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Processo n.º 1148/2020
(Autos de recurso cível)

Data: 1/Dezembro/2022

Recorrente:
- A, Limitada (credor reclamante)

Recorridos:
- B(exequente), C e D (credores reclamantes)

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
Inconformado com a sentença de graduação de créditos na parte respeitante à fracção autónoma designada por “L4”, que graduou o crédito do credor reclamante A, Limitada (doravante designado por “banco recorrente”, em terceiro lugar, recorreu o mesmo jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
     “A) Conforme resulta dos Factos Assentes, em 23 de Maio de 2014, efectuou-se o registo provisório de constituição de hipoteca voluntária, nos termos do artigo 10º, n.º 6 da Lei n.º 7/2013.
     B) Os contratos–promessa de transmissão e oneração de edifícios em construção a que se refere a Lei n.º 7/2013 não necessitam da atribuição pelas partes de eficácia real, efectuando-se o registo emergente do contrato-promessa como provisório por natureza nos termos gerais, isto é ao abrigo do artigo 86º, n.º 1, alínea f) e g) do Código do Registo Predial.
     C) Não era preciso a Lei n.º 7/2013 fazer reportar a anterioridade da hipoteca definitiva à data da realização do registo provisório da hipoteca, porque tal já se encontra estabelecido no artigo 6º, n.º 3 do Código do Registo Predial.
     D) Os registos provisórios de aquisição prevalecem sobre sobre qualquer registo posterior com eles incompatíveis, porquanto os seus efeitos adquiridos, com a celebração do contrato definitivo, retroagem à data do registo provisório.
     E) Esta reserva de lugar ou de prioridade assenta nos mais relevantes princípios do sistema de registo que desde há muito vigoram em Macau, em especial os da prioridade (artigo 6º), da oponobilidade dos factos inscritos a terceiros (artigo 5º), da fé pública do registo (artigo 7º) e do trato sucessivo (artigo 10º).
     F) No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça Português, de 20/01/2009, proferido no Processo n.º 08A3800, houve uma inflexão da posição defendida no Acórdão de 25/06/2002, citado na decisão do Tribunal Judicial de Base, referindo-se expressamente que “Os efeitos do registo (provisório de aquisição) estão condicionados à sua conversão em definitivo, sendo certo que os efeitos do registo definitivo retroagem à data do registo provisório”.
     G) O legislador sempre quis e continua a querer que, durante a vigência do registo provisório de aquisição o seu titular fique protegido, motivo pelo qual estabeleceu como princípio estruturante do sistema registral o da prioridade.
     H) Assim, não pode prevalecer sobre o registo provisório de hipoteca, a penhora ou arresto de prédio efectuados pelo credor do promitente-adquirente e registados em data posterior à daquele registo.
     I) O Banco Recorrente ao financiar a aquisição da fracção em causa, confiou na retroacção do efeito do contrato definitivo à data do registo provisório, pois se assim não fosse o mesmo seria completamente inútil, e por-se-ia em causa o regular funcionamento do comércio imobiliáio assente no crédito hipotecário.
     J) Nas disposições transitórias da Lei n.º 7/2013, estipulou-se no n.º 1 do artigo 26º, a validade dos negócios jurídicos de promessa de oneração sobre parte do edifício em construção celebrados em data anterior à entrada em vigor do novo regime – como sucedeu in casu.
     K) O contrato-promessa em discussão nos autos é válido porquanto foi celebrado mediante documento escrito e foi assinado pelas partes que se vincularam, nos termos do artigo 404º, n.º 2 do Código Civil.
     L) A falta de reconhecimento das assinaturas, formalidade que se entende não ser necessária face à forma como o artigo 26º, n.º 1 está formulado, e cuja necessidade não se admite mas apenas se equaciona por mera cautela de patrocínio, constitui apenas nulidade mista ou atípica, não podendo ser arguida por terceiros, nem oficiosamente conhecida pelo tribunal.
     M) Daqui decorre aliás que o registo provisório de aquisição e de oneração lavrado com base em tais contratos-promessa não pode ser objecto de recusa nem importa a provisoriedade por dúvidas.
     N) Tudo visto, violou a douta sentença o disposto nos artigos 5º, 6º, n.º 3 e 86º, n.º 1 alínea g) do Código do Registo Predial, os artigos 10º e 26º da Lei n.º 7/2003 bem como o princípio da segurança do comércio jurídico imobiliário, que o registo predial tem como função prioritária garantir.
     Termos, em que deve a decisão recorrida ser revogada, graduando-se o crédito do Recorrente, relativamente à fracção designada por “L4”, em primeiro lugar, assim se fazendo JUSTIÇA!”
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Devidamente notificada, respondeu a credora reclamante C ao recurso, pugnando pela negação de provimento ao recurso.
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Corridos os vistos, cumpre decidir.
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II) FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida deu como provada a seguinte factualidade:
Em 12 de Fevereiro de 2015, a reclamante C celebrou com o executado E o acordo junto a fls. 65 dos autos, através do qual a reclamante concedeu ao executado E um empréstimo no montante de HKD$10.000.000,00. (alínea A) dos factos assentes)
O prazo do empréstimo terminava em 11 de Outubro de 2015, data em que o executado E teria de reembolsar a quantia mutuada à credora reclamante. (alínea B) dos factos assentes)
Mais foi convencionado que, durante o prazo do empréstimo, a quantia mutuada venceu juros no montante de HKD$800.000,00, a ser pagos à reclamante por 8 prestações mensais, cada uma no valor de HKD$100.000,00. (alínea C) dos factos assentes)
Dos juros acima convencionados resulta, portanto, que foi convencionada uma taxa de juros anual de 12%. (alínea D) dos factos assentes)
Com a assinatura do referido contrato, a quantia mutuada foi imediatamente entregue pela credora reclamante ao executado. (alínea E) dos factos assentes)
Até à presente data, o executado não efectuou qualquer pagamento no sentido de amortizar as dívidas de capital ou o pagamento dos juros, apesar de ter sido diversas vezes interpelado para o efeito. (alínea F) dos factos assentes)
Em 27 de Setembro de 2016, a reclamante apresentou execução contra o executado E, processo esse que se encontra pendente no 1º Juízo Cível, sob o n.º CV1-16-0186-CEO. (alínea G) dos factos assentes)
No âmbito dos referidos autos, entre outros, encontra-se registada penhora a favor da credora reclamante, sobre as seguintes fracções autónomas: (alínea H) dos factos assentes)
1. Fracção autónoma designada por “DR/C”, do rés-do-chão D, composta por rés-do-chão e sobreloja, para comércio, do prédio sito em Macau, com os n.ºs 5 a 47 da Alameda da Tranquilidade, 350 a 392 da Avenida da Longevidade, 261 a 279 da Rua da Tribuna, e 216 a 276 da Avenida do Hipódromo, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 21985 (cfr. inscrição n.º 38658F, de 16/03/2017);
2. Fracção autónoma designada por “G20”, do 20º andar “G”, para habitação, do prédio sito em Macau, na Avenida do Nordeste, n.ºs 601 a 683, Rua Central da Areia Preta, n.ºs 702 a 742, Edifício La Baie du Noble, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.o 22379-III (cfr. inscrição n.º 38658F, de 16/03/2017);
3. Fracção autónoma designada por “L4”, do 4º andar “L”, para habitação, do prédio sito na Taipa, Rampa da Taipa Grande, n.ºs 135 a 275, Bloco III, Edifício Prime Royalton, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.o 19819-III (cfr. inscrição n.º 38790F, de 03/04/2017).
No passado dia 23/6/2015 o executado E mediante o consentimento da sua mulher F, pediu o empréstimo de HKD12,000,000.00 ao reclamante D. (alínea I) dos factos assentes)
Quantia do empréstimo que foi efectivamente entregue na mesma data. (alínea J) dos factos assentes)
Para o efeito, o executado e sua mulher assinaram e apuseram respectivamente, na “還款保證書 – garantia de pagamento”, que se encontra junta a fls. 341 dos autos, as suas assinaturas e impressões digitais. (alínea K) dos factos assentes)
Conforme consta na referida “還款保證書 – garantia de pagamento” e por acordo do reclamante e do executado e da sua mulher, fixaram que o empréstimo tem como prazo de 3 meses (ou seja, dia 23/6/2015 até 22/9/2015). (alínea L) dos factos assentes)
Acordaram ainda que em caso de mora, os Requeridos pagam as taxas de juros até o integral reembolso da dívida. (alínea M) dos factos assentes)
Chegado a data estipulado, dia 22/9/2015, o executado e sua mulher não pagaram as suas dívidas. (alínea N) dos factos assentes)
O reclamante interpelou ele próprio ou por interposta de amigos inúmeras vezes no domicílio do executado e sua mulher e/ou através de telefone e outros meios de contacto, com vista à satisfação do crédito do reclamante. (alínea O) dos factos assentes)
Na sequência de tais interpelações, o executado nos dias 1/4/2016 devolveu HK1.000.000,00, 9/5/2016 devolveu HK200.000,00, 27/5/2016 devolveu HK200.000,00 e em 21/12/2016 devolveu mais HK200.000,00. (alínea P) dos factos assentes)
Para além da supra citada HKl.600.000,00 nem os requeridos nem outrem em nome dos mesmos procedeu mais qualquer pagamento. (alínea Q) dos factos assentes)
Razão pela qual o reclamante intentou no passado dia 26/1/2018 a respectiva acção executiva CV3-18-0024-CEO contra o executado e sua mulher para obter o pagamento da quantia em dívida (capital e juros) que atingem MOP13.503.216,06. (alínea R) dos factos assentes)
Foi decretado no apenso CV3-18-0024-CEO-A o arresto sobre: (alínea S) dos factos assentes)
1. A fracção autónoma, designada por “G20” do 20º andar “G”, para habitação, do prédio sito em Macau, nos 601 a 683 da Avenida do Nordeste e nºs 702 a 742 da Rua Central da Areia Preta, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 22379-III do Livro B, inscrito na matriz predial urbana sob o nº 073597 (cfr. inscrição n.º 41572F, de 15/03/2018);
2. A fracção autónoma, designada por “L4” do 4º andar “L”, para habitação do prédio sito em Macau, nos 135 a 275 da Rampa da Taipa Grande, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 19819-III do Livro B, inscrito na matriz predial urbana sob o nº 040929 (cfr. inscrição n.º 41588F, de 15/03/2018).
Em 27 de Junho de 2018 foi registada na Conservatória do Registo Predial a conversão do arresto das fracções autónomas “G20” e “L4” em penhora, no âmbito do processo n.º CV3-18-0024-CEO-A. (alínea T) dos factos assentes)
No decurso dos autos CV3-18-0024-CEO, no passado dia 20/9/2018 foi determinada ainda a penhora da fracção autónoma, para comércio, designada por “DR/C”, do rés-do-chão “D”, composta por R/C e coquechai, do prédio urbano com os n.ºs 5 a 47 da Alameda da Tranquilidade, 350 a 392 da Avenida da Longevidade, 261 a 279 da Rua da Tribuna, e 216 a 276 da Avenida do Hipódromo, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º 21985, a folhas 195 do Livro B113, registada em nome do executado E. (alínea U) dos factos assentes)
A penhora da fracção autónoma “DR/C” acima referida foi registada na Conservatória do Registo Predial em 24 de Setembro de 2018 (cfr. inscrição n.º 42161F, de 24/09/2018). (alínea V) dos factos assentes)
Por escritura de 3 de Dezembro de 2009, lavrada de fls. 29 a 32 verso do livro de notas para escrituras diversas n.º 191 da Notária Privada Manuela António, o Executado e sua mulher F constituíram a favor do reclamante A, Limitada hipoteca voluntária sobre a fracção autónoma “G20”, do 20º andar “G”, Subcondomínio III, para habitação, do prédio sito em Macau, com os n.ºs 601 a 683 da Avenida do Nordeste e n.ºs 702 a 742 da Rua Central da Areia Preta, inscrito na matriz sob o artigo n.º 73597, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º 22379-III, do Livro B, com a constituição da propriedade horizontal inscrita sob o n.º 31032 do Livro F. (alínea W) dos factos assentes)
A hipoteca sobre a fracção autónoma “G20”, ficou registada sob o n.º 101533 do Livro C, em 17 de Dezembro de 2009. (alínea X) dos factos assentes)
Nos termos da cláusula segunda da escritura pública, a hipoteca destina-se a caucionar e garantir o pagamento de todas e quaisquer facilidades bancárias concedidas ou a conceder ao executado e sua mulher F, em virtude de quaisquer operações bancárias, qualquer que seja a sua origem, natureza, fundamento, moeda, divisa ou título, designadamente como sacadores, aceitantes, subscritores ou avalistas de letras, livranças, aceites, fianças, ou como devedores de saldos correntes, empréstimos, créditos documentários, abonos, adiantamentos, saques a descoberto ou outras dívidas contraídas ou a contrair, até ao limite em capital de HKD$5.000.000,00, equivalente para efeitos fiscais a MOP$5.145.000,00. (alínea Y) dos factos assentes)
Nos termos da referida escritura, o crédito vence juros, à taxa flutuante, os quais, para efeitos de registo se fixaram em 2.4% ao ano, acrescidos de 3% em caso de mora. (alínea Z) dos factos assentes)
Os juros, incluindo os de mora, são sujeitos a capitalização. (alínea AA) dos factos assentes)
A hipoteca garante ainda todas as despesas despendidas pelo reclamante para conseguir ou assegurar o reembolso, incluindo os honorários de advogado, as quais somente para efeitos de registo se fixaram em MOP$500.000,00. (alínea BB) dos factos assentes)
O reclamante foi autorizado a pagar os prémios da apólice de seguro contra risco de incêndio sobre a fracção hipotecada, acrescentando-se ao crédito concedido as importâncias que tiverem sido pagas, as quais vencerão igualmente os juros convencionados. (alínea CC) dos factos assentes)
A concessão foi feita pelo prazo de um ano, renovável por igual período e nas mesmas condições mas o reclamante pode exigir o vencimento antecipado nos casos previstos na cláusula 9ª, nomeadamente penhora, arresto ou outra forma de apreensão judicial ou administrativa do objecto da hipoteca. (alínea DD) dos factos assentes)
Ficou expressamente convencionado na citada escritura que todos e quaisquer documentos, sejam de que natureza fossem, que se encontrassem em conexão com esta, designadamente extractos bancários, escritos particulares, títulos de crédito, avisos de débito e outros, ficariam a fazer parte integrante da mesma para efeitos de exequibilidade. (alínea EE) dos factos assentes)
Encontra-se no âmbito da garantia real constituída os contratos de mútuo celebrados em 3 de Dezembro de 2009 e 28 de Janeiro de 2014. (alínea FF) dos factos assentes)
Pelo contrato de mútuo de 03 de Dezembro de 2009, o reclamante acordou em conceder facilidades até ao limite de HKD$5.000.000,00. (alínea GG) dos factos assentes)
O contrato supra referido foi celebrado pelo prazo de dezoito anos e de acordo com as condições estipuladas no escrito particular subscrito pelo executado e sua mulher F, na qualidade de mutuários, e aceite pelo reclamante. (alínea HH) dos factos assentes)
De acordo com o mencionado escrito particular, sobre a importância concedida a título de empréstimo vencem-se juros a uma taxa anual correspondente a 2.85% abaixo da taxa preferencial (prime rate) do reclamante, que pode flutuar, acrescida de 3% em caso de mora. (alínea II) dos factos assentes)
Ficou também convencionado que as despesas resultantes do incumprimento – incluindo honorários de advogado – seriam suportadas pelo executado e sua mulher F. (alínea JJ) dos factos assentes)
O contrato de mútuo de 28 de Janeiro de 2014 foi celebrado inicialmente por um período de cinco anos, isto é até 28-01-2019. (alínea KK) dos factos assentes)
Em 11 de Fevereiro de 2016, as partes acordaram na alteração da cláusula 2ª do contrato de mútuo original, extendendo o prazo do contrato por mais de dez anos, isto é até 28-01-2029. (alínea LL) dos factos assentes)
Pelo contrato de mútuo supra referido, datado de 28 de Janeiro de 2014, o reclamante acordou em conceder facilidades bancárias até ao limite de HKD1.000.000,00, nas condições estipuladas no escrito particular subscrito pelo executado e sua mulher F, na qualidade de mutuários, e aceite pelo reclamante. (alínea MM) dos factos assentes)
De acordo com o mencionado escrito particular, sobre a importância concedida a título de empréstimo vencem-se juros a uma taxa anual correspondente a 2.25% abaixo da taxa preferencial (prime rate) do reclamante, que pode flutuar, acrescida de 3% em caso de mora. (alínea NN) dos factos assentes)
Ficou também convencionado que as despesas resultantes do incumprimento – incluindo honorários de advogado – seriam suportadas pelo executado e sua mulher F. (alínea OO) dos factos assentes)
Por escrito particular de 30 de Outubro de 2012, o executado E e sua mulher F prometeram hipotecar a favor do banco a fracção autónoma designada por “L4” do 4º andar “L”, do prédio sito na Taipa, na Estrada Governador Nobre de Carvalho, One Grantai, Bloco III, Prime Royalton, então descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º 19819, construído em terreno concedido por arrendamento. (alínea PP) dos factos assentes)
A promessa de hipoteca destinava-se a caucionar e garantir todas e quaisquer responsabilidades contraídas ou a contrair pelo executado e sua esposa F, junto do banco, até ao limite em capital de MOP$7.965.438,99. (alínea QQ) dos factos assentes)
A hipoteca a favor do banco reclamante, foi registada em 23 de Maio de 2014, com base no supra referido contrato-promessa, mediante inscrição provisória por natureza, nos termos do art. 10º n.º 6º da Lei 7/2013. (cfr. inscrição n.º 171617C). (alínea RR) dos factos assentes)
Na sequência do contrato referido na al. PP), o banco concedeu ao executado e sua esposa um mútuo, pelo prazo de vinte e cinco anos, nas condições estipuladas num escrito particular, subscrito por aqueles, na qualidade de mutuários, e aceite pelo reclamante. (alínea SS) dos factos assentes)
De acordo com o mencionado escrito particular, sobre a importância concedida a título de empréstimo vencem-se juros a uma taxa anual correspondente a 2.925% abaixo da taxa preferencial (prime rate) do banco, sujeita a flutuação, acrescida de 3% em caso de mora. (alínea TT) dos factos assentes)
Ficou também convencionado que as despesas resultantes do incumprimento – incluindo honorários de advogado – seriam suportadas pelo executado e pela sua esposa F. (alínea UU) dos factos assentes)
Após a conversão em definitiva quanto à inscrição da propriedade horizontal do prédio referido na al. PP), por escritura de 16 de Junho de 2017, lavrada a fls. 83 e seguintes do livro nº 104 do Notário Privado António Manuel Teixeira Pinto, o executado e a sua mulher F, constituíram a favor do reclamante hipoteca voluntária, sobre a fracção designada por “L4” do 4 º andar “L”, para habitação, inscrita a favor do executado e da sua esposa F sob o n.º 279838G, do prédio com os números 135 e 275 da Rampa da Taipa Grande, Taipa, Macau, inscrito na matriz predial sob o artigo 40929, descrito Conservatória do Registo Predial de Macau sob o número 19819-III do Livro B, com a constituição da propriedade horizontal inscrita sob o número 32980 do Livro F, construído em terreno concedido por arrendamento. (alínea VV) dos factos assentes)
A hipoteca foi constituída e destina-se a caucionar e garantir o pagamento de todas e quaisquer facilidades bancárias concedidas ou a conceder ao executado e sua esposa, designadamente os seguintes dois mútuos: (alínea WW) dos factos assentes)
1. o mútuo concedido em 30 de Outubro de 2012, em estrito cumprimento do contrato-promessa de hipoteca celebrado na mesma data; e
2. um mútuo que viria a ser concedido pelo reclamante ao executado e à sua esposa, em 24 de Julho de 2017,
até ao limite da importância em capital de MOP$7.965.438,99.
Nos termos da referida escritura, o crédito vence juros, à taxa flutuante, os quais, para efeitos de registo se fixaram em 2.325% ao ano, acrescidos de 3% em caso de mora. (alínea XX) dos factos assentes)
Os juros, incluindo os de mora, são sujeitos a capitalização. (alínea YY) dos factos assentes)
A hipoteca garante ainda todas as despesas despendidas pelo reclamante para conseguir ou assegurar o reembolso, incluindo os honorários de advogado, as quais somente para efeitos de registo se fixaram em MOP$796.544,00. (alínea ZZ) dos factos assentes)
O reclamante foi autorizado a pagar os prémios da apólice de seguro contra risco de incêndio sobre a fracção hipotecada, acrescentando-se ao crédito concedido as importâncias que tiverem sido pagas, as quais vencerão igualmente os juros convencionados. (alínea AAA) dos factos assentes)
A concessão foi feita pelo prazo de um ano, renovável por igual período e nas mesmas condições mas o reclamante pode exigir o vencimento antecipado nos casos previstos na cláusula 9ª, nomeadamente penhora, arresto ou outra forma de apreensão judicial ou administrativa do objecto da hipoteca. (alínea BBB) dos factos assentes)
Ficou expressamente convencionado na citada escritura que todos e quaisquer documentos, sejam de que natureza fossem, que se encontrassem em conexão com esta, designadamente escritos particulares, títulos de crédito, avisos de débito e outros, ficariam a fazer parte integrante da mesma para efeitos de exequibilidade. (alínea CCC) dos factos assentes)
Na sequência da celebração da escrita mencionada, foi o registo de hipoteca convertido em definitivo 19 de Junho de 2017, mediante averbamento à inscrição n.º 171617C. (alínea DDD) dos factos assentes)
O reclamante viria a conceder um segundo mútuo ao executado e à sua esposa F, o qual se encontra abrangido pela hipoteca referida na al. VV). (alínea EEE) dos factos assentes)
Este segundo mútuo, no montante de MOP$320.000,00, foi concedido para pagamento de despesas incorridas com a escritura de hipoteca e com o condomínio da fracção hipotecada, bem como para pagamento dos honorários de advogado devidos pelo executado e sua esposa ao escritório “XXX”. (alínea FFF) dos factos assentes)
Este segundo mútuo foi celebrado pelo prazo de cinco anos, conforme escrito particular subscrito pelo executado e sua esposa F, na qualidade de mutuários, e aceite pelo reclamante. (alínea GGG) dos factos assentes)
De acordo com o mencionado escrito particular, sobre a importância concedida a título de empréstimo vencem-se juros a uma taxa anual correspondente a 2.925% abaixo da taxa preferencial (prime rate) do Banco, sujeita a flutuação, acrescida de 3% em caso de mora. (alínea HHH) dos factos assentes)
Em 14 de Dezembro de 2016 foi registado na Conservatória do Registo Predial o arresto da fracção autónoma “G20” acima referida, no âmbito dos autos de arresto n.º CV2-16-0223-CEO-A movidos pelo exequente B contra o executado E para assegurar a quantia de MOP$2.707.054,55. (cfr. inscrição n.o 37772F, de 14/12/2016). (alínea III) dos factos assentes)
Em 26 de Julho de 2017 foi registada na Conservatória do Registo Predial a conversão do arresto da fracção autónoma “G20” em penhora, no âmbito dos autos principais. (alínea JJJ) dos factos assentes)
Em 14 de Dezembro de 2016 foi registado na Conservatória do Registo Predial o arresto da fracção autónoma “L4” acima referida, no âmbito dos autos de arresto n.º CV2-16-0223-CEO-A movidos pelo exequente B contra o executado E para assegurar a quantia de MOP$2.707.054,55. (cfr. inscrição n.º 37797F, de 14/12/2016). (alínea KKK) dos factos assentes)
Em 27 de Novembro de 2017 foi registada na Conservatória do Registo Predial a conversão do arresto da fracção autónoma “L4” em penhora, no âmbito dos autos principais. (alínea LLL) dos factos assentes)
Em 14 de Dezembro de 2016 foi registado na Conservatória do Registo Predial o arresto da fracção autónoma “DR/C”, do rés-do-chão D, composta por rés-do-chão e sobreloja, para comércio, do prédio sito em Macau, com os n.os 5 a 47 da Alameda da Tranquilidade, 350 a 392 da Avenida da Longevidade, 261 a 279 da Rua da Tribuna, e 216 a 276 da Avenida do Hipódromo, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 21985, no âmbito dos autos de arresto n.º CV2-16-0223-CEO-A movidos pelo exequente B contra o executado E para assegurar a quantia de MOP$2.707.054,55. (cfr. inscrição n.º 37772F, de 14/12/2016). (alínea MMM) dos factos assentes)
Em 26 de Julho de 2017 foi registada na Conservatória do Registo Predial a conversão do arresto da fracção autónoma “DR/C” em penhora, no âmbito dos autos principais. (alínea NNN) dos factos assentes)
Em virtude do contrato de mútuo de 3 de Dezembro de 2009 referido na al. GG), foi creditada a quantia de HKD5.000.000,00 na conta bancaria do Executado e da sua mulher F no dia 3 de Dezembro de 2009. (resposta ao quesito 1º da base instrutória)
Em 24 de Outubro de 2017, a dívida garantida pela hipoteca referia na al. W), relativamente ao contrato celebrado em 3 de Dezembro de 2009, era de HKD$3.059.961,91, equivalente a MOP$3.151.760,77, sendo: (resposta ao quesito 2º da base instrutória)
1. HKD$3.055.541,84, equivalente a MOP$3.147.208,10, a título de capital; e
2. HKD$4.420,07, equivalente a MOP$4.552,67, a título de juros vencidos e não pagos.
Em virtude do contrato de mútuo de 28 de Janeiro de 2014 referido na al. MM), o reclamante creditou a quantia de HKD$825.092,20, na conta bancária do Executado e da sua mulher F no dia 8 de Janeiro. (resposta ao quesito 3º da base instrutória)
Em 24 de Outubro de 2017, a dívida garantida pela hipoteca referida na al. W), relativamente ao contrato celebrado em 28 de Janeiro de 2014, era de HKD$733.388,49, equivalente a MOP$755.390,14, sendo: (resposta ao quesito 4º da base instrutória)
1. HKD$732.425,30, equivalente a MOP$754.398,05, a título de capital; e
2. HKD$963,19, equivalente a MOP$992,09, a título de juros vencidos e não pagos.
Na sequência do acordo referido na al. PP), a totalidade do montante emprestado foi creditado na conta bancária do executado e da sua esposa F no dia 30 de Outubro de 2012. (resposta ao quesito 5º da base instrutória)
Na sequência do acordado referido na al. WW), a totalidade do montante emprestado foi creditado na conta bancaria do executado e da sua esposa F, no dia 24 de Julho de 2017. (resposta ao quesito 6º da base instrutória)
Em 31 de Janeiro de 2018, a dívida garantida pela hipoteca referida na al. VV), relativamente ao mútuo de 30 de Outubro de 2012, era de MOP$6.796.651,63, sendo: (resposta ao quesito 7º da base instrutória)
1. MOP$6.769.348,04, a título de capital; e
2. MOP$27.303,59, a título de juros vencidos e não pagos.
A dívida garantida pela hipoteca referida na al. VV), referente ao mútuo de 24 de Julho de 2017, era, em 31 de Janeiro de 2018, de MOP$301.148,40, sendo: (resposta ao quesito 8º da base instrutória)
1. MOP$299. 808,49, a título de capital; e
2. MOP$1.339,91, a título de juros vencidos e não pagos.
*
Pela primeira instância foi proferida a seguinte sentença, objecto do presente recurso (focando-se aqui na parte que seja relevante para a apreciação do recurso):
“Pelos presentes embargos, pretendem os credores reclamantes que lhes sejam reconhecidos os créditos por si reclamados a fim de serem pagos pelo produto de venda dos bens penhorados. Tendo os créditos reclamados por por C e D sido já reconhecidos, resta tão-só verificar os créditos reclamados por A, Limitada.
Alega este Reclamante que:
• por acordos firmados com o Executado e a sua cônjuge, concedeu a estes duas facilidades bancárias respectivamente até ao limite de e de HK$1.000.000,00, HK$5.000.000,00 e dois empréstimos respectivamente no valor de MOP$7.965.438,99 e de MOP$320.000,00 tendo as quantias de HK$5.000.000,00, HK$825.092,20, MOP$7.965.438,99 e MOP$320.000,00 sido creditadas na conta do Executado e da sua cônjuge;
• os respectivos acordos prevêem a obrigação de pagamento de juros e das despesas tidas pelo Reclamante no caso de incumprimento contratual por parte do Executado e da sua cônjuge;
• que, em 24 de Outubro de 2017, relativamente à quantia de HK$5.000.000,00 facultada no âmbito das facilidades bancárias acima referidas, o valor em dívida, nele incluindo juros vencidos, ascendia a HK$3.059.961,91 equivalente a MOP$3.151.760,77;
• que, em 24 de Outubro de 2017, da quantia de HK$825.092,20 mutuada, o valor em dívida, nele incluindo juros vencidos, ascendia a HK$733.388,49 equivalente a MOP$755.390,14;
• que, em 31 de Janeiro de 2018, da quantia de MOP$7.965.438,99 mutuada, o valor em dívida, nele incluindo juros vencidos, ascendia a MOP$6.796.651,63;
• que, em 31 de Janeiro de 2018, da quantia de MOP$320.000,00 mutuada, o valor em dívida, nele incluindo juros vencidos, ascendia a MOP$301.148,40.
Produzida a respectiva prova, tais factos foram dados como provados.
Além disso, está também provado que, para a garantia do reembolso das quantias em dívida, o Executado e a sua cônjuge constituíram hipoteca, a favor do Reclamante A, Limitada, sobre as fracções autónomas “G20” e “L4”, dois dos três imóveis arrestados e, posteriormente, penhorados nos autos de execução de que estes autos são apenso e que, segundo a escritura pública de constituição de hipoteca, este Reclamante pode exigir o vencimento antecipado no caso de penhora ou arresto do objecto da hipoteca.
Dos factos provados acima referidos, vê-se que o Reclamante A, Limitada é efectivamente credor das quantias por si reclamadas as quais se encontram vencidas em virtude do arresto e posterior da penhora das fracções autónomas “G20” e “L4”.
*
Reconhecidos os créditos reclamados nos presentes autos, há que proceder à graduação dos mesmos.
Dos factos assentes vê-se que:
(…)
• a fracção autónoma designada por “L4”, do 4º andar “L”, para habitação, do prédio sito na Taipa, Rampa da Taipa Grande, n.ºs 135 a 275, Bloco III, Edifício Prime Royalton, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 19819-III, foi objecto de:
• hipoteca registada em 19 de Junho de 2017 a favor do Reclamante A, Limitada para garantir o crédito por este reclamado a fls 70 a 76;
• arresto decretado no âmbito dos autos de execução de que os presentes autos são apenso para assegurar o pagamento da dívida exequenda, em 14 de Dezembro de 2016 e posteriormente convertido em penhora em 27 de Novembro de 2017;
• penhora decretada nos autos de execução nº CV1-16-0186-CEO intentada pela Reclamante C para garantir o crédito reclamado a fls 61 a 64, penhora esta registada em 3 de Abril de 2017; e
• arresto decretado no âmbito dos autos de execução nº CV3-18-0024-CEO intentada pelo Reclamante D para garantir o crédito reclamado a fls 156 a 161 e 295 a 297, arresto este registado em 15 de Março de 2018 e posteriormente convertido em penhora em 27 de Junho de 2018;
*
Nos termos do artigo 682.º, n.º 1, do CC, “A hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo.”
Por outro lado, o Exequente adquire pela penhora o direito de ser pago com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior tendo os bens sido previamente arrestados, a anterioridade reporta-se à data do arresto (artº 812.º do CC).
A isso acresce que o artigo 6.º, n.º 1, do Código do Registo Predial estipula que “O direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pelo número de ordem das apresentações correspondentes.”
(…)

No que concerne à fracção autónoma designada por “L4”, verifica-se que o arresto decretado a favor do Exequente e a penhora decretada a favor da Reclamante C foram registados, respectivamente, em 14 de Dezembro de 2016 e 3 de Abril de 2017, ou seja, antes do registo da hipoteca a favor do Reclamante A, Limitada que teve lugar tão-só em 19 de Junho de 2017.
Segundo as mesmas regras acima elencadas, os créditos devem ser graduados:
• Em primeiro lugar, o crédito exequendo;
• Em segundo lugar, o crédito reclamado por C a fls 61 a 64;
• Em terceiro lugar, o crédito reclamado por A, Limitada a fls 70 a 76;
• Em quarto lugar, o crédito reclamado por D a fls 156 a 161 e 295 a 297.
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Contudo, dos factos assentes resulta que antes do registo da hipoteca sobre a fracção autónoma “L4” a favor do Reclamante A, Limitada, o Executado e a sua cônjuge, por escrito particular, prometeram hipotecar a fracção autónoma a favor deste Reclamante, promessa esta registada em 23 de Maio de 2014, ou seja, antes do registo do arresto e da penhora decretados a favor do Exequente e da Reclamante C.
Perante isso, coloca-se a questão de saber se a hipoteca posteriormente feita passa a prevalecer sobre os créditos do Exequente e de C tendo em conta o disposto no artigo 6.º, n.º 3, do Código do Registo Predial.
Segundo essa norma “O registo convertido em definitivo tem a prioridade correspondente à sua realização como provisório.”
*
Ora, no caso dos autos, a promessa de hipoteca a favor do Reclamante A, Limitada consta do acordo junto aos autos a fls 77 a 78, outorgado pelo Reclamante, pelo Executado, pela cônjuge deste e pelo promitente-vendedor da fracção autónoma, e está registada na Conservatória do Registo Predial ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.º 6, da Lei nº 7/2013, que veio estabelecer o regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção.
No acordo junto a fls 77 a 78 confluem três negócios jurídicos, a saber:
• Uma promessa de compra e venda da fracção autónoma “L4” feita entre o Executado e a sua cônjuge e o promitente vendedor nele indicado;
• Um mútuo concedido pelo Reclamante ao Executado e à sua cônjuge para financiar a aquisição dessa fracção autónoma;
• Uma promessa de hipoteca da mesma fracção autónoma feita pelo Executado e pela sua cônjuge a favor do Reclamante para garantir o pagamento da quantia mutuada.
Tendo em conta os seus termos, não resta qualquer dúvida de que o acordo é objecto de regulamentação da Lei n.º Lei n.º 15/2001, de 3 de Setembro, que estabelece o regime das promessas de alienação e oneração hipotecária de imóveis.
Essa lei veio prever expressamente a possibilidade de atribuição de eficácia real às promessas feitas ao abrigo desse diploma exigindo, para o efeito, que:
• Os negócios jurídicos constem de documento particular assinado pelos outorgantes com assinaturas reconhecidas notarialmente - artigos 2.º, n.º 2, e 3.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2001, de 3 de Setembro e artigo 407.º, n.º 2, do CC;
• A atribuição de eficácia real seja feita mediante declaração expressa – artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 15/2001, de 3 de Setembro;
• As promessas sejam registadas – artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 15/2001, de 3 de Setembro, e artigo 1.º, n.º 1, f) do Código do Registo Predial.
Como se vê, o regime aí previsto não difere em muito o regime geral consagrado no Código Civil em que também é facultada a possibilidade de atribuição de eficácia real às promessas de alienação e oneração de bens imóveis ou de bens sujeitos a registo – cfr. artigos 404.º, n.º 2, e 407.º do CC e artigo 1.º, n.º 1, f) do Código do Registo Predial.
Trata-se de um mecanismo que, actuando no plano substantivo, se destina a fazer dotar um acordo meramente obrigacional de eficácia erga omnes, rodeando as respectivas promessas de uma série de formalidades não apenas mais solenes mas também capazes de levar ao conhecimento daqueles a quem as promessas passam a ser oponíveis.
Ora, nada resulta dos autos que as citadas formalidades tenham sido cumpridas. Com efeito, nem as assinaturas constantes do acordo junto a fls 77 a 78 foram reconhecidas notarialmente, nem as partes declararam atribuir eficácia real às promessas nem as promessas foram registadas nos termos do artigo 2.º, n.º 1, do Código do Registo Predial.
Ora, não dotando as promessas de eficácia real, é manifesto que não podem opor-se a terceiro que não tenham participado no respectivo negócio jurídico.
*
Nem se diga que a promessa de hipoteca sub judice se encontra registada na Conservatória do Registo Predial ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.º 6, da Lei nº 7/2013. É que, a publicidade assim dada quanto à situação jurídica da fracção autónoma não é a de existência de uma promessa de hipoteca dotada de eficácia real e, como tal, oponível a terceiros mas tão-só a de existência de uma promessa de hipoteca.
Por sua vez, nada na Lei n.º 7/2013 confere eficácia especial às promessas feitas ao abrigo deste diploma designadamente a de fazer reportar a anterioridade da compra e venda e/ou da hipoteca definitiva à data realização do registo provisório das respectivas promessas.
Assim, também não se pode fazer prevalecer a data do registo provisório da promessa de hipoteca feito nos termos previstos na Lei n.º 7/2013 considerando a hipoteca definitiva oponível a terceiros desde a data do registo provisório.
*
Com o que resta tão-só a norma do artigo 6.º, n.º 3, do Código do Registo Predial para poder eventualmente sustentar a oponibilidade da hipoteca desde a data do registo provisório da promessa de hipoteca.
Alguma parte da doutrina e jurisprudência portuguesa opina no sentido da oponibilidade dos direitos adquiridos com a celebração do contrato definitivo retroage até à data do registo do respectivo contrato-promessa, devendo os registos provisórios de aquisição prevalecer sobre qualquer registo posterior com eles incompatíveis – cfr. Isabel Pereira Mendes, Código do Registro Predial, Anotado e Comentado, 17ª edição, 2009, Almedina, pg 405 e 406 bem como o Acórdão aí citado da Relação de Coimbra, de 14 de Dezembro de 2004, CJ, XXIX, V, 2004, pg 35.
Porém, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça português, de 25 de Junho de 2002, Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Ano X, Tomo II, 2002, pg 127 a 128, aqui citado a título de direito comparado, relativamente às promessas de compra e venda, decidiu-se que “... o contrato-promessa de compra e venda que determinou o registo de aquisição provisória da propriedade de metade indivisa do imóvel em causa não tem eficácia real, quer porque tal efeito não lhe foi atribuído pelas partes, quer porque só o poderia ter sido através de escritura pública. Esta consequência não pode ser afastada pelo facto de o artigo 6.º, n.º 3, do CRP atribuir ao registo definitivo a prioridade que tinha como provisório. Sem eficácia real do contrato-promessa de compra e venda de imóveis apenas resultam direitos obrigacionais, já que a propriedade apenas se transfere com a celebração da escritura, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 408.º, n.º 1, 1316.º e 1317.º, alínea a), do CC. Daí que o simples registo provisório de aquisição com base em contrato-promessa não possa ter o efeito de fazer retroagir a aquisição da propriedade à do registo provisório. Fá-lo se o direito substantivo o permitir, isto é se do contrato resultar uma garantia ou direito real, não se dele apenas resultarem direito de natureza obrigacional.” - sublinhado nosso.
Urge, portanto, analisar qual dessas posições deve ser aqui adoptada.
*
Segundo o artigo 1.º do Código do Registo Predial, o registo predial destina-se essencialmente a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio imobiliário.
A isso acresce a natureza predominantemente declarativa do registo predial segundo a qual o registo é mera condição de oponibilidade dos factos sujeitos a registo a terceiros. Não podendo o registo dar nem retirar direitos, na falta de previsão legal expressa em sentido contrário, é impossível reconhecer à promessa de hipoteca dos autos eficácia perante terceiros através do registo quando a mesma não a tem no plano substantivo.
Assim, nada permite que se socorra da norma do artigo 6.º, n.º 3, do Código do Registo Predial para fazer retroagir a eficácia real da hipoteca até ao momento em que foi feito o registo da promessa de hipoteca.
É que, em princípio, as regras registrais fazem apenas transparecer no registo a condição das coisas no plano substantivo sendo a realidade registral mero reflexo da realidade substantiva. No caso de discrepância, em princípio, prevalece a realidade substantiva. Por isso, não se pode fazer derivar das regras registrais uma eficácia que as regras substantivas não atribuem.
Ora, não tendo o facto registado provisoriamente eficácia além das partes, a norma do artigo 6.º, n.º 3, do Código do Registo Predial não pode pretender atribuir-lhe esta eficácia.
Nestes termos, não se pode deixar de aderir à posição sufragada no citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça português de que o registo provisório não tem o efeito de fazer retroagir a aquisição do direito à deste registo.
Conclui-se, portanto, que não é de fazer prevalecer a garantia hipotecária sobre o arresto e penhora feitos em datas anteriores ao registo definitivo da hipoteca mas posteriores ao registo provisório da respectiva promessa de hipoteca sendo de manter a graduação feita mais acima.
***
IV – Decisão:
Face ao exposto, graduo os créditos da seguinte forma:
(…)
• Quanto à fracção autónoma designada por “L4”:
• Em primeiro lugar, o crédito exequendo;
• Em segundo lugar, o crédito reclamado por C a fls 61 a 64;
• Em terceiro lugar, o crédito reclamado por A, Limitada a fls 70 a 76;
• Em quarto lugar, o crédito reclamado por D a fls 156 a 161 e 295 a 297.
As custas saem procípuas a cargo do Executado.
Registe e notifique.”

Analisado o douto aresto que antecede, louvamos a acertada, douta e perspicaz decisão com a qual concordamos e que nela foi dada a melhor solução ao caso, pelo que, considerando a fundamentação de direito aí exposta, cuja explanação sufragamos inteiramente, remetemos para os seus precisos termos ao abrigo do disposto o artigo 631.º, n.º 5 do CPC e, em consequência, negamos provimento ao recurso.
Efectivamente, no caso presente, provado está que o executado e sua mulher prometeram hipotecar a favor do banco recorrente a fracção “L4”, com vista a obter um empréstimo junto do banco, até ao limite de MOP7.965.438,99.
Apesar de a lei admitir a atribuição de eficácia real aos contratos de mútuos com promessas (contrato de mútuo com promessa de compra e venda e promessa de constituição de hipoteca voluntária), a verdade é que no caso dos autos, não foi atribuída eficácia real aos referidos contratos, daí que a relação estabelecida entre os interessados e o banco recorrente não deixa de ser mera obrigacional. De facto, o banco recorrente só passou a ter garantia real com a outorga da hipoteca a seu favor registada em 19.6.2017.
Como bem observou a decisão recorrida, não se diga que o artigo 6.º. n.º 3 do Código de Registo Predial tem a virtualidade de atribuir “eficácia real” ao contrato-promessa de hipoteca nem alterar a natureza da relação jurídica, no sentido de atribuir ao crédito do banco recorrente uma prioridade sobre outras garantias reais.
Na medida em que o crédito do exequente (garantido por arresto registado em 14.12.2016 e convertido em penhora registada em 27.11.2017) e o crédito da credora reclamante C (garantido por penhora registada em 3.4.2017) são anteriores ao crédito do banco recorrente (o qual apenas se encontra garantido por hipoteca voluntária registada em 19.6.2017), têm, assim, prevalência de pagamento.
Isto posto, não merece censura a sentença recorrida, havendo de negar provimento ao recurso.
***
III) DECISÃO
Face ao exposto, o Colectivo de Juízes deste TSI acorda em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.
***
RAEM, a 1 de Dezembro de 2022
Tong Hio Fong
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
Fong Man Chong



Recurso cível 1148/2020 Página 25