Processo nº 368/2023
(Autos de Recurso Contencioso)
Data do Acórdão: 18 de Abril de 2024
ASSUNTO:
- Recurso contencioso
- Vício de forma
- Degradação de formalidade essencial em não essencial
SUMÁRIO:
- Estando em causa um poder discricionário, só pode aproveitar-se o acto ferido de vício procedimental por omissão de audiência prévia nas situações em que a apreciação do caso permita identificar apenas uma solução como possível (as chamadas situações de redução da discricionariedade a zero);
- Não se verificando que a situação adoptada era a única possível é inviável a neutralização do efeito invalidante do vício antes assinalado ao acto recorrido.
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 368/2023
(Autos de Recurso Contencioso)
Data: 18 de Abril de 2024
Recorrente: A
Entidade Recorrida: Secretário para a Segurança
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
A, com os demais sinais dos autos,
vem interpor recurso contencioso do Despacho proferido pelo Secretário para a Segurança de 17.03.2023 que indeferiu o pedido de renovação da autorização de residência, formulando as seguintes conclusões:
1. A R. obteve autorização de residência na RAEM, para exercer funções na XXX, Limitada enquanto XXX, através de Despacho do Secretário para a Segurança de 21/02/17, tendo sido a validade de tal autorização de residência estendida na última renovação até 21/08/24.
2. Aquando do seu regresso à RAEM, a 21/04/23, a R. foi notificada da revogação da sua autorização de residência, medida tomada por decisão do Secretário para a Segurança de 17/03/23.
3. No mesmo momento, foi-lhe cassado o seu BIR, o qual lhe foi provisoriamente devolvido no dia 10/05/23, ao abrigo da suspensão provisória ditada pelo art. 126.º do CPAC.
4. O acto recorrido foi tomado com base no art. 43.º, n.º 2.3) da Lei 16/2021, por se ter entendido que a R. deixara de ter a sua residência habitual na RAEM.
5. O acto recorrido é uma cópia da Notificação n.º 200571/SRDARPNT/2023P, que terá sido expedida para a residência da R. pelo Departamento para os Assuntos de Residência e Permanência, através do Ofício n.º l03498/CPSP-SRDARP/OFI/2023P.
6. A R. tem legitimidade, manifestamente, para recorrer do acto administrativo, nos termos do disposto no art.º 33.º do CPAC.
7. O acto recorrido condiciona directamente o seu direito a residir na RAEM e a aqui exercer o seu oficio e manter o centro efectivo e estável de vida.
8. O TSI é competente para apreciar o presente recurso contencioso, nos termos do art.º 36.º, n.º 8 (2) da LBOJ, visto que o acto recorrido foi praticado por um Secretário.
9. O órgão recorrido será aparentemente competente para a prática do acto administrativo, visto que o Chefe do Executivo delegou em si as competências previstas no art. 4.º do RA 6/1999 através da Ordem Executiva 182/2019.
10. Porém, tais competências não parecem incluir o das autorizações de residência na RAEM.
11. O mandatário foi informado no DARP que o Ofício n.º 103498/CPSPSRDARP/OFI/2023P terá sido expedido para a morada residencial da R. a 11/04/23.
12. A R. chegou a Macau volvidos dez dias sobre esta data, mas não conseguiu encontrar qualquer vestígio do envio do mesmo na sua morada.
13. A R. auscultou a pessoa que hoje lá habita e a agente imobiliária que lida com as questões da fracção autónoma para indagar do paradeiro desta correspondência; ambas lhe garantiram que não chegou à caixa de correio nem tal oficio, nem qualquer outro documento ou notificação provindo nem do CPSP em geral, nem do DARP ou do órgão recorrido em específico.
14. A R. deslocou-se inclusivamente à sede dos Correios de Macau, no dia 25/04/23, a fim de tentar levantar por sua mão tal notificação, mas foi-lhe dito que não lhe poderia ser entregue correspondência sem a produção de qualquer aviso.
15. A R. deve ter-se por notificada, nos termos do art. 121.º, n.º 1 do CPA e para os efeitos previstos no art. 26.º, n.º 2, al. b) do CPAC, no dia 21/04/23, única altura em que tomou - e podia tomar - conhecimento do acto.
16. Não obstante, ainda que se entendesse que a R. se deveria ter por notificada através do envio do Oficio n.º 103498/CPSP-SRDARP/OFI/2023P, nunca se deveria considerar notificada antes de 14/04/23, nos termos do art. 13.º, n.º 3 da Lei 16/2021.
17. Não poderá operar de todo o modo esta presunção porque ao que tudo indica a mais recente notificação padecerá dos mesmos vícios de que padece a que anteriormente lhe foi dirigida em sede de audiência de interessados.
18. O presente recurso contencioso é tempestivo, nos termos do art. 25.º do CPAC, quer se entenda que o acto recorrido é anulável, quer se entenda que padace de nulidade.
19. A R. apresentou previamente à interposição do presente recurso pedido de suspensão de eficácia do acto recorrido, cuja apreciação pende presentemente sob o n.º 333/2023.
20. Urge antes de mais aquilatar questão prévia com relevância nos presentes autos, qual seja o da competência para a prática do acto recorrido.
21. A lei prevê expressamente no art. 43.º, n.º 2 da Lei 16/2021 que a autorização de residência pode ser revogada através de Despacho do Chefe do Executivo.
22. O art.º 6 da Lei 16/2021 prevê que “as competências atribuídas pela presente lei ao Chefe do Executivo são delegáveis, nos termos gerais.”
23. Nos termos do art. 1.º da Ordem Executiva n.º 182/2019, foram “delegadas no Secretário para a Segurança, XXX, as competências executivas do Chefe do Executivo em relação a todos os assuntos relativos às áreas de governação e aos serviços e entidades referidos no artigo 4.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, bem como aos relativos ao seu Gabinete.”
24. Ressalvado melhor entendimento, as competências previstas no art. 4.º do RA n.º 6/1999, embora englobem a área de controlo de imigração (no n.º 5), não parecem estender-se à autorização de residência na RAEM.
25. A autorização de residência na RAEM não parece estar circunscrita dentro da área de governação do controlo de imigração, desde logo porque os residentes de Macau (mesmo os não-permanentes) não estão sujeitos a quaisquer controlos de entrada ou saída no território.
26. Reza o primeiro parágrafo da art. 24.º da Lei Básica da RAEM que “[o]s residentes da Região Administrativa Especial de Macau, abreviadamente denominados como residentes de Macau, abrangem os residentes permanentes e os residentes não permanentes.”
27. Por outro lado, estabelece o art. 33.º da Lei Básica da RAEM que “[a]os residentes de Macau são reconhecidas a liberdade de se deslocarem e fixarem em qualquer parte da RAEM e a liberdade de emigrarem para outros países ou regiões.”
28. A primeira parte deste último dispositivo legal consagra a liberdade de os residentes entrarem, fixarem-se e saírem de Macau, sem qualquer reserva de lei.
29. A própria Lei 16/2021 parece ser elucidativa do que se argúi, ao ser designada como o regime jurídico do controlo de migração e das autorizações de permanência e residência na RAEM.
30. Ora, admitindo que a competência prevista no art. 43.º, n.º 2 da Lei 16/2021 pode ser delegada, a verdade é que não se logrou identificar qualquer delegação específica de poderes, nem posterior nem anterior à publicação da Lei 16/2021, que preveja a delegação da competência da revogação da autorização de residência atribuída ao Chefe do Executivo no art. 43.º, n.º 2 da Lei 16/2021.
31. Nestes termos, argúi-se a incompetência do Secretário para a Segurança para a prática do acto recorrido, a qual deverá gerar a nulidade do acto administrativo, nos termos do art. 122.º, n.º 2, al. b) do CPA.
32. Ainda que se entenda que a incompetência seja apenas relativa, sempre deverá gerar a anulabilidade do acto, a qual desde já também se argúi, por violação da competência atribuída ao abrigo do art. 43.º, n.º 2 da Lei 16/2021.
33. Segundo o Despacho do Secretário para a Segurança de 17/03/23, foi determinada a revogação da autorização de residência anteriormente concedida, implicando a perda do tempo continuado para efeitos de aquisição da qualidade de residente permanente.
34. O órgão recorrido decidiu revogar a autorização de residência da R. com base no pressuposto abstracto previsto no art. 43.º, n.º 2.3 da Lei n.º 16/2001, designadamente por ter entendido que deixou de ter residência habitual na RAEM.
35. O órgão recorrido entendeu mostrar-se preenchido este requisito com base no facto de a R. ter estado fora da RAEM por mais de seis meses, designadamente entre 12 de Fevereiro de 2022 e 11 de Agosto de 2022.
36. Especial enfoque foi dado ao facto de a R. não ter oferecido qualquer pronúncia em sede de audiência de interessados, quando notificada para o efeito.
37. Nos termos do art. 93.º, n.º 1 do CPA, “os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta” e dos “elementos necessários para que os interessados fiquem a conhecer todos os aspectos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito,” nos termos do art. 94.º, n.º 2 do CPA.
38. A R. nunca foi informada da possibilidade de se lhe ser coarctado um direito tão fundamental como o direito de residência, e demonstrar-se-á, aliás, que a administração tinha pleno conhecimento de tal facto.
39. Não só foi desrespeitado o procedimento legal para notificar a R., como tal notificação nunca atingiu sequer o seu destino, pelo que lhe era impossível exercer o seu direito de audiência.
40. A preterição dum direito procedimental essencial deverá redundar necessariamente na declaração de nulidade do acto recorrido.
41. Nos termos descritos no acto recorrido, a R. terá sido notificada para exercer o seu direito de audiência, nos termos impostos pelos arts. 93.º e 94.º do CPA.
42. Dispõe o art. 72.º, n.º 1 do CPA que “[a]s notificações devem ser feitas pessoalmente ou por ofício, telegrama, telex, telefax, ou por telefone, consoante as possibilidades e as conveniências.”
43. No presente caso, parece claro que se deveria ter promovido preferencialmente a notificação pessoal da parte interessada, visto que se pretende aplicar uma medida que altera fundamentalmente a dinâmica da R. na RAEM.
44. Para o efeito, dever-se-ia ter entrado em contacto com a R. por via telefónica, ou até através de comunicação por correio electrónico, para auscultar a possibilidade de ela se deslocar pessoalmente ao DARP.
45. Dita a experiência que a convocação por via telefónica é de facto a forma mais comum de a administração informar as partes interessadas em casos semelhantes; porém, tal não sucedeu.
46. No presente caso, optou-se pela notificação da R. pela via postal, pelo que se deveriam ter adoptado os trâmites previstos no art. 13.º da Lei 16/2021.
47. Estabelece o art. 13.º, n.º 2 da Lei 16/2021 que “[a]s notificações postais são efectuadas ao interessado, ou ao seu representante legal ou mandatário constituído, no lugar da sua sede, no lugar da sua residência habitual ou do domicílio escolhido para o efeito de as receber, conforme os casos.”
48. No presente caso, sabendo a administração que a R. não estava em Macau, deveria ter-se procedido obrigatoriamente à notificação para pronúncia de interessados na pessoa do seu representante legal, na morada por ele indicada para receber as notificações da mandante durante a sua ausência.
49. A consulta do processo administrativo instrutor revela que praticamente metade do mesmo é composto por requerimentos apresentados pelo seu procurador, que indicou reiterada e especificamente que “uma vez que a Requerente se encontra em Portugal, as notificações, comunicações ou pedidos de esclarecimento sobre o presente assunto sejam realizadas na pessoa do procurador nomeado pela Requerente”.
50. Era amplamente conhecido do pessoal do DARP o representante legal da R., tanto que vem identificado nessa qualidade no parecer que foi elaborado a fls. 316 do p.a.i.
51. A notificação efectuada para a morada residencial da R. violou o preceituado no art. 13.º, n.º 2 da Lei 16/2021, visto que não respeitou a pessoa designada e o domicílio determinado para receber as notificações durante sua ausência da R.
52. Por outro lado, não se podia ter optado, nos termos do art. 13.º, n.º 2 da Lei 16/2021, por promover a sua notificação na sua residência habitual na RAEM, visto que o acto recorrido assenta fundamentalmente no entendimento de que a R. deixara aqui de ter o seu centro efectivo e estável da sua vida pessoal.
53. Baseando-se a intenção de revogar a autorização de residência no entendimento de que a R. deixara de ter residência habitual na RAEM, seria completamente ilógico afinal considerar a sua residência no território como a sua residência habitual para efeitos da notificação que se operou.
54. Seria um contra-senso que implicaria obrigatoriamente o provimento do presente recurso contencioso porque seria admitir que a R. aqui mantinha, afinal, a sua residência habitual.
55. Nesses termos, foi violado o preceituado no art. 13.º, n.º 2 da Lei 16/2021, visto que a entidade responsável não poderia ao mesmo tempo considerar que a R. tinha e não tinha residência habitual na RAEM.
56. Ou simplesmente implica uma confissão implícita do facto de que a R. detinha afinal a sua residência habitual na RAEM, confissão essa que se aceita expressamente.
57. E que deve determinar a comprovação de um erro sobré os pressupostos de facto no acto recorrido, visto que fica demonstrado que a R. detém a sua residência na RAEM,
58. O que implica o decaimento do pressuposto previsto no art. 43.º, n.º 2. 3) da Lei 16/2021, e torna a aplicação deste dispositivo ilegal no caso concreto ilegal por vício de violação de lei.
59. Até porque a última notificação do acto recorrido terá sido enviada novamente nos tennosdo art. 13.º, n.º 2 da Lei 16/2021 para o que se considerou ser a residência habitual, reiterando-se e renovando-se esse entendimento de que a R. ainda aqui mantém o seu centro efectivo e estável de vida.
60. Mais flagrantemente, crê-se que a promoção da notificação da R. por meio de carta registada terá originado os problemas que se debatem no recurso contencioso e deverá impedir que opere a presunção contida no art. 13.º, n.º 3 da Lei 16/2021.
61. A presunção contida neste dispositivo legal implica que a carta seja expedida de facto para o receptáculo postal da interessada, nos termos do art. 8.º, n.º 1, al. a) da Portaria n.º 441/99/M, só dessa forma se podendo presumir que a notificação terá chegado à sua esfera de conhecimento.
62. A opção por envio do expediente por meio de carta registada implicou que o ofício correspondente não fosse enviado para o seu receptáculo postal e, pelo menos no caso em específico, que não restassem vestígios de que houve sequer tentativa de notificar a R.
63. Conscientemente ou não, o recurso a este tipo de expedição por parte do órgão recorrido ou do DARP, em actos de tamanha relevância, pode representar uma ameaça muito grave para os direitos dos residentes de Macau, e não só os cidadãos portugueses que caem sob a sua alçada.
64. Dever-se-á averiguar inclusivamente se o recurso contínuo a este tipo de correspondência, e a tentativa de enquadrá-la com a presunção prevista no art. 13.º, n.º 3 da Lei 16/2021, não representará um grave atropelo do direito fundamental consagradono art. 42.º da Lei Básica de Macau, lá onde se prescreve que: “[o]s interesses dos residentes de ascendência portuguesa em Macau são protegidos, nos termos da lei, pela Região Administrativa Especial de Macau.”
65. Ainda que a R. se encontrasse no momento da expedição a residir em Macau, muito facilmente - para não dizer provavelmente - o resultado da notificação teria sido o mesmo, pois seria natural que o carteiro se deslocasse ao seu domicílio a horas em que ambos se encontrariam a praticar os respectivos ofícios, pelo que dificilmente coincidiria a sua presença no domicílio da R.
66. A expedição de uma notificação por meio de correio registado não se coaduna com a presunção ínsita no art. 13.º, n.º 3 da Lei 16/2021.
67. O art. 13.º, n.º 2 da Lei 16/2021 em lado algum alude à expedição das notificações por via de correio registado ao contrário do que acontece, por exemplo, no art. 201.º, n.º 1 do CPC, em que a expedição do correio é dirigida para um escritório de advogados, onde é expectável que esteja alguém preparado para receber a correspondência, como aliás em qualquer departamento público do Governo.
68. A expedição através de carta registada, nos termos dos arts. 16.º e 17.º da Portaria 441/99/M, representa uma forma ilegal de se proceder às notificações mencionadas no art. 13.º da Lei 16/2021, pois não permite a quem de direito tomar conhecimento do expediente, a não ser que se encontre no domicílio no exacto momento em que se proceda a uma tentativa de notificação.
69. Ao contrário do que acontece no envio de correspondência normal, não é emitido .nenhum aviso nos termos do n.º 2 ou n.º 3 do art. 9.º da Portaria 441/99/M, o que significa que, não encontrando o funcionário dos correios qualquer pessoa no domicilio do destinatário quando aí se deslocam, seja impossível à pessoa visada sequer adivinhar que houve uma tentativa de notificação.
70. Ao contrário do que se prevê no art. 8.º, n.º 1, al. a) da Portaria n.º 441/99/M para o correio normal, a entrega de correspondência registada não se faz “no receptáculo postal do destinatário, designadamente no [seu] domicílio”.
71. Através da correspondência registada, apenas se consegue demonstrar se a notificação foi de facto entregue em mão ao destinatário.
72. Nem a R. nem a pessoa que habitava na sua morada residencial na altura tiveram a oportunidade de se aperceberde que havia sido efectuada tentativa de notificação.
73. De facto, com o correio registado, apenas poderemos ter a certeza de que (1) um objecto postal foi entregue na mão do destinatário ou de que (2) ele não foi entregue; não há margem para presunções sobre realidades diversas.
74. O acto recorrido violou a norma do art. 13.º, n.º 3 da Lei 16/2021, ao aplicá-la numa situação em que manifestamente não o podia ter feito, consubstanciando nessa situação um vício de violação de lei, o qual deve redundar na sua anulabilidade.
75. Constam elementos inequívocos no processo administrativo instrutor de que a notificação através do ofício n.º 202115/SRDARPNT/2022P foi devolvida ao remetente porque não reclamada, o que será bastante para comprovar desde logo que a notificação não foi enviada para a sua morada.
76. Durante a sua ausência, a R. logrou receber correspondência da Direcção dos Serviços de Finanças sobre matérias fiscais que lhe diziam respeito, porque as cartas foram expedidas para o seu receptáculo postal.
77. As notificações fiscais são ainda hoje reguladas pelo DL 16/84/M, onde também se prevê que as notificações ou avisos se presumem “feitos no quinto dia posterior ao do registo postal, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja” (no seu art. 2.º, n.º 3).
78. O sistema uniformizado de envio de notificações postais nos termos desse diploma funciona sem complicações de maior volvidas praticamente três décadas sobre a sua concepção, pelo simples facto de que foi adoptada uma metodologia coerente e lógica.
79. Para operar a presunção prevista nesse diploma legal, a correspondência é enviada de forma simples, nos termos do art. 8.º da Portaria 441/99/M - para o receptáculo do destinatário - e nunca através de correspondência registada prevista nos arts. 16.º e 17.º da Portaria 441/99/M.
80. Esta comparação serve para demonstrar como em situações idênticas importa de facto atentar na forma como a correspondência é expedida, para compreender como num caso a presunção é perfeitamente compreensível e aceitável, enquanto no outro representará uma completa deturpação do sentido da lei.
81. A única certeza que a R. pode ter com alguma segurança é a de que não foi alvo de qualquer notificação para pronúncia de interessados.
82. Nunca chegou qualquer aviso ou outra forma de comunicação por via postal ao endereço para onde foi dirigida a notificação, da R., pelo que sempre lhe seria impossível tomar conhecimento da intenção da administração lhe, revogar a autorização de residência e exercer o seu direito de audiência.
83. Embora a R. não estivesse na altura na RAEM, a senhora que se encontrava a habitar na sua residência garante não ter chegado qualquer carta, notificação ou aviso para a R. desde Abril do ano passado até ao seu regresso, à excepção de três cartas da DSD a que se fez alusão acima.
84. Por excesso de rigor, argúi-se para efeitos do art. 13.º, n.º 5 da Lei 16/2021 que nunca se verificou a recepção da notificação para efeitos de audiência, o que será seguramente comprovado pelos Serviços de Correios, pois o expediente foi devolvido ao remetente e faz parte do processo administrativo instrutor.
85. Seria de facto ilógico pretender que operasse a presunção prevista no art. 13.º, n.º 3 da Lei 16/2021, quando se sabe perfeitamente que a notificação não ocorreu.
86. Não operando a presunção, tem de se concluir, em conformidade com a realidade que a R. nunca foi notificada.
87. Posto isto, deve-se desde logo extrair do se arguiu a existência de erro sobre os pressupostos de facto no acto recorrido, pois, ao contrário do que decorre do mesmo:
- A interessada não foi notificada para audiência nos termos dos arts. 93.º e 94.º do CPA;
- Não é verdade que nada se lhe ofereceu dizer, pelo simples facto de que não lhe foi facultada oportunidade para o fazer.
88. A notificação nunca chegou ao conhecimento da R., pelo que deve ter-se por preterido inadmissivelmente um passo essencial do procedimento administrativo e ditar-se a nulidade do acto administrativo.
89. O acto administrativo recorrido representa indubitavelmente uma decisão ablativa, pois retira o direito da R. poder continuar a ser residente da RAEM; extingue direitos essenciais legalmente protegidos, quais não sejam, desde logo, aqueles consagrados no Capítulo III da Lei Básica da RAEM.
90. No fundo, foi coarctado o direito de participação da R. no procedimento administrativo, que não teve qualquer oportunidade de se pronunciar acerca da possibilidade da perda do seu estatuto de residente de Macau.
91. Foi violado o princípio de participação consagrado no art. 10.º do CPA.
92. Foram violados especificamente os direitos de audiência previstos nos arts. 93.º e 94.º do CPA.
93. A preterição da audiência de interessados gera a nulidade prevista no art. 122.º, n.º 2, al, d) do CPA.
94. Não se pode deixar de oferecer uma justificação para a ausência da R. da RAEM, no sentido de afastar o entendimento espelhado no acto recorrido de que aqui deixara de ter residência habitual.
95. Urge demonstrar que o centro efectivo e estável de vida da R. nunca foi alterado, mau grado a sua ausência prolongada do território.
96. Como oportunamente se expôs em sede do pedido de suspensão de eficácia, a sua ausência foi determinada por imperativos de saúde que desaconselharam o seu regresso mais imediato à RAEM, devido a uma gravidez com riscos maiores associados.
97. A R. casou-se com o seu marido no dia 15/09/21.
98. Nesse mesmo ano se havia deslocado a Portugal para proceder a tratamentos de fertilidade.
99. Ao regressar a Macau, bem ciente das complicações causadas pela pandemia, a R. tudo tentou para que o seu marido se pudesse juntar a ela na RAEM, para que naturalmente pudessem viver e conviver juntos.
100. A 01/11/21, recebeu notificação da Direcção dos Serviços de Saúde, informandoa de que não poderia ser concedida ao seu marido a isenção da aplicação da medida de restrição de entrada ao seu marido, por não preencher as condições excepcionais previstas no n.º 2 do Despacho do Chefe do Executivo n.º 72/202.
101. A R. tentou seguidamente recorrer à faculdade de reagrupamento familiar prevista no Despacho do Chefe do Executivo n.º 130/2021.
102. Para esse efeito, foi adquirida passagem para o seu marido sair de Lisboa no dia 05/12/21 e aterrar na RAEHK no dia seguinte, contando aí permanecer os 21 dias necessários para tentar depois ingressar na RAEM.
103. O marido da R. chegou inclusivamente a reservar e a pagar pela sua estadia para quarentena de 14 dias no Hotel Best Westem de Causeway Bay.
104. Qual não foi o espanto do casal quando o Governo da RAEHK anunciou a 01/12/21 - a escassos quatro dias da data de embarque - que seriam banidos de entrar na vizinha região administrativa cidadãos não-residentes provenientes de Portugal, deitando por terra a possibilidade de o marido se juntar à R. por esta via.
105. A R. ficou devastada, mas ainda assim não desistiu de tentar que o seu marido se juntasse a ela em Macau para aqui poderem conduzir a vida que o destino matrimonial tinha unido.
106. Para esse efeito, tratou de recolher toda a documentação necessária e apresentou no mês de Janeiro de 2022 pedido de autorização de residência em nome do seu marido, enquanto membro do seu agregado familiar.
107. Foi-lhe dito então que as formalidades de tal pedido só poderiam ser completadas quando o seu marido ingressasse em Macau, altura em que devería fornecer as impressões digitais e o seu boletim de entrada.
108. Recorde-se que na altura não havia qualquer possibilidade de o marido da R. entrar directamente em Macau, devido às restrições fronteiriças impostas pelo combate ao COVID.
109. Após ver goradas as expectativas de ver consumada a reunião com o seu marido em Macau, a R. requereu à sua entidade empregadora uma licença especial para se poder encontrar temporariamente com ele em Portugal, tendo de facto saído de Macau no dia 12/02/22.
110. A verdade é que durante este período de licença em que esteve junto com o seu marido acabou mesmo por engravidar, o que por um lado a deixou exultante, mas por outro um pouco apreensiva, devido aos já mencionados tratamentos de fertilidade a que sujeitara anteriormente, no ano de 2021.
111. Durante consulta que teve no dia 24/05/22 com o seu ginecologista, que havia anteriormente acompanhado o tratamento de fertilidade da R., foi confirmada efectivamente a existência de uma gravidez com cinco semanas.
112. Dados os riscos clínicos associados à sua situação em particular, o médico recomendou-lhe que a sua gravidez fosse acompanhada de perto tanto por si como por um especialista em Medicina Materno-fetal, no Hospital da CUF, em Lisboa.
113. A R. entrou em contacto então com a sua entidade empregadora, tendo ficado combinado que excepcionalmente a R. poderia continuar a trabalhar remotamente durante o período da gravidez, assim a sua saúde o permitisse e assim permanecessem as condições para ela o fazer em Portugal.
114. De resto, não só devido aos riscos clínicos, era seguramente aconselhável e natural que o marido - o pai da criança - quisesse e devesse acompanhá-la durante a sua gravidez.
115. A filha do casal nasceu na cidade de Lisboa no dia 24/01/23.
116. A R. gozou ainda a sua licença de 'maternidade em Portugal, tendo ficado combinado com a entidade empregadora que voltaria para Macau o mais cedo possível para trabalhar, assim fosse aconselhável viajar com a sua filha, e assim esta completasse a primeira dose de vacinações.
117. A R. acabou por regressar à RAEM pouco tempo depois da sua licença de maternidade terminar, numa altura em que a criança não perfizera ainda três meses de idade.
118. Qual não foi o seu choque e profunda tristeza ao ser confrontada, mal chegou a Macau, com o facto de que a sua autorização de residência havia sido revogada.
119. A R. havia regressado a Macau acompanhada do seu marido e filha, confiante de que finalmente o seu núcleo familiar se poderia juntar a ela na RAEM, oferecendo um semblante de normalidade - e, atrevemos dizê-lo, felicidade - à sua vida.
120. O facto de a R. ter estado afastada de Macau nos últimos tempos foi absolutamente excepcional e esteve relacionado com preocupações de saúde, não traduzindo qualquer alteração do seu centro efectivo e estável de vida pessoal.
121. A R. nunca deixou de ter a RAEM como sua base, como o demonstram todas as atitudes adoptadas pela mesma e todo o esforço despendido para aqui reunir o seu núcleo familiar.
122. Por outro lado, a requerente nunca descurou a sua ligação profissional à empresa XXX, Limitada, facto que determinou a concessão inicial da sua autorização de residência, como decorre literalmente do acto recorrido.
123. Mesmo durante a sua ausência forçada por motivos de saúde, a R. continuou a prestar a sua actividade profissional para a sua entidade empregadora, enquanto as circunstâncias permitiram.
124. O acto recorrido padece do vício de violação de lei do art. 42.º, n.º 2.3 da Lei 16/2021, ao desconsiderar factos essenciais que permitem enquadrar devidamente a sua ausência temporária da RAEM.
125. Não houve de facto decaimento do pressuposto ou requisito da autorização de residência, do art. 42.º, n.º 2.3 da Lei 16/2021.
126. A R. sempre continuou a trabalhar para a XXX, Limitada, facto que determinou a sua concessão de autorização de residência.
127. A R. nunca deixou de ter o seu centro estável e efectivo de vida na RAEM, tendo sido a sua ausência temporária ditada por questões de saúde ligadas provavelmente ao marco mais importante da sua vida até ao momento: o nascimento da sua filha.
128. O acto recorrido padece de ilegalidades várias que devem determinar, nos termos expostos, que se declare a sua nulidade, derivada dos vícios previstos no art. 122.º, n.º 2, als. b) e d) do CPA, e de todo o modo ser anulado, pelos vários vícios que se demonstraram ao longo do presente recurso contencioso.
Citada a Entidade Recorrida veio o Senhor Secretário para a Segurança contestar, apresentando as seguintes conclusões:
1) A recorrente interpôs o presente recurso do despacho proferido em 17 de Março de 2023 pelo Secretário para a Segurança na Informação do CPSP n.º 20002/SRDARPG/2023F, que concordou com a revogação da autorização de residência da recorrente.
2) A recorrente põe em causa se as competências delegadas pelo Chefe do Executivo ao Secretário para a Segurança através da Ordem Executiva n.º 182/2019 incluem a competência relativa à autorização de residência.
3) Salvo o devido respeito por diverso entendimento, a entidade recorrida entende que, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, al. 5) do Regulamento Administrativo n.º 6/1999 e do n.º 1 da Ordem Administrativa n.º 182/2019, é muito claro que o Chefe do Executivo já delegou ao Secretário para a Segurança as competências, incluindo a competência relativa à autorização de residência.
4) A expressão chinesa da alínea 5) do n.º 1 do art.º 4.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999 utilizou os “controlos de imigração (出入境控制)”, mas, o que não apenas se refere ao “controlo de migração” (出入境管控) previsto no art.º 1.º da Lei n.º 6/2021 (sic.).
5) Da expressão portuguesa “Controlos de imigração” constante da alínea 5) do n.º 1 do art.º 4.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999 (sic.), acredita-se que é mais fácil compreender que as respectivas competências relevantes incluem a competência relativa à autorização de residência e permanência.
6) Tomando como referência os acórdãos do TSI proferidos nos autos de recurso contencioso n.ºs 274/2012 e 1154/2017, é também bastante claro o ponto de vista que o Secretário para a Segurança foi delegado para exercer a competência relativa à autorização de residência.
7) Nos n.º 1 da Ordem Administrativa n.º 182/2019, n.º 1 da Ordem Administrativa n.º 122/2009 e n.º 1 da Ordem Administrativa n.º 111/2014, as disposições relativas à delegação de competência são as mesmas.
8) Pois, não resta dúvida de que o Chefe do Executivo já delegou ao Secretário para a Segurança a competência relativa à autorização de residência através da Ordem Administrativa n.º 182/2019.
9) Relativamente à alegação da recorrente que não foi realizada a audiência, de acordo com os documentos constantes de fls. 423 a 425 e 429 a 431 dos autos, o CPSP enviou em 16 de Novembro de 2022 uma carta por correio registado para a residência habitual declarada pela recorrente (vide fls. 377 dos autos), a fim de notificar a mesma da realização de audiência escrita sobre a matéria em causa.
10) Por não ter sido recebida, a carta por correio registado acima referida foi devolvida para o CPSP (vide fls. 431 dos autos).
11) No art.º 13.º, n.º 3 da Lei n.º 16/2021 – “Regime jurídico do controlo de migração e das autorizações de permanência e residência na Região Administrativa Especial de Macau”, dispõe-se que “a notificação postal considera-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte quando aquele o não for, devendo esta cominação constar do acto de notificação”.
12) O CPSP já constou da notificação o disposto no art.º 13.º, n.º 3 da Lei n.º 16/2021.
13) Nos termos do disposto no art.º 13.º, n.º 2 e n.º 3 da Lei n.º 16/2021, a notificação do CPSP à recorrente para realização de audiência escrita considera-se já feita no terceiro dia posterior ao do registo.
14) No art.º 13.º, n.º 4 (sic.) da Lei n.º 16/2021, dispõe-se que “a presunção prevista no n.º 3 só pode ser ilidida pelo notificando quando a recepção da notificação ocorra em data posterior à presumida, por razões imputáveis aos serviços postais.
15) A recorrente não conseguiu provar que a não recepção da notificação postal foi devida aos serviços postais.
16) Por isso, a entidade recorrida entende que já notificou com sucesso a recorrente para exercício dos seus direitos, mas que a recorrente não se pronunciou.
17) De acordo com a procuração em questão, a recorrente conferiu ao Sr. B os poderes para a representar na matéria da renovação da autorização de residência em questão. (vide fls. 305 a 306 dos autos)
18) A renovação da autorização de residência da recorrente foi aprovada em 7 de Dezembro de 2021. (vide fls. 412 dos autos)
19) Sendo assim, a matéria da revogação da autorização de residência da recorrente não devia ser notificada ao Sr. B.
Notificadas as partes para apresentarem alegações facultativas, ambas o fizeram.
Pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público foi emitido parecer pugnando pela procedência do recurso.
Foram colhidos os vistos.
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
O Tribunal é o competente.
O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
Cumpre assim apreciar e decidir.
III. FUNDAMENTAÇÃO
a) Dos factos
A factualidade com base na qual foram praticados os actos recorridos consiste no seguinte:
a) Por Despacho do Senhor Secretário para a Segurança datado de 17.03.2023, nos termos e com os fundamentos do relatório nº 200002/SRDARPG/2023P elaborado pelo DARP, o qual consta de fls. 427/428 do PA e com o seguinte teor:
«1. Da análise do processo individual da interessada A (titular do BIR nº XXX, válido até 21/8/2024), verifica-se que por Despacho do Exmº Secretário para a Segurança de 21/Fev/2017 foi-lhe autorizada a residência para exercer funções no XXX, Limitada, como XXX e tem residência válida até 21/Ago/2024.
2. Da análise aos movimentos fronteiriços da interessada, constatou-se que no período de 01/Out/2019 a 31/Out/2022, contatou-se que a interessada ausentou-se da RAEM por mais de seis meses consecutivos, assim, verifica-se que no passado até à presente data não tem o centro de vida efectiva na R.A.E.M., levando que a situação actual não esteja conforme o objectivo do despacho da autorização de residência (exercício de actividade profissional na RAEM).
3. A alínea 3) do nº 2 do Art.º 43º da Lei nº 16/2021, estipula que são causas de revogações da autorização de residência, quando o titular deixar de ter residência habitual na RAEM ou deixar de verificar-se algum dos requisitos, pressupostos ou condições subjacentes à concessão da autorização de residência.
4. Assim, foi elaborada a Notificação para Audiência Escrita nº 202115/SRDARPNT/2022P, a notificar a interessada nos termos do artºs 93º e 94º do CPA (fls. 423)
5. Em 16/Nov/2022, foi enviada a Notificação de Audiência Escrita, através de carta registada, para a morada da interessada, com a indicação de que poderia dizer o que se lhe oferecer no prazo de 15 dias a contar do dia seguinte à notificação e que nos termos da lei, a notificação postal considera-se feita no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil a seguir a esse, quando o não seja (fls. 424-425).
6. Após o prazo concedido, nada lhe ofereceu dizer, de acordo com o registo dos movimentos fronteiriços, a interessada saíu da RAEM em 12/Fev/2022 e até à presente data não regressou, assim julgo ser de revogar a autorização de residência da interessada nos termos da alínea 3) do nº 2 do Artº 43º da Lei nº 16/2021.
À consideração superior.»;
b) Aquando do seu regresso à RAEM, no passado dia 21 de Abril de 2023, a Recorrente foi notificada da revogação da sua autorização de residência, medida tomada por decisão do Excelentíssimo Senhor Secretário para a Segurança de 17 de Março de 2023;
c) No mesmo momento, foi-lhe cassado o seu Bilhete de Identidade de Residente Não-Permanente nº XXX, o qual lhe foi provisoriamente devolvido no dia 10 de Maio de 2023, ao abrigo da suspensão provisória ditada pelo art. 126º do Código de Processo Administrativo Contencioso;
d) O ofício nº 103498/CPSP-SRDARP/OFI/2023P terá sido expedido para a morada da Requerente sita na XXX Macau, no passado dia 11 de Abril de 2023;
e) Quando a Recorrente chegou a Macau volvidos apenas dez dias sobre a data em que este ofício terá sido expedido, não conseguiu encontrar qualquer vestígio do envio do mesmo na morada para onde terá sido enviado, onde a Recorrente, aliás, já não reside;
f) A Recorrente auscultou a pessoa que hoje lá habita e a agente imobiliária que lida com as questões da fracção autónoma – com quem tem mantido regular contacto nos últimos meses – para indagar do paradeiro desta correspondência;
g) Ambas lhe garantiram que não chegou à caixa de correio nem tal ofício, nem qualquer outro documento ou notificação provindo nem do Corpo de Polícia de Segurança Pública em geral, nem do Departamento para os Assuntos de Residência e Permanência ou do órgão recorrido em específico;
h) A Recorrente deslocou-se inclusivamente à sede dos Correios de Macau, na Estação Central, no Largo do Senado, no passado dia 25 de Abril de 2023, a fim de tentar levantar por sua mão tal notificação, mas foi-lhe dito que não lhe poderia ser entregue correspondência sem a produção de qualquer aviso;
i) Pelo procurador da Requerente foi indicado que “uma vez que a Requerente se encontra em Portugal, as notificações, comunicações ou pedidos de esclarecimento sobre presente assunto sejam realizadas na pessoa do procurador nomeado pela Requerente, Sr. B, portador do BIR-Não Permanente nº XXX, válido até 09.03.2023, com morada profissional na XXX, Macau o que pode igualmente ser contactado para o número de telefone XXX” – cfr. fls. 372 do PA -;
j) Nem a Recorrente nem a pessoa que habitava na sua morada residencial na altura tiveram a oportunidade de se aperceber de que havia sido efectuada tentativa de notificação;
k) Do processo administrativo consta que a notificação com a referência nº 202115/SRDARPNT/2022P através do ofício nº 107955/CPSP/SRDARP/OFI/2022P - fls. 429/431 do PA -, foi devolvida ao remetente porque não reclamada;
l) De facto, durante a sua ausência, a Recorrente logrou receber correspondência da Direcção dos Serviços de Finanças sobre matérias fiscais que lhe diziam respeito, porque as cartas foram expedidas para o seu receptáculo postal;
m) Embora a Recorrente não estivesse na altura na RAEM, na sua residência não chegou qualquer carta, notificação ou aviso para a Recorrente desde Abril do ano passado até ao seu regresso, à excepção de três cartas da Direcção dos Serviços de Finanças;
n) A Recorrente casou-se com o seu marido C no dia 15 de Setembro de 2021 – fls. 378/379 do PA -;
o) Também nesse mesmo ano se havia deslocado a Portugal para proceder a tratamentos de fertilidade;
p) Ao regressar a Macau em Setembro de 2021, bem ciente das complicações causadas pela pandemia, a Recorrente tudo tentou para que o seu marido se pudesse juntar a ela na RAEM, para que naturalmente pudessem viver e conviver juntos;
q) A 1 de Novembro de 2021, recebeu notificação da Direcção dos Serviços de Saúde, informando-a de que não poderia ser concedida ao seu marido a isenção da aplicação da medida de restrição de entrada ao seu marido, por não preencher as condições excepcionais previstas no n.º 2 do Despacho do Chefe do Executivo nº 72/2020;
r) A Recorrente tentou seguidamente recorrer à faculdade de reagrupamento familiar prevista no Despacho do Chefe do Executivo nº 130/2021, onde se previa que “a partir das 00H00 do dia 15 de Setembro de 2021, os não residentes que não tenham a qualidade de residente do Interior da China, da Região Administrativa Especial de Hong Kong, doravante designada por RAEHK, e da região de Taiwan podem entra na RAEM, em casos excepcionais de reagrupamento familiar ou de relacionamento estreito com a RAEM, desde que nos 21 dias anteriores à sua entrada não tenham estado em locais fora do Interior da China, da RAEM ou da RAEHK e que tenham sido previamente autorizados pela autoridade sanitária.”
s) Para esse efeito, foi adquirida passagem para o seu marido sair de Lisboa no dia 5 de Dezembro de 2021 e aterrar na Região Administrativa Especial de Hong Kong no dia seguinte, contando aí permanecer os 21 dias necessários para tentar depois ingressar na RAEM ao abrigo da faculdade descrita no item anterior;
t) O marido do Recorrente chegou inclusivamente a reservar e a pagar pela sua estadia para quarentena de 14 dias no Hotel XXX, na vizinha RAEHK;
u) O Governo da RAEHK anunciou no dia 1 de Dezembro de 2021 – e escassos quatro dias da data de embarque – que seriam banidos de entrar na vizinha região administrativa cidadãos não-residentes provenientes de Portugal, deitando por terra a possibilidade de o marido se juntar à Recorrente por esta via;
v) A Recorrente apresentou no mês de Janeiro de 2022 pedido de autorização de residência em nome do seu marido, enquanto membro do seu agregado familiar;
w) Foi-lhe dito então que as formalidades de tal pedido só poderiam ser completadas quando o seu marido ingressasse em Macau, altura em que deveria fornecer as impressões digitais e o seu boletim de entrada;
x) Recorde-se que na altura não havia qualquer possibilidade de o marido da Recorrente entrar directamente em Macau, devido às restrições fronteiriças impostas pelo combate ao COVID;
y) Após ver goradas as expectativas de ver consumada a reunião com o seu marido em Macau, a Recorrente requereu à sua entidade empregadora uma licença especial para se poder encontrar temporariamente com ele em Portugal, tendo de facto saído de Macau no dia 12 de Fevereiro de 2022;
z) A verdade é que durante este período de licença em que esteve junto com o seu marido acabou mesmo por engravidar, o que por um lado a deixou exultante, mas por outro um pouco apreensiva, devido aos já mencionados tratamentos de fertilidade a que sujeitara anteriormente, no ano de 2021;
aa) Durante consulta que teve no dia 24 de Maio de 2022 com o seu ginecologista Dr. D, que havia anteriormente acompanhado o tratamento de fertilidade da Recorrente, foi confirmada efectivamente a existência de uma gravidez com cinco semanas;
bb) Dados os riscos clínicos associados à sua situação em particular, o médico recomendou-lhe que a sua gravidez fosse acompanhada de perto tanto por si como pelo Dr. E, especializado em Medicina Materno-fetal, no Hospital da CUF, em Lisboa;
cc) A Recorrente entrou em contacto então com a sua entidade empregadora, tendo ficado combinado que excepcionalmente a Recorrente poderia continuar a trabalhar remotamente durante o período da gravidez, assim a sua saúde o permitisse e assim permanecessem as condições para ela o fazer em Portugal;
dd) De resto, não só devido aos riscos clínicos, era seguramente aconselhável e natural que o marido – o pai da criança - quisesse e devesse acompanhá-la durante a sua gravidez;
ee) A filha do casal F nasceu na cidade de Lisboa no dia 24 de Janeiro de 2023 – fls. 63 dos autos de suspensão de eficácia -;
ff) A Recorrente gozou ainda a sua licença de maternidade em Portugal, tendo ficado combinado com a entidade empregadora que voltaria para Macau o mais cedo possível para trabalhar, assim fosse aconselhável viajar com a sua filha, e assim esta completasse a primeira dose de vacinações;
gg) A Recorrente acabou por regressar à RAEM pouco tempo depois da sua licença de maternidade terminar, numa altura em que a criança não perfizera ainda três meses de idade;
hh) Chegando a Macau a Recorrente foi confrontada com o facto de que a sua autorização de residência havia sido revogada; de facto, enquanto passava pelo controlo de migração foi informada do sucedido, tendo-lhe sido imediatamente cassado o Bilhete de Identidade de Residente Não-Permanente da RAEM;
ii) A Recorrente havia regressado a Macau acompanhada do seu marido e filha, confiante do que finalmente o seu núcleo familiar se poderia juntar a ela na RAEM;
jj) A Recorrente e os seus familiares trouxeram de Portugal a bagagem para assegurar que por aqui ficassem todos juntos durante muitos anos, desde roupa para os primeiros anos da bebé, um carrinho para ela se deslocar quando crescer, utensílios necessários à introdução alimentar da bebé aquando dos seus 6 meses, roupa e calçado para os próximos invernos;
kk) A Recorrente procedeu no passado dia 10 de Maio de 2023 à inscrição da sua filha na Creche XX para o ano lectivo de 2023/2024, após lhe ter sido atribuída vaga para a qual se candidatara no mês de Março passado;
ll) O facto de a Recorrente ter estado afastada de Macau nos últimos tempos foi absolutamente excepcional e esteve relacionado com preocupações de saúde, não traduzindo qualquer alteração do seu centro efectivo e estável de vida pessoal;
mm) A Recorrente tem uma óptima experiência de trabalho na empresa em que está inserida, estando perfeitamente realizadas as suas expectativas a nível profissional e encontrando-se perfeitamente integrada dentro da sua equipa de trabalho;
nn) Mesmo durante a sua ausência forçada por motivos de saúde, a Recorrente continuou a prestar a sua actividade profissional para a sua entidade empregadora, enquanto as circunstâncias permitiram – tanto as suas condições de saúde, como as possibilidades de trabalhar remotamente.
b) Do Direito
É do seguinte teor o Douto Parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público:
«1.
A, melhor identificada nos autos, veio interpor o presente recurso contencioso do acto administrativo praticado do Secretário para a Segurança que revogou a sua autorização de residência na Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China (RAEM), pedindo a respectiva anulação.
A Entidade Recorrida, devidamente citada, apresentou contestação e nela pugnou pela improcedência do recurso contencioso.
2.
(i.)
Começa a Recorrente por imputar ao acto recorrido o vício da incompetência do autor do acto. Em seu entender, a competência para a prática do acto de revogação da autorização de residência pertence ao Chefe do Executivo, sem que se mostre, segundo diz, que a mesma haja sido delegada na Entidade Recorrida, nomeadamente, através da Ordem Executiva n.º 182/2019.
Parece-nos, salvo o devido respeito, que não tem razão.
É incontroverso, à luz do disposto na norma do artigo 43.º da Lei n.º 16/2021, ao abrigo da qual foi praticado o acto recorrido, que é ao Chefe do Executivo que pertence a competência para revogar actos de autorização de residência na RAEM. Todavia, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 37.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), «os órgãos administrativos normalmente competentes para decidir em determinada matéria podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, permitir, através de um acto de delegação de poderes, que outro órgão ou agente pratique actos sobre a mesma matéria». É a chamada delegação de poderes.
Como se sabe, a norma do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 85/84/M, de 11 de Agosto, habilita expressamente o Chefe do Executivo a delegar nos Secretários do Governo, «as suas competências executivas em relação a todos ou a alguns dos assuntos relativos aos serviços públicos», e foi precisamente ao abrigo dessa habilitação normativa que o Chefe do Executivo, através da Ordem Executiva n.º 182/2019, delegou no Secretário para a Segurança as sua competências executivas em relação a todos os assuntos relativos às áreas de governação e aos serviços e entidades referidos no artigo 4.º do Regulamento n.º 6/1999.
Ora, decorre da alínea 5), do n.º 1, do artigo 4.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, que o Secretário para a Segurança exerce as suas competências, na área de governação atinente aos «controlos de imigração», cujo regime jurídico se encontra nuclearmente estabelecido na Lei n.º 16/2021, a qual como resulta do seu artigo 1.º «estabelece o regime jurídico do controlo de migração e das autorizações de permanência e residência na Região Administrativa Especial de Macau (…)». Como é bom de ver, a matéria relativa às autorizações de permanência e de residência, não constituem um aliud relativamente ao controlo da migração, constituindo, antes, um instrumento fundamental desse controlo. Daí que se deva entender, segundo cremos, que a competência revogatória que a norma do artigo 43.º da referida Lei n.º 16/2021 defere ao Chefe do Executivo se mostra, contrariamente ao que vem alegado pela Recorrente, abrangida pela delegação de competências constante da Ordem Executiva n.º 182/2019.
Concluímos, assim, que, tendo a Entidade Recorrida praticado o acto impugnado ao abrigo da falada delegação de competências, não sofre o mesmo do vício da incompetência arguido pela Recorrente.
(ii)
(ii.1)
O segundo fundamento do presente é o da preterição da audiência prévia da Recorrente, em virtude de esta, segundo alega, não ter sido notificada para esse efeito.
Neste ponto, estamos em crer que a pretensão impugnatória deduzida nos presentes autos merece ser acolhida. Pelo seguinte.
Dispõe o n.º 1 do artigo 93.º do CPA que, «[s]alvo o disposto nos artigos 96.º e 97.º, concluída a instrução, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta» e como aponta a melhor doutrina, através dessa audiência dos interessados, prévia à decisão final, procura a lei evitar decisões-surpresa, facultando ao particular a possibilidade de fazer valer a sua posição, e, além disso, auxiliar a Administração a decidir melhor, atendo ao contributos de facto e/ou de direito eventualmente trazidos ao procedimento pelos particulares (nestes termos, MARCELO REBELO DE SOUSA - ANDRÉ SALGADO DE MATOS, Direito Administrativo Geral, tomo III, Lisboa, 2007, p. 127).
No caso, como já dissemos, alega a Recorrente não lhe ter sido facultada aquela audiência prévia, em virtude de não ter sido notificada pela Administração para esse efeito.
Parece-nos que assim é.
Com efeito, está demonstrado nos autos e não é, aliás, objecto de controvérsia entre as partes, que (α) a Administração enviou uma carta registada que endereçou à Recorrente, contendo um ofício visando comunicar a esta a possibilidade de exercer por escrito, e no prazo de 15 dias, o direito de audiência a que se refere o artigo 93.º do CPA, a propósito da projectada revogação da autorização de residência e que, (β) essa carta foi devolvida à Administração por não ter sido entregue à Recorrente nem ter sido por ela reclamada.
Da conjugação das normas dos nºs 2 e 3 do artigo 13.º da Lei n.º 16/2021 resulta que as notificações postais são feitas ao interessado, ou ao seu representante legal ou mandatário constituído, no lugar da sua sede, no lugar da sua residência habitual ou do domicílio escolhido para o efeito de as receber, conforme os casos, sob registo, presumindo-se que a notificação postal se considera feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte quando aquele o não for.
No caso, a Administração parece querer valer-se desta presunção legal (cfr., por exemplo, os artigos 18.º e 19.º da douta contestação).
O ponto está, no entanto, em que, comprovadamente, a carta enviada para notificação da Recorrente foi devolvida ao remetente e, portanto, não lhe foi entregue. Ora, como é bom de ver, a devolução da carta ao remetente impede que a Recorrente se tenha por notificada.
Na verdade, nem da norma do n.º 3 do artigo 13.º da Lei n.º 16/2021, nem da do artigo 72.º do CPA, resulta que a notificação se considere efectuada nas situações em que carta seja devolvida ao remetente e, por outro lado, não é aplicável no procedimento administrativo a regra, certamente excepcional, que se consagra no n.º 3 do artigo 201.º do Código de Processo Civil [segundo o aí preceituado, «a notificação produz efeito mesmo que os papéis sejam devolvidos, desde que a remessa tenha sido feita para o escritório ou para o domicílio por ele escolhido (…)»].
É certo que, como vimos, de acordo com o n.º 3 do artigo 13.º da Lei n.º 16/2021, «a notificação postal considera-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte quando aquele o não for (…)». Todavia, essa presunção tem o seu âmbito circunscrito à determinação do momento da notificação, no pressuposto, portanto, de que a carta chegou ao seu destino. A lei presume que a carta foi entregue no 3.º dia posterior ao do registo. Contudo, se a carta foi devolvida, fica inelutavelmente demonstrado que a notificação não ocorreu, pelo que não fará sentido invocar a presunção de que ela ocorreu numa certa data. É o que resulta, fora de dúvida, do n.º 5 do mesmo artigo 13.º (aí se preceitua: «a presunção prevista no n.º 3 só pode ser ilidida pelo notificando quando a recepção da notificação ocorra em data posterior à presumida, por razões imputáveis aos serviços postais»), em que apenas se admite a possibilidade de ilidir a presunção, através da demonstração de que a notificação ocorreu em data posterior à presumida, mas não, quando a notificação, comprovadamente, não tiver ocorrido.
Assim, somos a concluir que a Recorrente não foi notificada para se pronunciar, querendo, sobre a intenção da Administração de revogar a autorização de residência, previamente à decisão final que constitui o acto recorrido. Significa isto, portanto, que, este acto sofre do vício procedimental decorrente da violação do disposto no artigo 93.º do CPA, gerador da respectiva anulabilidade.
(ii.2)
O acto em causa, praticado que foi ao abrigo da norma da alínea 3) do n.º 2 do artigo 43.º da Lei n.º 16/2021, corresponde ao exercício de um poder discricionário («a autorização de residência na RAEM pode ser revogada, por despacho do Chefe do Executivo»).
Ora, entre nós tem vindo a ser decidido de modo uniforme que, quando tal suceda, não é possível aproveitar o acto praticado com preterição da audiência prévia. Apenas quando «no exercício de poderes vinculados por parte da Administração, o tribunal conclua, através de um juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa tomada era a única concretamente possível» é que a falta de audiência do interessado, prevista no art.º 93.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo se degrada em preterição de formalidade não essencial (assim, entre muitos outros, veja-se o acórdão do Tribunal de última Instância de 31.7.2020, processo n.º 18/2020).
Estando em causa um poder discricionário, só pode aproveitar-se o acto ferido de vício procedimental por omissão de audiência prévia nas situações em que a apreciação do caso permita identificar apenas uma solução como possível (as chamadas situações de redução da discricionariedade a zero). Ora, manifestamente, isso não sucede no caso em apreço pelo que, como dissemos, cremos ser inviável a neutralização do efeito invalidante do vício antes assinalado ao acto recorrido.
3.
Face ao exposto, salvo melhor opinião, somos de parecer de que o presente recurso contencioso deve ser julgado procedente, devendo, em consequência, ser anulado o acto recorrido.».
O Douto Parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público vem de acordo com aquela que tem vindo a ser Jurisprudência deste Tribunal em situações idênticas.
No caso em apreço está assente e demonstrado que a notificação não foi entregue ao interessado, porquanto havia sido constituído mandatário para receber as notificações e a sua ausência de Macau era do conhecimento da Administração, sendo até o fundamento do acto.
Destarte, concordando integralmente com a fundamentação constante do Douto Parecer supra reproduzido à qual aderimos, impõe-se decidir em conformidade.
Assim se concluindo, e uma vez demonstrado que foi preterida a audição prévia da interessada sem que para tal haja fundamento legal violando-se o disposto nos artº 93º e 94º do CPA, de acordo com o disposto no artº 124º do mesmo diploma legal impõe-se anular o acto impugnado por vício de forma.
IV. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, concedendo-se provimento ao recurso anula-se o acto impugnado.
Sem custas por delas estar isenta a Entidade Recorrida.
Registe e Notifique.
RAEM, 18 de Abril de 2024
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)
Fong Man Chong
(1º Adjunto)
Ho Wai Neng
(2º Adjunto)
Mai Man Ieng
(Procurador-Adjunto)
368/2023 REC CONT 66