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Processo nº 845/2022
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 23 de Fevereiro de 2023

ASSUNTO:
- Marca
- Concorrência desleal

SUMÁRIO:
- Não obstante a marca registanda N/161590, além dos dois caracteres chineses “四季”, ter ainda outros elementos nominativos e figurativos adicionais ( ), o certo é que aqueles dois caracteres chineses constituem a sua parte essencial, chamando desde logo atenção dos consumidores.
- Sendo as marcas da Recorrente (“四季” ou “Four Seasons”) marcas de prestígio na área de serviços prestados relativos ao alojamento e alimentação em hotéis e pensões, conhecidas ao nível internacional, um consumidor médio, ao ler e ver a marca registanda, poderá associar desde logo com as marcas da ora Recorrente, pensando que se tratam de serviços ou bens fornecidos pela própria Recorrente, nomeadamente na mencionada área.
- É certo que a ramonização dos caracteres chineses “四季” da marca registanda é diferente das marcas da Recorrente, pois, em vez das palavras inglesas “Four Seasons”, utilizou o mandarim “SIJI”. Porém, esta diferença é pouco relevante no caso sub justice, já que é de conhecimento público de que tanto a população como os turistas em Macau são predominantes os chineses, daí que a reprodução dos dois caracteres chineses “四季” tem maior relevância.
- Constitui o acto de concorrência desleal todo o acto que objectivamente se revela contrário às normas e usos honestos da actividade económica, designadamente o que seja idóneo a criar confusão com a empresa, os produtos, serviços ou o crédito dos concorrentes. E o risco de associação por parte dos consumidores relativo à origem do produto ou do serviço é suficiente para fundamentar a deslealdade de uma prática - cfr. arts. 158º e 159º do Código Comercial.
O Relator
Ho Wai Neng











Processo nº 845/2022
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 23 de Fevereiro de 2023
Recorrente: A
Recorridas: Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico
B

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – RELATÓRIO
Por sentença de 02/03/2022, julgou-se improcedente o recurso interposto pela Recorrente A, e em consequência mantendo-se a decisão da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico.
Dessa decisão vem recorrer a Recorrente A, alegando, em sede de conclusões, o seguinte:
A. A marca “FOUR SEASONS” tem a sua versão, em língua chinesa, nos caracteres chineses “四季”, onde se integram as marcas da Recorrente N/155779, N/29029, N/17552, N/3672, N/26426, N/29205, N/155780, N/155781, N/67985 “” Classe 35, N/29206 “四季 / SEI KUAI” Classe 36, N/29207 “四季 / SEI KUAI” Classe 39, N/29208 “四季 / SEI KUAI” Classe 41 e N/29210 “四季 / SEI KUAI” Classe 44.
B. Por outro lado, a Recorrente tem ainda registadas a seu favor na China e em Hong Kong, as marcas n.º 5899380 “ ” na Classe 43, 5899381 “ ” na Classe 36, 17972467 “四季” na Classe 43, 27373914 “四季” na Classe 35, 1400901 “四季” na Classe 36, 1400791 “四季” na Classe 39, 1406872 “四季” na Classe 41, 304439647 “四季” na Classe 42 e em Hong Kong com o número 200004114AB “四季” nas Classes 36, 39, 41, 43, 44.
C. Na Reclamação, a Recorrente demonstrou:
i) a existência de marcas registadas prévias como base de todos os subsequentes argumentos e, nessa base, seguindo a precedência lógica, invocou:
ii) o prestígio da marca “四季”da Recorrente, que é a transliteração para chinês da marca “Four Seasons”, conhecida do consumidor do produto que apenas se expressa em Chinês;
iii) a notoriedade da marca “四季” da Recorrente;
iv) imitação de marca prévia; e
v) concorrência desleal e má-fé de B (o Requerente).
D. O Tribunal a quo na decisão proferida entendeu que:
i) O prestígio da marca da Recorrente é inegável, não tendo sido contestado pela própria DSEDT;
ii) A marca da Recorrente é uma marca famosa;
iii) A marca registanda utiliza, na totalidade, os sinais das marcas N/29209 e N/29205 da Recorrente;
E. A fundamentação do Tribunal a quo é antagónica e tem por base uma decisão deficiente da DSEDT, com a seguinte justificação no parágrafo 23 (da decisão administrativa da DSEDT):
i) “Ocorre que, a Recorrente é titular de marcas registadas em Macau, pelo que, deixa de ser importante para se aferir se existe imitação, a notoriedade e prestígio da marca (que releva para efeitos de concorrência desleal), fica assim, afastado o fundamento de recusa do artigo 214, n.º 1, alínea b) e c) do RJPI.” (!?!)
F. O Tribunal a quo, imbuído pelo erro manifesto (por omissão) da DSEDT, pugnou a final pela inexistência de semelhanças entre as marcas em confronto, quando já as havia expressamente reconhecido, conforme descrito nos artigos 13 e 14.
G. Constitui erro manifesto entender que, uma vez registada a marca em Macau, deixa de ser necessário atender à sua notoriedade e prestígio. Este entendimento não tem qualquer correspondência com a letra da lei e foi “inventado” pela DSEDT.
H. Em nenhuma parte do artigo 214, n.º 1 al. b) ou c) do RJPI vem dito que a protecção da marca notória ou da marca de prestígio deverá ser diferente caso se encontre registada em Macau – este ponto foi “acrescentado” pela DSEDT.
I. O entendimento do Tribunal não tem qualquer correspondência com a letra da lei e constitui uma flagrante violação das convenções internacionais aplicáveis em Macau e que visam a protecção especial de marca notória e de marca de prestígio.
J. É entendimento da lei repudiar e rejeitar marcas que “constituam reprodução, imitação ou tradução de uma marca anterior que goze de prestígio em Macau (…)” (sublinhado nosso), “e sempre que a utilização da marca posterior procurar tirar partido indevido do carácter distintivo ou de prestígio da marca ou possa prejudica-las”.
K. As marcas “四季” / “FOUR SEASONS” da Recorrente são marcas de renome internacional para designar hotéis de luxo, resorts e acomodações residenciais, catering, restaurantes e spa, onde as propriedades situadas na região Ásia-Pacífico - onde se destaca a presença na China, Hong Kong e Macau - oferecem ainda serviços de catering, banquetes e outros serviços relacionados com bebidas e alimentos.
L. Os hotéis e propriedades “四季” da Recorrente incluem restaurantes com elegantes experiências culinárias, tendo atingido recorde em 2019 por receber o maior número de estrelas Michelin - 25 - atribuídas a 17 restaurantes dos hotéis FOUR SEASONS. Em Março de 2022, esse número aumentou para 28 estrelas Michelin em 21 restaurantes internacionais, em 16 hotéis por todo o mundo.
M. A notoriedade e o prestígio das marcas da Recorrente, bastam, por si só, para conceder a necessária protecção às mesmas em Macau – além do Tribunal a quo e DSEDT já terem reconhecido que as marcas “四季” e “FOUR SEASONS” são marcas de prestígio em Macau pertencentes à Recorrente, sendo “四季” indissociável da sua romanização “FOUR SEASONS” – o que determina, in fine, a inadmissibilidade de registo da marca a favor de outra entidade.
N. No texto “SIJIYELIN / SEI KUAI IE LAM (C.C.) / 四季椰林”, o único elemento preponderante e com carácter distintivo é o termo “四季” (“FOUR SEASONS” na sua romanização), pois é o que identifica a qualidade, proveniência e/ou natureza da marca.
O. A marca N/161590 utiliza os sinais de marcas da Recorrente na totalidade:
i) N/29029, 四季 / SEI KUAI, na Classe 43;
ii) N/29205 四季 / SEI KUAI, na Classe 35;
iii) N/29206, 四季 / SEI KUAI, na Classe 36
iv) N/29207, 四季 / SEI KUA, na Classe 39;
v) N/29208, 四季 / SEI KUAI, na Classe 41;
vi) N/29210, 四季 / SEI KUAI, Classe 44;
vii) e utiliza os elementos que contêm a marca mista N/67985 “”.
P. No juízo a fazer acerca da imitação/reprodução, é importante a impressão de conjunto e não o pormenor das marcas, sendo apenas relevantes os elementos que, essencialmente, as distinguem, por serem os dominantes.
Q. O elemento predominante das marcas em confronto é “四季”, o qual goza de prestígio e notoriedade em Macau a favor da Recorrente, conforme bem entendeu o Tribunal a quo - cfr. 1.º parágrafo da pág. 12 da decisão ora em recurso.
R. A semelhança e imitação são óbvias, onde a marca N/161590 “四季椰林 SIJIYELIN” tem o único elemento distintivo “四季”, sendo “SIJI” a transliteração em mandarim de “四季”, sendo que a expressão adicional “椰林” / “YELIN”, significando “grupo de côco” não tem carácter distintivo - é um alimento/fruta.
S. “四季” é o elemento predominante da marca (notória) da Recorrente, será sempre esse elemento a memorizar por qualquer consumidor, independentemente do seu nível de atenção.
T. A cópia do elemento dominante “四季” conduz, inevitavelmente, qualquer consumidor ao risco de associação das duas marcas, criando a ilusão de que têm ambas a mesma proveniência, e prejudicando a reputação e notoriedade das marcas da Recorrente.
U. A imitação e semelhança foi já objecto de decisão anterior, no âmbito de pedido de registo da marca N/161589 “FOUR SEASONS COCONUT GROVE” na Classe 43, tendo o registo da mesma sido recusado pela DSEDT, por decisão confirmada por este Tribunal judicial e já transitada em julgado.
V. Existem ainda inúmeras decisões das autoridades administrativas e dos Tribunais Judiciais da China que reconheceram o carácter notório e prestígio das marcas da Recorrente em diversas Classes.
W. Na Classe 43, a Reclamante já obteve decisões favoráveis contra os pedidos de marcas que no essencial reproduziam a marca “四季” e “FOUR SEASONS” da Reclamante:
i) “TAOSHAN FOUR SEASONS” e “桃山四季” (em inglês e chinês);
ii) “四季花园酒店THE FOUR SEASONS GARDEN HOTEL LIBO及图” (em inglês e chinês);
iii) “FOUR SEASONS ELEMENTS” (em inglês);
iv) “7天四季” (na tradução para inglês “7 Days Four Seasons”);
v) “四季会FOUR SEASONS CLUB及图” (em inglês e chinês) - decisão administrativa;
vi) “四季会FOUR SEASONS CLUB及图” (em chinês e inglês) - decisão judicial;
vii) “四季御园生态园FOUR SEASONS ROYALECOLOGICAL GARDENS及图” (em chinês e inglês);
viii) conforme decisões juntas com a Reclamação como Docs. 24 a 30.
X. Foi recusado o registo da marca N/161589 apresentado pela Requerente - por violação dos direitos prévios registados da Recorrente, pelo risco de associação da marca em recurso e as marcas da Recorrente (e os serviços por si oferecidos), o qual se afigura notório e de identificação simples e fácil pelo consumidor médio - pelo que terá que verificar-se a recusa de registo da marca N/161590 “四季椰林 / SIJIYELIN”, sob pena de contradição com caso julgado anterior.
Y. O registo da marca da N/161590 é um acto de concorrência desleal por parte da Requerente, porque se apropriaria ilícitamente da reputação da Recorrente, causa confusão nos consumidores e tem o potencial de denegrir a imagem de alta qualidade que a Recorrente mantem em todas as suas propriedades, nos seus serviços e produtos.
Z. Constitui má-fé, o facto de a Requerente procurar registar marca que reproduz na sua essência e elemento indentificador marca previamente registada em Macau para assinalar produtos afins, e produtos que possam levar os consumidores a estabelecer ligação com o proprietário da marca notória - a Recorrente.
AA. Existe o risco de desvio de clientela de uma empresa para a outra - sendo certo que esse risco ou potencial risco nem sequer necessita de ser concreto ou efetivo, bastando uma mera suscetibilidade de vir a suceder - o que acontece no presente caso.
BB. Há a possibilidade da canalização da clientela ou desvio de clientes por confusão, sendo que tal possibilidade não é resultado do mérito da Requerente, o que origina o risco de ocorrência de concorrência em violação das normas e usos honestos da actividade económica.
CC. A intenção fraudulenta e ilegal da Requerente é óbvia, criando uma situação de confusão junto dos consumidores que prejudica o nome e a reputação da Recorrente, usufruindo gratuitamente e de forma imoral do enorme reconhecimento de que goza a Recorrente, e que resultou unicamente do seu esforço, criatividade, inovação e investimento ao longo de 60 anos.
DD. Verifica-se má-fé e tentativa de concorrência desleal, e que esta é possível independentemente de vontade, pelo que deve ser recusado o pedido formulado pela Requerente sob o n.º N/161590, para o registo da marca mista “四季椰林 / SIJIYELIN” na Classe 43, com fundamento nos artigos 9.º n. 1 al. c) e 214.º n. 1 al. a) do RJPI.
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Foram colhidos os vistos legais.
*
II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
a) Por decisão publicada no BO, constante do apenso administrativo e de fls.13 e ss destes autos, cujo teor aqui se reproduz para os legais e devidos efeitos, a DSE deferiu o pedido de concessão da marca nº N/161590 à recorrente.
b) Tal marca é constituída pelo sinal e destinava-se a assinalar os produtos da classe 43ª.
c) A recorrente tem registadas as marcas assinaladas a fls.15 e cujo teor aqui se reproduz, todas com data anterior ao pedido de prestígio da marca posta em crise.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A parte contrária requereu o registo da marca N/161590 ( ) para os produtos e serviços da classe 43ª, em concreto: restaurantes; creches (para crianças), pensões para animais; aluguel de cadeiras, mesas, toalhas de mesa e copos; aluguel de equipamentos de cozinha; aluguel de bebedouros; agências imobiliária (hotéis, pensões); serviços de bar; aluguel de casas móveis; lar de idosos.
Segundo a nota explicativa da Classificação Internacional de Produtos e Serviços para efeitos do Registo de Marcas (Classificação de Nice)1, “a Classe 43ª inclui essencialmente os serviços prestados por pessoas ou por estabelecimentos cujo objectivo é a preparação de alimentos ou de bebidas para o consumo bem como os serviços prestados relativos ao alojamento e alimentação em hotéis, pensões ou outros estabelecimentos que forneçam alojamento temporário”.
Por sua vez, a ora Recorrente é titular dos seguintes marcas registadas:
Numero
C1
Logo
Serviços
N/155779
43ª


Serviços de hospedagem temporária; serviços de fornecimento de comida e bebida; aluguer de alojamento temporário; serviços de alojamento temporário; reservas de alojamento temporário; serviços de hotelaria e estância turística; serviços de reservas em hotéis; serviços de restaurante; serviços de bar; serviços de recepção para alojamento temporário [gestão de chegadas e partidas]; serviços de agência de alojamento [hotéis, pensões]; arrendamento de salas de reunião; serviços de aluguer de aparelhos de iluminação; serviços de aluguer de cadeiras, mesas, toalhas de mesa, copos; serviços de aluguer de aparelhos de cozinha; serviços de lares para a terceira idade; serviços de aluguer de tendas; serviços de aluguer de edifícios transportáveis;(…) 
N/29209
43ª
四季SEI KUAI

Serviços de hotel e pousadas, serviços de reserva para hotéis; serviços de restauração, de fornecimento de refeições para fora e banquetes.
N/17552
42ª

Serviços hoteleiras e complexos hoteleiros e turísticos; serviços de reserva de hotéis; serviços de restaurantes e de banquetes.
N/3672
42ª



Idem
N/26426
35ª

(…); serviços de lojas de venda a retalho; gestão de hotéis para terceiros, administração de hotéis, providenciar instalações para exibições (administrativas), disseminação de anúncios, publicidade por correio directo, providenciar serviços de centros de negócios; “marketing” de um centro comercial de venda a retalho; serviços de centro comercial de venda a retalho. 
N/29205
35ª
四季 SEI KUAI
Idem
N/155780
44ª

Serviços de spa; salões de beleza; fornecimento de instalações e serviços de sauna; serviços ao domicílio para pessoas em convalescença; serviços de arranjos florais; serviços de spa de saúde; serviços de massagem; serviços de jardinagem paisagística; serviços de paisagismo.
N/155781
44ª


Idem
A questão fundamental do presente recurso jurisdicional consiste em saber se a marca registanda (N/161590) é ou não uma marca que imita, ou reproduz, as marcas registadas da ora Recorrente.
Dispõe o artº 214º do RJPI que:
Artigo 214.º
(Fundamentos de recusa do registo de marca)
1. O registo de marca é recusado quando:
a) Se verifique qualquer dos fundamentos gerais de recusa da concessão de direitos de propriedade industrial previstos no n.º 1 do artigo 9.º;
b) A marca constitua, no todo em parte essencial, reprodução, imitação ou tradução de outra notoriamente conhecida em Macau, se for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se, ou que esses produtos possam estabelecer ligação com o proprietário da marca notória;
c) A marca, ainda que destinada a produtos ou serviços sem afinidade, constitua reprodução, imitação ou tradução de uma marca anterior que goze de prestígio em Macau, e sempre que a utilização da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca ou possa prejudicá-los.
2. O pedido de registo também é recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha:
a) Sinais que sejam susceptíveis de induzir em erro o público, nomeadamente sobre a natureza, qualidades, utilidade ou proveniência geográfica do produto ou serviço a que a marca se destina;
b) Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada;
c) Medalhas de fantasia ou desenhos susceptíveis de confusão com as condecorações oficiais ou com as medalhas e recompensas concedidas em concursos e exposições oficiais;
d) Brasões ou insígnias heráldicas, medalhas, condecorações, apelidos, títulos e distinções honoríficas a que o requerente não tenha direito, ou, quando o tenha, se daí resultar o desrespeito e o desprestígio de semelhante sinal;
e) A firma, nome ou insígnia de estabelecimento, ou apenas parte característica dos mesmos, que não pertençam ao requerente ou que o mesmo não esteja autorizado a utilizar, se for susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão;
f) Sinais que constituam infracção de direitos de autor ou de propriedade industrial.
3. O facto de a marca ser constituída exclusivamente por sinais ou indicações referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 199.º não constitui fundamento de recusa se aquela tiver adquirido carácter distintivo.
4. O interessado na recusa do registo da marca a que se refere a alínea b) do n.º 1 só pode intervir no respectivo processo quando prove já ter requerido em Macau o respectivo registo ou o faça simultaneamente com o pedido de recusa.
5. O interessado na recusa do registo da marca a que se refere a alínea c) do n.º 1 só pode intervir no respectivo processo quando prove já ter requerido em Macau o respectivo registo para os produtos ou serviços que lhe deram grande prestígio, ou o faça simultaneamente com a reclamação.
Por sua vez, o artº 215º do RJPI consagra que:
Artigo 215.º
(Reprodução ou imitação de marca)
1. A marca registada considera-se reproduzida ou imitada, no todo ou em parte, por outra, quando, cumulativamente:
a) A marca registada tiver prioridade;
b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, nominativa, figurativa ou fonética com outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
2. Considera-se reprodução ou imitação parcial de marca, a utilização de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada, ou somente do aspecto exterior do pacote ou invólucro com as respectivas cores e disposição de dizeres, medalhas e recompensas, de modo que pessoas analfabetas os não possam distinguir de outras adoptadas por possuidor de marcas legitimamente utilizadas.
Olhamos para a marca registanda, o que sobressai desde logo à vista são os carácteres chineses “四季”.
As marcas registadas a favor da ora Recorrente têm os mesmos caracteres chineses ou a respectiva tradução em língua inglesa “Four Seasons”.
Será que a utilização dos mesmos carácteres chineses “四季” é suficiente para concluir pela existência da imitação ou reprodução das marcas já registadas da ora Recorrente?
Para nós, a resposta não deixará de ser afirmativa.
Vejamos.
Não obstante a marca registanda N/161590, além dos dois caracteres chineses acima referidos, ter ainda outros elementos nominativos e figurativos adicionais ( ), o certo é que aqueles dois caracteres chineses constituem a sua parte essencial, chamando desde logo atenção dos consumidores.
Sendo as marcas da Recorrente (“四季” ou “Four Seasons”) marcas de prestígio na área de serviços prestados relativos ao alojamento e alimentação em hotéis e pensões, conhecidas ao nível internacional, um consumidor médio, ao ler e ver a marca registanda, poderá associar desde logo com as marcas da ora Recorrente, pensando que se tratam de serviços ou bens fornecidos pela própria Recorrente, nomeadamente na mencionada área.
É certo que a ramonização dos caracteres chineses “四季” da marca registanda é diferente das marcas da Recorrente, pois, em vez das palavras inglesas “Four Seasons”, utilizou o mandarim “SIJI”.
Contudo, esta diferença é pouco relevante no caso sub justice, já que é de conhecimento público de que tanto a população como os turistas em Macau são predominantes os chineses, daí que a reprodução dos dois caracteres chineses “四季” tem maior relevância.
Invoca ainda a Recorrente a concorrência desleal e má fé da parte contrária como fundamentos da recusa do registo da marca.
Para ser recusado o registo com este fundamento é necessário que se reconheça que a requerente do registo pretende fazer concorrência desleal, ou que esta é possível independentemente da sua intenção (art. 9º, nº 1, al. c) do RJPI).
Esta norma abrange dois tipos de concorrência desleal: intencional e objectiva (não intencional).
Constitui o acto de concorrência desleal todo o acto que objectivamente se revela contrário às normas e usos honestos da actividade económica, designadamente o que seja idóneo a criar confusão com a empresa, os produtos, serviços ou o crédito dos concorrentes. E o risco de associação por parte dos consumidores relativo à origem do produto ou do serviço é suficiente para fundamentar a deslealdade de uma prática - cfr. arts. 158º e 159º do Código Comercial.
É comum na doutrina a indicação de 5 tipos de actos de concorrência desleal: actos de confusão, actos de descrédito, actos de apropriação, actos de desorganização e actos de concorrência parasitária.
No caso em apreço, quanto à concorrência desleal na vertente subjectiva (intencional ou má fé da parte contrária), não temos elementos para concluir pela sua existência.
O que já não acontence com a concorrência desleal na vertente objectiva (não intencional), pois já acima verificamos que a marca registanda é passível de criar confusão entre produtos ou serviços de diferentes agentes económicos (a ora Recorrente e a parte contrária), bem como existir o risco da associação.
Face ao expendido, o presente recurso jurisdicional não deixará de se julgar provido.
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IV – DECISÃO
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conceder provimento ao presente recurso, revogando a sentença recorrida, bem como a decisão da DSEDT que concedeu o registo da marca N/161590.
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Custas em ambas as instâncias pela parte contrária.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 23 de Fevereiro de 2023.


Ho Wai Neng
(Relator)

Tong Hio Fong
(1º Juiz-Adjunto)

Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(2º Juiz-Adjunto)


1 Aviso do Chefe do Executivo nº 10/2009, B.O. nº 20/2009, I Série, de 22/05/2009.
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