打印全文
Processo n.º 983/2021
(Autos de recurso contencioso)
     
Relator: Fong Man Chong
Data : 10 de Novembro de 2022

Assuntos:
- Cancelamento da autorização da permanência por o Recorrente ter praticado infração penal


SUMÁRIO:
I – Na sequência da prática pelo arguido/Recorrente dos factos integradores do crime de fuga à responsabilidade e ter sido condenado pelo tribunal competente, foi proferida pelo Secretário para a Segurança a decisão que cancelou a autorização da permanência anteriormente concedida ao Recorrente, tendo em vista a preservação da segurança e ordem pública, como valores que interessam a toda a comunidade e que se dota de um estatuto de supremacia enquanto interesse público, contra tal decisão foi interposto o presente processo contencioso.
     
     II – Uma vez que os vícios invocados (violação da proporcionalidade e de adequação) pelo Recorrente não ficaram provados, nem se verificam outras deficiências invalidantes, é de manter a decisão recorrida.


O Relator,
     
_______________
Fong Man Chong


























Processo n.º 983/2021
(Autos de recurso contencioso)

Data : 10 de Novembro de 2022

Recorrente : A

Entidade Recorrida : Secretário para a Segurança

*
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I – RELATÓRIO
A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho do Secretário para a Segurança, datado de 27/09/2021, veio, em 24/11/2021, interpor o presente recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 5, tendo formulado as seguintes conclusões:
一、本司法上訴所針對的標的行政行為是,於2021年9月27日,保安司司長根據第8/2010號行政法規第15條第1款,結合第6/2004號法律第11條第1款3項的規定,針對上訴人A廢止其以僱員身份的逗留許可。
二、上訴人不認同有關標的行政行為,並認為其沾有違反行使自由裁量權、適當及適度原則瑕疵。
三、雖然針對上訴人作出的行政行為屬於行政當局自由裁量的範圍,但是,上訴人認為保安司司長對其廢止的行政行為亦應以上訴人最終是否科處刑罰為考慮前提,於行使自由裁量權時出現明顯錯誤,行政當局對上訴人廢止以僱員身份而獲得逗留許可的行政行為決定與上訴人現處於上訴仍未有判決之間出現明顯不相稱的情況。
四、在保持應有之尊重下,上訴人認為有關結論性(有罪判決)陳述缺少考慮上訴人所觸犯犯罪並沒有為社會帶來其大影響,事件情節不屬嚴重,行政當局選擇對上訴人作出的決定與其所犯之過錯明顯不適當。
五、雖然上訴人所觸犯的刑事罪行如果成為確定判決的話,確會為社會帶來一定影響,但是,有關被害人損失金額數目不多(澳門幣3,000.00),事後上訴人亦支付賠償給兩名被害人。
六、上訴人所觸犯之刑事案件沒有為社會帶來嚴重影響,被害人損失金額不多,情節明顯不屬於嚴重狀況,行政當局明顯無考慮對上訴人一切有利於司法上訴人的各項客觀有利情節,行政決定實屬過度適用。
七、在上訴人來澳工作4年多及對工作充滿熱誠的態度,被上訴實體應考慮到上訴人在本案之有利情節,至少仍未有最後的確定判決前仍是未屬有犯罪前科或屬已科處徒刑,因此尊敬的中級法院應撤銷被上訴的行政行為分方為恰當。
八、綜上所述,被訴行為存在包括行使自由裁量權、違反適當及適度原則的瑕疵,因此,被上訴實體於2021年09月27日所作出批示中關於“廢止其以僱員身份的逗留許可”的決定應予以撤銷。
*
Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Secretário para a Segurança veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 17 a 20, tendo formulado as seguintes conclusões:
1) 司法上訴人不服保安司司長所作出的、維持治安警察局局長決定廢止其僱員身份逗留許可的批示,提起本司法上訴;
2) 在所提交的上訴狀中,司法上訴人指被上訴的決定沾有違反行使自由裁量權、適當及適度原則的瑕疵,應予以撤銷;
3) 僅在行使自由裁量權時出現明顯錯誤或絕對不合理,或以不能容忍的方式違反了行政法的基本原則時,法院才可以對此類行為的實質內容進行審查;
4) 按照相關法律的規定,行政當局在對廢止逗留許可作出決定時尤其應該考慮利害關係人是否有刑事犯罪前科,是否經證實不遵守澳門特別行政區法律,是否有強烈跡象顯示利害關係人曾實施或預備實施任何犯罪;
5) 行政當局可以基於其經調查而查明的事實就是否存在強烈跡象顯示利害關係人曾實施或預備實施犯罪作出判斷,即使法院仍未經審判而認定該等事實亦然;
6) 雖然司法上訴人所涉刑事案件尚處待決中,但不妨礙行政當局依據有關行政卷宗所載資料作出相應判斷。因此,不存在司法上訴人所指違反行使自由裁量權的瑕疵;
7) 而司法上訴人不僅涉及酒後駕駛,並在事故發生後沒有報警亦沒有設法作出處理,而是離開了現場,明顯,其對本地區的公共安全和秩序構成的危險非如其所指般不屬嚴重。故此,被上訴決定同樣未有違反適當及適度原則的情況。
*
O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o douto parecer de fls. 31 e 32, pugnando pelo improvimento do recurso.
*
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
    III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:

- Relativamente ao Recorrente, enquanto titular da licença de trabalhador não residente, pela Entidade Recorrida foi revogada a competente autorização (despacho de 27/09/2021) mediante o seguinte despacho:
批示
事項:必要訴願
利害關係人:A

      利害關係人針對廢止其以僱員身份逗留許可的決定提起本訴願。
      卷宗資料顯示,利害關係人酒後駕車,並在碰倒兩輛電單車後沒有報警亦沒有設法作出處理,而是離開了現場。治安警察局因此作出評估認為其人對澳門的公共安全和秩序構成危險並不存在錯誤和不當之處。
      除此之外,初級法院亦已對其醉酒駕駛和逃避責任的行為作出了有罪判決。
      基於此,根據《行政程序法典》第161條1款規定,決定維持原決定。
      
保安司司長
B
二零二一年九月二十七日
* * *
    IV – FUNDAMENTOS
A propósito das questões suscitadas pelo Recorrente, o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI teceu as seguintes doutas considerações:
“(…)
Na petição, o recorrente solicitou a anulação do despacho recorrido cujo conteúdo integral se dá aqui por integralmente reproduzido (vide. fls.7 dos autos), invocando a violação dos princípios da presunção da inocência bem como da adequação e da proporcionalidade.
*
Por maioria da razão, entendemos tranquilamente que se aplica ao caso sub judice a jurisprudência do Venerando TUI, segundo a qual (cfr. Acórdão no Processo n.º28/2014): 1. No caso de haver fortes indícios quanto à prática ou à preparação para a prática de crimes, a Administração pode decretar a interdi-ção de entrada com fundamento na existência de perigo efectivo para a segurança ou ordem públicas da RAEM - art.º 12.º n.ºs2 e 3 da Lei n.º6/2004 e art.º4.º n.º2, al. 3) da Lei n.º4/2003. 2. Com a previsão, como pressuposto da interdição de en-trada, de existência de “fortes indícios” da prática do crime, não se pode falar na aplicação dos princípios da presunção de inocência e do in dubio pro reo, já que a exigência legal, tão só, de fortes indícios se opõe logicamente à ideia de com-provação de prática do facto ilícito. 3. Não se aplica, na matéria de interdição de entrada em virtude de existirem fortes indícios da prática do crime, os princípios da presunção de inocência e do in dubio pro reo.
Convém notar que a posição unânime do TSI vem asseverando (a título exemplificativo, cfr. Acórdãos nos Processos n.º759/2007 e n.º647/2012): A interdição da en-trada na RAEM, sendo uma medida policial destinada a assegurar a paz e a tranquilidade social desta comunidade, não confronta com o princípio da presunção da inocência, previsto nos arts.29º e 43º da Lei Básica.
Em esteira, temos por concludente que o despacho em questão não ofende o princípio da presunção da inocência, pese embora em 27/09/2021 que é data desse despacho, não transitasse em julgado a sentença prolata-da no Processo n.ºCR4-21-0031-PCS (doc. de fls.127 a 135 do P.A.). Pois, o despa-cho in quaestio não se baseia em caso julgado ou antecedente criminal.
*
A jurisprudência constante e uniforme dos TUI e TSI sustenta que a reabilitação, judicial ou ipso iure, não impede a Administração de recu-sar os pedidos de autorização de permanência ou de residência em Macau com fundamento em antecedentes criminais, condenações penais ainda não transitadas, indícios da prática de crimes ou indícios da preparação para prática de crimes. O que nos dão a conta, a título exemplificativo, os doutos arestos do TUI nos processos n.º36/2006, n.º76/2012 e n.º123/2014.
Afirma ainda a sensata jurisprudência, e bem, que decisão judicial de não transcrição da sentença condenatória no certificado do registo cri-minal bem como a não revogação da suspensão de execução da pena não obsta à valorização de antecedentes criminais pela Administração para negar pedidos de autorização de permanência ou residência em Macau.
Bem, a autoridade administrativa é livre de retirar as consequências de uma condenação, ainda que suspensa na sua execução e decorrido já o período de suspensão, bem como de uma investigação criminal, ainda que arquivada por prescrição, para avaliação de uma personalidade em vista dos fins perspectivados, sendo de relevar os interesses referentes à defesa da segurança e ordem públicas (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º315/2004).
De qualquer modo, vale ter sempre presente que «第4/2003號法律第九條規定行政長官或經授權的司長得批給在澳門特別行政區居留的許可,且規定批給時應考慮各種因素,當中包括申請人的犯罪前科,即使上訴人的犯罪已逾若干年數,且判刑亦未見嚴厲,但該犯罪記錄仍不失為一犯罪前科,並可作為批准外地人居留澳門的考慮因素的事實性質。» (vide Acórdão do TSI no Processo n.º244/2012)
Sufragamos também a criteriosa jurisprudência que inculca «雖然上訴人提出的居留許可聲請被否決,但毫無疑問,有關被上訴的行政行為明顯是為了謀求公共利益,尤其為確保公共安全及社會穩定,因此上訴人的個人利益應當給予讓步。» (Acórdãos do TSI no Pro-cessos n.º787/2011 e n.º570/2012)
No vertente caso, o despacho impugnado, só por si, demonstra que a Administração visa propositadamente a prosseguir interesses públicos que se traduzem, no caso sub iudice, em defender a segurança e ordem públicas da RAEM, designadamente em evitar sinistralidade estradal.
A todas estas luzes, e atendo que os argumentos alegados pelo re-corrente para abonar a violação dos princípios da proporcionalidade e da adequação são manifesta e incuravelmente vagos e fracos, temos por certo que o despacho recorrido não colide com estes dois princípios.
***
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso.”
*
Quid Juris?
Basicamente concordamos com o douto parecer do MP acima transcrito e acrescentamos ainda os seguintes aspectos:
Temos vindo a afirmar em vários arestos por nós proferidos a seguinte ideia (cfr. aórdao do Proc. nº 553/2019, com acórdão proferido em 16/01/2020) :
“(…)
a) - O direito de permanência na RAEM não é um direito subjectivo titulado pelo Recorrente, pois, a atribuição deste direito está sujeito à valoração da autoridade competente nos termos legais;
b) - Tal valoração consubstancia no cumprimento das leis reguladoras da matéria pela entidade recorrida;
c) - Os factos criminosos imputados ao Recorrente revelam a sua personalidade e leva a crer-se que lhe faltava a consciência de cumprir as leis vigentes na RAEM, o que constitui um fundamento forte e suficiente para revogar a autorização da permanência do Recorrente em Macau tal como nos termos invocados pela Entidade Recorrida.
(…)”.

Naquele processo em que o Recorrente suscitou igualmente a questão da violação dos princípios da proporcionalidade, e a este propósito, foram tecidas as seguintes considerações pelo Digno. Magistrado do MP junto deste TSI:
“O recorrente alinha também, como fundamentos do recurso, a violação dos princípios da adequação e da proporcionalidade. Nesse sentido, considera que, em face dos elementos de que a Administração dispunha, a decisão de revogar a autorização de permanência se apresenta desproporcional, vistas as coisas à luz do confronto entre os interesses e direitos em presença.
Crê-se que, também neste ponto, não lhe assiste razão, não obstante os considerandos que tecemos em sede de recurso jurisdicional da providência de suspensão de eficácia, em matéria de ponderação de interesses, pois são diversos os critérios e as finalidades que presidem ao juízo de proporcionalidade nos dois momentos.
O princípio da proporcionalidade, que é um corolário do princípio da justiça, obriga a que as decisões administrativas que colidam com direitos e interesses legítimos dos particulares apenas possam afectar as posições destes na justa medida da necessidade reclamada pelos objectivos a prosseguir. E não se pode falar de desrazoabilidade quando a actuação administrativa é adequada à prossecução do interesse público que lhe cabe salvaguardar, desde que o sacrifício do interesse particular encontre justificação na importância do interesse público a salvaguardar.
Pois bem, estando em causa, como estava, a continuidade da autorização de permanência em Macau, só duas hipóteses se colocavam: mantê-la ou revogá-la. O acto recorrido tomou em linha de conta a prática de um crime por parte do particular interessado, aqui recorrente, e, no confronto dos valores em presença, atribuiu supremacia ao interesse público, o que se compreende e é aceitável em vista da preservação da segurança e ordem pública, como valores que interessam a toda a comunidade. No contexto em que o acto recorrido foi proferido, a primazia conferida ao interesse público não afronta o princípio da proporcionalidade, não padecendo o acto de erro, muito menos ostensivo ou grosseiro, que caucione uma interferência do tribunal relativamente ao sentido do exercício daquele poder discricionário. Soçobram também a desadequação e a desproporcionalidade atribuídas ao acto.”
Subscrevemos inteiramente este ponto de vista com a qual concordamos.
Pelo que, na ausência de fundamentos, é de julgar improcedente o recurso.
*
Síntese conclusiva:
I – Na sequência da prática pelo arguido/Recorrente dos factos integradores do crime de fuga à responsabilidade e ter sido condenado pelo tribunal competente, foi proferida pelo Secretário para a Segurança a decisão que cancelou a autorização da permanência anteriormente concedida ao Recorrente, tendo em vista a preservação da segurança e ordem pública, como valores que interessam a toda a comunidade e que se dota de um estatuto de supremacia enquanto interesse público, contra tal decisão foi interposto o presente processo contencioso.
II – Uma vez que os vícios invocados (violação da proporcionalidade e de adequação) pelo Recorrente não ficaram provados, nem se verificam outras deficiências invalidantes, é de manter a decisão recorrida.
*
Tudo visto, resta decidir.
* * *
    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
*
Custas pelo Recorrente que se fixam em 6 UCs.
*
Notifique e Registe.
*
RAEM, 10 de Novembro de 2022.

_________________________ _________________________
Fong Man Chong Mai Man Ieng
_________________________
Ho Wai Neng
_________________________
Tong Hio Fong

23
2021-983-revogar-entrada-permanência-crime