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Processo nº 578/2015
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 07 de Dezembro de 2023

ASSUNTO:
- Declaração da caducidade da concessão
- Despacho de “Concordo”
- A contagem do prazo da concessão
- Suspensão e interrupção do prazo da concessão
- Dever de decisão
- Princípios da boa-fé, da tutela da confiança, da igualdade e da justiça

SUMÁRIO:
- A caducidade das concessões, provisórias ou definitivas, é declarada por despacho do Chefe do Executivo, publicado no Boletim Oficial.
- A Entidade Recorrida ao lançar a palavra “Concordo” na proposta da declaração da caducidade da concessão do terreno, significa aderir ao proposto, declarando a caducidade da concessão do terreno com os fundamentos constantes da proposta.
- A contagem do prazo das concessões do terreno anteriores cuja outorga da escritura do contrato tornou-se desnecessária face à Lei nº 8/91/M deveria iniciar-se a partir da data da entrada em vigor da Lei em referência, ou seja, a partir do dia 04/08/1991, já que só a partir desta data é que o despacho de autorização tornou-se título bastante da concessão, em substituição da outorga da escritura do contrato.
- Não resulta da Lei da Terra qualquer norma que permite a suspensão ou interrupção do prazo da concessão.
- A violação do dever de decisão não invalida o acto recorrido, visto que o legislador estabelece mecanismo próprio para o efeito, que é justamente a presunção do indeferimento tácito, permitindo desta forma o interessado exercer o respectivo meio legal de impugnação contra a inércia da Administração (cfr. artº. 102º do CPA).
- A lei impõe-se, sem qualquer alternativa, a verificação da caducidade no caso do termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva, pelo que a respectiva declaração da caducidade constitui uma actividade administrativa vinculada.
- Os princípios da boa-fé, da tutela da confiança, da igualdade e da justiça não são operantes nas actividades administrativas vinculadas.
O Relator,

Ho Wai Neng


Processo nº 578/2015
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 07 de Dezembro de 2023
Recorrentes: A, B, C, D, E, F e G
Entidade Recorrida: O Chefe do Executivo da RAEM

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Os Recorrentes A, B, C, D, E, F e G, melhores identificados nos autos, vêm interpor o presente Recurso Contencioso contra o despacho do Chefe do Executivo de 14/04/2015, que declarou a caducidade da concessão por arrendamento do terreno com a área de 930m2 situado em Macau, entre a Travessa do Laboratório e a Rua Marginal do Canal dos Patos, designado por lote B, concluíndo que:
   Questão Prévia:
a) O Parecer da Comissão de Terras 81/2014 (processo 61/2013) não foi homologado pelo Chefe do Executivo, que se limitou a apor nele a palavra “Vista”.
b) O carimbo de “Concordo” aposto no Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas só pode ser entendido como uma declaração de concordância com o que é proposto ao Chefe do Executivo pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que é, relembre-se, o pedido (que se traduz em: “solicito”) ao Chefe do Executivo para que declare a caducidade da concessão.
c) O Despacho final proferido pelo Chefe do Executivo (isto é o “Concordo”) não consubstancia um acto decisório no sentido de expressamente declarar a caducidade da concessão.
d) Falta, pois, o Despacho do Chefe do Executivo, a sua manifestação expressa e inequívoca de declarar a caducidade do contrato, ainda que com os fundamentos propostos pelo Secretário.
e) lnexiste o Despacho de declaração de caducidade do Chefe do Executivo, como inexiste o despacho do órgão competente, o que, consequentemente, acarretará a inexistência do Despacho 38/2015 do Secretário dos Transportes e Obras Públicas, a qual deverá ser declarada.
Sobre a matéria de facto:
f) Os Concessionários tinham as suas pequenas oficinas industriais num terreno situado na Travessa do Laboratório pelas quais pagavam rendas a quem se intitulava proprietário.
g) Em 1985, a Administração procedeu à desocupação daquele terreno para nele ser construído um Centro de Habitação Temporária.
h) Na sequência daquela desocupação foram concedidas nove parcelas de terreno aos Concessionários, em regime de ocupação temporária, no tardoz do edifício industrial OCEAN para poderem prosseguir com as suas actividades industriais.
i) Pelo Despacho 36/SAES/86, publicado no BO 42, de 20 de Outubro, foi concedido, por arrendamento, a A, B, C, F, H, D, I, E, G e J, um terreno com a área de 930 m2, situado em Macau, entre a Travessa do Laboratório e a Rua Marginal do Canal dos Patos, designado por lote B.
j) Porém, os Concessionários não puderam realizar o aproveitamento do terreno, em virtude do mesmo se encontrar encravado, sem qualquer possibilidade de acesso, inviabilizando a sua desocupação e respectivo aproveitamento nos termos do contrato.
k) Com essa constatação, o Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas, por despacho de 06.07.1987, autorizou a suspensão do prazo para o aproveitamento do terreno e a suspensão do pagamento do prémio.
l) A DSSOPT não conseguiu encontrar, porém, uma solução para resolver o problema do acesso dos concessionários ao lote B,
m) Pelo que a DSSOPT propôs ao SATOP a troca da Parcela B pela Parcela C, contígua.
n) O SATOP concordou com essa proposta.
o) Apesar de todas as diligências feitas, nem o Gabinete de Planeamento Urbanístico (GPUDEP) emitiu a PAO nem a Direcção de Serviços de Cartografia e Cadastro (DSCC) emitiu a Planta Cartográfica, o que obstaculizava que os concessionários pudessem apresentar o Estudo Prévio de aproveitamento do terreno do lote C.
p) Sempre que os Concessionários insistiam junto do GPUDEP para ser emitida a PAO era-lhes dito, sem mais justificações, que todo o quarteirão estava em estudo e por isso não podia ser emitida a PAO.
q) Em 21.04.1993, apesar de não ter sido emitida a PAO, nem a Planta Cartográfica, os Concessionários apresentaram um Estudo Previa (a coberto do T-2106), para aproveitamento do lote C, propondo a construção de um edifício industrial composto por um piso e 10 fracções, assim como solicitaram autorização para a transferência dos direitos resultantes da concessão para a sociedade que constituíram entre si.
r) Como a GPUDEP disse aos Concessionários que a zona do Canal dos Patos iria deixar de ser uma zona industrial e que seria reconvertida em zona habitacional e comercial, a sociedade constituída apenas pelos Concessionários - Companhia de Investimento e Desenvolvimento Predial K, Limitada - como representante de todos os Concessionários, apresentou um novo Estudo Prévio de Arquitectura para habitação, comércio e estacionamento.
s) Só em 16.01.1995, a Administração emitiu a PAO 86A203 para o lote C.
t) Em consequência, a Administração emitiu parecer desfavorável ao estudo prévio apresentado pelos concessionários para o aproveitamento conjunto do lote B e C informando que devia ser apresentado novo Estudo Prévio tendo em conta a PAO entretanto aprovada para o Lote C.
u) Em 20.02.1995 foi requerido o registo do terreno concedido pelo Despacho nº 36/SAES/86 à CRP.
v) O registo foi recusado com os seguintes fundamentos: “O acto requerido não está titulado nos documentos apresentados. Com efeito, a Cláusula 2ª do Despacho nº 36/SAES/86, publicado no B.O. nº 42, de 20/10/86, refere que o arrendamento é válido por 25 anos, contados a partir da data da escritura. Assim, a escritura é essencial para determinar o termo inicial daquele prazo, e ainda para a verificação do cumprimento da caução e das obrigações fiscais (sisa), sendo certo, por outro lado, que só após a entrado em vigor do Lei nº 8/91/M, passou a dispensar-se a escritura para a titulação dos registos de concessão. Art. 5º e 243º, nº 1, b) CRP e 127º da Lei de Terras”.
w) Em 27.10.1995, a representante dos Concessionários apresentou um novo projecto de arquitectura, mas agora só para o lote C, tal como solicitado pela DSSOPT.
x) Este projecto foi considerado passível de aprovação, ainda que condicionado ao cumprimento dos pareceres e à correcção das questões técnicas enumeradas.
y) Em 06.08.1997, a representante dos Concessionários, invocando a evolução e as necessidades do mercado habitacional de Macau, pediu i) autorização para a alteração da finalidade do projecto para habitacão económica e, consequentemente, ii) que o contrato de concessão fosse reformulado.
z) Em 20.10.1997, o Instituto de Habitação (IH) respondeu à DSSOPT, no sentido de apoiar a alteração da finalidade do aproveitamento do lote C por haver carência de produção de habitação económica.
aa) Após diligências várias, em 08.11.2001 o IH deu conhecimento à Representante dos Concessionários do conteúdo do ofício 5642/DURDEP/2001 da DSSOPT, pedindo-lhe que alterasse o projecto em conformidade e entregasse os documentos solicitados pela DSSOPT.
bb) Entre meados de 2002 e Fevereiro de 2008, a Representante dos concessionários não estabeleceu contactos por escrito, com o IH ou com a DSSOPT.
cc) Mas a Representante dos Concessionários contactava regularmente com o IH e ia dando conhecimento àquele Instituto das dificuldades em obter o financiamento necessário à execução do projecto devido, não só à crise imobiliária, mas sobretudo porque o Lote B não estava registado em nome dos Concessionários e os bancos queriam ter mais garantias para além do contrato a assinar com a RAEM para a troca dos lotes.
dd) Em 22.02.2008, a Representante dos Concessionários apresentou à DSSOPT o requerimento T-1884 invocando como razão para a falta de resposta ao ofício 647/143.2/SOLDEP/96 os factos notórios da crise do mercado imobiliário, e declarou aceitar as condições contratuais insertas na minuta do contrato que lhe foi enviada com aquele ofício, procurando, deste modo, acelerar o processo de troca.
ee) Em 31.07.2009, a Representante dos Concessionários entregou na DSSOPT o requerimento T-5321 com um novo projecto, para a construcão de um edifício com um piso com 10 fraccões comerciais no Lote C.
ff) A construção deste projecto podia concluir-se antes de 19 de Outubro de 2011, prazo em que, segundo o entendimento da DSSOPT, terminava o contrato de concessão do Lote B.
gg) Este pedido pretendia retomar os fundamentos da concessão do lote B aos Concessionários: ou seja, a construção de um espaço onde os Concessionários pudessem desenvolver as suas actividades, com segurança em relação ao futuro e sem receio de inopinadas desocupações.
hh) Em 12.05.2010, na sequência do Despacho 07/SOPT/2010, foi emitida a Informação 095/DSODEP/2010 determinando que “tem de se proceder a uma análise e um estudo aprofundados e tomar medidas efectivas referentes às situações de aproveitamento dos actuais terrenos concedidos”.
ii) Em 31.01.2011, o Departamento Jurídico da DSSOPT analisou o processo e emitiu a informação 7/DJUDEP/2011.
jj) A Chefe do DJUDEP emitiu um Parecer jurídico sobre essa Informação, considerando que “Da situação fáctica descrita na informação em apreço e da Informação nº 245/DSODEP/2010, de 26 de Novembro, que lhe serve de suporte, não decorre, em nossa opinião, que a falta de aproveitamento do terreno em causa, designado por lote B, seja imputável aos concessionários, imputabilidade de cuja existência o nº 1 do artigo 166º ex vi do seu nº 2, da Lei nº 6/80/M , de 5 de Julho (Lei de Terras) faz depender a caducidade da concessão”.
kk) Considerou ainda a Chefe do DJUDEP que “não podem os concessionários responder pela não realização do aproveitamento no periodo anterior a 1995 dado ter sido autorizada a suspensão temporária do prazo de aproveitamento e do prazo de prémio, por se ter reconhecido que os concessionários não tinham condições para desenvolver o terreno em virtude de o mesmo não dispor de acesso directo e estar ocupado por terceiro, situação esta que exigia a intervenção da Administração
ll) E considerou, finalmente, que: “tendo o aproveitamento do lote B tornado-se total e definitivamente inviável por ter sido alterado o planeamento da zona, inicia-se o procedimento de concessão do lote C, de modo a reparar os prejuízos resultantes da impossibilidade de os concessionários utilizarem e fruírem o terreno concedido (lote B)”
mm) Em 16.06.2011, na sequência do Parecer do DJUDEP e do Parecer da Chefe deste Departamento, o DSODEP emitiu a informação 150/DSODEP/2011, concluindo que não se podendo imputar aos concessionários o não aproveitamento do terreno no período anterior a 1995 e que devido à alteração do planeamento da zona, após 1995, o aproveitamento do lote B tornou-se definitivamente inviável,
nn) propôs o desencadeamento do processo da rescisão do contrato de concessão do lote “B” por acordo das partes e de autorização de abertura do processo de concessão do lote “C” em condições a definir e que devem ter um conta os interesses da RAEM nomeadamente a obrigação de construir habitações de determinada tipologia e área ou habitação económica”.
oo) Em 04.08.2011, o Secretário exarou sobre a informação 150/DSODEP/2011, o seguinte despacho: “A DSSOPT deve proceder à reanálise profunda da responsabilidade dos concessionários no processo da troca de terrenos, especialmente a sua responsabilidade no período entre 1998 e 2008, assim como os fundamentos e viabilidade propostos nos pontos 3, 4.1 a 4.4.”
pp) Em face do novo despacho do Secretário, as novas informações da DSSOPT foram nitidamente orientadas para se declarar a caducidade do contrato.
Sobre os fundamentos do Recurso:
O início do prazo de 25 anos de validade do contrato não pode contar-se a partir da publicação do Despacho 36/SAES/86, de 20 de Outubro:
qq) A cláusula 2ª do contrato de concessão, é um termo inicial suspensivo e, consequentemente, a contagem do prazo de 25 anos de validade só comeca a contar a partir da data da celebracão da escritura.
rr) Perante o disposto na Lei 8/91/M, de 29 de Julho, o título do contrato de concessão passou a ser o Despacho de deferimento publicado e não a escritura do contrato de concessão.
ss) Uma coisa é o contrato de concessão poder ser titulado pelo despacho de deferimento da concessão e outra coisa é a validade e o próprio conteúdo das suas cláusulas.
tt) A Lei 8/91/M, de 29 de Julho, apenas estipulou que o despacho de deferimento da concessão passava a titular a concessão de terras, mas nada estabeleceu quanto à contagem do início da validade do prazo de 25 anos do contrato que fazia parte das cláusulas contratuais e onde se estabelecia um termo inicial suspensivo para a contagem do referido prazo.
uu) A cláusula 2ª do contrato manteve-se válida e foi sempre essa a razão da C.R.P. para recusar o registo da concessão do lote B em nome dos Concessionários (Vd. supra ponto 49).
vv) A cláusula 2ª do contrato é uma cláusula acessória que estabelece um termo inicial de natureza suspensiva.
ww) Como o termo não pode ter aplicação retroactiva, terá de se concluir que a contagem do prazo de 25 anos do contrato do lote B nunca podia comecar a partir da publicacão do Despacho nº 36/SAES/86, no B.O. nº 42, em 20/10/86.
xx) O Despacho recorrido, ao considerar que o início da contagem do prazo de 25 anos do contrato de concessão retroagia à da data da publicação do Despacho nº 36/SAES/86, publicado no B.O. nº 42, de 20/10/86, não só violou o disposto na cláusula 2ª do contrato de concessão, como violou o disposto nos arts. 271º e 265º do CC.
yy) Impõe-se, pois, que o Despacho recorrido seja anulado com fundamento no disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC.
O Despacho que determinou a suspensão do aproveitamento do terreno do Lote B deve suspender, também, o decurso do prazo de 25 anos do contrato de arrendamento:
zz) Está reconhecido em todas as análises técnicas e jurídicas efectuadas pela DSSOPT que os Concessionários estavam impedidos de aceder ao terreno para poderem cumprir as obrigações contratuais, de realizar a desocupação e o aproveitamento do terreno.
aaa) Tal impedimento foi expressamente reconhecido pela Administração quando o Director dos SPECE emitiu o seguinte Parecer para o Secretário-Adjunto: “Atendendo aos factos invocados peLo requerente e ao referido na presente informação, proponho a V. Exa. que seja considerado suspenso o respectívo processo, nomeadamente quanto ao cumprimento das obrígacães dos requerentes, sem prejuízo de estes serviços desenvolverem todas acções necessárias para a solução dos problemas existentes relacionados com os terrenos em causa”.
bbb) E foi também expressamente reconhecido em 6.07.1987 quando aquela proposta foi aceite pelo Secretário-Adjunto, que lavrou sobre a Informação 172/87 o despacho de “Concordo com o procedímento proposto. Aja-se em conformidade”.
ccc) Mais: a Administração reconheceu em todos as informações e pareceres que precederam a decisão recorrida, que os Concessionários não tiveram qualquer culpa até 1998 no não aproveitamento do terreno assim como reconheceu que tinha sido autorizada a suspensão do prazo de aproveitamento do terreno.
ddd) Mostra-se totalmente incompreensível e desrazoável que a suspensão do prazo de aproveitamento do terreno, que se iniciou em 1987 com o despacho que a autorizou, não se tenha reflectido no prazo de 25 anos de validade do contrato!
eee) Se tal tivesse acontecido o prazo de 25 anos do contrato teria ficado suspenso em 1987 e só teria continuado a correr a partir de 1998.
fff) Bastaria atentar-se no princípio da boa fé para ter de se considerar que a Administração, ao suspender o prazo de aproveitamento do terreno, constituiu na esfera dos Concessionários uma situação de confiança legítíma, criando neles uma expectativa fundada de que aquela suspensão se reflectiria, também, no prazo de 25 anos da validade do contrato.
ggg) É manifesto que se a suspensão do prazo de aproveitamento do terreno se tivesse reflectido no prazo de 25 anos da validade do contrato, a declaração de caducidade do contrato não podia ter fundamento nas disposições conjugadas do nº 1 do artigo 54º e do nº 1 do artigo 55º da Lei nº 6/80/M (Lei de Terras), de 5 de Julho, como foi considerado.
hhh) O despacho recorrido, ao declarar a caducidade do contrato de concessão com fundamento no decurso do respectivo prazo de validade, não só violou o disposto na alínea c) do nº 1 da cláusula 14º do contrato de concessão e, consequencialmente, o disposto do nº 1 do artigo 54º e do nº 1 do artigo 55º da Lei nº 6/80/M (Lei de Terras), de 5 de Julho, como violou, ainda, o princípio da boa-fé previsto no artigo 8º do CPA, na dimensão da protecção da confiança.
Da violação de outros princípios gerais a que está subordinada a actuação da Administração:
iii) O Chefe do Executivo, ao decidir como decidiu, violou o princípio da decisão, consagrado no art. 11º do CPA, porquanto durante o procedimento que preparou o despacho recorrido foi alertada para a falta de decisão quanto aos requerimentos dos Concessionários de 22.02.2008 e 31.07.2009, e não actuou em conformidade.
jjj) A violação do princípio da decisão é mais um fundamento para ser anulado o despacho recorrido nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC.
kkk) O Chefe do Executivo, ao decidir como decidiu, violou o princípio da boa fé consagrado no art. 8º do CPA, porquanto os Concessionários sempre confiaram que a Administração respeitaria os seus direitos e actuaria de modo a que as suas expectativas não fossem goradas
lll) Os Concessionários informaram sempre a Administração, mesmo quando não comunicaram com ela por escrito, das razões e das dificuldades que tinham para executar o projecto aprovado em 1998, e isto, entre outras razões, porque não conseguiam obter o financiamento necessário por parte dos bancos, em virtude da falta de registo do lote B em seu nome.
mmm) A Administração bem sabia que o registo do lote do terreno em nome dos Concessionários era essencial à obtenção do financiamento para execução do projecto.
nnn) A Administração nunca foi diligente nem colaborou com os Concessionários no sentido da realização desse registo.
ooo) Todas as acções e omissões posteriores dos Concessionários foram consequência daqueles dois factos entrelaçados: falta de registo do lote B em nome dos Concessionários e, por isso, falta de financiamento para execução do projecto de aproveitamento do Lote C que seria objecto de troca pelo Lote B.
ppp) Constituiu uma verdadeira surpresa para os Concessionários a notificação da intenção da Administração vir a declarar a caducidade do contrato: primeiro, i) por culpa no não aproveitamento do terreno e depois, ii) por ter decorrido o respectivo prazo de validade do contrato.
qqq) O Chefe do Executivo, ao decidir como decidiu, violou o princípio da protecção da confiança, pois os Concessionários tinham a esperança, legítima, de não ver declarada a caducidade do seu contrato e de lhes ser dada uma oportunidade razoável e justa para aproveitarem o terreno.
rrr) Tal expectativa dos Concessionários estava sustentada na actuação anterior da Administração face a outros casos de não aproveitamento do terreno e de termo do prazo do contrato que nem sequer tinham passado pelas vicissitudes por que passaram os Concessionários.
sss) A situação sui generis do processo dos Concessionários sempre permitia à Administração estender o prazo de validade de 25 anos do contrato quer com fundamento no termo suspensivo da cláusula 2ª do contrato, quer com fundamento na suspensão do prazo para o aproveitamento do terreno autorizada em 1987, sustentada na ressalva da alínea c) da cláusula décima quarta do contrato.
ttt) O Despacho recorrido, ao declarar a caducidade do contrato pelo decurso do respectivo prazo de validade, é desconforme com as exigências decorrentes do princípio da protecção da confiança e por isso violou o princípio da boa fé consagrado no artigo 8º do CPA.
uuu) Este é, pois, mais um fundamento para ser anulado o despacho recorrido nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC.
vvv) O Chefe do Executivo, ao decidir como decidiu, violou o princípio da igualdade ao declarar a caducidade do contrato publicado através do Despacho 36/SAES/86, pelo decurso do respectivo prazo de validade.
www) Ao longo dos tempos a Administração muito raramente declarou a caducidade dos contratos de concessão com fundamento no não aproveitamento do terreno ou no decurso do prazo do contrato; e, quando tal aconteceu, isto é, quando a Administração formalmente declarou tal caducidade, também deferiu, em simultâneo ou de seguida, a concessão do mesmo terreno ou parte dele ou idêntico a ele aos mesmos concessionários.
xxx) Há violação do princípio da igualdade, na vertente de “Proibição do arbítrio”, sempre que, diante de situacões substantivamente idênticas, a Administração decide de modo diferente, de modo desigual.
yyy) Se dois ou mais contratos de concessão estão caducados por falta de aproveitamento do terreno ou pelo decurso do respectivo prazo de validade, a situacão jurídica de tais contrato apresenta-se substantivamente idêntica, pelo que a decisão a tomar pela Administração sobre tais contratos deve ser idêntica, seja qual for o tipo de contrato, seja qual for o objecto e a finalidade da concessão, seja qual for a natureza jurídica dos concessionários.
zzz) Através do Despacho nº 49/2002 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, publicado no B.O. 26, de 26 de Junho, foi declarada a caducidade do contrato de concessão, titulado pelo Despacho 69/SATOP/95, com a área de 111272 m2, por ter terminado, em 7 de Outubro de 2000, o prazo do arrendamento sem que tenha sido concluído o aproveitamento.
aaaa) Em simultâneo, no mesmo Despacho, foi autorizada a concessão do mesmo terreno, por mais 25 anos.
bbbb) Através do Despacho nº 89/2007, do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, publicado no B.O. 29, de 20 de Julho, foi declarada a caducidade da concessão titulada por escritura de 1975, revista pelas escrituras de 9 de Março de 1979 e de 25 de Março de 1981, pelo Despacho 34/SAOPH/88 e pelo Despacho 172/SATOP/93, rectificado pelo Despacho 81/SATOP/94, respeitante ao terreno com a área de 55652 m2, por ter terminado, em 6 de Outubro de 2000, o respectivo prazo de arrendamento sem que tenha sido concluído o seu aproveitamento.
cccc) Em simultâneo, no mesmo Despacho, foi autorizada a concessão do mesmo terreno, por mais 25 anos.
dddd) Da comparação entre estes dois casos e o caso dos Concessionários é manifesto o tratamento privilegiado dado aos concessionários dos dois despachos referidos, pois não havia aproveitamento do terreno e o prazo de 25 anos do contrato já tinha sido ultrapassado, mesmo depois das anteriores revisões (cerca de 2 anos num caso e cerca de 7 anos no outro caso); a concessão inicial reportava a 1975; e não tinham ocorrido impedimentos ao aproveitamento como aquele que determinou a suspensão do prazo do aproveitamento do terreno do Lote B.
eeee) Os Concessionários entendem que se impõe, também com este fundamento, que seja anulado o despacho recorrido, nos termos do disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC.
ffff) O Chefe do Executivo, ao decidir como decidiu, violou o princípio da justiça, ao declarar a caducidade do contrato publicado pelo Despacho 36/SAES/86, pelo decurso do respectivo prazo de validade
gggg) O princípio da justiça consagrado no artigo 7º do CPA estabelece que “No exercício da sua actividade, a Administração PúbLica deve tratar de forma justa e imparcial todos os que com ela entrem em relação”.
hhhh) É injusta porque contrária ao direito e violadora de normas contratuais e normas e princípios legais,
iiii) e é parcial porque, o Chefe do Executivo deu uma última oportunidade para o aproveitamento de terreno a concessionários que tiveram culpa no não aproveitamento, porque o Chefe do Executivo deu uma última oportunidade a concessionários quando declarou a caducidade de contratos em simultâneo com nova concessão do mesmo terreno.
jjjj) Um exemplo significativo da violação do princípio da boa fé e do principio da justiça é o contrato de concessão a favor da XXX Limitada, titulado pelo Despacho nº 173/SATOP/97, de 19 de Dezembro, e a tramitação subsequente descrita nesta petição de Recurso.
kkkk) Este exemplo reforça a certeza de que o Chefe do Executivo, ao decidir como decidiu, também violou o princípio da justiça quando negou aos Concessionários uma última oportunidade para, em 2009, realizar o aproveitamento do lote C (e proceder à troca deste pelo lote B), com um projecto que repunha o espírito inicial da concessão do lote B - construir 10 espaços comerciais para o desenvolvimento das actividades dos concessionários.
llll) Além do mais, a situação dos autos tem uma marca distintiva que o Chefe do Executivo e a Administração fizeram por ignorar: é que esta concessão foi dada aos Concessionários como compensacão por algo que lhes tinha sido retirado!
mmmm) A verdade é que a Administração desalojou os Concessionários dos terrenos onde desenvolviam, legalmente, as suas actividades profissionais e que era o sustento de várias famílias (vd. pontos 18 a 21).
nnnn) Como forma de os compensar, a Administração entregou-lhes o terreno com a área de 930 m2, situado em Macau, entre a Trav. do Laboratório e a Rua Marginal do Canal dos Patos, designado por lote B.
oooo) A aprovação do projecto das dez lojas (vd. supra ponto 100), apresentado em 31.07.2009, e que seriam facilmente concluídas dentro do prazo de concessão considerado pela DSSOPT, seria a forma justa e correcta de concretizara promessa feita anteriormente.
pppp) Ao decidir como decidiu, não só a Administracão tinha anteriormente retirado os terrenos e o modo e sustento de vida dos Concessionários, como agora lhe retirava também a compensação que lhes tinha prometido com a concessão do terreno mesmo reconhecendo ue o não aproveitamento do terreno não era culpa sua, traduzindo-se essa decisão do Chefe do Executivo numa PROFUNDA E REVOLTANTE INJUSTIÇA!
qqqq) Também por estas razões, que consubstanciam uma violacão do princípio da boa fé e da justiça deve ser anulado o despacho recorrido nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 21º do CPAC.
*
Regularmente citada, a Entidade Recorrida contestou nos termos constantes a fls. 830 a 874 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pelo não provimento do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Pressupostos Processuais
O Tribunal é o competente.
As partes possuem personalidade e capacidade judiciárias.
Mostram-se regularmente patrocinadas.
Não existem nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – Factos
É assente a seguinte factualidade com interesse à boa decisão da causa com base nos elementos probatórios existentes nos autos:
1. Por Despacho n.º 36/SAES/86, publicado no BO de 20 de Outubro, foi autorizada a concessão por arrendamento e com dispensa de hasta pública, o terreno com a área de 930m2, situado em Macau, entre a Travessa do Laboratório e a Rua Marginal do Canal dos Patos, designado por lote B, a favor de A, B, C, F, H, L, I, E, G e J.
2. Por despacho do Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas (SATOP), de 30 de Agosto de 1991, foi autorizado o desencadeamento do procedimento de troca do lote B pelo lote C, ficando o lote C confinante com o lote B.
3. Em 02 de Outubro de 1996, a Administração enviou aos recorrentes a minuta do contrato referente à troca do lote B pelo lote C, na qual se indicava que o lote C seria aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, composto por 21 pisos, destinado a fins habitacionais, comerciais e de estacionamento, cujo prémio seria fixado em 10,168,581.00 patacas e, a fim de permitir registar o respectivo terreno na CRP, seria fixado o prazo de arrendamento de 25 anos contado a partir de 20 de Outubro de 1986, ou seja, a partir da data da publicação no BO do Despacho n.º 36/SAES/86.
4. Em 22 de Fevereiro de 2008, os Recorrentes enviaram uma carta à DSSOPT, na qual afirmam que não responderam ao ofício e minuta de contrato enviados pela Administração em 02 de Outubro de 1996 por motivo de crise no mercado imobiliário ocorrida anteriormente mas que agora, em 2008, já estavam reunidas as condições para darem seguimento ao processo, tendo, por isso, declarado aceitar as condições contratuais.
5. A Administração não respondeu a carta dos recorrentes acima em referência.
6. Por despacho do Chefe do Executivo de 14 de Abril de 2015, exarado sobre o parecer do STOP de 17 de Março de 2015, que concordou com o proposto no processo n.º 61/2013 da Comissão de Terras, pelas razões nele indicadas, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 930m2, situado em Macau, entre a Travessa do Laboratório e a Rua Marginal do Canal dos Patos, designado por lote B, pelo decurso do respectivo prazo de validade, o qual foi tomado público pelo despacho do STOP n.º 38/2015, publicado no Suplemento ao BO n.º 16, de 22 de Abril de 2015.
*
IV – Fundamentação
A. Da inexistência da Despacho do Chefe Executivo que declarou a caducidade da concessão:
Para os Recorrentes, o acto recorrido padece do vício de forma por inobservância da forma legalmente exigida no artº 167º da Lei nº 10/2013 (Lei de Terras).
Não lhe assiste mínima razão, por confundir o acto administrativo propriamente dito e o acto de publicação/notificação.
Dispõe o artº 167º da Lei nº 10/2013 que “A caducidade das concessões, provisórias ou definitivas, é declarada por despacho do Chefe do Executivo, publicado no Boletim Oficial”.
No caso em apreço, a declaração da caducidade, ora acto recorrido, foi feita por despacho do Chefe do Executivo.
Cumpriu-se desde logo a formalidade do acto legalmente exigida.
Quanto à publicação do acto, o Despacho do STOP nº 38/2015, publicado no B.O. nº 16, de 22/04/2015, fez menção expressa de que “Tornar público que por despacho do Chefe do Executivo de 14 de Abril de 2015, exarado sobre o seu parecer de 17 de Março de 2015, que concordou com o proposto no processo n.º 61/2013 da Comissão de Terras, pelas razões nele indicadas, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 930 m2, situado em Macau, entre a Travessa do Laboratório e a Rua Marginal do Canal dos Patos, designado por lote B, pelo decurso do seu prazo”.
Face ao teor supra transcrito, não resta qualquer margem de dúvida de que está feita também a publicação do acto nos termos legais.
Aliás, ainda que se verificasse a falta de publicação do acto, nunca conduz à invalidade do acto recorrido.
Como é sabido, tanto a publicação como a notificação do acto administrativo visam dar conhecimento ao seu destinatário dos elementos essenciais do acto administrativo propriamente dito.
Assim, quando a publicação/notificação omita os elementos legalmente exigidos, determina, consoante os casos, a ineficácia do acto (se a publicação/notificação não dê a conhecer o sentido, o autor e a data da decisão) – artº. 26º, nº 1, do CPAC, ou simplesmente a suspensão da contagem do prazo de recurso – artº 27º do CPAC.
Mas nunca determina a invalidade do acto administrativo propriamente dito, por não ser parte constitutiva do mesmo.
Alegam também que a simples palavra “Concordo” exarada na proposta da declaração da caducidade da concessão do terreno não pode ser entendida como uma manifestação expressa e inequívoca de declarar a caducidade.
Trata-se duma posição manifestamente infundada e até contra a disposição legal do nº 1 do artº 115º do CPA, nos termos do qual a fundamentação do acto pode consistir “em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto”.
No caso em apreço, a Entidade Recorrida ao lançar a palavra “Concordo” na proposta da declaração da caducidade da concessão do terreno, significa aderir ao proposto, declarando a caducidade da concessão do terreno com os fundamentos constantes da proposta.
No mesmo sentido, vejam-se os Acs. do do T.U.I. de 25/09/2019 e 04/10/2019, Procs. nºs 79/2018 e 11/2017, e deste T.S.I. de 19/09/2019, Proc. n.º 1122/2017.
Improcede, assim, esta parte do recurso contencioso.
B. Erro no pressuposto de facto quanto à contagem do início do prazo da concessão de 25 anos:
Sustentam os Recorrentes que o início do prazo de 25 anos de validade da concessão do terreno não pode contar-se a partir da publicação do Despacho n.º 36/SAES/86, de 20 de Outubro, já que a cláusula 2ª do contrato da concessão previa que o prazo da concessão só começava a contar a partir da data da celebração da escritura, que não foi feita em consequência da entrada em vigor da Lei nº 8/91/M, de 29 de Julho, nos termos da qual o título da concessão passava a ser o despacho de deferimento publicado no BO e não a escritura do contrato de concessão.
Quid iuris?
O Despacho n.º 36/SAES/86 foi publicado no BO de 20/10/1986, onde fixou uma das condições do contrato de concessão o seguinte:
“1. O arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, a contar a partir da data da outorga da escritura do presente contrato.” (cfr. nº 1 da cláusula 2ª do contrato).
Sem as alterações legislativas introduzidas pela Lei nº 8/91/M, o prazo da concessão do terreno em causa contava-se a partir da data da outorga da escritura do contrato da concessão, isto é, uma data certamente posterior à da publicação do Despacho n.º 36/SAES/86.
A Lei nº 8/91/M foi publicada no dia 29/07/1991, sem prever qualquer data específica da entrada em vigoir, pelo que entrou em vigor no dia 04/08/1991.
Entre a publicação do Despacho n.º 36/SAES/86 e a entrada em vigor da Lei nº 8/91/M, existe um lapso de tempo cerca de 5 anos.
Até à entrada em vigor da Lei nº 8/91/M, ainda não se celebrou a escritura do contrato da concessão entre os Recorrentes e a Administração.
Ou seja, até 04/08/1991, ainda não se iniciou a contagem do prazo da concessão para o terreno em causa.
Tendo a nova lei dispensado a outorga da escritura do contrato da concessão, a forma da contagem do prazo da concessão inicialmente prevista no nº 1 da cláusula 2ª do contrato deixava de ter qualquer utilidade prática.
Assim, já não pode servir para determinar o início da contagem do prazo da concessão.
Pergunta-se então como é que vamos contar o prazo das concessões do terreno anteriores cuja outorga da escritura do contrato tornou-se desnecessária face à Lei nº 8/91/M?
Se contar o prazo de 25 anos da concessão a partir de 20/10/1986 (data da publicação no BO do Despacho n.º 36/SAES/86) significa uma redução quase 1/5 do prazo, o que se traduz numa injustiça para os Recorrentes.
Cremos que o legislador ao mandar aplicar aos processos pendentes da concessão a disposição da nova lei não tenha a intenção de reduzir os prazos da validade das concessões já autorizadas mas à espera da celebração da escritura do contrato, antes queria simplificar as formalidades burocráticas da concessão, dispensando a outorga da escritura do contrato da concessão.
Nesta conformidade, entendemos que deveria iniciar a contagem do prazo dessas concessões a partir da data da entrada em vigor da Lei nº 8/91/M, ou seja, a partir do dia 04/08/1991, já que só a partir desta data é que o despacho de autorização tornou-se título bastante da concessão, em substituição da outorga da escritura do contrato.
Assim, o termo do prazo da concessão do caso sub justice ocorre-se no dia 04/08/2016, pelo que à data do acto recorrido (14/04/2015), ainda não se verifica a caducidade da concessão.
Existe portanto erro no pressuposto de facto, o que determina a anulabilidade do acto recorrido.
C. Da suspensão da contagem do prazo da concessão:
Para os Recorrentes, como foi autorizada a suspensão do prazo de aproveitamento, tal suspensão devia ter sido extendidda também ao prazo da concessão.
Adiantamos desde já que não lhes assiste razão.
Dispõe o artº 320º do C.C. que “O prazo de caducidade não se suspende nem e interrompe senão nos casos em que a lei o determine”.
Não resulta da Lei da Terra qualquer norma que permite a suspensão ou interrupção do prazo da concessão.
Aliás, tanto o TUI como este TSI já se pronunciaram sobre a questão em causa, com sentido unâmine de que o prazo da concessão do terreno não é passível de suspensão ou interrupção.
A título exemplificatico, transcrevemos o Ac. do TUI, de 07/03/2018, proferido no Proc. nº 1/2018, na parte que se pronunciou sobre o problema:
“…
Estamos, agora, em condições de extrair algumas conclusões do regime de caducidade das concessões provisórias e definitivas.
Já vimos que a concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório, por prazo a fixar em função das características da concessão, e só se converte em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas. E que o prazo de concessão por arrendamento é fixado no respectivo contrato de concessão, não podendo exceder 25 anos.
A lei estabelece que as concessões provisórias não podem ser renovadas.
Assim, podemos concluir que decorrido o prazo de 25 anos da concessão provisória (se outro prazo não estiver fixado no contrato) o Chefe do Executivo deve declarar a caducidade do contrato se considerar que, no mencionado prazo, não foram cumpridas as Processo n.º 1/2018 65 cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas. Por outro lado, como vimos, a prova de aproveitamento de terrenos urbanos ou de interesse urbano faz-se mediante a apresentação pelo concessionário da licença de utilização (artigo 130.º). Feita a prova do aproveitamento, a concessão torna-se definitiva (artigo 131.º).
Quer isto dizer que o Chefe do Executivo declara a caducidade pelo decurso do prazo (25 anos, se outro não for o fixado no contrato) se o concessionário não tiver apresentado a licença de utilização do prédio, porque é mediante a apresentação desta licença que se faz a prova de aproveitamento de terreno urbano ou de interesse urbano.
E o Chefe do Executivo não tem que apurar se o este incumprimento das cláusulas de aproveitamento se deve ter por motivo não imputável ao concessionário. Isto é, não tem que apurar se a falta de aproveitamento se deveu a culpa do concessionário ou se, por exemplo, a Administração teve culpa, exclusiva ou não, em tal falta de aproveitamento. Ou, ainda, se a falta de aproveitamento se deveu a caso fortuito ou de força maior.
Por outro lado, nenhuma norma permite à Administração considerar suspenso o prazo de concessão provisória ou poder prorrogá-lo.
Que isto é assim resulta da circunstância de o n.º 5 do artigo 104.º dispor que “A requerimento do concessionário, o prazo de aproveitamento do terreno pode ser suspenso ou prorrogado por autorização do Chefe do Executivo, por motivo não imputável ao Processo n.º 1/2018 66 concessionário e que o Chefe do Executivo considere justificativo”.
Quer dizer, a propósito do prazo de aproveitamento do terreno (no caso, o prazo de 36 meses), a lei permite que, a requerimento do concessionário, o Chefe do Executivo autorize a prorrogação desse prazo ou que o mesmo se considere suspenso se considerar que o não aproveitamento do terreno não é imputável ao concessionário.
Mas relativamente ao decurso do prazo de concessão (no caso, o prazo de 25 anos) nenhuma norma permite que o Chefe do Executivo autorize a prorrogação desse prazo ou que o mesmo se considere suspenso, se considerar que o não aproveitamento do terreno não é imputável ao concessionário».
…”.
D. Da violação do princípio da decisão:
Entendem os Recorrentes que há violação do princípio da decisão legalmente previsto no artº 11º do CPA, uma vez que a Administração não deu qualquer resposta aos seus requerimentos de 22/02/2008 e 31/07/2009.
Não ignoramos que a Administração tem o dever de decisão, tal como está previsto no artº 11º do CPA.
No entanto, a violação desse dever não invalida o acto recorrido, visto que o legislador estabelece mecanismo próprio para o efeito, que é justamente a presunção do indeferimento tácito, permitindo desta forma o interessado exercer o respectivo meio legal de impugnação contra a inércia da Administração (cfr. artº. 102º do CPA).
É de julgar improcedente este argumento do recurso.
E. Da violação dos princípios da boa-fé, da tutela da confiança, da igualdade e da justiça:
  Os vícios supra identificados só existem nas actividades administrativas discricionárias.
  Já vimos que a lei se impõe, sem qualquer alternativa, a verificação da caducidade no caso do termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva, pelo que a respectiva declaração da caducidade constitui uma actividade administrativa vinculada.
  Ora, sendo uma actividade administrativa vinculada, os alegados vícios nunca são operantes.
  No mesmo sentido, vejam-se os acórdãos do TUI, de 08/06/2016 e 22/06/2016, proferidos, respectivamente, nos Proc. nº 9/2016 e 32/2016.
  Improcedem, assim, este fundamento do recurso.
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V – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em julgar procedente o recurso contencioso, anulando o acto recorrido nos termos acima consignados.
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Sem Custas, por a Entidade Recorrida gozar da isenção subjectiva.
Notifique e D.N..
*
RAEM, aos 07 de Dezembro de 2023.

Ho Wai Neng
(Relator)

Tong Hio Fong
(1º Adjunto)

Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(2º Adjunto)
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578/2015