Processo nº 750/2023
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data do Acórdão: 01 de Fevereiro de 2024
ASSUNTO:
- Inventário
- Dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges
SUMÁRIO:
- Dívidas contraídas antes ou depois do casamento com o consentimento do outro, para ocorrer aos encargos normais da vida familiar, em proveito comum do casal, ou no exercício do comércio são conceitos de direito que têm de ser integrados por factos cujo ónus da prova cabe àquele que invoca serem as dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges.
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 750/2023
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 01 de Fevereiro de 2024
Recorrente: (A)
Recorrida: (B)
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
Nestes autos de inventário para partilha de bens na sequência de divórcio em que é cabeça-de-casal (A) e interessado (B) veio esta reclamar da relação de bens quanto a determinadas verbas, entre elas as verbas 2, 3 e 4 do passivo quanto ao 2º período do casamento em que vigora o regime de comunhão de adquiridos.
Proferido despacho a deferir a reclamação não foram aquelas verbas incluídas no passivo.
Não se conformando com o despacho proferido veio o cabeça de casal (A) recorrer apresentando as seguintes conclusões e pedidos:
1. Por despacho de 15 de Março de 2023 (adiante designado por “despacho recorrido”), o Tribunal a quo decidiu excluir as 2ª a 4ª dívidas da relação de bens do 2º período da constância do casamento (no qual se aplica o regime da comunhão de adquiridos) entre o recorrente e a requerente (B).
2. No despacho recorrido, indica-se que, “as 2ª a 4ª dívidas nesta fase foram contraídas pelo marido no Banco (X) para o seu investimento pessoal e a provisão do exercício da empresa (vide as fls. 310 a 316 e 438 a 486 dos autos), e nos autos, salvo que o marido afirmasse vulgarmente que a mulher dependeu consideravelmente dos cuidados dele em diversos aspectos da vida ou o rendimento das actividades comerciais foram usadas para as despesas familiares (vide a fls. 391 dos autos), não há elemento concreto que justifique ou manifeste que os empréstimos para exploração pessoal, no valor de cerca de $300.000.000,00, foram contraídos em proveito comum do casal ou para ocorrer aos encargos normais da vida familiar, deste modo, segundo a interpretação “a contrario” do art.º 1558.º alíneas a), b) e d) do Código Civil, as respectivas dívidas não são comuns do casal, devem ser excluídas da relação de bens desta fase;”. (vide o teor do despacho constante da fls. 519v. dos autos, cujo teor se dá por reproduzido)
3. Salvo o devido respeito, o recorrente não concorda com o entendimento do Tribunal a quo, que cometeu erro na aplicação da lei e apreciação da prova quando considerava o art.º 1558.º n.º 1 alínea b) e d) do Código Civil ao proferir o despacho recorrido, uma vez que:
4. Conforme as fls. 132 a 134 dos autos, o recorrente é um empresário comercial, matriculado na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 21879(CO), titular duma empresa comercial designada por “(C)”, que foi aberta em 1 de Janeiro de 2010.
5. Além disso, segundo os elementos do registo comercial, constantes das fls. 135 a 292 dos autos, o recorrente é sócio e administrador da (D) Lda. (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 3xxx(SO)), da (E) Lda. (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 3xxx(SO)), da (F)Lda. (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 3xxx(SO)), da (G) Lda. (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 4xxx (SO)), da (H) Limitada (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 4xxxx(SO)), da (I)Lda. (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 4xxx(SO)), da (J) Lda. (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 4xxx(SO)), da (K) Lda. (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 4xxx(SO)) e da (L) Lda. (matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis sob o n.º 4xxx(SO)).
6. As duas dívidas acima descritas foram contraídas antes do casamento, o recorrente usou as respectivas quantias para o seu investimento e o exercício da empresa comercial como consta dos contratos de empréstimo, os rendimentos decorrentes foram usados para ocorrer aos encargos familiares dos cônjuges e aos encargos normais do consumo da requerente.
7. Importa assinalar que, a requerente não se opôs nem reclamou das alegações da fls. 391 dos autos de forma qualquer.
8. Pelo que, na verdade, a requerente admitiu tacitamente os factos alegados pelo recorrente na fls. 391 dos autos, a requerente tem dependido consideravelmente dos cuidados do recorrente na vida e as remunerações do exercício das actividades comerciais pelo recorrente são a fonte principal do dinheiro para cobrir os encargos familiares.
9. E as remunerações do exercício das actividades comerciais pelo recorrente são decorrentes do investimento dos dois empréstimos referidos no exercício da empresa e do comércio.
10. Se o recorrente não pedisse os referidos empréstimos do Banco (X), S.A. para o investimento e o exercício da empresa e, dessa forma, ganhasse os rendimentos para ocorrer aos encargos da vida familiar, foi impossível para ele suportar as custas mensais elevadas da recorrida e manter o ambiente e a situação da sua vida.
11. Pelo que, embora as dívidas fossem contraídas pelo recorrente próprio antes do casamento, segundo os elementos dos autos e a situação económica do recorrente e da requerente, pode-se concluir que, as dívidas foram contraídas em proveito comum do casal, tendo como objectivo principal e essencial cobrir os encargos normais da vida familiar deles.
12. No despacho recorrido, sem que fizesse uma análise sintetizada dos autos e provas, nomeadamente a titularidade duma empresa comercial pelo recorrente, descrita nas fls. 132 a 293 dos autos, a sua qualidade de sócio e administrador em várias sociedades limitadas e os documentos bancários constantes das fls. 333 a 373 dos autos, o Tribunal a quo sustentou que nos autos não há elemento concreto que justifique ou manifeste que os empréstimos para exploração pessoal, no valor de cerca de $300.000.000,00, foram contraídos em proveito comum do casal ou para ocorrer aos encargos normais da vida familiar. Assim sendo, o despacho recorrido viola o art.º 1558.º n.º 1 alínea b) do Código Civil.
13. Desde que as dívidas foram contraídas obviamente em proveito comum do casal, ao abrigo do art.º 1558.º n.º 1 alínea b) do Código Civil, são da responsabilidade de ambos os cônjuges. O juiz deve integrar essas dívidas à relação de bens, para realizar a partilha justa e precisa dos bens comuns.
14. Deste modo, ao abrigo do art.º 1558.º n.º 1 alínea b) do Código Civil, as 2ª e 3ª dívidas da relação de bens em causa devem ser da responsabilidade do recorrente e a requerente.
15. Pelo exposto e nos demais de direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, pede-se que seja julgado procedente o presente recurso, seja declarado que no teor do despacho relativo à exclusão das 2ª e 3ª dívidas (mencionado no art.º 2.º das alegações) cometeu-se erro na aplicação do art.º 1558.º n.º 1 alínea b) do Código Civil e na apreciação da prova, seja anulado esse teor do despacho recorrido, substituindo-o, por conseguinte, por um outro que considere justo e adequado.
16. De acordo com o documento de empréstimo, celebrado entre o cabeça-de-casal e o Banco (X), constante das fls. 469 a 472 dos autos, a 4ª dívida da relação de bens foi contraída em 27 de Dezembro de 2018, a linha de crédito era de MOP$109.800.000,00, na altura, o regime de bens para o casamento entre o recorrente e a requerente era o regime da comunhão de adquiridos, o empréstimo destinava-se ao investimento e à provisão do exercício da empresa do recorrente.
17. Como acima disse nos art.º 7.º e 8.º das alegações, o recorrente é um empresário comercial, titular duma empresa comercial designada por “(C)” e sócio e administrador de várias sociedades limitadas.
18. Ao abrigo do art.º 1.º do Código Comercial, o recorrente deve ser considerado como empresário comercial. E o negócio de empréstimo entre o recorrente e o Banco (X) é regulamentado pelos art.º 850.º e ss. do Código Comercial.
19. O acto de abertura de crédito bancário é regulado pelo Código Comercial, pelo que, ao abrigo do art.º 3.º n.º 1 alínea a), o acto de requerimento do empréstimo bancário pelo recorrente para o exercício da empresa deve ser considerado acto de comércio.
20. Deste modo, o acto de celebração do contrato de empréstimo pelo recorrente e o Banco (X), constante das fls. 469 a 472 do processo apensado, é acto de comércio, a dívida decorrente desse contrato de empréstimo constitui dívida comercial.
21. Ao abrigo do art.º 81.º do Código Comercial, a dívida comercial decorrente do contrato de empréstimo pelo recorrente e o Banco (X), constante das fls. 469 a 472 do processo apensado, presume-se contraída no exercício da sua empresa.
22. A requerente questionou a origem e o destino dessa dívida, defendendo que a dívida não se derivou do exercício da empresa comercial, entretanto, não ofereceu qualquer contraprova, nesta situação, deve ser aplicada a presunção prevista pelo art.º 81.º do Código Comercial.
23. Pelo que, ao abrigo do art.º 1558.º n.º 1 alínea d) do Código Civil, a dívida é da responsabilidade de ambos os cônjuges.
24. No caso, não é aplicável a segunda parte do art.º 1558.º n.º 1 alínea d) do Código Civil, é certo que a requerente sustentou que a dívida não foi contraída em proveito comum do casal e o art.º 1558.º n.º 3 do Código Civil dispõe que o proveito comum do casal não se presume, mas a primeira parte do art.º 1558.º n.º 1 alínea d) do Código Civil já presume que as dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio são da responsabilidade de ambos os cônjuges, o ónus da prova da falta do proveito comum do casal recai sobre o outro cônjuge ou outros interessados.
25. Deste modo, se a requerente entenda que a dívida não foi contraída em proveito comum do casal, deve assumir o ónus da prova.
26. Todavia, a requerente limitou-se a afirmar que nunca soube nem concordou com a contracção da dívida, o valor do empréstimo foi demasiadamente elevado e a dívida não foi contraída em proveito comum do casal, mas não produziu qualquer prova da falta do proveito comum do casal. Pelo que, não procede o seu fundamento na falta do proveito comum para apoiar que a dívida não da responsabilidade de ambos os cônjuges.
27. Além disso, a dívida acima descrita foi contraída depois do casamento, o recorrente usou a respectiva quantia para o seu investimento e o exercício da empresa comercial como consta do contrato de empréstimo, os rendimentos decorrentes foram usados para ocorrer aos encargos familiares dos cônjuges e aos encargos normais do consumo da requerente.
28. Como acima disse nos art.º 10.º a 13.º das alegações, a requerente tem dependido consideravelmente dos cuidados do recorrente na vida, as remunerações do exercício das actividades comerciais pelo recorrente são a fonte principal do dinheiro para cobrir os encargos familiares e essas remunerações são decorrentes do investimento dos dois empréstimos referidos (sic.) no exercício da empresa e do comércio.
29. Se o recorrente não pedisse o referido empréstimo do Banco (X) para o investimento e o exercício da empresa e, dessa forma, ganhasse os rendimentos para ocorrer aos encargos da vida familiar, foi impossível para ele suportar as custas mensais elevadas da recorrida e manter o ambiente e a situação da sua vida.
30. Pelo que, embora a dívida foi contraída pelo recorrente próprio depois do casamento, segundo os elementos dos autos e a situação económica do recorrente e da requerente, pode-se concluir que, a dívida foi contraída em proveito comum do casal, tendo como objectivo principal e essencial cobrir os encargos normais da vida familiar deles.
31. No despacho recorrido, sem que considerasse a titularidade duma empresa comercial pelo recorrente, descrita nas fls. 132 a 293 dos autos, a sua qualidade de sócio e administrador em várias sociedades limitadas, os documentos bancários constantes das fls. 333 a 373 dos autos e a finalidade de celebração do contrato de empréstimo pelo recorrente com o Banco (X), constante das fls. 469 a 472 do processo apensado, o Tribunal a quo sustentou que nos autos não há elemento concreto que justifique ou manifeste que os empréstimos para exploração pessoal, no valor de cerca de $300.000.000,00, foram contraídos em proveito comum do casal ou para ocorrer aos encargos normais da vida familiar. Assim sendo, o despacho recorrido viola o art.º 1558.º n.º 1 alínea b) do Código Civil.
32. Desde que a dívida foi contraída obviamente em proveito comum do casal, ao abrigo do art.º 1558.º n.º 1 alínea b) do Código Civil, são da responsabilidade de ambos os cônjuges; e ao abrigo do art.º 1558.º n.º 1 alínea d) do Código Civil, a 4ª dívida da relação de bens em causa deve ser considerada contraída por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio e em proveito comum do casal.
33. Deste modo, ao abrigo do art.º 1558.º n.º 1 alíneas b) e d) do Código Civil, essa dívida deve ser da responsabilidade do recorrente e a requerente. O juiz deve integrar essa dívida à relação de bens, para realizar a partilha justa e precisa dos bens comuns.
34. Pelo exposto e nos demais de direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, pede-se que seja julgado procedente o presente recurso, seja declarado que no teor do despacho relativo à exclusão da 4ª dívida (mencionado no art.º 2.º das alegações) cometeu-se erro na aplicação do art.º 1558.º n.º 1 alíneas b) e d) do Código Civil e na apreciação da prova, seja anulado esse teor do despacho recorrido, substituindo-o, por conseguinte, por um outro que considere justo e adequado.
Pela Recorrida não foram apresentadas contra-alegações.
Foram colhidos os vistos.
II. FUNDAMENTAÇÃO
Pelo Tribunal “a quo” foi proferida a seguinte decisão:
«No presente processo de inventário, o cabeça-de-casal (A) apresentou a relação de bens rectificada (a segunda relação de bens) (cfr. fls. 393 a 404 dos autos), à qual a requerente (B) formulou reclamação (cfr. fls. 409 a 414 dos autos), impugnando as inexactidões relativas a algumas contas bancárias e as respectivas dívidas.
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Compulsados os autos, deram-se como provados os seguintes factos relevantes para o julgamento da causa:
1) Em 11 de Novembro de 2016, (A) e (B) contraíram matrimónio em Macau sem convenção antenupcial (cfr. fls. 8 dos autos);
2) No dia 6 de Novembro de 2017, os mesmos celebraram uma convenção pós-nupcial alterando o regime de bens para o da comunhão de adquiridos (cfr. fls. 8 dos autos);
3) Em 9 de Novembro de 2020, a requerente (B) intentou acção de divórcio litigioso em Macau; em 9 de Novembro de 2021, o Tribunal decretou a dissolução do casamento, sendo a requerente única culpada; a respectiva sentença transitou em julgado no dia 29 de Novembro de 2021.
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Quanto ao regime de bens aplicável ao casamento dos cônjuges em causa, dado que o cabeça-de-casal (marido) e a requerente (esposa) não celebraram convenção antenupcial quando contraíram matrimónio em Macau em 11 de Novembro de 2016, era aplicável supletivamente o regime de bens supletivo – o regime da participação nos adquiridos. Posteriormente, os cônjuges alteraram o regime de bens para o da comunhão de adquiridos em 6 de Novembro de 2017. Por outras palavras, o período da constância do casamento é dividido em duas fases em que vigoravam diferentes regimes de bens:
1ª fase: de 11 de Novembro de 2016 a 6 de Novembro de 2017, período em que vigorava o regime da participação nos adquiridos. Ou seja, sob este regime de bens não existe património comum do casal, podendo cada um dos cônjuges dispor livremente dos seus bens, e só aquando da cessação do regime da participação nos adquiridos é que é preciso determinar o titular e o montante do crédito na participação, sendo apenas necessário incluir na relação de bens o património em participação como o objecto do inventário.
2ª fase: de 6 de Novembro de 2017 a 9 de Novembro de 2020, período em que vigorava o regime da comunhão de adquiridos. Quer dizer que os bens adquiridos pelos cônjuges neste período são bens comuns; além disso, nos termos do artigo 1644.º do CC de Macau, os efeitos do divórcio retrotraem-se à data da propositura do processo do divórcio quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges.
Nestes termos, aceitamos que o cabeça-de-casal relacionou o património em participação e o património comum respectivamente nas duas tabelas de fls. 393 a 404 dos autos em função dos dois períodos do casamento. Quanto à reclamação apresentada pela requerente, esclarecemos do seguinte modo:
1) O primeiro período do casamento (em que vigorava o regime da participação nos adquiridos):
- Os saldos das contas bancárias referidas nas verbas n.ºs 1 a 12 da relação de bens, são bens adquiridos na vigência do regime da participação nos adquiridos, pelo que são património em participação e devem assim ser mantidos.
- No entanto, as contas referidas nas verbas n.ºs 4, 5 e 6 são tituladas conjuntamente pelo cônjuge marido e por outras pessoas, detendo este a quota de ½ dos respectivos saldos. Portanto, os saldos à data de 11 de Novembro de 2016 deveriam ser de MOP$28.587,59, MOP$22.059,74 e MOP$9.037,76 e, à data de 6 de Novembro de 2017, de MOP$236,89, MOP$4.976,09 e MOP$1.375,04.
- Além disso, relativamente às contas das verbas n.ºs 3 e 12, os saldos à data de 6 de Novembro de 2017 devem ser corrigidos, por conversão ou lapso de escrita, para MOP$1.311,63 e MOP$40.897,41.
- No que toca à conta n.º 1xxxxx do Banco (Y), apesar de a conta ter sido aberta pelos cônjuges em 10 de Novembro de 2016, ou seja, um dia antes do casamento, os respectivos montantes foram todos adquiridos na constância do matrimónio, pelo que cada um incluiu metade dos montantes na sua relação de bens do referido período, concretamente à data de 11 de Novembro de 2016 e à data de 9 de Novembro de 2017 (sic).
- No que tange à verba n.º 1 do referido período, isto é, a dívida relativa ao empréstimo hipotecário para aquisição de imóvel contraído junto do Banco Tai Fung (conta n.º 208-5-00245-5) (fls. 307 e 419 dos autos), considerando que a referida dívida foi contraída pelo marido e terceiro no dia 4 de Junho de 2015, ou seja, antes da celebração do matrimónio, e não onerava bens em participação, e que dos autos não flui que a mulher tenha consentido na contracção do dito empréstimo ou que este tenha sido contraído para os encargos normais da vida familiar, é de concluir que não se trata de uma dívida comum dos cônjuges, pelo que deve ser excluída.
2) O segundo período do casamento (em que vigorava o regime da comunhão de adquiridos):
- Em primeiro lugar, deve proceder-se, em conformidade com o que precede, à correspondente rectificação em relação dos saldos, à data de 6 de Novembro de 2017, das contas bancárias das verbas n.º 3 a 6 e 12 da relação de bens.
- Relativamente à verba n.º 1 do passivo deste período, considerando que a referida dívida foi contraída pelo marido e terceiro antes do casamento (junto do Banco (Z), através da conta n.º 2xxxx) e não onerava bens comuns, e que dos autos não flui que a mulher tenha consentido na contracção deste empréstimo de cerca de 100 milhões ou que o empréstimo tenha sido contraído para os encargos normais da vida familiar, é de concluir que não se trata de uma dívida comum dos cônjuges, pelo que deve ser excluída.
- Quanto às dívidas relacionadas nas verbas n.ºs 2 a 4, tratam-se todas de fundos de reserva do cônjuge marido no Banco (X) para investimentos pessoais e exploração comercial (fls. 310 a 316 e 438 a 486 dos autos). Além disso, compulsados os autos, constata-se que o cônjuge marido limitou-se a dizer, de forma genérica, que a vida do cônjuge mulher depende significativamente do marido, e que as respectivas actividades comerciais destinavam-se a suportar os encargos da vida familiar (fls. 391 dos autos), mas não disponibilizou dados concretos para esclarecer ou demonstrar que os empréstimos pessoais para exploração em causa, que perfaziam um total de cerca de 300 milhões, tenham sido contraídos para o interesse comum dos cônjuges ou para os encargos normais da vida familiar. Razão pela qual, ao abrigo do disposto no artigo 1558.º, al.s a), b) e d) do CC, a contrario sensu, tais dívidas não são dívidas comuns dos cônjuges, pois devem ser excluídas da relação de bens deste período.
- Relativamente à dívida relacionada na verba n.º 5, trata-se do empréstimo contraído pelo cônjuge marido junto do Banco (X) para fins de migração por investimento do cônjuge mulher (cfr. fls. 441 a 442 dos autos), pelo que é dívida comum do casal por ter sido contraída para a vida familiar. Realizada investigação, verificou-se que a linha de crédito do referido empréstimo hipotecário para aquisição de imóvel é de 12.400.000,00 dólares de Hong Kong, e actualmente só se encontra concedido o montante de 9 milhões. Até 9 de Novembro de 2020, data da propositura do divórcio, o empréstimo tinha o saldo de 3.100.668,96 dólares de Hong Kong (vide fls. 517 dos autos).
Nos termos do artigo 986.º, n.º 5 do CPC de Macau, ordena-se ao cabeça-de-casal que apresente uma nova relação de bens em conformidade com o teor do despacho, com a determinação do titular e do montante do crédito na vigência do regime da participação nos adquiridos.».
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
O Objecto deste recurso foram as verbas do passivo relacionadas sob os nºs 2 a 4.
Estando em causa dívidas que possam responsabilizar ambos os cônjuges a matéria rege-se pelo disposto no artº 1558º do C.Civ. o qual reza que:
«1. São da responsabilidade de ambos os cônjuges:
a) As dívidas contraídas, antes ou depois da celebração do casamento, pelos dois cônjuges, ou por um deles com o consentimento do outro;
b) As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges, antes ou depois da celebração do casamento, para ocorrer aos encargos normais da vida familiar;
c) As dívidas contraídas na constância do matrimónio pelo cônjuge administrador, em proveito comum do casal e nos limites dos seus poderes de administração;
d) As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio, salvo se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal ou se vigorar entre os cônjuges o regime da separação de bens ou da participação nos adquiridos;
e) As dívidas consideradas comunicáveis nos termos do n.º 2 do artigo 1560.º
2. No regime da comunhão geral de bens, são ainda comunicáveis as dívidas contraídas antes do casamento por qualquer dos cônjuges, em proveito comum do casal.
3. O proveito comum do casal não se presume, excepto nos casos em que a lei o declarar.».
Este artigo é igual ao artº 1691º do C.Civ. Português o que permite o recurso a jurisprudência comparada e Doutrina sobre a matéria.
É bastante claro o ensinamento de Antunes Varela em Direito da Família, pág. 325 e seguintes, Livraria Petrony, 1982 que dada a antiguidade da obra e para facilitar aqui se transcreve:
«69. Dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges
I) Dívidas contraídas por ambos, ou por um deles com o consentimento do outro
No primeiro núcleo das dívidas desta categoria cabem todas as obrigações contraídas por ambos os cônjuges, tendo a lei equiparado a elas as dívidas contraídas por um com o consentimento do outro (1). A classificação abrange tanto as dívidas posteriores, como as anteriores ao casamento, e aplica-se a qualquer regime de bens, inclusive ao regime de separação, como se depreende do texto da alínea a) do nº 1 do artigo 1691º e, por argumento de contexto, do disposto na alínea d) do mesmo número e do nº 2 do artigo 1695º.
É evidente, porém, que as dívidas anteriores à celebração do casamento só gozam do regime especial previsto no artigo 1695º, 1, se, além do mais, forem contraídas na expectativa do casamento e tendo em vista a realização deste. Não será esse o caso de um contrato de jogo, por exemplo, em que os “namorados” participaram antes de se decidirem a casar ou de um cruzeiro em que ambos se inscreveram e devia realizar-se antes do seu casamento.
Não se alude às dívidas contraídas por um dos cônjuges, com suprimento do consentimento judicial do outro, por não ter cabimento este suprimento, em face do princípio proclamado no nº 1 do artigo 1690º e da doutrina firmada nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 1691º.
II) Dívidas destinadas a ocorrer aos encargos normais de vida familiar
Estas dívidas responsabilizam ambos os cônjuges, mesmo que contraídas por um só deles, em virtude da sua afectação especial. E tanto faz que sejam contraídas antes (viagem de núpcias), como depois do casamento; que o regime de bens vigente entre os cônjuges seja de comunhão ou de separação (2).
Entre os encargos normais da vida familiar cabem não só as despesas do governo doméstico (alimentação, vestuário, calçado, aquecimento, artigos de limpeza, medicamentos, etc.) (3), como outras que o transcendem (renda de casa, propinas escolares dos filhos, transportes diários para a escola ou o emprego, aquisição de gasolina para a viatura, etc.).
Estas dívidas serão, em regra, contraídas por cada cônjuge dentro dos poderes de administração que lhe competem no governo da casa. Mas ainda que sejam constituídas pelo cônjuge, que não tem o pelouro correspondente, gozam do mesmo tratamento. Assim poderá inclusivamente suceder com algumas das providências administrativas tomadas nas condições previstas pelo artigo 1679º. Essencial para o efeito é que, não só pela sua natureza, mas também pelo seu valor, as dívidas caibam entre os encargos normais da vida familiar, tendo em conta o padrão de vida do casal (4). Este é o preciso alcance da expressão – “encargos normais” - intencionalmente usada na lei. Não se confundem os encargos da vida familiar com as dívidas contraídas em proveito comum do casal, por que há encargos normais da vida familiar que apenas se referem a um dos cônjuges (a blusa ou a saia comprada para a mulher; a gravata ou o aparelho de barbear adquirido para o marido) ou parentes deles; e outros há que respeitam somente aos filhos ou a alguns deles.
III) Dívidas contraídas em proveito comum do casal pelo cônjuge administrador, dentro dos seus poderes
Abrangem-se neste núcleo apenas as dívidas nascidas na vigência do matrimónio; e é necessário, além disso, que tenham sido contraídas pelo cônjuge administrador.
Para que as dívidas assumidas pelo cônjuge administrador, na constância do casamento, responsabilizem também o outro cônjuge, dois requisitos substanciais se tornam indispensáveis:
a) que a dívida tenha sido contraída em proveito comum do casal;
b) que ela caiba nos poderes de administração do cônjúge que a contraíu.
Para saber se a dívida foi ou não contraída em proveito comum do casal, o que conta é a intenção com que a dívida foi assumida (a aplicação dela) e não o seu resultado prático efectivo (5).
É também líquido que o proveito comum tanto pode ser económico, como moral (despesa para o casal participar numa peregrinação) ou espiritual (despesa para ambos assistirem a um festival de arte).
O segundo requisito, uma vez extinta a distribuição de funções que a própria lei programava dentro do lar, pode suscitar os maiores embaraços na sua aplicação prática, por não se saber ao certo qual a área de administração que os cônjuges reservaram um ao outro.
IV) Dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges, no exercício do comércio
O artigo 1691º inclui na categoria das dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges as contraídas por qualquer deles no exercício do comércio, desde que entre os cônjuges não vigore o regime da separação absoluta.
Na sua primitiva versão, a disposição não admitia qualquer prova em contrário da presunção que estava na sua base: a de que a dívida, assumida no desenvolvimento da actividade comercial do cônjuge, fora contraída no proveito comum do casal. Assim se alterou, deliberadamente, o preceito do artigo 15º do Código comercial, segundo o qual (na sua anterior redacção) “as dívidas provenientes de actos comerciais contraídas só pelo marido comerciante, sem outorga da mulher, presumirse-ão aplicadas em proveito comum dos cônjuges”.
A alteração introduzida pelo Código de 1966 reflectia-se em três pontos essenciais: a) o regime estabelecido passou a ser aplicável a qualquer dos cônjuges, e não apenas ao marido comerciante, como na antiga redacção do artigo 15º do Código comercial; b) esse regime passou a vigorar só quando a dívida do cônjuge comerciante fosse contraída no exercício do comércio, não bastando para o efeito que procedesse dum acto comercial; c) a dívida contraída nas circunstâncias expostas não se presumia apenas aplicada em proveito comum do casal, passava a responsabilizar sistematicamente ambos os cônjuges (6).
A Reforma de 1977, modificando a redacção desta alínea d) do nº 1 do artigo 1691º, veio permitir a prova, contra os credores, de que a dívida, apesar de contraída no exercício do comércio, não o foi em proveito comum do casal.
A alteração acautela melhor os interesses do cônjuge que não contraiu a dívida. Mas prejudica o crédito do outro, em prejuízo final de ambos, e envolve os tribunais em delicadas averiguações sobre matéria de facto, quanto ao tratamento das dívidas contraídas nestas condições.
Entretanto, foi também alterada pelo Dec.- Lei nº 363/77, de 2-9, a redacção do artigo 15º do Código comercial, que passou a ser a seguinte: “As dívidas comerciais do cônjuge comerciante presumem-se contraídas no exercício do seu comércio” (7). Para harmonizar os dois textos (o da lei comercial e o do Código civil), estabeleceu-se deste modo uma dupla e articulada presunção: as dívidas comerciais de qualquer do cônjuges, desde que comerciante, presumem-se realizadas no exercício da sua actividade comercial; e, desde que presuntivamente realizadas no exercício do comércio do devedor, presumem-se contraídas em proveito comum do casal.
V) Dívidas que onerem doações, heranças ou legados, tendo os respectivos bens ingressado no património comum (art. 1693º, 2)
Trata-se das dívidas a que se refere a alínea e) do nº 1 do artigo 1691º, mediante a remissão para o disposto no nº 2 do artigo 1693º.
Se os bens doados ou deixados engrossam o património comum, cuja titularidade pertence a marido e mulher, compreende-se perfeitamente, por uma razão de equidade, que ambos eles respondam pelas dívidas que onerem a liberalidade. Nessas dívidas cabem não só as obrigações em sentido estrito, como os encargos da liberalidade (que, na sua estrutura, são autênticos deveres jurídicos de prestar) e ainda as obrigações reais e os ónus reais, porquanto a todos abrange o espírito da lei (8).
Pelo mesmo critério de equidade se estende ao cônjuge, que não seja beneficiário directo, mas apenas indirecto, da doação ou da deixa, a faculdade de exigir o cumprimento da responsabilidade intra vires, consagrada nos artigos 963º, 2, 2071º, 1 e 2 e 2276º, 1.
VI) Dívidas contraídas antes do casamento, por um dos cônjuges, em proveito comum do casal, no regime de comunhão geral de bens
As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges antes da realização do casamento, ainda que em proveito comum do casal, só responsabilizam ambos eles, se o regime matrimonial de bens for o da comunhão geral (art. 1691º, 2).
E compreende-se o critério da lei.
Na comunhão geral, são considerados comuns os bens que cada um deles leva para o casamento; justo é, por conseguinte, que as dívidas contraídas por qualquer deles, em proveito comum do casal, não deixem de os responsabilizar a ambos, pelo facto de terem sido constituídos antes do matrimónio. Se se comunicam os bens (activo) que cada um deles leva para o casamento, justo é que de igual modo se comuniquem as dívidas (passivo) anteriores, desde que contraídas em proveito comum.
No regime da comunhão de adquiridos, tal como da separação, sendo considerados como próprios os bens que cada um dos cônjuges leva para o casamento, razoável é que, em contrapartida, as dívidas contraídas por um só deles, antes do casamento, ainda que revertendo em proveito comum, responsabilizem apenas o cônjuge que as assumiu.
VII) Dívidas que onerem bens comuns (art, 1694º. 1) ou tenham por causa a percepção de rendimentos comuns (art. 1694º, 2)
Estabelecem-se no artigo 1694º duas regras, não difíceis de justificar: as dívidas que onerem bens comuns (rendas devidas a terceiro por virtude de um imóvel comum, por exemplo: cfr. art. 1238º), responsabilizam ambos os cônjuges; as dívidas que oneram bens próprios são da exclusiva responsabilidade do cônjuge titular desses bens.
Quanto às primeiras, o seu regime é o mesmo, quer as dívidas sejam posteriores à celebração do casamento, quer sejam anteriores, a fim de evitar que os credores das dívidas anteriores sejam prejudicados nas suas expectativas, pois contariam naturalmente com a responsabilidade dos bens por inteiro, para realização do seu crédito, e não apenas com a agressão ao direito a uma quota ideal desses bens.
A segunda regra (as dívidas que onerem bens próprios de um dos cônjuges são da sua exclusiva responsabilidade) comporta, porém, uma ressalva.
Como o facto de os bens serem próprios não impede, nos regimes de comunhão, que sejam comuns os respectivois rendimentos, sempre que a dívida, onerando embora bens próprios, tenha por causa a percepção dos respectivos rendimentos e estes sejam comuns, ela responsabilizará ambos os cônjuges. Trata-se da generalização da doutrina já fixada no nº 2 do artigo 1115º do Código de 1867.
Essa doutrina continua ainda hoje a ter plena aplicação no que respeita, por exemplo, à contribuição predial e à contribuição industrial referentes a bens próprios de um dos cônjuges casados em regime de comunhão de adquiridos ou de comunhão geral.».
Como do Douto ensinamento resulta cada alínea do assinalado preceito versa sobre uma realidade distinta, pelo que, as alíneas do nº 1 do artº 1558º não se confundem entre si, reportando-se a realidades distintas, do que resulta termos:
- Dívidas contraídas por ambos ou por um dos cônjuges com o consentimento do outro;
- Dívidas para ocorrer aos encargos normais da vida familiar;
- Dívidas contraídas pelo cônjuge administrador em proveito comum do casal, dentro dos seus poderes;
- Dívidas contraídas pelos cônjuges no exercício do comércio se não vigorar o regime de separação;
- Dívidas comunicáveis nos termos da disposição legal indicada.
Ainda sobre esta matéria, veja-se também Pereira Coelho em Curso de Direito de Família, 1981, pág. 414 e seguintes:
«107. Dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges;
São da responsabilidade de ambos os cônjuges as dívidas mencionadas nas várias alíneas do nº 9 e no n.º 2 do art. 1691º:
a) Dívidas contraídas pelos dois cônjuges, ou por um deles com o consentimento do outro.
Cfr. o art. 1691, nº 1. al. a). Visam-se aqui quer as dívidas anteriores quer as posteriores ao casamento, e qualquer que seja o regime de bens.
Note-se que a lei só fala das dívidas contraídas por um dos cônjuges com o consentimento do outro, e não das que sejam contraídas com o suprimento judicial desse consentimento. A razão parece ser a de que tal suprimento não se admite, por desnecessário, dando a lei a cada um dos cônjuges, como dá, legitimidade para contrair dívidas sem o consentimento do outro. Claro que se concebia que a lei admitisse o suprimento judicial do consentimento, mesmo não sendo este consentimento necessário, para o efeito de a respectiva dívida ser havida como de responsabilidade comum. Mas a lei não parece admitir aqui o suprimento judicial, Aliás, quando a dívida seja contraída por um dos cônjuges nos limites dos seus poderes de administração será normalmente de responsabilidade comum, nos casos em que o suprimento seria concedido se pudesse pedir-se, por ser contraída “em proveito comum do casal” nos termos do al. c) do n.º 1 do art. 1691º.
Quando a dívida seja contraída por um dos cônjuges e seja estranha ao âmbito da sua administração, é que será normalmente de responsabilidade exclusiva desse cônjuge, mesmo que contraída em proveito comum de casal, não podendo o cônjuge não administrador pedir o suprimento judicial do consentimento do outro para o efeito de o responsabilizar igualmente. Poderá, porem, invocar o princípio do art. 1679º (supra, nº 94), se se verificar o condicionalismo deste artigo.
b) Dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges para ocorrer aos encargos normais da vida familiar.
Cfr. o art. 1691º, nº 1, al. b). Também agora não interessa que as dívidas sejam contraídas antes ou depois do casamento, nem que o regime de bens seja um ou outro. É aqui que cabem as dívidas de alimentação, vestuário, médico e farmácia, etc. Normalmente trata-se de dívidas contraídas por um dos cônjuges no âmbito da parcela de administração dos bens afectos ao governo do lar que lhe caberá, e em proveito comum do casal; se for assim, já seriam de responsabilidade comum por força do art. 1691º, nº 1, al. c).
c) Dívidas contraídas na constância do matrimónio pelo cônjuge administrador e nos limites dos seus poderes de administração, em proveito comum do casal.
Cfr. o art. 1691º, nº 1, al. c) (9)
Na aplicação prática deste princípio deve ter-se presente que a administração cabe normalmente ao marido e à mulher. De modo que, para se saber se certa dívida contraída por um dos cônjuges pode considerar-se de responsabilidade comum à luz desta al. c), há que averiguar se essa dívida está conexionada com os bens de que esse cônjuge tem a administração e ainda se ela é contraída em proveito comum do casal.
Quanto à noção de proveito comum há várias ideias a salientar (10).
A primeira é que o proveito comum se afere, não pelo resultado mas pela aplicação da dívida, ou seja, pelo fim visado pelo devedor que a contraiu. Se este fim foi o interesse do casal, a dívida considera-se aplicada em proveito comum dos cônjuges, embora, na realidade, dessa aplicação tenham resultado prejuízos. Assim, a dívida que um dos cônjuges contrai para montar uma exploração agrícola será comunicável mesmo que a exploração não dê lucros ou até traga prejuízos, pois se trata de dívida aplicada no interesse comum do casal (11).
Interesse comum do casal que pode ser – e é esta a segunda ideia – não só um interesse material ou económico, senão também um interesse moral ou intelectual. Assim, será aplicada em proveito comum a dívida que um dos cônjuges contraia para fazerem os dois uma viagem, para irem a uma festa, etc. (12).
Resta acrescentar esta ideia: decerto que não basta, para que uma dívida se considere aplicada em proveito comum dos cônjuges, a intenção subjectiva do agente: exige-se uma intenção objectiva de proveito comum, ou seja, é necessário que a dívida se possa considerar aplicada em proveito comum aos olhos de uma pessoa média e, portanto, à luz das regras da experiência e das probabilidades normas. Assim, por exemplo, uma dívida que um dos cônjuges contraia para fazer em Coimbra uma plantação de bananeiras nunca poderá considerar-se aplicada em proveito comum, ainda que ele a tenha contraído nesse intuito (13).
d) Dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio.
Cfr. o art. 1691º, nº 1, al. d).
Ao contrário do Código de 1966, que considerava de responsabilidade comum as dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio mesmo que não houvesse proveito comum do casal, a Reforma de 1977 veio alterar esta alínea no sentido de se poder provar que não houve intenção de proveito comum da parte do cônjuge que contraiu a dívida, sendo esta, portanto, de responsabilidade exclusiva do cônjuge devedor. Não se quis levar tão longe a protecção dos credores comerciais, com sacrifício dos interesses do casal, como a levara o Código de 1966.
Também não haverá comunicabilidade se vigorar entre os cônjuges o regime da separação.
e) Dívidas que onerem doações, heranças ou legados, quando os respectivo bens tenham ingressado no património comum.
Cfr. os arts. 1691º, nº 1, al. e) e 1693º, nº 2.
O ingresso dos bens no património comum resultará naturalmente, de os cônjuges terem estipulado o regime da comunhão geral ou uma cláusula de comunicabilidade de certos bens adquiridos a título gratuito.
Note-se que a responsabilidade por estas dívidas é comum ainda que o outro cônjuge não tenha dado o seu consentimento à aceitação (14). Mas o cônjuge do aceitante poderá impugnar o pagamento das dívidas com o fundamento de que o valor dos bens não é suficiente para a satisfação dos encargos (art. 1693º, nº 2).
f) Dívidas contraídas antes do casamento por qualquer dos cônjuges em proveito comum do casal, vigorando o regime da comunhão geral de bens.
Cfr. o art. 1691º, nº 2 (15).
Sendo outro o regime de bens, a dívida será da exclusiva responsabilidade do cônjuge que a contraiu, não obstante ter sido aplicada em proveito comum do casal.
g) Dívidas que onerem bens comuns.
Cfr. o art. 1694º, nº 1.
Nem obsta à comunicabilidade a circunstância de as dívidas se terem vencido antes de os bens se tornarem comuns.
h) Dívidas que, nos regimes de comunhão, onerarem bens próprios, se tiveram como causa a percepção dos respectivos rendimentos.
Cfr. o art. 1694º, nº 2.
Há pois que ver sempre se as dívidas então relacionadas com os bens em si ou com a percepção dos rendimentos desses bens. Só neste 2º caso (dívidas de foros, de impostos sobre o rendimento, etc.) é que as dívidas serão de responsabilidade comum, por também serem comuns nos regimes de comunhão esses rendimentos (art. 1733º, nº 2).».
Logo, as dívidas não podem caber em duas alíneas ao mesmo tempo como ao longo do processo se vai invocando, ora se dizendo que foram contraídas para ocorrer aos encargos normais da vida familiar, ora no exercício do comércio.
Por outro lado, encargos normais da vida familiar, proveito comum, no exercício do comércio são conceitos de direito, que têm de ser integrados por factos.
Não basta dizer que se tem uma empresa e se é sócio de várias sociedades para se concluir que a dívida é comercial. É necessário invocar e descrever, quando, como, porquê e em que valor se contraiu a dívida para depois se poder concluir em que alínea da indicada norma ela pode ser subsumida, caso caiba nalguma delas.
Por exemplo, se um dos cônjuges contrai um empréstimo em nome da sua empresa para comprar um carro para uso pessoal, essa dívida em princípio não é comercial.
Se foram contraídas no exercício do comércio as dívidas decorrem da actividade comercial de um dos cônjuges o que não se confunde com a dívida contraída para pagar as obras de decoração do apartamento onde a família vive que será uma dívida eventualmente em proveito comum do casal, sendo que a primeira não se comunica no regime de separação de bens e a segunda é comunicável ainda que vigore o regime de separação de bens.
Assim sendo, não pode o Recorrente vir alegar ora uma coisa ora outra sem concretizar.
As dívidas contraídas no exercício do comércio presumem-se em proveito comum do casal, cabendo ao cônjuge que a invoca demonstrar que foi contraída no exercício do comércio e ao cônjuge contra quem são apresentadas demonstrar que não houve proveito comum do casal.
Nestes autos o que aconteceu foi que o cabeça-de-casal veio inicialmente relacionar estas dívidas como passivo do património em participação, sendo certo que dessa relação nada consta quanto ao período em que vigorou o regime de comunhão de adquiridos.
A interessada respondeu pedindo que o cabeça-de-casal esclarecesse quais as empresas cuja exploração levou a que se contraíssem estas dívidas e qual o destino destes três empréstimos.
O cabeça-de-casal apresentou um requerimento em que apenas diz que estas dívidas foram contraídas no exercício do comércio e apresenta nova relação de bens onde estas dívidas passam a figurar como passivo no período em que vigorou o regime de comunhão de adquiridos.
A interessada voltou a apresentar reclamação contra a relação de bens agora apresentada alegando em síntese que o cabeça-de-casal não justifica porque é que estas dívidas são da responsabilidade de ambos os cônjuges.
No seguimento desta reclamação pelo Tribunal foi proferido despacho para o cabeça-de-casal esclarecer a finalidade com que estes empréstimos foram contraídos e o destino que lhes foi dado e pedida informação ao banco credor.
O cabeça de casal respondeu a fls. 297 que não é capaz de indicar todos os destinos dos empréstimos, reiterando que se peça informação ao Banco credor.
O Banco credor respondeu nos termos que consta de fls. 299 e seguintes.
As dívidas em causa segundo resulta dos documentos juntos aos autos e da informação prestada pelo Banco credor foram contraídas pelo cabeça-de-casal no âmbito dos contratos que constam de fls. 299 a 352, sendo o primeiro contrato de 28.01.2016 para uma linha de crédito válida entre 28.01.2016 e 27.01.2017 – fls. 311 a 313 -, segue-se um contrato de 23.12.2016 para uma linha de crédito válida de 13.01.2017 a 12.01.2018 – fls. 314 a 316 -, um contrato de 18.12.2017 para uma linha de crédito de 28.12.2017 a 28.12.2018 – fls. 317 a 320 -, um contrato de 27.12.2018 para uma linha de crédito de 27.12.2018 a 27.12.2019 – fls. 321 a 324 -, um contrato de 19.12.2019 para uma linha de crédito de 12 meses – fls. 325 a 328 -, um contrato de 17.12.2020 para uma linha de crédito de 17.12.2020 a 16.12.2021 – fls. 329 a 332 -, um contrato de 13.12.2021 para uma linha de crédito de 14.12.2021 a 14.12.2022 – fls. 333 a 336 -, um contrato de 27.12.2018 para uma linha de crédito de 27.12.2018 a 27.12.2019 – fls. 337 a 340 -, um contrato de 19.12.2019 para uma linha de crédito de 19.12.2019 a 19.12.2020 – fls. 341 a 344 -, um contrato de 17.12.2020 para uma linha de crédito de 17.12.2020 a 16.12.2021 – fls. 345 a 348 - e um contrato de 13.12.2021 para uma linha de crédito de 14.12.2021 a 14.12.2022 – fls. 349 a 352 -.
Considerando que as relações patrimoniais entre os cônjuges, decorreram sob dois regimes de bens distintos.
Considerando que as linhas de crédito eram anuais e algum daqueles contratos englobaram contratos anteriores.
Considerando que de fls. 305 a 308 o Banco (X) vem informar o saldo de apenas 3 linhas de créditos que tudo indicam se referirem a estes contratos indicando os valores em dívida, ao que parece, em 17.11.2022, isto é cerca de 2 anos após terem cessado as relações patrimoniais entre os cônjuges.
Considerando que a alínea d) do nº 1 do artº 1558º do C.Civ. se refere aos cônjuges, nada dizendo quanto a dívidas anteriores ao casamento e expressamente afasta o regime de separação de bens, mas não o da comparticipação nos adquiridos.
Nada tendo vindo o cabeça-de-casal esclarecer e alegando que “já não consegue indicar plenamente todo o destino dos empréstimos” ficamos na impossibilidade de saber qual a natureza destas dívidas.
Os contratos juntos são linhas de crédito que se iniciaram antes do casamento e continuam para além dele e da cessação das relações patrimoniais entre os cônjuges.
A alegação do cabeça-de-casal quanto à natureza das dívidas processa-se de forma inconsistente sem a preocupação de invocar factos concretos e precisos de onde resulte quando e em que valor é que o empréstimo foi contraído e para que fim.
O cabeça de casal limita-se a relacionar o passivo indicado pelo Banco em 2022, mas não sabemos o saldo em dívida na data da celebração do casamento, nem o saldo na data em que cessam as relações entre os cônjuges, nem se durante a vigência das relações patrimoniais foram levantadas quantias daquelas linhas de crédito – isto é contraídas dívidas no sentido de facto -, e o cabeça-de-casal não se lembra para que é que usou o dinheiro.
O facto de nos contratos de empréstimo supra indicados se dizer que foram contraídos para a empresa do cabeça-de-casal, não quer dizer que assim seja quando o cabeça-de-casal nada alega a respeito e já nem se lembra para o que é que os usou.
Se são dívidas comerciais não tem nada a ver com os encargos da vida familiar, e se são em proveito comum do casal, não se confunde com as dívidas contraídas no exercício do comércio nem com os encargos da vida familiar.
O elenco do nº 1 do artº 1558º do C.Civ. não é cumulativo, respeitando a realidades distintas conforme referido em cada alínea e já se deixou explicado.
Exercício do comércio, proveito comum do casal, encargos normais da vida familiar são conceitos de direito que têm de ser preenchidos com os factos invocados pelas partes.
Cabia ao cabeça-de-casal ao relacionar a dívida dizer quando foi contraída, valor, destino do dinheiro.
Convidado para o fazer, disse que já não era capaz.
O Banco juntou cópias dos contratos de onde nada do que se impunha saber resulta. Não consta sequer qual o valor das dívidas indicadas que foi efectivamente contraído durante a vigência das relações patrimoniais entre os cônjuges, sendo certo que o único documento junto com o valor em dívida é de uma data muito posterior à cessação daquelas e os contratos datam de antes, durante e após a vigência das relações patrimoniais entre os cônjuges.
A falta de informação é tal que nem tão pouco se pode inferir que os empréstimos em causa tenham sido usados para adquirir o património em comunhão.
Na decisão recorrida acaba por se concluir que não se sabe a que fim se destinaram as indicadas dívidas.
Cabendo ao cabeça-de-casal o ónus de indicar quando é que as dívidas foram contraídas, qual o valor e a que se destinaram, havendo sido convidado para esclarecer e não o tendo feito, nem tais factos resultarem dos elementos juntos aos autos, a decisão não poderia ser outra que não fosse a de não aceitar que as indicadas verbas do passivo fossem relacionadas como passivo comum, por falta dos indicados elementos.
Em sede de conclusões de recurso o cabeça-de-casal nada de novo trás alegando que as dívidas foram contraídas no exercício do comércio e em parte usadas para a decoração da casa de morada de família e que sendo o cabeça-de-casal o único que tinha rendimentos aquele passivo é da responsabilidade de ambos os cônjuges.
Ora, as coisas não se processam assim.
Não é porque o cabeça-de-casal é que providenciava pelo pagamento das despesas do casal que todas as dívidas que contraiu são comunicáveis.
Para se saber se a dívida é comunicável nos termos do artº 1558º do C.Civ. é preciso saber quando foi contraída – data -, qual o valor do débito – quanto -, para que serviu e onde é quê foi gasto esse dinheiro.
Nada disso se alega.
O que acontece no caso em apreço é que o cabeça de casal se limita a relacionar este passivo, sem alegar quando, em que valor e qual o destino destas dívidas, apesar de ter sido notificado para o efeito, pelo que, havendo sido impugnado o passivo relacionado e não tendo sido feita prova da sua origem, valor e destino, não pode o passivo relacionado sob as verbas 2 a 4 ser reconhecido, havendo que ser excluído da relação de bens.
Termos em que, embora por fundamentos ligeiramente diversos da decisão recorrida, se mantém o decidido, impondo-se decidir em conformidade.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, negando-se provimento ao recurso não se aceita as verbas nºs 2, 3 e 4 do passivo da relação de bens como dívidas da responsabilidade de ambos os cônjuges.
Custas a cargo do Recorrente.
Registe e Notifique.
RAEM, 01 de Fevereiro de 2024
Rui Pereira Ribeiro
(Juiz Relator)
Fong Man Chong
(1º Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng
(2º Juiz-Adjunto)
(1) A forma do consentimento, quando o cônjuge não intervenha directamente no acto que serve de fonte à obrigação, será a requerida para a realização desse acto.
(2) O cônjuge que pretenda retirar ao outro este poder legal de contrair dívidas que oneram não só o declarante, mas também o seu consorte, por não confiar nos seus critérios de administração, só o poderá conseguir mediante a separação judicial de bens (arts. 1767º e segs.), desde que no caso ocorram os respectivos pressupostos.
O direito português, ao invés do Código alemão (§ 1357, Il), não prevê a revogação ou limitação desse poder legal (cfr. inclusivamente o disposto no art. 1699º, 1, al. c)), por acto unilateral do cônjuge não confiante.
(3) A nova redacção dada ao § 1357 do Código alemão também reconhece a qualquer dos cônjuges o poder de realizar os negócios destinados à cobertura adequada das necessidades vitais da famllia, responsabilizando o outro cônjuge através dos negócios que realize com esse fim: BEITZKE, ob. cit., § 12. V, pág. V, pág. 67, que salienta, com razão. não haver neste caso um direito de representação, mas uma espécie de posição funcional no interesse da família. GERNHUBER (ob. cit., § 19; IV, pág. 196 e segs.) faz uma crítica bastante viva desse preceito, até certo ponto herdado, com modificações, do velho poder das chaves (Schlusselgewalt) atribuído à mulher na primitiva versão do Código alemão.
(4) Vejam-se os exemplos elucidativos fornecidos por BEITZKE, ob. cit., § 12, V, 3, pág. 68. No texto da disposição paralela (art. 220) do Código francês, referente às obrigações contraídas para o sustento do lar ou a educação dos filhos, declara-se expressamente que a solidariedade entre os cônjuges não aproveita às despesas manifestamente excessivas, tendo em conta o padrão de vida do casal, a utilidade ou inutilidade da operação, a boa ou má fé do outro contraente, Exclui-se de igual modo a solidariedade em certas compras a prestações - achats à tempérament -, não efectuadas com o consentimento de ambos os cônjuges
(5) Sobre a questão de saber se o aproveitamento comum deve resultar imediatamente do acto ou pode constituir um simples efeito indirecto ou mediato da contracção da dívida - questão com bastante interesse prático no domínio dos títulos de crédito (abstractos) -, vide PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, ob. e vol. cits., pág. 294 e segs.
(6) Não queria isso significar que o Código de 1966, através da disposição contida no artigo 1691º, d) (texto primitivo), tivesse revogado o artigo 15º do Código comercial, como chegou a ser sustentado por CASTRO MENDES (Breve nota sobre o valor actual do art. 10º do Cód. Com., na Rev. Trib., 90º, pág. 293). O artigo 15º deste diploma manteve ainda o seu interesse, quer relativamente às dividas contraídas pelo marido comerciante, casado em regime de separação, quer em relação às dívidas por ele contraídas através de actos comericiais, mas sem conexão com o exercício do comércio: PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, ob cit., IV, pág. 300.
(7) No sentido de que o artigo 15º do Código comercial abrange não só as dívidas substancialmente comerciais, mas também as formalmente comerciais, vide ac. do Sup. Trib. Just., de 5-11-80 (Bol. Min. Just., 301, pág. 437 e segs.),
(8) Acerca destas noções elementares, ANTUNES VARELA. Ensaio sobre o conceito do modo, passim: Id., Direito das obrigações, 3.ª ed., I, pág. 179 e segs.
(9) Pode ver-se sobre esta matéria A. LOPES CARDOSO, A administração dos bens do casal (1972).
(10) Determinar se uma dívida foi aplicada em proveito comum implica, ao mesmo tempo, uma questão-de-facto (averiguar o destino dado ao dinheiro) e uma questão-de-direito (decidir sobre se, em face desse destino, a dívida foi ou não contraída em proveito do casal). Por isso, em vez de se quesitar se a dívida foi ou não contraída em proveito comum do casal, deve antes perguntar-se a aplicação que teve a quantia proveniente da dívida. Cfr. os Acs. Do S.T.J. de 17 de Maio de 1946 (RLJ, 79º, p. 205, com anotação de ALBERTO DOS REIS) e de 25 de Outubro de 1957 (BMJ nº 70, p. 427).
(11) O proveito comum não se presume, excepto nos casos em que a lei o declarar (art. 1691º, nº 3).
(12) Neste sentido, PIRES DE LIMA, cit., II, p. 125, e CUNHA GONÇALVES, Tratado, VI, p. 393.
(13) Sobre o problema de saber se do aval ou fiança prestado por um dos cônjuges, casado no regime de comunhão geral, resulta proveito para o casal, v. PIRES DE LIMA, na RLJ, 102º, pp. 16 ss. e A. LOPES CARDOSO, na Rev. Dos Trib., ano 86º, pp. 99 ss.
(14) Consentimento que aliás não é necessário (art. 1683º, nº 1).
(15) CUNHA GONÇALVES, Tratado, IV. pp. 503 e 504, exemplifica com “a dívida dos doces, vinhos e outras iguarias, servidas no lunch ou jantar nupcial aos convidados para a boda”.
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