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Processo n.º 642/2022
(Autos de recurso em matéria cível)

Relator: Fong Man Chong
Data: 10 de Novembro de 2022

ASSUNTOS:

- Intervenção principal e/ou acessória do Fundo de Garantia Automóvel (FGA)


SUMÁRIO:

I - Ao abrigo do disposto no artigo 23º do DL nº 57/94/M, de 28 de Novembro, ao Fundo de Garantia Automóvel (FGA) compete satisfazer as indemnizações por morte ou lesões corporais consequentes de acidentes originados por veículos sujeitos ao seguro obrigatório, quando o responsável seja desconhecido ou não beneficie de seguro válido ou eficaz.
II - O FGA não é mais que um garante, um responsável subsidiário. O principal obrigado é sempre o responsável civil pelo acidente de viação. O FGA só actua, satisfazendo a indemnização arbitrada, se o responsável civil, deixar de o fazer.
III – Nestes termos, o causador do acidente (culpado) pode vir a ser condenado a título de responsável solidário impróprio com o FGA (repare-se, este não é responsável por todas as indemnizações caudadas pelo acidente de viação – artigo 23º e 24º do citado DL), quando não está perante a hipótese do artigo 45º do citado diploma legal. Pelo que, a intervenção do responsável do acidente de viação tanto pode ser acessória como principal, consoante as circunstâncias em causa.
IV - No caso, como o pedido do Autor é no valor de MOP$369,828.00, nos termos do artigo 45º do DL citado, a acção só pode ser intentada contra o FGA, o que significa que a intervenção dos responsáveis do acidente, uma vez chamados, só pode ser acessória.


O Relator,

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Fong Man Chong










Processo nº 642/2022
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 10 de Novembro de 2022

Recorrente : - Fundo de Garantia de Automóvel e Marítimo (汽車及航海保障基金)

Objecto do Recurso : - Despacho que admitiu a intervenção na modalidade acessória (批准輔助參加之批示)

Autoras : - A (menor-Representada pela sua mãe B) (A(未成年人-由其母親B代表))
- B (B)

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   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    Fundo de Garantia de Automóvel e Marítimo (汽車及航海保障基金), Recorrente, devidamente identificada nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datado de 03/12/2021 (fls. 99 e 100), veio, em 08/03/2022, interpor recurso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 3 a 18, tendo formulado as seguintes conclusões:
     I. Vem o presente recurso interposto do despacho de fls. 118, unicamente na parte em que admitiu a intervenção, mas a título meramente acessório, do proprietário e do condutor do ciclomotor com a chapa de matrícula CM-XXXXX, indeferindo consequentemente a intervenção destes a título principal;
     II. O FGAM não se conforma com a decisão recorrida por esta fazer uma aplicação errónea do artigo 272.° do Código do Processo Civil, face ao n.º 2 do artigo 45.° do Decreto-Lei n.º 57/94/M, de 28 de Novembro (aplicável in casu ex vi do n.º 3 do mesmo artigo), conjugado com o disposto no n.º 3 e no n.º 1, ambos do artigo 25.° do mesmo diploma, quanto ao direito de intervenção e de sub-rogação ali estatuídos a favor do FGAM, e atento o disposto nos artigos 586.º e 517.°, ambos do Código Civil;
     III. O acidente de viação sub judice ocorreu no dia 1 de Novembro de 2017, envolvendo o ciclomotor com a chapa de matrícula CM-XXXXX, que era então conduzido pelo C;
     IV. A propriedade do referido veículo encontrava-se naquela data registada a favor de D, o qual não beneficiava de seguro válido ou eficaz;
     V. A questão fundamental que se traz a este Tribunal é a de saber se, face ao direito substantivo de sub-rogação legal conferido ao FGAM e consagrado no n.º 1 do artigo 25.° do regime do seguro obrigatório, e à faculdade prevista no n.º 3 do mesmo artigo, deverão o proprietário-sujeito da obrigação de segurar e o condutor intervir na causa a título principal ou acessório;
     VI. O FGAM é apenas um garante, um responsável "subsidiário", já que o principal obrigado é sempre o responsável civil. E só se este se furtar ao cumprimento do seu dever é que o FGAM entra em acção, satisfazendo a indemnização arbitrada;
     VII. "O FGAM garante a obrigação do responsável, verificados os pressupostos legais que o obrigam à garantia. O Fundo responde se, e na medida da obrigação do responsável civil pela obrigação de indemnizar";
     VIII. A socialização da responsabilidade e garantia de pagamento concedida pelo legislador às vítimas de acidentes de viação não se fez sem contrapartidas: à solidariedade subsidiária efectivada pelo FGAM, o legislador contrapõs o direito de o FGAM garante ficar sub-rogado nos direitos do lesado, ope legis, uma vez paga a respectiva indemnização;
     IX. Do regime do seguro obrigatório resulta a co-existência, no ordenamento jurídico da RAEM e em matéria de seguro obrigatório automóvel, de dois institutos de contornos limítrofes, mas não inteiramente coincidentes: por um lado o da sub-rogação e, por outro, o do direito de regresso;
     X. Ao FGAM é conferido o direito de sub-rogação nos direitos do lesado, ope legis, uma vez paga a respectiva indemnização - cfr. n.º 1 do artigo 25.º do regime do seguro obrigatório;
     XI. Às pessoas que, estando sujeitas à obrigação de segurar, não tenham efectuado seguro, é concedido o benefício do direito de regresso contra outros responsáveis pelo acidente, relativamente às quantias que tiverem pago - cfr. n.º 4 do artigo 25.º do regime do seguro obrigatório;
     XII. Às companhias seguradoras, é consagrado o direito de regresso quando se verifique qualquer uma das situações previstas no artigo 16.º do regime do seguro obrigatório;
     XIII. O direito de sub-rogação e o direito de regresso não são a mesma coisa;
     XIV. Para que o FGAM fique sub-rogado ope legis na posição do lesado, necessário é: (1) que os responsáveis civis (condutor e/ou proprietário-sujeito da obrigação de segurar) tenham sido condenados solidariamente com o FGAM; e (2) este pague a indemnização à vítima;
     XV. Se os responsáveis civis (condutor e/ou proprietário-sujeito da obrigação de segurar) não forem condenados solidariamente com o FGAM, nunca este poderá ficar sub-rogado: nem ope legis, nem por outra via, pois o lesado não terá neste caso qualquer direito de acção contra aqueles, mas apenas contra o FGAM;
     XVI. Se os responsáveis civis (condutor e/ou proprietário-sujeito da obrigação de segurar) não forem condenados solidariamente com o FGAM, este nunca terá um direito de sub-rogação, mas apenas um direito de regresso;
     XVII. O direito legalmente conferido ao FGAM pelo n.º 1 do artigo 25.° do Decreto-Lei n.º 57/94/M, de 28 de Novembro, é um direito de sub-rogação e, não, um direito de regresso;
     XVIII. O n.º 3 do artigo 25.° do regime do seguro obrigatório, pelo qual é conferido ao FGAM a faculdade de fazer intervir no processo o obrigado ao seguro e os co-responsáveis pelo acidente, é uma norma de direito substantivo;
     XIX. O artigo 45.° do regime do seguro obrigatório contém normas de natureza processual, as quais devem subalternizar-se às normas de natureza substantiva que o legislador estabeleceu quanto à possibilidade de intervenção de terceiros, nomeadamente as previstas no artigo 25.°;
     XX. O artigo 272.° do CPC aplica-se apenas aos casos em que "o réu tenha acção de regresso contra terceiro para ser indemnizado do prejuízo que lhe cause a perda da demanda (...) sempre que o terceiro careça de legitimidade para intervir como parte principal";
     XXI. Que o direito do FGAM é de sub-rogação, e não de regresso, decorre claramente da letra da lei. E que os chamados têm legitimidade para intervir como parte principal também é indiscutível, seja porque a lei substantiva lhes comete uma obrigação própria, cujo direito devem aqui fazer valer, seja porque o regime do seguro obrigatório e a processual lhes confere essa legitimidade;
     XXII. Sendo o direito de reembolso do FGAM configurado pela lei como de sub-rogação ope legis, impõe-se que os chamados intervenham a título principal, para "faz[er] valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu", como determina o artigo 263.° do CPC.
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    As Autoras, A (A) e B (B), veio, 25/04/2022, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 23 a 26, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. De acordo com o artigo 3.° das Alegações de Recurso, a que se responde, o Réu FGAM sob o título de “Génese e Obrigação do FGAM" esclarece:
     “3. A questão fundamental que ora se traz a este Tribunal é, portanto, a de saber se, face ao direito substantivo de sub-rogação legal conferido ao FGAM e consagrado no n.º 1 do artigo 25.° do regime do seguro obrigatório, e à faculdade prevista no n.º 3 do mesmo artigo, deverão ao proprietário-sujeito da obrigação de segurar e o condutor (quando são conhecidos e não beneficiam de seguro válido ou eficaz) intervir na causa a título principal ou acessório."
     2. As Autoras atento o direito que lhes assiste de serem indemnizadas nos autos principais e dessa obrigação recair sobre o Réu FGAM, respeitam a questão jurídica apresentada pelo Réu, que no fundo não mais pretende senão garantir o direito de regresso do FGAM relativamente ao proprietário do ciclomotor de matrícula CM-XXXXX, o qual na altura, que se deu o acidente de viacção, era conduzido por C, sem que o ciclomotor beneficiasse de seguro obrigatório válido e eficaz.
     3. Tal questão jurídica corresponde a um interesse legítimo do Réu, mas, se a intervenção do proprietário do ciclomotor e do condutor nos presentes autos é a título principal ou acessório, já não interfere no pedido formulado pelas Autoras.
     4. Contudo, atento o disposto no artigo 272.° do CPC: "1. O réu que tenha acção de regresso contra terceiro para ser indemnizado do prejuízo que lhe cause a perda da demanda pode chamá-lo a intervir como auxiliar da defesa, sempre que o terceiro careça de legitimidade para intervir como parte principal.”_sombreado nosso.
     5. Por outro lado, o artigo 262.° do CPC dispõe: "Estando pendente uma causa, pode nela intervir como parte principal: a) Aquele que, em relação ao objecto da causa, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu, nos termos dos artigo 60.º e 61.º;"_sombreado nosso.
     6. As Autoras entendem que C condenado nos autos de Processo Crime n.º CR2-18-0313-PCS, não tem um interesse igual ao do Réu FGAM, uma vez que já foi condenado naqueles autos!
     7. Mais se apurou que o proprietário do ciclomotor de matrícula CM-XXXXX, D, não beneficiava de seguro válido de acordo com o previsto no art. 23.° n.º 2 al. a) do Decreto-Lei n.º 57/94/M de 28 de Novembro de 1994: "
Fundo de Garantia Automóvel
Artigo 23.º
(Natureza e fins)
     1. O Fundo de Garantia Automóvel, adiante designado abreviadamente por FGA, é uma pessoa colectiva de direito público dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, instituída no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
     2. Ao FGA compete satisfazer as indemnizações por morte ou lesões corporais consequentes de acidentes originados por veículos sujeitos ao seguro obrigatório, quando:
     a) O responsável seja desconhecido ou não beneficie de seguro válido ou eficaz;"_sombreado nosso.
     8. Em face ao supra exposto dúvidas não se colocam sobre a responsabilidade pela satisfação da indemnização peticionada pelas Autoras ao Réu nos autos principais e também se conclui não existir um interesse igual ao do Réu FGAM por parte do proprietário do ciclomotor de matrícula CM-XXXXX, D.
     9. Como tal, as Autoras concordam com o despacho recorrido de fls. 129 dos autos principais.
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    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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  III – FACTOS ASSENTES:
1 - Em 07/07/2021 os ora Recorridos propuseram no TJB uma acção cível contra o FGA;
2 - Em 23/09/2021 o FGA apresentou contestação em que foi feita a intervenção principal provocada (chamamento à demanda e intervenção provocada do proprietário do ciclomotor e do respectivo condutor;
3 - Por despacho datado de 03/12/2021 foi deferido o pedido, tendo fixado que a intervenção os sujeitos no parágrafo é uma intervenção acessória;
4 - O FGA discorda desta decisão, veio interpor o presente recurso jurisdicional para este TSI.

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IV – FUNDAMENTAÇÃO
    É o seguinte despacho que constitui o objecto deste recurso, proferido pelo Tribunal de primeira instância:
    “(…)
     *
     Da intervenção principal provocada
     Por ser legal, vai admitido o requerimento do chamamento do proprietário do ciclomotor CM-XXXXX e condutor C, para intervirem no processo, mas a sua intervenção é da modalidade de intervenção acessória ao abrigo do art.º 272º, n.º 1 do CPC, para o efeito, diligencie junto da DSAT, para vir informar aos autos a identidade e morada do proprietário do ciclomotor em causa.
     Cite C nos termos do preceituado no art.º 274º do CPC.
     *
     (…)”.
     Notifique e D.N.
     
*
    Quid Juris?

    Antes de mais, importa reter os dados pertinentes sobre a questão em discussão: o ocorreu um acidente de viação em 1/11/2017, envolvendo o ciclomotor com a chapa de matrícula CM-XXXXX, que era então conduzido pelo C (C), a propriedade do referido veículo encontrava-se naquela data registada a favor de D (D), o qual não beneficiava de seguro válido ou eficaz.
    A questão fundamental consiste em saber se, face ao direito substantivo de sub-rogação legal conferido ao FGAM e consagrado no n.º 1 do artigo 25.° do regime do seguro obrigatório, e à faculdade prevista no n.º 3 do mesmo artigo, deverão o proprietário-sujeito da obrigação de segurar e o condutor intervir na causa a título principal ou acessório?
    O Recorrente/FGAM advoga que ele é apenas um garante, um responsável "subsidiário", já que o principal obrigado é sempre o responsável civil. E só se este se furtar ao cumprimento do seu dever é que o FGAM entra em acção, satisfazendo a indemnização arbitrada, e como tal continua a ser responsáveis os culpados do acidente.
    Ora, nesta matéria, o artigo 25º do DL nº 57/94/M, de 28 de Novembro, manda:
(Sub-rogação e demanda judicial)
    1. Satisfeita a indemnização, o FGA fica sub-rogado nos direitos do lesado, tendo ainda direito aos juros de mora legal e ao reembolso das despesas que houver feito com a liquidação e cobrança.
    2. No caso de falência da seguradora, o FGA fica sub-rogado apenas contra aquela.
    3. O lesado pode demandar directamente o FGA, o qual tem a faculdade de fazer intervir no processo o obrigado ao seguro e os co-responsáveis.
    4. As pessoas que, estando sujeitas à obrigação de segurar, não tenham efectuado seguro podem ser demandadas pelo FGA, nos termos do n.º 1, beneficiando do direito de regresso contra outros responsáveis pelo acidente, se os houver, relativamente às quantias que tiverem pago.
    E, quando há lugar a intervenção do Fundo?
    O artigo 23º do citado DL estipula:
(Natureza e fins)
    1. O Fundo de Garantia Automóvel, adiante designado abreviadamente por FGA, é uma pessoa colectiva de direito público dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, instituída no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
    2. Ao FGA compete satisfazer as indemnizações por morte ou lesões corporais consequentes de acidentes originados por veículos sujeitos ao seguro obrigatório, quando:
    a) O responsável seja desconhecido ou não beneficie de seguro válido ou eficaz;
    b) For declarada a falência da seguradora.
    3. Em todos os actos e contratos relativos aos seus direitos e obrigações, o FGA está sujeito à jurisdição do direito privado.
    4. O limite, por acidente, das indemnizações a satisfazer pelo FGA é determinado pelas quantias fixadas na tabela constante do Anexo I ao presente diploma.
   
    Ora, nestes termos, sem dúvida o FGA é chamado porque o ciclomotor acidentado não beneficiou do seguro obrigatório e também foi conduzido por pessoa não habilitada para este efeito, o que leva que a acção foi proposta contra o FGA.
    Por outro lado, quando o legislador criou o artigo 25º tem na sua mente obviamente a garantia da reparação de danos mediante indemnizações pagas pelo Fundo, que é uma entidade pública.
    Neste tipo de acção, em que intervieram o causador do acidente e também o FGA, é acessória ou principal a intervenção daquele não gera consenso ao nível de jurisprudência de Portugal citada aqui em nome do Direito Comparado, pois defende-se:
    I - O Fundo de Garantia Automóvel (FGA) não é mais que um garante, um responsável subsidiário.
    II - O principal obrigado é sempre o responsável civil pelo acidente de viação.
    III - O FGA só actua, satisfazendo a indemnização arbitrada, se o responsável civil, deixar de o fazer.
    IV - Exigindo a lei do seguro obrigatório, litisconsórcio necessário passivo: - FGA / responsável civil - a condenação solidária de ambos é imperativa.
(Base de Dados www.dgsi.pt/jtrp.nsf/Proc.0250497) (ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO DE 7/04/2003)

    Diferentemente, advoga-se em sentido diverso:
    I - O F.G.A. surge como mero garante do pagamento das indemnizações devidas a terceiros lesados em consequência de um acidente de viação, ficando sempre com a faculdade de reaver dos responsáveis principais as quantias que houver despendido e nessa medida fica legalmente subrogado nos direitos do lesado.
    II - Como corolário lógico impõe-se o litisconsórcio necessário passivo entre o FGA e o responsável civil, quando este seja conhecido e não beneficie de seguro válido ou eficaz, visando-se facilitar e tornar célere a aplicação do direito, com a condenação solidária dos demandados.
    III - Trata-se, no entanto, de uma solidariedade imprópria, visto que no plano exterior o lesado pode exigir a qualquer dos responsáveis a satisfação do seu crédito, embora nas relações internas só o FGA fique rogado nos direitos do lesado, dada a sua posição de garante.
(Base de Dados www.dgsi.pt/jtrc.nsf/Proc.3013/04) (ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DE COIMBRA DE 11/01/2005)
    E, por outro lado, o artigo 272º do CPC estipula:
(Âmbito)
1. O réu que tenha acção de regresso contra terceiro para ser indemnizado do prejuízo que lhe cause a perda da demanda pode chamá-lo a intervir como auxiliar na defesa, sempre que o terceiro careça de legitimidade para intervir como parte principal.
2. A intervenção do chamado circunscreve-se à discussão das questões que tenham repercussão na acção de regresso invocada como fundamento do chamamento.
   
    Nestes termos, bem lida a norma do nº 1 do artigo citado, conjugado com o DL acima citado, não é obrigatório ao Autor propor acção contra o FGA, pode intentar acção directamente contra (e apenas) o causador do acidente de viação, salvo se a lei dispor em sentido diferente.
    Ora, o artigo 45º do citado DL estipula:
(Normas processuais)
    1. Em todas as acções destinadas à efectivação da responsabilidade civil por acidente de viação abrangido pelo seguro obrigatório, quer sejam exercidas em processo cível, quer o sejam em processo penal, é obrigatória a intervenção da seguradora ou seguradoras dos demandados, sob pena de ilegitimidade.
    2. Se o pedido formulado se contiver dentro dos limites estabelecidos no n.º 1 do artigo 6.º, a acção, em processo cível, tem de ser obrigatoriamente exercida apenas contra a seguradora que, se o entender, pode fazer intervir nela o seu segurado.
    3. O disposto nos números anteriores é aplicável ao Fundo de Garantia Automóvel, em substituição da seguradora ou seguradoras, sempre que aquele intervier ao abrigo do presente diploma.
    4. Nas acções referidas no n.º 1, que sejam exercidas em processo cível, é permitida a reconvenção.
    5. O prazo fixado no Código da Estrada, para efeitos de pedido de indemnização, em processo penal, inicia-se com a notificação feita aos lesados para, querendo, deduzir aquele pedido.
    6. O Fundo de Garantia Automóvel está isento de preparos e custas judiciais nos processos em que for interessado.
    No caso dos autos, para a maior garantia de obter a satisfação das indemnizações, o Autor propôs acção contra o FGA e este acionou o respectivo chamamento.
    Nesta óptica, nos termos do que a jurisprudência acima citada defende, e tem razão, o causador do acidente (culpado) pode vir a ser condenado a título de responsável solidário impróprio com o FGA (repare-se, este não é responsável por todas as indemnizações caudadas pelo acidente de viação – artigo 23º e 24º do citado DL), quando não está perante a hipótese do artigo 45º do citado diploma legal.
    Pelo que, a intervenção do responsável do acidente de viação tanto pode ser acessória como principal, consoante as circunstâncias em causa.
    No caso, como o pedido do Autor é no valor de MOP$369,828.00, nos termos do artigo 45º do DL citado, a acção só pode ser intentada contra o FGA, o que significa que a intervenção dos responsáveis do acidente, uma vez chamados, só pode ser acessória.
    Pelo que, não obstante por argumento diverso, há-de ser mantido o despacho recorrido, julgando-se improcedente o recurso interposto pelo FGA.
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    Síntese conclusiva:
    I - Ao abrigo do disposto no artigo 23º do DL nº 57/94/M, de 28 de Novembro, ao Fundo de Garantia Automóvel (FGA) compete satisfazer as indemnizações por morte ou lesões corporais consequentes de acidentes originados por veículos sujeitos ao seguro obrigatório, quando o responsável seja desconhecido ou não beneficie de seguro válido ou eficaz.
    II - O FGA não é mais que um garante, um responsável subsidiário. O principal obrigado é sempre o responsável civil pelo acidente de viação. O FGA só actua, satisfazendo a indemnização arbitrada, se o responsável civil, deixar de o fazer.
    III – Nestes termos, o causador do acidente (culpado) pode vir a ser condenado a título de responsável solidário impróprio com o FGA (repare-se, este não é responsável por todas as indemnizações caudadas pelo acidente de viação – artigo 23º e 24º do citado DL), quando não está perante a hipótese do artigo 45º do citado diploma legal. Pelo que, a intervenção do responsável do acidente de viação tanto pode ser acessória como principal, consoante as circunstâncias em causa.
    IV - No caso, como o pedido do Autor é no valor de MOP$369,828.00, nos termos do artigo 45º do DL citado, a acção só pode ser intentada contra o FGA, o que significa que a intervenção dos responsáveis do acidente, uma vez chamados, só pode ser acessória.
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    Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao presente recurso, mantendo-se o despacho recorrido.
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    Custas pelo Recorrente, sem prejuízo da isenção subjectiva (artigo 45º do DL citado).
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    Registe e Notifique.
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RAEM, 10 de Novembro de 2022.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
Tong Hio Fong




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