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Processo nº 30/2023
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A, arguido, natural da Tanzânia e com os restantes sinais dos autos, vem recorrer do Acórdão do Tribunal de Segunda Instância datado de 12.01.2023, (Proc. n.° 897/2022), que confirmou o Acórdão do Tribunal Judicial de Base que o condenou como autor material da prática de 1 crime de “consumo ilícito de estupefacientes agravado”, p. e p. pelo art. 14°, n°s 1 e 2, e art. 7°, n.° 1, assim como art. 21°, n.° 1, al. 1), ponto (7) da Lei n.° 17/2009, (na redacção resultante da Lei n.° 10/2016), na pena principal de 7 anos e 3 meses de prisão, assim como na pena acessória de proibição de entrada na R.A.E.M. por 8 anos, batendo-se – tão só – pela redução da dita pena de prisão para uma outra não superior a 6 anos de prisão; (cfr., fls. 318 a 325 e 340 a 370 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Após resposta do Ministério Público pugnando pela integral confirmação do decidido, (cfr., fls. 373 a 376), e remetidos os autos a esta Instância, em sede de vista, juntou a Ilustre Procuradora Adjunta douto Parecer, considerando, também, que nenhuma censura merecia a decisão recorrida; (cfr., fls. 392).

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Nada obstando, cumpre decidir.

A tanto se passa.

Fundamentação

2. Entende – tão só – o ora recorrente, que “excessiva” é a pena que lhe foi aplicada de 7 anos e 3 meses de prisão, pugnando pela sua redução para uma outra não superior a 6 anos de prisão; (cfr., fls. 340 a 370).

Vejamos.

Está provada a “matéria de facto” como tal elencada e constante do Acórdão do Tribunal Judicial de Base, que não foi nem agora vem impugnada, e que, por motivos não haver para se alterar, aqui se tem por definitiva fixada e integralmente reproduzida; (cfr., fls. 260-v a 263 e 322-v a 324, oportunamente se fazendo adequada referência à mesma).

Nesta conformidade, e centrando-nos na (única) “questão” – da “adequação da pena” – pelo recorrente trazida à apreciação desta Instância, mostra-se de se começar por referir que ao dito crime pelo qual foi o recorrente condenado cabe a pena (abstracta) de 5 a 15 anos de prisão, (cfr., art. 7°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009 com a redacção dada pela Lei n.° 10/2016), e que, como sabido é, a “determinação da medida concreta da pena”, é tarefa que implica a ponderação de vários aspectos.

Desde logo, importa atentar que nos termos do art. 40° do C.P.M.:

“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

Sobre a matéria preceitua também o art. 65° do mesmo código que:

“1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.
2. Na determinação da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
3. Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da determinação da pena”.

Por sua vez, e como repetidamente temos considerado, na completa ausência de qualquer “circunstância” que permita considerar a situação em questão como “excepcional” ou “extraordinária”, motivos não existem para qualquer “atenuação especial da pena” ao abrigo do art. 66° do C.P.M., (sendo de consignar igualmente que inverificados também estão os necessários pressupostos legais do art. 18° da Lei n.° 17/2009 para qualquer atenuação especial, pois que, como se tem decidido: “Para efeito de atenuação especial da pena prevista no art.º 18.º da Lei n.º 17/2009, só tem relevância o auxílio concreto na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis do tráfico de drogas, especialmente no caso de grupos, organizações ou associações, ou seja, tais provas devem ser tão relevantes capazes de identificar ou permitir a captura de responsáveis de tráfico de drogas com certa estrutura de organização, com possibilidade do seu desmantelamento”; cfr., v.g., o Ac. deste T.U.I. de 30.07.2015, Proc. n.° 39/2015, de 30.05.2018, Proc. n.° 34/2018, de 23.09.2020, Proc. n.° 155/2020, de 30.10.2020, Proc. n.° 165/2020, de 27.11.2020, Proc. n.° 193/2020, de 23.06.2021, Proc. n.° 84/2021, de 24.09.2021, Proc. n.° 66/2021, de 11.03.2022, Procs. n°s 8/2022, 12/2022 e 14/2022, de 18.05.2022, Proc. n.° 52/2022 e de 21.09.2022, Proc. n.° 78/2022).

Por outro lado, e como igualmente temos (também repetidamente) afirmado, com o recurso não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida em matéria de determinação da pena, e que esta deve ser confirmada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais atendíveis; (cfr., v.g., o Ac. deste T.U.I. de 03.12.2014, Proc. n.° 119/2014, de 04.03.2015, Proc. n.° 9/2015, de 03.04.2020, Proc. n.° 23/2020, de 05.05.2021, Proc. n.° 40/2021, de 23.06.2021, Proc. n.° 72/2021(I) e de 11.03.2022, Procs. n°s 8/2022, 12/2022 e 14/2022).

Importa pois ter presente que, (nomeadamente), em “matéria de pena”, o recurso não deixa de possuir o paradigma de remédio jurídico, pelo que o tribunal de recurso deve intervir na pena, (alterando-a), apenas e tão só quando detectar desrespeito, incorrecções ou distorções dos princípios e normas legais pertinentes no processo de determinação da sanção, pois que o recurso não visa, nem pretende eliminar, a imprescindível margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de julgamento.

Com efeito, temos vindo a entender que “Ao Tribunal de Última de Instância, como Tribunal especialmente vocacionado para controlar a boa aplicação do Direito, não cabe imiscuir-se na fixação da medida concreta da pena, desde que não tenham sido violadas vinculações legais – como por exemplo, a dos limites da penalidade – ou regras da experiência, nem a medida da pena encontrada se revele completamente desproporcionada”; (cfr., v.g., os Acs. de 27.04.2018, Proc. n.° 27/2018, de 30.07.2019, Proc. n.° 68/2019, de 26.06.2020, Proc. n.° 44/2020(I), de 23.06.2021, Procs. n°s 72/2021(I) e 84/2021, de 11.03.2022, Procs. n°s 8/2022, 12/2022 e 14/2022 e de 18.05.2022, Proc. n.° 52/2022).

Nesta conformidade, ponderando no que até aqui se expôs, na referida moldura penal – 5 a 15 anos de prisão – atentos os critérios para a determinação da medida da pena previstos nos transcritos art°s 40° e 65° do C.P.M., e no que vem sendo entendido pelos Tribunais de Macau em matéria de pena em processos análogos, que dizer?

Ora, resulta – essencialmente – da matéria de facto dada como provada que ao arguido ora recorrente foram apreendidas 11,53g de “Cocaína” que possuía e que destinava ao seu consumo (próprio), resultando também daquela que não tem antecedentes criminais (em Macau).

Não se deixa de considerar algo “estranhas” as “circunstâncias” da sua detenção, em especial de não ter ocupação e encontrar-se em Macau como visitante, hospedado num quarto, com o dito estupefaciente e na posse de alguma quantidade de dinheiro e outros bens…

Porém, uma coisa é certa: nada mais se apurou, (nem em sede de Inquérito, nem em sede de audiência de julgamento), e apenas a matéria de facto considerada “provada” se apresenta apta e válida para se apreciar da conduta do arguido.

Dest’arte, em face do que provado está, atenta, especialmente, a quantidade e natureza do estupefaciente, cremos que, efectivamente, algo inflacionada está a pena decretada, mais justa e adequada se nos mostrando a pena de 6 anos e 4 meses de prisão, assim se concedendo parcial provimento ao presente recurso.

Decisão

3. Em face do exposto, e em conferência, acordam conceder parcial provimento ao recurso, ficando o arguido condenado na pena de 6 anos e 4 meses de prisão.

Pelo seu decaimento pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 3 UCs.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 15 de Março de 2023


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei
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