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Processo nº 681/2022
(Autos de Recurso Cível e Laboral)

Data do Acórdão: 23 de Março de 2023

ASSUNTO:
- Meios de prova
- Matéria de facto
- Sociedade Civil
- Sócios anónimos

SUMÁRIO:
- Para que a decisão da 1ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal”, se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes;
- No enquadramento do actual Código Civil nada impede que dois ou mais sujeitos criem uma sociedade civil mesmo que uma das partes participe na sociedade de forma anónima e a referida organização não possa ser considerada uma pessoa colectiva autónoma desde que tenham em vista a repartição dos lucros proveniente da economia comum que geraram.


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Rui Pereira Ribeiro
















Processo nº 681/2022
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 23 de Março de 2023
Recorrente: A
Recorridos: B Educação Grupo Limitada,
C e D
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  A, com os demais sinais dos autos,
  vem instaurar acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra
  B Educação Grupo Limitada (1ª Ré), C (2ª Ré) e D (3º Réu), também, com os demais sinais dos autos,
  Pedindo a Autora/Recorrente que:
  - sejam condenados os três Réus a pagar, solidariamente, à Autora uma quantia de MOP409.000,00 a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros legais contados a partir da data da sentença até ao seu integral pagamento;
  - sejam ordenados os três Réus a cessar imediatamente os actos de concorrência desleal e devolver à Autora todos os materiais didáticos; e
  - seja ordenado a publicação da sentença nos termos do artigo 172º nº 2 do Código Comercial.
  Proferida sentença, foi a acção julgada parcialmente procedente e em consequência, decide:
1. Confirmar que os recursos didáticos levados pela 2.ª Ré e pelo 3.º Réu em 21 de Dezembro de 2018, incluindo alguns livros didáticos, livros de referência, fichas de trabalho escolares, fichas de trabalho preparados para alunos e enunciados das provas simuladas (que não são objectos pessoais de outros formadores contratados pelo Centro) são bens comuns da Autora e da 2.ª Ré.
2. Julga improcedentes os restantes pedidos e absolve os três R.R. dos pedidos.
  Não se conformando com a decisão proferida vem a Autora e agora Recorrente interpor recurso da mesma, formulando as seguintes conclusões e pedidos:
1. O conteúdo da decisão do tribunal recorrido é baseado nas constatações de factos, mas, salvo o pleno respeito a isso, a recorrente não concorda com os critérios de apreciação do tribunal a quo sobre as provas documentais e o depoimento das testemunhas.
2. A decisão recorrida entretanto, contém erros na aplicação da lei, pelo que, a decisão do tribunal a quo sobre os factos e todo o conteúdo da decisão constituem o objecto do presente recurso.
3. A recorrente entende que, na decisão recorrida, as provas utilizadas para fundamentar o conteúdo dos factos a serem provados nos artigos 1º a 9º, 60º, 61º e 63º contêm vícios à apreciação e formação de convicção do tribunal.
4. Citando-se a jurisprudência do Tribunal de Segunda Instância no. 915/2017, na qual a decisão sobre a matéria de facto só pode ser modificada nos casos previstos no artigo 629º do CPC” e o tribunal de recurso não pode criticar a decisão do tribunal de conhecimento de facto de ponderar a importância e credibilidade do depoimento das testemunhas.
5. O tribunal de conhecimento de facto tem livre apreciação e, a menos que viole o princípio da prova legal, o tribunal de recurso não deve intervir em questões de conhecimento de facto.
6. Nos termos do no. 1 do artigo 558º do Código de Processo Civil, no procedimento de formação da livre apreciação, a respectiva prova produz realmente uma certeza da existência de um facto para livre apreciação.
7. Castro Mendes explica: “Refere-se à prova que a lei permite que os juízes usem como razão para a livre apreciação na ausência de dúvida em contrário”.
8. O tribunal a quo salientou na sua decisão sobre a matéria de facto: "Baseia-se na prova documental contida nas fls. 94 a 155 para formar a livre apreciação das provas (entre eles, deve-se destacar que as fls. 119, 122, 125, 131, 134, 143, 146 e 150 contêm a expressão "dividendos aos acionistas", sendo que os prazos correspondentes de alguns dos documentos acima mencionados são anteriores ao funcionamento da "F III"; a coluna "Dividendos aos Acionistas" nos boletins das fls. 148 e 149.).
9. A recorrente entende que, quando determinada prova é utilizada para formar a convicção, a referida prova deve comprovar cabalmente a ocorrência de determinado facto e é formada sob as circunstâncias fora de dúvida. O tribunal não pode provar afirmativamente o respectivo facto se a referida prova não pode convencer seguramente que o tribunal acredite a existência do facto.
10. Das fls. 46 a 52 dos autos, pode-se saber que a “B Educação Grupo Limitada” (ou seja, primeira ré na decisão recorrida) constituída pelo marido da recorrente E, a segunda ré C e o terceiro réu D foi constituída em 19 de Outubro de 2015. A partir desta prova documental, o tribunal apurou que E, a segunda ré C e a terceira ré D cooperaram e operaram o "F III" desde a data acima mencionada.
11. Através do conteúdo das fls. 118 dos autos, pode-se ver que as despesas da constituição da “B Educação Grupo Limitada” (ou seja, primeira ré na decisão recorrida) são também registadas na respectiva tabela de receitas e gastos.
12. Com o uso do conteúdo da prova documental usada para formar a convicção do tribunal a quo, embora as fls. 119, 122, 125, 131, 134, 143, 146 e 150 dos autos contenham a expressão "dividendos aos acionistas", no entanto, as datas constantes nestes documentos são posteriores à data de constituição da “B Educação Grupo Limitada” (ou seja, primeira ré na decisão recorrida) – ou seja, após 19 de Outubro de 2015.
13. Mesmo a coluna "dividendo aos acionistas" no boletim nas fls. 148 e 149, a data indicada no documento é posterior ao momento em que o marido da recorrente cooperou com a segunda ré C e o terceiro réu D.
14. Com base no conteúdo da prova documental supracitada, é absolutamente impossível afirmar que a expressão "dividendos aos acionistas" contida nos documentos supracitados é parcialmente anterior à operação do "F III", porque os documentos acima mencionados cuja maneira de expressão é totalmente surgida após a criação da “B Educação Grupo Limitada” pelo marido da recorrente E, a segunda ré C e o terceiro réu D.
15. Ao apreciar a prova documental acima referida, o tribunal a quo apenas incidiu sobre o conteúdo da recuperação da caução adiantada pela segunda ré, proferiu as seguintes determinações quanto aos factos constantes dos artigos 1º a 9º, 60º, 61º e 63º dos factos a serem provados, concluiu que a recorrente e a segunda ré mantinham uma relação de cooperação, parceria, etc., e não uma simples relação entre empregada e empregadora.
16. A partir da expressão “dividendos aos acionistas” ou “dividendos dos acionistas” com valor constante das fls. 119, 122, 125, 131, 134, 143, 146 e 150 da prova documental dos autos, o valor relevante é um número inteiro e é distribuído regularmente a cada poucos meses.
17. O desembolso da conta conjunta de duas pessoas nas fls. 156 e seguintes dos autos também coincide com o depoimento da testemunha E na audiência de julgamento. O valor relevante é calculado pela recorrente, e a recorrente tem o direito de decidir quanto dinheiro deve ser distribuído, não vinculado a todos os lucros do "F II". (vide Recorded on 11-Nov-2021 at 10.24.19 (3J7SOB(101120319)38:45 – 43:39)
18. Assim, quando o tribunal a quo determinou o teor dos artigos 1º, 2º, 3º, 6º, 7º, 8º, 9º, 60º, 61º e 63º dos factos a serem provados, houve o vício de erro na apreciação das provas.
19. O tribunal a quo ignorou, entretanto, a expressão constante das fls. 155 dos autos: “conteúdo de "3 pessoas (incluindo a indemnização rescisória de C)", fls. 119 dos autos: "fundo de segurança social do 4º trimestre de 2015, 4 pessoas x $45 x 3 meses (Lao, Cheong, Leong, Mui)". O acima mencionado é para provar que a segunda ré é uma funcionária do "F II", e/ou não pode ser provado sem dúvida que a recorrente e a segunda ré C estão operando em conjunto o Centro de Explicações F II.
20. Numa verdadeira relação de parceria, além de terem direitos iguais na distribuição dos lucros, os sócios também parecem ter direitos iguais na tomada de decisões, no entanto, através do depoimento da testemunha - afirmando que a recorrente tem o direito de fazer uma distribuição de quanto dinheiro é dado, e que é responsabilidade da recorrente para recolher todos os pagamentos, contar os valores, etc... e o que a recorrente alegou no depoimento da parte.
21. A recorrente também admitiu em juízo com base na decisão pessoal da recorrente, e naquela época, ela esteve a transferir a turma de explicações da quarta classe do ensino primário que ela encarregava no Centro de Explicações F (II), para o Centro de Explicações F. (vide Recorded on 11-Nov-2021 at 10.24.19 (3J7SOB(101120319) 19:49-24:45)
22. A recorrente tem o direito de decidir transferir alunos de uma turma toda, de um centro de explicações (F I) para outro centro de explicações (F 2), ou ter a decisão de repor à situação de origem, o que afectam absolutamente a receita e o funcionamento do centro de explicações, sendo uma decisão importante, até à receita mensal do "F II", à liquidação das contas e à decisão de o dinheiro a ser distribuído.
23. a decisão recorrida, de acordo com o depoimento da parte feito pela recorrente, reconheceu o artigo 64o dos factos a serem provados: “Em Junho de 2018, a autora decidiu transferir a turma de quarta classe do ensino primário que encarregava no Centro de Explicações F (II), para voltar ao Centro de Explicações F, o que levou a uma diminuição da receita do Centro de Explicações F (II) a partir de então”. Portanto, a decisão da recorrente de transferir de volta a turma de quarta classe do ensino primário é de grande importância para determinar a relação entre a recorrente e a segunda ré.
24. É considerado existir contradições na análise do tribunal a quo, sobre os depoimentos das testemunhas, a prova documental e o conteúdo do depoimento da parte acima mencionados, não podendo a prova documental e o depoimento das testemunhas confirmar firmemente os artigos 1º a 9º, os artigos 60º, 61º e do artigo 63º dos factos a serem provados, relativos à existência de cooperação, parceria, etc. entre a recorrente e a terceira ré.
25. A recorrente entende que os artigos 1º, 2º, 3º, 6º, 7º, 8º, 9º, 60º, 61º e 63o dos factos a serem provados, baseando em erros na apreciação e apreciação das provas, há assim erros na apreciação de factos e devem ser alterados.
26. O artigo 1º dos factos a serem provados deve ser alterado para: “A autora também é a única empresária do Centro de Explicações F (II)”
27. O artigo 2º dos factos a serem provados deve ser alterado para: “A autora tem gerido e operado, na qualidade de única operadora, o Centro de Explicações F e o Centro de Explicações F (II).”
28. O artigos 3o e 60º dos factos a serem provados devem ser alterados para: “Num momento que não pode ser especificado antes de Setembro de 2014, em que o marido da autora e o terceiro réu eram colegas, e através do terceiro réu, soube de que a segunda ré tinha experiência de trabalho de centro de explicações, a autora e seu marido convidaram a segunda ré para administrar o Centro de Explicações F (II).”
29. O artigo 6º dos factos a serem provados deve ser alterado para: “Em Setembro de 2014, a autora e a segunda ré concordaram em que a segunda ré compartilharia 40% dos dividendos do Centro de Explicações F (II), e a partir de Março de 2015, as duas partes concordaram que a segunda ré teria direito a, para além da correspondente remuneração de explicadora do Centro de Explicações F (II), compartilhar um dividendo de 50% do referido Centro de Explicações calculado e determinado pela autora."
30. O artigo 7º e 63º dos factos a serem provados devem ser alterados para: “Para que a segunda ré confirme e receba o bónus, a autora e a segunda ré abriram uma conta conjunta no Banco da X, Sucursal de Macau, e o número da conta é: ...”
31. O artigo 8º dos factos a serem provados deve ser alterado para: “A autora depositou todos os lucros líquidos pertencentes ao Centro de Explicações F (II) na conta conjunta acima mencionada, e então a segunda ré saca regularmente da conta o valor dos dividendos que a autora determinou que a última pode obter.”
32. O artigo 9º dos factos a serem provados deve ser alterado para: “A segunda ré nunca fez nenhum investimento ao Centro de Explicações F (II), mas foi contratada pela autora para administrar o Centro de Explicações F (II), por isso, recebia apenas salários e bónus como empregada.”
33. Com base na existência dos vícios no reconhecimento dos factos da decisão recorrida, foi erradamente determinado que a recorrente e a segunda ré tinham uma parceria interna, a razão é que o tribunal a quo acreditava erradamente que a segunda ré prestou trabalho ao Centro de Explicações F (II) - administrar o supracitado centro de explicações.
34. Por meio de prova documental dos autos, que a segunda ré tem mensalmente recebido remuneração para administrar o Centro de Explicações F (II). Ao proferir a decisão relevante, o tribunal a quo obviamente ignorou o conteúdo de que a segunda ré tinha recebido uma remuneração.
35. A segunda ré não prestou o trabalho em troca do lucro do centro de explicações.
36. Ao receber remuneração como contrapartida de seu trabalho prestado, o tribunal a quo considerou que a segunda ré efectuou contribuições de trabalho para estabelecer seu estatuto de parceria, o que claramente violou as regras da experiência comum.
37. Ainda que a remuneração mensal recebida seja considerada insuficiente em contrapartida ao trabalho prestado pela segunda ré no centro de explicações, isso também não pode estabelecer a existência de uma parceria, dado que (do ponto de vista das pessoas comuns) a recorrente opera o respectivo centro de explicações há muito tempo, a segunda ré não pode apenas usar o seu trabalho prestado como uma contribuição razoável para lhe dar o direito e a estatuto de partilhar uma metade dos lucros com a recorrente, ou seja, 50% dos lucros, portanto, o respectivo bónus só deve ser entendido como um tratamento mais favorável dado pela recorrente a uma trabalhadora mais importante.
38. Não havendo parceria entre a recorrente e a segunda ré, a segunda ré é apenas uma empregada com direitos especiais - recebendo remuneração mensal e recebendo dividendos determinados pela recorrente, portanto, a segunda ré não possui quaisquer direitos patrimoniais aos papéis de exames simulados e materiais pedagógicos do Centro de Explicações F (II).
39. Devido ao facto de a prova documental constante dos autos, o depoimento das testemunhas e o teor do depoimento da parte não poderem provar a determinação do tribunal a quo de que a recorrente e a segunda ré tinham a relação de cooperação e parceria, etc. no Centro de Explicações F (II), fez com que a decisão recorrida aplicasse erradamente as disposições sobre a parceria aludido no artigo 184o do Código Civil.
40. A recorrente entende que a decisão recorrida tem erro na interpretação do artigo 156º do Código Comercial, ao analisar se o acto dos três réus constitui ou não o acto de concorrência desleal.
41. Quanto à teoria académica, é geralmente apontado que afectar maliciosamente o funcionamento interno do concorrente é obviamente um acto de concorrência que viola as normas das atividades económicas e os usos honestos.
42. De acordo com os artigos 30º, 31º, 33º, 34º, 42º, 43º e 50º dos factos a serem provados já confirmados na decisão recorrida, provaram-se que quando a segunda ré deixou de exercer qualquer actividade no Centro de Explicações F (II), não se limitou a enviar aos encarregados de educação de alunos no Centro de Explicações F (II) mensagens com conteúdo para solicitar negócios, também retirou as informações didácticas no referido centro de explicações, o que faz com que o docente do Centro de Explicações F (II) despendesse mais dois a três meses para recolher informações.
43. A taxa de explicações e refeições indicadas na supracitada mensagem com conteúdo para solicitar negócios enviada pela segunda ré é obviamente mais barata do que a taxa cobrada pelo Centro de Explicações F (II) em Janeiro de 2019, e a taxa para cada turma é reduzida em 200 patacas a menos.
44. Através dos artigos 47º, 48º, 49º e 51º dos factos a serem provados já confirmados, sabe-se que os alunos que costumavam receber explicações no Centro de Explicações F (II) transferiram-se para o Centro de Explicações F (III); e em circunstância de a aula de explicações regular se prolongar por um ano inteiro, depois de a segunda ré ter enviado a mensagem do artigo 31º dos factos a serem provados já confirmados, os alunos que estavam a receber explicações no Centro de Explicações F (II) sucessivamente abandonaram o Centro de Explicações F (II).
45. A mensagem do artigo 31º dos factos a serem provados já confirmados remetida pela 2ª ré constitui o acto de concorrência que objectivamente se revele contrário às normas e aos usos honestos previsto no artigo 158.º do Código Comercial - Atrair clientes de concorrentes do mesmo sector a um preço menor do que os concorrentes do mesmo sector e influenciar maliciosamente as operações internas dos concorrentes de acordo com os princípios académicos - Retirou as informações didácticas do Centro de Explicações F (II).
46. A decisão recorrida tem vícios na interpretação da lei, devendo o tribunal de instância superior decidir que o acto da segunda ré constitui e está em conformidade com a concorrência desleal aludida no artigo 158º do Código Comercial.
47. Por o acto acima mencionado praticado pela segunda ré ser um acto de concorrência desleal, causou directamente o prejuízo à recorrente.
48. Nos termos do artigo 172º do Código Comercial, a ré deve necessariamente assumir a responsabilidade de indemnização.
49. Em referência ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal n.º 6742/1999.L1.S2, a recorrente não precisa de provar que todos os clientes se transferiram para a ré (o que é realmente difícil de fazer), mas apenas precisa de provar que a recorrente perdeu clientes ou potenciais clientes, tendo em conta que a recorrente, através dos artigos 47º, 48º e 49º dos factos a serem provados já confirmados, provou que os alunos que costumavam receber explicações no Centro de Explicações F (II) deixaram de o fazer no referido centro, isso já é suficiente.
50. A perda da recorrente é as propinas de explicações emergentes dos alunos que efectivamente perdeu naquele momento (pelo menos até ao fim do ano lectivo).
51. O tribunal de instância superior, através dos factos provados, pode condenar os actos dos réus a levar directa e necessariamente à perda da recorrente, devendo ser obrigados a indemnizá-la pelos danos causados.
52. A decisão recorrida baseia-se no conteúdo alegado pela recorrente na petição inicial, especialmente no conteúdo dos artigos 4º, 5º, 7º e 10º existem as disposições da alínea b) do no. 2 do artigo 385º do Código de Processo Civil: "Tiver alterado a verdade dos factos”, a recorrente não concorda com isso.
53. A alegação da recorrente na sua petição inicial não destorceu quaisquer factos importantes para a decisão do processo.
54. O Boletim de Inscrição da Direcção dos Serviços de Finanças da segunda ré foi anexado pela recorrente quando apresentou a petição inicial, as provas documentais apresentados pela segunda ré (conteúdo das fls. 155 dos autos - "indemnização rescisória de C constante da demonstração integrada de receitas e despesas feita pela recorrente). Entretanto, a recorrente também explicou voluntariamente ao tribunal na petição inicial que uma conta conjunta foi aberta em nome da recorrente e da segunda ré, bem como apresentou documentos ao tribunal.
55. Nos termos do no. 2 do artigo 9º do Código de Processo Civil, a recorrente não deve expor factos não correspondentes à verdade, pelo que a recorrente é obrigada a expor as suas convicções ao tribunal.
56. Não devemos acreditar que uma parte deva violar o princípio da boa-fé e constituir a litigância de má-fé porque acreditamos que os factos alegados por uma parte não foram provados, ou a versão contrária foi provada, após a audiência de julgamento.
57. O objectivo da alegação da recorrente é tornar mais fácil para o tribunal entender a posição da recorrente ao propor uma acção do ponto de vista e cognição subjectiva da recorrente.
58. Mesmo que o tribunal finalmente considere que o conteúdo das alegações nos artigos 4, 5, 7 e 10 da petição inicial não está provado e a versão alegada pela ré seja relativamente provada, também não atende à situação aludida na alínea b) do no. 2 do artigo 385º do Código de Processo Civil.
59. A recorrente sempre acreditou que a segunda ré era apenas uma empregada com direitos especiais, e pelos factos a serem provados já confirmados, a recorrente sempre acreditou que ela própria exercia o direito de decidir sobre todos os exercícios de decisão do Centro de Explicações F (II).
60. Salvo o pressuposto de respeitar as opiniões do tribunal a quo, o tribunal a quo não podia impor à recorrente uma série de termos jurídicos relativamente complexos, como parceria e operação conjunta, e esperava que o público em geral tivesse o mesmo entendimento.
61. Requer ao tribunal de instância superior que considere os fundamentos acima mencionados e cancele a decisão de que a recorrente foi condenada como litigante de má-fé na decisão recorrida, e cancele a decisão de aplicação de multa à recorrente.
Face ao acima exposto, devem ser julgados procedentes os fundamentos de recurso, em consequência:
a. Seja cancelada a decisão a quo e sejam novamente ouvidas as gravações de audiência de julgamento: Recorded on 11-Nov-2021 at 10.24.19 (3J7SOB(101120319)38:45-43:39, Recorded on 11-Nov-2021 at 10.24.19 (3J7SOB(101120319) 19:49-24:45, bem como novamente apreciados os conteúdos constantes nas fls. 119, 122, 125, 131, 134, 143, 146 e 150 dos autos, sendo alterada directamente a decisão proferida em relação â matéria de facto.
b. Sejam directamente julgados procedentes todos os pedidos da recorrente, cancelada a decisão de que julgou a recorrente como litigante de má fé e no pagamento de multa.
  Contra-alegando vieram os Réus/Recorridos apresentar as seguintes conclusões:
A. A recorrente interpôs recurso por não concordar com o acórdão e a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo e por entender que havia vícios de “erro na apreciação da prova”, “erro na aplicação da Lei” e “erro na aplicação do regime (sic.) da litigância de má fé.
B. Com o pressuposto de respeitar as diferentes opiniões, os recorridos manifestam o respeito, mas não concordam com isso.
C. Quanto à parte de “erro na apreciação da prova”, os recorrentes (sic.) concordam plenamente com a decisão do tribunal a quo sobre a determinação e reprovação de determinados factos no presente processo, e entendem que a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal a quo não contém o vício de “erro na apreciação da prova”, com base nisso, deve ser indeferida essa parte do recurso da recorrente. Depreende-se da parte da fundamentação da decisão a quo que os réus acreditavam que o tribunal a quo havia analisado, de forma rigorosa, objectiva, abrangente e crítica, o depoimento da parte da recorrente e os depoimentos das testemunhas na audiência de julgamento e, em seguida, em conjugação com apreciação documental e com outras provas na audiência de julgamento, foi proferida a decisão de afirmação ou não afirmação dos determinados factos.
D. O tribunal goza da liberdade de apreciar as provas e reconhecer os factos, ou seja, fazer julgamento com base no senso comum e nas regras da experiência. Apenas quando houver um erro notório, o tribunal de instância superior fará a correcção no recurso. Em outras palavras, o erro deve ser óbvio e comum e também pode ser facilmente encontrado pelas pessoas comuns.
E. No entanto, neste processo, se verificamos, do ponto de vista de uma pessoa comum e de acordo com a experiência de vida comum, as demostrações de receitas e despesas e os registos de transferências bancárias nas fls. 94 a 162 dos autos, podemos facilmente concluir que “a recorrente e a segunda ré utilizam conjuntamente esta conta bancária para compartilhar os lucros da operação de uma empresa”.
F. Em 19 de Outubro de 2015, as pessoas constituíram em conjunto a “B Educação Grupo Limitada” (ou seja, primeira recorrida) e esta detinha o “F III” como titular, o que reflecte directamente o “animus” e o “corpus” de a recorrente, a segunda recorrida e o terceiro recorrido operarem em conjunto a “Marca do F”. De acordo com a forma de transferência de contas constante das fls. 156 a 162 dos autos, a recorrente e os recorridos, antes da constituição da primeira recorrida, já distribuíram os lucros da operação conjunta da “F II” de acordo com a proporção acordada.
G. E o ponto mais importante é que, de acordo com as fls. 93 a 105, 156 dos autos, a recorrente e a segunda recorrida já depositaram no dia da abertura da conta bancária um montante de MOP$132.370,00 (cento e trinta e duas mil, trezentas e setenta patacas), esse valor foi proveniente do lucro da operação conjunta do “F II” entre a recorrente e os recorridos desde Setembro de 2014 antes da data da abertura da conta.
H. Obviamente, a prova documental acima mencionada nos autos mostra consistentemente que a recorrente começou a considerar a segunda recorrida como uma parceira de operação já em Setembro de 2015, e não apenas como uma funcionária mais importante.
I. O tribunal a quo indicou nas fls. 27 a 28 da decisão sobre a matéria de facto que já considerou pormenorizadamente todas as provas do caso antes de deliberar sobre a matéria de facto e explicou os critérios de livre apreciação da prova.
J. Além disso, ao facto de a recorrente salientou que a mesma possuía mais poder decisório que a segunda recorrida na distribuição dos lucros e transferência de turma do “F II” em relação aos recorridos, portanto, deve-se decidir que a segunda recorrida é apenas uma empregada, esse raciocínio também não é razoável.
K. Desde que a recorrente e a segunda recorrida começaram a cooperar para operar o “F II” em 2014, as duas pessoas concordaram com a divisão interna do trabalho no “F II”: a recorrente era responsável pelos assuntos financeiros internos, enquanto a segunda recorrida era responsável pelo ensino externo. Pelo que, a recorrente é responsável pelo cálculo das despesas diárias e distribuição de lucros do “F II”, que é sua obrigação como parceira, aliás, ela só registou as contas de acordo com os lucros brutos concretos do “F II”. De acordo com as demostrações de receitas e despesas e registos de transferências bancárias das fls. 94 a 162 dos autos, os saldos mensais de receitas e despesas do “F II” correspondem às receitas do banco, pelo que na verdade não pode e não cabe à recorrente decidir por sua iniciativa.
L. Quanto ao acto arbitrário de a recorrente ter transferido por sua iniciativa, os alunos do “F II”, o que não significava que ela tivesse o direito de decidir, mas só ela decidiu pela própria iniciativa, a segunda recorrida e o terceiro recorrido não concordaram com isso, mas porque a recorrente havia completado a operação da transferência de turma quando as duas pessoas souberam disso, as duas pessoas se sentiram desamparadas, então ficaram insatisfeitas e pediram à recorrente para dissolver a parceria.
M. A recorrente não deve considerar o seu acto arbitrário como tendo poder de decisão, assim como um sócio de uma sociedade limitada pode extrair ou transferir bens da sociedade sem o consentimento ou conhecimento de outros sócios, isso apenas demonstra que o sócio é suspeito de abusar confiança, mas não pode ser demonstrado que tem poder de decisão individual sobre o património da sociedade.
N. A ênfase da recorrente nas alegações de recurso de que ela praticou o acto acima mencionado apenas demonstrou que ela não respeitou o acordo de parceria estabelecido com a segunda recorrida.
O. No entanto, o tribunal a quo afirmou claramente nas fls. 28 da decisão sobre a matéria de facto, que tinha apreciado a parte da remuneração recebida pela segunda recorrida e, também tinha explicado o fundamento da decisão sobre a matéria de facto.
P. Assim, devem ser julgados improcedentes os fundamentos de recurso da recorrente sobre que o tribunal a quo aplicou erradamente as disposições relativas à parceria do artigo 184º do Código Civil. Conforme acima referido, a decisão do tribunal a quo sobre a matéria de facto não padeceu do vício de “erro na apreciação da prova”, e a recorrente não contestou em relação à qualificação jurídica do tribunal a quo aludida no artigo 184º do Código Civil. Então, de acordo com os factos provados no presente processo, especialmente os factos dos artigos 1º a 9º, artigos 60º a 61º e artigo 63º, a determinação do tribunal a quo de constatar que havia uma parceria interna entre a recorrente e a segunda recorrida foi absolutamente correcta. Pelo que, deve ser indeferido esta parte do pedido de recurso da recorrente.
Q. Em relação à “erro na aplicação da lei”, a recorrente considerou principalmente que, de acordo com os factos dos artigos 30º a 31º, 33º a 34º, 42º a 43º e 47º a 51º, o tribunal a quo cometeu um erro na decisão sobre se os actos dos recorridos eram adequadas para usar o regime jurídico de "concorrência desleal" previsto no artigo 156o e artigos seguintes do Código Comercial.
R. Os recorrentes (sic.) concordam plenamente com a qualificação jurídica feita pelo tribunal a quo, em primeiro lugar, o preço de explicações e de refeições do “F III” mencionado pela recorrente no fundamento de recurso é mais barato do que o do “F II” e está reunido o disposto no artigo 158º do Código Comercial sobre violação de usos honestos, mesmo que o preço do “F III” seja diferente do da mesma indústria, não se pode provar que o preço relativamente baixo do “F III” viola o critério da indústria.
S. Além disso, a recorrente nunca forneceu e explicou se existiam normas que a indústria devia seguir em relação ao preço de explicações e de refeições.
T. Em termos de preços, mesmo na nossa profissão de advogado ou no sector de restauração, a fixação dos honorários de advogados ou os preços de restauração, os pacotes preferenciais exclusivos lançados podem ser diferentes, mesmo que os clientes escolham o preço com mais desconto como critério de selecção, isso não significa que destrua as normas e usos honestos.
U. Em suma, a alegação da recorrente de que o preço do “F III” é mais barato do que o do “F II” é totalmente não reunido as disposições do artigo 158º do Código Comercial sobre usos honestos, a título complementar, o preço do “F III” não atendeu ao disposto no artigo 169º do Código Comercial.
V. Nos termos do nº 1 do artigo 156º do Código Comercial, podemos saber de que, ao se ponderar sobre a utilização do regime de concorrência desleal sobre o assunto em questão, deve-se comprovar que o assunto tem por objecto a concorrência desleal.
W. Revela-se nos factos provados que dez e tal de alunos deixaram de receber explicações no “F II” desde Janeiro de 2019, e alguns deles transferiram-se para o “F III”, mas, em relação ao motivo concreto, não há qualquer facto provado que estivesse relacionado com a conduta dos respectivos recorridos.
X. Além disso, os factos provados também mostram que quando a recorrente e seu marido alienaram a quota da primeira recorrida para o terceiro recorrido em 31 de Dezembro de 2018, a recorrida e seu marido concordaram em permitir que os recorridos continuassem a usar a denominação empresarial "F III" e a operar de forma independente.
Y. Dessa forma, depois de a segunda recorrida ter terminado a parceria do “F II” com a recorrente e transferida para o “F III” para continuar a operar o centro e trabalhar como explicadora junto ao terceiro recorrido, a segunda recorrida enviou aos encarregados de educação conhecidos mensagem contida no artigo 31o dos factos a serem provados aludidos na resposta, não há nada inadequado.
Z. Dessa forma, a segunda recorrida enviou a mensagem acima mencionada aos encarregados de educação em nome de “F III”, não pensava subjectivamente em que violou algum direito da recorrente, pois, na opinião da segunda recorrida, todos apenas dissolveram a parceria e esta apenas notificou os encarregados de educação do facto de que a parceria foi dissolvida. Quanto ao facto de se os encarregados de educação deixarem seus filhos transferir-se do “F II” para “F III”, cabe inteiramente aos encarregados de educação ou alunos compararem o corpo ducente ou factores ambientais após a dissolução de parceria do “F II” e do “F III”.
AA. E objectivamente, se os encarregados de educação ou alunos não gostam de seguir a segunda recorrida como explicadora, mas preferem o local do “F II”, acreditava que nunca decidiriam transferir-se do centro de explicações só porque receberam uma mensagem de conteúdo tão simples. Assim como os clientes vão a um salão de cabeleireiro para cortar cabelo, eles seguem mais o cabeleireiro do que o ambiente do salão.
BB. Os artigos 47º e 48º dos factos a serem provados já confirmados, podem sustentar o argumento acima mencionado. Os dois encarregados de educação indicaram claramente que seus filhos decidiram transferir-se para o então “F III” porque gostavam de seguir a segunda recorrida, não é que a segunda recorrida os convencesse para se transferir para o referido centro de explicação através de chamadas telefónicas, etc.
CC. Nos termos de retirada de materiais didácticos, de facto, ficou provado que a perda de alguns materiais didácticos teve um certo impacto ao funcionamento do “F II”, no entanto, os recorridos entendem que isso se devia apenas ao comportamento da terminação da parceria entre a segunda recorrida e a recorrente (o término da operação conjunta).
DD. Aliás, os factos provados demonstram que a segunda recorrida e a recorrente operam em conjunto o “F II”, ou seja, ambos também possuíam a qualidade de empregador, e a segunda recorrida também participou na produção de materiais didácticos. Neste caso, a segunda recorrida, no dia em que terminou a relação de cooperação do “F II” com a recorrente, apenas retirou as coisas que julgava pertencer a ela (após a dissolução da relação de cooperação), ainda que a perda dessas coisas afectasse o “F II”, mas esses impactos são inevitáveis ​​em resposta à dissolução da relação de cooperação das duas cooperadoras. Assim como a segunda recorrida também perdeu algo para o “F II” (sic.) após a dissolução da parceria (excluindo os itens que levou com sucesso e o corpo docente (sic.), etc.).
EE. Em suma, a razão pela qual a operação do “F II” tem um impacto é que a segunda recorrida e a recorrente se separaram devido à dissolução da parceria, e não pela concorrência desleal que a segunda recorrida fez à recorrente.
FF. Face ao exposto, os actos dos recorridos, subjectiva ou objectivamente, não foram praticados para fins de concorrência, e não há indícios de que seus actos tenham violado as normas das atividades económicas e os usos honestos, e não tenham reunido as normas gerais de concorrência desleal aludidas no artigo 156º e seguintes do Código Comercial, e/ou qualquer conduta típica ou atípica de concorrência desleal. Com base nisso, a decisão proferida pelo tribunal a quo não possui o vício de “erro na aplicação da lei”, de modo que esta parte no recurso da recorrente deve ser julgado improcedente.
GG. Em relação à erro na aplicação do regime (sic.) de litigância de má fé alegado pela recorrente, os recorridos entendem que as razões invocadas pela recorrente não são justificadas. o objecto da apreciação de factos envolvido neste caso não poderia ser simplesmente um mal-entendido subjectivo ou uma falácia cognoscitiva legal para a recorrente. Em conjugação com as provas dos autos e as regras da experiência comum, desde que façamos uma análise adequada, podemos facilmente confirmar a relação de operação conjunta entre a recorrente e a segunda recorrida desde 2015.
HH. Obviamente, neste caso, a recorrente alegou falsamente que era a empregadora da segunda recorrida e dissimulou a relação de cooperação entre ambos, pelo que os recorrentes (sic.) concordam com a decisão do tribunal a quo nesta parte.
II. Conforme claramente indicado nas fls. 36 do acórdão proferido pelo tribunal a quo, com base nisso, a decisão proferida pelo tribunal a quo não tem vício do erro na aplicação do regime (sic.) de litigância de má fé, devendo ser indeferida esta parte do recurso da recorrente.

Foram colhidos os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO

Vem a Recorrente impugnar a matéria de facto no que concerne às respostas dadas aos quesitos 1º, 2º, 3º, 6º, 7º, 8º, 9º, 60º, 61º, e 63º da Base Instrutória, pese embora por vezes refira 1º a 9º embora, depois, quando concretiza apenas o faça relativamente àqueles e nunca quanto ao 4º e 5º.
Indica a Recorrente para fundamentar o erro na apreciação da matéria de facto os documentos a fls. 119, 122, 125, 131, 134, 143, 146 e 150, bem como as passagens dos depoimentos que transcreve.
Para melhor facilidade de análise transcrevem-se os indicados quesitos da Base Instrutória e as respostas dadas.
1.º
A Autora também é a única empresária do Centro de Explicações de F (II)?
Foi apenas provado que, antes de Setembro de 2014, a Autora é a única operadora do Centro de Explicações de F (II).
2.º
A Autora tem gerido e operado todos os negócios do Centro de Explicações de F e do Centro de Explicações de F (II) como a única empresária destes, durante o período a reputação comercial do Centro de Explicações de F e do Centro de Explicações de F (II) tem sido muito boa e o volume de negócios e o número de estudantes têm vindo a aumentar?
Foi apenas provado que, antes de Setembro de 2014, a Autora geriu e operou o Centro de Explicações de F e o Centro de Explicações de F (II), na qualidade de única operada.
3.º
Em 2014, devido a uma escassez de pessoal, a Autora foi apresentada à 2.ª Ré pelo 3.º Réu (a 2.ª Ré e o 3.º Réu tinham uma relação amorosa nessa altura). Considerando que a 2.ª Ré tinha experiência de trabalho nuns centros de explicações e tinha contactos no sector de explicações, a Autora nomeou então a 2.ª Ré para recrutar tutores para o Centro de Explicações de F (II)?
O mesmo facto foi provado como na resposta ao Quesito 60.º.
6.º
Tendo em conta a natureza do trabalho da 2.ª Ré, a fim de lhe permitir trabalhar mais e gerir bem o Centro de Explicações de F (II), a Autora decidiu pagar à 2.ª Ré 50% do lucro líquido do Centro de Explicações de F (II) como bónus, para além de um salário fixo?
Foi apenas provado que, em Setembro de 2014, a Autora e a 2.ª Ré acordaram que a 2.ª Ré partilharia 40% do lucro líquido do Centro de Explicações de F (II). E desde Março de 2015, as partes acordaram que a 2.ª Ré teria direito a 50% do lucro líquido do Centro de Explicações de F (II), para além da remuneração correspondente como tutora daquele Centro.
7.º
A fim de facilitar a confirmação e cobrança do bónus pela 2.ª Ré, a Autora e a 2.ª Ré criaram uma conta conjunta na sucursal de Macau do Banco da X sob o número de conta ... (ver fls. 37 a 44 dos autos)?
Foi provado que, a fim de permitir à 2.ª Ré participar no lucro líquido, a Autora e a 2.ª Ré abriram uma conta conjunta na sucursal de Macau do Banco da X com o número de conta ....
8.º
A Autora depositou todo o lucro líquido pertencente ao Centro de Explicações de F (II) na conta conjunta acima referida todos os meses e a 2.ª Ré levantou o correspondente numerário da conta num período regular?
Foi provado que, a Autora depositou todo o lucro líquido pertencente ao Centro de Explicações de F (II) na referida conta conjunta e que a 2.ª Ré levantou regularmente da conta a parte do lucro líquido pertencente a esta última.
9.º
A 2.ª Ré nunca fez qualquer investimento no Centro de Explicações de F (II), mas apenas foi contratada pela Autora para gerir o Centro de Explicações de F (II) e, portanto, apenas tinha recebido salários e bónus como empregada?
Não foi provado.
60.º
Por volta de meados de 2014, devido às dificuldades no funcionamento do Centro de Explicações de F (II), o marido da Autora era um colega do 3.º Réu nessa altura e ao saber que a 2.ª Ré tinha experiência de trabalho num centro de explicações, a Autora e o seu marido tomaram a iniciativa de convidar a 2.ª Ré a juntar-se ao Centro de Explicações de F (II) para gerirem o negócio em conjunto?
Foi provado que, numa altura não especificada antes de Setembro de 2014, o marido da Autora era um colega do 3.º Réu nessa altura e ao saber que a 2.ª Ré tinha experiência de trabalho num centro de explicações, a Autora e o seu marido convidaram a 2.ª Ré a juntar-se ao Centro de Explicações de F (II) para gerir o negócio em conjunto com a Autora.
61.º
Após a negociação entre a Autora e a 2.ª Ré e o 3.º Réu, foi decidido que a 2.ª Ré operaria temporariamente o Centro de Explicações de F (II) em anonimato com a Autora em conjunto.
Foi provado.
63.º
A Autora e a 2.ª Ré decidiram abrir uma conta conjunta no Banco da X em Macau para efeitos de divisão razoável de contas?
Foi provado o mesmo conteúdo que a resposta ao quesito 7.º.

A fundamentação do tribunal “a quo” relativamente as respostas dadas a esta matéria é a seguinte:
«O ponto de controvérsia mais crucial do facto neste caso é que se a 2.ª Ré era uma empregada comum que foi contratada pela Autora para trabalhar no Centro de Explicações de F (II)1.
As fls. 29 e 243 dos autos mostram respectivamente que a abertura da empresa de “F II” foi registada em 2007, e que era a entidade licenciadaquando foi atribuída a licença do Centro de Apoio Didáctico Complementar Particular em 2007 e 2010 bem como o enderenço registado de “F II”.
Além disso, os documentos constantes de fls. 94 a 155 dos autos (onde os registos começam em Setembro de 2014), de fls. 156 (onde a data de emissão da caderneta da conta bancária conjunta da Autora e da 2.ª Ré é de 5 de Fevereiro de 2015). Noutro processo penal, o marido da Autora, E (que também prestava a testemunhar neste processo), os 2.ª e 3.º Réus declararam também que a 2.ª Ré começou a participar nos assuntos do “F II” em Setembro de 2014 (ver fls. 350 a 360).
As provas acima referidas são suficientes para convencer o Tribunal de que, antes de Setembro de 2014, a Autora era a única operada do “F II”.
Em relação à forma como a 2.ª Ré tem estado envolvido no “F II” desde Setembro de 2014, devem ser consideradas neste caso, em particular, as seguintes provas: as provas documentais constantes de fls. 94 a 155 dos autos (das quais se deve salientar que as fls. 119, 122, 125, 131, 134, 143, 146 e 150 contêm a expressão “dividendos aos sócios” e que alguns dos documentos acima referidos correspondem a períodos anteriores à operação do “F III”; nas tabelas constantes de fls. 148 e 149 existe uma coluna de “dividendos aos sócios”). Os registos da conta conjunta da Autora e da 2.ª Ré são apresentados de fls. 156 a 162 e o 3.º Réu (não a 2.ª Ré, por ênfase) foi registado como coordenador do “F II” em 16 de Abril de 2015, a fls. 243.
De facto, se a 2.ª Ré fosse apenas uma empregada comum do “F II”, mesmo que a Autora quisesse oferecer uma remuneração generosa para que a 2.ª Ré continuasse a trabalhar no centro de explicações, não teria de abrir uma conta conjunta com a 2.ª Ré na qual qualquer uma das titulares da conta pudesse levantar dinheiro separadamente, nem teria utilizado a expressão “dividendos aos sócios” nas contas do “F II”, nem teria de registar o marido (D) de uma empregada como coordenador do “F II” em Abril de 2015 (antes do estabelecimento da 1.ª Ré e do início efectivo dos negócios da “F III” – vide facto assente D) ), e a 2.ª Ré não deveria ter adiantado o depósito a título de caução para o arrendamento da loja em que se encontrava o “F II” (ver “Lao deveria ter recuperado o depósito” de fls. 155, e o facto de adiamento foi confirmado pela testemunha E no seu testemunho neste caso, embora por razões diferentes). As circunstâncias acima referidas convenceram suficientemente o Tribunal de que, desde Setembro de 2014, a Autora e a 2.ª Ré tinham operado juntos “F II” e que tinham partilhado o lucro líquido num rácio acordado (inicialmente 60% para a Autora e 40% para a 2.ª Ré e depois 50/50).
Deve acrescentar-se que o Tribunal não aceitou o testemunho de E de que a 2.ª Ré só foi responsável pela introdução de tutores e pela gestão do “F II” até Março de 2015, e recebeu 40% do lucro do “F II" como parte da remuneração. De facto, o simples trabalho de introduzir tutores e gerir o “F II” não foi suficiente para explicar porque é que a 2.ª Ré foi tão generosamente remunerada. Pelo contrário, pelas razões expostas no parágrafo anterior, a prova objectiva neste caso demonstra suficientemente que, desde Setembro de 2014, a Autora e a 2.ª Ré têm vindo a operar “F II” em conjunto e que é devido a esta cooperação dos negócios que a 2.ª Ré tem direito a uma quota de 40% no lucro líquido e que, desde Março de 2015 (a abertura do registo do imposto profissional da 2.ª Ré e o seu emprego como tutora que exercia a função em regime de acumulação na “F II” - ver fls. 35 dos autos), a 2.ª Ré tem direito a 50% no lucro líquido do “F II”, para além da remuneração correspondente pelo seu emprego como tutora que exercia a função em regime de acumulação.
O Tribunal analisa e reconhece os quesitos 1.º a 9.º; 60.º, 61.º e 63.º de acordo com as razões expostas nos parágrafos acima.».

Nas suas alegações e conclusões de recurso pretende a Autora convencer de que os pagamentos e respectivos valores dos lucros da F (II) entregues à 2ª Ré eram decididos apenas por si à revelia da 2ª Ré.
Contudo dos documentos por si indicados nada resulta que venha infirmar os fundamentos e conclusões do tribunal “a quo” quanto a esta matéria.
A própria testemunha E marido da Autora e relativamente ao qual esta cita várias passagens do seu depoimento nas alegações do recurso, refere nessas mesmas passagens que:
«… “o bónus não é distribuído em cada mês, pode ser de 2 ou 3 meses, ou seja, pode ser distribuído conforme o acordo de todos sobre como distribuir. Caso o dinheiro seja depositado em outra conta, pode ser melhor, mais claro, sabendo quanto bónus cada um tem, sendo assim aberta uma conta de duas pessoas e esses lucros foram depositados nessa conta.
(…)
Não será distribuído integralmente, ainda existe uma possibilidade, é uma fracção, se o bónus for 110.000, então será distribuído 100.000, ou seja, eles vão calcular uma vez a cada três meses, uma vez a cada três meses, e elas mesmas vão calcular, sendo isto o seu método de cálculo e eu mesmo não sei muito bem.
(…)
…no meu ponto de vista, deveria ser distribuído integralmente, ou seja, não sei quanto a minha esposa ia distribuir.
(…)
Depois de a minha esposa calcular o lucro do centro 2, depositava o lucro do centro 2 na conta.
Juiz: Ou seja, a conta é simplesmente de lucro líquido, e é a mesma conta de C?
Testemunha: Sim.
Juiz: Desta forma, voltando à questão, já que é lucro líquido, se for 115000, será distribuído em 50% de 115000.
Testemunha: Dessa forma, pode ser que para elas, porque o sector de explicações é muito especial, não temos nenhum cliente aqui em Julho e Agosto, ou vem pouca gente, portanto, às vezes haverá mais gastos em Julho e Agosto, então ela tem que arranjar algum dinheiro para resolver o problema dos gastos em excesso, significa que pode não haver lucro nesses dois meses, se não houver lucro, o dinheiro será usado para a dedução.”.

Ora, o que resulta daquelas passagens não é o que a Autora pretende mas que havia uma conta entre a Autora e a 2ª Ré onde era depositado o lucro líquido do F (II) de onde Autora e 2ª Ré levantavam a parte que lhes cabia na proporção de 50/50 e ainda mais, onde ficava sempre um valor residual para cobrirem despesas que pudessem ocorrer nos meses em que não havia proveitos.
Ou seja a conta entre a Autora e a 2ª Ré não existia só para a partilha dos lucros mas também para concorrerem ambas e na mesma proporção nas despesas.
Destarte, nada do que se invoca afasta a convicção e a fundamentação do tribunal “a quo” no que concerne à matéria impugnada, mais não fazendo a Recorrente do que tentar impor o seu ponto vista, o qual seria favorável à sua pretensão mas que não conseguiu demonstrar.
Sobre esta matéria veja-se Acórdão deste Tribunal de 15.10.2021 proferido no processo nº 240/2021:
«Ora bem, dispõe o artigo 629.º, n.º 1, alínea a) do CPC que a decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pelo Tribunal de Segunda Instância se, entre outros casos, do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada a decisão com base neles proferida.
Estatui-se nos termos do artigo 558.º do CPC que:
“1. O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
2. Mas quando a lei exija, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial, não pode esta ser dispensada.”
Como se referiu no Acórdão deste TSI, de 20.9.2012, no Processo n.º 551/2012: “…se o colectivo da 1ª instância, fez a análise de todos os dados e se, perante eventual dúvida, de que aliás se fez eco na explanação dos fundamentos da convicção, atingiu um determinado resultado, só perante uma evidência é que o tribunal superior poderia fazer inflectir o sentido da prova. E mesmo assim, em presença dos requisitos de ordem adjectiva plasmados no art. 599.º, n.º 1 e 2 do CPC.”
Também se decidiu no Acórdão deste TSI, de 28.5.2015, no Processo n.º 332/2015 que:“A primeira instância formou a sua convicção com base num conjunto de elementos, entre os quais a prova testemunhal produzida, e o tribunal “ad quem”, salvo erro grosseiro e visível que logo detecte na análise da prova, não deve interferir, sob pena de se transformar a instância de recurso, numa nova instância de prova. É por isso, de resto, que a decisão de facto só pode ser modificada nos casos previstos no art. 629.º do CPC. E é por tudo isto que também dizemos que o tribunal de recurso não pode censurar a relevância e a credibilidade que, no quadro da imediação e da livre apreciação das provas, o tribunal recorrido atribuiu ao depoimento de testemunhas a cuja inquirição procedeu.”
A convicção do Tribunal alicerça-se no conjunto de provas produzidas em audiência, sendo mais comuns as provas testemunhal e documental, competindo ao julgador valorar os elementos que melhor entender, nada impedindo que se confira maior relevância ou valor a determinadas provas em detrimento de outras, salvo excepções previstas na lei.
Não raras vezes, pode acontecer que determinada versão factual seja sustentada pelo depoimento de algumas testemunhas, mas contrariada pelo depoimento de outras. Neste caso, cabe ao Tribunal valorá-las segundo a sua íntima convicção.
Ademais, não estando em causa prova plena, todos os meios de prova têm idêntico valor, cometendo-se ao julgador a liberdade da sua valoração e decidir segundo a sua prudente convicção acerca dos factos controvertidos, em função das regras da lógica e da experiência comum.
Assim, estando no âmbito da livre valoração e convicção do julgador, a alteração das respostas dadas pelo tribunal recorrido à matéria de facto só será viável se conseguir lograr de que houve erro grosseiro e manifesto na apreciação da prova.
Analisada a prova produzida na primeira instância, a saber, a prova documental junta aos autos e o depoimento das testemunhas, entendemos não assistir razão aos autores.».
Em sentido idêntico veja-se Acórdão deste tribunal de 09.05.2019, proferido no processo nº 240/2019, em cujo sumário se diz:
«I – Em matéria de impugnação de matéria de facto, a especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem questionar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio delimitam o objecto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto. Por sua vez, a especificação dos concretos meios probatórios convocados, bem como a indicação exacta das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de base para a reapreciação do Tribunal de recurso, ainda que a este incumba o poder inquisitório de tomar em consideração toda a prova produzida relevante para tal reapreciação, como decorre hoje, claramente, do preceituado no artigo 629º do CPC.
  II - para que a decisão da 1ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal”, se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.».
  Deste modo, não resultando da fundamentação do tribunal “a quo” quanto às respostas dadas à Base Instrutória, erro grosseiro e manifesto, de acordo com o disposto na al. b) do nº 1 e nº 2 do artº 599º do CPC, estando devidamente fundamentada e alicerçada na prova produzida a convicção a que chegou, impõe-se que se negue provimento ao recurso no que concerne à impugnação da matéria de facto.
  
a) Factos

A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
1. Em 2004, a Autora estabeleceu o Centro de Explicações F e procedeu às formalidades de início de actividade na Direcção dos Serviços de Finanças, cujo objecto social é centro de explicações, com o endereço na Avenida…, R/C e Sobreloja, sendo a Autora a única empresária (cfr. fls. 26 dos autos). (alínea A) dos factos assentes)
2. Em 4 de Janeiro de 2007, a Autora estabeleceu o Centro de Explicações F II e procedeu às formalidades de início de actividade na Direcção dos Serviços de Finanças, cujo objecto social é dar explicações, actualmente com o endereço na Avenida…, R/C e Sobreloja (cfr. fls. 29 a 30 dos autos). (alínea B) dos factos assentes)
3. Em 19 de Outubro de 2015, o marido da Autora E, a 2.ª Ré e o 3.º Réu estabeleceram a B Educação Grupo Limitada (1.ª Ré) com a finalidade de exercer em comum o Centro de Explicações F III que ia ser estabelecido em breve, sendo E o presidente do conselho da administração, o 3.º Réu o gerente-geral e a 2.ª Ré a gerente (cfr. fls. 46 a 52 dos autos). (alínea C) dos factos assentes)
4. Em Setembro de 2016, a 1.ª Ré estabeleceu o Centro de Explicações F III e procedeu às formalidades de início de actividade na Direcção dos Serviços de Finanças, com o endereço na Rua…, R/C, Loja E. (alínea D) dos factos assentes)
5. O Centro de Explicações F III era gerido pelo 3.º Réu e pela sua irmã mais nova (uma dos formadores do Centro de Explicações F III), não tendo o marido da Autora e a 2.ª Réu participado na gestão efectiva deste. (alínea E) dos factos assentes)
6. Na altura, o Centro de Explicações F III só prestava serviços de explicações aos alunos do ensino secundário da Escola Secundária X . (alínea F) dos factos assentes)
7. Pouco após o estabelecimento Centro de Apoio Pedagógico G/Centro de Explicações G, a Autora descobriu que uma declaração foi publicada na página oficial no Facebook da 1.ª Ré e na própria página no Facebook do 3.º Réu, cujo conteúdo é: “A Prof.ª Lao, uma dos fundadores deste Centro, era uma dos sócios do Centro de Explicações F II e do Centro de Explicações F III. Recentemente tendo ouvido muitos pais dos alunos dizerem que (H, fundadora do Centro de Explicações F), espalhou por todo o lado que a Prof.ª Lao era sua trabalhadora e descreveu a cena mostrada no vídeo de CCTV em que a Prof.ª Lao saiu do Centro com os seus objectos pessoais como a Prof.ª Lao saiu com os objectos furtados do Centro de Explicações F. O nosso Centro já apresentou denúncia à Polícia e exigiu a efectivação das responsabilidades legais. Vimos, também por este meio, mostrar a prova factual para comprovar que a Prof.ª Lao era uma dos sócios do Centro de Explicações F II e do Centro de Explicações F III, em vez de trabalhadora destes como dito por H.” Para servir de prova, juntaram-se os registos relativos à conta conjunta da Autora e da 2.ª Ré abaixo da declaração. (alínea G) dos factos assentes)
8. A 2.ª Ré e o 3.º Réu casaram-se no início de 2017 (cfr. fls. 60 dos autos). (alínea H dos factos assentes)
- Factos dados como provados após audiência de julgamento: (cfr. fundamentos dos factos provados a fls. 363 a 380 dos autos)
9. Antes de Setembro de 2014, a Autora era a única operadora do Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 1.º da base instrutória)
10. Antes de Setembro de 2014, a Autora geria e exercia o Centro de Explicações e o Centro de Explicações II na qualidade de única operadora. (resposta ao artigo 2.º da base instrutória)
11. Provado como resulta da resposta ao artigo 60.º da base instrutória. (resposta ao artigo 3.º da base instrutória)
12. Desde Março de 2015, a 2.ª Ré exercia, em acumulação, as funções de formadora no Centro de Explicações F II, e para tal, a Autora preencheu e apresentou junto da Direcção dos Serviços de Finanças o boletim de inscrição do imposto profissional da 2.ª Ré (cfr. fls. 35 dos autos). (resposta ao artigo 4.º da base instrutória)
13. Desde Setembro de 2014, a 2.ª Ré responsabilizava-se pela gestão do Centro de Explicações F II, incluindo as tarefas de gestão de pessoal do Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 5.º da base instrutória)
14. Em Setembro de 2014, a Autora e a Ré acordaram que a 2.ª Ré ia repartir 40% do lucro líquido do Centro de Explicações F II, e desde Março de 2015, ambas as partes combinaram que para além de renumeração correspondente às funções de formadora do Centro de Explicações F II, a 2.ª Ré também ia repartir 50% do lucro líquido deste centro de explicações. (resposta ao artigo 6.º da base instrutória)
15. Para repartir o lucro líquido com a 2.ª Ré, a Autora e a 2.ª Ré abriram uma conta conjunta no Banco da X, Sucursal de Macau, sob o n.º .... (resposta ao artigo 7.º da base instrutória)
16. A Autora depositava todo o lucro líquido do Centro de Explicações F II na aludida conta conjunta, e depois, a 2.ª Ré levantava periodicamente da conta o lucro líquido a que tinha direito. (resposta ao artigo 8.º da base instrutória)
17. Ao estabelecer o Centro de Explicações F III, o Centro de Explicação F tinha como destinatários alunos do jardim de infância ao 4.º ano de escolaridade da Escolha X , o Centro de Explicação F II tinha como destinatários alunos do 5.º ao 6.º ano de escolaridade da mesma escola e o Centro de Explicações F III tinha como destinatários alunos do ensino secundário da mesma escola. (resposta ao artigo 10.º da base instrutória)
18. Desde o início de actividade, o Centro de Explicações F III tinha enfrentado pressão de insuficiência de alunos. (resposta ao artigo 11.º da base instrutória)
19. Pelo menos em 19 de Dezembro de 2018, por não ser ideal o resultado da exploração do Centro de Explicações F III, o marido da Autora, a 2.ª Ré e o 3.º Réu concordaram em cessar a cooperação no Centro de Explicações F III (resposta ao artigo 15.º da base instrutória)
20. Em 11 de Dezembro de 2018, o 3.º Réu assinou, em nome da 1.ª Ré, um “contrato provisório de alienação” a fls. 53 dos autos com I. (resposta ao artigo 16.º da base instrutória)
21. Ao assinar o “contrato provisório de alienação” a fls. 53 dos autos em nome da 1.ª Ré com I, o 3.º Réu recebeu uma quantia de HKD50.000,00 como sinal. (resposta ao artigo 18.º da base instrutória)
22. Provado como resulta da resposta ao artigo 15.º da base instrutória. (resposta ao artigo 19.º da base instrutória)
23. Em 19 de Dezembro de 2018, o marido da Autora manifestou ao 3.º Réu que a Autora ia cessar a relação de cooperação no Centro de Explicações F II com a 2.ª Ré. (resposta aos artigos 20.º e 21.º da base instrutória)
24. Em 20 de Dezembro de 2018, a 2.ª Ré e J entraram na fracção onde funciona o Centro de Explicações F II e encaixotaram alguns recursos didáticos que se encontravam no Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 23.º da base instrutória)
25. De manhã do dia 21 de Dezembro de 2018, K, formadora do Centro de Explicações F II, telefonou à Autora, dizendo que não conseguiu encontrar os materiais didáticos necessários no Centro de Explicações F II, mais informando à Autora que a 2.ª Ré lhe disse que foi esta que escondeu os referidos materiais didáticos. (resposta ao artigo 24.º da base instrutória)
26. Tomando conhecimento do sucedido, a Autora dirigiu-se ao Centro de Explicações F II com o seu irmão mais velho, L, para conhecer melhor o caso, altura em que estavam no local a 2.ª Ré, o 3.º Réu, J e K. (resposta ao artigo 25.º da base instrutória)
27. A 2.ª Ré e o 3.º Réu disseram que iam levar consigo os materiais didáticos já encaixotados. (resposta ao artigo 26.º da base instrutória)
28. Após discussão entre a Autora e a 2.ª Ré mas em vão, a 2.ª Ré e o 3.º Réu levaram os materiais didáticos já encaixotados fora do Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 27.º da base instrutória)
29. Na altura, um veículo estava a esperar fora do Centro, e depois de terem colocado os referidos objectos no referido veículo, a 2.ª Ré e o 3.º Réu saíram do local. (resposta ao artigo 28.º da base instrutória)
30. Feita a contagem pela Autora e por outros formadores do Centro de Explicações F II, verificou-se que alguns recursos didáticos existentes no Centro de Explicações F II, incluindo alguns livros didáticos, livros de referência, fichas de trabalho escolares, fichas de trabalho elaboradas para alunos e enunciados das provas simuladas foram levados para fora do Centro pela 2.ª Ré e pelo 3.º Réu em 21 de Dezembro de 2018. (resposta ao artigo 30.º da base instrutória)
31. Em 21 de Dezembro de 2018, a 2.ª Ré emitiu, através da sua aplicação de comunicação, a seguinte mensagem aos pais dos alunos que frequentavam o Centro de Explicações F II:
“Olá, Pais dos alunos, venho por este meio informar que a partir de Janeiro de 2019, o Centro de Explicações F III desvincular-se-á do Centro de Explicações F e passará a funcionar independentemente, todos os serviços de explicações e refeições e o pessoal docente manter-se-ão inalterados, e para formar uma equipa de pessoal docente mais forte, a Prof.ª Lao do F II ingressará no F III e o F III terá como destinatários alunos que frequentam o 1.º ao 9.º ano de escolaridade. Nestes termos, faça o favor de nos pagar a tarifa do mês de Janeiro no F III. Obrigada pelo vosso apoio!
A nova tarifa de cada ano de escolaridade é a seguinte:
1.ºAno 3000
2.º Ano 3100
3.º Ano 3200
4.º Ano 3300
5.º Ano 3400
6.º Ano 3500
7.º Ano 3600
8.º Ano 3700
9.º Ano 3800
Desejo um feliz Natal
F III” (resposta ao artigo 31.º da base instrutória)
32. No Centro de Explicações F II existem as formas de contacto dos pais dos alunos para os contactar caso necessário. Todos os trabalhadores do Centro de Explicações F II podem ter acesso aos aludidos dados. (resposta ao artigo 33.º da base instrutória)
33. A 2.ª Ré emitiu aos pais dos alunos a mensagem referida na resposta ao artigo 31.º da base instrutória através das formas de contacto destes. (resposta ao artigo 34.º da base instrutória)
34. Depois de a 2.ª Ré ter emitido a mensagem referida na resposta ao artigo 31.º da base instrutória, alguns pais dos alunos procuraram saber a situação de funcionamento do Centro de Explicações F II junto da Autora. (resposta ao artigo 35.º da base instrutória)
35. Em 31 de Dezembro de 2018, o marido da Autora, E, alienou todas as suas acções da 1.ª Ré ao 3.º Réu. (resposta ao artigo 39.º da base instrutória)
36. As aludidas acções que originalmente pertenciam a E ainda estão registadas a favor do 3.º Réu. (resposta ao artigo 40.º da base instrutória)
37. Dado que alguns recursos didáticos foram levados, os formadores do Centro de Explicações F II, incluindo K, precisaram de recolher novamente os livros didáticos e os livros de referência levados pela 2.ª Ré e pelo 3.º Réu e elaborar novamente as fichas de trabalho e os enunciados das provas simuladas levados pela 2.ª Ré e pelo Réu que não foram digitalizados. (resposta ao artigo 42.º da base instrutória)
38. Decorridos 2 a 3 meses, os recursos didáticos novamente elaborados pelos formadores do Centro de Explicações F II voltaram ao nível semelhante ao que estavam antes do dia 21 de Dezembro de 2018. (resposta ao artigo 43.º da base instrutória)
39. Em Fevereiro de 2019, o Centro de Explicações F II alterou a sua denominação inscrita para Centro de Apoio Pedagógico G/Centro de Explicações G, sendo o titular da licença ainda a 1.ª Ré. (resposta ao artigo 44.º da base instrutória)
40. Desde Janeiro de 2019, numa turma do Centro de Explicações F II que originalmente houve 19 alunos do 6.º ano de escolaridade, 14 decidiram deixar de frequentar o Centro de Explicações F II, e em Fevereiro de 2019, mais 2 alunos deixaram de frequentar o Centro de Explicações F II (respectivamente são M, N, O, P, Q, R, S, T, U, V, W, X, Y, Z, AA e AB). (resposta ao artigo 47.º da base instrutória)
41. Além disso, numa turma do Centro de Explicações F II que originalmente houve 18 alunos do 5.º ano de escolaridade, os pais dos 2 alunos, AC e AD, também decidiram deixar de frequentar o Centro de Explicações F II a partir de Janeiro de 2019; e em Fevereiro, mais uma aluna, AE, também deixou de frequentar o Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 48.º da base instrutória)
42. Entre os alunos mencionados nas respostas aos artigos 47.º e 48.º da base instrutória, há, pelo menos, uma parte que passou a frequentar o Centro de Explicações F III – cuja denominação foi posteriormente alterada para Centro de Apoio Pedagógico G/Centro de Explicações G. (resposta ao artigo 49.º da base instrutória)
43. Desde Janeiro de 2019, as tarifas cobradas pelo Centro de Explicações F II são as seguintes:
i. 5.º ano de escolaridade, MOP$3.600,00;
ii. 6.º ano de escolaridade, MOP$3.700,00. (resposta ao artigo 50.º da base instrutória)
44. Habitualmente, os alunos que recorrem a explicações em centros de explicações frequentam as aulas de explicações durante todo o ano lectivo, isto é, desde Setembro do ano a Junho do próximo ano. Desde o momento em que os alunos mencionados nas respostas aos artigos 47.º e 48.º da base instrutória deixaram de frequentar o Centro de Explicações F II, tais alunos nunca mais pagaram as correspondentes tarifas ao Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 51.º da base instrutória)
45. Os recursos didáticos levados pela 2.ª Ré e pelo 3.º Réu têm o uso efectivo para o Centro de Explicações F II, sendo indispensáveis ao funcionamento deste. (resposta ao artigo 55.º da base instrutória)
46. Dado que alguns recursos didáticos do Centro de Explicações F II foram levados pela 2.ª Ré e pelo 3.º Réu, o Centro de Explicações F II não conseguiu fornecer materiais de estudo suficientes aos seus alunos num curto período de tempo. (resposta ao artigo 56.º da base instrutória)
47. Provado como resulta da resposta ao artigo 43.º da base instrutória. (resposta ao artigo 57.º da base instrutória)
48. A declaração mencionada na alínea G) dos factos assentes é uma declaração pública, podendo ser lida por qualquer pessoa. Caso o seu conteúdo seja lido por outra pessoa, é possível levá-la a ter uma má impressão na Autora, entendendo que a Autora terá denegrido maliciosamente outrem, e levantar dúvida sobre a personalidade moral da Autora. (resposta ao artigo 58.º da base instrutória)
49. Em data não concretamente apurada antes de Setembro de 2014, o marido da Autora e o 3.º Réu eram colegas. Depois de saber junto do 3.º Réu que a 2.ª Ré tinha experiências em centro de explicações, a Autora e o seu marido convidaram a 2.ª Ré para exercer em comum o Centro de Explicações F II com a Autora. (resposta ao artigo 60.º da base instrutória)
50. Por acordo entre si, a Autora, a 2.ª Ré e o 3.º Réu decidiram que a 2.ª Ré ia exercer, temporariamente e sob forma anónima, o Centro de Explicações F II em conjunto com a Autora. (resposta ao artigo 61.º da base instrutória)
51. Provado como resulta da resposta ao artigo 7.º da base instrutória (resposta ao artigo 63.º da base instrutória)
52. Em Junho de 2018, a Autora decidiu passar o Centro de Explicações F responsabilizar-se pela turma do 4.º ano escolaridade que originalmente era da responsabilidade do Centro de Explicações F II, o que diminuiu, desde já, as receitas do Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 64.º da base instrutória)
53. Apenas provado como resulta da resposta ao artigo 15.º da base instrutória. (resposta ao artigo 66.º da base instrutória)
54. Provado como resulta da resposta aos artigos 15.º e 21.º da base instrutória. (resposta ao artigo 67.º da base instrutória)
55. Apenas provado como resulta da resposta aos artigos 16.º e 18.º da base instrutória. (resposta ao artigo 68.º da base instrutória)
56. A transacção envolvida no “contrato provisório de alienação” a fls. 53 dos autos acabou por não ser concluída. (resposta ao artigo 69.º da base instrutória)
57. Em data não concretamente apurada de Dezembro de 2018, o marido da Autora concordou em repartir as participações da 1.ª Ré com o 3.º Réu, e em 31 de Dezembro de 2018, acabou por alienar as suas acções pelo valor nominal de MOP$20.000,00 cada ao 3.º Réu. (resposta ao artigo 70.º da base instrutória)
58. Após o incidente referido na resposta ao artigo 21.º da base instrutória, a 2.ª Ré e a sua amiga J dirigiram-se ao Centro de Explicações F II em 20 de Dezembro de 2018 para arrumar os seus objectos pessoais e encaixotar alguns recursos didáticos que se encontravam no Centro de Explicações F II, o referido decurso foi filmado pela câmara do Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 71.º da base instrutória)
59. De manhã do dia 21 de Dezembro de 2019, a 2.ª Ré regressou ao Centro de Explicações F II e levou consigo o computador que se encontrava no referido centro de explicações. (resposta ao artigo 73.º da base instrutória)
60. Durante o período em que explorava em comum o Centro de Explciações F II com a Autora, a 2.ª Ré acumulava, desde Março de 2015, as funções de formadora, elaborando alguns materiais didáticos e enunciados das provas simuladas para o uso dos seus alunos. (resposta ao artigo 74.º da base instrutória)
61. Outros formadores do Centro de Explicações F II usavam nas aulas os materiais didáticos elaborados pela 2.ª Ré. (resposta ao artigo 75.º da base instrutória)
62. O Centro de Explicações F III – cuja denominação foi posteriormente alterada para Centro de Apoio Pedagógico G/Centro de Explicações G, abriu inscrições em 21 de Dezembro de 2018 e muitos dos alunos inscritos são os que frequentavam o Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 76.º da base instrutória)
63. Os alunos que originalmente frequentavam o Centro de Explicações F II e os seus pais sabem que a 2.ª Ré era uma das formadoras e operadoras do Centro de Explicações F II. (resposta ao artigo 77.º da base instrutória)
64. Alguns alunos que tinham frequentado o Centro de Explicações F II e seus pais disseram à 2.ª Ré que a Autora tinha mostrado aos alunos do Centro de Explicações F II o vídeo mencionado na resposta ao artigo 71.º da base instrutória. (resposta ao artigo 78.º da base instrutória)
65. Ao mostrar o aludido vídeo aos alunos, a Autora disse-lhes que a 2.ª Ré era a trabalhadora do Centro de Explicações F II e o vídeo mostrou que a 2.ª Ré estava a furtar bens do Centro de Explicações. (resposta ao artigo 79.º da base instrutória)
66. A 2.ª Ré e o 3.º Réu entenderam que os actos da Autora denegriram maliciosamente a 2.ª Ré e afectaram a consideração dos pais dos alunos no Centro de Apoio Pedagógico G/Centro de Explicações G (resposta ao artigo 80.º da base instrutória)
67. Pelo que, o 3.º Réu emitiu, através da página no Facebook da 1.ª Ré e da sua própria página no Facebook, a declaração mencionada na alínea G) dos factos assentes para esclarecer os factos. (resposta ao artigo 81.º da base instrutória)

b) Do Direito

  Vem a Autora e agora Recorrente impugnar a decisão de direito alegando que a mesma enferma de erro ao não concluir pela concorrência desleal e ao concluir pela litigância de má-fé da Autora.
  
  Quanto à concorrência desleal.
  
  É o seguinte o teor da decisão recorrida:
  «V. Aplicação da lei
  No caso em apreço, as questões centrais a apreciar são duas:
  - Se os actos praticados pelos três R.R. dados como provadas após a audiência de julgamento constituem ou não actos de concorrência desleal;
  - Se os três R.R. (ou algum deles) precisam de devolver alguns objectos à Autora e pagar a indemnização pelos referidos actos.
*
  4.1. Exercício do Centro de Explicações F II por parte da Autora e da 2.ª Ré
  Antes de analisar as aludidas duas questões, vem este Tribunal analisar primeiro qual é a situação jurídica do exercício do Centro de Explicações F II (“F 2”) pelas Autora e 2.ª Ré, questão essa é directamente relevante para analisar se os actos dos três R.R. constituem os alegados actos de concorrência desleal.
  No caso em apreço, após a audiência de julgamento, foram dados como provados os seguintes factos:
  - Em 4 de Janeiro de 2007, a Autora estabeleceu o Centro de Explicações F II e procedeu às formalidades de início de actividade na Direcção dos Serviços de Finanças, cujo objecto social é dar explicações, actualmente com o endereço na Avenida…, R/C e Sobreloja (cfr. fls. 29 a 30 dos autos) – artigo 2.º dos factos provados
  - Antes de Setembro de 2014, a Autora geria e exercia o Centro de Explicações e o Centro de Explicações II na qualidade de única operadora – artigo 10.º dos factos provados
  - Desde Março de 2015, a 2.ª Ré exercia, em acumulação, as funções de formadora no Centro de Explicações F II, e para tal, a Autora preencheu e apresentou junto da Direcção dos Serviços de Finanças o boletim de inscrição do imposto profissional da 2.ª Ré – artigo 12.º dos factos provados
  - Desde Setembro de 2014, a 2.ª Ré responsabilizava-se pela gestão do Centro de Explicações F II, incluindo as tarefas de gestão de pessoal do Centro de Explicações F II – artigo 13.º dos factos provados
  - Em data não concretamente apurada antes de Setembro de 2014, o marido da Autora e o 3.º Réu eram colegas. Depois de saber junto do 3.º Réu que a 2.ª Ré tinha experiências em centro de explicações, a Autora e o seu marido convidaram a 2.ª Ré para exercer em comum o Centro de Explicações F II com a Autora – artigo 49.º dos factos provados
  - Por acordo entre si, a Autora, a 2.ª Ré e o 3.º Réu decidiram que a 2.ª Ré ia exercer, temporariamente e sob forma anónima, o Centro de Explicações F II em conjunto com a Autora – artigo 50.º dos factos provados
- Em Setembro de 2014, a Autora e a Ré acordaram que a 2.ª Ré ia repartir 40% do lucro líquido do Centro de Explicações F II, e desde Março de 2015, ambas as partes combinaram que para além de renumeração correspondente às funções de formadora do Centro de Explicações F II, a 2.ª Ré também ia repartir 50% do lucro líquido deste centro de explicações – artigo 14.º dos factos provados
- Para repartir o lucro líquido com a 2.ª Ré, a Autora e a 2.ª Ré abriram uma conta conjunta no Banco da X, Sucursal de Macau, sob o n.º ... – artigo 15.º dos factos provados
- A Autora depositava todo o lucro líquido do Centro de Explicações F II na aludida conta conjunta, e depois, a 2.ª Ré levantava periodicamente da conta o lucro líquido a que tinha direito – artigo 16.º dos factos provados
O F 2 foi estabelecido em 2007, constituindo uma empresa por ter factores produtivos e prestar serviços permanentes aos seus clientes para ganhar lucros. Na altura, o F 2 era exercido e gerido só pela Autora.
Dos factos acima citados resulta que em data não concretamente apurada antes de Setembro de 2014, a Autora e o seu marido convidaram a 2.ª Ré a exercer em comum o F 2 com a Autora, e por acordo entre si, a 2.ª Ré ia exercer, temporariamente e sob forma anónima, o F 2 em conjunto com a Autora.
Neste contexto, como se deve qualificar a relação entre a Autora e a 2.ª Ré e quais são as normas que regulam tal relação?
Antes de mais, este Tribunal entende que pode excluir o “contrato de associação em participação” previsto no artigo 511.º do Código Comercial pois os factos dados como provados revelam que a Autora e a 2.ª Ré “exerciam em comum o Centro de Explicações F II” e a 2.ª Ré contribuiu com serviços em vez de prestar ou obrigar-se a prestar uma contribuição de natureza patrimonial (forma de prestação de contribuição prevista no artigo 554.º n.º 1 do Código Comercial) para trocar a repartição dos lucros (e perdas) do centro de explicações.
Aliás, analisando os factos dados como provados no presente processo, também se pode excluir a aplicação do “contrato de consórcio” previsto no artigo 528.º do Código Comercial (quer modalidade de consórcio externo quer modalidade de consórcio interno) pois os factos dados como provados revelam que a Autora e a 2.ª Ré “exerciam em comum o Centro de Explicações F (II)”, facto esse não preenche qualquer dos objectos enumerados no artigo 529.º do Código Comercial, e o “exercício em comum” entre a Autora e a 2.ª Ré também é diferente da “forma concertada” 2 do “contrato de consórcio”.
A seguir, vamos continuar a analisar se existe a relação de sociedade civil entre a Autora e a 2.ª Ré.
O tradicional Direito Romano limitou-se a qualificar a sociedade civil como relação de dívida entre associados, a sociedade civil não foi reconhecida como pessoa colectiva autónoma.
Antes da entrada em vigor o vigente Código Civil, os artigos 980.º a 1021.º do Código Civil de 1966 regulavam o “contrato de sociedade”.
Nos termos do artigo 980.º do Código Civil de 1966: “contrato de sociedade é aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade.”
Embora conforme a lei antiga as “sociedades” dotassem, em casos específicos, de capacidade jurídica limitada (como por exemplo: Artigo 2033.º n.º 2 alínea b) do Código Civil de 1966) e o Código Civil de 1966 não tomasse expressamente uma posição afirmativa ou negativa sobre tal questão, as doutrinas relativamente dominantes entendem que as “sociedades” (o que dá importância para o presente processo é a sociedade civil pois, evidentemente, ambas as partes não estabeleceram qualquer tipo de sociedades comerciais previstos no Código Comercial) não possuem personalidade jurídica. Os académicos que negam que a sociedade civil tem personalidade jurídica sustentam geralmente que os bens investidos na sociedade civil pelos associados são da comunhão de mão comum dos associados que no direito alemão é chamada gesamthand, também se pode ver o artigo 719.º do Código Civil Alemão.3
António Menezes Cordeiro4 refere que podem ser retirados do artigo 980.º do Código Civil de 1966 três elementos e um outro elemento, ou seja, o quarto elemento de certo modo anterior aos restantes:
- as contribuições das partes
- um exercício em comum
- o fim da repartição dos lucros
- intenção de formar a sociedade ou affectio societatis; isto é, o quarto elemento acima referido)
O vigente Código Civil não segue o mesmo caminho do Código Civil de 1966 que regulava o “contrato de sociedade” como “contrato típico legal”5, mas sim opta por reconhecer expressamente que as “sociedades” são pessoas jurídicas de substrato pessoal.
O artigo 184.º do Código Civil prevê:
“1. As sociedades são pessoas jurídicas de substrato pessoal, cujos membros se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade ou de proporcionarem uma economia.
2. As sociedades são civis ou comerciais.
3. São civis as sociedades que não tenham por objecto o exercício de uma empresa comercial, nem adoptem expressamente um dos tipos de sociedades comerciais; são comerciais todas as outras.
4. A lei especial pode prever a possibilidade de constituição de sociedades unipessoais.”
Apesar de o artigo 184.º do vigente Código Civil não distinguir entre a “sociedade civil externa” e a “sociedade civil interna”6, estas, de facto, apresentam diferentes modalidades na vida real. Como por exemplo, A e B, indivíduos que exercem profissão liberal, abriram um escritório com a denominação de “Escritório de Sociedade Civil AB”. Quer para o externo quer para o interno entre os dois, existe uma “sociedade”, melhor dizendo, uma “sociedade civil”.
Porém, no caso de B não querer mostrar o seu nome, B, mediante acordo com A, compromete-se, no exercício do “Escritório A” cuja denominação é formada pelo nome de A, a prestar serviços ao escritório, gerir o escritório, dar apoio, analisar e acompanhar os casos confiados a A pelos clientes, bem como ter encontros com os clientes e emitir-lhes pareceres, e para tal, B reparte proporcionalmente os lucros resultantes do exercício do “Escritório A”. Nesta circunstância, apesar de existir um acordo interno entre A e B, não existe, externamente, uma “sociedade” de substrato pessoal ou patrimonial.
Salvo melhor entendimento, este Tribunal crê que se deve fazer uma distinção entre a “sociedade civil externa”7 a “sociedade civil interna” seguinte ao artigo 184.º do Código Civil, entre as quais, só a primeira constitui a pessoa colectiva autónoma enquanto a última, apresar de não constituir a pessoa colectiva autónoma, existe relação de dívida entre os associados (apesar de o referido contrato já deixar de ser contrato típico como regulado pela lei antiga).
Quer isto dizer que mesmo no enquadramento do vigente Código Civil, não se impede que dois ou mais sujeitos criam “sociedades civis” através de negócios jurídicos – mesmo que uma das partes participam na sociedade civil sob forma anónima, e a referida organização não pode ser considerada como pessoa colectiva autónoma – para o exercício em comum de certa actividade económica, a fim de repartirem lucros resultantes dessa actividade ou de proporcionarem uma economia.
Sintetizando os factos dados como provados no presente processo, deve-se entender que existe relação de sociedade civil interna8 entre a Autora e a 2.ª Ré (mas tal sociedade civil não tem personalidade jurídica)9.
Os seus fundamentos residem em:
Ambas a Autora e a 2.ª Ré prestaram bens ou serviços. A Autora contribuiu com uma sua empresa já existente – isto é, F 2 – para a referida cooperação10 enquanto a 2.ª Ré contribuiu com os seus serviços – gerir o aludido centro de explicações. Além disso, a Autora e a 2.ª Ré exerciam em comum o F 2 e o seu fim era, obviamente, para repartirem os lucros do F 2 na proporção acordada. Conforme os factos, ambas as partes exerciam em comum o centro de explicações e para tal abriram uma conta conjunta para repartir os lucros, daí pode-se julgar suficientemente que existia relação de sociedade entre a Autora e a 2.ª Ré. Durante o exercício em comum entre a Autora e a 2.ª Ré, a 2.ª Ré e os demais formadores do centro de explicações acumularam incessantemente a reputação e o número de clientes para o centro, e a quantidade de enunciados das provas simuladas e materiais didáticos também aumentaram gradualmente, e no caso de avaria de equipamentos do centro, as receitas do centro também foram usadas para actualizar os respectivos equipamentos e a distribuição de lucros à Autora e à 2.ª Ré só aconteceu quando houvesse lucros.
Nesta situação, os resultados intelectuais obtidos pela contribuição de indústria por parte da 2.ª Ré no enquadramento da sociedade civil e pelos seus serviços durante o funcionamento da aludida empresa (como: enunciados das provas simuladas, exercícios para estudo, fichas de trabalho) são bens comuns de ambas as partes11.
Quer no enquadramento do Código Civil de 1966 quer no do vigente Código Civil, o aludido resultado intelectual não pode ser considerado como bens próprios da Autora ou da 2.ª Ré. Para a Autora, ela contribuiu com uma empresa já existente12, os enunciados das provas simuladas, os exercícios para estudo, as fichas de trabalho e os dados dos clientes13 são resultados produzidos durante a cooperação entre ambas as partes, acumulando a empresa inicialmente exercida pela Autora com a gestão e os serviços prestados pela 2.ª Ré, pelo que, devem ser considerados como bens comuns após a constituição da relação de sociedade entre ambas as partes. Face a isso, a situação também é assim para a 2.ª Ré.
*
Depois de chegar à aludida conclusão, estão reunidas condições para analisar a primeira questão.
4.2. Se os actos praticados pelos três R.R. dados como provados após a audiência de julgamento constituem actos de concorrência desleal
Antes de mais, é necessário recordar os três factos dados como provados no presente processo:
- Pelo menos em 19 de Dezembro de 2018, por não ser ideal o resultado da exploração do Centro de Explicações F III, o marido da Autora, a 2.ª Ré e o 3.º Réu concordaram em cessar a cooperação no Centro de Explicações F III – artigo 19.º dos factos provados
- Em 19 de Dezembro de 2018, o marido da Autora manifestou ao 3.º Réu que a Autora ia cessar a relação de cooperação no Centro de Explicações F II com a 2.ª Ré – artigo 23.º dos factos provados
- Em 31 de Dezembro de 2018, o marido da Autora, E, alienou todas as suas acções da 1.ª Ré ao 3.º Réu – artigo 35.º dos factos provados
Dos factos acima citados e outros factos provados no presente processo resulta que em 19 de Dezembro de 2018, o marido da Autora manifestou ao 3.º Réu que a Autora ia cessar a relação de cooperação no F 2 com a 2.ª Réu, porém, no caso sub judice, não há factos que demonstram que existe qualquer acordo entre ambas as partes sobre a liquidação ou a repartição dos bens da sociedade civil. Tendo em conta o conteúdo do artigo 65.º dos factos provados e a posição mostrada pela Autora no presente processo, pode-se julgar razoavelmente que a Autora só reconheceu que a 2.ª Ré era a trabalhadora do F 2, pelo que, conforme o seu entendimento, mesmo que ambas as pares cessem a cooperação, esta última só tem o direito a que um trabalhador comum deve ter.
Porém, tal como já acima referido, existe entre a Autora e a 2.ª Ré a relação de sociedade civil. Antes de a Autora pretender cessar a relação de cooperação com a 2.ª Ré, é óbvio que a 2.ª Ré tem direito sobre alguns bens existentes no F 2 a que ela deve ter. Pelo menos, é difícil entender que a 2.ª Ré não tem nenhum direito sobre os utensílios e livros de referência comprados com as receitas do exercício do centro de explicações, ou os enunciados das provas simuladas, exercícios para estudo e fichas de trabalho elaborados pela 2.ª Ré e por outros formadores contratados pelo centro de explicações, ou os dados dos clientes depois de a 2.ª Ré ingressar no centro de explicações em causa.
Claro é que durante a liquidação, quais são os direitos e interesses que a Autora e a 2.ª Ré devem ter ou se cada uma que tiver entrado para a sociedade com o uso ou fruição de certos bens tem direito de os levantar, estas são outras questões.
Não falando se a Autora ou a 2.ª Ré tem direito a cessar unilateralmente a relação de cooperação entre ambas as partes, a cessação da relação tem apenas duas possibilidades: a Autora ou a 2.ª Ré adquire os direitos e interesses de outra parte, passando a ser a única operadora; ou ambas as partes procedem à liquidação dos bens comuns da sociedade civil, restituem os bens que devem ser restituídos aos associados (como previsto no artigo 1017.º do Código Civil de 1966), procedem à venda dos bens caso haja necessidade e, após a liquidação de dívidas, efectuam a distribuição do activo restante na proporção da parte que lhes caiba nos direitos e interesses da sociedade civil (quanto à situação prevista na lei antiga, cfr. artigo 1018.º do Código Civil).
Porém, com o devido respeito e salvo a melhor opinião, este Tribunal não verifica que qualquer uma das partes, a Autora ou a 2.ª Ré, tem o direito de negar a qualidade de operadora da sociedade civil que outra parte tem e só a considerar como trabalhadora comum, ou tem o direito de cessar unilateralmente a relação de sociedade ou, sem efectuar a liquidação com outra parte, só exigir que outra parte saía da sociedade civil para passar a exercer, por si só, a empresa.
No caso em apreço, tal como revelam os factos dados como provados, em 19 de Dezembro de 2018, depois de o marido da Autora ter dito ao 3.º Réu que a Autora ia cessar a relação de cooperação no F 2 com a 2.ª Ré, ocorreram os factos constantes dos artigos 7.º, 24.º a 29.º, 31.º, 58.º e 59.º, 64.º, 65.º dos factos provados.
Tal como comprovam os factos provados, até 21 de Dezembro de 2018, ambas as partes, obviamente, deixaram de ter vontade de exercer em comum o F 2. Porém, mesmo que seja assim, ambas as partes ainda têm obrigação de negociar adequadamente no enquadramento do contrato de sociedade para tratar justamente da repartição dos direitos e interesses e dos bens nos termos do artigo 752.º n.º 2 do Código Civil. É verdade, quanto aos livros didáticos, livros de referência, fichas de trabalho escolares, fichas de trabalho preparadas para alunos e enunciados das provas simuladas (em particular os referidos no artigo 30.º dos factos provados), nomeadamente aos objectos pessoais que só foram produzidos após o ingresso da 2.ª Ré no referido centro de explicações e não pertencem a outros formadores contratados pelo centro, caso a Autora não possa continuar a colaborar com a 2.ª Ré, ambas as partes devem ter direito de repartir os referidos bens, pelo que, ou os referidos objectos foram totalmente deixados no centro de explicações para o uso da Autora no exercício contínuo do centro ou totalmente levados fora do centro pela 2.ª Ré para não serem usados pela Autora (pelo menos é necessário certo tempo para recolher novamente tais objectos ou só podem ser usados depois de reimprimir aqueles que têm arquivos electrónicos no computador), isto é injusto para outra parte.
Assim sendo, considerando os motivos acima referidos, apesar de a 2.ª Ré não ser trabalhadora comum, este Tribunal entende objectivamente que os actos praticados pela 2.ª Ré em 20 a 21 de Dezembro de 2018 não são totalmente incensuráveis.
Porém, no caso em apreço, se tais situações constituem actos de concorrência desleal?
4.2.1. Actos dos três R.R. que destruíram a organização
Salvo o melhor entendimento, este Tribunal tem uma opinião negativa.
Por força do artigo 153.º n.º 1 do Código Comercial, “A concorrência entre empresários deve desenvolver-se por forma a não lesar os interesses da economia do Território e nos limites estabelecidos na lei.”
O artigo 156.º do mesmo Código prevê: “1. Os comportamentos previstos neste capítulo consideram-se desleais quando sejam praticados no mercado com fins concorrenciais. 2. Presume-se que o acto é praticado com fins concorrenciais quando, pelas circunstâncias em que se realize, se revele objectivamente idóneo para promover ou assegurar a distribuição no mercado dos produtos ou serviços do próprio ou de terceiro.”
Quanto aos actos de concorrência desleal, o Código Comercial também preceitua a cláusula geral e o seu artigo 158.º prevê: “Constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência que objectivamente se revele contrário às normas e aos usos honestos da actividade económica.”
É de referir, o que o instituto de concorrência desleal regula é a relação de concorrência no mercado (artigo 156.º n.º 1 do Código Comercial). Tal como previsto na cláusula geral acima citada, constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência que objectivamente se revele contrário às normas e aos usos honestos da actividade económica. Para apreciar se um acto concorrencial é desleal, deve-se recorrer aos padrões sociais de conduta e aos padrões éticos do comerciante médio.14
O aludido instituto previsto no Código Comercial não visa proibir a concorrência mas sim impedir a concorrência desleal.
No caso concreto, os actos praticados pela 2.ª Ré em 20 e 21 de Dezembro de 2018 levaram a que o F 2 não pudesse fornecer materiais de estudo aos alunos num curto período de tempo (artigo 46.º dos factos provados), porém, tal como já acima referido, ou os referidos objectos foram totalmente deixados no centro de explicações para o uso da Autora no exercício contínuo do centro ou totalmente levados fora do centro pela 2.ª Ré, isto é injusto para outra parte. Mesmo que o acto da 2.ª Ré que optou por levar fora do centro de explicações os objectos aí existentes, incluindo os materiais didáticos, por o seu direito na sociedade civil ter sido negado, poderá a fazer incorrer em responsabilidade penal (no correspondente processo penal), responsabilidade contratual ou responsabilidade de violação de direito e daí poderá ser efectivada, isto não equivale necessariamente a que tal acto deve ser considerado como acto de concorrência desleal.15 Salvo o melhor entendimento, este Tribunal crê que não se pode elevar o litígio entre a Autora e a 2.ª Ré sobre os bens da sociedade civil para o nível da concorrência desleal, pois a questão controvertida que ambas as partes focam situa-se na reversão de direitos patrimoniais. Dizendo simplesmente, mesmo que no exercício dos direitos, a 2.ª Ré excedesse o âmbito dos seus direitos e assim causasse litígio com a Autora sobre a dissolução da sociedade civil, isto refere-se ao cumprimento do contrato de sociedade entre ambas as partes e ao inadimplemento contratual.
Mais ainda, quanto ao pedido principal da Autora que peticiona aos três R.R. indemnização por danos patrimoniais, é de referir que ao escolher um centro de explicações, o que os pais dos alunos consideram é sempre a reputação do centro de explicações ou a consideração dos alunos sobre os formadores e o nível de confiança. Assim sendo, mesmo que o actos praticados pela 2.ª Ré em 20 e 21 de Dezembro de 2018 levassem a que o F 2 não pudesse fornecer suficientes materiais de estudo aos alunos num curto período de tempo (artigo 46.º dos factos provados), se os pais dos alunos que escolheram sair do F 2 sabiam tal facto ou se a impossibilidade de fornecimento dos referidos materiais didáticos num curto período de tempo levou os pais dos alunos a tomarem tal decisão? Face a isso, é difícil para este Tribunal verificar que existe um nexo de causalidade adequado entre os alegados prejuízos e os actos da 2.ª Ré que teriam destruído a organização. Assim sendo, mesmo que se suponha que os actos da 2.ª Ré e do 3.º Réu constituam os actos que destruíram a organização como alegado pela Autora, o pedido de indemnização por diminuição de receitas formulado pela Autora não pode ser satisfeito.
No que diz respeito à reivindicação de materiais didáticos por parte dos três R.R., os factos provados revelam que alguns materiais didáticos existentes no F 2, incluindo alguns livros didáticos, livros de referência, fichas de trabalho escolares, fichas de trabalho preparados para alunos e enunciados das provas simuladas, foram levados fora do centro de explicações em 21 de Dezembro de 2018 pela 2.ª Ré e pelo 3.º Réu (artigo 29.º dos factos provados). Da análise do artigo 1235.º do Código Civil, a acção de reivindicação é composta por duas partes: 1. Provar a titularidade por parte do autor; 2. Analisar se existe fundamento legítimo em que assente a não restituição pelo réu. Havendo prova e reconhecimento do direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos previstos na lei.
No caso em apreço, os recursos didáticos levados, incluindo alguns livros didáticos, livros de referência, fichas de trabalho escolares, fichas de trabalho preparados para alunos e enunciados das provas simuladas, são os bens em comum produzidos pela Autora e pela 2.ª Ré na sociedade civil, pelo que, deve-se considerar que a Autora provou com sucesso o direito de propriedade dos referidos objectos (independentemente de ser considerada como consorte dos bens em comum ou em comunhão).
Porém, quanto à reivindicação, nos termos dos artigos 1300.º e 1302.º do Código Civil, seja qual for o tipo de comproprietária que a Autora e a 2.ª Ré é, sendo como a consorte, cada uma delas pode usar os referidos objectos, contanto que não os não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive a outra consorte do uso a que igualmente têm direito. Conforme os dispostos legais acima referidos, caso julgue a reivindicação à Autora da coisa comum levada pela 2.ª Ré que igualmente é a consorte, isto equivale à privação do direito a que a 2.ª Ré igualmente tem direito. Pelo que, este Tribunal só julga que a 2.ª Ré reconhece o direito a que a Autora tem, sem prejuízo de a Autora ou a 2.ª Ré requerer a liquidação ou a partilha dos referidos bens mediante processo adequado, ou exercer o seu direito comum pela forma que entender adequada.
4.2.2. Actos de violação de segredos imputados aos três R.R.
A Autora invocou que a 2.ª Ré, usando a sua relação de trabalho no F 2, furtou as formas de contacto dos pais dos alunos e contactou-os sem qualquer autorização para divulgar o F 3, actos esses constituem a violação de segredos prevista no artigo 166.º n.º 1 do Código Comercial.
Com o devido respeito e salvo a melhor opinião, não assiste razão à Autora.
O artigo 166.º do Código Comercial prevê:
“1. Considera-se desleal a divulgação ou exploração, sem autorização do titular, de segredos industriais ou quaisquer outros segredos empresariais a que se tenha tido acesso legitimamente, mas com dever de sigilo, ou ilegitimamente, nomeadamente em consequência de alguma das condutas previstas no artigo seguinte.
2. Para os efeitos deste artigo, considera-se como segredo empresarial toda e qualquer informação técnica ou comercial que tenha utilização prática e proporcione benefícios económicos ao titular, que não seja do conhecimento público, e relativamente à qual o titular tomou as medidas de segurança apropriadas a garantir a respectiva confidencialidade.”
Antes de mais, os factos provados revelam que para além de gerir o F 2, a 2.ª Ré também exercia, em acumulação, as funções de formadora do referido Centro (cfr. artigos 12.º e 13.º dos factos provados), pelo que, no exercício de funções, houve necessidade de contactar os pais dos alunos. Daí resulta que, tendo em conta que a 2.ª Ré era a associada, as formas de contacto dos pais dos alunos não são os secretos comerciais a que a 2.ª Ré não pode ter acesso, e a 2.ª Ré não usou meio ilícito para obter os referidos dados.
Sintetizando os factos provados no presente processo, este Tribunal entende que os actos da 2.ª Ré não constituem as situações de concorrência desleal previstas no disposto legal acima citado.
Servindo de referência do Direito Comparado (apesar de se tratar de actos praticados pelo ex-trabalhador, os seus fundamentos também são aplicáveis ao presente processo), o Tribunal de Relação de Coimbra de Portugal referiu16:
“1. – No âmbito da concorrência desleal, o desvio de clientela ocasiona direito a indemnização se for causado por uma conduta contrária às normas e usos honestos – mediante um comportamento ferido de deslealdade, quanto aos meios utilizados -, uma atuação desonesta/incorrecta e, como tal, inaceitável para o direito.
2. – A cessação da relação laboral devolve ao trabalhador a liberdade de emprego e de trabalho, o qual passa a poder exercer livremente qualquer actividade, mesmo que concorrente com a desenvolvida pelo anterior empregador, mormente se não foi celebrado pacto de não concorrência e desde que não incorra em concorrência desleal.
3. – Se dois trabalhadores da sociedade autora puseram fim aos respectivos contratos de trabalho, após o que foram trabalhar para sociedade concorrente, não pode aquela limitar a atividade concorrencial diferencial dos seus ex-trabalhadores na ausência de pacto de não concorrência.
4. – Tais ex-trabalhadores não incorrem em concorrência desleal se, embora angariando clientes que eram da autora e levando-os a vincular-se à sua nova empregadora (mesmo que constituída e gerida por familiares seus), não se mostra que tal tenha ocorrido antes da extinção do vínculo laboral, nem que para tanto tenham usado meios desleais, designadamente enganando os clientes ou usando informação reservada da autora ou cujo acesso não lhes tivesse sido facultado para o exercício comum da sua prestação laboral anterior.
5. – Também a prática de preços mais baixos que os praticados pela autora, potenciando a transferência de clientela para quem oferece preço inferior para semelhante serviço, não traduz, sem mais, concorrência desonesta/desleal, antes permitindo o normal funcionamento do mercado, em benefício dos consumidores.”
No caso sub judice, depois de a Autora lhe ter manifestado em 19 de Dezembro de 2018 que ambas as partes não iam manter a relação de cooperação, a 2.ª Ré emitiu a mensagem referida no artigo 31.º dos factos provados aos pais dos alunos em 21 de Dezembro de 2018. A referida mensagem referiu que “o Centro de Explicações F III desvincular-se-á do Centro de Explicações F e passará a funcionar independentemente” e “para formar uma equipa de pessoal docente mais forte, a Prof.ª Lao do F II ingressará no F III e o F III terá como destinatários alunos que frequentam o 1.º ao 9.º ano de escolaridade. Nestes termos, faça o favor de nos pagar a tarifa do mês de Janeiro no F III”. Analisando o referido conteúdo, a mensagem emitida pela 2.ª Ré basta para os pais dos alunos que receberam tal mensagem souberam o desvinculo entre o “F 2” e o “F 3”, passando os mesmos a funcionar independentemente e a Prof.ª Lao (ora 2.ª Ré) a trabalhar no Centro de Explicações 3 (isto é, F 3). Face a isso, como os pais dos alunos valorizam a localização, os professores e as tarifas dos dois centros de explicações e decidem o centro de explicações que os seus filhos frequentam, isto é a vontade dos pais dos alunos. Tendo em conta que os referidos pais dos alunos não foram enganados pela aludida mensagem, este Tribunal crê que a emissão da referida mensagem pela 2.ª Ré aos pais dos alunos constantes da lista de contactos do centro de explicações não constitui o acto de violação de segredos nem sequer pode ser considerado como acto de concorrência desleal.
4.2.3. A declaração publicada na página oficial da 1.ª Ré no Facebook e na própria página do 3.º Réu no Facebook poderia constituir acto de denegrição
A Autora entendeu que a declaração publicada na página oficial da 1.ª Ré no Facebook e na própria página do 3.º Réu no Facebook não é exacta uma vez que a Autora não só não fez rumores de que a 2.ª Ré furtou os materiais didáticos do F 2 e a 2.ª Ré nunca é a sócia do F 2. A Autora entendeu que o aludido acto constitui acto de denegrição previsto no artigo 162.º n.º 1 do Código Comercial.
O artigo 162.º do Código Comercial prevê:
“1. Considera-se desleal a realização ou difusão de afirmações sobre a empresa, os produtos, os serviços ou as relações comerciais dos concorrentes que sejam aptas a diminuir o seu crédito no mercado, salvo se forem exactas, verdadeiras e pertinentes.
2. Não se consideram pertinentes as considerações que tenham por objecto a nacionalidade, as convicções religiosas ou ideológicas, a vida privada ou quaisquer outras circunstâncias exclusivamente pessoais do visado.”
Salvo o devido respeito, este Tribunal não entende que a 2.ª Ré e o 3.º Réu praticaram os actos proibidos pelo aludido disposto legal.
No caso sub judice, os factos provados revelam:
- Alguns alunos que tinham frequentado o Centro de Explicações F II e seus pais disseram à 2.ª Ré que a Autora tinha mostrado aos alunos do Centro de Explicações F II o vídeo mencionado na resposta ao artigo 71.º da base instrutória – artigo 64.º dos factos provados
- Ao mostrar o aludido vídeo aos alunos, a Autora disse-lhes que a 2.ª Ré era a trabalhadora do Centro de Explicações F II e o vídeo mostrou que a 2.ª Ré estava a furtar bens do Centro de Explicações – artigo 65.º dos factos provados
- A 2.ª Ré e o 3.º Réu entenderam que os actos da Autora denegriram maliciosamente a 2.ª Ré e afectaram a consideração dos pais dos alunos no Centro de Apoio Pedagógico G/Centro de Explicações G – artigo 66.º dos factos provados
- Pelo que, o 3.º Réu emitiu, através da página no Facebook da 1.ª Ré e da sua própria página no Facebook, a declaração mencionada na alínea G) dos factos assentes para esclarecer os factos – artigo 67.º dos factos provados
Este Tribunal crê que quando a 2.ª Ré que trabalha no Centro de Apoio Pedagógico G/Centro de Explicações G foi criticada pela responsável de outro centro de explicações como ex-trabalhadora e foi acusada de ter furtado bens no centro de explicações, a 1.ª Ré, proprietária do centro de explicações onde a 2.ª Ré trabalha, a 2.ª Ré, alvo da acusação até o seu marido (3.º Réu) têm direito e necessidade de esclarecer e explicar os factos.
Pelo que, ao abrigo da última parte do n.º 1 do artigo 162.º do Código Comercial, o referido esclarecimento deve ser considerado pertinente.
Tal como revela o artigo 7.º dos factos provados, a 1.ª e o 3.º Réu fizeram a seguinte declaração:
“A Prof.ª Lao, uma dos fundadores deste Centro, era uma dos sócios do Centro de Explicações F II e do Centro de Explicações F III. Recentemente tendo ouvido muitos pais dos alunos dizerem que (H, fundadora do Centro de Explicações F), espalhou por todo o lado que a Prof.ª Lao era sua trabalhadora e descreveu a cena mostrada no vídeo de CCTV em que a Prof.ª Lao saiu do Centro com os seus objectos pessoais como a Prof.ª Lao saiu com os objectos furtados do Centro de Explicações F. O nosso Centro já apresentou denúncia à Polícia e exigiu a efectivação das responsabilidades legais. Vimos, também por este meio, mostrar a prova factual para comprovar que a Prof.ª Lao era uma dos sócios do Centro de Explicações F II e do Centro de Explicações F III, em vez de trabalhadora destes como dito por H.”
O ponto central da aludida declaração é esclarecer que a 2.ª Ré não era meramente a trabalhadora do F 2, pelo que, o conteúdo da referida declaração em causa deve ser considerado exacto e verdadeiro.
Nestes termos, este Tribunal entende que não se pode concluir que os actos da 1.ª Ré e do 3.º Réu constituem actos de concorrência desleal.».

Acompanhamos integralmente a decisão recorrida.
Por vezes é preciso coragem para sair dos acostumados lugares comuns para aplicar o direito à situação de facto que nos é submetida, sendo isso o que, com excelência, se faz nesta decisão.
A Recorrente nas suas alegações de Recurso mais não faz do que voltar a sustentar a concorrência desleal no pressuposto de que a sua impugnação da matéria de facto haveria de proceder.
Contudo assim não foi.
Demonstrando-se como resulta da factualidade apurada que a relação entre a Autora e a 2ª Ré no que concerne ao F (II) era uma relação de sociedade com igual repartição dos lucros embora não haja sido formalizada, outra conclusão não se poderia retirar que não aquela que resulta da decisão recorrida Doutamente fundamentada.
Nada mais havendo a acrescentar aos fundamentos da decisão recorrida, para os quais remetemos e aderimos integralmente nos termos do nº 5 do artº 631º do CPC, impõe-se negar provimento ao recurso, no que concerne a este segmento da decisão recorrida.

Quanto à litigância de má-fé.

É o seguinte o teor da decisão recorrida quanto a esta matéria:
«4.3. Acto de litigância de má fé da Autora
Após a audiência de julgamento e tendo em conta as alegações da Autora, nomeadamente os artigos 4.º, 5.º, 7.º e 10.º17 da petição inicial, este Tribunal entende que é possível que a Autora praticou acto de litigância de má fé previstos no artigo 385.º n.º 1 e n.º 2 alínea b) do Código de Processo Civil. Para cumprir o princípio do contraditório, este Tribunal comunicou a Autora para se pronunciar sobre a matéria, e por sua vez, a Autora negou ter praticado acto de litigância de má fé.
Antes de mais, é de apontar que qualquer pessoa em geral pode distinguir se um indivíduo é trabalhador comum ou titular dos direitos e interesses na operação social e se um indivíduo recebe o salário e o “bónus” extraordinário só na qualidade de trabalhador comum ou se recebe o “bónus” na qualidade de sócio ou titular dos direitos e interesses. É possível que os cidadãos em geral não são capazes de saber precisamente a respectiva qualificação jurídica, porém, se for apenas um trabalhador, este não pode ser o titular dos direitos e interesses e se for titular dos direitos e interesses, nunca este pode ser considerado como trabalhador comum.
Tal como analisado pelo Tribunal Colectivo quando deu como provados os factos no presente processo, as provas do presente processo são suficientes para demonstrar que a 2.ª Ré não era apenas uma trabalhadora:
“Para saber qual a forma pela qual a 2.ª Ré participou no “F II”desde Setembro de 2014, deve-se atender nomeadamente às seguintes provas: provas documentais a fls. 94 a 155 dos autos (é de salientar que fls. 119, 122, 125, 131, 134, 143, 146, 150 contêm a expressão de “bónus a sócios” e as datas de alguns documentos acima referidos são anteriores ao exercício do F III”; o mapa a fls. 148 e 149 contém a rubrica de “bónus a sócios”; fls. 156 a 162 contêm os registos de conta conjunta da Autora e da 2.ª Ré; fls. 243 mostra que o 3.º Réu (é de salientar que não é a 2.ª Ré) foi registado como coordenador do “F II” em 16 de Abril de 2015.
De facto, caso a 2.ª Ré fosse apenas contratada como trabalhadora comum do “F II”, mesmo que a Autora lhe pretendesse oferecer benefícios favoráveis para a 2.ª Ré continuar a trabalhar no centro de explicações, não foi necessário que a Autora abriu uma conta conjunta com a 2.ª Ré em que o depósito podia ser levantado isoladamente por qualquer um dos titulares, nem foi necessário constar da conta do “F II” “bónus a sócios” nem sequer foi necessário registar o marido (D) de uma trabalhadora como coordenador do “F II) em Abril de 2015 (anterior ao estabelecimento da 1.ª Ré e à data concreta de início da actividade do “F II” – cfr. alínea D) dos factos assentes), e o sinal para aluguer a loja onde se situa o “F II” também não devia ser pago antecipadamente pela 2.ª Ré (cfr. “sinal que deve ser recebido por Lao” constante de fls. 155 dos autos, bem como a testemunha do presente processo, E, também confirmou o facto sobre o pagamento antecipado do sinal, mesmo que tal testemunha apresentasse uma versão diferente para explicar tal facto). As aludidas circunstâncias são suficientes para fazer o Tribunal acreditar que desde Setembro de 2014, a Autora e a 2.ª Ré começaram a exercer o “F II” e repartir o lucro líquido na proporção acordada (inicialmente 60% para a Autora e 40% para a 2.ª Ré; e posteriormente, 50% para cada uma).
É de acrescentar que de entre os depoimentos prestados por E, este Tribunal não acolheu a parte em que antes de Março de 2015, a 2.ª Ré só se responsabilizava por apresentar formadores e gerir o “F II” e, para tal, recebia 40% do lucro líquido do “F II” como remuneração. De facto, a mera tarefa de apresentar formadores e gerir o “F II” não basta para explicar porque a 2.ª Ré podia ter benefícios tão favoráveis. Pelo contrário, conforme as razões mencionadas no parágrafo anterior, as provas objectivas do presente processo demonstram suficientemente que desde Setembro de 2014, a Autora e a 2.ª Ré exerciam em comum o “F II” e também por causa de tal exercício em comum entre ambas as partes, a 2.ª Ré podia ter direito de repartir 40% do lucro líquido, e desde Março de 2015 (procedeu-se à inscrição do início de emprego da 2.ª Ré no âmbito do imposto profissional e a 2.ª Ré começou a exercer, em acumulação, as funções de formadora no “F II” – cfr. fls. 35 dos autos), a 2.ª Ré, para além de receber a remuneração correspondente às funções de formadora em acumulação, também podia repartir 50% do lucro líquido do “F II)”.
Aliás, também é de referir, face à questão a saber se a 2.ª Ré era apenas uma “trabalhadora”, os referidos factos não são meramente factos de apoio. Tal como já acima analisado, se a 2.ª Ré era associada ou trabalhadora, isto tem valor relevante para a questão de concorrência desleal do presente processo. Se a 2.ª Ré retirou alguns objectos do centro de explicações em 21 de Dezembro de 2018 e emitiu mensagem aos pais dos alunos do centro de explicações (conforme o entendimento da Autora, a 2.ª Ré, aproveitando a relação de trabalho que tinha no F 2, usou, sem autorização, as formas de contacto dos pais dos alunos) meramente na qualidade de trabalhadora comum, isto, obviamente, é diferente do que a 2.ª Ré praticou os mesmos actos em outra qualidade. Além disso, se as afirmações feitas pela Autora a alguns alunos de que a 2.ª Ré era sua ex-trabalhadora e o referido vídeo mostrou que a 2.ª Ré estava a furtar os objectos do centro de explicações são exactas, e mesmo mais tarde a 1.ª Ré e o 3.º Réu emitiram declaração no Facebook, tudo isso tem a ver com o facto de a 2.ª Ré ser ou não apenas uma trabalhadora comum.
Salvo o devido respeito, quer no presente processo cível, quer em outros dois processos penais em que envolvem a Autora e a 2.ª Ré (cfr. fls. 267 a 292 dos autos), os referidos factos são relevantes.
Evidentemente, ao alegar os factos, a Autora alterou a verdade dos factos relevantes para a decisão da causa. Apesar de existir a relação de cooperação com a 2.ª Ré, a Autora ainda disse que a 2.ª Ré era apenas uma trabalhadora comum. Tal acto, pelo menos, foi praticado com negligência grave, preenchendo o acto de litigância de má fé previsto no artigo 385.º n.º 1 e n.º 2 alínea b) do Código de Processo Civil.
Pelos acima expostos, este Tribunal considera que a Autora praticou o aludido acto de litigância de má fé, pelo que, condena a Autora na multa de 10 UC por tal acto.».

Nesta parte não acompanhamos a decisão recorrida.
A Autora configurou a acção como base na relação de empregador/empregado que formalmente havia entre si e a 2ª Ré.
Em face do que existe nos autos evidente é o litígio que há entre as partes, agravado pela indefinição da caracterização jurídica da relação que houve entre ambas.
Se é certo que as partes ao carrearem para os autos os factos necessários à composição do litígio não devem faltar à verdade, também não é menos verdade que apenas lhes é exigido invocarem os factos que sustentam a sua pretensão, cabendo à parte contrária invocar os factos relativos às excepções por si invocadas.
A incerteza da caracterização jurídica da relação existente entre a Autora e a 2ª Ré é tão evidente quanto justificou a elaboração jurídica da decisão recorrida, recorrendo a uma aprofundada interpretação da lei, para encontrar uma solução que se adequasse ao caso de forma a compor o litígio de uma forma justa e equilibrada para ambas as partes.
Não podemos ignorar que na própria decisão recorrida se reconhece que os bens retirados pela 2ª Ré pertenciam a esta e à Autora em sociedade, reconhecendo-se também a dado passo que “os actos praticados pela 2ª Ré em 20 e 21 de Dezembro de 2018 não são totalmente incensuráveis”.
Ou seja, na indefinição da situação Autora e 2ªRé esgrimiram nos autos os argumentos que lhes eram favoráveis, mas daí não resulta que hajam deduzido pretensão a que não tivessem direito.
Veja-se que a decisão conclui que recursos didáticos elencados são bens da Autora e da 2ª Ré e improcedem os demais pedidos, terminando na prática com o que poderíamos qualificar em linguagem desportiva como um empate técnico remetendo as partes se quiserem para uma acção de divisão dos bens que têm em comum.
Destarte, entendemos não estarem preenchidos os pressupostos para se concluir que a Autora haja usado de negligência grave omitindo factos, pelo que, no que concerne à condenação como litigante de má-fé entendemos ser de proceder o recurso revogando-se a decisão recorrida.
III. DECISÃO
  
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, concedendo-se parcialmente provimento ao recurso, revoga-se a decisão recorrida no que concerne à condenação como litigante de má-fé da Autora, improcedendo em tudo o mais o recurso, mantendo-se a decisão recorrida no remanescente nos seus precisos termos.

Custas a cargo da Recorrente e Recorrida nesta instância na proporção de 4/5 para aquela e 1/5 para esta.

Registe e Notifique.

RAEM, 23 de Março de 2023
  Rui Pereira Ribeiro
  (Relator)
  
  Fong Man Chong
  (Primeiro Juiz Adjunto)
  
  Ho Wai Neng
(Segundo Juiz Adjunto)
  

1 Os três centros de explicações envolvidos neste caso serão adiante abreviadamente designados por “F”, “F II” e “F III”.
2 Quanto à distinção entre os dois, cfr. Raul Ventura, Primeiras Notas Sobre o Contrato de Consórico, ROA, Ano 41, Vol. III e Jorge Manuel Coutinho de Abreu, CURSO DE DIREITO COMERCIAL, Volume II, 2011, 4.ª edição, obra citada, página 36 a 38.
3 Também cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. II, 4.ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Limitada, páginas 287 a 288.
4 MANUEL DAS SOCIEDADE, I, Das Sociedades em geral, Almedina, 2007, 2.ª Edi., página 312. Também cfr. Jorge Manuel Coutinho de Abreu na obra citada, páginas 5 a 6: “Retiram-se desta definição (do artigo 980.º do CC) os seguintes elementos da noção (civilista) de sociedade enquanto entidade: a) a associação ou agrupamento de pessoas; b) o fundo partrimonial; c) o objecto (exercício em comum de certa actividade económica que não seja de mera fruição); d) o fim (obtenção de lucros para serem repartidos pelos associados)”.
5 Quanto à posição do legislador, cfr. João Gil de Oliveira e José Cândido de Pinho, “CÓDIGO CIVIL DE MACAU ANTOADO E COMETADO, JURISPRUDÊNCIA), Livro I, Volume V, páginas 73 a 74. Aliás, também há opinião de que passa o “contrato de sociedade” que se integra no contrato típico a regular-se na Parte Geral onde prevê as pessoas colectivas por ter em conta a existência da sociedade unipessoal limitada que é uma pessoa colectiva criada por um único sujeito.
6 Para não se confundir com o artigo 551.º do Código Comercial, não se refere aqui como “associação em participação”.
7 Importa referir que o artigo 102.º do vigente Código Civil do nosso país também não reconhece que a empresa civil é uma organização personalizada mas sim considera aquelas que exercem legalmente actividades civis em seu nome próprio (incluindo empresas civis) como organizações não personalizadas, reconhecendo que estas têm, em certo nível, natureza orgânica. Além disso, no direito comparado, o Tribunal Federal Alemão proferiu, em 2001, uma famosa sentença de princípio, reconhecendo que em algumas capacidades jurídicas, as sociedades civis externas têm a mesma posição das sociedades comerciais – cfr. Claudia Schubert, Sociedade civil com personalidade jurídica e sociedade civil sem capacidade jurídica no Direito Alemão. Traduzido por Hu Qiangzhi, Estudo sobre Lei Privada da China e da Alemanha 19, Editora da Universidade de Beijing, páginas 276 a 277.
8 É de acrescentar que caso haja opinião contrária de que não existe entre a Autora e a 2.ª Ré a sociedade civil (tem ou não personalidade jurídica) prevista no artigo 184.º do Código Civil, existe, pelo menos, entre si, o contrato não típico previsto no artigo 980.º do Código Civil de 1966, a esse contrato também são total ou parcialmente aplicáveis as disposições legais que regulam as “sociedades” (quanto a esta questão, cfr. António Menezes Cordeiro, obra citada, páginas 318 e 319 e acórdão proferido pelo Tribunal de Relação de Lisboa em 18 de Maio de 2000 por si citado).
9 Tal como previsto no Código Civil de 1966, a personalidade jurídica da sociedade não foi expressamente reconhecida, porém, sem estabelecer uma sociedade civil com personalidade jurídica, cada uma das partes (como por exemplo, A e B) pode efectuar contribuições com dinheiro para exercer em comum as actividades da cultivação, do escritório de advogados e do investimento, entre outros.
10 Quanto à contribuição com empresa já existente, cfr. Jorge Manuel Coutinho de Abreu, obra citada, página 25.
11 Claro é que caso se prove que a sociedade civil entre a Autora e a 2.ª Ré é uma pessoa colectiva autónoma, os referidos bens são bens sociais. Porém, dado que já concluímos que existe apenas a relação de sociedade entre a Autora e a 2.ª Ré sem se formou uma nova pessoa colectiva, os referidos bens são bens de ambas as partes (independentemente de ser considerados como bens em comum ou em comunhão)
12 Independentemente de se entender que o objecto da participação de capital é o próprio direito de propriedade da empresa ou apenas o direito de gozo ou uso temporário (isto é, direito de levantar os bens no estado em que se encontrarem na participação de capital após dissolução da sociedade civil. Quanto a isso, pode-se consultar os artigos 983.º, 1010.º e 1017.º do Código Civil de 1966), isto não afecta a nossa conclusão: os enunciados das provas simuladas, os exercícios para estudo, as fichas de trabalho, os dados dos clientes produzidos durante o exercício da sociedade civil após a sua criação são bens comuns de ambas as partes.
13 Correspondendo à nota 7, mesmo que se entenda que só existe contrato não típico entre a Autora e a 2.ª Ré, tais objectos ainda pertencem à Autora e à 2.ª Ré (independentemente de se entender que são bens em comum à proporção ou em comum).
14 A arrumação das jurisprudências mais recente sobre esta questão, cfr. Ana Clara Azevedo de Amorim, A Concorrência Desleal à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça: revistando o tema dos interesses protegidos, Junho de 2017 – n.º 2, Revista electrónica de Direito, p. 9 a 13.
Também cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância no Processo n.º 447/2012, de 18 de Outubro de 2012.
15 Quanto à distinção entre a ilicitude e a concorrência desleal resultante da violação da obrigação contratual, cfr. Ana Clara Azevedo de Amorim, ob.cit., página 25, e o acórdão do STJ, Processo n.º 06ª4523, de 13 de Março de 2007.
16 Ac. RC, proc. n.º 1313/13.7TBLRA. C1, de 2018-06-26. Além disso, neste semelhante sentido, cfr. Ac. RE, proc. n.º 757/19.5T8PTG-A.E1, de 2020-07-14.
17 Artigo 4.º da petição inicial: Até 2014, por falta de pessoal, a Autora conheceu, através do colega do seu marido, D, a 2.ª Ré (na altura, a 2.ª Ré e o 3.º Réu eram namorados), e tendo em conta as experiências profissionais da 2.ª Ré em centros de explicações e o relacionamento interpessoal da 2.ª Ré no sector das explicações, a Autora incumbiu a 2.ª Ré de recrutar formadores para o F 2.
Artigo 5.º da petição inicial: Posteriormente, em Março de 2015, a Autora contratou formalmente a 2.ª Ré como uma dos formadores do F 2 e procedeu às formalidades de início das funções na DSF.
Artigo 7.º da petição inicial: Devido à natureza de trabalho da 2.ª Ré, a fim de a 2.ª Ré poder trabalhar com mais dedicação e gerir melhor o F 2, a Autora decidiu que para além de pagar o salário fixo à 2.ª Ré, a Autora também ia pagar à 2.ª Ré 50% do lucro líquido do F 2 como bónus.
Artigo 10.º da petição inicial: A 2.ª Ré nunca fez qualquer investimento no F 2 mas sim foi apenas recrutada pela Autora para gerir o F 2, pelo que, esta recebeu o salário e o bónus na qualidade de trabalhadora.
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681/2022 CÍVEL 4