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Proc. nº 116/2023
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 04 de Maio de 2023

ASSUNTOS:
- Erro na escolha do processo
- Acção sobre contrato administrativo

SUMÁRIO:
- Tendo o Autor formulado o pedido da anulação do acto de indeferimento da prorrogação do prazo no recurso contencioso, este meio processual é próprio e legal para o efeito nos termos do artº 20º do CPAC.
- Não se verifica, portanto, qualquer erro na escolha do meio processual no âmbito do referido processo, pelo que não há lugar a aplicação do disposto do artº 49º, ex vi do artº 12º, nº 2, ambos do CPAC.
- A propositura da acção sobre os contratos administrativos na modalidade da execução do contrato, apenas legitima o Autor a formular os pedidos condenatórios da realização da prestação contratual nos termos previstos nos artigos 113.º e 114.º do CPAC, enquanto que a tomada da decisão pelo dono de obra sobre as reclamações deduzidas pelo empreiteiro não configura uma prestação contratual ou legal, não resulta do vínculo jurídico por virtude do qual o contraente público fica adstrito para com o contraente particular.
O Relator,
Proc. nº 116/2023
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 04 de Maio de 2023
Recorrente: Consórcio formado pelas sociedades Companhia de Construção Urbana A, Lda. e Sociedade Construtora B, Limitada (Autor)
Entidade Recorrida: Região Administrativa Especial de Macau (Ré)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 31/10/2022, o Tribunal Administrativo da RAEM julgou improcedente a acção interposta pelo Autor Consórcio formado pelas sociedades Companhia de Construção Urbana A, Lda. e Sociedade Construtora B, Limitada, por ter julgado procedentes as excepções peremptórias arguidas pela Ré Região Administrativa Especial de Macau.
Dessa decisão, vem o Autor, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
I. DO OBJECTO DO PRESENTE RECURSO E DO ENQUADRAMENTO DA ACÇÃO
A. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida na fase de saneamento pelo Tribunal a quo, que julgou improcedente a acção sobre contrato administrativo proposta pelo Recorrente, por ter julgado procedentes as excepções peremptórias arguidas pela Recorrida, absolvendo-a de todos os pedidos nela formulados.
B. Na referida acção, o Recorrente deduziu os seguintes pedidos contra a Recorrida, no âmbito da execução do contrato de empreitada de obra pública denominada “Empreitada de Construção do Complexo Municipal de Serviços Comunitários da Praia do Manduco, (1ª Fase)” (doravante designada por “Empreitada”):
f. Reconhecer que o atraso de 152 dias resulta das deficiências técnicas e erros de concepção do Projecto pelos quais responde exclusivamente a Ré nos termos do artigo 38º e 40º do Decreto-Lei 74/99/M, não sendo o atraso imputável ao Consórcio Autor; e
g. Condenar a Ré, nos termos do ponto 5.2. do caderno de encargos e do disposto no artigo 752º, nº 2, do Código Civil, ou por força da lei, a prorrogar o prazo de execução da empreitada em 152 dias, ou subsidiariamente, reconhecer que não é aplicável ao Consórcio Autor qualquer multa sob qualquer modalidade prevista na cláusula 5.3 do Caderno de Encargos ou nos termos do artigo 174º do Decreto-Lei 74/99/M pelo atraso de 152 dias; e
h. Condenar a Ré na indemnização ao Consórcio Autor pelos prejuízos decorrentes da supressão das consequências das deficiências e erros de concepção do Projecto supra identificados no valor total de Mop22,249,230.70 e juros vincendos até integral pagamento, ou subsidariamente, condenar a Ré na elaboração da Conta Final da Empreitada com a inclusão do montante de MOP22,249,230.70, a título de prejuízos decorrentes da supressão das consequências das deficiências e erros de concepção do Projecto, sem prejuízo de outros valores peticionados pelo Consórcio Autor;
i. Condenar a Ré no pagamento ao Consórcio no montante de MOP9,595,932.02, a título de revisão de preços, ou subsidiariamente, condenar a Ré na elaboração da Conta Final da Empreitada com a inclusão do montante MOP9,595,932.02, a título de revisão de preços, sem prejuízo de outros valores peticionados pelo Consórcio Autor; e
j. Condenar a Ré, no caso de improcedência dos pedidos c) e d), a proferir decisão final sobre as reclamações pendentes relativamente ao pagamento de valores resultantes das despesas adicionais e à revisão de preços, referidas na Conta da Empreitada assinada a 21 de Abril de 2020 (pedido aditado na Réplica).
C. Relativamente aos pedidos principal e subsidiário da al. b) sobre a questão de prorrogação do prazo e aplicação da multa, uma vez que já foi concluída a execução da obra, bem como se encontra já prescrito o prazo legal de procedimento administrativo de aplicação de multa em causa, verifica-se a inutilidade superveniente na procedência dos referidos pedidos. Assim sendo, o Recorrente deixa de ter o interesse processual em recorrer da Sentença nesta parte.
D. Mantendo-se interesse na procedência dos restantes pedidos das als. a), c), d) e e) e inconformado com os fundamentos invocados na Sentença Recorrida para a absolvição da Recorrida dos referidos pedidos tanto na parte da matéria de facto como na parte de direito, vem o Recorrente recorrer da mesma com os seguintes fundamentos:
i) Contradição e deficiência da decisão da matéria de facto provada;
ii) Erro na interpretação das normas relativas ao regime de erros e omissões do projecto consagrado no DL;
iii) Erro no pressuposto de facto e na qualificação jurídica dos actos praticados pela Recorrida;
iv) Violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 2º do Código do Processo Administrativo Contencioso.
E. Com base na factualidade alegada e dada como provada pelo Tribunal a quo, existe claramente um litígio entre o Recorrente e a Recorrida no âmbito do referido contrato administrativo, que consiste no apuramento da existência ou não do erro do projecto imputável ao dono da obra, pelo qual foram causados atraso na obra e custos a mais e prejuízos ao empreiteiro.
F. O apuramento desta questão não só era essencial para a decisão de aplicação da multa, mas igualmente essencial para a fixação da data de conclusão da obra, liquidação definitiva da Empreitada e a consequente restituição da caução.
G. Por esta razão e perante a inercia da Recorrida sobre as referidas questões, a Recorrente decidiu propor a presente acção, não só em reposta à decisão do Tribunal da Última Instância que tinha julgado irrecorrível o acto de indeferimento da prorrogação do prazo contratual, mas também com a acumulação dos pedidos de pagamento do preço contratual e de indemnização no âmbito da execução da Empreitada, em busca de uma solução definitiva do litígio contratual em causa.
H. Contudo, os fundamentos invocados pela sentença recorrida para absolver a Recorrida de todos os pedidos deduzidos põem gravemente em causa o princípio da tutela jurisdicional efectiva, ficando o Recorrente completamente desprotegido face ao incumprimento contratual da Recorrida e lhe obrigando a aguardar infinitamente decisões da Recorrida e incorrer necessariamente novos custos significativos com a repetição dos processos judiciais. Senão, vejamos.
II. DA INFUNDADA CADUCIDADE DO DIREITO À ACÇÃO QUANTO AO PEDIDO DE AL. A) E DO INTERESSE PROCESSUAL NA SUA PROCEDÊNCIA
I. O Tribunal a quo fundou a absolvição da Recorrida do pedido de al. a) a caducidade do direito de acção por entender que o seu exercício está sujeito ao prazo de 180 dias, previsto no artigo 219º, n.º 1 do Decreto-Lei 74/99/M, que se encontra ultrapassado a contar da data da prolação do indeferimento de prorrogação do prazo da Empreitada.
J. Tal entendimento não procede, porque o exercício pelo Recorrente do direito de acção está salvaguardado através da aplicação do regime do artigo 49º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC) em virtude da verificação do erro na escolha do processo prevista no artigo 12º do mesmo diploma.
K. A questão da irrecorribilidade do acto pela falta do exercício dos poderes públicos quando é suscitada no recurso contencioso em âmbito de um litígio resultante de uma relação contratual administrativa implica por natureza e necessariamente a questão da “impropriedade” do meio processual, por ambos os problemas se socorrerem do mesmo critério de aferição, pelo que apesar do silêncio do TUI, se deve reconhecer a verificação do erro na escolha do processo e aplicar o regime do artigo 49º, ex vi artigo 12º do CPAC de modo a salvaguardar o direito à acção do Recorrente,
L. Assim, e embora o TUI não se tenha expressamente pronunciado sobre tal nulidade/excepção, sendo esta do conhecimento oficioso, o Tribunal a quo deveria reconhecer a sua verificação e aplicar o regime do disposto conjugadamente dos artigos 12º e 49º do CPAC.
M. Como tal, por força do regime sobre o erro na escolha do processo, a propositura da presente acção em relação aos pedidos de prorrogação deve considerar-se efectuada na data da apresentação da petição de recurso contencioso, ou seja, em 21.02.2017.
N. Ao contrário do que o Tribuanl a quo sustenta, o Recorrente não está a solicitar uma pronúncia sua relativamente a uma decisão já transitada em julgado, mas antes a sua aplicação de uma regra que permite a concessão do benefício do prazo por erro de escolha da acção para salvaguardar o direito à acção do Recorrente.
O. Ou seja, a procedência da excepção da caducidade do direito de acção, não era nada mais do que negar o direito do Recorrente à tutela jurisdicional por razões que não lhe são imputáveis. Tendo sido a sua escolha decisivamente influenciada pela jurisprudência existente que apontava à adequação do meio adoptado, seria injusto e surpreendente que, passados anos a aguardar a decisão final, não só as suas pretensões não sejam atendidas, como nem sequer lhe seja permitido recorrer à forma processual que o tribunal tenha entendido como “adequada” para fazer valer os seus direitos.
P. Ainda que assim não se entenda, a concessão do benefício do prazo para propositura da nova açcão prevista no artigo 231º do Código do Processo Civil deveria ser analogicamente aplicável no presente caso para melhor salvaguardar os direitos do Recorrente e em cumprimento do princípio da tutela jurisdicional efectiva.
Q. Mesmo se entenda que não há lugar qualquer concessão do benefício do prazo, a contagem do prazo de caducidade do Pedido de al. a), no último caso, não deve ser contado a partir do despacho do STOP, datado de 29/6/2017 que indeferiu o requerimento de prorrogação por 152 dias.
R. Mesmo no caso em que se entenda que não há lugar qualquer concessão do beneficio do prazo, a contagem do prazo de caducidade do Pedido de al. a), no último caso, não deve ser contado a partir do despacho do STOP, datado de 29/6/2017 que indeferiu o requerimento de prorrogação por 152 dias.
S. A situação de incerteza contra a qual o Recorrente procura reagir na presente acção é inequivocamente objectiva por ter sido objecto do próprio recurso contencioso, assim como a dúvida é manifestamente grave por se tratar de uma questão prejudicial dos referidos procedimentos administrativos pendentes.
T. A situação de incerteza contra a qual o Recorrente procura reagir na presente acção é inequivocamente objectiva por ter sido objecto do próprio recurso contencioso, assim como a dúvida é manifestamente grave por se tratar de uma questão prejudicial dos referidos procedimentos administrativos pendentes.
U. Por outro lado, importa enfatizar que tendo sido julgado improcedente o recurso contencioso com base na excepção da irrecorribilidade do acto, a presente acção sobre os contratos administrativos constitui o único meio idóneo e disponível para o Recorrente poder reagir contra a incerteza e dúvida sobre a imputação do atraso e sobre a responsabilidade contratual da Ré, pelo que o requisito da “adequação” do meio escolhido também se encontra preenchido para afirmar a existência do interesse processual no seu julgamento.
V. Portanto, a sentença recorrida deve ser revogada na parte que julgou procedente a excepção da caducidade do prazo relativamente ao Pedido da al. a), o que, desde já, como afinal se requer.
III. DA INFUNDADA FALTA DA RECLAMAÇÃO PRÉVIA QUANTO AOS PEDIDOS RELATIVOS À COMPENSAÇÃO POR ERRO E OMISSÕES DO PROJECTO (PEDIDOS DA AL. C)
W. Os Pedidos deduzidos pelo Recorrente na al. c) fundam-se na responsabilidade do dono da obra por erros de concepção do projecto nos termos dos artigos 38º e 40º do DL, pelo facto de este ter errado na estimativa da quantidade e qualidade de rocha a demolir com base na qual o projecto fora elaborado, tratando-se de um pedido tipicamente indemnizatório.
X. Salvo o devido respeito, o Recorrente entende que a conclusão do Tribunal a quo nesta parte padece claramente dos seguintes vícios:
a. Contradição e insuficiência para a decisão da matéria de facto;
b. Erro na interpretação das normas aplicáveis ao regime da responsabilidade por erros e omissões de projecto, designadamente o artigo 13º do DL.
a) Da Impugnação da Matéria de facto: eliminação do facto de al. 24) do rol de factos assentes
Y. É de apontar, desde logo, que a afirmação constante da al. 24) do rol de facto assente (“o Autor nunca tinha reclamado contra os erros ou omissões do projecto, até à data de 4/1/2018.”) não é nada mais que um juízo de valores sobre as actuações do Recorrente com o apelo das normas jurídicas constantes do artigo 13º do DL.
Z. Há que distinguir entre juízos (puros) de facto e juízos de valor acerca dos factos: aqueles são as ocorrências concretas da vida real, incluindo as realidades puramente psicológicas; e estes são integrados por apreciações, valorizações dos puros factos. Nos juízos de valor há que ainda distinguir entre os que são formulados apenas mediante a aplicação aos puros factos de critérios próprios do homem comum, prudente, bom pai de família, daqueles para cuja formulação é necessário fazer apelo a regras jurídicas ou à sensibilidade e intuição do jurista.
AA. Apenas integram matéria de facto os puros factos e os juízos de valor da primeira categoria, enquanto que os juízos de valor da segunda categoria integram matéria de direito.
BB. Demonstra-se claramente que o Tribunal a quo, ao considerar o facto da al. 24) como assente, recorreu aos critérios jurídicos e à sensibilidade e intuição do jurista, tratando-se, no fundo, de um juízo de qualificação jurídica dos factos puros.
CC. Mesmo se considerando que o facto da al. 24) fosse um facto puro ou devesse integrar a matéria de facto, a sentença recorrida também violava as regras relativas ao ónus de impugnação e padecia do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto. O que importa igualmente, por excesso, a eliminação do referido facto do rol dos factos assentes.
DD. Se a verdade é que o Tribunal a quo reconheceu a impugnação específica feita pelo Recorrente nos artigos 125º e 126º da sua Réplica contra a alegada falta da dedução da reclamação prévia quanto aos erros e omissões do projecto, não seria compreensível nem admissível que o Tribunal a quo adiante afirmasse que tal facto impeditivo foi reconhecido pelo próprio Recorrente fundando nas mesmas alegações constantes da Réplica.
EE. Nessa medida, nunca poderia o Tribunal colocar tal facto no rol de factos assentes quando se trata de um facto controvertido (que ao invés, deveria ser selecionado para a base instrutória), muito menos dar tal facto como assente fundando no reconhecimento pelo Recorrente, quando foi expressamente impugnado.
FF. independentemente da impugnação do Recorrente, a verdade é que não existem elementos suficientes nos presentes autos para o Tribunal poder considerar como assente a falta da reclamação previa resultante da factualidade alegada pela Recorrida nos artigos 68º, 105º e 110º da Contestação por tal factualidade nem sequer foi considerada como provada na Sentença Recorrida.
GG. A questão de saber se os erros do projecto foram arguidos ou solicitados perante o dono da obra tempestivamente não deve ser averiguada simplesmente com base em parte dos documentos apresentados ou exclusivamente nas alegações da Recorrida (que nem sequer foram provadas), muito menos no reconhecimento do Recorrente (que não é admissível no caso), mas antes é necessário fazer apelo a um juízo sobre a globalidade de factos alegados pelas partes, tendo em conta as circunstâncias concretas antes e durante a execução da empreitada, o que requer imprescindivelmente a produção de prova pelas ambas as partes na audiência de julgamento, sobretudo pela relevância do elemento factual em causa, sendo que a sua verificação pode precludir o exercício pelo Recorrente dos seus direitos contratuais.
HH. Nestes termos, é absolutamente evidente que se verifica o vício da insuficiência cometido pelo Tribunal a quo para a decisão da matéria de facto quanto ao assentamento do facto de al. 24), e como tal, se deve a sentença ser revogada e substituída por outra em que seja eliminado do rol de factos assentes o facto da al. 24), o que desde já, como afinal, se requer.
b) Erro na interpretação das normas aplicáveis ao regime da responsabilidade por erros e omissões de projecto
II. Independentemente da matéria de facto, a verdade é que a apreciação jurídica tida pelo Tribunal a quo dos factos assentes de al. 5), 6) e 20) tem por base uma interpretação errada da disposição do artigo 13º do DL, por seguintes razões:
i. A lei não exige um formalismo específico para a reclamação dos erros e omissões do projecto;
ii. A lei também não exige a indicação dos valores relativos a todas as despesas e custos relacionados com a supressão das deficiências técnicas e do erro do projecto, mas antes apenas quanto ao trabalho a mais e a menos, e tal indicação, porém, também não se trata de um elemento imprescindível da referida reclamação;
iii. A falta da reclamação não preclude o direito do empreiteiro de imputar a responsabilidade ao dono da obra pelos prejuízos causados por deficiências técnicas e erros do projecto.
JJ. No âmbito de um contrato de empreitada, atenta a dinâmica prática entre o particular e a administração na execução da obra, não se justifica a exigência de um formalismo equivalente àquele tipicamente definido para uma relação administrativa (estrito sensu).
KK. Por esta razão, se no presente caso, o Tribunal a quo deu como assente os factos descritos nas al. 5) e 6) do rol de factos assentes - a suscitação do erro da caracterização do terreno em diversas reuniões realizadas no mês seguinte da data de consignação da obra e a consequente apresentação das soluções alternativas como forma de suprir o erro e que foram posteriormente adoptadas pelo dono da obra -, não seria justo nem compreensível chegar a conclusão de que o Recorrente não chegou a “reclamar” os erros perante a Recorrida, ou só os suscitar na conta final pela primeira vez.
LL. Se atenta a factualidade assente, é inequívoco que ambas as partes reconhecem durante a execução da obra que existiam efectivamente grandes diferenças entre as condições locais existentes e as previstas no projecto, bem como, por causa disso, adoptaram soluções alternativas propostas pelo Recorrente para suprir as deficiências técnicas resultantes deste erro de caracterização do terreno (vide. facto assente 5), 6), 7) e 27)), não se pode, após a conclusão da obra, afirmar que o Recorrente não chegou a “reclamar” junto da Recorrida dos referidos erros e inibi-lo exercer os direitos legalmente reconhecidos nos artigos 38º e 40º do DL.
MM. Agiu a Recorrida também em abuso do direito, na modalidade do “venire contra factum proprium”, pois existem condutas objectivamente contraditórias por sua parte a frustrar a confiança criada perante o Recorrente. Daí que a excepção da falta de reclamação prévia não deva proceder.
NN. Por outro lado, para sustentar a sua posição, o Tribunal a quo ainda fez uma interpretação errada do artigo 221º do DL, ao afirmar que “conforme se alude ainda na dita norma do artigo 221º do DL, “o indeferimento de reclamações formuladas oportunamente pelo empreiteiro ao dono da obra não inibe o empreiteiro de discutir a matéria dessas reclamações, em acção para o efeito proposta.”, o que parece sugerir a consequência de que a falta da reclamação oportuna pudesse inibir a proposição da acção contratual.” - o sublinhado é da responsabilidade do Recorrente.
OO. Tal interpretação não só não tem mínima correspondência à letra da norma, é também manifestamente desfavorável ao princípio da tutela jurisdicional efectiva.
PP. Se a norma concede um direito ao particular, o intérprete jamais pode fazer uma interpretação parcial da mesma com efeito de restringir o mesmo direito.
QQ. Portanto, as normas procedimentais e processuais previstas no DL devem ser interpretadas de forma mais favorável ao exercício do direito fundamental à tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 2º do Código de Processo Administrativo Contencioso, o que leva ao afastar interpretações meramente ritualistas e formalistas do quadro normativo que sobre eles disponha.
RR. Por outro lado, o Tribunal a quo também confundiu o procedimento de rectificação do erro do projecto previsto nos artigos 13º a 15º do DL e o regime da responsabilidade por erros de concepção do projecto consagrado no artigo 38º e 40º.
SS. No primeiro caso, por se tratar de uma actividade que depende do consenso das partes, o formalismo previsto (tanto a forma e aprazo) é de natureza procedimental, i.e., visam apenas regulamentar as comunicações entre as partes, o andamento, a execução e fiscalização da obra; e por outro, de natureza supletiva, pois a lei não exclui a possibilidade de que o contrato da empreitada possa prever prazos maiores ou mais restritos, ou até dispensar a sua observância consoante a natureza e o objecto da empreitada em causa.
TT. Já no segundo caso, o exercício de direitos, sobretudo, de indemnização pelos danos causados pelos factos imputáveis ao dono da obra no âmbito da responsabilidade contratual não deve sujeitar a referidos prazos, mas antes aos prazos gerais de prescrição ou ao de caducidade da acção previsto no artigo 219º do DL quando aplicável.
UU. Portanto, nada impede o Recorrente de reclamar no momento da elaboração da conta da empreitada bem como na presente acção quando tais prejuízos tinham sido efectivamente sofrido pelo Recorrente com as obras, alterações e diligências necessárias para o suprimento dos erros de concepção imputáveis à Ré no âmbito da execução da obra, e na ausência da pronúncia pelo Recorrida, de solicitar a intervenção do Tribunal para determinar a respectiva responsabilidade desde que se verifiquem os seus pressupostos.
VV. Nestes termos, é de concluir que a conclusão do Tribunal a quo de que por falta tempestiva da reclamação prévia do Recorrente, ficou precludida a possibilidade de suscitar o erro do projecto por via judicial não só está desfasada da realidade, bem como não tem nenhum cabimento legal, pelo que a sentença recorrida deve ser revogada, o que desde já, como afinal, se requer.
IV. DA INFUNDADA CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO QUANTO AOS PEDIDOS RELATIVOS À REVISÃO DE PREÇO (PEDIDOS DA AL. D)
WW. Em relação aos pedidos de al. d), o Tribunal a quo julgou procedente a excepção de caducidade do direito de acção arguida pela Recorrida por entender que “havia uma decisão que tenha negado a pretensão quanto ao valor resultante da revisão do preço contratual”, qualificando o despacho do STOP exarado na proposta n.º 128/DJU/2018, de 18/12/2018 “como uma decisão expressa de indeferimento oriunda do dono de obra”.
a) Impugnação da Matéria de Facto:
  i) Da recitificação do facto assente da al. 19)
XX. De acordo com a redação dada à al. 19) do rol de factos assentes, foi dado como provado que a recepção provisória da empreitada foi realizada em 21/11/2017.
YY. Contudo, tanto no artigo 147º da petição inicial como no artigo 681º da contestação, bem como por referência ao auto da recepção provisória (junto como Doc. n.º 55 à petição inicial, fls. _ dos autos), a data correcta deveria ser 6/12/2017, e não 21/11/2017. Razão pela se requer, por deficiência, a recpectiva rectificação da al. 19).
ii) Da rectificação do facto assente da al. 22)
ZZ. De acordo com o doe. junto a fls. 6478v e 6479v dos autos, inclui-se também o período do quarto trimestre do ano 2017 que engloba os meses de Outubro a Dezembro de 2017 conforme indicado na coluna relativa ao ano 2017 dessa tabela.
AAA. Isto porque tendo a recepção provisória apenas lugar em Dezembro de 2017, a revisão do preço deveria abranger também este período. Razão pela qual se requer, por deficiência, a respectiva rectificação da al. 22).
iii) Do aditamento da al. 32) no rol de factos assentes, correspondente ao artigo 55º da Réplica, com base no auto de recepção definitiva junto à mesma como Doc. n.º 3.
BBB. A recepção definitiva é o acto que determina a conclusão de todos os trabalhos da empreitada, pelo que é neste momento conforme previsto no artigo 205º do DL que são restituídas ao empreiteiro as quantias retidas como garantia ou a qualquer outro título a que tiver direito, e promove-se a extinção da caução prestada.
CCC. Contudo, no presente caso, a caução não chegou a ser restituída nem nesse momento (3/6/2020), nem até à presente data.
DDD. A justificação dada pela Recorrida foi devido à pendência das reclamações deduzidas pelo Recorrente relativas à conta da empreitada, que inclui, entre outras, a reclamação do valor da revisão do preço contratual no valor de MOP9,595,932.02.
EEE. Tal facto afigura-se de absoluta relevância para evidenciar as posições contraditórias adoptadas pela Recorrida no momento da recepção definitiva e na presente acção em que afirma que tinha indeferido tal valor, pelo que se requer que seja julgada procedente a impugnação da matéria de facto e procede-se às retificações e aditamento requeridos em termos referidos supra.
b) Contradição entre a fundamentação e a decisão
FFF. O prazo de caducidade do direito a açcão prevista no artigo 219º do DL apenas inicia a contar da data em que foi proferida uma decisão denegatória do direito ou pretensão do empreiteiro.
GGG. Tal decisão tem de ser inequívoca, clara e expressa quanto ao seu sentido denegatório, nem é passível de ser presumida, a não ser que a sua presunção esteja expressamente prevista no DL.
HHH. E precisamente não foi o que sucedeu no presente caso, uma vez que a Recorrida sempre por sua própria iniciativa deu causa à uma expectativa legítima do Recorrente sobre o facto de que o restante valor reclamado em sede de revisão do preço ainda se encontrava por decidir, i.e., ainda não havia uma decisão de indeferimento da pretensão do Recorrente.
III. Perante isto, ao basear exclusivamente no deferimento da parte do valor concedido no despacho do STOP de 18/12/2018 e desconsiderar por completo as suas declarações constantes da conta final da empreitada e do auto de recepção definitiva - cuja elaboração teve lugar cerca de dois anos após a emissão daquele despacho - para sustentar o indeferimento do restante valor e a consequente caducidace da acção, a Recorrida agiu novamente em abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
JJJ. Por outro lado, a verdade é que a Recorrida tinha sido sempre coerente nas suas decisões e declarações, porque nunca foi da sua intenção de recusar a ponderação do remanescente do valor reclamado pelo Recorrente em sede de revisão do preço contratual.
KKK. Por outro lado, a verdade é que a Recorrida tinha sido sempre coerente nas suas decisões e declarações, porque nunca foi da sua intenção de recusar a ponderação do remanescente do valor reclamado pelo Recorrente em sede de revisão do preço contratual.
V. DA INFUNDADA FALTA DA VIABILIDADE DO PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE AL. E) ADITADO NA RÉPLICA
LLL. O Tribunal a quo julgou ainda improcedente, por falta da inviabilidade por não se tratar de uma prestação contratual ou legal, o Pedido subsidiário de al. E) que foi aditado pelo Recorrente na sua Réplica na eventualidade da improcedência dos Pedidos da al. c) e d).
MMM. Tal pedido consubstancia simplesmente na condenação da Recorrida em decidir sobre as reclamações pendentes, sem implicar qualquer julgamento por parte do tribunal sobre o mérito das reclamações, tratando claramente de um pedido de natureza subsidiária.
NNN. Importa fazer notar que foi o próprio dono da obra que invocou a pendência das reclamações para não restituição da caução.
OOO. Ou seja, a decisão do Tribunal a quo não é nada mais que permitir implicitamente que o dono da obra podia recusar-se de cumprir uma obrigação contratual e legal (restituição da caução) com a promessa da prática de um acto, mas que afinal o dono da obra se pode desvincular dessa promessa simplesmente por não ser “devido” (no uso da palavra do Tribunal a quo).
PPP. Tal decisão do Tribunal a quo implicaria que o Recorrente aguardasse novamente infinitamente uma decisão expressa denegatória para poder reagir judicialmente para que o Tribunal viesse a pronunciar novamente no sentido de que por falta da reclamação prévia, os valores relativos à compensação pelo erro do projecto não podiam ser atendidos, ou por caducidade da acção, não podia reclamar mais valores a título da revisão do preço.
QQQ. Isto é, com a recusa do conhecimento do mérito de todos os pedidos principais, nem o Recorrente podia ter o direito de pedir o Tribunal a condenar à Recorrida na prática dos actos que ela própria se comprometeu e de que a mesma fez depender a decisão sobre as questões pendentes e a restituição da caução.
RRR. O efeito jurídico que resulta do teor da sentença recorrida é repugnante e completamente contrário aos valores e princípios fundamentais de um sistema jurídico do Estado de Direito, ficando o Recorrente completamente desprotegido, sem qualquer recurso judicial para repor um litígio pendente em prejuízo dos seus interesses e direitos.
SSS. Nestes termos, é de revogar a sentença recorrida na parte que julgou verificada a falta da viabilidade do Pedido da al. e), o que desde já, como afinal se requer.
*
A Ré Região Administrativa Especial de Macau respondeu à motivação do recurso do Autor nos termos constantes a fls. 7810 a 7828v dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
*
Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
*
II – Factos
Foi assente a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
1. Por Despacho do Chefe do Executivo de 01/11/2013, foi adjudicada ao Autor a “Empreitada de Construção do Complexo Municipal de Serviços Comunitários da Praia do Manduco (1.ª Fase)” (doravante designada por “empreitada”) no preço total de MOP120,522,000.00, com o prazo de execução de 480 dias (conforme o doc. junto a fls. 262 dos autos).
2. A empreitada adjudicada era por série de preços (idem).
3. Em 16/12/2013, foi consignada a obra ao Autor enquanto empreiteiro adjudicatário, tendo sido lavrado o auto de consignação (conforme o doc. junto a fls. 263 dos autos).
4. Em 31/12/2013, foi outorgado o contrato público sobre a empreitada da obra, em que foi convencionado o prazo de 480 dias para a execução da empreitada a contar a partir de 16/12/2013 (conforme o doc. junto a fls. 122 a 126 dos autos).
5. Nas três reuniões convocadas entre os representantes de ambas as partes, em 08/01/2014 , 15/01/2014 e 22/01/2014, o Autor várias vezes informou, em matéria do projecto e concepção da obra, o seguinte: “探土報告顯示部位位置岩面較高,地下連續牆施工對工期影響較大”,”將考慮提出替代方案”,”將詳細對工程工期、成本及結構功能等進行分析比較後並報DSSOPT及JPC審批” (conforme os docs. juntos a fls.1188 a 1190, 1193 a 1195, e 1198 a 1200 dos autos).
6. Na sequência disso, o Autor apresentou sucessivamente em 21/01/2014, 28/02/2014 e 02/04/2014, soluções alternativas para melhoria do solo e construção de paredes de contenção alternativa (conforme os docs. juntos a fls. 1203, 1506 e 1535 a 1536 dos autos).
7. Durante a execução da empreitada, foram autorizadas as sucessivas prorrogações do prazo requeridas pelo Autor, até 25/02/2017.
8. Foi o Autor notificado, por ofício n.º 0670/DEPDPO/2017, datado de 01/03/2017 que o dono de obra iria desencadear o procedimento com vista à aplicação da multa contratual por não ter sido concluída a empreitada até à data prevista em 25/02/2017 (conforme o doc. junto a fls. 4248 dos autos).
9. Por carta n.º L17109/L, de 10/03/2017, o Autor alegando que a não conclusão da obra não lhe era imputável, solicitou que se mandasse arquivar o procedimento de aplicação de multa, e que além disso, lhe concedesse o prazo de mais 120 dias para a conclusão da obra em 25/06/2017 (conforme o doc. junto a fls. 4268 a 4278 dos autos).
10. Posteriormente, por carta n.º L17196/M, de 21/04/2017, o Autor mais uma vez solicitou a concessão da prorrogação do prazo por mais de 1 dia, por causa do mau tempo (conforme o doc. junto a fls. 4476 a 4478 dos autos).
11. Por despacho exarado na proposta n.º 301/DEPDPO/2017, datado de 12/05/2017, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas (doravante “STOP”) concedeu a prorrogação do prazo por mais 1 dia, indeferindo o pedido quanto à concessão do prazo de mais 120 dias, sendo esta decisão notificada ao Autor por ofício n.º 1759/DEPDPO/2017, de 18/05/2017 (conforme o doc. junto a fls. 4574 a 4681 e 4719 dos autos).
12. Por carta n.º L17262/L, de 01/06/2017, o Autor pediu a concessão da prorrogação do prazo de execução por mais de 32 dias (conforme o doc. junto a fls. 4729 a 4730 dos autos).
13. Ademais, por carta n.º L17263/L, de 02/06/2017, o Autor apresentou a reclamação da referida decisão do STOP de 12/05/2017, além de reiterar nela o pedido de prorrogação anteriormente referido (conforme o doc. junto a fls. 4739 a 4758 dos autos).
14. Por despacho exarado na proposta n.º 379/DEPDPO/2017, de 29/06/2017, o STOP “a fim de clarificar e simplificar todo este procedimento”, decidiu o seguinte,
“1) Revogo o meu despacho proferido em 12 de Maio de 2017, exarado na Proposta n.º 301/DEPDPO/2017, de 9 de Maio de 2017;
2) Indefiro o pedido de prorrogação do prazo por 152 dias, isto é até 27 de Julho de 2017, com base no relatado nesta Proposta e no que havia sustentado a decisão ora revogada;
3) Notifique-se o consórcio em questão, nos termos do artigo 70.º do Código do Procedimento Administrativo, do referido em 1) e em 2).”
(conforme o doc. 465, junto a fls. 5250 a 5261 dos autos)
15. Dessa decisão o Autor recorreu contenciosamente em 11/08/2017 para o Tribunal de Segunda Instância, que por Acórdão proferido em 23/07/2020, no processo n.º 779/2017, veio a julgar procedente o recurso com a anulação do acto recorrido.
16. O Ministério Público, não se conformando com a decisão interlocutória desse Tribunal datada de 17/05/2018 pela qual se julgou improcedente a excepção da irrecorribilidade suscitada pelo mesmo, recorreu para o Tribunal de Última Instância.
17. Aliás, a Entidade recorrida do processo n.º 779/2017 também interpôs para o TUI o recurso da decisão proferida pelo mesmo Tribunal de 23/07/2020.
18. Por Acórdão proferido em 10/02/2021, no processo n.º 198/2020, o TUI decidiu conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público da decisão do TSI de 17/05/2018, abstendo-se de conhecer do recurso interposto pela Entidade recorrida quanto à decisão final.
19. Em 21/11/2017, foi procedida à recepção provisória da empreitada, tendo sido lavrado o auto de recepção, de cujo teor o Autor deduziu reclamação (conforme o docs. juntos a fls. 6410 a 6415 e dos autos).
20. Em 04/01/2018, o Autor apresentou a proposta da conta final da empreitada, incluindo nela o valor da última prestação do preço adjudicado – MOP3,849,685.20, o de revisão do preço contratual – MOP18,204,786.08, o dos trabalhos a mais não decididos – MOP27,409,777.35 (conforme o doc. junto a fls. 6416 a 6419 dos autos).
21. Dentro dos trabalhos a mais não decididos supra-referidos no valor de MOP27,409,777.35, encontram-se incluídos os seguintes elementos concretos:
- compensação relativa às máquinas para o melhoramento do solo (土壤改良);
- compensação relativa às máquinas para a obra de construção da parede diafragma (地下連續牆) ;
- despesas adicionais com a escavação de caves e das rochas (地庫開挖及支撐) ;
- despesas a pagar aos trabalhadores da obra e dos escritórios do estaleiro durante o prazo de execução prorrogado (於延長施工期間的地盤寫字樓費用) ; e
- despesas com alterações feitas ao projecto (修改方案之設計費用) .
(conforme o doc. junto a fls. 6420 a 6426 dos autos)
22. O valor de MOP18,204,786.08 proposto pelo Autor acima quanto à revisão do preço contratual, reportava-se ao período entre o início do segundo trimestre de 2015 e o fim do terceiro trimestre de 2017 (conforme o doc. junto a fls. 6478v e 6479v dos autos).
23. Na proposta da conta final acima referida, a propósito dos trabalhos a mais não decididos no valor de MOP27,409,777.35, o Autor prestou esclarecimentos justificativos das diversas quantias por ele propostas com base na deficiência ou omissão do projecto fornecido pelo dono de obra.
24. O Autor nunca tinha reclamado contra os erros ou omissões do projecto, até à data de 04/01/2018.
25. Por despacho proferido na proposta n.º 437/DEPDPO/2018, de 16/08/2018, o STOP concordou em realizar a audiência prévia quanto à fixação do montante de MOP7,965,515.60 a título de revisão do preço contratual, e sobre o indeferimento do requerido relativamente ao valor dos trabalhos a mais não decididos (conforme o doc. junto a fls. 6439 a 6713v dos autos).
26. Notificado para a audiência prévia sobre a decisão supra, o Autor por carta n.º L18218/L de 03/09/2018, solicitou a reconsideração da decisão a tomar (conforme os docs. juntos a fls. 6714 a 6738).
27. Foi elaborada pela DSSOPT a Informação n.º 128/DJU/2018, de 14/12/2018, com o teor que se transcreve no seguinte:
“報告書編號Informação No:128/DJU/2018
日期Data:14/12/2018
事由Assunto:價金修正及其他支付10月30日第569/DEPDPO/2018號建議書。預先聽證後之最終決定
Revisão de preços e outros pagamentos, Proposta n.º 569/DEPDPO/2018, de 30 de Outubro, Decisão final após audiência prévia
1. 根據運輸工務司司長於2018年11月12日載於10月30日第569/DEPDPO/2018號建議書的批示,圖則暨工程處於11月14日透過第1203/DEPDPO/2018號內部通訊,要求本廳就10月30日第569/DEPDPO/2018號建議書發表意見。
De acordo com o despacho do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP) de 12 de Novembro de 2018, exarado na proposta n.º 569/DEPDPO/2018 de 30 de Outubro, a Divisão de Projectos e Obras através da Comunicação de Serviço Interno (CSI) n.º 1203/DEPDPO/2018, de 14 de Novembro, solicitou ao Departamento Jurídico (DJU) a emissão de parecer relativo à referida proposta.
概述Introdução:
2. 根據運輸工務司司長於2018年8月16日載於8月13日第437/DEPDPO/2018號建議書所作的批示,關於承攬人”A – B聯營公司” 申請價格修訂的金額澳門幣18,204,786.08,其中有金額澳門幣10,239,270.48不被接納及其他申請款項金額27,409,777.35不被接納的決定意向,聽取承攬人的意見。
No que diz respeito ao pedido de revisão de preços efectuado pelo “Consórcio Companhia de A e B”, no valor de $18,204,786.08 patacas, de acordo com o despacho do Senhor STOP de 16 de Agosto de 2018, exarado na proposta n.º 437/DEPDPO/2018, o montante de $10,239,270.48 patacas não foi aprovado e sobre o projecto de decisão referente à não aprovação de outras despesas, no valor de $27,409,777.35, ter-se-ia que ouvir o empreiteiro.
3. 接著,按照第57/99/M號法令核准的《行政程序法典》第93條及第94條的規定,土地工務運輸局於2018年8月22日透過第2586/DEPDPO/2018號公函,通知承攬人接獲本公函日起計十日期限內,對行政當局決定意向提交書面意見。
Assim, nos termos dos artigos n.ºs 93 e 94 do Código do Procedimento Administrativo (CPA) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M, a DSSOPT através do ofício n.º 2586/DEPDPO/2018, 22 de Agosto, solicitou ao empreiteiro que se pronunciasse sobre o projecto de decisão, no prazo de 10 dias contados a partir da data de recepção do referido ofício.
4. 承攬人於2018年9月3日透過編號L18218/L信函提交解釋並要求重新考慮可能作出的決定。
Através da carta n.º L18218/L, de 3 de Setembro, o empreiteiro apresentou à DSSOPT as suas justificações e a reconsideração da decisão.
5. 因此,就承攬人提交之回覆,圖則暨工程處撰寫10月30日第569/DEPDPO/2018號建議書,建議批准價格修訂金額澳門幣7,965,515.60,並建議不批准價格修訂金額澳門幣9,595,932.02及不批准其他申請款項澳門幣27,409,777.35的金額。
Nestes termos, tendo em conta a resposta apresentada pelo empreiteiro, a Divisão de Projectos e Obras elaborou a proposta n.º 569/DEPDPO/2018, de 30 de Outubro, na qual propôs que, de acordo com a revisão de preços efectuada, fosse autorizado o montante de $7,965,515.60 patacas e fosse indeferido o montante de $9,595,932.02 patacas, assim como indeferido o valor de $27,409,777.35 patacas relativo a outras despesas.
分析Análise:
6. 現就第569/DEPDPO/2018號建議書發表以下法律意見。
Relativamente à proposta n.º 569/DEPDPO/2018 cumpre-nos emitir o seguinte parecer jurídico.
7. 經查閱後,發現題述建議書第4.6點之分析存在不公正之情況。
Durante a verificação efectuada, detectou-se que a análise que foi feita no ponto 4.6 da proposta em epígrafe denota uma situação de injustiça.
8. 題述建議書第4.6點其他申請款項—地庫開挖石方增加的費用之分析認為,原招標案卷之探土報告的孔與孔之間岩石高低起伏較大,有一片區存有較多岩石層,探土報告不能反映整個工程範圍的地質狀況,不能以探土報告作為估算岩石數量的依據,且招標文件中的工程數量表中第B 5.1項已清楚說明 “開挖地面層至地庫三層之樁承台、地樑、地台板、雹梯井及泵井墊層底開挖標高之任何性質之土層及石層”,任何土石方量須按工程數量表之單價計算,完成工程數量的金額亦已每期工程糧單中在各方同意下完成支付,原合約的後加後減工程已於2018年4月17日獲運輸工務司司長在第185/DEPDPO/2018號建議書批准,承攬人的理據與事實不符,因此建議不接受承攬人提出補償增加開石費用。
Na análise ao item “Outro pedido de pagamento de despesas – Despesa adicional com a escavação de caves e de rochas” do ponto 4.6 da referida proposta, de acordo com o relatório de sondagem geotécnica do processo de concurso, nos furos efectuados durante a sondagem verificou-se que há diferenças muito grandes entre o tamanho das rochas e existe uma zona onde a camada rochosa é muito mais ampla.
Visto que o relatório de sondagem geotécnica não consegue demonstrar a situação geológica de toda a área da obra, este relatório não pode servir de base para se fazer uma estimativa da quantidade de trabalhos a executar, pois, no ponto B5.1 do mapa de quantidade de trabalhos do programa de concurso está claramente especificado que “a escavação é desde o piso térreo até às vigas e lajes, bases dos poços dos elevadores e bombagens do pavimento do 3.º piso em cave, em terreno de qualquer natureza ou terreno rochoso”.
A quantidade de material rochoso escavado deve ser calculada com base no preço unitário constante do mapa de quantidade de trabalhos e os trabalhos efectuados já foram pagos conforme o pagamento por prestação acordado mutuamente.
Por despacho de 17 de Abril de 2018 proferido pelo Senhor STOP na proposta n.º 185/DEPDPO/2018, foram aprovados os trabalhos a mais e a menos constantes do contrato inicial, deste modo, os fundamentos apresentados pelo empreiteiro não correspondem aos factos provados, pelo que se propõe que não seja aceite o pedido de compensação da despesa adicional resultante da escavação do material rochoso apresentado pelo empreiteiro.
9. 然而,該分析並沒有考慮到11月8日第74/99/M 號法令核准公共工程承攬合同之法律制度第38條第1款所規定圖則設計錯誤之責任。
Todavia, a respectiva análise não teve em consideração as responsabilidades pelas deficiências técnicas e erros de concepção dos projectos previstos no n.º 1 do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 74/99/M, de 8 de Novembro, que aprova o Regime Jurídico do Contrato das Empreitadas de Obras Públicas.
10. 按照法律規定,定作人須對由其本身提供之圖則、招標時可供查閱之其他資料或嗣後確定將實施之工作之其他資料中之技術缺陷及設計錯誤承擔責任。
Nos termos da lei, pelas deficiências técnicas e erros de concepção dos projectos e dos restantes elementos patenteados no concurso ou nos trabalhos que posteriormente se decida executar, responde o dono da obra caso as peças tenham sido apresentadas pelo mesmo.
11. 因此,當因為原招標案卷之探土報告所預計的岩石數量不準確,導致承攬人實際開挖的岩石數量是此前它在定作人提供的資料的基礎上所計算的岩石量四倍,如果面對四倍的工作量,不按照工作的增加去補償增加開挖岩石費用(並延長工期),那麼承攬人將基於不可歸責其自身的事件遭受損失。
Por isso, uma vez que a quantidade de rochas prevista no relatório de sondagem do processo de concurso não está correcta e visto que a quantidade de rochas removida foi quatro vezes mais do que a estimada nas informações fornecidas pelo dono da obra, perante este aumento, caso não seja pago ao empreiteiro o acréscimo de encargos daí derivado (e prorrogado o prazo de execução), este poderá sofrer prejuízos, prejuízos estes cuja responsabilidade não lhe pode ser imputada.
12. 鑒於定作人須對其提供承攬人作為提交標書之依據的資料的可靠性承擔責任。申言之,定作人須向承攬人補償增加開挖岩石費用,故題述建議書建議不批准其他申請款項澳門幣27,409,777.35的結論須作修正。
Visto que o dono da obra deve assumir a responsabilidade pela fiabilidade dos elementos de base do concurso fornecidos ao empreiteiro, por outras palavras, o dono da obra deve pagar ao empreiteiro as despesas adicionais com a escavação de rochas, propõe-se que seja alterada a conclusão da proposta referida em epígrafe no que diz respeito ao indeferimento do pedido de pagamento de outras despesas no valor de $27,409,777.35.
13. 值得指出的是,根據公共工程承攬合同之法律制度第187條第3款規定,就工作狀況、價金修正或工作圖表內之金額存有異議時,須以定作人接受之數額為臨時基數作出支付。
É de salientar que nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 187.º, em caso de desacordo sobre o montante indicado numa situação de trabalhos, de revisão de preços ou num mapa de trabalhos, o pagamento é efectuado sobre a base provisória das somas aceites pelo dono da obra.
14. 換言之,首先須以定作人接受之數額為臨時基數作出支付。亦即是,按題述建議書建議批准之價金修正金額澳門幣7,965,515.60為臨時基數作出支付。
Dito de outra forma, em primeiro lugar o pagamento deve ser efectuado sobre a base provisória das somas aceites pelo dono da obra, ou seja, o valor revisto no montante de $7,965,515.60 patacas, conforme proposto na referida proposta.
15. 之後,根據同一法律制度第180條第3款及第187條第4款規定,待補償增加開挖岩石費用之異議獲解決後,須立即更正經常帳目,結算承攬人應獲支付之款項,以及倘有之差額獲支付遲延利息。
A seguir, nos termos do n.º 3 do artigo 180.º e n.º 4 do artigo 187.º do mesmo regime jurídico, logo que sejam resolvidas as reclamações deduzidas, procede-se à rectificação da conta corrente, e liquida-se a importância apurada a favor do empreiteiro e os eventuais juros de mora calculados sobre a diferença.
16. 綜上所述,認為應向上級建議批准以定作人接受之價金修正金額澳門幣7,965,515.60為臨時基數作出支付。
Por todo o exposto, julga-se que deve ser proposto superiormente que seja autorizado o valor revisto e aceite pelo dono da obra no montante de $7,965,515.60 patacas como base provisória das somas.
呈上級審議。
À consideração superior.
  高級技術員
  O técnico superior
  C”
  (conforme o doc. junto a fls. 6915 a 6918 dos autos)
28. O proposto acima mereceu o despacho de concordância do STOP, datado de 18/12/2018 (ibid.).
29. O Autor por carta n.º L18357/L, em 28/12/2018, pediu a passagem da certidão do referido despacho (conforme o doc. de fls. 6921 a 6922 dos autos).
30. Em 21/04/2020, o representante do Autor assinou a conta de empreitada que lhe foi facultada pelo dono de obra, em que se incluiu como elementos sobre os quais havia reclamações pendentes os seguintes:
“2. Reclamações pendentes
2.1 Valor resultante de revisões de preços contratuais…
MOP9,595,932.02
2.2 Outro pedido de pagamento de despesas……………
MOP27,409,777.35
2.3 Multa aplicada por atraso na execução da obra….

MOP4,268,549.45
2.4 Despesa pelos serviços adicionais de fiscalização…
MOP916,599.99”
  (Conforme o doc. de fls. 6935)
31. Em 31/05/2021, o Autor propôs a acção sobre contratos administrativos.
*
III – Fundamentação
1. Da caducidade da acção sobre contrato administrativo relativamente ao pedido principal vertido na alínea a):
   O Tribunal a quo julgou procedente a excepção da caducidade do direito da acção quanto ao peticionado na al. a) da petição inicial por entender que a presente acção foi proposta fora do prazo legal previsto no nº 1 do artº 219º do DL nº 74/99/M, nos termos do qual “As acções propostas pelo empreiteiro devem sê-lo dentro do prazo de 180 dias, contados desde a data da notificação, que lhe tenha sido efectuada, da decisão ou deliberação da entidade competente para praticar actos administrativos, em virtude da qual seja negado algum direito ou pretensão do empreiteiro ou o dono da obra se arrogue direito que a outra parte não considere fundado”.
   Para o Autor, o seu direito da acção está salvaguardado através da aplicação do regime previsto no artº 49º, ex vi do nº 2 do artº 12º, ambos do CPAC, em virtude da verificação do erro na escolha do processo.
   Quid iuris?
   Adiantamos desde já que não lhe assiste razão.
   No recurso contencioso sob o nº 779/2017 que correu termos neste TSI, o que o Autor pediu foi a anulação do acto que tinha indeferido o seu pedido da prorrogação do prazo da execução das obras por 152 dias.
   O referido processo findou com a decisão do TUI no sentido da irrecorribilidade do acto.
   Na presente acção, o pedido constante da al. a) da petição inicial consiste em “Reconhecer que o atraso de 152 dias resulta das deficiências técnicas e erros de concepção do Projecto pelos quais responde exclusivamente a Ré nos termos do artigo 38º e 40º do Decreto-Lei 74/99/M, não sendo o atraso imputável ao Consórcio Autor”.
   Como se vê, as pretensões do Autor são diferentes num e noutro processos.
   No recurso contencioso, o Autor pretendia anular o acto de indeferimento da prorrogação do prazo da execução de obras.
   No entanto, o pedido formulado sob a al. a) da petição inicial da presente acção consiste em requerer o Tribunal declarar que o atraso da execução da obra por um período de 152 dias resulta da culpa do dono da obra.
   Ora, tendo formulado pedidos diferentes num e noutro processos, não se pode dizer que o primeiro é o erro da forma de processo do segundo.
   Por outro lado, o erro na escolha da forma de processo verifica-se quando o meio processual escolhido não é adequado para o pedido formulado.
   Por exemplo, pediu a anulação dum acto administrativo no processo de impugnação de normas.
   Nos termos do artº 20º do CPAC, o recurso contencioso é o meio processual próprio e legal para a anulação dos actos recorridos, ou a declaração da sua nulidade ou inexistência jurídica.
   Assim, tendo o Autor formulado o pedido da anulação do acto de indeferimento da prorrogação do prazo no recurso contencioso sob o nº 779/2017, este meio processual é próprio e legal para o efeito.
   Não se verifica, portanto, qualquer erro na escolha do meio processual no âmbito do referido processo, pelo que não há lugar a aplicação do disposto do artº 49º, ex vi do artº 12º, nº 2, ambos do CPAC.
   Pelo exposto, é de julgar improvido o recurso nesta parte.
2. Da caducidade da acção sobre contrato administrativo relativamente aos pedidos principal e subsidiário vertidos na alínea c) da petição inicial por falta da reclamação prévia do erro ou omissões do projecto e por intempestividade:
A sentença recorrida nesta parte tem o seguinte conteúdo:
“…
   O que temos aqui é um pedido indemnizatório, fundado na responsabilidade por erros de concepção do projecto prevista no disposto dos artigos 38.º e 40.º do DL n.º 74/99/M, pelo facto de o dono de obra ter errado na estimativa da quantidade e qualidade de rocha a demolir com base na qual o projecto fora elaborado, tratando-se de pedido típico da acção sobre responsabilidade contratual.
   Conforme se alega no artigo 115.º da petição inicial, no montante peticionado no valor total de MOP22,249,230.70, encontram-se discriminadas as seguintes quantias,
   “i) Custo adicional associado à escavação adicional e escoramento no valor de MOP 15,219,200.00;
   ii) Custo adicional associado a aluguer, mobilização e desmobilização de equipamentos para melhoria de solo no valor de MOP 1,378,914.00;
   iii) Custo adicional associado a aluguer, mobilização e desmobilização de equipamentos para construção da parede diafragma no valor de MOP 1,418,984.00
   iv) Custo adicional associado à concepção do novo projecto de design no valor de MOP 934,470.70;
   v) Custos e encargos adicionais de estaleiro durante as prorrogações do prazo de execução no valor de MOP 3,297,662.00”
   Não obstante terem os valores sido invocados como prejuízos sofridos pelo Autor em consequência da ocorrência do erro de projecto, a que se refere no disposto do artigo 40.º do DL - “As obras, alterações e reparações necessárias à adequada supressão das consequências da deficiência ou erro verificado, bem como a indemnização pelos prejuízos sofridos pela outra parte ou por terceiros, correm por conta do responsável definido nos termos dos artigos 38.º e 39.º” , o que se pretende aqui é essencialmente o custo pela execução do trabalhos a mais que têm origem na rectificação dos erros ou omissões do projecto, tal como previsto no artigo 26.º, n.º 1, alínea c) do DL.
   Como decorre da factualidade apurada, a questão de compensação dos alegados prejuízos adicionais pela deficiência do projecto a título de trabalhos a mais foi colocada pelo Autor diante do dono de obra mediante a remessa da carta n.º L18002/M, de 4/1/2018, pela ocasião da apresentação da proposta para a conta final da empreitada, depois de ter sido concluída a recepção provisória da obra em 21/11/2017.
   Mais do que saber se tal questão levantada ficou ou não inequivocamente decidida pelo dono de obra até ao momento da conta final, interessa ver a adequação do momento procedimental em que a respectiva decisão devesse ter sido tomada. Foi neste contexto que invocou a Ré uma outra excepção peremptória com base na verificação do facto impeditivo da pretensão do Autor, designadamente, a falta da reclamação prévia do erro ou omissões do projecto.
   Como se bem compreende, tendo em presente a natureza burocratizada do procedimento relativo à execução da empreitada e o pagamento dos preços, tal como definida no DL n.º 74/99/M, não é na fase final que se discute tudo o que foi decidido ou devia o ter sido nas sucessivas fases anteriores. Esta conclusão evidencia-se ainda pelo disposto do artigo 196.º, n.º 5 - “5. Na sua reclamação, o empreiteiro não pode: a) Fazer novas reclamações sobre medições; b) Fazer novas reclamações sobre verbas que constituam mera e fiel reprodução das contas das medições ou das reclamações já decididas; c) Ocupar-se de reclamações pendentes e ainda não decididas.”
   Atenta a causa de pedir invocada assente na deficiência técnica e erros de concepção, situamo-nos no disposto dos artigos 13.º a 16.º, 38.º e 40.º do referido DL.
   O artigo 13.º dispõe o seguinte:
“Artigo 13.º
(Reclamações quanto a erros e omissões do projecto)
   1. No prazo para esse efeito estabelecido no caderno de encargos, e que não pode ser inferior a 30 dias nem superior a 90 dias, contados da data da consignação, o empreiteiro pode reclamar:
   a) Contra erros ou omissões do projecto, relativos à natureza ou volume dos trabalhos, por se verificarem diferenças entre as condições locais existentes e as previstas ou entre os dados em que o projecto se baseia e a realidade;
   b) Contra erros de cálculo, erros materiais e outros erros ou omissões do mapa de medições, por se verificarem divergências entre este e o que resulta das restantes peças do projecto.
   2. Findo o prazo estabelecido no número anterior, admitem-se ainda reclamações com fundamento em erros ou omissões do projecto, desde que, arguindo o erro ou omissão nos 10 dias subsequentes ao da verificação, o empreiteiro demonstre que lhe era impossível descobri-lo mais cedo.
   3. Na reclamação prevista nos números anteriores o empreiteiro deve indicar o valor que atribui aos trabalhos a mais ou a menos resultantes da rectificação dos erros ou omissões arguidos.
   4. O dono da obra deve, no prazo máximo de 60 dias contados da data da respectiva apresentação, notificar o empreiteiro da sua decisão sobre as reclamações referidas no presente artigo, presumindo-se o indeferimento se a notificação não for efectuada nesse prazo.
   …” (sublinhados nossos)
   Da citada norma extrai-se sem esforço que qualquer erro de projecto na modalidade da alínea a) ou b) do preceito legal deva ser arguido previamente dentro do prazo legal, ou “no prazo para esse efeito estabelecido no caderno de encargos”, ou “nos 10 dias subsequentes ao da verificação, o empreiteiro demonstre que lhe era impossível descobri-lo mais cedo”. – conforme previsto nos n.ºs 1 e 2. E o dono da obra deve decidir e notificar a decisão sobre a reclamação deduzida no prazo máximo de 60 dias, sob pena de ser presumido o indeferimento da reclamação, conforme se prevê no n.º 4.
   Pode-se ainda alcançar, se percorrendo as normas subsequentes do DL, que a arguição tempestiva do erro de projecto perante o dono de obra na fase da execução da empreitada constitui uma das condições imprescindíveis para que o empreiteiro possa invocar o direito que lhe resultam da verificação desse mesmo erro. Nesta conformidade, a norma do n.º 3 impõe que o empreiteiro arguente deva ainda indicar o valor que atribui aos trabalhos a mais ou a menos resultantes da rectificação dos erros ou omissões invocados.
   Assim, tendo sido deferida a reclamação, com o reconhecimento pelo dono de obra daquele erro e do valor resultante da rectificação, assiste ao empreiteiro o direito à inclusão do valor no preço de adjudicação (conforme disposto nos artigos 13.º, n.º 3 e 14.º, n.º 1 do referido DL).
   Contudo, se for indeferida a reclamação deduzida sem que o erro suscitado tenha sido reconhecido pelo dono de obra, poderá ainda o empreiteiro intentar a acção de modificação do contrato, destinada a obter a rectificação visada e a fixação judicial do novo preço, dentro do prazo de caducidade (conforme o disposto no artigo 29.º, n.ºs 5 e 6, ex vi o 15.º, n.º 2, alínea b) do DL).
   Pois, sendo uma das causas geradora do trabalho a mais nos termos previstos no artigo 26.º, n.º 1, alínea c) do DL, a execução desse trabalho “deve ser formalizada como contrato adicional ao contrato de empreitada” (conforme previsto no artigo 26.º, n.º 7).
   Lendo as ditas normas, cremos que nesta fase o Tribunal, sobre a matéria em apreço, está inibido de condenar directamente a Ré a pagar qualquer valor peticionado pelo empreiteiro perante as regras contratuais que se mantém inalteradas. Como se sabe, o contrato administrativo, assim como todos os contratos de raiz civilista, adquire, pela presença do elemento essencial de um “acordo criador de vínculos de obrigação”, entre as partes “a força de lei” que vincula necessariamente a decisão que se profira neste Tribunal. Por outras palavras, a questão de incumprimento das obrigações contratuais, sendo fulcral na acção de responsabilidade contratual, terá de ser apreciada em conformidade com o estipulado no respectivo contrato que vem disciplinar prima facie a relação jurídica existente entre as partes.
   Deste modo, compreende-se melhor que o legislador do DL n.º 74/99/M tenha obrigado o empreiteiro a socorrer-se da reclamação prévia prevista no artigo 13.º do DL, a fim de que os litígios emergentes em torno dessa matéria pudessem ser resolvidos preferencialmente de forma consensual, e em caso da ausência do consenso, com a intervenção do Tribunal Administrativo. Se entretanto as questões nunca foram suscitadas perante o próprio dono de obra no momento oportuno, ficaria naturalmente precludida a possibilidade de voltar a suscitá-las na fase posterior, muito menos no fim da execução da empreitada (Na mesma linha, conforme se alude ainda na dita norma do artigo 221.º do DL, “O indeferimento de reclamações formuladas oportunamente pelo empreiteiro ao dono da obra não inibe o empreiteiro de discutir a matéria dessas reclamações, em acção para o efeito proposta…”, o que parece sugerir a consequência de que a falta da reclamação oportuna pudesse inibir a proposição da acção contratual).
   No caso dos autos, certo é que durante a execução da empreitada, os problemas relativos à demolição da rocha (decorrentes das diferenças significativas entre a quantidade e a qualidade do solo encontradas no local da obra e as previstas no projecto) foram várias vezes colocados perante o dono de obra (por exemplo, nas sucessivas reuniões convocadas entre o Autor e os representantes da Ré em Janeiro de 2014), mas não é menos verdade que nunca tinham sido os mesmos configurados como erro de projecto ou concepção, com indicação do valor da rectificação, para os efeitos da adjudicação dos trabalhos a mais ou para o ressarcimento dos danos sofridos, a fim de que se desenrolasse a partir daí o procedimento administrativo autónomo previsto no artigo 13.º do DL.
   Como atrás referido, foi após a recepção provisória realizada em 6/12/2017, e pela ocasião da apresentação da proposta para a elaboração da conta final em 4/1/2018 é que o erro foi pela primeira vez arguida, na sua configuração própria, diante do dono de obra, com a indicação do valor de compensação que daí resultaria.
   Motivo pelo qual o facto impeditivo sobre a falta da reclamação prévia resultante dos factos alegados pela Ré nos artigos 68.º, 105.º, 110.º da contestação se considera assente na alínea 24), supra indicada, por ter sido reconhecido pelo Autor nos artigos 125.º e 126.º da réplica – que se limitou a dizer que já tinha chamado atenção para as diferenças detectadas nas sessões iniciais de reunião entre as partes, e proposto por causa disso os planos alternativos (conforme assente nas alíneas 5 e 6 da factualidade) – aquilo que ele reiterou obviamente não tem nada a ver com a arguição do erro no formalismo legal exigido. E a arguição efectiva dos erros em 4/1/2018 ao tempo da apresentação da proposta para conta final foi, sem dúvida, inoportuna, se tiver em conta que mesmo as reclamações deduzidas por causa do conhecimento superveniente dos erros ou omissões do projecto só são admissíveis caso perante o dono de obra “o empreiteiro demonstre que lhe era impossível descobri-lo mais cedo” – conforme se prevê no citado artigo 13.º, n.º 2 do DL n.º 74/99/M.
   Assim sendo, não resta senão proceder a excepção peremptória suscitada, com a absolvição da Ré do peticionado (posto isto sempre se dirá que como reiteramos, a falta da reclamação prévia levaria à manutenção das cláusulas contratuais na vigência do contrato, que não tem vindo a sofrer alterações, designadamente, quanto à fixação do novo preço contratual – por força do artigo 29.º do DL, o que, por conseguinte ainda, inviabiliza a proposição posterior da acção de responsabilidade contratual – pela simples razão de que tal quantia reclamada não é devida face ao estipulado nos termos contratuais).
   Sem prejuízo de vermos ainda a invocada caducidade da acção por causa do decurso do prazo de 180 dias a contar da tomada decisão de indeferimento da pretensão do empreiteiro (nas sucessivas datas de 28/12/2018, 22/1/2019, 18/2/2019 e 21/4/2020). Quanto a isto, foi dada como assente a factualidade com base nos elementos documentais, no seguinte:
   “20. Em 4/1/2018, o Autor apresentou a proposta da conta final da empreitada, incluindo nela o valor da última prestação do preço adjudicado – MOP 3,849,685.20, o de revisão do preço contratual – MOP 18,204,786.08, o dos trabalhos a mais não decididos – MOP 27,409,777.35”.
   “25. Por despacho proferido na proposta n.º 437/DEPDPO/2018, o STOP concordou em fixar o montante de MOP 7,965,515.60 a título de revisão do preço contratual, indeferindo o requerido sobre o valor dos trabalhos a mais não decididos”.
    “26. Notificado para a audiência prévia sobre a decisão supra, o Autor por carta n.º L18218/L de 3/9/2018, solicitou a reconsideração da decisão a tomar, propondo de novo o valor de revisão do preço de MOP 17,561,447.62”.
   E a que acresce que o STOP, por despacho exarado na proposta n.º 128/DJU/2018, concordou em reconsiderar a compensação das despesas resultantes da escavação do material rochoso, autorizar o valor revisto no montante de MOP 7,965,516.60 como base provisória de pagamento, tendo sido a fixação do preço revisto notificada ao Autor, por ofício n.º 3792/DEPDPO/2018, de 21/12/2018, conforme resulta das alíneas 27) e 28) da factualidade assente.
   Pese embora que a forma concreta como foi formulada a proposta que serviu de base para a decisão de concordância do STOP não deixasse qualquer dúvida em relação à vontade firme do respectivo autor, não se contesta que o Chefe do DEP ainda tinha sugerido, no lugar anterior àquele despacho do Secretário, a audiência escrita do Autor antes da tomada da decisão final. Assim, o STOP ao exarar o despacho de concordância naquela proposta, estava a concordar com a realização da audiência, não tendo se tornado ainda firme a sua vontade de decidir nos precisos termos que lhe foram propostos.
   Por isso, seria de afirmar que estamos perante um mero projecto da decisão do STOP, datado de 16/8/2018. E como se vê, a decisão não chegou a ser tomada mais tarde na proposta n.º 128/DJU/2018, em que o STOP concordou em reconsiderar a justeza da mesma. Importa que até ao momento da assinatura da conta final de empreitada elaborada pelo empreiteiro em 21/4/2020, tal atitude de indecisão parece manter-se inalterada, uma vez que o montante foi incluído na lista de elementos sobre os quais houvesse reclamações pendentes.
   Se assim é, inclinamo-nos a concordar com a conclusão que se chegou o Autor nas alegações da réplica – “Perante a factualidade ora descrita, não resta qualquer dúvida de que, mesmo após a recepção definitiva da obra e até à presente data, a Ré nunca chegou a decidir definitivamente sobre todos os valores reclamados pelo Autor na conta da empreitada apresentada pela Ré” – conforme se alega nos artigos 47.º a 56.º da réplica. O que contudo não significa que lhe devemos dar a razão.
   Na nossa opinião, a falta da decisão inequívoca (Ao contrário do que afirmou o Autor, não é a decisão “definitivamente” tomada que nos interessa, sendo tal decisão um acto opinativo, não administrativo, importa apenas saber se o sentido decisório deste acto foi ou não inequívoco, o qual quando se externaliza ou é levado ao conhecimento do respectivo destinatário, marcará o início de contagem do prazo de caducidade da acção – no mesmo sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, no processo n.º 1158/2018, de 23/7/2020) gera também a intempestividade da acção por ser prematura. Como já vimos, o dies a quo, para efeito da proposição da acção sobre contratos, inicia-se com a ocorrência da decisão denegatória da pretensão tomada pelo dono de obra ou com o indeferimento da reclamação, ou melhor dizendo, com a ocorrência da aparente decisão expressa. Não tendo sido ainda tomada essa decisão, o empreiteiro terá de aguardar até que isso aconteça para depois poder reagir contenciosamente. Aliás, não sendo a decisão a tomar configurável como acto administrativo, nem se forma o indeferimento tácito previsto no disposto do artigo 102.º do CPA (no entanto, não se encontra o empreiteiro desmunido de qualquer arma diante do silêncio permanente do dono de obra, podendo o mesmo solicitar a resposta do dono de obra, marcando-lhe o prazo para o efeito, sob pena de se presumir tomada a decisão de indeferimento para agir contenciosamente).
   Portanto, ainda se tivesse concluído pela verificação da reclamação oportuna por parte do Autor contra o erro de projecto, a falta da decisão definitiva do dono de obra impediria que a acção tivesse sido interposta em virtude da prematuridade.
Assim, improcede a acção quanto a esta parte”.
…”.
Do teor da sentença acima transcrito resulta de forma clara que o Tribunal a quo julgou a acção improcedente com absolvição da Ré dos pedidos principal e subsidiário formulados na al. c) da petição inicial por dois fundamentos, a saber:
i. A falta da reclamação prévia do erro ou omissões do projecto dentro do prazo legal previsto no artº 13º do DL nº 74/99/M, o que “levaria à manutenção das cláusulas contratuais na vigência do contrato, que não tem vindo a sofrer alterações, designadamente, quanto à fixação do novo preço contratual – por força do artigo 29.º do DL, o que, por conseguinte ainda, inviabiliza a proposição posterior da acção de responsabilidade contratual – pela simples razão de que tal quantia reclamada não é devida face ao estipulado nos termos contratuais.”; e
ii. A prematuridade da acção por falta da decisão definitiva por parte da Ré, ainda que se entendesse que o Autor tinha reclamado oportunamente sobre os erros ou omissões do projecto.
Como o Autor só veio recorrer do primeiro fundamento da absolvição do pedido, a decisão da absolvição do pedido com fundamento na prematuridade da acção já transitou em julgado.
Nesta conformidade, torna-se inútil apreciar o recurso nesta parte, já que ainda com procedência do recurso nesta parte, continua a subsistir a decisão da absolvição do pedido do Tribunal a quo no segundo fundamento.
Face ao expendido, não é de apreciar o recurso nesta parte.
3. Da caducidade da acção sobre contrato administrativo relativamente aos pedidos principal e subsidiário vertidos na alínea d) da petição inicial:
A sentença recorrida nesta parte tem o seguinte teor:
   “…
   Mais peticionou o Autor a condenação da Ré no pagamento do montante de MOP9,595,932.02 a título de revisão de preços, ao abrigo da cláusula 3.6 das Cláusulas Gerais e da Cláusula 5 do Caderno de Encargos, em virtude do “agravamento de custo de mão-de-obra e materiais no trimestre da conclusão da empreitada de valor igual ou superior a 10% sobre o correspondente custo no trimestre da assinatura de contrato” – conforme se alega no artigo 394.º da petição inicial. Tal como aconteceu anteriormente com os outros pedidos do Autor, a Ré defendeu-se pela excepção da caducidade da acção com base no artigo 219.º, n.º 1 do dito DL.
   Continuamos a nos situar no âmbito da acção sobre contratos administrativos, destinada a obter a interpretação da cláusula prevista no Caderno de Encargos, a saber se tal cláusula tenha conferido ou não ao Autor enquanto empreiteiro o direito à revisão do preço relativamente ao valor invocado. Assim, relativamente à caducidade da acção, remetemo-nos para o referido artigo 219.º, n.º 1 do DL.
   Cumpre por isso fixar o respectivo dies a quo, por referência ao momento em que ocorreu a decisão administrativa de ter negado a pretensão do empreiteiro sobre esta matéria. Neste ponto, alegou a Ré que o prazo se iniciou com a tomada da decisão pelo STOP em 18/12/2018 quando este concordou em autorizar o valor revisto no montante de MOP 7,965,516.60 como base provisória de pagamento, ou com a entrega da certidão sobre o teor do referido despacho ao Autor em 22/1/2019.
   Contra-alegou o Autor, insistindo que neste caso, também inexistia uma decisão definitiva sobre o valor reclamado por parte do dono de obra, uma vez que na conta final de empreitada, este incluiu o montante de MOP 9,595,932.02 como um dos elementos relativamente aos quais houvesse reclamação pendente, e reconheceu-o como tal no auto de recepção definitiva posteriormente lavrado em 3/6/2020.
   A improcedência do peticionado não deixa de ser manifesta pelo que fica dito acima:
   - Se se entender que o referido despacho do STOP exarado na proposta n.º 128/DJU/2018, de 18/12/2018 não consubstancia, para o efeito do artigo 219.º, n.º 1 do DL n.º 74/99/M, uma decisão inequívoca sobre a matéria em causa, e que nunca chegou a ser decidido sobre o valor aqui peticionado, então a acção interposta teria de naufragar por prematuridade.
   - Se, pelo contrário, optar por qualificar o dito despacho como uma decisão expressa de indeferimento oriunda do dono de obra, a acção teria caducado há muito tempo (o sublinhado e o realçado são nossos).
   Para nós, havia uma decisão que tenha negado a pretensão quanto ao valor resultante da revisão do preço contratual, e por conseguinte, a acção intentada caducou por ser fora do prazo, pelo motivo que passaremos a expor de seguida.
   Recapitulando, quanto a esta matéria, depreende-se da factualidade apurada acima o seguinte:
   - Ao momento da apresentação da proposta para a conta final, a revisão do preço foi pela primeira vez requerida junto ao dono de obra, em 4/1/2018, no valor de MOP 18,204,786.08, reportando-se o preço proposto ao período entre o segundo trimestre de 2015 e 6/12/2017 (data de assinatura do auto de recepção provisória), e com base no valor dos trabalhos a mais adjudicados neste período.
   - E a decisão do STOP proferida em 16/8/2018 na proposta n.º 437/DEPDPO/2018, no sentido de ser realizada audiência prévia do empreiteiro quanto ao sentido decisório da concessão do valor de MOP 7,965,515.60 a título de revisão do preço contratual, com o indeferimento do pedido quanto ao valor remanescente de MOP 10,239,270.48.
   - Após a audiência escrita do Autor, pelo despacho exarado na proposta n.º 128/DJU/2018 em 18/12/2018, o STOP voltou a fixar o valor para a revisão do preço em MOP 7,965,515.60, como base provisória de pagamento e notificou tal decisão ao Autor por ofício n.º 3792/DEPDPO/2018, de 21/12/2018.
   - O Autor acusou o recebimento da notificação do referido despacho, e pediu a passagem da certidão por carta n.º L18357/L, em 28/12/2018.
   Diante do que até aqui exposto, é inequívoco que houve uma decisão expressa tomada mediante o despacho do STOP em 18/12/2018, pelo dono de obra de negar a pretensão de revisão do preço, e o Autor teve conhecimento da decisão pelo menos em 28/12/2018, devendo propor a acção para discutir essa matéria no tribunal sob pena da caducidade. Pode-se afirmar com segurança no caso dos autos que até à proposição da presente acção em 31/5/2021, decorrera o prazo de 180 dias, o que leva à caducidade da acção intentada nesta parte.
   Não se ignora que tal despacho do STOP em que se negou a pretensão quanto à revisão do preço contatual no valor remanescente foi exarado na mesma proposta em que se ponderou a alteração da conclusão da proposta no que diz respeito ao indeferimento do pedido de pagamento de outras despesas no valor de MOP 27,409,777.35, quanto aos trabalhos a mais não decididos, como atrás referido. É manifesto que face aos valores reclamados em separado, o referido despacho do STOP é divisível, comportando os dois segmentos – relativamente aos trabalhos a mais não decididos, o dono de obra iria reconsiderar a sua decisão; quanto à revisão do preço contratual, manteve o valor aceite no despacho proferido em 16/8/2018 na proposta n.º 437/DEPDPO/2018, tomando este como base provisória de pagamento posterior para os efeitos do disposto no artigo 187.º n.º 3 do referido DL.
   É ainda certo conforme resulta da conta final junta a fls.7707 dos autos, notificada ao abrigo do artigo 195.º, n.º 1 do DL n.º 74/99/M, que nela o valor resultante de revisões de preços contratuais de MOP 9,595,932.02 se encontra incluído nos elementos relativamente aos quais havia reclamações pendentes. Acrescenta-se que a pendência dessas reclamações foi reconhecida pelo próprio dono de obra no auto de recepção definitiva da obra elaborado em 9/4/2020, como motivo da retenção da caução paga pelo empreiteiro, conforme resulta do documento junto a fls. 7709 dos autos. Portanto para o Autor, não foi ainda tomada a decisão sobre a matéria em causa.
   Com todo o respeito, como já falámos desde o início, a dedução da reclamação fora das situações legais específicas, ou seja, na figura próxima da “reclamação” graciosa prevista nos artigos 145.º a 152.º do CPA, não releva na determinação do dies a quo do prazo de caducidade.
   Quanto a nós, “as reclamações decididas” ou “as reclamações pendentes” a que se alude nas normas dos artigos 195.º e 196.º do DL n.º 74/99/M, da inclusão obrigatória na conta final da empreitada, assim como “as reclamações apresentadas no decurso da empreitada e ainda não definitivamente resolvida…” referidas no artigo 182.º, n.º 1 do DL, devem ser objecto de regulamentação legal específica, porque são reclamações que careçam de ser decididas e a falta da decisão no prazo importará a formação do acto tácito (ou indeferimento presumido) nos termos legais. Assim, o prazo de caducidade inicia se com o indeferimento de “as reclamações oportunamente formuladas” conforme estabelecido no artigo 221.º do dito DL.
   Ora bem, no que concerne à decisão do dono de obra sobre a pretensão do empreiteiro em matéria da revisão do preço contratual, tomada ao abrigo do artigo 172.º, n.º 2 do DL e por força da cláusula específica inserida no Caderno dos Encargos, este diploma não prevê nenhum meio legal de reclamação. Assim, a respectiva reclamação não obsta à formação da decisão, sem aptidão de influir na contagem do prazo de caducidade.
   É de acrescentar que à data da elaboração da conta final de empreitada, inexistia, na realidade, nenhuma reclamação interposta sobre a decisão do STOP de 18/12/2018: o facto de ter incluído aquele valor de MOP 9,595,932.02 na lista dos elementos sobre os quais não haja uma decisão não altera em nada a realidade de que a entidade competente enquanto dono de obra já se pronunciou expressamente sobre a matéria, tendo aprovado o valor de revisão de preço a que o empreiteiro apenas tinha direito, e que tal pronúncia foi levada ao conhecimento do mesmo.
   Aliás, estando confrontado com a conta final remetida pelo dono de obra, o Autor deveria ter perfeita consciência de que a questão da revisão de preço contratual já foi decidida, não obstante a respectiva inclusão pelo dono de obra no mapa de reclamações pendentes. Nesta linha de consideração, aquela declaração do empreiteiro de manter expressamente as reclamações pendentes exarada na conta final de empreitada só produzirá os efeitos possíveis dentro dos moldes estabelecidos pelo diploma, ou seja, de manter as reclamações verdadeiramente pendentes que não tenham sido ainda decididas pela entidade competente.
   Dito isto, parece-nos evidente a procedência da excepção peremptória da caducidade, com a consequente absolvição da Ré quanto aos pedidos deduzidos.
   …”
Como se deve notar que o Tribunal a quo entendeu os pedidos principal e subsidiário constante da al. d) da petição são manifestamente improcedentes por duas razões, a saber:
   “- Se se entender que o referido despacho do STOP exarado na proposta n.º 128/DJU/2018, de 18/12/2018 não consubstancia, para o efeito do artigo 219.º, n.º 1 do DL n.º 74/99/M, uma decisão inequívoca sobre a matéria em causa, e que nunca chegou a ser decidido sobre o valor aqui peticionado, então a acção interposta teria de naufragar por prematuridade.
   - Se, pelo contrário, optar por qualificar o dito despacho como uma decisão expressa de indeferimento oriunda do dono de obra, a acção teria caducado há muito tempo.”
Como o Autor só veio recorrer do segundo fundamento da absolvição do pedido, a decisão da absolvição do pedido com fundamento na prematuridade da acção já transitou em julgado.
Nesta conformidade, torna-se inútil apreciar o recurso nesta parte, já que ainda com procedência do recurso nesta parte, continua a subsistir a decisão da absolvição do pedido do Tribunal a quo no primeiro fundamento.
Face ao expendido, não é de apreciar o recurso nesta parte.
4. Do novo pedido da alínea e) aditado na réplica:
Sobre a matéria supra identificada, o Tribunal a quo decidiu pela forma seguinte:
   “…
5). Quanto ao novo pedido da alínea e) aditado na réplica.
   Aproveitando a ocasião da réplica contra as excepções deduzidas na contestação, o Autor vem requerer o aditamento do novo pedido subsidiário relativamente aos pedidos deduzidos nas alíneas c) e d) da petição inicial, no sentido de ser “condenada a Ré a proferir decisão final sobre as reclamações pendentes relativamente ao pagamento de valores resultantes das despesas adicionais e à revisão de preços referidas na conta da empreitada assinada a 21 de Abril de 2020.”
   Independentemente das razões de ordem substancial que acabamos de referir relativamente aos pedidos vertidos na petição inicial, o pedido cujo aditamento se requer não é sequer admissível pela manifesta falta da idoneidade do mesmo, já que os efeitos jurídicos que se pretende são repugnantes ao ordenamento jurídico.
   A razão de ser desta afirmação é simples: a propositura da acção sobre os contratos administrativos na modalidade da execução do contrato, apenas legitima o Autor a formular os pedidos condenatórios da realização da prestação contratual nos termos previstos nos artigos 113.º e 114.º do CPAC, enquanto que a tomada da decisão pelo dono de obra sobre as reclamações deduzidas pelo empreiteiro não configura uma prestação contratual ou legal, não resulta do vínculo jurídico por virtude do qual o contraente público fica adstrito para com o contraente particular.
   Como já vimos, o dono de obra decidir sobre as reclamações deduzidas não é mesma coisa que o mesmo tomar a decisão enquanto acto administrativo definitivo e executório, com força que obriga o contraente particular. O que se poderia consubstanciar aqui é a emissão de uma declaração negocial face à declaração negocial formulada pela contraparte para que este, em caso de falta do consenso, possa vir a discutir a mesma matéria mediante a acção interposta no tribunal – nos termos do artigo 221.º do DL n.º 74/99/M.
   Neste entendimento, tanto a emissão da resposta como a respectiva falta no prazo legal gera as consequências já definidas nos termos da lei. Não se vê como o contraente público pudesse ser compelida a pronunciar-se sobre as questões emergentes da execução da empreitada relativamente às quais a Lei tenha atribuído o efeito à falta da resposta no prazo (muito menos possível em relação às questões que a Lei não prevê qualquer necessidade específica de reclamação e a sua decisão, e.g. sobre a revisão do preço contratual – por ser menos “devida” neste caso a decisão sobre as reclamação).
   É evidente que o pedido deva improceder em virtude da falta da viabilidade.
   …”
Trata-se duma decisão ajuizada e correcta, pelo que é de louvar a sentença recorrida nesta parte, e ao abrigo do nº 5 do artº 631º do CPCM, ex vi do artº 1º do CPAC, é de negar provimento ao recurso nesta parte com os fundamentos constantes da decisão impugnada.
5. Da impugnação da decisão da matéria de facto:
Tendo em conta as decisões supra tomadas, não se nos afigura ter alguma utilidade prática em conhecer da impugnação em causa, já que a procedência ou não da mesma nada pode influenciar nas decisões já assumidas, pelo que nos abstemos de a conhecer.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em julgar improvido o recurso, mantendo a sentença recorrida.
*
Custas do recurso pelo Autor.
 Notifique e D.N..
*
RAEM, aos 04 de Maio de 2023.

Ho Wai Neng
(Relator)

Tong Hio Fong
(1o Juiz-Adjunto)

Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(2o Juiz-Adjunto)




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116/2023