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Processo n.º 83/2023
(Autos de recurso em matéria cível)

Relator: Fong Man Chong
Data: 28 de Março de 2023

ASSUNTOS:

- Actos de gestão privada do ente público e competência do Tribunal Administrativo

SUMÁRIO:

Quando o Autor na sua PI identificou como causa de pedir o uso não autorizado de informação gráfica e digital dele enquanto arquitecto de uma obra, e também a modificação da mesma, igualmente não autorizada, e, ainda a remoção das legendas dos desenhos que identificam o Autor enquanto criador da obra, e assim pede indemnizações, tais factos não são actos integradores da gestão pública, pois não se compreende no exercício de um poder público, nem integra a realização de uma função pública da Ré, assim, o tribunal competente para julgar esta acção é o TJB e não o Tribunal Administrativo.
O Relator,

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Fong Man Chong
Processo nº 83/2023
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 28 de Março de 2023

Recorrente : A

Objecto do Recurso : Despacho que declarou competente o Tribunal Administrativo (宣告行政法院具有管轄權的批示)

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   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datado de 19/09/2022 (fls. 869 a 871), veio, em 06/10/2022, interpor recurso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 884 a 889, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. O objecto do presente recurso cinge-se ao teor do despacho do Tribunal a quo constante de fls.869 e seguintes dos autos (doravante, o “Despacho”), nos termos do qual quele Tribunal se considerou incompetente para julgar a presente causa, em razão da matéria, tendo determinado, em consequência, a remessa dos presentes autos para o Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 33.º do Código de Processo Civil.
     2. A materialidade subjacente ao presente pleito colocada à apreciação do Tribunal a quo prende-se com o uso suplementar e não autorizado da informação gráfica e digital do projecto original, uso esse que correu no âmbito da prestação de serviços profissionais encomendados pelo 2.º Recorrido à 3.ª Recorrida, e desenvolvidos pela 4.ª Recorrida, para registo e legalização das modificações já efectuadas (展望樓建築及消防圖則更新服, em português “Serviços de actualização dos desenhos de arquitectura e de serviço de incêndios”) da obra arquitectónica em apreço nos presentes autos.
     3. Em face da concreta factualidade que foi aduzida nos presentes autos e que constitui a causa de pedir do Recorrente, retira-se que a actuação dos 1.º e 2.º Recorridos não deverá ser configurada como actos de gestão pública, porquanto não se encontravam a exercer um poder público face ao Recorrente, tratando-se de uma relação de cariz privado, estruturada de forma horizontal, gozando de igual estatuto e de idêntica qualidade relacional e de vinculação obrigacional.
     4. A competência para o julgamento da presente causa deverá caber aos Juízos Cíveis do Tribunal Judicial de Base, não ao Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no artigo 28.º da Lei de Bases da Organização Judiciária, em virtude da não aplicabilidade ao caso concreto do disposto no subparágrafo (4), paragrafo 3), do n.º 2 do artigo 30.º do mesmo diploma legislativo, disposições normativas essas que foram violadas pelo Despacho objecto do presente recurso.
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    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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  III – FACTOS ASSENTES:
    - Pelo Autor foi proposta acção contra a RAEM, IFTM, e demais Réus, alegando que os Réus violaram os seus direitos do Autor enquanto criador da obra por ele concebida, com referência ao artigo 144º/2 do Regime do Direito de Autor e Direitos Conexos;
    - Por despacho datado de 19/09/2022 o TJB declara-se incompetente para julgar esta acção e ordena-se a remessa para o TA que é competente;
    - Contra tal decisão o Autor veio a interpor o recurso jurisdicional com os fundamentos constantes de fls. 821 a 851 dos autos.

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IV – FUNDAMENTAÇÃO
    É o seguinte despacho que constitui o objecto deste recurso, proferido pelo Tribunal de primeira instância:
     
“Da excepção da incompetência do Tribunal:
     O A, com sinais nos autos, intentou a presente acção :
     - contra os 1.° e 2.° RR, para pagamento de uma indemnização ao Autor por violação do seu direito patrimonial de autor pelo uso superveniente da informação gráfica e digital do projecto da obra de arquitectura sem a sua devida autorização, para enriquecimento sem causa daqueles, no valor de MOP$1.195.300,00;
     - contra os 3.° e 4.° RR, para pagamento de uma indemnização ao Autor por violação do seu direito moral de autor, em resultado da modificação da informação gráfica e digital do projecto da obra de arquitectura sem a sua autorização, e pela remoção das legendas dos desenhos que o identificam como autor da obra, no valor de MOP$500.000,00.
     Entende o A., em suma, que o uso dos desenhos de arquitectura superveniente extravase os limites de uso alienado, i.e. a construção da obra segundo o respectivo projecto, acarretando um dano patrimonial ao A.
     Por sua vez, entende que houve uma modificação dos desenhos de projecto de obra de arquitectura, remoção das legendas com a identificação do Autor enquanto autor da obra de arquitectura, e que se encontravam apostas nos desenhos originais, substituição por outras legendas onde outros se arrogam autores da obra de arquitectura, o que acarreta um dano moral ao A.
     A 2.ª, 3.ª e 4.ª RR invocam a excepção da incompetência deste Tribunal, alegando em suma que é competente o Tribunal Administrativo, e que o Venerando TSI, no acórdão proferido, em 24 de Junho de 2020, no Proc. n.º 80/2020, deu provimento ao recurso, considerando que a conduta imputada aos Réus – a mesma em apreciação nestes autos – foi praticada no âmbito do exercício de funções públicas, declarando ser o Tribunal Administrativo o competente para conhecer da acção intentada pelo Autor.
     O caso sub judice versa sobre alterações e modificações da informação gráfica e digital do projecto levado a cabo na obra de arquitetura da autoria do A. originariamente designada por “Biblioteca Internacional da Universidade de Macau”, edifício esse que veio a ser cedido pela RAEM ao IFT, que cujas alteações e modificações foram introduzidas pela 3.ª Ré, empresa com a actividade de elaboração de projectos de arquitectura e cuja titularidade pertence à 4.ª Ré, na qualidade de agente prestadora de serviços relativos às alterações e modificações da informação gráfica e digital do projecto em causa.
     Convém salientar que nos autos 386/19-RA em que corre termos no Tribunal Administrativo também tinha levantado a questão da incompetência do Tribunal em que o Venerando TSI no processo n.° 80/2020 vem declarar que é competente o Tribunal Administrativo, uma vez que que a conduta imputada aos 1.° e 2.° RR foi praticada no exercício de funções públicas e que se enquadra no âmbito da gestão pública, pelo que é competente o Tribunal Administrativo a apreciar a causa.1
     Invoca o A, na sua réplica que a materialidade sub judice prende-se com o uso suplementar e não autorizado da informação gráfica e digital do projecto original, praticados pelos RR e que correu no âmbito da prestação de serviços profissionais encomendados pelo 2.º Réu à 3.ª Ré, e desenvolvidos pela 4.ª Ré, para registo e legalização das modificações e alterações.
     Ora, esse uso suplementar e não autorizado da informação gráfica e digital do projecto em causa acaba por se traduzir nos alegados actos ilícitos praticados pelos RR conforme a sua p.i e que constituiu a causa de pedir da presente acção.
     Na nossa modéstia opinião o facto de 3.ª R e 4.ª R actuar como agente prestadora de serviços adjudicados pela 2.ª R, não altera a materialidade subjacente em que já o Venerando TSI tinha declarado ser competente o Tribunal Administrativo a apreciar a causa e que o caso sub judice cabe na alçada do artigo 30.º, n.º 2, alínea 3), ponto IV da Lei de Bases de Organização Judiciária, onde se prevê que “no âmbito do contencioso administrativo, e sem prejuízo da competência do Tribunal de Segunda Instância, compete ao Tribunal Administrativo conhecer das acções sobre responsabilidade civil extracontratual da Região Administrativa Especial de Macau, dos demais entes públicos e dos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, incluindo acções de regresso.”.
     Nestes termos e nos demais de direito, aderimos na íntegra o acórdão do Venerando TSI no processo n.° 80/2020, onde vem declarar que não é competente o TJB para dirimir o litígio em causa. É, pois, competente o Tribunal Administrativo.
     Após trânsito em julgado, remete-se os autos ao TA, nos termos do artigo 33.° do CPC.
     Notifique e DN.”
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    Quid Juris?
    A questão mais melindrosa no âmbito deste processo prende-se com a noção de actos de gestão pública.
    Este particular aspecto é relevante, já que se se tratar de acto de gestão privada estaremos no domínio de relações jurídicas privadas, excluídas da jurisdição administrativa.
    Numa fórmula sintética poder-se-á dizer que uma actividade será de gestão pública, quando seja regida pelo direito público.
    P. LIMA e A. VARELA referem que a gestão será privada sempre que se trate de actos praticados por orgãos, agentes ou representantes dos entes públicos mas sujeitas às mesmas regras que vigorariam se os mesmos actos fossem praticados por meros particulares (cfr. "Código Civil Anotado" vol. I, a pág. 510/511).
    De acordo com VAZ SERRA a distinção entre actos de gestão pública e privada deveria centrar-se na circunstância de o acto em questão se integrar ou não numa actividade de direito público da pessoa colectiva pública em causa.
    O acto seria de gestão privado, se correspondesse a actividade de direito privado em todo semelhante à desenvolvida pelos particulares (cfr "Rev. Leg. e Jur." Ano 103, pág. 350/351).
    No caso, tal como o Recorrente alega, a causa de pedir e o pedido deste processo consistem em:
“A presente acção versa especificadamente sobre a violação do direito do autor pelo:
i) – Uso superveniente (não autorizado) de informação gráfica e digital do Autor;
ii) – Pela mofificação da mesma, não autorizada;
iii) – Pela remoção das legendas dos desenhos que o identificam enquanto autor da obra.”
Ora, salvo o melhor respeito, parece que o Recorrente tem razão, efectivamente a Ré, ao praticar tais actos imputados, não chegou a exercer o poder de autoridade, não podemos olhar só para a qualidade do sujeito interveniente, ou seja, não é por que a Ré é uma pessoa colectiva de direito público, então todos os actos por ela praticados integram na gestão pública. Melhor dito, o critério da qualidade do sujeito interveniente, autor dos actos imputados, não é um critério válido para resolver correctamente todas as questões levantadas neste domínio. Este processo é diferente do citado no despacho recorrido em que foi alegada a gestão pública.
Citem-se aqui, em nome de Direito Comparado, algumas decisões proferidas nesse sentido:
I - A ocupação abusiva de dois andares de um imóvel, pertencente a um particular, por funcionários da Comissão Venatória Regional do Sul, para a instalação de serviços e de uma creche para os filhos destes, não é um acto de gestão pública, pois não se compreende no exercício de um poder público, nem integra a realização de uma função pública.
II - Tais actos de ocupação são de gestão privada, pois compreendem-se numa actividade em que a pessoa colectiva aparece despida de poder público e se encontra numa posição de paridade com o particular a que os actos respeitam, sujeita às regras de direito privado. (Ac. de 87.07.09 (A.D. 313)
(...)
I - Constituem actos de gestão pública os que se compreendem no exercício de um poder público, integrando, eles mesmos, a realização de uma função pública da pessoa colectiva, independentemente de envolverem ou não o exercício de meios de coerção e independentemente, ainda, das regras, técnicas ou de outra natureza, que na prática dos actos devem ser observados,
II – (…)
III – (…) (Ac. de 89.01.12 (T. Conflitos) A.D. 330)
    
Pelo que, entendemos que deve ser o TJB competente para julgar esta acção nos termos em que ela está proposta.
Procede assim o recurso, revogando-se a decisão recorrida e declarando-se competente o TJB para julgar a presente acção.
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Síntese conclusiva:
Quando o Autor na sua PI identificou como causa de pedir o uso não autorizado de informação gráfica e digital dele enquanto arquitecto de uma obra, e também a modificação da mesma, igualmente não autorizada, e, ainda a remoção das legendas dos desenhos que identificam o Autor enquanto criador da obra, e assim pede indemnizações, tais factos não são actos integradores da gestão pública, pois não se compreende no exercício de um poder público, nem integra a realização de uma função pública da Ré, assim, o tribunal competente para julgar esta acção é o TJB e não o Tribunal Administrativo.
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    Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em conceder provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e declarando-se competente o TJB para julgar a presente acção.
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    Custas pela Recorrida que fica isenta.
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    Registe e Notifique.
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RAEM, 28 de Março de 2023.

Fong Man Chong
(Relator)

Ho Wai Neng
(1o Juiz-Adjunto)

Tong Hio Fong
(2o Juiz-Adjunto)


1 A fundamentação do Venerando TSI vem dizer que:
“A questão que se coloca neste recurso é saber qual o Tribunal, o Tribunal Administrativo ou o Juízo Cível, o competente para julgar a acção intentada pelo Autor contra os Réus.
Vejamos.
Dispõe o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 28/91/M: “A Administração do Território e demais pessoas colectivas públicas respondem civilmente perante os lesados, pelos actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício.”
Por sua vez, prevê o artigo 30.º, n.º 2, alínea 3), ponto IV da Lei de Bases de Organização Judiciária: “No âmbito do contencioso administrativo, e sem prejuízo da competência do Tribunal de Segunda Instância, compete ao Tribunal Administrativo conhecer das acções sobre responsabilidade civil extracontratual da Região Administrativa Especial de Macau, dos demais entes públicos e dos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, incluindo acções de regresso.”
Sobre o conceito de gestão pública, decidiu o Acórdão do TUI, de 18.1.2006, no Processo n.º 23/2005, o seguinte:
“E são actos de gestão pública os que se compreendem no exercício de um poder público, integrando, eles mesmos, a realização de uma função pública da pessoa colectiva, independentemente de envolverem ou não o exercício de meios de coerção e independentemente, ainda, das regras, técnicas ou de outra natureza, que na prática dos actos devam ser observadas".
Também de acordo com o Acórdão deste TSI, de 26.1.2006, no âmbito do Processo n.º 268/2005, deixou consignado o que são actos de gestão pública:
“Um acto de gestão pública integra-se no exercício da actividade pública de uma pessoa de direito público, enquanto realiza um fim de Estado, através do exercício de um poder de autoridade, próprio ou delegado, atribuído por lei e incumbe aos tribunais administrativos e fiscais dirimir os conflitos de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativas e fiscais, devendo excluir-se da jurisdição administrativa e fiscal as acções ou recursos que tenham por objecto as questões de direito privado, ainda que qualquer das partes seja uma pessoa de direito público.
(…)
Será uma relação de direito público, quando um dos sujeitos (o de direito público) intervém na relação jurídica que em causa estiver, numa qualidade que lhe confere, por lei, e em razão do interesse público que prossegue, uma posição de supremacia sobre o outro sujeito dessa mesma relação, impondo-lhe unilateralmente a sua vontade, por via da necessidade daquele prosseguimento.
(…)
À luz destas reflexões, devem considerar-se actos de gestão pública os que se compreendem no exercício de um poder público, integrando eles mesmos a realização de uma função pública, independentemente de envolverem ou não o exercício de meios de coerção e independentemente ainda das regras, técnicas ou de outra natureza, que na prática dos actos devam ser observadas.”
Em termos de doutrina, observam Lino Ribeiro e Cândido de Pinho o seguinte: “A jurisprudência do STA, no âmbito das acções de responsabilidade, em diversos acórdãos tem dado as seguintes definições: são «actos de gestão privada, os que se compreendem numa actividade em que uma pessoa colectiva, despida do poder público, se encontra e actua numa posição de paridade com os particulares a que os actos respeitam e, portanto, nas mesmas condições e no mesmo regime em que poderia proceder um particular, com submissão às normas de direito privado»; são «actos de gestão pública, os que se compreendem no exercício de um poder público, integrando eles mesmos a realização de uma função pública da pessoa colectiva, independentemente de envolverem ou não o exercício de meios de coerção e independentemente ainda das regras técnicas ou de natureza que na prática dos actos devam ser observados.»”
Ainda nas palavras do Cândido de Pinho : “O Território surge, neste contexto, vestido de soberania, manifestando-se nos poderes administrativos com igual roupagem, sendo legítima a conclusão de que o poder administrativo é um poder de autoridade.”
No caso sub judice, foi alegado pelo Autor ora recorrente que ele não foi informado da realização de alterações e modificações na obra de arquitectura de sua autoria “Biblioteca Internacional da Universidade de Macau”, nem tão-pouco foi previamente consultado.
Além disso, foi alegado ainda que o Instituto de Formação Turística (IFT) apresentou um pedido de licenciamento de obra de construção junto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), instruído com recurso a desenhos e informação digital relativa à obra de arquitectura, tendo aquele pedido sido autorizado sem que o Autor para tal tivesse dado a devida autorização.
Segundo o preceituado no artigo 2.º, alínea j) do Decreto-Lei n.º 29/97/M (Lei Orgânica da Direcção dos de Solos, Obras Públicas e Transportes), sendo um serviço funcional da 1ª Ré, compete à DSSOPT, entre outras atribuições, licenciar e fiscalizar todas as edificações urbanas, designadamente particulares, municipais ou de entidades autónomas, nos termos da legislação aplicável. E em termos de distribuição de tarefas, cabe à Divisão de Licenciamento daquele Serviço, entre outras, apreciar e informar os projectos elaborados pelos municípios e entidades autónomas relativos a obras de ampliação, construção, remodelação, conservação e reparação de edifícios públicos, de monumentos e de instalações especiais (artigo 8.º, n.º 2, alínea e) do mesmo diploma legal) e à Divisão de Fiscalização fiscalizar o cumprimento das leis e regulamentos gerais inerentes ao licenciamento das construções (artigo 8.º, n.º 3, alínea e)).
E em relação ao Instituto de Formação Turística (IFT), a sua estrutura orgânica e respectivo funcionamento vêm regulados no Regulamento Administrativo n.º 27/2019.
Segundo o artigo 2.º, n.º 1 do Regulamento, o IFT é uma pessoa colectiva de direito público, dotado de órgãos e património próprios e, como instituição de ensino superior pública, goza de autonomia científica, pedagógica, administrativa e financeira, e patrimonial.
Além disso, estatui-se na alínea 10) do artigo 31.º do mesmo Regulamento que compete ao Conselho Administrativo daquele Instituto administrar os bens do IFT, supervisionando o seu aproveitamento e conservação e garantir a elaboração e permanente actualização do inventário e cadastro dos bens móveis e imóveis.
Ora, alega o Autor ora recorrente na sua petição inicial que cabia às entidades públicas/órgãos funcionais da RAEM, a saber, o IFT e a DSSOPT, supervisionar o processo de licenciamento e de fiscalização das alterações introduzidas na obra de arquitectura de sua autoria, mas não o tendo feito por forma a evitar danos, antes tendo os Réus adoptado uma conduta lesiva dos legítimos direitos e interesses do recorrente. Sendo assim, somos a entender que a alegada falta de cumprimento das obrigações por parte daquelas entidades estava inserida no âmbito de actividades do respectivo domínio de gestão pública. Pois, os actos originadores de danos, a existirem, foram praticados pelos Réus no exercício das suas funções públicas, de acordo com as atribuições legalmente previstas.
Ademais, convém realçar que a ilicitude prevista no Decreto-Lei n.º 28/91/M, que regula o regime da responsabilidade civil extracontratual da Administração e demais pessoas colectiva públicas da RAEM, não se cinge apenas à violação das normas do direito público, antes abrange a violação do direito de outrem ou de uma disposição legal destinada a proteger os seus interesses, bem como situações em que violem as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis (cfr. artigo 7.º do Decreto-Lei).
Isto posto, por a conduta imputada aos Réus foi praticada no exercício de funções públicas, o caso sub judice enquadra-se, salvo o devido e mui respeito, no âmbito da gestão pública, pelo que compete ao Tribunal Administrativo a apreciação da causa.”
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