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Processo nº 98/2023(I)
(Autos de recurso penal)
(Incidente)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Aos 11.12.2023, proferiu o relator dos presentes Autos de Recurso Penal a seguinte “decisão sumária”:

“Relatório

1. A (甲), (1°) arguido com os restantes sinais dos autos, vem recorrer do Acórdão do Tribunal de Segunda Instância datado de 27.09.2023, (Proc. n.° 523/2023), que confirmou o Acórdão do Tribunal Judicial de Base que o condenou como co-autor material da prática de 1 crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 e 21°, n.° 1, al. 1), ponto (7) da Lei n.° 17/2009, (na redacção resultante da Lei n.° 10/2016), na pena principal de 8 anos de prisão, assim como na pena acessória de proibição de entrada na R.A.E.M. por 8 anos, imputando ao Acórdão recorrido vícios vários no que toca à “decisão da matéria de facto”, “violação do princípio in dubio pro reo” e “excesso de pena”; (cfr., fls. 603 a 613 e 624 a 639 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Adequadamente processados os autos, e nada obstando, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Com relevo para a decisão a proferir estão “provados” os factos como tal elencados nos Acórdãos do Tribunal Judicial de Base e Tribunal de Segunda Instância e que são os seguintes:

“ 1.
No último terço de Junho de 2022, a Polícia foi informada de que alguém transportou, por via postal, drogas do estrangeiro para o Interior da China, depois para Macau, e praticou actividades de tráfico de droga, pelo que procedeu à investigação.
2.
Após investigação, a Polícia formou um juízo indiciário, segundo o qual os autores incluíram o 1º arguido A e o 2º arguido B, e as três encomendas envolvidas seriam enviadas para a estação postal de Fai Chi Kei.
3.
Depois, a Polícia mandou agentes policiais patrulhar e vigiar nas proximidades da estação postal de Fai Chi Kei, em espera dos autores que viriam a levantar as encomendas.
4.
No dia 16 de Agosto de 2022, pelas 13h00, o 1º arguido e o 2º arguido chegaram à porta da estação postal de Fai Chi Kei. A seguir, o 1º arguido entrou na estação e levantou as três encomendas, respectivamente com n.ºs RP585604706MX, RP585604621MX e RP585604697MX, enquanto o 2º arguido aguardou fora da estação postal.
5.
Fora da aludida estação, o 1º arguido entregou as três encomendas acima referidas ao 2º arguido, e caminhou com este para a Rua do Conselheiro Borja. Depois, os dois arguidos descobriram que estavam vigiados pelos agentes policiais, pelo que interceptaram um táxi pretendendo sair do local.
6.
Os agentes policiais interceptaram de imediato os dois arguidos, e levaram-nos, junto com as três encomendas acima referidas, à PJ para efeitos de investigação.
7.
Na PJ, os agentes policiais abriram as supracitadas encomendas perante os dois arguidos, nas quais encontraram os seguintes objectos:
Na encomenda n.º RP585604706MX:
1) Duas calças;
2) Um tubo com tampa e com letras imprimidas “XXXXX”, contendo:
- 330 cápsulas de cor amarela e vermelha, embaladas respectivamente em 11 sacos plásticos transparentes;
- 90 cápsulas de cor de rosa, embaladas respectivamente em 3 sacos plásticos transparentes;
- 90 cápsulas coloridas embaladas num saco plástico transparente;
3) Um tubo com tampa e com letras imprimidas “XXXXXXX”, contendo:
- 56 comprimidos de cor de rosa embalados separadamente em saquinhos de cor prateada;
- 119 cápsulas de cor amarela e vermelha, embaladas respectivamente em 4 sacos plásticos transparentes;
- 87 cápsulas de cor de rosa, embaladas respectivamente em 3 sacos plásticos transparentes;
- 144 cápsulas de cor roxa embaladas respectivamente em 5 sacos plásticos transparentes;
4) Um tubo com tampa e com letras imprimidas “XXXXXXX”, contendo:
- 265 cápsulas de cor amarela e vermelha, embaladas respectivamente em 9 sacos plásticos transparentes;
- 240 cápsulas de cor de rosa, embaladas respectivamente em 8 sacos plásticos transparentes;
- 100 comprimidos de cor de rosa embalados separadamente em saquinhos de cor prateada;
5) Um tubo com tampa e com letras imprimidas “XXXXX”, contendo:
- 350 cápsulas coloridas embaladas respectivamente em 3 sacos plásticos transparentes;
- 30 cápsulas de cor amarela e vermelha embaladas num saco plástico transparente;
- 30 cápsulas de cor de rosa, embaladas num saco plástico transparente;
Na encomenda n.º RP585604621MX:
6) 60 máscaras embaladas respectivamente em 3 caixas de papel;
7) 900 comprimidos de cor de rosa embalados separadamente em saquinhos de cor prateada e colocados em 30 caixinhas de remédio com letras imprimidas “XXXX” (as caixinhas foram guardadas respectivamente em 2 caixas de papel e cobertas por 5 máscaras);
Na encomenda n.º RP585604697MX:
8) 40 máscaras embaladas respectivamente em 2 caixas de papel;
9) 440 cápsulas de cor roxa embaladas em 44 blísteres (as cápsulas foram colocadas respectivamente em 15 caixinhas de remédio com letras imprimidas “XXXX” e “XXXXXX”, que foram guardadas respectivamente em 2 caixas de papel e cobertas por 10 máscaras);
10) 460 comprimidos de cor de rosa embalados separadamente em saquinhos de cor prateada e colocados num saco transparente com letras imprimidas “XXXX” (o saco transparente foi guardado numa caixa de papel e coberto por 10 máscaras);
8.
Os agentes policiais apreenderam um telemóvel do 1º arguido.
9.
Os agentes policiais apreenderam um telemóvel do 2º arguido, bem como HKD$2.000,00 e MOP$1.200,00 em numerário.
10.
Após o exame laboratorial, verificou-se que o pó branco contido nas 330 cápsulas de cor amarela e vermelha, referidas na al. 2) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 82,495g, continha “Fentermina”, substância abrangida pela tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009, e após análise quantitativa, a percentagem de “Fentermina” foi verificada em 12,2%, com o peso de 10,1g; os grãos coloridos contidos nas 90 cápsulas coloridas, referidas na al. 2) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 58,689g, continham “Catina” e “Diazepam”, substâncias abrangidas respectivamente pelas tabelas II-B e IV anexas à Lei n.º 17/2009; os 56 comprimidos de cor de rosa, referidos na al. 3) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 6,728g, continham “Mazindol”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009; o pó branco contido nas 119 cápsulas de cor amarela e vermelha, referidas na al. 3) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 29,563g, continha “Fentermina”, substância abrangida pela tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009, e após análise quantitativa, a percentagem de “Fentermina” foi verificada em 15,7%, com o peso de 4,64g; o pó amarelo contido nas 144 cápsulas de cor roxa, referidas na al. 3) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 60,323g, continha “Dietilpropiona”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009 (cuja composição química satisfaz a definição do derivado de “Catinona”, substância abrangida pela tabela II-A anexa à Lei n.º 17/2009); o pó branco contido nas 265 cápsulas de cor amarela e vermelha, referidas na al. 4) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 66,310g, continha “Fentermina”, substância abrangida pela tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009, e após análise quantitativa, a percentagem de “Fentermina” foi verificada em 12,4%, com o peso de 8,22g; os 100 comprimidos de cor de rosa, referidos na al. 4) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 12,010g, continham “Mazindol”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009; os grãos coloridos contidos nas 350 cápsulas coloridas, referidas na al. 5) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 227,136g, continham “Catina” e “Diazepam”, substâncias abrangidas respectivamente pelas tabelas II-B e IV anexas à Lei n.º 17/2009; o pó branco contido nas 30 cápsulas de cor amarela e vermelha, referidas na al. 5) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 7,514g, continha “Fentermina”, substância abrangida pela tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009, e após análise quantitativa, a percentagem de “Fentermina” foi verificada em 16,8%, com o peso de 1,26g; os 900 comprimidos de cor de rosa, referidos na al. 7) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 107,765g, continham “Mazindol”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009; o pó amarelo contido nas 440 cápsulas de cor roxa, referidas na al. 9) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 183,666g, continha “Dietilpropiona”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009 (cuja composição química satisfaz a definição do derivado de “Catinona”, substância abrangida pela tabela II-A anexa à Lei n.º 17/2009); e os 460 comprimidos de cor de rosa, referidos na al. 10) do supracitado art.º 7º, com peso líquido de 55,332g, continham “Mazindol”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009.
11.
Após investigação, descobriu-se que as aludidas drogas foram enviadas, por via postal, do estrangeiro para Macau por indivíduo de identidade desconhecida sob instruções do suspeito C. E o suspeito C também deu instruções ao 1º arguido para levantar as encomendas contendo drogas na estação postal de Macau, transportar as drogas para o Interior da China, e enviá-las para o endereço indicado pelo suspeito C, para praticar actividades de tráfico de droga. Para o efeito, o suspeito C pagou ao 1º arguido uma quantia não apurada como remuneração.
12.
Depois de ter recebido as supracitadas instruções dadas pelo suspeito C, o 1º arguido levantou as encomendas contendo drogas na estação postal de Macau, transportou as drogas para o Interior da China, e enviou-as para o endereço indicado pelo suspeito C, para praticar actividades de tráfico de droga. Para o efeito, o 1º arguido exigiu que o 2º arguido o acompanhasse para levantar as encomendas na estação postal, e prometeu pagar-lhe uma quantia não apurada como remuneração.
13.
Antes de os dois arguidos levantarem as respectivas encomendas na estação postal, o suspeito C já disse ao 1º arguido que foram escondidas drogas nas encomendas.
14.
Por outro lado, após investigação, descobriu-se que no dia 12 de Agosto de 2022, o 1º arguido, sob instruções dadas pelo suspeito C, levantou uma encomenda na estação postal da Areia Preta, transportou-a para o Interior da China e enviou-a para o endereço indicado pelo suspeito C, para o efeito, o 1º arguido exigiu que o 2º arguido o acompanhasse para levantar a encomenda e transportá-la para o Interior da China.
15.
O supracitado telemóvel encontrado na posse do 1º arguido era o instrumento de comunicação utilizado pelo 1º arguido nas actividades de tráfico de droga.
16.
O 1º arguido conhecia bem a natureza e as características das drogas acima referidas.
17.
O 1º arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente ao praticar dolosamente as supracitadas condutas.
18.
De comum acordo e em colaboração com outrem, o 1º arguido, sabendo bem que eram proibidos os seus actos, ainda transportou, por via postal, para Macau drogas controladas por lei, responsabilizou-se por receber em Macau as encomendas contendo drogas, e depois transportou-as para o Interior da China, para praticar actividades de tráfico de droga.
19.
O 1º arguido sabia bem que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei.
Mais se provou:
Antes de ser preso, o 1º arguido fez do contrabando de mercadorias modo de vida, auferindo mensalmente cerca de RMB¥8.000,00.
- O arguido é divorciado, tendo a seu cargo uma filha menor do seu amigo.
- O arguido tem como habilitações literárias o ensino secundário complementar.
- O arguido negou a prática dos factos acusados.
- De acordo o CRC, o arguido é delinquente primário.
(…)”; (cfr., fls. 496-v a 500, 606-v a 609 e 18 a 26 do Apenso).

Do direito

3. Como se deixou relatado, insurge-se o (1°) arguido A contra o decidido pelo Tribunal de Segunda Instância que, negando provimento ao anterior recurso que tinha interposto do Acórdão do Tribunal Judicial de Base, confirmou a sua condenação como co-autor material da prática de 1 crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 e 21°, n.° 1, al. 1), ponto (7) da Lei n.° 17/2009, (na redacção resultante da Lei n.° 10/2016), na pena principal de 8 anos de prisão, assim como na pena acessória de proibição de entrada na R.A.E.M. por 8 anos.

Afirma que o Acórdão recorrido padece de vícios vários no que toca à “decisão da matéria de facto”, “violação do princípio in dubio pro reo” e “excesso de pena”.

Porém, e como se nos apresenta evidente, nenhuma razão lhe assiste, sendo de se rejeitar o presente recurso dada a sua “manifesta improcedência”.

Vejamos.

Apreciando o anterior recurso do ora recorrente, assim considerou e ponderou o Tribunal de Segunda Instância:

“O recorrente A alegou o seguinte na sua motivação do recurso:
` - Nos autos não há prova de que C revelou ao recorrente a composição das mercadorias encontradas nas encomendas, e também não há prova de que o recorrente tinha conhecimento efectivo da composição das mercadorias encontradas nas encomendas, pelo que o acórdão recorrido incorreu em erro notório na apreciação da prova ao reconhecer que o recorrente A sabia que as encomendas continham drogas ou substâncias proibidas/controladas por lei, violando o art.º 400.º, n.º 2, al. c) do CPP.
- In casu, apenas foi submetida à análise quantitativa a substância “Fentermina”, com peso de 24,22g, e quanto ao resultado do exame laboratorial das restantes substâncias, devido à carência de padrões, não foi feita a análise quantitativa, e a percentagem das substâncias controladas verificadas nas amostras era inferior ao limite quantitativo, pelo que o acórdão recorrido incorreu em erro notório ao reconhecer a quantidade das drogas, violando os art.ºs 400.º, n.º 2, al. c) e 149.º do CPP. O recorrente também imputou ao acórdão recorrido a violação dos art.ºs 149.º e 400.º, n.º 1 e n.º 2, al. c) do CPP, do art.º 8.º da Lei n.º 17/2009, e dos art.ºs 40.º, 64.º e 65.º do CPM, com fundamento no excesso da medida da pena.

(I) Vício de erro notório na apreciação da prova
Como é sabido, o “erro notório na apreciação da prova” previsto pelo art.º 400.º, n.º 2, al. c) do CPP existe quando qualquer pessoa que consiga ler o conteúdo do acórdão a quo, irá considerar, após a leitura e conforme as regras da experiência da vida quotidiana, que o resultado do conhecimento dos factos controvertidos seja manifestamente irrazoável, ou quando se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável, ou quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada ou as regras de experiência comum, e tem de ser um erro ostensivo.1
No caso sub judice, o acórdão recorrido deixou claro que o Tribunal a quo, após análise objectiva e sintética das declarações dos dois arguidos e das testemunhas, respectivamente prestadas e lidas na audiência de julgamento, em conjugação com os objectos apreendidos, o auto de visionamento do disco compacto contentor da gravação visual com as imagens capturadas, o auto de exame de telemóvel com as imagens capturadas, o relatório pericial, as provas documentais e outras provas produzidas na audiência, formou a sua convicção de acordo com o senso comum e as regras da experiência (vide as fls. 502 dos autos).
Embora o recorrente A negasse repetidamente ter conhecimento efectivo da composição dos produtos de saúde encontrados nas 3 encomendas, concordamos com a convicção do formada pelo acórdão recorrido, isto é, o recorrente A sabia bem que as 3 encomendas, levantadas por ele na estação postal de Fai Chi Kei no dia 16 de Agosto de 2022, continham drogas ou substâncias proibidas/controladas por lei.
Em primeiro lugar, antes disso (ou seja no dia 12 de Agosto de 2022), sob instruções de C, o recorrente A já levantou uma encomenda na estação postal da Areia Preta, na qual se encontraram 40 caixas de comprimidos de natureza desconhecida e uns biscoitos mofados, e parte dos comprimidos foram colocados em embalagem de biscoito, para o efeito de disfarce. Ao mesmo tempo, o recorrente A disse, em Wechat, a C que “quem está tão louco que se atreve a tomar os medicamentos”. Ademais, o recorrente permitiu à testemunha D, que lhe prestou auxílio no transporte dos referido objectos para o Interior da China, retirar um pacote de biscoitos pertencente ao cliente. Daí que, o recorrente A sabia bem que precisava de transportar para o Interior da China as 40 caixas de comprimidos, e os biscoitos apenas serviam de disfarce.
Por indicação de C, o recorrente A, de forma tortuosa, oculta e dissimulada, transportou para o Interior da China 40 caixas de comprimidos de natureza desconhecida que tinham sido enviadas do estrangeiro para Macau, o destinatário no Interior da China não era o próprio suspeito C, ao enviar as referidas 40 caixas de comprimidos ao indivíduo indicado pelo suspeito C, o recorrente não usou o seu nome verdadeiro e declarou que se tratava de arroz. Daí que, pelo menos a partir de 12 de Agosto de 2022, o recorrente A já soube que os objectos que ele auxiliou C a transportar para o Interior da China continham drogas ou substâncias proibidas/controladas por lei.
Por outro lado, tal como referiu o Tribunal a quo: “segundo o processo de cooperação entre o 1º arguido e C, obviamente, C sabia que o 1º arguido iria abrir as encomendas depois de as ter levantado e retirar os objectos colocados nelas, e o 1º arguido sabia que as encomendas a levantar continham medicamentos. Se C quisesse simplesmente aproveitar do 1º arguido que desconhecia completamente a verdade, deveria C ou o suspeito que enviou as 3 encomendas envolvidas, ter embalado as respectivas drogas ou estupefacientes e substâncias psicotrópicas controladas como se fossem produtos de saúde ou medicamentos contra obesidade comuns, para que o 1º arguido, depois de ter aberto as encomendas, continuasse a meter-se na ignorância da verdade, cresse, equivocadamente, que se tratavam de produtos de saúde ou medicamentos contra obesidade comuns e legítimos, e, sob indicação dele, prestasse auxílio no transporte para o Interior da China e no envio a outrem. Senão, C ou o suspeito também ficaria preocupado com a possibilidade de o 1º arguido não transportar as drogas para o Interior da China depois de abrir as encomendas e descobrir a estranheza da embalagem dos medicamentos. Porém, C, ou o suspeito, não ficou preocupado, mas ao contrário, teve a audácia de usar os supracitados métodos de ocultação e dissimulação evidentemente anormais para enviar as encomendas ao 1º arguido.”
Obviamente, o que o recorrente pretende é usar sua opinião pessoal para desafiar a convicção do tribunal, e não se verifica qualquer erro no reconhecimento de facto feito pelo Tribunal a quo, pelo que não assiste razão ao recorrente.
Também improcede o seu fundamento de que o Tribunal a quo incorreu em erro notório no reconhecimento da quantidade das drogas, e devia ele ser condenado pela prática do crime previsto no art.º 11.º da Lei n.º 17/2009.
De facto, segundo o relatório pericial (vide as fls. 308 a 320 e 323 a 331 dos autos), os comprimidos detidos pelo recorrente A continham:
1) Catina, substância abrangida pela tabele II-B anexa ao art.º 4.º da Lei n.º 17/2009;
2) Fentermina, substância abrangida pela tabela II-B anexa ao art.º 4.º da Lei n.º 17/2009;
3) Dietilpropiona, substância abrangida pela tabela II-B anexa ao art.º 4.º da Lei n.º 17/2009, cuja composição química satisfaz a definição do derivado de “Catinona”, substância abrangida pela tabela II-A anexa ao art.º 4.º da Lei n.º 17/2009;
4) Diazepam, substância abrangida pela tabela IV anexa ao art.º 4.º da Lei n.º 17/2009;
5) Mazindol, substância abrangida pela tabela anexa ao art.º 4.º da Lei n.º 17/2009;
O referido relatório apontou que, após análise quantitativa, o peso total de “Fentermina” foi verificado em 24,22g, e devido à carência de padrões, não foi feita a análise quantitativa de “Catina”, “Dietilpropiona” e “Mazindol”, e no que diz respeito a “Diazepam”, também não foi feita a análise quantitativa porque “a percentagem das substâncias controladas verificadas nas amostras era inferior ao limite quantitativo” (vide as fls. 326 dos autos).
Relativamente à droga “Fentermina”, com peso de 24,22g, que foi submetida à análise quantitativa, e às substâncias “Catina”, “Dietilpropiona”, “Mazindol” e “Diazepam”, contidas nos comprimidos envolvidos, que não foram submetidas à análise quantitativa por motivo técnico, a lei não fixou a quantidade de referência de uso diário, mas, o Tribunal a quo, conforme as regras de experiência comum, reconheceu que a quantidade detida pelo recorrente excedeu obviamente o limite legal de uso de 5 dias, condenando o recorrente pelo crime previsto pelo art.º 8.º da Lei n.º 17/2009.
Quid juris?
Tanto a prática judicial como a jurisprudência têm entendido que, para a qualificação jurídica dos factos e a determinação da medida concreta da pena, é de primeira importância determinar a quantidade dos estupefacientes, dito por outra palavra, é decisivo para saber se os factos são integrados no crime previsto pelo art.º 8.º ou no crime previsto pelo art.º 11.º da Lei n.º 17/2009, sob pena de incorrer em vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto.2 Então, para obter a qualificação jurídica feita pelo Tribunal a quo (que, com base no facto de detenção das drogas, condenou o arguido pela prática do crime de tráfico de drogas), primeiro, é necessário determinar a quantidade destinada a consumo próprio durante 5 dias.
Por outro lado, a jurisprudência também tem entendido que, se o tribunal não reconheceu a análise quantitativa que pudesse servir de referência para a determinação da quantidade destinada a consumo, incorre no vício previsto na al. a) do n.º 2 do art.º 400.º do CPP, ou seja, insuficiência de factos para a aplicação da lei.
O chamado vício de insuficiência de factos só existe quando o tribunal não provou os factos necessários para a adequada aplicação da lei e a decisão de mérito; cabe ao tribunal investigar, na audiência de julgamento e dentro do objecto do processo penal, tal como está circunscrito pela acusação e defesa, os referidos factos.3
Porém, in casu, estamos perante uma excepção, isto é, quanto às drogas detidas pelo arguido, a lei não fixou expressamente a quantidade de referência de uso diário, e os órgãos policiais de Macau não estão em condições técnicas para realizar análise quantitativa de parte das respectivas drogas.
Neste caso, deve o tribunal, usando o poder judicial conferido pela lei, cumprir a obrigação de julgar (art.º 3.º do «Estatuto dos Magistrados»4), e segundo o princípio da busca da verdade material, apurar oficiosamente os tipos e quantidades das drogas detidas pelo arguido. Por um lado, é para a melhor punição do crime, e, por outro, para não castigar, de maneira solta ou injusta, o autor do crime relacionado com drogas por não ser apurada a quantidade.5
Não obstante a nova redacção do art.º 14.º6 da Lei n.º 17/2009 – Proibição da produção, do tráfico e do consumo ilícitos de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, introduzida pela Lei n.º 10/2016, não se pode esquecer que, a aplicação dos dispostos no art.º 14.º pressupõe que as drogas detidas pelo arguido se destinem uma parte para consumo pessoal, mas no caso concreto, as drogas detidas pelo 1º arguido destinaram-se, evidentemente, para venda a outrem, pelo que não está preenchido o pressuposto da aplicação do art.º 14.º.
Então, a questão-chave reside em saber o que deve o tribunal fazer antes de decidir se o arguido é condenável pelo crime de tráfico de drogas previsto pelo art.º 8.º, quando a lei não fixe expressamente a quantidade de referência de uso diário das respectivas drogas.
Como é óbvio, cabe ao tribunal cumprir efectivamente o dever de decidir, com base nos factos dados como provados, se aplica o art.º 8.º ou o art.º 11.º.
O tráfico de droga aqui é um conceito em sentido lato, abrangendo todos os actos referidos neste artigo. No presente caso, trata-se dum dos actos previstos – a detenção ilícita. No que concerne ao acto de detenção, a lei fez a seguinte distinção: a finalidade da detenção ilícita prevista no art.º 8.º não é a da detenção ilícita prevista no art.º 14.º.
Dispõe-se no art.º 11.º (Produção e tráfico de menor gravidade) da Lei n.º 17/2009 que:
“1. Se a ilicitude dos factos descritos nos artigos 7.º a 9.º se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta, nomeadamente, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, das substâncias ou dos preparados, a pena é de:
1) Prisão de 1 a 5 anos, se se tratar de plantas, de substâncias ou de preparados compreendidos nas tabelas I a III, V ou VI;
2) Prisão até 3 anos ou multa, se se tratar de plantas, de substâncias ou de preparados compreendidos na tabela IV.
2. Na ponderação da ilicitude consideravelmente diminuída, nos termos do número anterior, deve considerar-se especialmente o facto de a quantidade das plantas, das substâncias ou dos preparados encontrados na disponibilidade do agente não exceder cinco vezes a quantidade constante do mapa da quantidade de referência de uso diário anexo à presente lei, da qual faz parte integrante.”
Obviamente, o facto de “exceder cinco vezes a quantidade constante do mapa da quantidade de referência de uso diário”, previsto no referido artigo como elemento constitutivo do crime de tráfico de drogas, não só não passa dum critério da ponderação da ilicitude, mas também é um facto conclusivo, só podendo o tribunal decidir depois de ter feito o raciocínio com base nos factos objectivos e reconhecido o referido facto. E o reconhecimento depois dessa ilação extraída pelo tribunal constitui uma questão de aplicação da lei, não se verificando qualquer vício no plano dos factos. Pelo que não há margem para considerar o vício previsto na al. c) do n.º 2 do art.º 400.º do CPP, imputado pelo recorrente.
Segundo os factos dados como provados pelo Tribunal a quo, as drogas detidas pelo arguido incluem:
- O pó branco contido nas 330 cápsulas de cor amarela e vermelha, referidas na al. 2) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 82,495g, contendo “Fentermina”, substância abrangida pela tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009, e após análise quantitativa, a percentagem de “Fentermina” foi verificada em 12,2%, com o peso de 10,1g;
- Os grãos coloridos contidos nas 90 cápsulas coloridas, referidas na al. 2) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 58,689g, contendo “Catina” e “Diazepam”, substâncias abrangidas respectivamente pelas tabelas II-B e IV anexas à Lei n.º 17/2009;
- Os 56 comprimidos de cor de rosa, referidos na al. 3) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 6,728g, contendo “Mazindol”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009;
- O pó branco contido nas 119 cápsulas de cor amarela e vermelha, referidas na al. 3) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 29,563g, contendo “Fentermina”, substância abrangida pela tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009, e após análise quantitativa, a percentagem de “Fentermina” foi verificada em 15,7%, com o peso de 4,64g;
- O pó amarelo contido nas 144 cápsulas de cor roxa, referidas na al. 3) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 60,323g, contendo “Dietilpropiona”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009 (cuja composição química satisfaz a definição do derivado de “Catinona”, substância abrangida pela tabela II-A anexa à Lei n.º 17/2009);
- O pó branco contido nas 265 cápsulas de cor amarela e vermelha, referidas na al. 4) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 66,310g, contendo “Fentermina”, substância abrangida pela tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009, e após análise quantitativa, a percentagem de “Fentermina” foi verificada em 12,4%, com o peso de 8,22g;
- Os 100 comprimidos de cor de rosa, referidos na al. 4) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 12,010g, contendo “Mazindol”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009;
- Os grãos coloridos contidos nas 350 cápsulas coloridas, referidas na al. 5) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 227,136g, contendo “Catina” e “Diazepam”, substâncias abrangidas respectivamente pelas tabelas II-B e IV anexas à Lei n.º 17/2009;
- O pó branco contido nas 30 cápsulas de cor amarela e vermelha, referidas na al. 5) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 7,514g, contendo “Fentermina”, substância abrangida pela tabela II-B anexa à Lei n.º 17/2009, e após análise quantitativa, a percentagem de “Fentermina” foi verificada em 16,8%, com o peso de 1,26g;
- Os 900 comprimidos de cor de rosa, referidos na al. 7) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 107,765g, contendo “Mazindol”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009;
- O pó amarelo contido nas 440 cápsulas de cor roxa, referidas na al. 9) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 183,666g, contendo “Dietilpropiona”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009 (cuja composição química satisfaz a definição do derivado de “Catinona”, substância abrangida pela tabela II-A anexa à Lei n.º 17/2009);
- Os 460 comprimidos de cor de rosa, referidos na al. 10) do art.º 7º dos factos, com peso líquido de 55,332g, contendo “Mazindol”, substância abrangida pela tabela IV anexa à Lei n.º 17/2009.
A circunstância de serem apreendidos mais de 3,000 comprimidos e cápsulas contendo drogas constantes das tabelas anexas à Lei n.º 17/2009, por si só, já revela o elevado grau de ilicitude dos factos e a inaplicabilidade do art.º 11.º da Lei n.º 17/2009, sem necessidade de considerar se a quantidade das drogas excede ou não a quantidade de uso de 5 dias.
Não há erro notório na aplicação da lei feita pelo Tribunal a quo, que deve ser mantida. Improcede o recurso do recorrente nesta parte.

(II) Medida da pena
Nos termos do art.º 65.º do CPM, a determinação da medida da pena é feita “dentro dos limites definidos na lei” e “em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal” (tanto de prevenção geral como de prevenção especial), atendendo a todos os elementos pertinentes apurados nos autos, nomeadamente os elencados no n.º 2 do mesmo artigo.
E a lei confere ao tribunal a liberdade de escolher uma pena adequada dentro da moldura legal, só podendo o tribunal superior intervir quando haja situação de não correspondência entre a pena e o crime, ou quando seja a pena manifestamente desproporcional.
In casu, excepto a qualidade de delinquente primário, o recorrente não reveste de qualquer outra circunstância atenuante, e a quantidade das drogas escondidas nas encomendas recebidas pelo recorrente revela que são graves as circunstâncias do crime e o grau de ilicitude dos factos é elevado. Os males trazidos pelo tráfico de drogas são necessariamente proporcionais à quantidade das drogas, pelo que é bastante elevado o grau de dolo do recorrente. Por outro lado, em termos de prevenção criminal, o crime cometido pelo recorrente é um crime muito frequente em Macau, o qual todo o mundo está empenhado em combater, sendo muito graves a natureza, a ilicitude e a consequência deste crime, bem como as influências negativas trazidas para a saúde pessoal dos consumidores de droga, até para a saúde pública e paz social. Ademais, tendo em conta a tendência de aumento dos actos criminosos relacionados com drogas, e a gravidade dos problemas causados à sociedade, mostra-se muito elevada a exigência de prevenção geral.
Por isso, o tribunal recorrido, atendendo sinteticamente às exigências de prevenção criminal (tanto especial como geral) e ao grau de culpa do recorrente, e dentro da moldura penal de 5 a 15 anos de prisão do crime previsto pelo art.º 8.º da Lei n.º 17/2009, decidiu aplicar ao recorrente a pena de 8 anos de prisão efectiva, decisão essa que não violou manifestamente o princípio de proporcionalidade, e deve ser mantida.
Improcede o recurso do recorrente”; (cfr., fls. 609 a 613 e 27 a 40 do Apenso).

E, em face do que se deixou transcrito (do Acórdão do Tribunal de Segunda Instância) que dizer?

Ora, (e como já se deixou adiantado), cremos que a decisão ora recorrida apresenta-se-nos clara e adequada na sua “fundamentação”, não merecendo, igualmente, qualquer censura a “solução” a que se chegou.

Quanto ao (agora novamente) assacado “erro notório”, evidente se mostra que o mesmo não existe, pois que não se incorreu em violação de qualquer regra sobre o valor da prova tarifada, regra de experiência ou legis artis, limitando-se o ora recorrente a repetir o que antes já tinha alegado, e a sindicar a livre convicção pelo Tribunal formada em sede de audiência de julgamento, afrontando o estatuído no art. 114° do C.P.P.M., não se podendo também olvidar que adequadamente fundamentada está a “convicção” do Tribunal Judicial de Base relativamente à sua “decisão da matéria de facto”, (cfr., fls. 500-v a 503), nenhum motivo havendo, igualmente, para se considerar como verificado qualquer eventual “violação do princípio in dubio pro reo”, que, aliás, (e em bom rigor), nem sequer invocado foi no recurso para o Tribunal de Segunda Instância; (cfr., v.g., sobre os ditos vícios, e para citar os mais recentes, os Acs. deste T.U.I. de 11.03.2022, Procs. n°s 8/2022 e 12/2022, de 27.07.2022, Proc. n.° 71/2022, de 21.09.2022, Proc. n.° 78/2022, de 13.01.2023, Proc. n.° 108/2022, de 03.03.2023, Proc. n.° 97/2022, de 29.09.2023, Procs. n°s 71/2023 e 81/2023 e de 01.11.2023, Proc. n.° 82/2023, cujo teor aqui se dá como reproduzido).

Aqui chegados, (e, abreviando), mostra-se-nos pois de acompanhar – na sua essência – a fundamentação exposta no Acórdão do Tribunal Judicial de Base e Tribunal de Segunda Instância quanto à “qualificação jurídico-penal” efectuada, notando-se que inexiste qualquer “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” ou eventual “contradição insanável da fundamentação”, até mesmo porque não deixou o Tribunal de emitir pronúncia sobre toda a “matéria objecto do processo”, não padecendo a decisão recorrida de qualquer “incompatibilidade não ultrapassável”, “obscuridade” ou “ambiguidade”, sendo a matéria de facto provada perfeitamente bastante para uma rigorosa e justa aplicação do direito no que toca à dita “qualificação” e respectiva “medida da pena”.

Na verdade, importa ter presente e não perder de vista a “quantidade” e “variedade” de estupefaciente em causa, (cfr., “factos provados n.° 7 e 10”), o que, com todo o respeito por outro entendimento, (e como bem se nota no Acórdão recorrido), torna, em nossa opinião, totalmente, inviável qualquer possibilidade de se enquadrar (diferentemente) a conduta em questão do ora recorrente ao abrigo de qualquer outro preceito que não o que entendido foi pelo Tribunal Judicial de Base e Tribunal de Segunda Instância, pois que, tendo-se apenas em conta as quantidades apreendidas de “Fentermina”, que constitui um derivado de “anfetamina”, que, por sua vez, constitui, essencialmente, um estimulante do sistema nervoso central, também conhecido como “speed”, e que, no caso, em causa está mais do que “20 gramas”, evidente se nos apresenta que correcta é a “qualificação jurídico-penal” efectuada relativamente à conduta do ora recorrente.

E, nesta conformidade, pouco há a dizer relativamente à “pena de 8 anos de prisão decretada”.

Com efeito, tendo presente a moldura penal aplicável – 5 a 15 anos de prisão – inexistindo qualquer motivo para uma “atenuação especial da pena”, (cfr., v.g., os Acs. deste T.U.I. de 03.04.2020, Proc. n.° 23/2020-I, de 26.06.2020, Proc. n.° 44/2020-I e de 23.09.2020, Proc. n.° 155/2020, de 27.11.2020, Proc. n.° 193/2020, de 23.06.2021, Proc. n.° 84/2021, de 11.03.2022, Proc. n.° 8/2022, de 18.05.2022, Proc. n.° 52/2022, de 21.09.2022, Proc. n.° 78/2022 e de 29.09.2023, Proc. n.° 71/2023), e situando-se a pena concreta aplicada de 8 anos de prisão a 3 anos do seu limite mínimo, e a 7 do máximo, vista está a solução para a questão, pois que não se pode olvidar que o ora recorrente encontrava-se em Macau como mero “visitante”, revelando a sua conduta um dolo directo e muito intenso, (demonstrado, especialmente, pelo “modus operandi”), muito fortes sendo também as necessidades de prevenção do crime de “tráfico ilícito de estupefacientes” em virtude dos prejuízos que o mesmo causa em termos de saúde pública.

Dest’arte, verificado estando que nenhuma censura merece a decisão de “facto” e de “direito” ínsita no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância agora recorrido, (e verificando-se também que o ora recorrente se limita a repetir no presente recurso o que antes já tinha alegado), mais não se mostra necessário dizer para decidir como segue.

Decisão

4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o presente recurso.

Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 5 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$3.500,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
(…)”; (cfr., fls. 668 a 679 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Oportunamente, veio o recorrente reclamar do decidido, insistindo no entendimento que em sede do seu recurso tinha deixado exposto; (cfr., fls. 685 a 695).

*

Em sede de vista é o Exmo. Magistrado do Ministério Público de opinião que a reclamação apresentada carece de fundamento, devendo por isso improceder; (cfr., fls. 697 a 706-v).

*

Por despacho do ora relator, foram os presentes autos conclusos para visto dos Mmos Juízes-Adjuntos e, seguidamente, nada vindo de novo, inscritos em tabela para decisão em conferência.

*

Nada parecendo obstar, passa-se a decidir.

Fundamentação

2. Em conformidade com o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b), do C.P.P.M., após exame preliminar, o relator profere “decisão sumária” sempre que o recurso deva ser rejeitado, o que pode suceder quando for “manifesta” a sua improcedência; (cfr., art. 410°, n.° 1 do dito Código).

Assim, apresentando-se ser a situação dos presentes autos, e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, proferiu-se a decisão sumária que se deixou integralmente transcrita.

Invocando a faculdade que lhe é legalmente reconhecida pelo art. 407°, n°. 8 do C.P.P.M., vem o recorrente reclamar da aludida decisão sumária.

Porém, e sem prejuízo do muito respeito devido a outro entendimento, evidente é que não se pode reconhecer (qualquer) mérito à sua pretensão – que apenas pode ter como justificação uma deficiente compreensão do que decidido foi – muito não se mostrando necessário aqui consignar para o demonstrar, pois que o recorrente limita-se a repetir as questões que já foram apreciadas pelo Tribunal de Segunda Instância e pela decisão sumária agora reclamada que apresenta-se clara, lógica e adequada na sua fundamentação, nela se tendo efectuado uma correcta identificação e tratamento das “questões” pelo recorrente colocadas em sede do seu recurso, justa e acertada sendo, igualmente, a solução a que se chegou.

Na verdade, pelos motivos – de “facto” e de “direito” – que na referida decisão sumária (atrás transcrita) se deixaram expostos, patente se nos mostra que adequado foi o deliberado no Acórdão do Colectivo do Tribunal de Segunda Instância objecto do recurso pelo ora reclamante trazido a este Tribunal, o que, por sua vez, implica, a necessária (e natural) conclusão da sua total confirmação, com a “rejeição do recurso” dada a sua manifesta improcedência (em sede de decisão sumária), como, no caso, sucedeu.

Dest’arte, e mais não se mostrando de consignar, já que o ora reclamante também nada diz (ou acrescenta), inevitável é a improcedência da pretensão apresentada.

Decisão

3. Nos termos que se deixam expostos, em conferência, acordam julgar improcedente a apresentada reclamação.

Pagará o reclamante a taxa de justiça que se fixa em 5 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor Oficioso no montante de MOP$1.000,00.

Registe e notifique.

Oportunamente, e nada vindo de novo, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 26 de Janeiro de 2024


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei

1 Cfr. os Acórdãos do TSI, de 19/06/2014 no Proc. n.º 191/2014, de 19/06/2014 no Proc. n.º 116/2012 e no Proc. n.º 65/2012, de 05/06/2014 no Proc. n.º 623/2013, e de 29/05/2014 no Proc. n.º 115/2014.
2 Entre diversos acórdãos, cita-se o Acórdão de 16/05/2002, no Proc. n.º 41/2002.
3 Vide por exemplo o Acórdão do TUI, de 20/03/2002, no Proc. n.º 3/2002.
4 Nos termos do qual:
“Os magistrados judiciais não podem abster-se de julgar com fundamento na falta, obscuridade ou ambiguidade das leis, em dúvida insanável sobre a questão em litígio, desde que esta deva ser juridicamente regulada, em inexistência de meio processual adequado ou em carência de provas.”
5 Cfr. o Acórdão do TSI de 06/03/2014, no Proc. n.º 32/2014.
6 Nos termos do qual:
“Artigo 14.º Consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas
1. Quem consumir ilicitamente ou, para seu exclusivo consumo pessoal, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, adquirir ou detiver ilicitamente plantas, substâncias ou preparados compreendidos nas tabelas I a IV, é punido com pena de prisão de 3 meses a 1 ano ou com pena de multa de 60 a 240 dias, salvo o disposto no número seguinte.
2. Caso as plantas, substâncias ou preparados que o agente referido no número anterior cultiva, produz, fabrica, extrai, prepara, adquire ou detém constem do mapa da quantidade de referência de uso diário anexo à presente lei, da qual faz parte integrante, e a sua quantidade exceder cinco vezes a quantidade desta mapa, aplicam-se, consoante os casos, as disposições dos artigos 7.º, 8.º ou 11.º.
3. Para determinar se a quantidade de plantas, substâncias ou preparados que o agente cultiva, produz, fabrica, extrai, prepara, adquire ou detém excede ou não cinco vezes a quantidade a que se refere o número anterior, são contabilizadas as plantas, substâncias ou preparados que se destinem a consumo pessoal na sua totalidade, ou aquelas que, em parte, sejam para consumo pessoal e, em parte, se destinem a outros fins ilegais.”
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