Processo n.º 512/2022
(Autos de recurso contencioso)
Data: 24/Maio/2023
Recorrentes:
- A e B
Entidade recorrida:
- Secretário para os Transportes e Obras Públicas
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
A e B, com sinais nos autos, notificados do despacho do Exm.º Secretário para os Transportes e Obras Públicas que ordenou a demolição das obras ilegais realizadas na fracção “O” do rés-do-chão e no parque de estacionamento em cave do edifício X, bem como a reposição dos locais afectados, dele não se conformando, interpuseram o presente recurso contencioso de anulação de acto, formulando na petição de recurso as seguintes conclusões:
“1. 本司法上訴所針對之標的: 由運輸工務司司長於2022年5月24日在第2059/53/DJU/2022號報告書所作出之駁回司法上訴人於2022年3月9日提起的訴願之批示(以下稱: 被訴決定)(見文件 1)。
2. 運輸工務司司長作出被訴決定的理由如下(見文件1):
a) OR/C單位內開鑿混凝土樓板及加建混凝土樓梯通往地庫層停車場;
b) 在澳門XX馬路…號X苑停車場加建磚牆、金屬閘門及捲閘圍封第6-10、23-39及40-47號車位。
3. 在尊重運輸工務司司長所作出的被訴決定之前提下,司法上訴人對於作出被訴決定的理由不予認同,司法上訴人認為被訴決定存在法律適用錯誤及違反法律的瑕疵。
I. 違反法律(《行政程序法典》第21條第1款d)項)
A. OR/C單位內之工程
4. 被訴決定指出司法上訴人曾開鑿OR/C單位與地庫停車場之間本來存在混凝土板及加建混凝土樓梯通往停車場,使OR/C單位與停車場被圍封的空間相連,涉及變更樓宇結構部分(見文件1)。
5. 根據物業登記局的資料顯示OR/C單位屬商業用途的單位,實用面積為56.76平方米。
6. 被訴決定指涉嫌違法工程為於OR/C單位內開鑿混凝土板及加建混凝土樓梯通往停車場並使OR/C單位與停車場相連。
7. 但相關混凝土板僅用於OR/C單位內,並用於將單位分隔之用,並沒有涉及加建混凝土樓梯通往地庫層停車場的情況,且並未對OR/C單位的面積有所改變,而現時OR/C單位亦繼續用作商業用途。
8. 加建的混凝土樓梯亦為於OR/C單位內,屬內部的更改工程,沒有涉及大廈的共同或結構部分,屬《都巿建築總章程》第3條第3款A)項第i)的情況。
9. 基此,有關工程不屬於《都巿建築總章程》第3條第1款的規定的工程,而僅需根據同條第3款的規定向土地工務局局長作出通知即可,不屬需獲發准照的工程。
10. 顯然,司法上訴人並沒有作出《都巿建築總章程》第3條第1款所指的工程。
B. 違反主體
11.司法上訴人自購入OR/C單位後(並不包括被訴決定所指之全部車位)並未進行任何工程以變更原有圖則或打通OR/C單位,使OR/C單位與地庫停車場相連。
12. 司法上訴人購入OR/C單位(並不包括被訴決定所指之全部車位)之目的為司法上訴人投資之用,購入後出租予來來超級巿場有限公司至今。
13. 司法上訴人並不知悉涉嫌違法工程之存在,亦非相關涉嫌違法工程/工作物的所有人且不知悉違法工程之所有人是誰,有關涉嫌違法工程與司法上訴人無關。
14. 被訴決定指出即使涉案之違法工程並非由司法上訴人所建造,但司法上訴人為OR/C單位之業權人,司法上訴人仍有義務遵守現行法例,確保其物業處於合法的狀態,故司法上訴人須承擔清拆相關涉案之違法工程並恢復違反法律之前的原狀的責任(見文件1)。
15. 但根據《都巿建築總章程》第52、53及56條的規定,甚至乎被訴決定當中的2059/53/DJU/2022報告書第24點亦指金出應針對工程所有人命令拆卸非法工程是應針對工程所有人(見文件1)。
16. 儘管司法上訴人為相關單位的業權人,但有關涉嫌違法建築物並非由司法上訴人所建造,司法上訴人並不知悉涉嫌違法工程之存在,亦非涉嫌違法工程/工作物的所有人,司法上訴人至少不是OR/C單位內的非法工程/工作物的所有人。
17. 司法上訴人不能拆卸被訴決定所指的非法工程,因為該等不在OR/C單位內的非法工程並不屬於司法上訴人之所有,拆卸不屬於司法上訴人所有工作物將會導致司法上訴人可能觸犯由《刑法典》第206條所規定的毁損罪。
18. 關於土地工務運輸局局長要求司法上訴人需要按照原圖則將受影響部份還原,如前所述,司法上訴人並非涉嫌違法工程/工作物的所有人,故無法對他人之建築物進行還原或拆除的工作。
19. 綜上所述,基於被訴決定所指的違反工程並不屬於《都巿建築總章程》第3條第1款所規定需要獲發准照之工程,且根據《都巿建築總章程》僅能命令非法工程之所有人拆卸非法工程,故被訴決定違反《都巿建築總章程》第3條第1款、第52、53及56條的規定;被訴決定應被撤銷。
綜上所述,現謹向尊敬的法官 閣下請求如下:
1. 接納本司法上訴及全部附件;
2. 傳喚被訴實體以便其答辯,無論答辯與否,均須根據《行政訴訟法典》第55條之規定,將針對司法上訴人之行政卷宗之正本以及一切與司法上訴之事宜有關之其他文件附於本卷宗內;
3. 宣告被訴決定違反第79/85/M號法令《都巿建築總章程》第3條第1款、第52、53及56條的規定,並命令被訴實體撤銷被訴決定。”
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Regularmente citada, apresentou a entidade recorrida contestação, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“1. O objecto do presente recurso é o despacho do STOP de 24 de Maio de 2022, notificado aos Recorrentes pelo ofício n.º 4853/24/DJU/2022, no dia de 1 de Junho, que indeferiu o recurso hierárquico por eles interposto em 9 de Março de 2022, mantendo a decisão do director substituto da DSSOPT de 26 de Janeiro de 2022, exarado na proposta n.º 00781/DURDEP/2022, de 21 de Janeiro de 2022, que ordenou a demolição das obras ilegais realizadas na fracção O/RC e no parque de estacionamento em cave do Edifício X, em Macau, e a reposição dos locais afectados, nos termos do disposto no artigo 52º do Decreto-Lei n.º 79/85/M (RGCU), de 21 de Agosto.
2. As obras ilegais realizadas consistem na construção de uma parede divisória no meio da fracção OR/C, numa abertura na laje de betão entre esta fracção autónoma e o parque de estacionamento (i.e. o pavimento da fracção e o tecto do parque de estacionamento), bem como a construção de uma escada em betão para dar acesso ao espaço correspondente aos lugares 23 a 39 do parque de estacionamento em cave, o qual foi vedado com a construção de paredes de alvenaria e tijolo ao lado dos lugares 23, 24 e 39 e colocação de portão metálico e portão de enrolar metálico, formando a ligação da dita fracção autónoma OR/C ao espaço fechado do estacionamento.
3. Entendem os Recorrentes que as obras efectuadas apenas estão sujeitas a comunicação ao director da DSSCU, por se enquadrarem na situação prevista na subalínea i) da alínea a) do n.º 3 do artigo 3º do RGCU, porque o pavimento da fracção OR/C foi tão-só utilizado para a sua divisão, a respectiva área não foi alterada e a mesma continua a ser utilizada para fins comerciais.
4. Todavia, considera a Entidade Recorrida que não lhes assiste razão, desde logo porque as obras ilegais realizadas na fracção OR/C não se traduzem numa simples modificação no seu interior, na medida em que implicaram o prolongamento da fracção sobre um espaço integrante das partes comuns do prédio, que foi vedado, absorvendo-o funcionalmente e que só a ela serve, o que consubstancia uma obra de ampliação.
5. Por outro lado, a abertura (demolição) executada na laje de betão entre a fracção OR/C e o parque fechado de estacionamento em cave, bem como a instalação da escada de betão de ligação desses espaços, constituem alteração à estrutura do edifício.
6. Assim, contrariamente ao que sustentam os Recorrentes, as obras em causa encontram-se abrangidas pelo n.º 1 do artigo 3º do RGCU e não podiam ter sido efectuadas sem aprovação de projecto e emissão da correspondente licença pela DSSCU.
7. Mesmo que as obras ilegais tenham sido concluídas há muito tempo, não tinha a então DSSOPT qualquer outra hipótese que não fosse ordenar aos Recorrentes a sua demolição e a reposição do local afectado, conforme determina o artigo 52º do RGCU.
8. Até porque os Recorrentes não submeteram qualquer projecto de legalização das obras.
9. A possibilidade de legalização das obras ilegais que foi avaliada pela Entidade Recorrida na proposta n.º 03916/DURDEP/2021, de 23 de Abril, carece do consentimento prévio dos condóminos de acordo com o estipulado no artigo 1324º do Código Civil, alterado pelo artigo 70º da Lei n.º 14/2017, e no disposto nas alíneas 2) e 3) do n.º 1 do artigo 14º da mesma lei e acarreta a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal, porquanto tais obras contendem com elementos estruturais do edifício (laje de betão) e alteram a finalidade de um espaço que integra uma parte comum e que foi incorporado fracção OR/C, por forma a ampliar a respectiva área bruta de utilização.
10. A falta do consentimento dos condóminos obsta ao conhecimento do pedido de legalização que, reitera-se, não foi submetido, uma vez que os Recorrentes não possuem, por si só, legitimidade para legalizar tais obras.
11. Os Recorrentes afirmam que não adquiriram os lugares de estacionamento e não efectuaram qualquer obra para modificar o projecto inicial ou ligar a fracção O/RC ao parque de estacionamento subterrâneo.
12. Nestas circunstâncias, entendem os Recorrentes que não são os proprietários das construções ilegais em causa e, portanto, não possuem a qualidade de dono da obra, razão pela qual a ordem de demolição não lhe poderá ser dirigida, de acordo com os artigos 52º, 53º e 56º do RGCU.
13. Mesmo assim só os Recorrentes se encontram em posição de demolir a obra de modificação e ampliação ilegal porque, enquanto proprietários da fracção autónoma OR/C, só eles têm o domínio do imóvel a que aquela obrigação se encontra ligada.
14. Com efeito, as construções efectuadas no interior da fracção não permanecem na titularidade do anterior proprietário que, com a alienação, perdeu a legitimidade de nela intervir e, por outro lado, as obras realizadas fora do perímetro da fracção, ou seja, nos 17 lugares de estacionamento, não ingressam no condomínio.
15. Por isso, cabe aos Recorrentes, na qualidade de comproprietários da fracção autónoma OR/C, repor a conformidade entre a construção e o projecto de obra, harmonizando a fracção com o seu estatuto jurídico-administrativo.
16. Suportando-se ainda no argumento de que não são proprietários das ditas obras ilegais, defendem os Recorrentes que a sua demolição os faria incorrer na prática do crime de dano previsto e punido no artigo 206º do Código Penal; Também aqui eles não têm razão, porquanto
17. Ao realizar a demolição das obras ilegais acima identificadas, os Recorrentes mais não estão do que a cumprir uma ordem legítima emitida pela Administração por força do disposto no RGCU (cfr. alínea c) do n.º 2 do artigo 30º do Código Penal).
18. Na verdade, após verificar a existência de obras ilegais e ter ponderado a possibilidade da sua legalização cujo projecto não foi apresentado pelos Recorrentes, a Administração estava vinculada a ordenar a respectiva demolição.
19. Outrossim, os Recorrentes devem devolver a fracção O/RC bem como os lugares de estacionamento ao seu estado inicial, de acordo com o projecto de construção, sendo que estes últimos constituem espaço comum do qual indevidamente se apropriaram em proveito daquela fracção autónoma.
20. O relatório de fiscalização do Corpo de Bombeiros n.º 1477/DVI/DPI/2019, de 1 de Julho alerta para que as obras ilegais efectuadas impedem o funcionamento pleno do sistema de segurança contra incêndios, razões porque se torna urgente a reposição da legalidade urbanística violada.
21. Devem improceder, pelo exposto, os vícios assacados ao acto recorrido.
Nestes termos e nos melhores de direito, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser julgado improcedente, por não verificação de quaisquer dos alegados vícios, devendo ser mantido o acto recorrido.”
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Corridos os vistos, cumpre decidir.
O Tribunal é o competente.
O processo é o próprio.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas, estão devidamente representadas e têm interesse processual.
Não existe questões prévias, excepções nem nulidades que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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II) FUNDAMENTAÇÃO
Resulta provada dos elementos constantes dos autos, designadamente do processo administrativo, a seguinte matéria de facto com pertinência para a decisão do recurso:
Os recorrentes são comproprietários da fracção autónoma “O” do rés-do-chão (designada por “OR/C” no registo da Conservatória do Registo Predial).
O Departamento de Urbanização dos Serviços de Solos e Construção Urbana verificou a execução das seguintes obras ilegais na fracção autónoma “OR/C” e no parque de estacionamento em cave do edifício X:
- na fracção autónoma OR/C: Demolição de laje em betão e instalação de escadas em betão para acesso ao parque de estacionamento;
- no parque de estacionamento: fechamento dos lugares n.ºs 6 a 10, 23 a 39 e 40 a 47 do parque de estacionamento para veículos do edifício com paredes de alvenaria de tijolo, portão metálico e portão de enrolar metálico.
Por despacho do Director Substituto da DSSOPT, de 26 de Janeiro de 2022, os interessados, incluindo os aqui recorrentes, foram notificados para procederem à demolição das obras acima descritas e à reposição dos locais afectados, ou apresentarem pedido de legalização de obras.
Inconformados, os interessados, incluindo os aqui recorrentes, apresentaram, respectivamente, três recursos hierárquicos.
O recurso hierárquico deduzido pelos recorrentes foi indeferido, tendo-se mantido o despacho proferido em 26.1.2022.
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Aberta vista ao Ministério Público, foi emitido pelo Digno Procurador-Adjunto o seguinte douto parecer:
“Na petição inicial, os recorrentes requereram a anulação do despacho em escrutínio, arrogando que esse despacho infringira as disposições no n.º 1 do art. 3.º do Regulamento Geral de Construção Urbana (RGCU) constante do D.L. n.º 79/85/M, bem como nos art. 52.º, art. 53.º e art. 56.º do mesmo diploma legal.
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Ora, dispõe o n.º 1 do art.3.º do RGCU: Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a execução de obras ou trabalhos referidos no n.º 1 do artigo 2.º não pode ser efectuada sem aprovação do projecto e emissão de licença correspondente pela DSSOPT. Por sua vez, o n.º 1 do art. 2.º deste diploma legal determina: Consideram-se obras de construção civil para efeitos de aplicação do presente diploma a execução de novas edificações, bem assim como os trabalhos de reconstrução, restauro, reparação, modificação, ou ampliação em edificações existentes, a demolição de construções e ainda quaisquer trabalhos que determinem alteração da topografia do solo e execução de infra-estruturas quando estas não caibam na competência das Câmaras Municipais.
Substanciando a arguida violação do n.º 1 do art.3.º acima, eles alegaram: 7. 但相關混凝土板僅用於OR/C單位內,並用於將單位分隔之用,並沒有涉及加建混凝土樓梯通往地庫層停車場的情況,且並未對OR/C單位的面積有所改變,而現時OR/C單位亦繼續用作商業用途。8. 加建的混凝土樓梯亦為於OR/C單位內,屬內部的更改工程,沒有涉及大廈的共同或結構部分,屬《都市建築總章程》第3條第3款A)項第i)的情況。
Porém, tanto o auto de notícia lavrado em 03/07/2019 como a Proposta n.º 00781/DURDEP/2022 constatam, com clareza e certeza, que as obras realizadas na fracção OR/C incluem a demolição de laje em betão entre a qual e o parque de estacionamento (isto é, o pavimento da dita fracção e o tecto do parque de estacionamento), bem como a construção de uma escada em betão para dar acesso ao parque de estacionamento em cave, formando a ligação dessa fracção ao espaço fechado do parque de estacionamento. (docs. de fls. 145 a 150 e 295 a 299 do P.A.)
Bem, tais obras provocam não só a alteração da estrutura do edifício, mas também o aumento da área da fracção dos recorrentes por via da indevida apropriação da uma parte do mesmo edifício, e causam ainda a alteração da finalidade dessa parte comum.
Tudo isto mostra, sem sombra de dúvida, que as supramencionadas obras não podem ser enquadradas na subalínea i) da alínea a) do n.º 3 do art. 3.º do RGCU. Nestes termos e na medida em que ninguém solicitou previamente a autorização e a licença imperativamente exigidas pelo n.º 1 deste art. 3.º, as quais não podem deixar de ser ilegais.
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Ora, a Notificação n.º 2/NOT/2022 indica (doc. de fls. 314 do P.A.): 基於上述情況,根據《都市建築總章程》第五十二條之規定,已於2022年1月26日在第00781/DURDEP/2022號報告書內作出批示,命令上述工程所有人或受託人自接到本通知書日起計15天期限內,自行拆除上述工程,同時必須移走其內存有的所有物料、設備及遷離現場,以促使受該工程影響的地方恢復原狀,但事前須向本局申請核准拆卸非法工程,並獲准後方可進行。在完成上述工程後,須通知本局以作審查;或根據同一法例第五十三條之規定,自接到本通知日起計8天期限內,向本局申請工程合法化,並遞交所需資料,以便評估其合法化的可行性。
Interpretado de acordo com Proposta n.º 00781/DURDEP/2022 e tal Notificação (docs. de fls. 295 a 299 e 314 do P.A.), o despacho lançado nessa Proposta pelo Director substituto concedeu uma alternativa aos recorrentes – ou pedir a legalização das referidas obras no prazo de 8 dias, demolí-las por sua conta e no prazo de 15 dias, podendo eles fazer livre escolha.
Sucede que os recorrentes interpuseram a reclamação desse despacho do Director substituto e o recurso hierárquico para o Exmo. Senhor STOP (docs. de fls. 341 a 358 e 398 a 400 do P.A.). Com efeito, eles e outrem nunca submeteram pedido de legalização das apontadas obras.
Tudo isto torna absolutamente indiscutível que o despacho in questio não podia nem devia apreciar a dita legalização e, em consequência disso, que não faz sentido algum que os recorrentes arguam a violação do art. 53.º do RGCU. Trata-se duma arguição despropositada.
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Disseram ainda os recorrentes: 16. 儘管司法上訴人為相關單位的業權人,但有關涉嫌違法建築物並非由司法上訴人所建造,司法上訴人並不知悉涉嫌違法工程之存在,亦非涉嫌違法工程/工作物的所有人,司法上訴人至少不是OR/C單位內的非法工程/工作物的所有人。17. 司法上訴人不能拆卸被訴決定所指的非法工程,因為該等不在OR/C單位內的非法工程並不屬於司法上訴人之所有,拆卸不屬於司法上人所有的工作物將會導致司法上訴人可能觸犯《刑法典》第206條所規定的毁損罪。(conclusões 16 e 17 da petição inicial)
No caso sub judice, é verdade que não se descortina in casu prova directa que possa constatar, cabal e seguramente, que os recorrentes sejam dono das supramencionadas obras. Porém, inclinamos a entender que os dois argumentos (dos recorrentes) acima transcritos não procedem.
Bem, a interpretação articulada dos arts. 52.º e 56.º do RGCU dá a entender que a ordem de demolição de obras ilegais configura uma das medidas tutelares da legalidade urbanística, e a responsabilidade pela demolição recai no infractor que, por natureza das coisas, não pode deixar de ser o dono de obras legais. Com efeito, é o dono de obras legais quem pratique ou faz praticar a infracção ao regime urbanístico.
De facto, há casos práticos em que o dono de obra ilegal não coincide com o proprietário do imóvel onde se implanta uma obra ilegal. O que já ganhou criteriosa consideração jurisprudencial que reza (cfr. Acórdão do TSI de 20/03/2003 no Processo n.º 1136): “1. A exigência do licenciamento de obras de modificação ou ampliação em edifícios como tal prevista nos termos do art.º 3.º do Decreto-Lei n.° 79/85/M, de 21 de Agosto (Regulamento Geral da Construção Urbana) (RGCU) reporta-se ao estatuto jurídico-administrativo da coisa construída ou alterada e a esse estatuto está sempre subordinado o titular dessa coisa. 2. Assim sendo, mesmo no caso de verificação da alienação da fracção autónoma na qual foi realizado qualquer tipo de obras executadas sem a prévia e devida licença ou em desacordo com o projecto inicialmente aprovado e insusceptível de legalização posterior, os novos adquirentes da fracção ficam vinculados ao cumprimento da ordem de demolição emanada da Administração nos termos daquele RGCU.”
No mesmo douto aresto lê-se ainda: “Caberia, de resto, eventualmente aos recorrentes, se assim entendessem e se o autor da construção ilegal em causa fosse o anterior proprietário da fracção “A1”, pedir a este, por vias legais próprias admissíveis, a indemnização por danos causados por essa obra ilegal, caso eles próprios tivessem sido induzidos em erro na celebração da escritura de compra da dita fracção, no tocante à natureza da obra e/ou do pátio adjacente em causa.”
A nosso ver, aplica-se ao presente caso a axiologia da sensata jurisprudência que proclama (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º 55/2017): “I– Apurando-se a existência de obras não autorizadas no prédio (que violam os artigos 8º/-12) e 10º/-4) do Regulamento de Segurança contra Incêndio, aprovado pelo DL nº 24/95/M, de 9 de Junho), titulado pelo Recorrente, sobre este recai o dever de proceder à demolição de tais obras ou à sua regularização caso estejam reunidos os respectivos requisitos, ainda que tais não foram ordenadas nem executadas pelo Recorrente, enquanto proprietário (obras estas que supostamente foram ordenadas pela ex-proprietária), uma vez que está em causa o interesse público (segurança pública de pejamento e evacuação) que se sobrepõe sobre o interesse particular. II- As disposições sancionatórias do referido Regulamento (artigos 87.º e seguintes), quando aludem a obras ilegais já concretizadas, desconformes ao Regulamento e causadoras de pejamento ou de obstrução à evacuação, utilizam o termo infractores não apenas para se referirem aos autores ou executores das obras, mas para visarem aqueles que detêm o domínio do espaço e que, por isso, estão em condições de fazer cessar a infracção ou de, pelo contrário, a perpetuar.”
De outro lado, importa ter presente que o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas (art. 1229.º do Cód. Civil); e tanto o domicílio como o lugar vedado ao público gozam da tutela penal (arts. 184.º e 185.º do Cód. Penal).
Ora, as disposições nos arts. 1229º do Código Civil bem como 184.º e 185.º do Código Penal levam-nos a inferir que é legítima e justificável a presunção juris tantum, no sentido de que o dono duma obra ilegal é o proprietário do imóvel onde se implanta tal obra, cabendo-lhe o ónus de provar que ele não é dono da obra ilegal que é outrem.
Na nossa modesta opinião, o entendimento em sentido diferente emana o sério risco de que o proprietário pode facilmente fugir da responsabilidade legal a pretexto de não ser o dono da obra ilegal, nem saber quem o seja. O presente caso dá um exemplar – aqui os dois recorrentes arrogaram apenas não serem dono das obras ilegais supra referidas.
Bem vistas as coisas, afigura-se-nos que o argumento “司法上訴人並不知悉涉嫌違法工程之存在” contende manifestamente com o rudimentar senso-comum e as regras de experiência, por virtude de que eles dois são comproprietários do prédio onde se verifica as ditas obras ilegais.
Chegando aqui e tomando em conta que os recorrentes não provam que o dono das obras ilegais acima apontadas seja outrem, não podemos deixar de colher que o despacho objecto do presente recurso contencioso não infringe os preceitos nos arts. 52.º e art. 56.º do RGCU.
Nos termos do disposto na alínea c) do n.º 2 do art. 30.º do Código Penal, não há margem para dúvida de que é manifesta e incuravelmente descabido o argumento de “17. 司法上訴人不能拆卸被訴決定所指的非法工程,因為該等不在OR/C單位內的非法工程並不屬於司法上訴人之所有,拆卸不屬於司法上人所有的工作物將會導致司法上訴人可能觸犯《刑法典》第206條所規定的毁損罪。”
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Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso.”
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Conforme se decidiu no Acórdão do Venerando TUI, no Processo n.º 21/2004: “Simplesmente, o Magistrado do Ministério Público, no recurso contencioso de anulação, não é parte. Assim, não há norma que impeça o juiz de fundamentar decisão aderindo a texto do Ministério Público, o que se observa a cada passo…”
Atento o teor das doutas considerações tecidas pelo Digno Procurador-Adjunto que antecede, concordamos inteiramente com a solução, acertada e sensata, nelas apresentada para o caso sub judice, pelo que remetemos para os seus precisos termos e, em consequência, julgamos improcedente o recurso contencioso.
É de realçar ainda que sendo os recorrentes comproprietários da fracção em causa, têm sempre o dever de administrar o imóvel como deve ser. Mesmo que na altura da compra do imóvel não tivessem conhecimento de as obras em causa serem ilegais (cujo ónus da prova impendia sobre os recorrentes mas não logrou-se a prova dessa factualidade), após a sua aquisição, passaram a ter o pleno gozo e administração do bem, daí que a partir de então tinham todo o dever de administrar o imóvel com a devida diligência, cabendo, entre outros, eliminar todas as obras ilegais existentes e não se limitando a receber rendimentos provenientes do arrendamento do imóvel.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, o Colectivo de Juízes deste TSI acorda em julgar improcedente o recurso contencioso interposto pelos recorrentes A e B, mantendo o acto administrativo impugnado.
Custas pelos recorrentes, com taxa de justiça em 8 U.C.
Registe e notifique.
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RAEM, aos 24 de Maio de 2023
Tong Hio Fong
(Relator)
Rui Pereira Ribeiro
(Primeiro Juiz Adjunto)
Fong Man Chong
(Segundo Juiz Adjunto)
Procuradora-Adjunta
Ma Iek
Recurso Contencioso 512/2022 Página 30