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Processo nº 369/2023
(Autos de Recurso Jurisdicional em Matéria Administrativa)

Data do Acórdão: 27 de Setembro de 2023

ASSUNTO:
- Impugnação da assinatura
- Ónus da prova
- Documento particular
- Nulidade do contrato de arrendamento
- Alojamento ilegal
- Multa

SUMÁRIO:
- Impugnada a assinatura de determinado documento por aquele contra quem o mesmo foi apresentado cabe à parte que apresenta o documento o ónus da prova de que a assinatura é da Autoria daquele;
- Tendo sido a autoridade administrativa quem tirou cópia do documento onde a impugnada assinatura havia sido aposta com a menção de que foi retirada do original a esta entidade cabe diligenciar por apresentar o original para efeitos dos exames forenses que se tenham por necessários;
- Não ficando provada a autenticidade da assinatura do contrato de arrendamento falece o pressuposto da aplicação da multa por alojamento ilegal ao suposto arrendatário do imóvel;
- O reconhecimento da assinatura em contrato de arrendamento é uma formalidade “ad probationem” não sendo a sua omissão, quando está demonstrada a existência do contrato de arrendamento fundamento para concluir pela nulidade do contrato e com base nessa nulidade concluir pela inexistência do mesmo isentando o arrendatário do imóvel da responsabilidade decorrente do alojamento ilegal.


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Rui Pereira Ribeiro








Processo nº 369/2023
(Autos de Recurso Jurisdicional em Matéria Administrativa)

Data: 27 de Setembro de 2023
Recorrente: Directora dos Serviços de Turismo
Recorrido: A
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

A, com os demais sinais dos autos,
veio interpor recurso contencioso do despacho de 28.06.2021 da,
Directora dos Serviços de Turismo, também, com os demais sinais dos autos,
que lhe aplicou uma sanção pecuniária no valor de MOP200.000,00, pedindo que seja anulado o acto recorrido.

Proferida sentença, foi julgado procedente o recurso contencioso, com a consequente anulação do acto recorrido.
Não se conformando com a decisão proferida veio a Entidade Recorrida recorrer da mesma, apresentando as seguintes conclusões:
I. Para o tribunal a quo, não existem no processo provas suficientes e irrefutávels para acusar o Recorrente;
II. Pelo que entendeu que a decisão da DST teve apenas por base a assinatura do Recorrente no contrato de arrendamento da fracção em questão e que apenas aquele contrato por ele assinado não seria prova bastante para o acusar do controlo da fracção onde era prestado alojamento ilegal;
III. Entendeu ainda o tribunal a quo que não teria ficado provado, incontestavelmente, ter sido o Recorrente quem celebrou aquele contrato de arrendamento por essa decisão se ter baseado apenas e unicamente numa cópia do contrato;
IV. Entendeu também o tribunal a quo que uma vez que o Recorrente impugnou a veracidade da assinatura aposta no contrato e como apenas existia uma cópia do contrato de arrendamento não foi possível fazer prova pericial da sua veracidade;
V. Entendeu também que, quer as declarações prestadas pelo agente imobiliário, quer os documentos entregues por ele, quer a cópia do documento de identificação, todos estes documentos assinados pelo Recorrente, não seriam prova bastante e admitida face ao previsto no n.º 1 do artigo 387.º do CCM;
VI. Entendeu igualmente o tribunal a quo que o contrato de arrendamento seria um contrato nulo por falta do requisito previsto no n.º 1 do artigo 1032.º do CCM e, estando nós perante um contrato nulo, estariamos dessa forma perante um acto praticado com erro nos pressupostos de facto;
VII. Entendeu também o tribunal a quo que, sendo o contrato nulo, por falta de forma, ainda que tivesse sido assinado pelo Recorrente, este não poderia ser considerado o arrendatário;
VIII. Conclui o tribunal a quo dizendo que ao cair o título, cairá naturalmente o acto administrativo que se fundava na existência desse título, pelo que o acto administrativo praticado pela DST deveria ser anulado;
IX. A DST não pode concordar com esta posição do tribunal a quo e isto porque:
X. Foram levadas a cabo todas as diligências possíveis e que estavam ao alcance da DST, em respeito pelos princfpios basilares de Direito que regem e orientam a sua actuação em busca e no apuramento da verdade dos factos;
XI. A decisão da Directora da DST baseou-se numa análise clara e precisa desses factos, fazendo a integração e subsunção jurídica, com clara referência às normas violadas, à infracção praticada e à sanção a aplicar in casu.
XII. Relativamente à alegação de que a assinatura no contrato de arrendamento não se assemelhava à sua, o Recorrente apesar de pedir perícia junto da Polícia Judiciária, nada conseguiu provar;
XIII. E, apesar de preso, nada fez para denunciar aquele contrato de arrendamento a fim de afastar definitivamente a sua responsabilidade na actividade ilegal que ali se desenvolvia e como arrendatário se mantinha quando da inspecção conjunta aos 27 de Agosto de 2019;
XIV. E, como é sabido, a assinatura de um contrato de arrendamento sobre uma fracção atribui ao arrendatário a sua posse e com ela um vasto conjunto de direitos e obrigações, entre os quais o de não permitir que qualquer pessoa permaneça e utilize indevidamente o seu locado, bem como a obrigação de zelar por este, afectando-o a um bom e prudente uso;
XV. Quanto à impugnação da sua assinatura e salvo melhor opinião, esse processo não é contra a administração, mas em sede civil e relativamente às partes naquele contrato;
XVI. A DST é de opinião, tal como a melhor doutrina e jurisprudência, que a nulidade do contrato não o torna inexistente, pois apesar de nulo, o negócio existiu como acto praticado e apesar de pudermos estar, numa relação puramente civilistlca, perante uma relação inquinada, isso não a torna inexistente, atende-se a este respeito o ensinado por Manuel de Andrade “a inexistência pressupõe que um negócio jurídico nem sequer chegou a ser concluído; a nulidade pressupõe que ele foi concluído, sim, mas sem os requisitos que legalmente é necessário observar na sua conclusão para que daí se sigam os efeitos jurídicos pretendidos. (...) concebe-se que haja casos em que, embora o negócio nulo não produza todos os efeitos que devia produzir, no entanto ainda possa produzir alguns, pelo menos efeitos laterais ou secundários, como que - telvez se possa dizer - seus filhos ilegítimos apenas, mas filhos em todo o caso”;
XVII. Ou como afirmado pelo douto TSI no Processo n.º 44/2013, de 12 de Março de 2015 “(...) não prejudica a possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situação de facto decorrente de actos nulos, por força do simples decurso de tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito. Não faz sentido o litígio da nulidade do referido contrato, apresentado no presente recurso contencioso, já que independentemente de ser nulo o contrato, os factos apurados pelo mesmo não vão deixer de existir. (...) Na verdade, não se pode passar uma esponja por cima de uma realidade independente da produção de efeitos do acto, ainda que nulo (...). Os eventuais efeitos putativos do acto nulo situam-se ainda ao nível de alguma juricidade remanescente do acto e não se confundem as consequências e transformações operadas no mundo dos factos que por via da invalidade fatal do acto, não podem desaparecer por um passo de mágica.”;
XVIII. Ou no mesmo sentido o referido no Acordão do STJ, no Processo n.º 03B484, de 16 de Outubro de 2002 ou ainda do Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, no Processo n.º 00636/14.2BEVIS, de 22 de Janeiro de 2016: “Poder-se-ia argumentar que pela eficácia retroactiva da declaração de nulidade tudo se passa como se o contrato não tivesse sido celebrado, ou produzido quaisquer efeitos (...). Todavia, a nulidade, conquanto tipicizada pelos mais drásticos predicados de neutralização do negócio operando interactivos ex tunc, nem assim pode autorizar a ilação de que o negócio jurídico seja equivalente a um nada, tal como se pura e simplesmente não tivesse acontecido. A celebração do negócio revela-o existente como evento e por isso não está ao alcance da ordem, jurídica tratar o acto realizado como se este não houvesse realmente ocorrido, mas apenas recusar-lhe a produção de efeitos jurídicos que lhe vão implicados. Não é, por conseguinte, exacta a ideia de que, mercê da nulidade, tudo se passa como se o contrato não tivesse sido celebrado ou produzido quaisquer efeitos. Bem ao invés porque o contrato é algo que na realidade aconteceu, daí precisamente a sua repercussão no subsequente relacionamento jurídico das partes.”;
XIX. Para além da relação civilística, com sede própria para ser tratada, estamos, in casu, perante uma relação administrativa que não pode ser pura e simplesmente apagada, já para não falar no conflito entre os interesses públicos e os interesses privados aqui em questão, sendo que, salvo melhor opinião, deverá, in casu, prevalecer o interesse público “(...) são também aqui relevantes o interesse público que releva na actividade administrativa é aquele que é determinado, em função de sãos critérios, no respeito pela legalidade, considerados fundamentais para a existência, conservação e desenvolvimento da sociedade, traduzindo o interesse público a ideia dominante de todas normas juridico-administrativas, assentando aquele interesse numa ordem social pacífica. (...) prevalece a prossecução do interesse público, quando perante os diferentes interesses em jogo prevalece o de maior monta, o que assenta no primado da lei, na transparência das decisões administrativas expurgadas de actuações criminosas (...)” in TSI Processo n.º 755/2012 de 18 de Junho de 2015;
XX. Não podemos perder de vista o facto de estarmos perante factos ilícitos e comportamentos altamente reprováveis e reprovados pela sociedade e pelo ordenamento jurídico, factos e comportamentos esses aos quais fechar os olhos e fazer deles tábua rasa vai absolutamente contra os princípios da segurança jurídica e de protecção da confiança e consequente estabilidade da sociedade;
XXI. Realtivamente ao problema das pensões ilegais, os diversos sectores sociais assim como a população afectada continuam hoje, tal como no passado, a prestar grande atenção e a apelar ao Governo para que seja feito um combate severo a essa actividade ilícita, e foi perante tal problema que houve necessidade em 2010 de elaborar uma lei específica para reforçar o combate a este fenómeno que, apesar de todos os esforços da DST, perturbava e continua a perturbar a vida das pessoas e a exploração normal dos estabelecimentos hoteleiros;
XXII. Esta lei foi aprovada num contexto em que as pensões ilegais proliferavam descontroladamente em Macau, trazendo enorme preocupação para as autoridades governamentais e a população e acarretando grave perigo para a saúde e sequrança públicas dos moradores dos prédios ou fracções onde se prestava o alojamento ilegal;
XXIII. Essa preocupação do Governo foi expressa no Parecer n.º 1/IV/2010, elaborado pela 1ª Comissão Permanente, quando da discussão sobre a proposta de Lei intitulada “Proibição de prestação ilegal de alojamento” quando afirma “Com efeito, para além da questão do combate a um flagelo que vem afectando, por diversas vias, a sociedade de Macau com repercussões ao nível da sequrença e da higiene públicas, do conforto dos moradores de prédios e fracções destinadas somente a habitação, tem havido dificuldades em operar um efectivo combate ao fenómeno nomeadamente esbarrando em alguns constrangimentos judiciais (...)”;
XXIV. E nesse contexto, podemos igualmente afirmar que a escolha do legislador de multas com valor bastante elevado foi intencional, pois tal era essencial para se alcançar um efeito dissuasor e também para se poder punir, de forma severa, os infractores;
XXV. Pelo que e tal como afirma o tribunal a quo, “(…) pode extrair-se o corolário de que o controlo do prédio ou da fracção autónoma que releva para a responsabilização do infractor nos termos do artigo 10.º, n.º 1 da Lei n.º 3/2010, foi concebido como tipo de controlo virtual e abstrato, em vez de ser fáctico e concreto, que provenha da posição jurídica que o infractor ocupa na relação de arrendamento da fracção.”, assim tem sido o entendimento do douto TSI, indo na senda da punição do controlador “por qualquer forma” da actividade que se desenvolve em fracções autónomas com finalidade habitacional e que são usadas de forma ilícita;
XXVI. Ora, olhando para a ambiência em que esta actividade se desenvolvia na fracção em questão, ela mostrou-nos um quadro que não afastava de modo nenhum a existência do ilícito e como tal não restou qualquer dúvida de que era o Recorrente quem, à data da inspeção conjunta aos 27 de Agosto de 2019, constava como arrendatário da fracção, não tendo feito absolutamente nada para denunciar. tal contrato, sendo precisamente essa atitude passiva, que na maior parte das situações, permite e facilita que terceiros explorem este tipo de actividade ilegal em fracções autónomas com finalidade habitacional;
XXVII. O que foi reconhecido também pelo tribunal a quo na sentença ora em escrutínio quando afirma: “(...) este nem por isso estaria isento de culpa por omissão do dever de “olhar pela coisa e saber do que ali se passava”, que lhe decorre do artigo 983.º do CCM, a não ser que lograsse demonstrar ser impossível de cumprir esse dever, ainda mediante a intervenção do terceiro (...)”;.
XXVIII. Assim e salvo melhor opinião, temos em crer que o que realmente releva é a assinatura do Recorrente aposta no contrato de arrendamento que lhe atribuiu a qualidade de arrendatário, o consequente controlo da fracção e o dever de por esta zelar, garantindo que nela não seja exercida qualquer actividade ilegal e, esse dever de zelo, foi também pelo Recorrente assumido na declaração que assinou quando do arrendamento da fracção e ao não cumprir os deveres que emanam do contrato, há matéria bastante para integrar a infracção prevista no n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 3/2010;
XXIX. Pelo que quando o tribunal a quo afirma: “(...) Assim, ainda que a autoria da assinatura do contrato devesse ser imputada ao Recorrente, tal contrato, pelo facto de padecer da nulidade formal, nunca poderia conferir ao Recorrente a qualidade de arrendatário (...)”, por todo o entendimento vindo a ser referido não podemos deixar de considerar esta opinião perigosa;
XXX. Acreditamos que a alteração ao n.º 1 do artigo 1032.º, segundo o Parecer n.º 5/V/2017, emanado pela Assembleia Legislativa, tinha, entre outros, o objectivo de combater e travar os chamados “arrendatários trapaceiros”, mas tememos que esta decisão do tribunal a quo, venha abrir uma porta para que outro tipo de “arrendatário trapaceiro” e todo um leque de “trapaceiros” se aproveite para defraudar a lei, pois ela permitirá o surgimento de um manancial de desculpas e mentiras, por parte destes “arrendatários trapaceiros”, para conseguirem fugir à lei e à sua responsabilização;
XXXI. Tememos ainda que esta decisão do tribunal a quo dê abertura para a subversão de todo o sentido e espírito da lei, podendo inclusivamente criar ainda mais dificuldades ao combate deste enorme flagelo do que aquele que a administração já tem no seu trabalho diário, veja-se o Acordão do TSI, no processo n.º 262/2014, de 27 de Novembro, quando refere “(...) Assim se compreende que o legislador se tenha preocupado em alargar e apertar a rede, para permitir à administração um combate mais eficaz àquela actividade ilegal e, para contornar estas situações, tenha optado por responsabilizar, também, aquele que detém a posse do imóvel onde aquela actividade se desenvolve. No fundo, estende-se a responsabilização a quem, ainda que não preste directamente acolhimento, angarie hóspedes ou receba contrapartidas, também aqueles que, por terem a posse ou detenção do prédio, não deixam de pactuar com essa situação, ao permitirem que ela se desenvolva em espaço sob o seu domínio. Por isso, o legislador atribuiu o mesmo grau de censura a quem controla por qualquer forma o prédio ou fracção autónoma e a quem presta o alojamento, punindo ambas as situações da mesma forma (…)”;
XXXII. À DST, como entidade administrativa e sempre norteada pelos princípios que orientam é balizam a sua actuação, tem a obrigação de fazer uma investigação cuidada e rigorosa a fim de poder reunir todas as provas que levem ao apuramento da verdade, por forma a punir os infractores e combater, tão eficazmente quanto possível, o flagelo que é, para a sociedade em geral e para os residentes em particular, a utilização em prédios habitacionais de fracções autónomas para a promoção de alojamento ilegal.
XXXIII. Por tudo o explicado, a DST reitera que não pode concordar com a douta sentença do tribunal a quo, uma vez que os factos apurados e dados como provados no processo sancionatório, consubstanciam a violação do previsto no n.º 1 do artigo 10.º da Lei nº 3/2010, de 02 de Agosto, devendo assim ser aplicada ao Recorrente a sanção prevista legalmente pelo controlo da fracção na qual se desenvolvia a actividade de alojamento ilegal.
Contra-alegando veio o Recorrente e agora Recorrido apresentar as seguintes conclusões:
1. Nos presentes autos o ora Recorrido interpôs recurso contencioso contra o acto da Exma. Senhora Directora da DST, de 28 de Agosto de 2021, no processo administrativo com o auto de notícia nº 234/DI-AI/2019, que lhe aplicou sanção de multa no valor de MOP$200,000.00 por prestação ilegal de alojamento, ao abrigo da Lei n.º 3/2010.
2. No seu recurso contencioso apontou o Recorrente ao acto recorrido a violação de lei, mormente dos artigos 9.º e 86.º do CPA, bem como dos art.ºs 10.º, 14.º, n.º 2 e 21.º da Lei 3/2010, os princlpios do inquisitório e da investigação que regem os procedimentos referentes a infracções administrativas, previstas no DL n.º 52/99/M e o erro nos pressupostos de facto.
3. Foi julgada provada a matéria de facto constante de página 6 da douta Sentença recorrida, tendo, a final, julgado o douto Tribunal recorrido procedente o recurso contencioso apresentado, anulando o acto recorrido, com, base no erro dos pressupostos de facto.
4. Referindo-se doutamente que tendo sido arguida a falsidade do contrato de arrendamento, e não tendo sido estabelecida a genuinidade do contrato de arrendamento que a Administração Pública entendeu ter sido celebrado pelo ora Recorrido, nos termos da repartição do ónus da prova, incorreu o acto sancionatório em erro nos pressupostos de facto, por se ter fundado meramente na qualidade de arrendatário do Recorrido; e; ainda que,
5. O contrato de arrendamento sub judice foi celebrado sem as assinaturas notarialmente reconhecidas, ao contrário do que dispõe o art.º 1032.º do CCM, sendo, portanto, nulo, ao abrigo do disposto no art.º 212.º do mesmo Código. Entendendo o douto Tribunal a quo que sendo o contrato nulo, nunca poderia o mesmo conferir ao Recorrente a qualidade de arrendatário, não estando o mesmo vinculado aos deveres postulados no art.º 983.º do CCM. Caindo o título, cairá necessariamente o acto administrativo em que se fundou na existência desse título.
6. Inconformada, interpôs a Entidade Recorrida recurso para este Venerando TSI, alegando, em suma, que a Sentença recorrida violou o art.º 10.º, n.º 1, da Lei n.º 3/2010, por entender que os factos apurados e provados no processo sancionatório seriam sutíclentes para fundamentar a condenação do Recorrido.
7. Da conjuqaçêo dos artigos 2.º, n.º 3, e 10.º, n.º 1, da Lei n.º 3/2010, facilmente se retira que só é punido com a multa aí referida quem prestar ilegalmente alojamento ou controlar por quatquer forma a fracção autónoma utilizada para alojamento ilegal. I.e., tem de se provar, por qualquer dos meios de prova permitidos por lei, que a pessoa visada tenha incorrido numa dessas condutas.
8. O único fundamento no qual se fundou o acto recorrido para punir o Recorrente por prátíca de alojamento ilegal foi o de alegadamente ter aquele assinado um contrato de arrendamento sob a fracção em causa. Contrato esse do qual só existe cópia, e, tanto quanto se saiba, nenhum original.
9. Sendo que, como decorre amplamente da Sentença recorrida, não resultou provado que o Recorrente tenha assinado esse contrato de arrendamento.
10. Foi no processo administrativo errrergente do auto de notícia n.º234/DI-AI/2019, exarado no relatório n.º 608/DI/2021, o Recorrente acusado de prestar alojamento ilegal, por constar da cópia de um contrato de arrendamento como sendo arrendatário da fracção sita na Rua de ......, n.º ..., edf. ......, 7º andar D.
11. Contrato de arrendamento esse que além de ser uma mera cópia, não seguiu a forma legal imposta pelo art.º 1032.º do Código Civil, por não estarem as assinaturas reconhecidas, sendo, portanto, o contrato nulo, nos termos do art.º 212.º desse mesmo Código.
12. Fracção autónoma na qual, após uma operação policial levada a cabo em 27 de Agosto de 2019, descobriu-se que 11 pessoas foram alojadas ilegalmente na referida fracção autónoma 7D, várias destas pessoas familiares entre si. Sendo que nenhum dos ocupantes da fracção identificou o Recorrido A; nem tampouco declarou alguma vez o terem visto ou conhecido.
13. O Recorrido, por seu lado, encontra-se desde o mês de Fevereiro de 2019 preso no Estabelecimento Prisional de Coloane, em cumprimento de pena de prisão, tanto que o seu interrogatório no âmbito dos autos administrativos decorreu no interior do Estabelecimento Prisional.
14. Tirando a alegada assinatura do Recorrente na cópia do contrato de arrendamento, nenhuma outra prova foi colhida de que ele tivesse o controlo da fracção ou fosse seu efectivo arrendatário.
15. Decorrendo do próprio relatório da DST que “Mesmo que os elementos que constam dos autos não consigam comprovar que A introduziu e organizou a estadia dos ocupantes na referida fracção, ou que tenha recebido o preço da estadia através deles, aliás, não conseguindo ainda comprovar que A conhecia nenhum dos ocupantes, podendo ainda excluir a possibilidade de A ter participado directamente na prestação de alojamento ilegal, ainda assim, não se pode contrariar que A, na qualidade de locatário, tinha o dever de controlar a fracção”.
16. O Recorrente fel notificado da acusação contra si deduzida, e apresentou, no prazo leqal, a respectiva defesa, afirmando perentoriarmente que não fôra ele que assinou o contrato de arrendamento sub judice, afirmando que tal documento havia sido falsificado, é requerendo à DST que fosse levada a cabo uma perícia sobre o documento, para se averiguar se a assinatura no contrato de arrendamento era do seu punho.
17. Diligência de prova que a Entidade Recorrida ignorou por completo, sendo que no dia 27 de Agosto de 2019 foi proferido o acto administrativo ora recorrido; o qual condenou o Recorrente a pagar uma multa de MOP$200,000.00 (duzentas mil patacas) por prestação ilegal de alojamento.
18. Pelo que não pode colher o argumento da Entidade Recorrida no sentido de que “A DST levou a cabo todas as diligências possíveis e que estavam ao seu alcancem em respeito pelos princípios basilares de direito”.
19. Bem andou o douto Tribunal a quo ao determinar que o acto recorrido se fundou simplesmente no facto de o Recorrente contencioso ter assinado um contrato de arrendamento, mas que, na verdade, não resultou provado que assinou.
20. Os argumentos avançados pela Entidade Recorrida na sua alegação de recuros partem, salvo o devido respeito, e novamente, de um pressuposto errado: o de que o Recorrente A assinou o contrato de arrendamento em causa. Mas tal facto não ocorreu.
21. O Recorrente impugnou expressamente a veracidade da assinatura aposta no contrato de arrendamento, pelo que era à Entidade Recorrida que, face à arquição de falsidade do contrato por parte do Recorrente, cabia fazer prova desse facto,
22. A Entidade Recorrida podia, querendo, e ao abrigo do direito que processualmente lhe cabia, fazer prova por outros meios de que o Recorrente controlava a fracção em causa. Mas não o fez. Mantendo sempre o entendimento de que a cópia do contrato de arrendamento em causa, era suficiente para sustentar o acto recorrido mas, como já se viu, esse manifestamente não é o caso, porquanto foi nos termos legais arguida a falsidade do contrato em causa.
23. Tal falsidade foi arguida pelo próprio Recorrente nas suas declarações prestadas no EPC. Posteriormente na sua contestação à acusação da DST. E finalmente no próprio Recurso contencioso. Pelo que teve a Entidade Recorrida várias hipóteses para fazer contraprova desse facto, ónus que não cumpriu.
24. Quanto ao segundo fundamento elencado na douta Sentença para anular o acto recorrido (que, na verdade, com a procedência do fundamento anterior, nem precisa de se dar por verificado) a nulidade do contrato de arrendamento, também nenhum reparo se afigura merecer.
25. Conforme muito bem referido no Aresto, já sé julgou no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, no processo n.º 260/2014, de 21/4/2016, que a nulidade formal não pode conferir qualquer qualidade de arrendatário pelo gozo e utilização imediata da coisa, não estando, portanto, vinculado aos deveres elencados no art.º 983,º do CCM.
26. Não havendo razões para ínclulr nos efeitos putativos do contrato nulo a penalização por prestação de alojamento ilegal nesses casos, quando o que está em causa é tão só a qualidade de arrendatário do alegado infractor, como é o caso dos autos. Diferente seria se a Administração tivesse feito prova de um efectivo controlo da fracção, o que não é o caso dos autos,
27. Assim, e diferentemente daquilo que é aleqado pela Entidade Recorrida, não se trata de melindrar o combate à prestação de alojamento ilegal, que naturalmente deve ser combatida.
28. O que se trata é o de exigir que- seja feito o mínimo de prova ou da prestação de actividade ilegal ou o de controlo da fracção. E, in casu, nem a prova de uma nem a prova de outra foi efectivamente realizada. Pelo que não houve qualquer violação do disposto no art.º 10.º da Lei n.º 3/2010.
29. Pelo que deve improceder in tatum o recurso da Entidade Recorrida, sendo mantida integralmente a douta Sentença recorrida, e mantidos todos os doutos fundamentos para a anulação do acto recorrido.

Foram os autos ao Ilustre Magistrado do Ministério Público o qual emitiu o seguinte parecer:
«1.
A, melhor identificado nos autos, interpôs recurso contencioso do acto praticado pela Directora dos Serviços de Turismo datado de 28 de Agosto de 2021 que aplicou à recorrente uma multa no valor de 200.000,00 patacas pela prática da infracção administrativa prevista no artigo 10.º, n.º 1 da Lei n.º 3/2010.
Por douta sentença do Tribunal Administrativo que se encontra a fls. 184 a 190 dos presentes autos foi o recurso contencioso julgado improcedente.
Inconformada com a dita sentença, veio a Entidade Recorrida interpor o presente recurso jurisdicional, pedindo a respectiva revogação por parte do Tribunal de Segunda Instância.
2.
Embora sem aderirmos na íntegra aos fundamentos da douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo, parece-nos que o presente recurso não merece provimento.
Procuraremos demonstrar porquê.
(i)
O acto administrativo contenciosamente recorrido aplicou à Recorrente uma multa no montante de 200.000,00 patacas pela prática da infracção prevista no n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 3/2010.
Aí se preceitua:
«Quem prestar ilegalmente alojamento ou controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento é punido com multa de 200 000 a 800 000 patacas».
Como resulta expressamente da fundamentação do acto recorrido, o Recorrente foi responsabilizado em virtude de, segundo a Administração, ser o arrendatário da fracção autónoma que servia de alojamento ilegal e, por via dessa qualidade jurídica, ter o controlo da dita fracção.
Sabemos todos que, no contencioso de mera legalidade, com natureza meramente impugnatória, como é o caso do recurso contencioso, o tribunal tem de se ficar pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto impugnado tal como ele ocorreu, apreciando, pois, a respectiva validade, em face da fundamentação contextual integrante do próprio acto (veja-se neste sentido, por exemplo e entre muitos outros, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27.01.2016, processo n.º 43/16, disponível em linha).
Significa isto, portanto, que a questão que se discute nos presentes autos deve ser delimitada, face aos termos da motivação do acto administrativo contenciosamente recorrido, a saber se está ou não demonstrada a qualidade de arrendatário da fracção do Recorrente contencioso e, portanto, se o Tribunal Administrativo julgou ou não bem essa questão.
(ii)
A douta sentença a quo concluiu no sentido da não demonstração da qualidade de arrendatário do Recorrido com base em dois fundamentos. A saber:
- Em primeiro lugar, a falta de prova de que o Recorrente tenha celebrado o contrato de arrendamento que a Administração considerou constituir a fonte da respectiva posição de arrendatário;
- Em segundo lugar, como que subsidiariamente, a nulidade do contrato de arrendamento por falta de reconhecimento notarial das assinaturas nele apostas, em contravenção do disposto no artigo 1032.º do Código Civil.
A Entidade Recorrida não se conforma com este julgamento, alegando que ambos os fundamentos são insubsistentes.
Vejamos.
(iii)
(iii.1)
A primeira questão suscitada no recurso, apesar de assim não vir apresentada pela Recorrente, visa obter a reapreciação da matéria de facto por parte do Tribunal ad quem, no que se nos afigura como uma pretensão processualmente legítima, face ao disposto no artigo no artigo 39.º da Lei n.º 9/1999 e no artigo 629.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ao processo administrativo contencioso por força do disposto no artigo 1.º do CPAC.
Além disso, também nos quer parecer que a Recorrente se desincumbiu de forma satisfatória do ónus a que se refere a norma do artigo 599.º do CPC, na medida em que, da respectiva alegação resulta, sem margem para dúvidas, por um lado, qual o ponto da matéria de facto que a Recorrente considera ter sido julgado incorrecta [artigo 599.º, n.º 1, alínea a), do CPAC] e que é o relativo à aposição da assinatura no contrato de arrendamento por parte do Recorrido e, por outro lado, também se extrai daquela alegação quais os concretos meios probatórios constantes do processo, incluindo do processo administrativo, que impunham decisão diversa, bastando, para assim concluir, atentar, em especial, nos pontos 10, 14, 17 e 26 das alegações de recurso.
Isto dito.
(iii.2)
Começaremos por notar que o facto de toda a prova ter sido produzida no procedimento administrativo, não constitui qualquer limite relativamente aos poderes de plena reapreciação dessa prova por parte do tribunal, seja do Tribunal Administrativo, seja, em recurso, do Tribunal de Segunda Instância.
Com efeito, cremos estar hoje definitivamente ultrapassado o entendimento segundo o qual a intervenção fiscalizadora na apreciação da prova por parte do tribunal estaria sujeita aos limites que são próprios da apreciação do exercício de poderes discricionários por parte da Administração, de tal modo que essa intervenção judicial ficaria reservada para as situações de existência de erros grosseiros e manifestos na valoração da prova.
Não pode deixar assim, segundo pensamos, num paradigma processual como é o nosso que repousa numa garantia constitucional expressa de acesso por parte dos particulares aos tribunais para fiscalizar os actos da Administração (artigo 36.º da Lei Básica), depois densificada ao nível da lei ordinária na consagração do princípio da tutela judicial efectiva dos direitos subjectivos públicos e dos interesses legalmente protegidos (artigo 2.º do CPAC) a concretizar-se através, entre outros, de um meio processual como o recurso contencioso que é concebido como um processo de partes que estão submetidas a um estatuto de igualdade no que aos respectivos poderes processuais diz respeito (artigo 23.º do CPAC) e que prevê um ónus de contestação e impugnação por parte da Entidade Recorrida (artigo 55.º do CPAC) e que abre a porta, com grande amplitude, a todos os meios de prova, com excepção do depoimento de parte, no quadro de um princípio do inquisitório também expressamente plasmado na lei (artigo 67.º do CPAC).
Na verdade, nesta matéria não se detectam margens de abertura discricionária, é dizer, não se vislumbra que na apreciação da prova em sede de procedimento administrativo, a Administração recorra a valorações autónomas e próprias da função administrativa com base nos seus juízos de apreciação que possam justificar que ao tribunal fique reservado um papel meramente residual ou secundário (em geral, sobre a discricionariedade como espaço de valorações próprias da Administração, por todos, PEDRO COSTA GONÇALVES, Manual de Direito Administrativo, volume I, Coimbra, 2020, pp. 220-222).
Daí que, os tribunais, em princípio devam reapreciar o julgamento de facto feito pela Administração em toda a sua extensão, ou seja, devem reapreciar todos os elementos de prova que foram produzidos nos autos (neste mesmo sentido, veja-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29.10.2020, processo n.º 035/12.0BECBR, com versão integral disponível em dgsi.pt. Na doutrina, já no mesmo sentido, LUÍS FILIPE COLAÇO ANTUNES, O juiz administrativo, súbdito da prova procedimental?, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 56, pp. 3-17, em especial, pp. 15 e 17).
De resto, à luz da princípio da unidade do sistema, não se compreenderia que, por um lado, a lei admitisse, como admite, que o Tribunal de Segunda Instância pudesse modificar a decisão do Tribunal de 1.ª instância sem qualquer limitação a erros grosseiros e manifestos, como decorre do artigo 629.º do CPC, e se não admitisse a sindicância judicial plena da apreciação da matéria de facto feita pela Administração em sede procedimental quando o tribunal é chamado a fiscalizar contenciosamente a legalidade de determinado acto administrativo (chamando também a atenção para este ponto, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29.10.2020, processo n.º 035/12.0BECBR antes citado).
(iii.3)
O recurso contencioso de um acto administrativo, dirigindo-se à respectiva anulação pode e deve ser configurado como uma contestação por parte do recorrente da posição que a Administração assumiu ao praticá-lo. Nessa contestação, o particular nega que a Administração dispusesse das condições materiais e/ou formais ou procedimentais para exercer o poder que se consubstanciou no acto recorrido (nestes termos, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, A Anulação dos Atos Administrativos no Contexto das Relações Jurídico-Administrativas, 2.ª edição, p. 134).
Deste modo, no recurso contencioso de anulação assiste-se a uma inversão das posições processuais das partes por comparação com as posições que lhes pertencem no quadro da relação jurídica substantiva. Quer isto dizer que, embora na relação processual seja o impugnante que surge como autor, no plano substantivo é a Administração quem é titular da pretensão que assumiu ao praticar o acto (assim, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Sobre as regras de distribuição do ónus material da prova no contencioso administrativo de anulação de actos administrativos, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 20, p. 48).
Esta inversão das posições processuais das partes projecta-se, naturalmente, no plano da distribuição do ónus da prova. Assim, se o recorrente contencioso alegar matéria de impugnação, é dizer, o não preenchimento dos pressupostos do acto, deve recair sobre a Administração o risco da falta de prova da respectiva verificação por ser sobre ela que incide o ónus da prova (neste sentido, que nos parece ser o correcto MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Sobre as regras …, p. 49. Já no sentido de que à Administração deve caber o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais vinculativos da sua actuação, designadamente se agressiva, veja-se JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, Justiça Administrativa, Coimbra, 1998, p. 219. Como sabemos, o ónus da prova constitui, essencialmente, uma regra de decisão (MANUEL DE ANDRADE) destinado a permitir ultrapassar situações de falta de prova ou de dúvida quanto à realidade de determinado facto, transformando uma situação de non liquet numa situação de liquet contra a parte onerada que apenas deve ser chamada a intervir quando as vias probatórias possíveis estiverem esgotadas).
(iii.4)
Está em causa, no caso em apreço, o julgamento sobre a matéria de efectuado pelo Meritíssimo juiz do Tribunal Administrativo que considerou não estar provado que foi o Recorrido que apôs a sua assinatura no contrato de arrendamento junto aos autos e no qual a Administração se baseou para concluir que aquele tem a posição de arrendatário e, por isso, tinha o controlo da fracção autónoma na qual tinha lugar o alojamento ilegal.
O percurso argumentativo-decisório da douta decisão recorrida, no ponto controvertido, foi o seguinte: «(…) o Recorrente impugnou a veracidade daquela assinatura como do seu próprio punho. Tratando-se do documento particular, se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ‘incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade’ (cfr. artigo 368.º, n.º 2 primeira parte do CCM). É que na generalidade dos casos, o meio de prova adequado ao estabelecimento da autoria é a prova pericial, mas não está excluída a utilização de outro meio de prova, como a testemunhal. No caso concreto, pela falta da junção do documento original, não foi possível produzir a prova pericial tendente a apurar a prova pericial tendente a apurar a veracidade da assinatura que consta da cópia (veja-se a este propósito, fls. 112 a 162 dos autos). E quanto às provas testemunhais produzidas perante a Recorrida, designadamente, o de tal agente imobiliário (…), quem referiu ter presenciado a assinatura do contrato de arrendamento por parte do Recorrente na data de 17/12/2018, tal prova não pode ser admitida manifestamente face ao previsto no artigo no artigo 387.º, n.º 1 do CCM, por estar em causa a demonstração de um contrato de arrendamento que houver de ser reduzido a escrito por força do artigo 1032.º, n.º 1 do CCM). Nestes termos, sem que haja sido estabelecida a genuinidade do contrato de arrendamento em causa, como não há outras provas destinadas à sua demonstração, a dúvida sobre a realidade de um facto resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita (cfr. artigo 437.º do CPC), ou seja, não se provou que o Recorrente celebrasse o contrato de arrendamento com o senhorio da fracção autónoma, o que inquinou o acto sancionatório de erro no pressuposto de facto, por se ter fundado na qualidade do arrendatário do Recorrente».
Com todo o respeito, não podemos, nesta parte, acompanhar a douta decisão recorrida.
De acordo com o n.º 2 do artigo 368.º do Código Civil, «se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade», sendo que, para lograr este desiderato, na falta de disposição legal que o proíba, não está o apresentante do documento impedido de lançar mão de qualquer meio de prova, da mesma forma que, para formar a sua convicção acerca da dita autoria, não há obstáculo a que, a Administração, no procedimento, ou, o Tribunal, no processo contencioso, esteja impedido de se socorrer de qualquer meio de prova, designadamente, da prova testemunhal.
Não nos parece, contrariamente ao que foi doutamente decidido pelo Meritíssimo juiz a quo, que a norma do n.º 1 do artigo 387.º constitua obstáculo à consideração e valoração da prova testemunhal, uma vez que essa norma - «se a declaração negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes, houver de ser reduzida a escrito, não é admitida prova testemunhal» - se não aplica à prova da assinatura (veja-se, neste mesmo sentido, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 2022, processo n.º 11/13.6TCFUN.L2.S1 com amplas referências doutrinais).
Deste modo, não estando vedado, na falta de prova pericial, o recurso à prova testemunhal para provar que foi o Recorrido quem apôs a sua assinatura no contrato de arrendamento, parece-nos, tal como já foi sustentado pelo nosso ilustre Colega junto do Tribunal Administrativo, que a prova recolhida no decurso do procedimento administrativo é de molde a permitir suportar, com a necessária segurança, a conclusão que foi o Recorrido quem assinou o contrato. Na verdade, entre as diversas diligências instrutórias assume particular relevância a do depoimento do mediador imobiliário que afirmou que o Recorrido assinou perante ele o contrato de arrendamento, além de que o Recorrido também lhe entregou uma cópia do documento de identificação no qual constava um número de telefone idêntico ao que consta da declaração de identificação fornecida pelo Recorrente à Direcção dos Serviços de Turismo.
Destes elementos, apreciados conjugadamente à luz das regras da experiência, até com outros elementos menos incisivos igualmente emergentes dos autos, cremos poder extrair-se, como antes referimos, a prova positiva da assinatura do contrato de arrendamento por parte do Recorrido. Não ocorre, a nosso humilde ver, dúvida razoável sobre a dita questão de facto que justifique a intervenção da regra do ónus da prova para decidir tal questão em desfavor da parte onerada, no caso a Administração. Daí que se nos afigure que, nesta parte, a douta decisão recorrida não se pode manter.
(iv.1)
No segundo segmento da fundamentação da sentença impugnada, o Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo considerou, a título subsidiário, se assim podemos dizer, que o contrato de arrendamento, mesmo a considerar-se que foi assinado pelo Recorrido, enferma de nulidade por inobservância da forma legal.
Parece-nos que assim é. Pelo seguinte.
De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 1032.º do Código Civil, que dispõe sobre a respectiva forma, o contrato de arrendamento é celebrado por escrito particular, devendo as assinaturas dos contraentes ser reconhecidas notarialmente. A lei, portanto, não impõe apenas, como sucedeu até à entrada em vigor da Lei n.º 13/2017, a observância da forma escrita, exige, além disso, o reconhecimento notarial das assinaturas dos contratantes.
No caso em apreço, é incontroverso que as assinaturas apostas no documento que formalizou o contrato de arrendamento aqui em causa não foram reconhecidas notarialmente, pelo que não pode deixar de concluir-se ter ocorrido a preterição da forma imposta por lei e que esta, como é próprio dos vícios de forma dos negócios jurídicos, é geradora da nulidade do contrato face ao disposto no artigo 212.º do Código Civil (no mesmo sentido de que a preterição do reconhecimento das assinaturas, quando exigido por lei, gera a nulidade do contrato por vício de forma, pode ver-se, entre outros, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 5.3.2016, processo n.º 1159/14.5TBCLD.C1, disponível em dgsi.pt).
Sempre diremos, complementarmente, que, em nosso modesto entendimento, com a alteração no n.º 1 do artigo 1032.º do Código Civil introduzida pela Lei n.º 13/2017, deixou, definitivamente, de poder considerar-se que a forma do contrato de arrendamento é meramente ad probationem, ou seja, destinada apenas à prova da declaração negocial, ao invés do que, face à redacção primitiva do Código Civil se podia, com alguma tranquilidade, defender.
Com efeito, a alteração introduzida no n.º 1 do artigo 1032.º do Código Civil implica, se estamos a ver bem, uma necessária releitura hermenêutica da norma contida no n.º 2 desse mesmo artigo a qual possa permitir abranger no âmbito da sua regulação as situações, como a dos presentes autos, em que não falte a forma escrita ao contrato (única situação abrangida pela letra do n.º 2 do artigo 1032.º do Código Civil), mas falte o reconhecimento notarial das assinaturas apostas no documento. Segundo nos parece, contrariamente ao que sucede com o próprio contrato, cuja prova pode ser feita por outro modo que não através de documento escrito, assim se suprindo a falta deste, esse suprimento, pela própria natureza das coisas, não pode ter lugar em relação ao reconhecimento notarial das assinaturas.
Assim, a forma de conferir utilidade ao disposto no n.º 2 do artigo 1032.º do Código Civil que se nos afigura mais consentânea com a respectiva finalidade, é a de considerar que da norma ali contida resulta um impedimento à invocação da nulidade derivada da falta de reconhecimento notarial das assinaturas por parte do contratante ao qual for imputável a preterição dessa formalidade. Se assim for, como cremos que é, estaremos, portanto, perante uma nulidade atípica, na medida em que a sua invocação fica vedada a uma das partes do contrato, caso a mesma lhe seja imputável.
Nas hipóteses em que nada se demonstra quanto à imputabilidade da falta de forma, incluindo a falta de reconhecimento notarial das assinaturas, a nulidade será invocável por qualquer interessado, podendo, além disso, ser oficiosamente declarada pelo tribunal nos termos gerais resultantes da norma do artigo 279.º do Código Civil.
(iv.2)
No caso em apreço, sendo o contrato nulo por vício de forma, tal significa que o mesmo não produziu, desde o início, os efeitos a que tendia, sendo, pois, desprovido de força jurísgena, de tal forma que o Recorrido não chegou a adquirir, em momento algum, contrariamente ao que foi pressuposto pela Administração no acto recorrido, a posição de arrendatário, ou, mais correctamente, os direitos e obrigações emergentes da celebração, como locatário, do dito contrato.
Ora, tendo o acto impugnado, como acima vimos, assentado no pressuposto de que o Recorrido tinha o controlo da fracção autónoma porque era arrendatário desta e demonstrando-se que o mesmo não chegou a adquirir essa qualidade em virtude da nulidade do contrato de arrendamento, a consequência dessa demonstração não pode deixar de ser a da anulabilidade de tal acto por violação de lei.
Uma última nota: tal como a decisão recorrida, argutamente, não deixou de assinalar, a demonstração de que ao arrendatário falta a qualidade jurídica de arrendatário não excluiria, em tese, que o mesmo pudesse ter exercido um controlo de facto da fracção autónoma, o qual seria suficiente para a sua responsabilização no âmbito do artigo 10.º, n.º 1 da Lei n.º 3/2010. O ponto é que o acto administrativo recorrido se não fundou nesse eventual controlo fáctico, antes se cingiu, exclusivamente, à invocação da qualidade, necessariamente jurídica, de arrendatário por parte do Recorrido, pelo que, falhando, como no caso falha, a demonstração da mesma, ficará o acto sem apoio que o sustente e permita a sua manutenção na ordem jurídica.
3.
Face ao exposto, salvo melhor opinião, parece ao Ministério Público que deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional.».

Foram colhidos os vistos.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

a) Dos Factos

Na decisão recorrida foi dada por assente a seguinte factualidade:
- Em 27 de Agosto de 2019, o pessoal da equipa de inspecção da DST entrou na fracção sita na Rua de ......, n.º ..., EDF. ......, 7.º Andar D, para investigar a alegada utilização da fracção para a prestação ilegal de alojamento, e lavrou o auto de notícia n.º 234/DI-AI/2019 (cfr. fls. 53v a 55v dos autos administrativos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
- A supra referida fracção autónoma é composta por uma sala, três quartos (incluindo um suíte), uma cozinha, uma casa de banho e uma varanda (idem).
- O proprietário da aludida fracção autónoma é B, que em 12 de Maio de 2010 fez o registo de aquisição junto da Conservatória do Registo Predial, segundo o qual o imóvel se destinava ao fim de habitação. E a DST nunca lhe emitiu a licença de exploração de estabelecimento hoteleiro (cfr. fls. 2 e v dos autos administrativos).
- Durante o período compreendido entre 21 e 27 de Agosto de 2019, a aludida fracção autónoma foi utilizada para a prestação de alojamento a D, E, F, G, H, I, J, K, L, M e N, todos não residentes de Macau que aqui entraram com passaportes da PRC ou salvo-condutos para Deslocações a Hong Kong e Macau, e aos quais não foram concedidas autorizações especiais de permanência (cfr. fls. 4 a 37 dos autos administrativos).
- Os respectivos ocupantes alojaram-se na referida fracção autónoma mediante a apresentação de indivíduo(s) de identidade desconhecida (idem).
- Em 30 de Agosto de 2021, a entidade recorrida decidiu, concordando com o proposto no relatório n.º 836/DI/2021, aplicar ao recorrente a multa de 200.000,00 patacas nos termos do artigo 10.º, n.º 1 da Lei n.º 3/2010, por ele controlar, enquanto arrendatário, a fracção autónoma em causa utilizada para a prestação ilegal de alojamento (cfr. fls. 218 a 233 dos autos administrativos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
- Em 8 de Setembro de 2021, a supra referida decisão foi notificada pela entidade recorrida ao recorrente através da Ordem de Notificação n.º 772/AI/2021 (cfr. fls. 234 a 236 dos autos administrativos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
- A partir de 25 de Fevereiro de 2019, o recorrente começou a cumprir pena de prisão na EPM em Coloane por ter sido condenado na pena de 6 anos e 3 meses de prisão efectiva (cfr. fls. 154 dos autos administrativos).
- Em 11 de Outubro de 2021, o recorrente interpôs o presente recurso contencioso da mencionada decisão.

b) Do Direito
  
É do seguinte teor a decisão recorrida:
«No caso em apreço, foi o Recorrente chamado à responsabilização pela conduta tipificada na norma específica do n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 3/2010, pelo facto de ser este que, sendo arrendatário da fracção autónoma, exercia o controlo sobre a mesma que fora utilizada para a prestação ilegal de alojamento.
Alegou o Recorrente por um lado, que não foi ele que assinou o contrato de arrendamento apenso ao processo administrativo, sendo por isso que a assinatura que dele consta era falsificada, além de não ter sido reconhecida notarialmente conforme se impõe no artigo 1032.º, n.º 1 do CCM, alterado pelo artigo 2.º da Lei n.º 13/2017, o que gera ainda a nulidade desse contrato. E que, por outro lado, o Recorrente se encontra preso desde 25/2/2019 no Estabelecimento Prisional de Coloane, não lhe sendo possível exercer tal controlo potencial da fracção que foi explorada para o exercício da actividade de alojamento ilícito.
Cumpre apreciar.
A norma do n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 3/2010 que serviu de base ao acto ora recorrido tem a seguinte redacção: “1. Quem prestar ilegalmente alojamento ou controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento é punido com multa de 200 000 a 800 000 patacas.”
Considera-se como “a prestação ilegal de alojamento”, ao abrigo do disposto no artigo 2.º da referida Lei, a actividade de 1) prestação de alojamento ao público, 2) sem possuir a licença para exploração de estabelecimentos hoteleiros, em prédio ou fracção autónoma não destinado a fins de actividade hoteleira e similar, 3) cujo ocupante é não residente da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), a quem não foi concedida autorização especial de permanência.
É incontroverso que no caso concreto, existe a actividade qualificável como prestação ilegal de alojamento, com base na seguinte factualidade demonstrada nos autos:
- A fracção em causa, 澳門......街...號......大廈7樓D座單位, com fim habitacional, foi destinada ao alojamento, sem que esteja dotada de licença para exploração de estabelecimento hoteleiro.
- A dita fracção foi utilizada entre 21/8/2019 e 27/8/2019 para acomodar os vários indivíduos não residentes da RAEM, D、E、F、G、H、I、J、K、L、M e N, que não tinham qualquer autorização especial de permanência.
No que toca à determinação concreta do infractor da conduta da prestação ilegal de alojamento a que se refere no artigo 10.º, n.º 1 da Lei n.º 3/2010, constitui a jurisprudência constante do Tribunal de Segunda Instância que a qualidade jurídica do arrendatário é título bastante para lhe atribuir o poder de controlo da fracção, e por conseguinte para o responsabilizar pelas actividades ilícitas desenvolvidas nela, sendo o mesmo responsável pelo gozo e utilização imediata da coisa. Cita-se, por exemplo, o segmento do Acórdão do TSI de 05/11/2015, Processo n.º 424/2015, no seguinte:
“…Como arrendatário, advêm-lhe deveres, tal como decorre do art. 983º do CC, que não só se impõem perante o locador, como perante terceiros e perante a sociedade, não se tendo por transmitida a responsabilidade decorrente da violação desses deveres. Daí que se alguém desenvolve uma actividade de alojamento ilegal num prédio que se mostra arrendado, o arrendatário, enquanto responsável pelo gozo e utilização imediata da coisa, não deixa de ser responsabilizado pelo desenvolvimento dessa actividade proibida, pois tem o dever de olhar pela coisa e saber do que ali se passa…” (No mesmo sentido, veja-se melhor, os Acórdãos do TSI de 29/11/2012, Processo n.º 693/2012, de 25/9/2014, Processo n.º 45/2014 e de 27/11/2014, Processo n.º 262/2014).
Desse conjunto das jurisprudências, pode extrair-se o corolário de que o controlo do prédio ou da fracção autónoma que releva para a responsabilização do infractor nos termos do artigo 10.º, n.º 1 da Lei n.º 3/2010, foi concebido como tipo de controlo virtual e abstracto, em vez de ser fáctico e concreto, que provenha da posição jurídica que o infractor ocupa na relação de arrendamento da fracção.
Foi o ora Recorrente considerado como infractor que controlava a fracção autónoma para a prestação ilegal de alojamento por ser aquele que subscreveu, em 17/12/2018, o contrato de arrendamento da fracção autónoma. Diante do acto recorrido tal como ele é fundamentado, e na estrita observância da jurisprudência acima citada, adiantamos que não vai influir na sanção determinada o facto de o mesmo se encontrar preso no EPC no apurado período enquanto estiveram a decorrer as actividades ilícitas de alojamento ilegal na dita fracção autónoma, já que como é consabido, a impossibilidade relativa à pessoa do devedor só importaria a extinção da obrigação, “se o devedor, no cumprimento desta, não puder fazer-se substituir por terceiro”, ao abrigo do disposto no artigo 780.º do CCM.
Por conseguinte, se tivesse sido a realidade incontornável que o Recorrente tinha outorgado tal contrato de arrendamento da fracção, com a respectiva representante do senhorio em 17/12/2018, este nem por isso estaria isento da culpa por omissão do dever de “olhar pela coisa e saber do que ali se passa”, que lhe decorra do artigo 983.º do CCM, a não ser que lograsse demonstrar ser impossível de cumprir esse dever, ainda mediante a intervenção do terceiro. Dito nesses termos, o segundo argumento do recurso só deveria sufragar.
Contudo, cremos que pelas provas produzidas nestes autos, incluindo as que tinham sido feitas no processo administrativo, é longe de mostrar-se incontestável a qualidade do arrendatário do Recorrente, razão pelo qual ao contrário do que sustentou a Recorrida, não demos como provado o facto de ele ter celebrado tal contrato sobre a fracção autónoma com a representante do senhorio em 17/12/2018.
Em breves linhas, veremos porquê.
Como se vê, a respeito dessa matéria de facto, a conclusão extraída pelo Recorrente encontra-se assente na única cópia do contrato de arrendamento, constante de fls. 95 do processo administrativo, donde consta que o mesmo foi assinado, na data de 17/12/2018, por indivíduo de nome “A” na qualidade de arrendatário.
Sucedeu que o Recorrente impugnou a veracidade daquela assinatura como do seu próprio punho. Tratando-se do documento particular, se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, “incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade.” (cfr. o artigo 368.º, n.º 2 primeira parte do CCM). É que na generalidade dos casos, o meio de prova adequado ao estabelecimento da autoria é a prova pericial, mas não está excluída a utilização de outro meio de prova, como a testemunhal.
No caso concreto, pela falta da junção do documento original, não foi possível produzir a prova pericial tendente a apurar a veracidade da assinatura que consta da cópia (veja-se a este propósito, fls. 112 a 162 dos autos). E quanto às provas testemunhais produzidas perante a Recorrida, designadamente, o de tal agente imobiliário O, quem referiu ter presenciado a assinatura do contrato de arrendamento por parte do Recorrente na data de 17/12/2018, tal prova não pode ser admitida manifestamente face ao previsto no artigo 387.º, n.º 1 do CCM, por estar em causa a demonstração de um contrato de arrendamento que houver de ser reduzido a escrito por força do artigo 1032.º, n.º 1 do CCM.
Nestes termos, sem que haja sido estabelecida a genuinidade do contrato de arrendamento em causa, como não há outras provas destinadas à sua demonstração, a dúvida sobre a realidade de um facto resolve-se contra a parte quem o facto aproveita (cfr. o artigo 437.º do CPC), ou seja, não se provou que o Recorrente celebrasse o contrato de arrendamento com o senhorio da fracção autónoma, o que inquinou o acto sancionatório do erro no pressuposto de facto, por ter se fundado na qualidade do arrendatário do Recorrente.
Ainda existe outro motivo preponderante que pudesse obstar à pretensão punitiva da ora Recorrida, independentemente da questão de autoria da assinatura.
Logo, a norma do artigo 1032.º na redação alterada pela Lei n.º 13/2017 (Alteração do regime jurídico de arrendamento previsto no Código Civil) dispõe o seguinte:
“Artigo 1032.º
(Forma)
1. O contrato de arrendamento é celebrado por escrito particular, cujas assinaturas devem ser reconhecidas notarialmente.
2. Salvo disposição legal em contrário, o arrendamento será, não obstante a falta de título escrito, reconhecido em juízo, por qualquer outro meio de prova, quando se demonstre que a falta é imputável à contraparte no contrato.”
Do que se trata no n.º 1 da norma citada é de uma exigência da formalidade ad substantiam conforme manda o disposto do artigo 357.º, n.º 1 do CCM, por ter-se imposto, como forma de declaração negocial, o documento escrito particular com assinaturas notarialmente reconhecidas. Assim, a inobservância desta forma prescrita pela lei gera a nulidade da declaração negocial ao abrigo do artigo 212.º do mesmo Código.
No entanto, não se ignora que era discutível, à luz da redacção da norma anterior à Lei n.º 13/2017, se a forma escrita exigida pelo artigo 1032.º do Código Civil para a formalização do contrato de arrendamento urbano é uma formalidade ad substantiam, ou uma mera formalidade ad probationem, conforme é ou não o documento escrito substituível por outros meios de prova mais difíceis de conseguir (Veja-se, Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª Edição Actualizada, p. 435. E o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância n.º 260/2014, de 21/4/2016), tendo em conta que apesar da exigência imperativa decorrente do n.º 1, o n.º 2 do artigo parece ter autorizado o suprimento da falta do título por qualquer outro meio de prova.
Apesar da controvérsia apontada, tal exigência acrescida de “reconhecimento notarial” do documento que viria a ser introduzida pela nova Lei parece inutilizar o sentido e o alcance da norma do n.º 2. Pois, a falta do documento escrito implicaria, naturalmente, a falta do reconhecimento notarial, assim ainda que se pudesse demonstrar a existência do arrendamento por outros meios de prova, certo é que inexistirá nenhuma maneira de fazer suprir a inobservância da forma “adicional”. Dito nestes termos, é incontroverso que o contrato de arrendamento em causa é nulo ao abrigo do artigo 212.º do CCM, por causa da falta de reconhecimento notarial das assinaturas.
Sendo o negócio nulo, não produz, desde o início (ab intio), por força da falta ou vício de um elemento interno ou formativo, os efeitos a que tendia (Veja-se, Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª Edição Actualizada, p.619). E apenas admitir-se-ia a paralisação dos efeitos da nulidade por vício de forma invocada por um dos contraentes nos casos excepcionalíssimos, como é o do artigo 326.º do CCM (abuso de direito) (cfr. obra cit. pp.436 a 438), o que, obviamente, não é o nosso caso.
Assim, ainda que a autoria da assinatura do contrato devesse ser imputada ao Recorrente, tal contrato, pelo facto de padecer da nulidade formal, nunca podia conferir ao Recorrente a qualidade de arrendatário enquanto responsável pelo gozo e utilização imediata da coisa, não estando o mesmo vinculado aos deveres postulados pelo artigo 983.º do CCM (No mesmo sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância n.º 260/2014, de 21/4/2016).
Não se ignora que nem o Recorrente era arrendatário fáctico da fracção autónoma. Aliás como se vê, tal argumento foi sempre postergado pelo acto sancionatório na sua fundamentação, que se encontra apoiada só na qualidade de arrendatário do Recorrente. Como parece óbvio, apesar da comodidade que decorre desta tese para actividade administrativa instrutória tendente à aplicação da sanção, a respectiva “inconveniência” também não é menos evidente, pois, se cair por terra o título, cairá naturalmente o acto administrativo que se fundava na existência desse título por estar inquinado do vício de erro no pressuposto de facto, gerador da anulabilidade do acto.
Aqui chegado, não resta senão anular o acto recorrido.».

Vejamos então:

No caso em apreço a DST com base num alegado contrato de arrendamento celebrado em 17.12.2018 pelo originário Recorrente agora Recorrido entendeu que este era o locatário da fracção autónoma em causa e que como tal lhe cabia o controle da mesma, entendendo ser este responsável nos termos do artº 10 nº 1 da Lei 3/2010 aplicando-lhe a multa de MOP200.000,00.
Como pressuposto da decisão da DST está um contrato de arrendamento celebrado em 17.12.2018.
O aqui Recorrente/Recorrido como consta dos autos cumpre pena do EPM desde 25.02.2019.
Os factos reportam-se ao período de 21 a 27 de Agosto de 2019, isto é, menos de 1 ano após a celebração do contrato de arrendamento, mas 6 meses após o Recorrente/Recorrido estar a cumprir pena no EPM.
O Recorrente/Recorrido impugnou a sua assinatura no indicado contrato de arrendamento.
A norma do n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 3/2010 que serviu de base ao acto ora recorrido tem a seguinte redacção: “1. Quem prestar ilegalmente alojamento ou controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento é punido com multa de 200 000 a 800 000 patacas.”.
Perante uma fracção autónoma onde se pratica alojamento ilegal cabe à DST com vista à aplicação da multa determinar quem é que controla a fracção em causa, presumindo-se à míngua de outra prova que quem o faz seja o proprietário.
Logo, é pelo proprietário que se começa a investigação.
Alegando este que o mesmo está arrendado cabe providenciar pela prova para o efeito, a qual se nos apresenta fácil, cópia do contrato de arrendamento, declaração às finanças do arrendamento, comprovativos do pagamento das rendas.
Apresentada cópia do contrato de arrendamento celebrado pelo aqui Recorrente/Recorrido veio este impugnar ser sua a assinatura do respectivo contrato.
Reza o artº 368º do C.Civ. o seguinte:
Artigo 368.º
(Autoria da letra e da assinatura)
1. A letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras, quando reconhecidas ou não impugnadas pela parte contra quem o documento é apresentado, ou quando esta declare não saber se lhe pertencem, apesar de lhe serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou judicialmente como verdadeiras.
2. Se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade.
Face à disposição legal citada a quem cabe a prova de que a assinatura é da Autoria do Recorrente/ora Recorrido é à DST.
Após a impugnação da sua assinatura por despacho de fls. 113 foi solicitado à PJ para proceder à verificação se a assinatura constante do contrato é da autoria do Recorrente/ora Recorrido.
Solicitados os originais do contrato de arrendamento pela PJ e notificada a DST para os juntar em 5 dias – cf. fls. 118 – a fls. 121 veio a DST responder que: “não dispõe dos documentos originais, encontrando-se o processo original nesse tribunal”.
Admitimos que a referência a processo original é feita relativamente ao Processo Administrativo, vulgo PA.
A fls. 95 do PA encontramos uma fotocópia do contrato de arrendamento que diz na frente e no verso, datada de 03.10.2019 ter sido extraída do original. Mais no verso dessa fotocópia consta ter sido pago o imposto de selo eventualmente devido pelo arrendamento com o respectivo carimbo da Repartição de Finanças.
Logo, se no PA consta uma fotocópia com carimbo de ter “fotocópia do original” é porque a DST se o diz sabe onde está o original que serviu de exemplar para aquela fotocópia.
Pelo que, em vez de dizer que havia mandado o processo para o tribunal e nada fazer, cabia à DST ter diligenciado pelo bom sucesso do seu processo onde aplicou uma multa e providenciar por exibir o original de onde foi extraída aquela cópia o qual, quiçá, estaria em poder do senhorio/locador o que se assemelha bastante provável dado que o contrato de arrendamento nem há um ano havia sido celebrado.
O contrato de arrendamento não é outorgado pelo dono da fracção mas sim por outra pessoa que no registo predial aparece como devedora juntamente com o dono da fracção de uma dívida cujo pagamento foi garantido por hipoteca constituída sobre a fracção – cf. fls. 95 e 2v. do PA -.
Quem se ocupa de dar a fracção em arrendamento é um tio do dono da fracção – cf. fls. 118 e 90 do PA -, que por sinal diz ser ele o dono da fracção, que quem assinou o contrato foi a esposa, que a renda é depositada na sua conta mensalmente e que quem tratou de tudo foi o agente imobiliário que por sinal diz que viu o Recorrente/ora Recorrido a assinar o contrato.
Contudo, salvo melhor opinião, sendo este agente imobiliário quem tratou de tudo no que concerne a este contrato não é o seu depoimento suficiente para convencer de que foi o Recorrente/ora Recorrido quem assinou o contrato uma vez impugnada que foi a sua assinatura, dado que, a ser verdade que a assinatura foi forjada tal pode ter acontecido por conluio com os intervenientes no contrato, não sendo os depoimentos destes suficientes para convencer do contrário.
Por outro lado, toda a instrução do processo administrativo ocorre após Agosto de 2019 sendo que o locatário estava preso desde Fevereiro desse ano.
Como a DST discorre abundantemente e bem nas suas alegações de recurso sobre a relevância para o interesse público da punição destas situações de alojamento ilegal, em vista de prosseguir o interesse público e saber quem efectivamente explorava o alojamento ilegal, face aos factos apurados, sendo o arrendamento celebrado por alguém que pouco tempo após a celebração do mesmo e seis meses antes da ocorrência dos factos foi preso, era bom de investigar não só quem é que fez o arrendamento mas como é que as rendas eram pagas e quem é que estava de facto no controle da fracção, informação essa que o senhorio teria de estar em condições de providenciar, uma vez que as rendas lhe são pagas mensalmente, e seja por transferência bancária, seja por depósito, seja por pagamento a dinheiro, há como saber quem paga a renda.
Não foram feitas diligências nesse sentido, nem a DST diligenciou por obter o original do contrato que ao que parece poderia ter obtido – cf. fls. 90 do PA -, para que o exame da assinatura do arrendatário fosse verificada.
Em face da ausência de prova vem a DST impugnar a decisão recorrida, contudo não indica quais os meios de prova que foram apresentados e que exigiam que o tribunal “a quo” desse como provado que o contrato foi assinado pelo Recorrente/ora Recorrido.
Não constando do elenco dos factos provados que o Recorrente/ora Recorrido outorgou o contrato de arrendamento bem se andou ao decidir nos termos da decisão recorrida, anulando o despacho de aplicação de multa por erro nos pressupostos de facto, a qual é de manter nesta parte.

Já não acompanhamos a decisão recorrida, quando depois de concluir pelo erro nos pressupostos de facto do despacho recorrido por não se ter provado a qualidade de arrendatário do Recorrente/ora Recorrido, conclui que sempre seria de anular o despacho recorrido uma vez que se funda no arrendamento e ser este nulo por não terem sido reconhecidas as assinaturas, sendo que, caindo o título e não havendo arrendamento por ser o contrato nulo igualmente enferma o despacho recorrido de erro nos pressupostos de facto.
Em igual sentido se pronuncia o Ilustre Magistrado do Ministério Público.
Não concordamos.

Reza o artº 1032º do C.Civ. o seguinte:
Artigo 1032.º
(Forma)
1. O contrato de arrendamento é celebrado por escrito particular, cujas assinaturas devem ser reconhecidas notarialmente.*
2. Salvo disposição legal em contrário, o arrendamento será, não obstante a falta de título escrito, reconhecido em juízo, por qualquer outro meio de prova, quando se demonstre que a falta é imputável à contraparte no contrato.
* Alterado - Consulte também: Lei n.º 13/2017
Tal como resulta do Acórdão citado na decisão recorrida, proferido por este Tribunal em 21.04.2016 no processo que correu termos sob o nº 260/2014, relativamente a este preceito antes da alteração introduzida pela Lei 13/2017 que passou a exigir o reconhecimento notarial das assinaturas, tem-se entendido ser esta uma formalidade “ad propbationem”:
  1. Na matéria das consequências da inobservância da forma legal de negócios jurídicos, a doutrina faz a distinção entre formalidades ad substantiam e formalidades ad probationem: as primeiras são insubstituíveis por outro género de prova, gerando a sua falta a nulidade do negócio, enquanto a falta das segundas pode ser suprida por outros meios de prova mais difíceis de conseguir.
  2. A forma escrita exigida pelos normativos constantes do artº 8º do Decreto 43 525, do artº 21º do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei nº 12/95/M e do artº 1032º do Código Civil vigente para a formalização do contrato de arrendamento urbano é a mera formalidade ad probationem. Assim, não obstante a falta do título escrito, se o arrendatário lograr provar que existe o contrato de arrendamento por outros meios de prova e que foi por culpa do senhorio que o contrato não foi celebrado por escrito, o contrato é reconhecido judicialmente.
  3. Ficou provado nos autos que o embargado, actual proprietário da fracção autónoma, tentou e frustrou, por várias vezes contactar com o arrendatário ou os residentes no locado a fim de celebrar um contrato escrito para titular o arrendamento, quem teve culpa na não formalização do contrato de arrendamento é o arrendatário, e não o senhorio, ora embargado, para os efeitos do disposto no artº 8º do Decreto 43 525, no artº 21º do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei nº 12/95/M e no artº 1032º do Código Civil vigente.
  4. Não tendo o arrendatário demonstrado a culpa do senhorio na não formalização por título escrito do contrato de arrendamento, não podemos senão aplicar ao caso sub judice a regra geral segunda a qual a consequência da inobservância da forma legal é a nulidade do negócio, quando outra não seja a sanção especialmente prevista na lei – o artº 212º do CC de 1999 e o artº 220º do CC de 1966.
5. Sendo nulo que é, o contrato fáctico nunca confere ao ora embargante a qualidade de arrendatário, enquanto titular de um direito incompatível com a entrega judicial ordenada nos autos de execução sumária, a que correm por apenso os presentes embargos, nos termos prescritos no artº 292º/1 do CPC, à luz do qual “se qualquer acto, judicialmente ordenado, de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro”.
Logo se se demonstrar a existência do contrato por outro meio o mesmo poderá ser reconhecido em juízo, salvo se for invocado pela parte que deu causa à falta de forma legal.
No caso em apreço o contrato foi celebrado por escrito particular, apenas não tendo sido as assinaturas reconhecidas notarialmente.
Também nestes autos não é parte o senhorio mas apenas o arrendatário, não se sabendo qual das partes deu causa à omissão do reconhecimento notarial das assinaturas.
Parece-nos pois impossível que, na ausência de prova de qual das partes deu causa à omissão, se conclua pela nulidade do contrato a favor do aqui Recorrente/ora Recorrido.
Imaginemos que a ausência de reconhecimento notarial das assinaturas foi provocada pelo inquilino? Estava descoberta a forma de se eximirem à responsabilidade decorrente do alojamento ilegal pela omissão de forma legal.
Por outro lado, o artº 10º da Lei n.º 3/2010 que serviu de base ao acto ora recorrido e que novamente citamos, diz que “1. Quem prestar ilegalmente alojamento ou controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento é punido com multa de 200 000 a 800 000 patacas.”
Quando no despacho recorrido se invoca por ser o arrendatário tem-se sempre em vista a situação de facto subjacente, ou seja que alguém mediante o pagamento de uma renda passou a ser detentor do uso e do gozo de coisa pertence a terceiro, tendo o “controle da mesma”.
Ora, este uso e gozo da coisa pertencente a terceiro não desparece, isto é, a situação de facto decorrente do arrendamento não desparece porque as assinaturas aquando da celebração do contrato não foram reconhecidas notarialmente, sendo, eventualmente, o contrato nulo.

Estando demonstrada a relação de arrendamento, ainda que o contrato com base no qual aquela existe seja nulo por omissões de forma, entendemos não estar afastada a responsabilidade daquele que nos termos do referido contrato ocupava a posição de locatário se não demonstrar que sobre a coisa não tinha controle algum.
Assim sendo, nesta parte não se confirma a decisão recorrida, sendo certo que a mesma já é de manter pelo fundamento anterior.

III. DECISÃO
  
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, negando-se provimento ao recurso mantém-se a decisão recorrida na parte em que anula o despacho recorrido por erro nos pressupostos de facto uma vez que não se demonstrou ser o Recorrente/Recorrido original arrendatário da fracção.

Sem custas por delas estar isenta a Entidade Recorrente.

Registe e Notifique.

RAEM, 27 de Setembro de 2023

                Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
                (Relator)
                
                Fong Man Chong
                (Primeiro Juiz-Adjunto)
                
                Ho Wai Neng
                (Segundo Juiz-Adjunto)

Fui presente,
Álvaro António Mangas Abreu Dantas
(Delegado Coordenador)

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