Processo nº 369/2022
(Autos de Recurso Jurisdicional em Matéria Administrativa)
Data do Acórdão: 10 de Novembro de 2022
ASSUNTO:
- Contrato Administrativo
- Interpretação
SUMÁRIO:
O contrato administrativo haverá de ser interpretado de acordo com as suas cláusulas não sendo legítimo ao intérprete ir para além do que naquele consta, criando cláusulas e excepções que não haviam sido previstas.
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 369/2022
(Autos de Recurso Jurisdicional em Matéria Administrativa)
Data: 10 de Novembro de 2022
Recorrente: Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização
Recorrida: XXX Limitada
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
XXX Limitada, com os demais sinais dos autos,
veio instaurar acção sobre Contrato Administrativo, contra,
Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização, também com os demais sinais dos autos, e
Região Administrativa Especial de Macau,
Pedindo que os Réus sejam condenados a pagar-lhe a quantia de MOP931.853,41 acrescida dos juros à taxa legal a contar de 19 de Janeiro de 2018.
Foi proferida sentença julgando-se a acção procedente e em consequência:
1. Condenando-se o 1º Réu Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização a pagar à Autora a quantia de MOP931.853,41 acrescida dos juros à taxa legal a contar de 30 de Março de 2018 até efectivo e integral pagamento.
2. Absolvendo-se a 2ª Ré Região Administrativa Especial de Macau.
Não se conformando com a decisão proferida veio o 1º Réu recorrer da mesma, apresentando as seguintes conclusões:
1. A alegante discorda da sentença a quo quanto às duas questões a saber: se o direito da autora a pedir à ré a efectivação da garantia caducou; e se se verificaram as condições efectivas para a efectivação da responsabilidade de garantia assumida pela ré. A alegante mantém a sua posição e entendimento expressos na sua contestação.
2. Primeiro, a autora e a ré convencionaram o prazo de caducidade no n.º 2 da cláusula 4ª do “Acordo de Garantia” em causa: “o primeiro outorgante ficará sem qualquer responsabilidade de garantia se, decorrido um ano desde a data em que a empresa mutuária deixou de pagar o empréstimo em violação do disposto no contrato de crédito, o segundo outorgante não tiver pedido ao primeiro outorgante a efectivação da garantia de crédito.” De acordo com o artigo 291.º, n.º 2 do CC, o falado acordo sobre a caducidade é válido.
3. Portanto, o prazo de caducidade deve começar a correr a partir da “data da cessação da restituição do empréstimo”, não se aplicando o artigo 321.º do CC, o qual só é aplicável quando a lei ou o negócio jurídico não fixe a data de início do prazo de caducidade.
4. Além disso, a interpretação da lei e do negócio jurídico deve ter na letra do texto um mínimo de correspondência verbal. Nem a ré nem o homem comum interpretará a “data da cessação de reembolso” como “data de incumprimento definitivo” ou “data de preenchimento dos requisitos do cumprimento obrigatório da responsabilidade da garantia de créditos pela fiadora”, uma vez que não se vê um mínimo de correspondência verbal entre as últimas duas expressões e a “data da cessação de reembolso”.
5. Acresce que, no entender do Tribunal a quo, tendo a cláusula 3ª, n.º 3, alínea 1) do “Acordo de Garantia” estabelecido como pressuposto da efectivação da garantia assumida pela RAEM, que “a empresa mutuária deixou de reembolsar o empréstimo por meio ano”, a autora só pode exercer o seu direito quando tal pressuposto se encontre preenchido. A verdade, todavia, é que se a autora pode exercer o seu direito e se a ré deve cumprir a sua responsabilidade não são a mesma coisa.
6. A nosso ver, os 3 requisitos previstos na cláusula 3ª, n.º 3 do “Acordo de Garantia” (1. Decurso de meio ano depois de a empresa mutuária deixar de pagar o empréstimo; 2. Impossibilidade de recuperação total do empréstimo apesar da interpelação bancária; 3. A RAEM dá por provada que a empresa mutuária não tem perspectiva futura da restituição do empréstimo), são as condições efectivas para o cumprimento da responsabilidade da fiadora, mas não os pressupostos da formulação do pedido pela autora (banco mutuante).
7. Portanto, os 3 requisitos não são diferentes na sua natureza. Tal como o que entende o Tribunal a quo sobre o terceiro requisito, todos os 3 requisitos visam decidir se o pedido pode acabar por ser deferido, ou seja, se o crédito da autora pode ser satisfeito através da fiadora, o que nada tem a ver com se o banco pode exercer oportunamente o seu direito. Razão pela qual, o exercício do direito pela autora não depende da verificação dos referidos requisitos.
8. Os outorgantes ao fixarem o prazo de caducidade tiveram em mente o puro significado literal, isto é, a data em que a empresa mutuária deixa de restituir o empréstimo ao banco. Portanto, a interpretação literal é que: quando decorreu 1 ano a partir da cessação do reembolso do empréstimo pela empresa sem que se tenha pedido a efectivação da garantia, a responsabilidade de garantia da 1ª ré termina, de forma a que esta não fique sempre sujeita a uma responsabilidade de garantia que não se sabe quando se efectiva. Trata-se da vontade real dos outorgantes no estabelecimento da respectiva cláusula.
9. Por outro lado, o “Acordo de Garantia” em causa foi assinado perante notário entre as partes, que declararam compreender e concordar totalmente com o seu teor. A expressão “deixar de pagar o empréstimo” aparece 2 vezes no acordo. De acordo com o princípio da uniformidade e consistência do sentido da letra, o significado expresso deve ser o mesmo. Tendo celebrado o acordo de forma livre e voluntária e com base na boa fé, as partes deviam prever, razoavelmente, as eventuais situações a decorrer das disposições do acordo, pelo que não se deve apresentar, posteriormente, a interpretação extensiva e diversa da vontade inicial, ou, tendo caducado o seu direito de acordo com o convencionado, acusar a interpretação literal da fiadora da má fé. Acusação essa não tem nenhuma razão de ser.
10. No que toca à determinação da “data da cessação do pagamento do empréstimo”, os documentos submetidos pela autora indicam o dia 6 de Dezembro de 2016 como data de início do pagamento em atraso por parte da empresa, mas no dia 3 de Janeiro de 2017, a conta de liquidação da empresa mutuária só tinha o saldo de MOP0,01. Pelo que se deve considerar como “data da cessação do pagamento do empréstimo”, o mais tardar, o dia 3 de Janeiro de 2017.
11. Portanto, o prazo de caducidade acordado já decorreu na data (19 de Janeiro de 2018) em que a autora pediu a efectivação da garantia. Consequentemente, a 1ª ré já deixou de ser responsável pela garantia nos termos do n.º 2 da cláusula 4ª do “Acordo de Garantia”.
12. Caso o douto Tribunal entenda que o exercício do direito pela autora não foi extemporâneo, há de analisar a segunda questão do presente caso, isto é, se a autora ao pedir a efectivação da garantia junto da 1ª ré já satisfez os 3 requisitos concretos previstos na cláusula 3ª, n.º 3 do “Acordo de Garantia”?
13. Juntamente com o pedido de efetivação da garantia a autora também apresentou à 1ª ré, em 19 de Janeiro de 2018, os registos de concessão e reembolso do empréstimo, registo de interpelação de pagamento, documentos de requerimento da empresa mutuária para prorrogação do prazo de pagamento ou pagamento em prestação, documentos de interpelação bancária junto da mutuária e fiador, e documentos comprovativos da acção executiva intentada pela autora contra o proprietário da empresa mutuária e os 3 fiadores. No entanto, é óbvio que os supra mencionados registos e documentos só podem demonstrar que a empresa mutuária deixou de pagar o empréstimo por mais de meio ano, e que a autora já procedeu à interpelação mas não conseguiu recuperar o empréstimo concedido. Por outras palavras, já se encontravam reunidos os primeiros dois requisitos da cláusula 3ª, n.º 3.
14. Porém, quanto ao terceiro requisito - “o primeiro outorgante dá por provado, de acordo com a prova fornecida pelo segundo outorgante, que a empresa mutuária não tem perspectiva futura da restituição do dinheiro”, a autora não forneceu qualquer informação comprovativa da capacidade ou perspectiva futura da empresa em causa relativamente ao pagamento da dívida.
15. A instauração de acção executiva pela autora não implica necessariamente que a empresa mutuária não tem perspectiva futura de pagar o empréstimo, posto que existe a possibilidade de a empresa possuir activo mas não pagar o empréstimo bancário, considerando que a autora não apresentou quaisquer dados que permitissem saber se a empresa em causa ainda tinha activo, ou se possuía bens penhoráveis ou qual o valor dos bens penhorados na acção executiva.
16. Na verdade, naquele momento (19 de Janeiro de 2018), a autora também não forneceu à 1ª ré provas da situação de exploração da empresa em causa. Além disso, o facto de que a empresa mutuária alienou a loja e encerrou a actividade em Julho de 2017 só foi confirmado no presente caso, não tendo a 1ª ré condições de o confirmar anteriormente. Acresce que, a licença da empresa em causa emitida pelo IAM ainda se encontrava válida na pendência do presente processo.
17. Cumpre ainda salientar que tal “perspectiva futura” depende não só da receita da exploração, como ainda do valor dos bens empresariais eventualmente existentes, visto que não se pode afastar a possibilidade de a empresa ou o seu titular possuir suficientes activos para pagar a dívida.
18. Portanto, a alegante discorda do Tribunal a quo quando conclui simplesmente, só dos diversos pagamentos em atraso e interpelações sem êxito, que a empresa “já não tinha na altura a perspectiva futura de pagar a dívida”, pois isso tornaria totalmente inútil o requisito previsto na cláusula 3ª, n.º 3, alínea 3) do “Acordo de Garantia”, cuja verificação não é um facto óbvio nem naturalmente presumível, mas antes depende dum mínimo grau de prova.
19. Apesar de ficar posteriormente apurado, através dos factos oficiosamente apreciados no processo executivo n.º CV3-17-0077-CEO, que a empresa em causa não tinha a perspectiva futura de pagar a dívida, era impossível à 1ª ré “prever” isso no momento em que a autora lhe formulou o pedido.
20. Quanto à intenção original do Governo ao criar o Plano de Garantia de Créditos, a alegante entende que não se trata dum simples regime de garantia em que a responsabilidade de reembolso automaticamente se transfere para a RAEM ou a 1ª ré quando a empresa mutuária não paga o empréstimo, servindo, antes, a RAEM ou a 1ª ré da última garantia em termos da recuperação da dívida bancária, para assegurar a satisfação do crédito do banco mutuante. Pois é claro que a transferência para o Governo da responsabilidade do banco pela cobrança de dívida não é o objectivo inicial e directo do Plano de Garantia de Créditos.
21. Razão pela qual, a autora ao pedir à 1ª ré a efectivação da garantia há de pelo menos lhe mostrar umas simples provas de que a empresa mutuária já perdeu a perspectiva futura de restituir o dinheiro emprestado, só assim pode a 1ª ré cumprir a sua responsabilidade de garantia. No entanto, não tendo a autora apresentado qualquer prova a esse respeito, a 1ª ré ficou sem condições de apurar se a empresa em causa tinha a perspectiva futura de pagar o empréstimo. Portanto, naquele momento ela não estava obrigada a efectivar a garantia.
22. Ainda não concordamos com o juízo do Tribunal recorrido relativamente à determinação do quantum da garantia que a 1ª ré deve cumprir. Compulsados os autos, constata-se que na acção executiva n.º CV3-17-0077-CEO foram penhorados a favor da autora consideráveis bens do proprietário da empresa mutuária e dos seus fiadores, sendo o valor total penhorado não inferior a MOP756.529,33. Razão pela qual, o crédito da autora será pelo menos parcialmente satisfeito pelo valor penhorado. Para evitar o enriquecimento indevido da autora, a liquidação da responsabilidade de garantia da 1ª ré deve ser precedida da dedução desse valor.
23. Ultimamente, quanto aos juros decorrentes do incumprimento, a 1ª ré entende que, de acordo com o n.º 1 da cláusula 3ª e o n.º 3 da cláusula 4ª do “Acordo de Garantia”, a RAEM apenas presta a garantia de crédito correspondente a 70% do empréstimo concedido, sem que fique obrigada aos juros e outros encargos. Pelo que deve ser afastada a aplicação do artigo 630.º do CC.
24. Por outro lado, tal como anteriormente se referiu, a 1ª ré é da opinião de que os prazos previstos na cláusula 8ª, n.ºs 3 e 4 - verificação escrita da garantia no prazo de 2 meses e determinação da quantia no prazo de 10 dias - só começam a correr quando fique objectivamente provado que “a empresa não tem a perspectiva futura de pagar a dívida”. No entanto, isso não se provou até à instauração do presente processo. Razão pela qual não há mora do devedor a que se refere o artigo 793.º do CC, e a 1ª ré não precisa de ficar obrigada a quaisquer juros decorrentes do incumprimento de obrigações.
25. Face ao exposto, a alegante entende que o direito da autora a pedir a efectivação da garantia já caducou. Caso assim se não entenda, deve ainda considerar que a mesma ao pedir a efectivação da garantia não satisfez os 3 requisitos previstos no “Acordo de Garantia”. A alegante também é da opinião de que não deve, seja como for, obrigar-se aos juros moratórios.
26. Por conseguinte, a sentença a quo fez uma interpretação errada da cláusula 4ª, n.º 2 do “Acordo de Garantia”, bem como errou relativamente às questões acerca da verificação dos requisitos da efectivação da garantia. Portanto, a decisão que julgou procedente o pedido da autora deve ser anulada e substituída por outra no sentido da improcedência do pedido. Caso assim se não entenda, deve proceder-se à dedução do valor recebido pela autora na acção executiva n.º CV3-17-0077-CEO antes da liquidação da garantia prestada pela 1ª ré, devendo a mesma ficar isenta dos juros de mora.
A Autora contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida, não apresentando, contudo, conclusões.
Foram colhidos os vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
A. Dos Factos
Da decisão recorrida consta a seguinte factualidade:
1. Em 30 de julho de 2009, a autora e a 2ª ré celebraram o “Acordo de Garantia de Créditos a Pequenas e Médias Empresas” (adiante designado por “Acordo de Garantia”), que entrou em vigor desde o dia de celebração (fls. 401 a 405v. dos autos).
2. Os outorgantes referidos acordaram o seguinte no art.º 3.º n.º 2 e 3 do “Acordo de Garantia”:
“...
2. Em qualquer das seguintes situações, a 1ª outorgante é obrigada a cumprir a responsabilidade de garantia de créditos:
(1) O tribunal de Macau emitiu certidão ou documento judicial equivalente sobre a situação de execução de liquidação da dívida, que mostre a incapacidade de reembolso do empréstimo por parte da empresa mutuária;
(2) O liquidador emitiu certidão, que mostre a incapacidade de reembolso do empréstimo por parte da empresa mutuária;
(3) O tribunal de Macau ou o Juízo de Arbitragem Voluntária, instituído nos termos do art.º 13.º do presente Acordo, julgou que a 1ª outorgante deve cumprir a responsabilidade de garantia de créditos.
3. Se forem preenchidas todas as seguintes condições, a 1ª outorgante é obrigada a cumprir a responsabilidade de garantia de créditos:
(1) A empresa mutuária parou de reembolsar o empréstimo concedido há mais de 6 meses;
(2) A 2ª outorgante já interpelou, conforme o procedimento bancário comum de interpelação, a empresa mutuária e os indivíduos que assumam a responsabilidade solidária sobre o reembolso do empréstimo, mas ainda não conseguiu receber o pagamento de todo o empréstimo;
(3) A 1ª outorgante reconheceu segundo as prvoas oferecidas pela 2ª outorgante que não se vê perspectiva de reembolso por parte da empresa mutuária...”
3. O art.º 4.º n.º 2 do referido Acordo de Garantia dispõe que:
“...se a 2º outorgante não tiver solicitado à 1ª outorgante cumprir a responsabilidade de garantia de créditos dentro de 1 ano contado a partir do dia de a empresa mutuária violar as disposições do contrato de concessão de empréstimo e cessar de reembolsar o empréstimo, a 1ª outorgante não assume qualquer responsabilidade de garantia...”
4. O art.º 8.º do “Acordo de Garantia” dispõe que:
“...1. Se o empréstimo a que a 1ª outorgante prestou a garantia não seja reembolsado atempadamente ou na empresa mutuária ocorra ou seja possível ocorrer situação que influencie a recuperação da dívida, a 2ª outorgante deve fazer interpelação oportunamente conforme o procedimento bancário comum de interpelação.
2. Ao solicitar o cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos, a 2ª outorgante deve preencher e entregar ao Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização o “requerimento de cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos”, bem como oferecer os documentos que o segundo entende necessários.
3. Sendo suficientes os elementos necessários, o Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização deve verificar dentro de 2 meses a responsabilidade de garantia de créditos e responder a 2ª outorgante por escrito.
4. Se for acordado o cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos, o Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização é obrigado a verificar e fixar o valor de compensação e prestar à 2ª outorgante a respectia quantia dentro de 10 dias de trabalho contados do dia de emissão da resposta escrita mencionada no número anterior.
5. Após cumprida a responsabilidade de garantia de créditos, a 1ª outorgante tem o direito de sub-rogação contra a empresa mutuária.
6. Se a 1ª outorgante constitua a 2ª outorgante para proceder à rogação, a 2ª outorgante não pode negar o pedido, as quantias recebidas ou as despesas decorrentes da rogação são distribuídas ou suportadas entre as 1ª e 2ª outorgantes à proporção de 70%:30%.
7. Após vendidos os bens que serviram como garantia, a 2ª outorgante é obrigada a pagar à 1ª outorgante 70% da receita...”
5. Em 3 de Dezembro de 2014, o Chefe do Executivo aprovou o requerimento da “Companhia de Restauração Internacional YY, Limitada” no Plano de Garantia de Créditos a Pequenas e Médias Empresas, o valor da garantia foi de MOP$2.310.000,00, com o prazo de 5 anos, A, B e C emitiram a livrança no mesmo valor para prestar a contragarantia. (vide a fls. 365 dos autos e as fls. 100 e 100v. do processo administrativo 1)
6. Em 30 de Dezembro de 2014, o Presidente do Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização emitiu à autora o documento de confirmação n.º 54/2014 do Plano de Garantia de Créditos a Pequenas e Médias Empresas. (vide a fls. 366 dos autos)
7. Em 6 de Janeiro de 2015, a autora, a mutuária “Companhia de Restauração Internacional YY, Limitada” e os 3 garantes A, B e C celebraram um contrato de concessão de empréstimo no valor de MOP$3.300.000,00, emprestando a respectiva quantia à mutuária. (vide as fls. 88 a 89 do processo administrativo 1)
8. De acordo com o contrato de concessão de empréstimo supracitado, a mutuária estava sujeita à prestação média mensal do capital e juros ao dia 6 de todos os meses. (Idem)
9. Em 3 de Janeiro de 2017, a autora só podia retirar automaticamente da conta da mutuária uma quantia de MOP$0,01. (vide as fls. 42 e 42v. do processo administrativo 1)
10. Em 31 de Março de 2017, a autora intentou perante o Tribunal Judicial de Base o processo ordinário de execução n.º CV3-17-0077-CEO contra a mutuária e os 3 garantes. (vide as fls. 44 a 47 do processo administrativo 1)
11. Em 19 de Janeiro de 2018, a autora requereu ao 1º réu o cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos, relativamente a uma quantia de MOP$931.853,41. (vide as fls. 37 a 43v. do processo administrativo 1)
12. Em 13 de Junho de 2018, o 1º réu respondeu por carta à autora que, foi indeferido o requerimento de cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos, com fundamento em que a autora “não apresentou ao nosso Fundo o pedido de cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos dentro de 1 ano contado a partir da cessação de reembolso do empréstimo por parte do empresário mutuário, por isso, nos termos do art.º 4.º n.º 2 do «Acordo de Garantia de Créditos a Pequenas e Médias Empresas», celebrado em 30 de Julho de 2009 entre a RAEM e o vosso Banco, a Comissão de Administração do nosso Fundo decidiu em 6 de Junho de 2018 indeferir o vosso pedido de cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos......” (vide a fls. 5 do processo administrativo 1).
13. Em 8 de Setembro de 2020, a autora intentou ao Tribunal a presente acção sobre contrato administrativo, pedindo condenar o Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização, 1º réu, a cumprir a responsabilidade de garantia de créditos.
14. Até 4 de Novembro de 2021, foi respectivamente no montante de MOP$40,00 e de MOP$98,08 o saldo das contas bancárias da mutuária “Companhia de Restauração Internacional YY, Limitada”, penhoradas no referido processo ordinário de execução n.º CV3-17-0077-CEO. (vide as fls. 532 a 545 dos autos)
B. Do Direito
São duas as questões que se colocam em sede de recurso, já aliás enunciadas na sentença recorrida:
- Da tempestividade do pedido de pagamento da garantia;
- Da verificação dos pressupostos para a efectivação da garantia.
Nas suas conclusões e alegações de recurso insurge-se o Recorrente contra a interpretação feita na decisão recorrida da cláusula 4ª nº 2 do Acordo de Garantia celebrado entre Autor e 2ª Ré, entendendo em síntese que o prazo de caducidade ali consagrado se conta a partir da data da cessação da restituição do empréstimo, sustentando que os 3 requisitos exigidos na cláusula 3ª nº 3 são as condições para o cumprimento do fiador mas não pressupostos para o Banco formular o pedido.
Sobre esta matéria entendeu-se na decisão recorrida o seguinte:
«No caso, analisando os fundamentos das partes, o Tribunal entende que, para o conhecimento, há as seguintes questões a resolver:
1. Ao abrigo do art.º 4.º n.º 2 do “Acordo de Garantia”, foi apresentado fora do prazo ou não o requerimento de cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos, deduzido pela autora ao 1º réu;
2. Se entenderem que não foi apresentado fora do prazo, esse requerimento reuniu ou não as condições necessárias para requerer o cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos, previsas pelo art.º 3.º n.º 3 do “Acordo de Garantia”.
No tocante à 1ª questão, ao contrário dos fundamentos dos réus, a autora sustenta que, o seu requerimento de 19 de Janeiro de 2018, sobre o cumprimento da garantia de créditos, não foi apresentado fora do prazo, uma vez que, o prazo de caducidade, previsto pelo art.º 4.º n.º 2 do “Acordo de Garantia”, deve ser contado a partir do dia em que o atraso em cumprimento contratual pela mutuária se transitou, após interpelação devida, em incumprimento definitivo. No caso, o incumprimento definitivo da mutuária começou em 20 de Fevereiro de 2017, por isso, o requerimento foi apresentado com tempestividade. Mesmo que não concordem, deve ser contado a partir de 8 de Fevereiro e de 31 de Março de 2017, altura em que a autora compensou a respectiva dívida com o saldo das contas bancárias da mutuária e garantes.
Dispõe o art.º 4 (exclusão de responsabilidade) n.º 2 do “Acordo de Garantia” que: ...se a 2º outorgante não tiver solicitado à 1ª outorgante cumprir a responsabilidade de garantia de créditos dentro de 1 ano contado a partir do dia de a empresa mutuária violar as disposições do contrato de concessão de empréstimo e cessar de reembolsar o empréstimo, a 1ª outorgante não assume qualquer responsabilidade de garantia...”
Isso é a vontade das partes, pela qual se fixa, através de negócio jurídico, um prazo da natureza de caducidade para o exercício do direito (vide o art.º 291.º n.º 2 do Código Civil).
Analisando o sentido apenas com base no texto, são indubitáveis a interpretação e a aplicação dessa disposição pelos réus - o prazo de caducidade para o exercício do direito, pela entidade de crédito que concedeu o empréstimo, de requerer ao Governo cumprir a garantia de crédito deve ser de 1 ano contado a partir do dia em que a mutuária parou pela primeira vez de reembolsar o empréstimo. Mesmo que, como disse a autora, a cessação ou não do reembolso seja indeterminável até que se reunem posteriormente as condições para chegar a conclusão, não obsta para os outorgantes fixar, no momento de celebração do acordo e por vontade comum, o dia de “cessação do reembolso” pela mutuária como a data decisiva para contagem inicial.
De acordo com os factos provados, o último pagamento da dívida pela mutuária “Companhia de Restauração Internacional YY, Limitada” efectuou-se em 3 de Janeiro de 2017, altura em que “a autora só podia retirar automaticamente da conta da mutuária uma quantia de MOP$0,01”. Evidentemente, já passou 1 ano quando a autora requereu o cumprimento da garantia de crédito em 19 de Janeiro de 2018, parece que o seu direito já foi caducado.
Mas, não se esqueça de que, o acordo de garantia de créditos em questão é um contrato administrativo, na interpretação das suas disposições atender-se-ão, para além do sentido do texto, os princípios fundamentais da lei administrativa, nomeadamente os interesses públicos que o outorgante com poderes públicos pretende realizar na celebração do contrato e a transparência do procedimento de formação do contrato, o que faz o sentido das disposições objectivamente determinável (vide Digo Freita do Amaral, Curso de Direito Administrativo, volume II, 3ª edição, pp. 493 a 495, e vide Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo III, Actividade administrativa, pp. 340 a 341).
E mais, o Tribunal Administrativo Supremo também apoia o mesmo entendimento no acórdão n.º 0739/04 de 8 de Março de 2005: “um dos princípios da disciplina legislativa dos contratos é o princípio da confiança, que nos leva à doutrina válida em matéria da sua interpretação, que terá de ser sempre enformada pelo princípio da boa fé, pois que este princípio deve acompanhar toda a vida do contrato, desde a sua feitura até à sua extinção.” (vide http://www.dgsi.pt)
No caso, os outorgantes do “Acordo de Garantia” já fixaram um prazo de caducidade do direito, ao abrigo do art.º 321.º do Código Civil, o prazo de caducidade, se a lei não fixar outra data, começa a correr no momento em que o direito puder legalmente ser exercido. Então, quando a mutuária praticou o acto de cessação do reembolso, reconhecido pelos réus, o banco mutuante reuniu ou não as condições para apresentar tempestivamente o requerimento segundo o “Acordo de Garantia” e solicitar ao garante cumprir a responsabilidade de garantia previamente acordada? Isto é, na altura era possível exercer o seu direito nos termos da lei? Conforme a nossa interpretação do “Acordo de Garantia”, era realmente impossível.
Pode-se ver que, os n.º 2 e 3 do art.º 3.º (âmbito e pressupostos de garantia de créditos) do “Acordo de Garantia” estabelecem 2 regimes diferentes do cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos. A autora apresentou o respectivo requerimento ao 1º réu com fundamento em preenchimento do n.º 3, que impõe ao garante o cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos só quando estejam satisfeitas as seguintes condições enumeradas nele: “(1) A empresa mutuária parou de reembolsar o empréstimo concedido há mais de 6 meses; (2) A 2ª outorgante já interpelou, conforme o procedimento bancário comum de interpelação, a empresa mutuária e os indivíduos que assumam a responsabilidade solidária sobre o reembolso do empréstimo, mas ainda não conseguiu receber o pagamento de todo o empréstimo; (3) A 1ª outorgante reconheceu segundo as prvoas oferecidas pela 2ª outorgante que não se vê perspectiva de reembolso por parte da empresa mutuária...”
No tocante à 1ª condição, se o mutante só puder requerer o cumprimento da garantia de crédito quando “A empresa mutuária parou de reembolsar o empréstimo concedido há mais de 6 meses” mas o prazo de caducidade do direito for contado a partir da 1ª cessação do reembolso pela mutuária, o prazo para o mutante exercer o direito conferido pelo contrato, de facto, é inferior a 6 meses, nos primeiros 6 meses após o dia de cessação do reembolso ele não reune a condição para apresentar o requerimento.
A 2ª condição para pedir cumprir a responsabilidade de garantia de créditos é “já interpelou, conforme o procedimento bancário comum de interpelação, a empresa mutuária e os indivíduos que assumam a responsabilidade solidária sobre o reembolso do empréstimo, mas ainda não conseguiu receber o pagamento de todo o empréstimo”.
Essa disposição é correpondente ao art.º 8.º (cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos) n.º 1 do “Acordo de Garantia” - antes de pedir o cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos, “Se o empréstimo a que a 1ª outorgante prestou a garantia não seja reembolsado atempadamente ou na empresa mutuária ocorra ou seja possível ocorrer situação que influencie a recuperação da dívida, a 2ª outorgante deve fazer interpelação oportunamente conforme o procedimento bancário comum de interpelação.” Por isso, a interpelação procedimental ao devedor também é o pressuposto de a autora exercer o direito e requerer o cumprimento da responsabilidade de garantia de crédito. Realmente, é fundamentado o entendimento da autora no sentido de que o prazo de caducidade deve ser contado a partir do dia em que o atraso em cumprimento contratual pela mutuária se transitou, após interpelação devida, em incumprimento definitivo. Mesmo não recorrendo para o regime geral do incumprimento da dívida, previsto pelos art.º 793.º a 797.º do Código Civil, basta a pura interpretação das disposições do “Acordo de Garantia” para chegar à mesma conclusão.
Os réus estão preocupados com esse entendimento porque, se a data de contagem inicial do prazo de caducidade depende completamente da acção da autora - ou seja, a interpelação ou não ao devedor, a eventual atitude omissiva da autora pode possivelmente resultar em prorrogação injusta do respectivo prazo, fazendo com que o garante tenha de assumir por longo período a responsabilidade de garantia de créditos.
Mas a essência da questão consiste em que, não podem ser produzidos os efeitos, esperados na fixação do prazo de caducidade, de incentivar o banco mutuante a tomar iniciativas para garantir a satisfação do direito de crédito, uma vez que, os pressupostos do requerimento do cumprimento da responsabilidade de garantia de créditos restringem a sua tomada de iniciativas, ele só pode exercer o direito quando estejam preenchidas todas as condições. Se não tiver interpelado a mutuária ou a mutuária tiver cessado de pagar a dívida há menos de 6 meses, é impossível para a autora aproveitar suficientemente os benefícios do prazo de caducidade.
Tal conclusão está contrariada sem dúvida ao princípio geral previsto pelo art.º 321.º do Código Civil. Segundo esse princípio, o exercício do direito pelo titular não pode impedir a iniciação de contagem do prazo de caducidade, salvo outra disposição da lei. O acordo entre as partes, mesmo sendo válido, não pode excluir a aplicação desse princípio.
Por outro lado, no momento de celebração do Acordo com a ré, a autora previa que discutiria as regras detalhadas com a mutuária quando teria todo um ano para exercer o seu direito e, com base nisso, modificava os direitos e deveres entre as partes e coordenava a execução das regras, esperando a satisfação efectiva do seu direito de crédito. Pelo que, não podemos considerar precipitadamente que, o prazo de caducidade que na verdade é inferior a 1 ano está conforme à vontade comum dos outorgantes. Mas agora, os réus recusam-se a cumprir a responsabilidade de garantia com base na sua interpretação unilateral das disposições do acordo, nomeadamente respeitantes ao prazo de caducidade, parece que prejudicam a confiança da autora como outra parte outorgante e violam o princípio da boa fé que devem cumprir nas actividades administrativas.
Deste modo, o Tribunal entende que, o prazo de caducidade de 1 ano, previsto pelo art.º 4.º n.º 2 do “Acordo de Garantia”, deve ser contado pelo menos a partir da satisfação das primeiras duas condições do art.º 3.º n.º 3 pela entidade de crédito mutuante.
No tocante à 3ª condição - “A 1ª outorgante reconheceu segundo as provas oferecidas pela 2ª outorgante que não se vê perspectiva de reembolso por parte da empresa mutuária”, a sua natureza é diferente das duas supracitadas. Se entenderem que, as primeiras duas condições constituem os pressupostos suficientes e necessários da apresentação do requerimento pela mutuante, essa condição final determina que a aprovação ou não do requerimento depende da existência ou não das provas suficientes para apreciação. Por isso, a satisfação ou não dessa condição tem nada a ver com o exercício oportuno do direito pelo mutuante.
Pelo que, se entenderem que a cessação do reembolso pela empresa mutuária em causa começou desde 3 de Janeiro de 2017, a autora só reuniu as condições objectivas, pelo menos desde 3 de Julho do mesmo ano, 6 meses após a cessação do reembolso, para apresentar o requerimento ao Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização. Por isso, o requerimento de 19 de Janeiro de 2018 não foi apresentado fora do prazo.».
Numa primeira abordagem somos tentados a acompanhar a decisão recorrida, mas se começarmos a equacionar esta solução outros problemas surgem que não têm resolução em face da resposta dada.
Se considerarmos que o prazo de um ano referido na cláusula 4ª nº 2 só começa a contar depois de verificados os requisitos do nº 3 da cláusula 3ª então não podemos apenas dizer que o prazo se inicia após o prazo de seis meses referido no nº 1 mas também após a verificação do requisito da impossibilidade de recuperação total do empréstimo, ou de alguma das situações previstos no nº II da Cláusula 3.ª, contudo, não foi nada disso que se escreveu no acordo.
Ou seja, o mutuante teria um ano a contar do final do prazo de seis meses ou a contar do momento em que passou a haver prova da impossibilidade de recuperação total do empréstimo para pedir a efectivação da garantia de crédito.
Tal equivalia a dizer-se que embora o contrato estabeleça que o garante não assume qualquer responsabilidade da garantia se o mutuante não solicitar o pagamento no prazo de 1 ano a contar da data em que a mutuária cessar de reembolsar em violação do contrato de crédito, deixaria de ter um termo inicial certo para ter um termo inicial incerto, isto é, seis meses após a cessação do pagamento pela mutuária se acaso nesse prazo já havia a prova da impossibilidade de pagamento total e superior a seis meses se essa prova só fosse obtida posteriormente.
Pergunta-se então para quê fixar o prazo de um ano a contar da cessação do pagamento por banda da mutuária se afinal os momentos a partir do qual o prazo se conta são outros?
A resposta só pode ser que não foi essa a intenção dos contratantes.
Os contraentes o que disseram é que cessa a obrigação do garante de prestar a garantia se o mutuante não tiver reclamado a efectivação daquela no prazo de um ano a contar da cessação do pagamento por banda do mutuário.
Entende-se na decisão recorrida e a Recorrente que este prazo é de caducidade por ser o prazo que o mutuante tem para exercer o direito. Mas também aqui discordamos, pois o que ali se consagra é uma prescrição extintiva, o garante fica sem responsabilidade de garantia se o mutuante decorrido um ano sobre a cessação de pagamentos por banda do mutuário não lhe comunicar (ao garante) este facto no prazo de um ano.
Ao se falar de extinção da responsabilidade mais apropriado será falar de prescrição extintiva, ou seja, não se comunicando no prazo que ocorreu a condição primeira (cessação de pagamentos pela mutuária) para a efectivação da garantia, a obrigação do garante extingue-se.
Mas o que é certo é que dúvidas não há-de que o momento a partir do qual o prazo se conta é o da data da cessação de pagamentos pela mutuária.
Salvo melhor opinião, acompanhamos o Recorrente que o que se estabelece na cláusula terceira e quarta são realidades diferentes.
Na cláusula quarta consagra-se o prazo durante o qual o mutuante há-de comunicar que cessaram os pagamentos sob pena de se extinguir a responsabilidade do garante.
Na cláusula terceira consagram-se os requisitos que se têm de verificar para que a garantia seja efectivada.
Nada obsta que antes de decorrido o prazo de seis meses após a cessação dos pagamentos o mutuante comunique a cessação de pagamentos e prove a impossibilidade de recuperação total do empréstimo se estiver em condições de o fazer.
De igual modo tudo indica que nada obsta que durante o ano subsequente à cessação de pagamentos se comunique tal facto, mas só após este ano venha a haver prova da impossibilidade de recuperação total do empréstimo, nomeadamente as previstos na Cláusula 3.ª II.
O que se determina no acordo são dois momentos distintos, na clausula 4ª estabelece-se o prazo durante o qual o mutuante tem de comunicar sob pena de se extinguir a responsabilidade do garante e na cláusula 3ª os requisitos para que seja efectivada a garantia.
O contrato administrativo haverá de ser interpretado de acordo com as suas cláusulas não sendo legítimo ao intérprete ir para além do que naquele consta, criando cláusulas e excepções que não haviam sido previstas.
Destarte, não acompanhamos a decisão recorrida, concluindo que se a mutuária cessou os pagamentos em 3 de Janeiro de 2017 a responsabilidade do garante aqui 1º Réu se extinguiu 1 ano após, isto é, estava já extinta quando em 19 de Janeiro de 2018 a Autora requereu o cumprimento da responsabilidade de garantia.
Tendo-se extinguido a responsabilidade do garante pelo decurso do prazo sem que lhe haja sido comunicada a cessação de pagamentos, fica prejudicada a apreciação dos requisitos para que se efectivasse a garantia, impondo-se decidir em conformidade.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, concedendo-se provimento ao recurso revoga-se a decisão recorrida, absolvendo-se o 1º Réu Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização do pedido.
Custas a cargo da Autora e agora Recorrida em ambas as instâncias.
Registe e Notifique.
RAEM, 10 de Novembro de 2022
(Relator)
Rui Carlos dos Santos Pereira Ribeiro
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong
(Segundo Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng
369/2022 ADM 1