Processo n.º 59/2022
(Autos de recurso em matéria cível)
Relator: Fong Man Chong
Data: 25 de Abril de 2024
ASSUNTOS:
- Pedido de junção aos autos escrituração mercantil na posse da sociedade comercial que é parte do processo
SUMÁRIO:
Quando, em nome dos princípios inquisitório e de cooperação (artigos 6º e 8º do CPC) e também para a descoberta da verdade material, o Autor pediu ao Tribunal que fosse notificada a 1ª Ré (sociedade comercial) para juntar aos autos um conjunto de documentos de escrituração mercantil (mais do que 10), tendo justificado os pedidos em casua, para comprovar os quesitos expressamente indicados, porque ele, o Autor, não é sócio da 1ª Ré, mas existe um acordo entre eles, a 1ª Ré reconhecia ao Autor o direito de receber 30% sobre os lucros distribuíveis anuais, tendo a Ré cumprido tal acordo, procedendo ao pagamento de quantias nos anos 2015 a 2017 conforme os factos dados como assentes pelo Tribunbal recorrido, os pedidos do Autor devem ser atendidos porque são dados pertinentes e têm valor para a boa decisão da causa. Quando o Tribunal recorrido, sem razão bastante e ponderosa, indeferiu tais pedidos, incorreu na violação dos princípios acima referidos e como tal deve ser revogado o despacho impugnado, deferindo-se os pedidos e mandando-se a repetição do julgamento sobre a matéria de facto nos termos legalmente prescritos (artigo 629º/3 do CPC).
O Relator,
________________
Fong Man Chong
Processo nº 59/2022
(Autos de recurso em matéria cível)
Data : 25 de Abril de 2024
Recorrente : Recurso Final / Recurso Interlocutório
- AXX (Autor)
Recorridos : - Serviços de Segurança B, Limitada (B保安有限公司) (1ª Ré)
- CXX (2º Réu)
- DXX (3º Réu)
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Nota prévia:
1 – Em 24/03/2022 por este TSI foi proferida no âmbito destes autos a seguinte decisão:
“Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em conceder provimento ao recurso interlocutório interposto pelo Autor/Recorrente, revogando-se o despacho recorrido, deferindo-se as diligências probatórias e ordenando-se, depois de repetido o julgamento, proferir nova decisão de mérito em conformidade.
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Custas pelos Recorridos a conta final.
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Registe e Notifique.”
2 – Contra a referida decisão foi interposto recurso para o TUI, tendo este proferido o acórdão em 17/01/2024, com a seguinte decisão:
“Nos termos e fundamentos que se deixaram expendidos, em conferência, acordam:
- não admitir o recurso dos 2° e 3° RR., CXX e DXX, com custas pelo incidente pelos mesmos e com taxa de justiça individual de 3 UCs;
- conceder parcial provimento ao recurso da 1ª R., “SERVIÇOS DE SEGURANÇA B, LIMITADA”, revogando-se o Acórdão recorrido nos exactos termos consignados, suportando a recorrente e o A. recorrido as respectivas custas pelos seus decaimentos, com taxa de justiça individual que se fixa em 3 e 5 UCs.
Registe e notifique.”
3 – Cabe agora cumprir a decisão do venerando TUI.
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Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I - RELATÓRIO
A – Recurso interlocutório:
AXX, Recorrente, com os sinais identificativos nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datado de 28/05/2020 e 19/06/2020 (fls.582, 583 e 594), veio, em 23/09/2020, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 662 a 693, tendo formulado as seguintes conclusões:
a) Vem o presente recurso interposto do Douto Despacho do Douto Tribunal Judicial de Base, proferido em 19 de Junho de 2020, constante de fls. 594 dos autos à margem epigrafados, na parte em que indefere os pontos I a V do requerimento de prova do Recorrente, remetendo para os argumentos previamente invocados no despacho constante de fls. 582 a 583 dos referidos autos.
b) Imputa o Recorrente ao suprarreferido despacho a violação do Principio do Inquisitório, prevista no art.º 6.° do Código do Processo Civil, assim como o vicio de erro de julgamento na verificação dos requisitos do art.º 455.°, n.º 1 e 2, do Código do Processo Civil, e, por inerência, de forma mais lata, a violação do Principio da Cooperação, previsto nos termos do art.º 8.° do Código do Processo Civil.
c) O Douto Tribunal a quo, no seu douto despacho constante de fls. 575, dou o Recorrente a aperfeiçoar o seu requerimento de prova, indicando os quesitos concretos que pretendia provar com os documentos cuja apresentação requeria da 1.ª Ré e de terceiro.
d) Por intermédio de requerimento apresentado em 15 de Junho de 2020, em estrito cumprimento do suprarreferido despacho proferido pelo Douto Tribunal a quo, o Recorrente especificou os quesitos que pretendia provar com os documentos cuja apresentação requeria da 1.ª Ré e de terceiro nos pontos I a V do seu requerimento de prova.
e) Tendo sido proferido despacho de aperfeiçoamento do requerimento de prova do Recorrente no qual este era convidado a especificar os quesitos que pretendia provar com a prova requerida, é razoável inferir que mais nenhuma questão formal obstasse à apreciação do mérito dos pedidos formulados.
f) Conforme decorre do Principio do Inquisitório, previsto no art.º 6.° do Código do Processo Civil, o "Incumbe ao juiz, sem prejuízo do ónus da iniciativa das partes, providenciar pelo andamento regular e célere do processo, ordenando as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção e recusando o que for impertinente ou meramente dilatório." (n.º 1 do suprarreferido artigo).
g) O indeferimento dos pontos I a V do requerimento de prova do Recorrente com o fundamento de que este devia, igualmente, ter identificado os documentos cuja apresentação pretendia da 1.ª Ré e de terceiro, atenta contra o Principio do Inquisitório, previsto no art.º 6.° do Código do Processo Civil, na medida em que, caso fosse esse o entendimento ab initio do Douto Tribunal a quo, deveria ser feita menção desse entendimento no despacho constante de fls. 575, permitindo dessa forma ao Recorrente conformar o seu comportamento ao douto entendimento do Tribunal e especificar, na medida do possível, os documentos cuja apresentação requeria da 1.ª Ré e de terceiro, dessa forma se servindo com maior acuidade a prossecução da descoberta da verdade material e da justa composição do litigio, que decorrem do principio suprarreferido.
h) Atento o pedido principal formulado pelo Autor na P.I. (distribuição de lucros da 1.ª Ré) e facto de a Ré alegar não ter obtido lucros nos anos de 2017 e 2018, não é difícil vislumbrar a importância central que a análise da escrituração mercantil, globalmente considerada, tem para a justa composição do litígio, a favor de qualquer uma das partes, sendo um meio de prova bastante mais fidedigno do que a prova testemunhal.
i) Acentuando, por conseguinte, a incumbência que sobre o Douto Tribunal a quo recaía de oficiosamente solicitar ao Recorrente o aperfeiçoamento do seu requerimento de prova, atendendo-se ao facto de se tratar de faltas supríveis do Recorrente e que aproveitam ao apuramento da verdade e à justa composição do litigio, em mor cumprimento do poder-dever previsto nos termos do art.° 6.° do Código do Processo Civil.
j) Salvaguardado o devido respeito, entende o Recorrente que andou mal o Douto Tribunal a quo ao não ter solicitado, igualmente, no douto despacho de fls. 575 dos autos, a especificação dos documentos requeridos pelo Recorrente, não tendo assim dado pleno cumprimento ao Principio do Inquisitório, perigando, por conseguinte, a descoberta da verdade material e a justa composição do litigio, por um lado.
k) No que diz respeito à não especificação do documento ou dos documentos em concreto cuja apresentação se requeria, o Recorrente escolheu a formula "a escrituração mercantil e documentos com ela relacionados" porque da factualidade, segundo a tese defendida pelo Recorrente, decorre que existiu conluio do 2.° e 3.° Réus para, de forma intencional, impedir o Recorrente de receber não os lucros gerados pela 1.ª Ré e esvaziar a actividade desta transferindo o contrato de prestação de serviços de segurança celebrado com o único cliente e exclusiva fonte de rendimento da 1.ª Ré para outra sociedade, a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", ora, encontrando-se o Recorrente do lado de fora da actividade administrativa tanto da 1.ª Ré como da "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", não tem forma de saber como esta organizam os seus livros e fazem o lançamento do registo da sua actividade comercial, podendo, caso nomeasse apenas o livro de balanços ou outro qualquer livro de escrituração mercantil obrigatório, ver frustradas as suas necessidades de prova por não ser possível aferir toda a informação pertinente e, mais importante, aferir se realmente existiu conluio entre os 2.° e 3.° Réus para prejudicar os interesses do Recorrente, conforme decorre dos quesitos 29, 31, 32 (etc) da Douta Base Instrutória.
l) O Recorrente entendeu ser necessário que a 1.ª Ré e a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", terceira à presente acção, apresentassem toda a sua escrituração mercantil para comprovar a tese de que a 1.ª Ré é e sempre foi uma companhia viável e por força do conluio entre o 2.° e 3.° Réus, deixou de distribuir os lucros devidos ao Recorrente, apesar de existirem, e transferiu toda a sua actividade e trabalhadores (da 1.ª Ré) para a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", controlada pelo 2.° e 3.° Réus, com vista a desonerar a 1.ª Ré de pagar lucros ao Recorrente no futuro.
m) Entende o Recorrente que para provar o acima exposto a 1.ª Ré e a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", têm de se comprometer perante o tribunal a apresentar toda a sua escrituração e documentos com ela relacionados, pois só assim será possível garantir que os documentos relevantes à prova dos factos quesitados na base instrutória, e devidamente identificados pelo Recorrente, serão apresentados em juízo, sob pena de aplicação da cominação prevista no art.º 456.° (que remete para as cominações do 442.°, n.º 2) e 459.° do Código do Processo Civil.
n) Nos termos do art.º 455.° do Código de Processo Civil assiste à parte interessada, quando pretenda fazer uso de documento em poder da parte contrária, a faculdade de requerer ao tribunal que notifique a outra parte para apresentar o documento dentro do prazo que for designado.
o) No que diz respeito à escrituração mercantil e documentos a ela relativos da 1.ª Ré, requeridos no Ponto I do Requerimento de Prova do Recorrente, a justificação do pedido da sua exibição decorre dos factos que o Recorrente pretende provar, constantes dos quesitos da Base Instrutória especificados pelo Recorrente, nomeadamente os quesitos: 8.°, 9.°, 12.°, 13.º, 14.º, 15.º, 18.°, 19.º, 27.°, 29.°, 31.°, 41.° e 44.°, que aqui se dão por legalmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
p) Analisados os suprarreferidos quesitos, dúvidas não existem relativamente à existência de um interesse sério e fundado do Recorrente na exibição da escrituração mercantil e dos documentos a ela relativos da 1.ª Ré, com vista à prova dos factos aí constantes.
q) Por outro lado, é entendimento pacifico tanto da doutrina como da jurisprudência que a especificação dos factos que se pretende provar, para efeitos do art.º 455.°, n.º 1, do Código do Processo Civil, é feita através da simples alusão aos respectivos quesitos da Base Instrutória em que estes se encontram inseridos.
r) Ora, assentando toda a narrativa do Recorrente no facto de a 1.ª Ré, intencionalmente, tê-lo privado dos lucros a que tinha direito e ter transferido o contrato de prestação de serviços de segurança do único cliente que detinha para outra sociedade comercial, a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", com vista a prejudicá-lo e furtar-se a distribuir-lhe os lucros devidos, e o facto de a 1.ª Ré alegar não ter tido lucros nos exercícios de 2017 e 2018, período relativamente ao qual o Recorrente reclama ter lucros a receber, salvo o devido respeito por opinião contrária, tem plena pertinência a consulta integral da escrituração mercantil e dos documentos a ela relativos, com vista a aferir da existência ou não de lucros e se efectivamente foram levadas a cabo acções deliberadas para privar o Recorrente dos lucros que vinha recebendo ano após ano.
s) O mesmo raciocínio é válido no que toca à apresentação de documento em poder de terceiro, no caso a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", nos termos do art.º 458.º do Código do Processo Civil, que opera uma remissão para os requisitos previstos no art.º 455.º do mesmo código, que por razões de desnecessidade e economia de meios aqui se dá por reproduzido o acima afirmado.
t) Tendo sido requerida escrituração mercantil de terceiro, também aqui se aplica o art.º 461.º do Código do Processo Civil e o art.º 52.º do Código Comercial, nos termos que acima se explanou.
u) No que diz respeito à escrituração mercantil da "Companhia de Segurança F Limitada" (terceira à presente acção) e documentos a ela relativos, requeridos no Ponto V do Requerimento de Prova do Recorrente, a justificação do pedido da sua exibição decorre dos factos que o Recorrente pretende provar, constantes dos quesitos da Base Instrutória especificados pelo Recorrente, nomeadamente os quesitos: 29.°, 31.°, 35.°, 39.°, 40.º e 41.º que aqui se dão por legalmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
v) Os factos constantes dos suprarreferidos quesitos são referentes à tese defendida pelo Recorrente na P.I. de que o contrato de prestação de serviços de segurança mantido entre a 1.ª Ré e a empresa "G Property Management Company Limited" foi "perdido" de forma intencional para que passasse constar como prestador dos mesmos serviços a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", controlada pelos 2.° e 3.º Réus, sócios fundadores da 1.ª Ré, que opera com os mesmos trabalhadores que eram funcionários da 1.ª Ré, e dessa forma inviabilizar a percepção dos lucros da 1.ª Ré pelo Recorrente, que resultavam exclusivamente do suprarreferido contrato.
w) O interesse do Recorrente na consulta integral escrituração mercantil e dos documentos com ela relacionados da "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada" é plenamente justificado e também se afigura claro e evidente o interesse ou responsabilidade da suprarreferida companhia no assunto que justifica a exibição da escrituração mercantil.
x) No que diz respeito à não especificação do documento ou dos documentos em concreto cuja apresentação se requer, fazendo-se alusão à escrituração mercantil e documentos com ela relacionados, o Recorrente escolheu essa formula porque encontrando-se do lado de fora da actividade administrativa tanto da 1.ª Ré como da "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", não tem forma de saber como esta organizam os seus livros e fazem o lançamento do registo da sua actividade comercial, podendo, caso nomeasse apenas o livro de balanços, ver frustradas as suas necessidades de prova por não ser possível aferir toda a informação pertinente e, mais importante, se diligências foram levadas a cabo para prejudicar os interesses do Recorrente, conforme se encontra quesitado na Douta Base Instrutória.
y) Relativamente à escrituração mercantil e documentos a ela relacionados da 1.ª Ré, relativa ao período compreendido entre 2017 e 2018, requeridos no Ponto I do requerimento de prova do Recorrente, esses documentos visam comprovar a existência de lucros da 1.ª Ré no período em questão, a intenção deliberada de não distribuir lucros ao Recorrente, assim como as diligências levadas a cabo pelos 2.° e 3.° Réus, enquanto administradores de facto da 1.ª Ré, para esvaziar esta de toda a sua actividade comercial, conforme é perceptível da leitura dos quesitos da base instrutória especificados pelo Recorrente, nomeadamente: 8.°, 9.°, 12.°, 13.°, 14.°, 15.°, 18.°, 19.°, 27.°, 29.° 31.°, 41.° e 44.°, que aqui se dão por legalmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
z) A obrigação de explicar a ligação entre os documentos requeridos e os factos a provar não resulta da lei, porquanto o art.° 455.°, n.º 1 do Código do Processo Civil prevê que "no requerimento a parte identifica quanto possível o documento e especifica os factos que com ele quer provar.".
aa) Resulta óbvio da leitura dos quesitos da Base Instrutória especificado pelo Recorrente, nomeadamente, os quesitos: 9.°, 12.°, 22.°, 29.°, 31.°, 35.°, e 40.º , que aqui se dão por legalmente reproduzidos para todos os efeitos legais, que os documentos requeridos no Ponto II, III e IV do requerimento de prova do Recorrente, servem fundamentalmente para demonstrar que os trabalhadores da 1.ª Ré, que vinham trabalhando para esta, pelo menos no período compreendido entre 2016 e 2019, são os mesmos que neste momento se encontram a trabalhar para a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", prestando exactamente o mesmo serviço, nas mesmas instalações, porém, por outra companhia.
bb) Não se afigura difícil vislumbrar que a única forma de o Recorrente poder demonstrar que os 2.° e 3.° Réus transferiram a totalidade dos trabalhadores da 1.ª Ré para a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada" é através da comparação dos respectivos formulários da Direcção dos Serviços de Finanças M3/M4 relativos ao pagamento do imposto profissional e o comprovativo do pagamento do Fundo de Segurança Social da Taxa de Contratação de trabalhadores não residentes, relativo ao período entre 2017 e 2019, da 1.ª Ré com os da "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada".
cc) Relativamente aos documentos requeridos no Ponto V do requerimento de prova do Recorrente, nomeadamente: escrituração mercantil e documentos com ela relacionados relativos aos exercícios de 2017 e 2018, os formulários da Direcção dos Serviços de Finanças M3/M4 relativos ao pagamento do imposto profissional dos anos 2017, 2018 e 2019 e o comprovativo do pagamento do Fundo de Segurança Social da Taxa de Contratação de trabalhadores não residentes relativo aos anos de 2017 a 2019 da "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", terceira na presente acção, têm como propósito comprovar a tese do Recorrente de que o 2.° e 3.° Réus, com vista a prejudicar o Recorrente, esvaziaram a actividade da 1.ª Ré, transferindo o contrato de prestação de serviços de segurança do seu único cliente, assim como todos os seus trabalhadores, para a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", sociedade controlada pelos 2.° e 3.° Réus, com vista a privar o Recorrente dos lucros a que tinha direito na 1.ª Ré, esvaziando a 1.ª Ré da sua única fonte de rendimento e de todos os seus trabalhadores, conforme resulta da leitura dos quesitos especificado pelo Recorrente, nomeadamente, os quesitos: 29.°,31.°,35.°,39.°,40.° e 41.°, que aqui se dão por legalmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
dd) No seu requerimento de prova, o Recorrente não se debruçou a explicar a relação especifica entre os documentos requeridos nos Pontos I a V do requerimento de prova e os factos constantes dos respectivos quesitos, primeiro, porque a tal não estava obrigado, nos termos dos artigos 455.°, n.º 1 e 458.° do Código do Processo Civil, estando apenas obrigado a identificar os quesitos onde os factos carentes de prova se inserem, e, por outro, porque se afigurava desnecessário e fútil o exercício de demonstração da ligação entre os documentos requeridos nos Pontos I a V do requerimento de prova e os factos inseridos nos quesitos da Base Instrutória especificados pelo Recorrente, pois a pertinência é óbvia e resulta da simples leitura dos quesitos em questão.
ee) Por tudo o acima exposto, entende o Recorrente, salvaguardado o respeito pela opinião do Douto Tribunal a quo, ser o douto despacho recorrido violador do art.º 455.° do Código do Processo Civil, por se verificarem preenchidos os requisitos aí previstos para o deferimento da pretensão apresentada, nomeadamente para se notificar a 1.ª Ré e a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", para apresentar os documentos solicitados. Não o fazendo, incorreu ainda o douto despacho recorrido em violação do Principio da Cooperação, previsto nos termos do art.º 8.° do Código do Processo Civil, o qual prevê no seu n.º 1 que "Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as partes cooperar entre si, contribuindo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio." e ainda no seu n.º 4 que "Sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo."
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Os Recorridos, Serviços de Segurança B, Limitada (B保安有限公司), CXX e DXX, veio, 03/11/2020, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 702 a 714, tendo formulado as seguintes conclusões:
Vem o presente recurso interposto pelo Recorrente do douto despacho de fls. 594 na parte em que indefere os pedidos I a V do requerimento de prova do Recorrente, A. nos autos.
Entendem os Recorridos que foi correcta e acertada a douta decisão recorrida porquanto é a única que se conforma com a lei aplicável.
Senão vejamos,
Por requerimento de 13 de Março de 2020 (fls. 482 a 486 dos autos), o Recorrente solicitou, como diligência probatória a junção:
I. da escrituração mercantil da 1.ª R. e documentos com ela relacionados, dos exercícios de 2017 e 2018;
II. dos formulários M3/M4 relativos ao imposto profissional pago pela 1.ª R. dos seus empregados inscritos para os anos de 2016 a 2019;
III. dos comprovativos dos pagamentos feitos pela 1.ª R. ao Fundo de Segurança Social relativos aos anos de 2016 a 2019;
IV. dos comprovativos dos pagamentos feitos pela 1.ª R. ao Fundo de Segurança Social da taxa de contratação mensal dos trabalhadores não residentes relativos aos anos de 2016 a 2019;
tudo ao abrigo do artigo 455.° do Código de Processo Civil (“CPC”),
e
V. a notificação da sociedade Companhia de Segurança F Limitada, para vir juntar (a) a sua escrituração mercantil de 2017 e 2018, (b) os formulários M3/M4 relativos ao imposto profissional dos seus empregados inscritos para os anos de 2017 a 2019, (c) comprovativos dos pagamentos feitos ao Fundo de Segurança Social relativos aos anos de 2017 a 2019 e (d) os comprovativos dos pagamentos feitos ao Fundo de Segurança Social da taxa de contratação mensal dos trabalhadores não residentes relativos aos anos de 2017 a 2019, ao abrigo artigo 458.° do CPC, para tudo dando apenas por justificação entenderem "serem fundamentais à descoberta da verdade material".
Sobre este requerimento recaiu o despacho de fls. 575 que determina:
" - Fls. 482 a 486, ponto I a V:
Antes de mais, notifique o Autor para indicar os respectivos quesitos concretos que a apresentação de documentos pela parte contrária e por terceiro se destina a comprovar.”
Sobre este requerimento recaiu posteriormente o despacho de fls. 582 ss., que cita várias razões para indeferir os pedidos, e não apenas a falta de indicação específica dos quesitos.
Em cumprimento do solicitado pelo Ilustre Tribunal, o ora Recorrente veio esclarecer quais os quesitos a provar por requerimento de 15 de Junho de 2020.
Não obstante esta indicação de quesitos, vêm, a final, as diligências de prova acima mencionadas indeferidas pelo douto despacho recorrido de fls. 594 (que remete para o despacho de fls.582 ss) com base nos seguintes fundamentos:
- não ter o A. identificado os documentos específicos que pretendia ver juntos pela 1.ª R. (fundamento que pode ler-se quer do douto despacho de fls. 582 como do de fls. 594);
- o carácter secreto da escrituração;
- a irrelevância dos formulários fiscais e do Fundo de Segurança Social da 1.ª R. para a decisão da causa; e
- a solicitação de documentos na posse de terceiros (ponto V do requerimento de prova) sem especificação de quais os documentos pretendidos e sem justificar a relação dos mesmo para a decisão da causa, que acrescem ao carácter secreto da escrituração dessa sociedade.
Não obstante a clareza da fundamentação e a justeza da decisão recorrida, vem o ora Recorrente invocar (artigos 16.° a 19.º do recurso) que "caso fosse entendimento ab initio do Douto Tribunal a quo a necessidade de os especificar, deveria ser feita menção desse entendimento no despacho constante de fls. 575 (...)”.
Ora, o fundamento em causa não é um entendimento (inicial ou posterior) do Ilustre Tribunal a quo mas a (não) verificação do cumprimento de um requisito legal que cabia ao A. ter preenchido, ora Recorrente, quando elaborou o seu requerimento, não necessitando de ser lembrado das suas obrigações processuais.
Acresce que, propositadamente, o despacho de fls. 575v especifica "Antes de mais (...)”, de onde se compreende claramente que o Ilustre Tribunal quis saber quais os quesitos em causa, antes de avaliar a legalidade e relevância do requerimento, daqui jamais se podendo retirar a conclusão que consta do artigo 16 do recurso.
Na realidade, era legítimo ao Tribunal a quo indeferir o pedido do A. sem solicitar qualquer aperfeiçoamento uma vez que, inicialmente, o A. não cumpriu nenhum dos requisitos legais que o artigo 455.° do CPP impunha ao pedido efectuado: (i) identificar o documento que pretendia o quanto possível e (ii) especificar os factos que com ele queria provar.
Nenhum destes requisitos é gerador de controvérsia e qualquer um deles é absolutamente claro no seu significado e na sua obrigatoriedade cumulativa.
Após esclarecimento dos quesitos em causa, e tendo estes em consideração, a douta decisão recorrida entendeu, a nosso ver bem, indeferir o solicitado pelo Recorrente.
Identificação dos documentos em posse da parte contrária
A lei impõe ao requerente a obrigação de identificar os documentos que pretende que a parte contrária apresente.
E, certamente, o Recorrente tinha obrigação, nos termos e para os efeitos do artigo 455.º, n.º 1 do CPC, de identificar mais que “a escrituração mercantil e documentos a ela relacionados”
Em redacção semelhante do equivalente preceito do Código de Processo Civil português anotou o Ilustre Professor Alberto dos Reis:
"2. Requerimento. A parte tem de especificar no seu requerimento:
a) em que consiste o documento:
b) quais os fados que por meio dele intenta provar.
A 1.ª exigência tem por fim dar a conhecer ao notificado qual o documento que dele requisita.
(..)
Na verdade, para que a parte contrária possa tomar conscientemente qualquer atitude perante o despacho que requisitar a apresentação, é indispensável que ela saiba, ao certo, qual a espécie de documento que se lhe exige - se uma carta, se uma letra, se um relatório, se um balanço, se um título de arrendamento, etc. E não basta que se indique a espécie em abstracto, é necessário que se caracterize a espécie, que se individualize o documento, dizendo-se, por exemplo, de que data é a carta e quem a expediu, a que prédio se refere o arrendamento e em que data se celebrou, etc." (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. IV, Coimbra Editora, 3.ª edição, anotação ao artigo 552.°).
Razão pela qual, foi acertada, está fundamentada e não merece reparo a douta decisão recorrida nesta parte.
Carácter secreto da escrituração
A propósito do carácter secreto da escrituração mercantil e das excepções a este princípio, pronunciou-se o Tribunal da Relação do Porto (face a um pedido bastante mais específico que o do Recorrente) no seguinte sentido:
I - O artº 41° do Código Comercial consagra o princípio geral do carácter secreto da escrituração comercial.
II - Porém, no que se refere às relações civis, regulam os art°s 42° e 43° do Código Comercial as formas de aceder à escrituração mercantil, por remissão do art° 534° do CPC
III - O artº 42º permite a exibição judicial por inteiro, da escrituração comercial e dos documentos a ela relativos, a favor dos interessados, em questões de sucessão universal, comunhão ou sociedade e no caso de quebra - em qualquer uma destas circunstâncias o comerciante é obrigado, se lhe for solicitado, a colocar à disposição do tribunal toda a escrituração mercantil, para ser analisada com vista à prova das questões suscitadas.
IV - Por sua ve4 o art° 43° admite um exame parcial da escrita mercantil, que pode ser requerido por qualquer uma das partes em litígio ou oficiosamente, relativamente à escrita na posse da outra ou mesmo de terceiro, desde que a pessoa a quem pertençam tenha interesse ou responsabilidade na questão em que tal apresentação for exigida.
V - O exame a realizar está conexo com a prova por arbitramento ou inspecção judicial – com efeito, estas diligências permitem conciliar, de forma proporcional, os direitos ao segredo comercial e à descoberta da verdade material.
VI – De um lado, os peritos ou o tribunal analisam e avaliam, no escritório do comerciante, o que importa ao apuramento da verdade sem reproduzirem as partes inspeccionadas ou examinadas; de outro lado, assim se evita que a escrita, ou parte dela, estando à disposição do tribunal, possa ficar fora do controle do comerciante e ao alcance de terceiros.
VII - O que quer dizer que, se o comerciante não autorizar outra forma de análise da escrita mercantil, esta só poderá ser feita nos termos específicos do art° 43° do C. Comercial.
VIII - Assim, salvo expressa disposição legal nesse sentido, nunca é permitida a cópia, reprodução, requisição ou apreensão dos documentos de escrituração sem a anuência da entidade cuja escrita é examinada. (sublinhado nosso)
(Proc. n.º 7494/06.9TBLRA.C1, de 19 de Janeiro de 2010, in http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/a0bbf336051f16f9802576ba005762bf?OpenDocument)
Nos números 1, 2 e 3 do artigo 52.° do Código Comercial podemos encontrar a combinação dos artigos 41.°, 42.° e 43.° do Código Comercial português, respectivamente, sendo-lhe aplicável a mesma lógica de aplicação jurídica exposta na .decisão acima citada, que se crê ser, por si só, esclarecedora.
Cabe, nesta fase, salientar que requerimento do Recorrente foi da juncão de toda a escrituração mercantil e documentos com ela relacionados (o que reitera no artigo 39.º das suas alegações de recurso).
Ora, a escritura mercantil pode ser integralmente exibida (mas não junta) exclusivamente nas circunstâncias do n.º 2 do artigo 52.º do Código Comercial e não nos casos referidos no n.º 3 do mesmo preceito.
E que, tal como os recorridos pugnaram atempadamente, não tem aplicação nos autos em apreço porquanto não se trata de nenhuma das situações jurídicas que estão identificadas nesse preceito.
Mas também o próprio Recorrente vem afastar expressamente a aplicação do n.º 2, indicando no artigo 34.º das suas alegações de recurso que é o n.º 3 o preceito pertinente no caso, deixando clara a invalidade legal da sua pretensão.
Explicação e destrinça que, aliás, lhe cabia ter feito no requerimento de prova, e não em sede de alegações.
Ora, o n.º 3 do artigo 52.º não tem aplicação possível aos autos em apreço porque este preceito só é aplicável:
(i) ao exame (e não à junção que requereu);
(ii) parcial (e não integral como reitera) da escrituração mercantil;
(iii) restringindo-se "exclusivamente aos aspectos que tenham directa ligação com a questão que se trate” que o Recorrente em momento algum indicou junto do Tribunal a quo; e
(iv) "quando o empresário a quem pertença tenha interesse ou responsabilidade no assunto que justifica a exibição”, responsabilidade que não está apurada em sede própria e não pode, naturalmente, resultar de mera alegação do Recorrente.
Explicação que se crê afastar, em absoluto, a possibilidade de acesso por parte do Recorrente à escrituração mercantil da 1.ª Ré e, por maioria de razão, à da Companhia de Segurança F Limitada cuja relação ao recorrente é inexistente, não estando apurados nenhum dos factos que o Recorrente alega nos autos.
Como tal, e por todas as razões acima expostas, a pretensão do Recorrente só podia ser rejeitada, como o bem fez a decisão recorrida.
Irrelevância dos documentos solicitados para a decisão da causa
Mas ainda que os requisitos de aplicação do artigo 455.º, 458.º e 461.º do Código de Processo Civil, bem como o artigo 52.° do Código Comercial, estivessem verificados (o que não acontece), o Tribunal só deveria ordenar a notificação se os factos que a parte pretendia provar com os documentos tivessem interesse para a decisão da causa (artigo 455.º, n.º 2), o que o Ilustre Tribunal, no seu livre arbítrio, e fundamentadamente, entendeu, e bem, não acontecer.
Aos recorridos, tal como ao Ilustre Tribunal a quo, não foi possível descortinar qual a intenção do Recorrente ao solicitar também informação das listas de trabalhadores, e respectivos impostos profissionais, entregues na Direcção dos Serviços de Finanças, bem como sobre os pagamentos efectuados ao Fundo de Segurança Social da 1.ª R.,
documentos que, aliás, fazem parte da escrituração mercantil das sociedades e, como tal estão também sujeitos ao regime do artigo 52.º do Código Comercial.
Ao Recorrente cabia ter explicado essa relevância e relação no momento do seu requerimento de prova e perante o Ilustre Tribunal a quo, o que não fez, e não fazê-lo em sede de alegações de recurso.
A identificação dos factos que pretende provar através da indicação dos quesitos pode ser bastante quando a sua relação é óbvia mas, como acima se indicou, tal não acontece no caso em análise.
A pretensão, que não passa de uma mera alegação, que o Recorrente apresentou em tribunal e que ainda não logrou provar não justifica o acesso deste a toda a informação comercial de duas empresas, que, com tanto cuidado, a legislação comercial e processual procurou proteger.
O requerimento do Recorrente em sede de prova tem apenas por objectivo um acesso integral e ilegítimo à escrituração da 1.ª R. e de terceiros.
Documentos na posse de terceiro
A falta de relação e pertinência dos documentos solicitados para os factos aprovar é particularmente pertinente quanto à Companhia de Segurança F Limitada.
Ao Ilustre Tribunal a quo e aos recorridos, não foi possível compreender qual a relação possível, em particular destes documentos, com o pedido efectuado pelo A. nos autos.
Em relação à 1.ª R., tais documentos apenas poderiam atestar o cumprimento de obrigações legais que apenas à 1.ª R. dizem respeitem e cujo eventual incumprimento seria irrelevante e totalmente alheio à decisão da causa nos presentes autos.
O único quesito relativo à Companhia de Segurança F Limitada é o constante do artigo 31 da Base Instrutória que se refere ao lucro futuro desta sociedade.
Tendo isso consideração, em que medida a escrituração, as listas de trabalhadores e pagamentos ao Fundo de Segurança Social dos anos de 2017 a 2019 desta sociedade podem ser relevantes para a decisão da causa?
Até porque 2017 e 2018 são anos anteriores à relação contratual invocada pelo próprio A. nestes autos e estão absolutamente fora do alcance do artigo 31.º da Base Instrutória.
Relevância que não foi explicada em momento algum pelo ora Recorrente ao Tribunal a quo, momento e lugar próprio para o fazer, justificando também assim a justeza da decisão recorrido.
E os ora recorridos já haviam pugnado por essa irrelevância na sua Tréplica (artigos 61.º ss) e no seu requerimento de 2 de Abril de 2020, quando se pronunciaram sobre a admissibilidade do requerimento probatório do A..
Sem outra explicação oferecida pelo Recorrente, a autorização de tal pedido permitiria um acesso indiscriminado e não justificado, e como tal ilegítimo, a toda a informação e segredos comerciais da 1.ª R. e da Companhia de Segurança F Limitada.
O Recorrente deve balizar a prova aos quesitos que ficaram a constar da Base Instrutória e não à narrativa que apresentou nas suas peças e que não teve expressão naquela.
A Companhia de Segurança F Limitada só está ligada aos presentes autos através do quesito 31.° e, como tal, não pode querer o Recorrente que o tribunal aceite que documentação desta sirva para provar outros quesitos que não este e quando estejam em ligação com um facto específico a provar em julgamento.
Os quesitos 29.°, 35.°, 39.°, 40.° e 41.° (citados pelo Recorrente no artigo 54.º das suas alegações e que já constavam do seu requerimento a fls. 587) nada têm a ver com a Companhia de Segurança F Limitada,
assim se compreendendo a justeza e legalidade da decisão recorrida também nesta parte.
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B – Recurso da decisão final:
AXX, Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, datada de 01/07/2021, veio, em 05/10/2021, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 959 a 1118, tendo formulado as seguintes conclusões :
1. Vem o presente recurso interposto do douto Acordão proferido pelo Tribunal Colectivo nos vertentes autos, nos termos do qual foi julgada totalmente improcedente a presente acção e absolvidos os Réus de todos os pedidos formulados pelo Autor;
2. Autor formulou na sua petição inicial dos vertentes autos os seguintes pedidos: 1) Se condene a 1ª Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$1,200,000.00 (um milhão e duzentas mil patacas), acrescida de juros de mora já vencidos no valor de MOP$38,786.30 (trinta e oito mil setecentas e oitenta e seis patacas e trinta avos) desde 11 de Fevereiro de 2019, mais os juros à taxa legal que se continuarem a vencer até ao seu efectivo e integral pagamento; 2) Se condene a 1ª Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$600,000.00 (seiscentas mil patacas) por cada ano em que subsistir o contrato que vincula ambas as partes; e 3) Se condene o 2° Réu e o 3° Réu a pagarem solidariamente ao Autor a quantia de MOP$100,000.00 (cem mil patacas) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal a contar desde a data da citação;
3. O Autor efectuou a ampliação do pedido e causa de pedir na sua Réplica, nos seguintes termos: 1) Que seja reconhecido que a aqui 1ª Ré agiu em abuso de direito ao não deliberar a distribuição de lucros nos anos de 2017 e 2018; e 2) Que seja a 1ª Ré condenada a pagar ao Autor 30% dos lucros de exercício, a apurar pela forma legalmente prescrita, nos anos de 2017, 2018 e 2019;
4. Não deu o douto Tribunal Colectivo a quo como provados os seguintes quesitos, ou uma parte importante dos seguintes quesitos, relevantes para uma diversa decisão conforme pugna o ora Recorrente no presente recurso, e cujos documentos juntos aos autos, e a prestação de relevante prova testemunhal nas sessões de audiência de discussão e julgamento, impunha que tal acontecesse: Quesito 13ª - O douto Tribunal a quo deu como não provado todo o quesito: "Os Réus e o Autor acordaram que, em troca pela contribuição do Autor, em forma de prestação de serviços, teria o Autor direito a 30% dos lucros distribuíveis pelos sócios anualmente, sendo os lucros da sociedade distribuídos da seguinte forma: 40% cabiam ao 3° Réu, 30% cabiam ao 2° Réu e 30% cabiam ao Autor?"; Quesito 16° - O douto Tribunal a quo deu como provado "Em data não apurada de 2017, começou a ocorrer desavenças entre o Autor e o 2° Réu.", mas deu como não provado "o 2° e o 3° Réus delinearam um plano para excluírem o Autor de qualquer participação no negócio da 1ª Ré, por forma a garantirem que o Autor não voltaria a receber os lucros a que tinha direito por virtude do acordo celebrado com a 1ª Ré?"; Quesito 17° - O douto Tribunal a quo deu como não provado todo o quesito: "Assim, os 2° e 3° Réus, enquanto administradores da 1ª Ré, deram ordens para que deixasse de ser pago o vencimento que o Autor recebia da sociedade enquanto gerente operacional?"; Quesito 18° - O douto Tribunal a quo deu como não provado todo o quesito: "Por outro lado, decidiram deixar de lhe pagar o lucro a que ele tinha direito anualmente?"; Quesito 19° - O douto Tribunal a quo deu como provado "O vencimento fixo, referente aos meses de Agosto a Dezembro de 2017, foi pago ao Autor em Janeiro de 2018, após o protesto do Autor.", mas deu como não provado "mas não lhe pagou o lucro a que ele tinha direito referente aos anos de 2017 e 2018?"; Quesito 22° - O douto Tribunal a quo deu como não provado todo o quesito: "É ele responsável pela contratação de trabalhadores?"; Quesito 27° - O douto Tribunal a quo deu como provado "O Autor aceitou o convite, tendo o Autor e a 1ª Ré acordado que o Autor recebesse da 1ª Ré um vencimento fixo e mensal enquanto gerente operacional da empresa e que o Autor se obrigasse a montar, organizar e gerir a estrutura de segurança do hotel H, e a associar-se ao exercício da actividade levada a cabo pela 1ª Ré no hotel H.", mas deu como não provado "E foi por isso que esta se disponibilizou a não só pagar um vencimento ao Autor como a conceder-lhe 30% dos lucfros anuais da sociedade?"; Quesito 28° - O douto Tribunal a quo deu como não provado todo o quesito: "Nunca foi o acordo celebrado entre a 1ª Ré e o Autor denunciado ou resolvido?"; Quesito 30° - O douto Tribunal a quo deu como não provado todo o quesito: "O Autor não aceitou a cessação da actividade da 1ª Ré?"; Quesito 31° - O douto Tribunal a quo deu como provado "A partir de 1 de Julho de 2019 quem ficará responsável pela gestão dos serviços de segurança privada no hotel H é a sociedade por quotas Companhia de Serviços de Segurança F Limitada.", mas deu como não provado "O lucro, que originalmente iria ser recebido pela 1ª Ré, vai ser recebido através da Companhia de Serviços de Segurança F Limitada, pelos 2° e 3° Réus controlada, ainda que através de terceiros familiares?"; Quesito 32° - O douto Tribunal a quo deu como não provado todo o quesito: “Os Réus têm como objectivo (i) afastarem definitivamente o Autor de um negócio que ele ajudou a obter e que ajudou a gerir e a crescer durante uma década (ii) mancharem a sua reputação no mundo empresarial dedicado à prestação de serviços de segurança privada e (iii) deixarem de lhe pagar os lucros a que ele tem direito?"; Quesito 33° - O douto Tribunal a quo deu como provado "Em 2017,2018 e na primeira metade de 2019, para além do seu vencimento, o Autor não recebeu mais nenhuma quantia da 1ª Ré.", mas deu como não provado "O Autor continua hoje a prestar a sua contribuição, mas não lhe foram distribuídos os lucros distribuíveis pela sociedade referentes aos anos de 2017, 2018 e na primeira metade de 2019?";
5. No vertente processo, foi determinada a documentação das declarações prestadas na audiência de julgamento, existindo por isso suporte de gravação, o que permitirá ao Venerando Tribunal de Segunda Instância melhor avaliar, e decidir, sobre o ora invocado erro na apreciação da prova, aqui expressamente se requerendo a reapreciação da matéria de facto, nos termos admitidos no art. 629º do Código de Processo Civil;
6. O Recorrente, ao invocar no presente recurso o erro na apreciação da prova, que, na sua óptica, inquina a decisão proferida pelo douto Tribunal Colectivo recorrido, não pretende apresentar apenas uma simples discordância relativamente à interpretação dos factos feita por aquele douto Tribunal, tendo bem presente o dispositivo do art. 558º do Código de Processo Civil, e a natureza insindicável da livre convicção relativamente à apreciação da prova efectuada pelo Tribunal recorrido, e ainda estando bem ciente da jurisprudência afirmada nos Tribunais Superiores da RAEM, entendendo a Recorrente que tal se verifica na situação dos autos, e que o vício apontado à decisão recorrida resulta dos próprios elementos constantes dos autos, por si só ou com recurso às regras da experiência comum;
7. A questão fundamental dos vertentes autos, no que aos factos interessa, é a de saber se a sociedade 1ª Ré prometeu pagar ao Autor um vencimento fixo, bem como distribuir-lhe 30% dos lucros, tendo o valor que foi sendo distribuído variado e modificado, a partir de 2015, para uma quantia fixa de MOP$600,000.00, perante a estabilidade dos rendimentos da sociedade 1ª Ré;
8. Os referidos pagamentos foram contrapartidas para que o Autor assumisse os deveres de montar, organizar e gerir a estrutura de segurança do hotel H, e associar-se ao exercício de toda a actividade levada a cabo pela 1ª Ré;
9. Da análise feita pelo douto Tribunal a quo das provas carreadas para o processo resultou inequivocamente demonstrado que o Autor, assumia um papel fundamental em toda a actividade da sociedade 1ª Ré, e que se encontrava no topo da respectiva hierarquia, lado a lado com o 2° Réu no cimo do organigrama da sociedade 1ª e Ré e sociedade Sincero, existente na sala de vigilância da 1ª Ré no hotel H, e o facto de o Autor ser chamado de patrão na empresa 1ª Ré, conforme afirmaram as testemunhas I, J e K nos seus depoimentos, e ainda a testemunha L, que referiu no seu depoimento que muitos colegas (da empresa) chamavam o Autor de patrão;
10. A testemunha L afirmou ainda que o Autor jamais foi registado como trabalhador da sociedade 1ª Ré, o que mais confirma a realidade de não ser o Autor funcionário da sociedade 1ª Ré, mas antes titular de uma posição de comparticipação na respectiva actividade e lucros;
11. Na certidão do registo comercial da sociedade 1ª Ré junta aos autos, é possível constatar que nesta sociedade comercial a titularidade de quotas sociais não determina a forma de distribuição dos lucros sociais, existindo por uma lado uma diferenciação entre as quotas da titularidade do 2° e o 3° Réus e o respectivo direito a 30% e 40% dos lucros sociais, e por outro lado a existência de um sócio com uma quota social correspondente a 10% do capital social da 1ª Ré que não recebe qualquer dividendo, assim se devendo concluir que as regras normais de repartição dos lucros pelos sócios inscritos no registo comercial não se aplicam à 1ª Ré, em virtude de decisões em contrário tomadas no seu seio, como é o caso dos vertentes autos;
12. Como são exemplos ainda o que resulta de fls. 128, 538 a 540 dos autos, verificando-se que o Autor teve já participações nas actividades da 1° Ré a partir de Julho de 2009, ainda antes da inauguração do hotel H em 21 de Setembro desse ano;
13. O que resulta de fls. 130 a 131v dos autos, é demonstrativo de ter sido o Autor quem preparou as "policies & procedures de Maio de 2014, matéria fundamental na relação de prestação de serviços entre a sociedade 1ª Ré e o hotel H, e que é tipicamente exclusivo dos proprietários da empresa prestadora dos serviços de segurança privada, e não de um qualquer funcionário da mesma empresa;
14. É inegável o papel fundamental desempenhado pelo Autor no exercício da actividade da sociedade 1ª Ré, pessoa de grande experiência profissional no ramo da segurança, por ter pertencido aos quadros da Polícia Judiciária por mais de trinta anos, ser uma pessoa idónea e capaz de representar e "dar a cara" pela sociedade 1ª Ré, que, lembre-se, não era titular de licença para o exercício da actividade de segurança privada, e sendo aquele que poderia montar a complexa operação de segurança no hotel H, a parte habitacional do edifício, a zona das massagens/sauna e clube nocturno, o respectivo parque de estacionamento e toda a zona envolvente ao hotel, geri-la e assegurar o dia-a-dia da prestação de serviços;
15. O 2° Réu não tinha, reconhecidamente, experiência no ramo da segurança, e o 3° Réu estava, como está, afecto a actividade similiar em casino propriedade da ......, e por isso impedido de exercer de facto a actividade junto do hotel H, sendo ainda motivos imputáveis ao 2° e 3º Réus a razão de não ter conseguido a 1ª Ré obter a licença para a actividade de segurança privada junto da Polícia de Segurança Pública;
16. Tudo isso justifica a absoluta necessidade do Autor para o exercício da actividade por parte da sociedade 1ª Ré, bem como a remuneração fixa mensal e o direito a 30% dos lucros da 1ª Ré que ficaram estabelecidos em termos de acordo verbal;
17. O que também resulta de fls. 86 a 87, 89 a 90, 93 a 94, 102 a 104, 498, 509, 512, 514, 832 a 891 dos autos, é demonstrativo de que documentos como a demonstração financeira, a conta de ganhos e perdas, entre outros documentos contabilísticos da sociedade 1ª Ré, eram enviados regularmente e todos os anos ao Autor, designadamente para efeitos de decisão sobre o montante dos lucros a dividir, como resulta dos emails enviados em vários anos pela testemunha L ao Autor - veja-se o conteúdo dos mencionados emails, com redacção muito idêntica ao longo dos vários anos, e que referiam "please advise how much total amount is the sharing? Then I will ask Mr. Chan to write the cheque", vidé fls. 832, ou como se pode ler a fls. 851 "please advise how much total amount is the sharing? Is the same total $2,000,000.00? Then I will ask Mr. Chan to prepare the cheque and arrange meeting among the shareholders";
18. Essa Linguagem e texto refere-se a repartição de lucros, e jamais se pode referir a prémio ou bónus, como pretenderam dizer as testemunhas L e M;
19. Os prémios ou bónus pagos nas empresas em geral aos seus funcionários integram-se nas contas societárias, talqualmente os salários e outros pagamentos a título de prestação de trabalho, sendo o lucro societário apurado após o lançamento a débito desses referidos prémios, bónus, salários e outros, e a distribuição dos lucros ser efectuado em momento posterior em que já se encontram considerados e pagos os sobreditos prémios ou bónus;
20. Quando na sociedade Ré se discutia com o Autor o montante a distribuir, nos termos acima enunciados, por referência a um valor de MOP$2,000,000.00 que era uma significativa parte dos lucros apurados no exercício, conforme o demonstra os documentos dos autos supra identificados, na verdade discutia-se a distribuição de lucros, e jamais a distribuição de um qualquer prémio ou bónus, exactamente como o Autor pretendeu provar nos vertentes autos, e que julga ter logrado fazê-lo;
21. Não é de todo razoável supor-se que, se fosse a distribuição de montantes feita ao Autor a título de prémio ou bónus, se fosse perguntar ao mesmo qual o montante que queria receber a esse título ao longo dos vários anos, pois, na verdade, as empresas não perguntam aos seus funcionários ou colaboradores qual o montante de prémio ou bónus é que querem receber, reservando-se a administração ou o colectivo de sócios tal tarefa e decisão;
22. A testemunha L afirmou ser funcionária da M, e que esteve sempre ao serviço do seu patrão, o 2° Réu CXX, sendo por isso necessário sobpesar as afirmações do seu depoimento, tendo em atenção as relações de fidelidade para com as posições adoptadas pelo 2° Réu nos vertentes autos;
23. A testemunha M é esposa do 2° Réu, o qual se encontra em litígio com o Autor desde 2017, por causa da posição de sócios que ambos ocupam numa sociedade comercial com a denominação N Limitada (vidé documento nº 11 junto com a petição inicial), existindo uma verdadeira guerra judicial entre o casal formado pela dita M e o 2° Réu contra o aqui Autor, com nove processos cíveis instaurados nos Tribunais de Macau e dois processos crime, pelo que o depoimento desta testemunha M não pode ser apreciado e devidamente avaliado sem que se tenham em conta as sobreditas realidades;
24. A verdade é que o douto Tribunal a quo teve demasiado em conta os depoimentos destas duas testemunhas, quando nada o deveria justificar;
25. Incorreu o douto Tribunal recorrido em erro na apreciação da prova, quando entendeu não serem os pagamentos de MOP$600,000.00 ao Autor feitos a título de distribuição de lucros;
26. Ficou demonstrado que o Autor recebeu da sociedade 1ª Ré o montante de MOP300,000.00 em 24-09-2010 (fls. 84, 85, 87), o de MOP150,000.00 em 01-02-2011 (fls. 88 e 90), o de MOP600,000.00 em MOP600,000.00 em 31-03-2012 (fls. 91, 104, 487, 488), o de MOP600,000.00 em 07-12-2012 (fls.92, 104), o de MOP600,000.00 em 01-09-2013 (fls. 95, 104), o de MOP600,000.00 em 08-01-2014 (fls. 96, 104, 490), o de MOP600,000.00 em 12-09-2014 (fls. 97, 104), o de MOP600,000.00 em 09-02-2015 (fls. 98, 104, 491, 854, 855), o de MOP600,000.00 em 03-03-2016 (fls. 99, 104, 492) e o de MOP600,000.00 em 02-03-2017 (fls. 100, 101, 104, 494), montantes que se ajustam ao valor dos lucros apurados nos respectivos exercícios, e sempre numa proporção de 30% a favor do Autor do montante total dos lucros distribuíveis ao longo dos vários anos, aliás, como afirmou a testemunha L, confirmando que inicialmente não houve distribuição de lucros, e que o montante dos lucros variou no início das actividades de prestação de serviços de segurança privada por parte da 1ª Ré ao hotel H, tendo os mesmos lucros se consolidado a partir do ano de 2012;
27. A confirmar que as sobreditas distribuições de montantes ao Autor ao longo dos anos o foram a título de distribuição de 30% dos lucros da sociedade 1ª Ré, conforme acordado verbalmente entre as partes, estão os depoimentos prestados na audiência de julgamento pela testemunha J, afirmando esta que o Autor lhe disse que era sócio da sociedade 1ª Ré, e que recebia lucros da mesma, e também pela testemunha K, que afirmou ter o Autor lhe dito da distribuição de 30% dos lucros da 1° Ré de que era titular, sendo as duas referidas testemunhas quadros superiores/Chefes da sociedade 1ª Ré, prestando. depoimentos com convicção, isentos e com credibilidade, sendo por isso merecedores de devido acolhimento das suas afirmações por parte do Tribunal;
28. Acresce ainda que a testemunha O, administrador responsável pela empresa do Hotel H que veio a contratar a sociedade 1ª Ré, afirmou em audiência que tinha a ideia que o 2° e o 3° Réus, conjuntamente com o Autor, iam trabalhar em parceria, o que significa que a relação entre os três seria, na óptica da testemunha, uma relação de negócio relativamente ao contrato de prestação de serviços de segurança privada outorgado com o hotel H;
29. Esta sua declaração foi igualmente omitida pelo douto Tribunal a quo, o que, conjuntamente com o atrás alegado, faz o douto Tribunal recorrido incorrer em erro na apreciação da prova, quando entendeu não serem os pagamentos de MOP$600,000.00 ao Autor feitos a título de distribuição de lucros;
30. No que se refere à empresa Sincero, titular de licença para o exercício da actividade de segurança privada, que a sociedade 1ª Ré não possuia devido à presença dos 2° e 3° Réus nos respectivos quadros societários, o que resultava em inidoniedade perante as autoridades policiais responsáveis pela emissão de tais licenças, e que por isso foi subcontratada pela sociedade 1ª Ré para prestação do serviço de segurança ao hotel H, referiu o douto Tribunal a quo, que o Autor não era, nem sócio da 1ª Ré nem sócio dessa sociedade Sincero, daí retirando a conclusão de que, se se tivesse havido realmente um acordo entre o Autor e a 1ª Ré no sentido de o Autor ter direito a 30% dos lucros da 1ª Ré, seria de esperar que teria sido o Autor a figurar como um dos sócios da Sincero (para dar reflexão aos seus interesses acerca dos lucros da 1ª Ré), logo na altura da aquisição desta sociedade em 2011, a par do 2ª Réu, e o Tribunal a quo labora uma vez mais em erro na apreciação da prova nesta matéria;
31. Conforme ficou completamente demonstrado nos autos, a referida sociedade Sincero tem formalmente como sócios de 50% a testemunha L, a qual deu apenas o nome, sendo o verdadeiro proprietário dessa quota o seu patrão CXX (2° Réu), como a mesma afirmou no seu depoimento, e formalmente como titular dos restantes 50% da sociedade a testemunha J, o qual afirmou igualmente no seu depoimento em audiência de julgamento ter dado apenas o nome, sendo o verdadeiro proprietário dessa quota de 50% da Sincero o Autor;
32. Esta realidade, de serem o 2° Réu e o Autor os verdadeiros proprietários da Sincero, numa proporção de 50% para cada um, empresa que desempenhava grande parte do trabalho respeitante ao contrato de segurança privada celebrado entre o hotel H e a sociedade 1ª Ré, por ser a Sincero titular de licença, ao contrário da 1ª Ré, demonstra à evidência que o papel do Autor não era o de um simples consultor ou gerente da 1ª Ré, mas alguêm que entrou em parceria e em associação com o 2° e o 3° Réus relativamente aos negócios sociais da 1° Ré, e que, por via de acordo verbal celebrado no âmbito da sociedade 1ª Ré, ficou com o direito de receber 30% dos lucros gerados pela 1ª Ré, para além de uma quantia fixa mensal;
33. Através das declarações prestadas em audiência de julgamento, designadamente pelas testemunhas L, J e K, e pela prova documental dos processos judiciais a correrem seus termos nos Tribunais de Macau junta com a petição inicial dos vertentes autos, o douto Tribunal a quo pôde constatar que o 2° e o 3° Réus desencadearam um litígio ou guerra contra o Autor no seio da sociedade 1ª Ré, o que os motivaram a deixar de pagar a remuneração fixa mensal e os 30% dos lucros a que o Autor tinha direito;
34. A sociedade 1ª Ré reatou o pagamento da quantia fixa mensal, após protesto do Autor, mas até à presente data jamais recebeu o Autor o montante dos lucros a que tinha direito relativamente aos anos de 2017 e 2018, e metade do ano de 2019;
35. Um episódio dessa mesma guerra foi o facto de o 2º e o 3° Réus terem feito constituir uma outra sociedade comercial com o objecto social de prestação de serviços de segurança privada, em que são únicos sócios o filho e a filha desses dois Réus, a qual veio a substituir a sociedade 1ª Ré na execução do contrato de prestação de serviços de segurança com o hotel H, recebendo grande parte dos trabalhadores antes pertencentes à 1ª Ré e á sociedade Sincero, e deixando a sociedade Sincero sem qualquer actividade no referido hotel H, quando era esta a empresa, com licença, que prestava grande parte do serviço de segurança inicialmente adjudicado à sociedade 1ª Ré, e tudo porque o Autor era o verdadeiro proprietário de 50% do capital da Sincero, o que deixou de interessar ao 2° e 3° Réus em função da guerra que desencadearam contra o mesmo;
36. Os mencionados factos deverão ser incluidos na matéria de facto dada por provada, por terem resultado da prova produzida por documentos juntos aos autos e por testemunhas ouvidas na audiência de julgamento;
37. Os Réus vieram ainda alegar que deixaram de distribuir lucros relativamente aos anos de 2017 e 2018, e metade do ano de 2019 por os terem reservado para eventuais despesas e indemnizações a haver em meados de 2019 com o encerramento da 1ª Ré, mas a verdade é que a sociedade 1ª Ré deixou de fazer aquilo que lhe era exigível fizesse: juntar aos autos os comprovativos legais do pagamento de despesas relativas ao encerramento da empresa, e todos os recibos das indemnizações legais pagas aos seus trabalhadores, e também aos trabalhadores da Sincero, em virtude da rescisão dos contratos de trabalho por encerramento da empresa;
38. Mas ainda assim foi possível retirar dos depoimentos das testemunhas L e J que o montante de indemnizações pagas pela sociedade 1ª Ré pelas rescisões com todos os trabalhadores terá sido entre o montante total de um milhão e seiscentas mil patacas e o montante de um milhão e oitocentas mil patacas;
39. O douto Tribunal a quo deu como provado ter tido a sociedade 1ª Ré um lucro de MOP$2,000,000.00 em 2017, de MOP$2,000,000.00 em 2018 e MOP$1,000,000.00 em 2019, num total de lucro acumulado de MOP$5,000,000.00;
40. Pelo que deverá o Venerando Tribunal declarar o direito do Autor a 30% dos lucros da sociedade 1ª Ré, tendo em conta os lucros apurados e as despesas efectuadas com indemnizações;
41. Entende o ora Recorrente que, após a reapreciação da prova que o Venerando Tribunal de Segunda Instância irá fazer no âmbito do presente recurso, a resposta a dar aos quesitos da Base Instrutória terá que ser alterada em muitos deles, por forma a ficara constar o seguinte:
Quesito 1°
Provado que, em finais de 2008 ou em princípios de 2009 começou a ser preparada a abertura de um novo hotel em Macau, sito no NAPE: o Hotel H, que veio a iniciar as suas operações no dia 21 de Setembro de 2009.
Quesito 2°
Provado que, a Companhia de Administração P Limitada (P Hotel Management Company Limited), entidade operadora do Hotel H, procurou, na fase de preparação para a bertura do hotel, uma empresa especializada em prestação de serviços de segurança que pudesse gerir todo o esquema de segurança privada do hotel.
Quesito 3°
Provado apenas que, a 1ª Ré, na pessoa do 2° Réu, convidou o Autor a montar e gerir o plano de segurança privada do Hotel H, e a supervisionar as operações diárias que caberiam à 1ª Ré por virtude da sua contratação pela Companhia de Administração P Limitada.
Quesito 4°
Provado apenas que, um dos motivos do convite foi por causa da experiência do Autor no ramo da segurança, tendo trabalhado na Polícia Judiciária de Macau.
Quesito 5°
Não provado.
Quesito 6°
Provado que, o Autor aceitou a colaboração proposta, sujeita a duas condições: (i) que recebesse um vencimento fixo enquanto gerente operacional da empresa e (ii) que tivesse direito a 30% dos lucros que adviessem para a 1ª Ré fruto da sua actividade.
Quesito 7°
Provado apenas que, a 1ª Ré, através dos seus respectivos administradores, 2º e 3° Réus, aceitou essas condições, num período em que os 2° e 3° Réus já eram administradores da 1ª Ré, havendo sido celebrado umk acordo verbal entre ela e o Autor no qual este se obrigou a (i) a montar, organizar e gerir a estrutura de segurança do hotel H e (ii) a associar-se ao exercício de toda a actividade levada a cabo pela 1ª Ré.
Quesito 8°
Provado que, e aquela se obrigava a (i) pagar ao Autor um vencimento fixo a rondar as MOP$30,000.00 (trinta mil patacas) e a (i) conceder-lhe 30% dos seus lucros anuais.
Quesito 9°
Não provado.
Quesito 10°
Provado apenas que, o Autor chegou a participar nas negociações entre a 1ª Ré e Companhia de Administração P Limitada.
Quesito 11°
Provado apenas que, em 15 de Julho de 2009, foi celebrado o acordo de prestação de serviço, cuja cópia se encontra junta a fls. 280 a 300 dos autos, entre a 1ª Ré e a Companhia de Administração P Limitada, através do qual aquela se tornou responsável pela gestão dos serviços de segurança das instalações do hotel H.
Quesito 12°
Provado que, o contrato de prestação de serviços acima referido foi sendo sucessivamente renovado até 30 de Junho de 2019.
Quesito 13°
Provado que, os Réus e o Autor acordaram que, em troca pela contribuição do Autor, em forma de prestação de serviços, teria o Autor direito a 30% dos lucros distribuíveis pelos sócios anualmente, sendo os lucros da sociedade distribuídos da seguinte forma: 40% cabiam ao 3° Réu, 30% cabiam ao 2º Réu e 30% cabiam ao Autor.
Quesito 14°
Provado apenas que, em 09 de Fevereiro de 2015, 03 de Março de 2016, e 02 de Março de 2017, o Autor recebeu da 1ª Ré, cada vez nas datas indicadas, o montante de MOP$600,000.00 a título de distribuição de lucros.
Quesito 15°
Não provado.
Quesito 16°
Provado apenas que, em data não apurada de 2017, por causa das várias desavenças entre o Autor e o 2° Réu, o 2° e o 3° Réus delinearam um plano para excluírem o Autor de qualquer participação no negócio da 1ª Ré, por forma a garantirem que o Autor não voltaria a receber os lucros a que tinha direito por virtude do acordo celebrado com a 1ª Ré.
Quesito 17°
Provado que, assim, os 2° e 3° Réus, enquanto administradores da 1ª Ré, deram ordens para que deixasse de ser pago o vencimento que o Autor recebia da sociedade enquanto gerente operacional.
Quesito 18°
Provado que, por outro lado, decidiram deixar de lhe pagar o lucro a que ele tinha direito anualmente.
Quesito 19°
Provado apenas que, o vencimento fixo, referente aos meses de Agosto a Dezembro de 2017, foi pago ao Autor em Janeiro de 2018, após o protesto do Autor, mas não lhe pagou o lucro a que ele tinha direito referente aos anos de 2017 e 2018.
Quesito 20°
Não provado.
Quesito 21°
Provado apenas que, o Autor, desde a data não apurada em finais de 2009 até 30 de Junho de 2019, desempenhava as funções como gestor operacional da 1ª Ré, relativamente aos serviços de segurança privada que esta prestava ao Hotel H.
Quesito 22°
Provado que, é ele responsável pela contratação de trabalhadores.
Quesito 23°
Provado que, o Autor era responsável por organizar e gerir o plano de segurança do hotel.
Quesito 24°
Provado apenas que, o Autor era responsável por resolver os problemas que surjam nas operações da empresa.
Quesito 25°
Provado que, estando disponível para prestar os seus serviços 24 horas por dia.
Quesito 26°
Provado apenas que, tendo em conta que o Hotel H tem nas suas instalações não só um hotel, como fracções habitacionais, um clube nocturno, uma sauna, um parque de estacionamento e mesmo ao lado o casino H, bem como a sua localização, a gestão do plano de segurança privada do Hotel H é mais exigente do que a dos edifícios normais.
Quesito 27°
Provado apenas que, e foi por isso que esta se disponibilizou a não só pagar um vencimento ao Autor como a conceder-lhe 30% dos lucfros anuais da sociedade.
Quesito 28°
Provado que, nunca foi o acordo celebrado entre a 1ª Ré e o Autor denunciado ou resolvido.
Quesito 29°
Não provado.
Quesito 30°
Provado que, o Autor não aceitou a cessação da actividade da 1ª Ré.
Quesito 31°
Provado que, o lucro, que originalmente iria ser recebido pela 1ª Ré, vai ser recebido através da Companhia de Serviços de Segurança F Limitada, pelos 2° e 3° Réus controlada, ainda que através de terceiros familiares.
Quesito 32°
Provado apenas que, os Réus têm como objectivo (i) afastarem definitivamente o Autor de um negócio que ele ajudou a gerir e a crescer durante uma e (ii) deixarem de lhe pagar os lucros a que ele tem direito.
Quesito 33°
Provado apenas que, o Autor continua a prestar a sua contribuição até 30 de Junho de 2019, mas não lhe foram distribuídos os lucros distribuíveis pela sociedade referentes aos anos de 2017, 2018 e na primeira metade de 2019.
Quesito 34°
Não provado.
Quesito 35°
Não provado.
Quesito 36°
Não provado.
Quesito 37°
Não provado.
Quesito 38°
Provado apenas que, a Companhia de Administração P Limitada não renovou a contratação da 1ª Ré, fazendo com que esta deixasse de poder prestar os seus serviços de segurança ao Hotel a partir de 1 de Julho de 2019.
Quesito 39°
Provado apenas que, a Companhia de Administração P Limitada decidiu pela não renovação da contratação da 1ª Ré no final do primeiro semestre de 2019, uma vez que a 1ª Ré não conseguiu obter o alvará de exercício da actividade de segurança privada.
Quesito 40°
Não provado.
Quesito 41°
Não provado.
Quesito 42°
Provado apenas que, o Autor continua a prestar a sua contribuição até 30 de Junho de 2019, mas não lhe foram distribuídos os lucros distribuíveis pela sociedade referentes aos anos de 2017, 2018 e na primeira metade de 2019.
Quesito 43°
Não provado.
Quesito 44°
Sem considerar as indemnizações e despesas que a 1ª Ré teria de pagar, referidas na resposta dada ao quesito 40°, a 1ª Ré teve nos anos de 2017 e 2018 lucros à volta de MOP$2,000,000.00 em cada ano, e na primeira metade de 2019, lucros à volta de MOP$1,000,000.00;
42. Conforme se deixou demonstrado, resulta claramente que a decisão recorrida, interpretada de per si, com a experiência comum e com os elementos dos autos nela acolhidos, se encontra inquinada do vício de erro na apreciação da prova, previsto designadamente no art. 599º do Código de Processo Civil, e que após a reapreciação da prova por parte desse Venerando Tribunal da Segunda Instância, deverá ser proferido douto Acórdão que considere provados todos os factos alegados nos presentes autos que alicerçam os pedidos formulados pelo Autor, com a consequente condenação da 1ª Ré, e ora Recorrida, a) a pagar ao Autor a quantia de MOP$1,200,000.00 (um milhão e duzentas mil patacas), acrescida de juros de mora já vencidos no valor de MOP$38,786.30 (trinta e oito mil setecentas e oitenta e seis patacas e trinta avos) desde 11 de Fevereiro de 2019, mais os juros à taxa legal que se continuarem a vencer até ao seu efectivo e integral pagamento; b) a pagar ao Autor a quantia de MOP$600,000.00 (seiscentas mil patacas) por cada ano em que subsistir o contrato que vincula ambas as partes; c) a ser reconhecido que agiu em abuso de direito, ao não deliberar a distribuição de lucros nos anos de 2017 e 2018; e d) a pagar ao Autor 30% dos lucros de exercício, a apurar pela forma legalmente prescrita, nos anos de 2017,2018 e 2019.
*
Os Recorridos, Serviços de Segurança B, Limitada (B保安有限公司), CXX e DXX, veio, 01/12/2021, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 1122 a 1143, tendo formulado as seguintes conclusões:
Vem o presente recurso interposto pelo Recorrente do douto acórdão de fls. 937 ss que julgou improcedentes todos os pedidos formulados pelo A. nos presentes autos.
Entendem os Recorridos que foi correcta e acertada a douta decisão recorrida porquanto é a única que se conforma com a prova produzida em audiência de discussão e julgamento e com a lei aplicável.
Senão vejamos,
Vem o A. recorrer da decisão final com fundamento em erro na apreciação da prova pedindo a reapreciação da matéria de facto, nos termos do artigo 629.° do CPC, aliás, sem qualquer fundamento, como afinal se demonstrará.
Com esse objectivo, elabora, criativamente, uma nova lista de "factos provados" (ponto 8., pág. 10 das suas alegações) que não tem qualquer relação com a prova produzida, nem resulta da prova produzida na audiência de discussão e julgamento, que se encontra devidamente documentada.
Essa lista de "factos provados" apresentada pelo Recorrente parece resultar de uma longa crítica - desmerecida, no entender dos Recorridos -, à matéria considerada provada pelo douto Tribunal a quo, e que, segundo o Recorrente, se afere por um conjunto de conclusões que elabora com a formulação "deu como provado .. mas não deu como provado ...".
Ora, não se encontra, entre uns e outros factos elencados, relação relevante que justifique tal formulação, não está a prova de uns relacionada com a prova dos outros, nem a prova de uns resulta da prova dos outros, nem uns se encontram em contradição com os outros.
Ao contrário do que afirma, as alegações de recurso do Recorrente são uma mera discordância deste com a livre convicção formulada pelo colectivo na sequência da prova produzida, que se encontra cabalmente fundamentada, razão pela qual, à partida, o presente recurso não pode vingar.
Boa parte dos factos que o Recorrente desejaria ver provados resultam maioritariamente de prova que o próprio Recorrente deveria ter produzido (porque a ele cabia o ónus da prova) e não produziu ou sequer apresentou.
O Recorrente não logrou provar nenhum dos factos que agora introduziu como “provados” na sua nova lista, mas existem matérias que aí acrescentou como provadas que nem foram abordadas pelas testemunhas, nem foram produzidas por qualquer outro meio.
Por exemplo, nada consta dos autos sobre um plano elaborado pelo 2.º e 3.º RR. para excluir o A. dos "lucros" (quesitos 16.º e 32.º da Base Instrutória). Nem transcreve ou cita qualquer prova faz nas suas alegações que possa indicar como tal matéria ficou provada.
Pelo contrário, resultou do depoimento prestado pela senhora M que foram os RR. os enganados, nomeadamente relativamente à empresa Sincere, propriedade da testemunha e do 2.º R., subcontratada da 1.ª nos serviços prestados ao Hotel H e detentora de uma licença de segurança, paga pelo 2.º R. e pela testemunha.
M - 21.5.6#12 (3D1@M0IGO1420319), 2.º Tradutor
Entre os minutos 06:38 e 12:51
Ilustre Mandatário do Recorrente
Quem é que era o verdadeiro dono da quota do J? Pode dizer. Esteja à vontade.
M
Não, à vontade estou sempre à vontade. Calma aí, Dr ..
É que esta companhia era minha pertença e do meu marido. É que na altura nós tínhamos que procurar duas pessoas com credibilidade e na altura a pessoa que eu tinha mais confiança era o meu marido, .. era o meu irmão e a L era uma senhora que já me acompanhava, trabalhava comigo há mais de dez anos quando no início a companhia era uma pequena companhia. E nessa altura eu pedi ao meu irmão e eu até perguntei se podia apresentar uma pessoa que ia ficar aí a constar o nome e de confiança. Aliás, o J era uma pessoa que eu já conhecia há muito tempo, quando era muito jovem, eu já o tinha conhecido esta pessoa, já antes de começar a minha carreira profissional, a trabalhar, já conhecia esta pessoa e era pessoa de confiança. E foi na altura que o meu irmão me apresentou, olha pode fazer então constar o nome do J que é uma pessoa com credibilidade.
Ilustre Mandatário do Recorrente
A quota do senhor J? Quem é o verdade proprietário?
M
Esta companhia é minha e do meu marido. Eu e o meu marido mudamos a quota para estas duas pessoas.
(...)
Mmo. Juiz
Porque uma companhia tem dois sócios e a outra companhia também tem dois sócios.
M
Eu sei. Sim, documentalmente a companhia foi transmitida.
(...)
Mmo. Juiz
A B tinha dois sócios, será que uma estava a representar o seu marido e outra pessoa ... (...)
Mmo. Juiz
Você quer dizer que as duas companhias são independentes uma da outra, é isso?
M
Sim.
(...)
Ilustre Mandatário do Recorrente
Agora fico com uma dúvida que vai ter que esclarecer. Vamos lá ver se isto é verdade. Este contrato com a B começou em 2019, acabou em 2019 ...
M
Sim.
Ilustre Mandatário do Recorrente
No entretanto, por causa das exigências cada vez maiores, a Sincere passou as fornecer os trabalhadores porque tinha a licença. Isto foi durante quantos anos?
(...)
M
Sete anos. Porque deram a licença muito mais tarde.
Ilustre Mandatário do Recorrente
Pronto. Então temos uma Sincere, que é sua e do seu marido, embora com outras pessoas como sócios de nome, que tem uma licença e quando chega a altura de 2019, porque acaba o contrato com a H, porque é que o contrato não foi para a Sincere, que já tinha lá os trabalhadores, a experiência, 7 ou 8 ou 9 anos de experiência, os trabalhadores todos, porque é que o contrato não passou da B para a Sincerity? Porque é que foi lá para a F? Explica-me isso. Tente lá explicar isso.
M
Nós também queríamos ...
Ilustre Mandatário do Recorrente
Mas explique.
M
Porque esses dois, a Sincere quando teve a licença, a gente em 2018, salvo o erro, eu queria mesmo ter novamente essa companhia. Eu pedi, porque a L conseguia transmitir para mim logo imediatamente, mas o J não queria assinar. Ele disse que era preciso perguntar ao senhor Ma, ao A, ou seja o meu irmão. E só depois é que podia assinar para mim. E eu disse a ele "essa companhia, este um milhão, foi pago por nós”, porque a companhia precisou depositar um milhão no banco em numerário. E eu disse "todas as coisas foram tratadas por nós, o montante também fomos nós que pagámos, não tem nada a ver com o senhor A."
Você acreditou nessas duas pessoas, passou a companhia para essas duas pessoas, então paciência, não há problema. Então ele disse que queria vender, não há problema, vende. Quanto dinheiro? Então o meu marido contactou com um advogado que o representa para falar da compra e venda mas não conseguiu, paciência. Ele não queria vender. Eu queria comprar mas não conseguia. É que eu confiei na pessoa errada. (...) é que aquela altura tinha dois advogados que chegaram a falar ou a discutir sobre a compra e venda mas eu não consegui. Eles podem ser testemunhas a provar isso.” (sublinhado nosso).
Também sobre a natureza dos conflitos entre o 2.º R. e o Recorrente, o depoimento de L, transcrito a pág. 68-69 das alegações do Recorrente:
"13:32 Pergunta Mm. Juiz:
Sabe se aconteceu alguma que causou a ruptura da relação entre eles? Não estou a referir acerca desses dois documentos?
13:45 Resposta da Testemunha:
Foi por causa a construção de um edifício, a companhia relacionada ficou com a construção, o senhor Chan, ele é sócio e administrador. E houve uma vez, em que circunstâncias, foi expulso da administração. E então, ele queria obter informações sobre o assunto só que não conseguiu, não sabe porque motivo, não conseguiu obter nenhuma informação e depois começou a haver as acções.
13:29 Pergunta da Advogada da Ré:
Quem expulsou o senhor CXX da administração?
14:37 Resposta da Testemunha:
Foi o senhor A."
A propriedade das quotas da Sincere por parte do 2.º R. e da sua mulher foi confirmada pelo J, pessoa de confiança do Recorrente, e titular registado de uma quota de 50% da sociedade Sincere.
A instâncias dos ilustres membros do colectivo confirmou [21.5.13 #17(3D@M-)AW01020319)]:
"1:24:37 Mma. Juíza
Há pouco também disse-nos que esta companhia Sincere, você era sócio juntamente com a senhor L?
J
Sim.
Mma. Juíza
Só que você esta aí apenas com o nome de sócio e que o verdadeiro sócio da sua parte era o senhor A. Quando é que foi?
J
Que eu me lembre, Agosto de 2010, que eu fui até ao escritório do advogado para assinar os documentos, (...) para assinar o documento em como o CXX me trespassava, me cedia as quotas.
Mma. Juíza
Do CXX para ti?
J
Sim.
Mma. Juíza
Sabe a razão disso?
J
Depois de passar para mim, iam pedir a licença para a Sincere.
Mma. Juíza
Quer dizer, 50% para ti?
J
Sim.
Mma. Juíza
E foi no mesmo dia com a senhor L?
J
Sim.
Mma. Juíza
E quem é que passou para ela?
J
Não sei se era a senhora ***.
Quer dizer que foi o CXX que passou para si?
J
Sim."
Também não foi feita qualquer prova, nem o Recorrente a invoca de que os 2.° e 3.° RR "deram ordens" para deixar de pagar o vencimento ao Recorrente (quesito 17.° da BI).
Da prova produzida também não resulta qualquer "especial complexidade" do Hotel H. Em particular não consta que essa alegada complexidade ''justificasse'' o pagamento de "lucros” ao Recorrente.
Da prova produzida resultou que a B cessou todas as suas actividades em Junho de 2019, pelo que não pode ficar provado que o A. nunca cessou actividades com a 1.ª R., como pretende (quesito 28.º da BI considerado não provado). De resto, nenhuma das testemunhas que apresentou sequer mencionou que o Recorrente não teria cessado funções nessa data e nenhuma prova documental demonstra o que o Recorrente vem agora criativamente afirmar.
Pelo contrário, foi J, testemunha apresentada pelo Recorrente e pessoa de confiança do Recorrente (como o próprio o apresentou) que afirmou [21.5.13 #17(3D@M-)AW01020319)]:
1:16:30
Ilustre Mandatário do Recorrente
"Diga-me uma coisa, até quando... o senhor esteve a trabalhar, já se percebeu, até ao dia 30 de Julho de 2019 como trabalhador da B. O senhor já disse isso embora estivesse na Sincere. E o senhor A? Até quando é que ele trabalhou lá? O senhor começou a trabalhar com ele desde o princípio. Até quando é que ele trabalhou lá?"
Na mesma altura. Até 30 de Junho de 2019."
E atente-se na transcrição que o próprio Recorrente fez a este Propósito do depoimento de L, na página 72 das suas alegações:
"0:55 Pergunta da Advogada da Ré:
Sabe em que data terminou o contrato do senhor A na B?
1:05 Resposta da Testemunha:
Finais de Junho de 2019, também já o contrato com o H já era terminado porque já não havia mais contrato.
1:21 Pergunta da Advogada da Ré:
Ou seja, além do senhor A, os outros trabalhadores também terminaram com efeitos nesta data, é assim? Todos os trabalhadores foram terminados foram terminados nesta data?
1:39 Resposta da Testemunha:
Sim, Sim."
Absolutamente nada, além deste depoimento invocado pelo próprio, contraria esta realidade.
O Recorrente não abordou ou provou que nunca havia "aceite" a cessação de actividades da 1.ª R. (quesito 30.º da BI) nem a tal foi feita qualquer referência na prova produzida, pelo que não se encontra provada como alega.
A prova que o Recorrente cita nas suas alegações, em particular os testemunhos que invoca e cita, não demonstram o que afirma no seu ponto 13., porque o seu conteúdo não permite retirar conclusões diferentes daquelas a que chegou o digno Tribunal a quo.
Ou seja, o Recorrente simplesmente não produziu prova que permitisse outra conclusão que não aquela a que chegou a douta decisão recorrida.
E, nessa medida, é difícil aos Recorridos demonstrar as passagens que infirmem tais conclusões. Não se pode contrariar o que não foi dito ou o que não foi sequer apresentado.
Não obstante, procurarão os Recorridos assinalar as passagens da produção de prova que estão em falta e que contribuem para elucidar a razão pela qual está absolutamente correcta a decisão recorrida.
A questão essencial dos autos, conforme a petição inicial, era a de saber se os 2.º e 3.º RR. haviam feito ao A. qualquer promessa de participação nos lucros da operação da 1.ª R., facto essencial que o A., ora Recorrente, não provou,
e se
tal promessa, a ter existido,
resultaria do facto de o A. ter tido um papel determinante na celebração do contrato entre o Hotel H e a 1.ª R., facto que o próprio Recorrente assumiu, em plena audiência, não ter acontecido,
ou
resultaria das actividades do Recorrente relativas à montagem e gestão do plano de segurança privada do Hotel e da supervisão das operações diárias da 1.ª R. nesse contrato de segurança.
Tendo ficado excluída a primeira justificação para a inusitada (e não provada) promessa de atribuir lucros a um não sócio, esta só se poderia justificar, segundo a narrativa do próprio Recorrente, pela regular actividade do Recorrente na operação das actividades da 1.ª R ..
A primeira dificuldade que o ilustre Tribunal a quo encontrou na versão do A. foi a de encontrar uma justificação plausível para que a 1.ª R. tivesse feito a promessa de atribuir lucros ao A ..
Do douto acórdão que decidiu a matéria de facto pode ler-se (pág. 13 do mencionado acórdão):
"Ora, se a confiança da testemunha O e a celebração do contrato, em 15 de Julho de 2009 - sendo pressupostos primordiais e bilhete de entrada da 1ª Ré no H - são coisas que o 3º Réu (pessoa cuja capacidade era por muito reconhecida pela testemunha, por ter experiência no ramo de segurança em casinos por muitos anos) e 2º Réu já alcançaram, dificilmente se perceberia porque é que teriam os 2º e 3º Réus aceitado dividir e dar a maior parte do bolo ao Autor (diz-se a maior parte porque, para além dos 30% dos lucros alegados pelo Autor, este recebia também um vencimento mensal que era MOP25,000 em Fevereiro de 2010 segundo a fls. 233 equivalente a MOP300,000.00 por ano, vindo a ser aumentado para MOP34,700 por mês, conforme as fls. 495 e 496 (ver também al. I dos Factos Assentes), equivalente a MOP416,400.00 por ano; e se a versão alegada pelo Autor fosse verdadeira, da divisão de lucros de, por exemplo, MOP1,000,000.00 o Autor receberia MOP600,000.00 como o somatório de salário fixo e de distribuição de lucros, (e, depois do aumento de salário fixo acima referido, MOP716,400.00) que excederia a distribuição ao 2º Réu e ao 3º Réu, que só daria MOP300,000.00 e MOP400,000.00 respectivamente!)."
Tal conclusão do Tribunal resulta de um argumento de lógica, na sequência do depoimento da testemunha M.
A instâncias do Mmo. Juiz Presidente, a testemunha respondeu o seguinte, entre os minutos 04:35 e 07:30 - 21.5.5 #12 (3D1A3)_W01420319), 2.º Tradutor)
M
Eu antes tinha uma companhia que foi adquirida em 1999 e depois tivemos uma companhia (...) em 2011, a companhia N Limitada, dois sócios, fomos registar a companhia, o meu irmão detém 60% e o meu marido 40%, em 2011 e 2010, o meu irmão veio trabalhar nessa companhia, ou seja, a H para ajudar o meu marido a trabalhar, eu apenas queria explicar que naquela altura todos nos dávamos muito bem. Hoje estamos no tribunal, todos sabemos o que se passa mas estamos a falar de 10 anos atrás, todos nos dávamos muito bem, somos parceiros, amigos, muito íntimos, o meu marido contratou ele para trabalhar, e por isso era remunerado. Se fosse sócio, porque é que o meu marido e o irmão dele não é remunerado? Não tem salário? posso assim dizer? Então, em 2011, fizemos a constituição da companhia, o A tem quota e o meu marido tem quota.
Mmo. Juiz Presidente
Se tiver quota claro que vai ter nome?
M
Isso sem dúvida. Naquela altura ele não fazia parte era por isso que não tinha o nome. E se ele quisesse nome? Porque é que não põe o nome dele?
(...)
E aos minutos 07:48:
Mmo. Juiz Presidente
Essa companhia N é sócio por isso tem nome. Se não tiver a quota não tem nome, é assim?
M
Sim.
Mmo. Juiz Presidente
Então parece que a B, segundo os documentos dos autos, parece que tem um salário de cerca de 30 mil e depois uns prémios de algumas dezenas de milhares. O que é que é isso?
M
É que a companhia tem lucros, então o marido que é sócio, foi-lhe partilhado o dinheiro, então eu disse a ele “se o meu irmão tem trabalhado bem você pode lhe atribuir uma parte de prémio, Se não tiver dinheiro nós também não podemos fazer este gesto. Se tiver lucro, então demos prémio. Se ele fosse sócio então ele podia por o nome. Qual é o pretexto de não por o nome? Porque é que não tem nome? Nós não somos uma pessoa que não tem colaboração. (...) Ele não é a única pessoa que teve lucro, os outros que trabalham, que trabalharam bem, também tiveram prémios.”
Mais adiante, a instâncias da mandatária dos RR., a mesma testemunha depôs o seguinte (21.5.13 #17 (3D@E($DG01420319), 2.º Tradutor):
"14:05 Mandatária dos RR.
O senhor CXX na qualidade de administrador recebia algum vencimento da sociedade?
M
Não.”
Acontece que para a regular operação das actividades da 1.ª R.., as funções para que o Recorrente foi contratado, - essas mesmas actividades que descreve no ponto 13. das suas alegações -, o Recorrente recebeu um vencimento e bonificações.
Ora, o trabalho do Recorrente para a 1.ª R., as funções para que foi contratado, consistia em fazer precisamente o que alega ter feito: "organizar e gerir a estrutura de segurança" do Hotel H, sendo que resultou provado em audiência de julgamento que não foi necessário montar uma estrutura de segurança de raiz, visto que, quando a 1.ª R. tomou as operações de segurança do hotel já lá existia uma, que foi posteriormente melhorada, também, naturalmente, com a colaboração do Recorrente.
Sobre esta matéria, disseram as testemunhas o seguinte:
Testemunha I (21.5.6#12, Tradutor 2, transcrição pelo Recorrente na pág. 34 das sua alegações):
"Dantes já estava lá instalado uma pequena quantidade, só que não era suficiente, então o senhor A falou com o Hotel para aumentar as câmaras e os locais para fixar as câmaras."
ou
"Quando ingressei, o senhor A, foi ele que me incumbiu as tarefas que tinha de fazer, o trabalho de patrulha e depois da inauguração, quando o sistema de detective não era suficiente, falou com o Hotel para ver se eles acrescentavam. Na sauna, no clube nocturno, quando foram inaugurados, foi o senhor A que nos levou a esses locais para dizer o que é que tinhamos de fazer." (a mesma transcrição, a pág. 33 das alegações do Recorrente).
Depoimento de J
Na pág. 95 das alegações Recorrente é citado este testemunho, que no entanto tem um salto, devidamente identificado. Desse salto pode ler-se (21.5.13 #17 (3D@M)AW01020319):
"05:15 Ilustre Mandatário do Recorrente
E o que e que vocês fizeram antes da abertura do hotel já agora?
J
Antes da inauguração havia uns trabalhos preparativos de recepção do hotel de ver quanto às instalações do hotel o serviço de segurança, fazer a patrulha, os equipamentos básicos já estavam lá instalados, precisam de alguém para tomar conta, apesar de ainda não ter sido inaugurado era necessário fazer os testes e conhecer o local (05:50)”.
As funções descritas pela testemunha eram as atribuições funcionais da colaboração do Recorrente com a 1.ª R e não uma excepcionalidade que justificasse uma participação nos lucros.
Porque razão os RR. dariam uma sociedade escondida ao Recorrente para lidar com as operações de gestão diária da empresa? Ou seja, para fazer aquilo que foi contratado para fazer na empresa, actividade que era justificada cabalmente pelo vencimento que recebia.
Do douto acórdão que decidiu a matéria de facto pode ainda ler-se (pág.s 14 e 15):
''Aceitar a distribuição de 30% dos lucros societários, de uma forma consistente, a uma pessoa que não ofereceu influência na obtenção do projecto do H, que aparenta não ter contribuído economicamente ao projecto limitando-se a oferecer esforços laborais ou intelectuais o que já lhe permitiam receber um vencimento mensal fixo como gestor operacional (sem, no entanto, insubstituível para a actividade da 1ª Ré) é uma coisa tão vantajosa, contrária à prática normal comercial, que só por razes muito particulares é que se justifica (e por isso é que, propendemos para que os montantes que o Autor vinha recebendo ao longo dos anos tiveram lugar por causa da boa relação familiar entre o Autor e o 2° Réu, e não por causa de existência de qualquer acordo no sentido de distribuição de lucros, tal como referiu a testemunha M, irmã do Autor), sendo certo que, repete-se, não consta dos autos prova directa que demonstre a tal promessa alegada pelo Autor.” (sublinhado nosso).
Esta convicção do ilustre Tribunal resulta, entre outras, do seguinte testemunho de M (21.5.6 #12 (3D1A3)_W01420319), 2.º Tradutor)
A instâncias do Mmo. Juiz, aos minutos 10:18, a testemunha respondeu o seguinte:
''Mmo. Juiz Presidente
Seiscentas mil? É prémio ou dividendo?
M
É prémio, não é dividendo.
Mmo. Juiz Presidente
Então é prémio ou dividendo?
M
É prémio porque ele já tem salário. Se assim fosse, era mais terrível que um sócio. Ele ficava a ganhar mais que toda a companhia. "
Esta falta de razão para o alegado comportamento dos RR. nunca o Recorrente conseguiu justificar ao longo do processo, nem tão pouco com a prova testemunhal que apresentou, não obstante ter sido várias vezes invocada.
A teoria de que era um sócio não declarado e de que participava nos lucros da 1.ª R. foi uma ficção criada pelo A.\Recorrente exclusivamente para a presente acção judicial, tão ficção que não logrou provar.
Ao longo dos presentes autos, o Recorrente nunca conseguiu explicar o que o tornava tão especial para que tivesse sido convidado para participar nos lucros da 1.ª R ..
Estranheza constatada pelo colectivo do digno Tribunal a quo, que afirma que, de acordo com a versão narrada pelo Recorrente na sua petição, este ganharia, sem razão aparente, mais do que qualquer sócio registado (conforme acima já citado).
Certamente não seriam as funções que exercia - quer as que o próprio invoca nos autos quer as que foram descritas pelas testemunhas - que poderiam ser exercidas por qualquer outra pessoa com experiência para tal.
Aliás, em Macau existe um elevado número de propriedades semelhantes, com hotel e casino - muitas delas de muito maior complexidade que o Hotel H - e não consta que a contratação de pessoas para o lugar equivalente ao do Recorrente nessas propriedades seja escassa ou de especial dificuldade em encontrar, o que, por si, é o argumento de lógica básica que permite concluir que o Recorrente não era a única pessoa disponível em Macau para exercer esse papel e, por isso, não era necessário dar-lhe sociedade nos lucros para que fosse trabalhar para a 1.ª R..
E a única razão que havia invocado que poderia ser plausível para tal - o ter sido responsável pela aquisição do contrato de segurança para a 1.ª R. - jamais existiu, como o próprio reconheceu na primeira sessão da audiência de discussão e julgamento na qual fez o seguinte requerimento (21.5.5#12, requerimento ditado para a acta pelo representante legal do A. no início da primeira sessão da audiência de julgamento que teve início no dia 5 de Maio de 2021):
"O A. A vem expor e requerer a V. Exa. o seguinte: a instâncias de preparação da presente audiência de julgamento, em reunião havida com os seus mandatários judicias, apercebeu-se o A. de ter havido incorrecto entendimento na comunicação com os seus advogados relativamente a facto que integra a matéria sujeita a julgamento.
Na verdade, embora consta dos articulados da responsabilidade do A. a indicação deter sido da sua responsabilidade a adjudicação a favor da 1.ª R. do contrato de prestação de serviços de segurança outorgado pela empresa H Property Managment Company Limited tal facto não corresponde à realidade e a sua redacção por parte do mandatário judicial correspondeu a um lapso de percepção ou entendimento.
O A. pretende provar que participou na fase das negociações do contrato q veio a ser outorgado entre a 1.ª R. a identificada empresa, nomeadamente acertando o texto do referido contrato, e sendo da sua responsabilidade a montagem e gestão do plano de segurança privada do Hotel H e proceder à supervisão das operações diárias das que cabiam à 1.ª R. em cumprimento desse contrato mas jamais foi o A. o responsável por ter sido o mencionado contrato adjudicado à 1.ª R ..
Assim, requer a V. Exa. se digne a considerar a presente declaração tanto na fase da inquirição das testemunhas como na fase da prolação do douto acórdão sobre a matéria de facto. Pede deferimento."
E ainda que o Recorrente tivesse tido alguma participação na aquisição do contrato - que o próprio admite não ser verdade - isso ainda não explicava porque razão o Recorrente não era um sócio registado, e a alegada participação no lucro teria sido dissimulada, através de um acordo verbal ...
Caso a intenção dos RR. fosse realmente fazê-lo sócio, então porque não lhe foi atribuída uma quota quando os 2.º e 3.º RR adquiriram participações na 1.ª R. ou porque razão não lhe foi proposto adquirir uma?
Nenhum dos depoimentos transcritos pelo Recorrente demonstram a existência de tal promessa ou a sua razão.
Pelo contrário, a testemunha L foi claríssima na explicação que ofereceu ao Tribunal, instada a responder sobre este assunto pelo colectivo e por ambos os mandatários presentes.
A propósito da explicação prestada pela testemunha L sobre a distribuição dos montantes aos sócios, o Recorrente omite na sua transcrição, sem referir que omitiu (pág. 49 das alegações de recurso), vários minutos do depoimento que são relevantes e que se passam a incluir:
L (3D1-R6E101420319) 2.º Tradutor; com início ao minuto 25:05)
Ilustre Mandatário do Recorrente
Sobre isso, a minha pergunta é esta, este senhor Chan que a senhora refere aqui é o senhor D?
L
Sim, o senhor CXX, é que tomava a ultima decisão.
Ilustre Mandatário do Recorrente
E o montante que refere era o cheque que o senhor A ia receber, de seiscentas mil patacas ...
L
Quanto é que seria distribuído não era do âmbito das minhas funções.
Ilustre Mandatário do Recorrente
A senhora pergunta ao senhor Ma "vamos distribuir este ano dois milhões?". Se sim, então o senhor Chan passa o cheque, ou os cheques. É isto que a senhora pergunta ao senhor Ma?
Ilustre Mandatário do Recorrente
Sim, foi isso que eu perguntei porque devia ser o senhor A a propor aos sócios. Do meu conhecimento, os sócios é o senhor CXX e o senhor D. Cabia a eles tomar a decisão.
26:05 Mmo. Juíz
Eu faço a pergunta mais directamente: o senhor A alguma vez recebeu alguma quantia da sociedade no valor de seiscentas mil?
L
Não foi uma distribuição para ele.
Mmo. Juíz
Mas ele recebeu?
L
Recebeu, recebeu.
Mmo. Juíz
Por quantas vezes?
L
Não me lembro.
Mmo. Juíz
Mas quer dizer que foram várias vezes?
L
Sim.
Mmo. Juíz
E, do seu conhecimento, por que é que ele recebia as seiscentas mil?
L
O senhor Chan dava-lhe o prémio. Era um prémio.
Mmo. Juíz
Prémio? Ou era dividendos?
L
Não era dividendos.
Mmo. Juíz
Porque é que chegou a essa conclusão?
L
Porque eu sei que os sócios da sociedade eram só o CXX e o D. São os únicos dois sócios. E o senhor A depois de propor os fundos disponíveis ou os lucros dependia dos sócios para ver se devia proceder à distribuição dos dividendos porque a companhia também tinha de ter em conta outras despesas.
Mmo. Juíz
Mas a senhora disse que eram só os dois sócios, deviam dividir entre eles. Porque é que o senhor A também tinha direito a receber seiscentos mil?
L
Eu não sei. O senhor Chan é que decidia quanto é que a título de prémio devia dar ao senhor A (...). Porque foi o senhor CXX que deu isso.
Mmo. Juíz
Ele sempre disse que era um prémio ou bónus?
L
Sim.
Mmo. Juíz
Ele sempre disse que era isso?
L
Sim.
Mmo. Juíz
Mas você utilizou o termo sharing.
L
Sharing para os sócios. Sharing para distribuir entre os sócios. E os sócios a que me estava a referir era o senhor CXX e o senhor D.
Mmo. Juíz
Então a minha dúvida é: quanto é que podia ser distribuído entre os sócios cabia aos sócios decidir. Porque é que pergunta ao senhor A?
L
Porque ele era o consultor, quanto aos assuntos operacionais ou de gestão da companhia, tudo era entregue ao senhor A para ele dar a sua opinião. Aquilo que enviava ao senhor Chan, tinha de enviar ao senhor A também. O que os sócios tinham o senhor A também tinha. E então se havia um prémio, se a companhia tinha lucros o prémio era mais alto ou então variava.
Mmo. Juíz
Então porque é que o montante que era pago era igual? Durante vários anos era seiscentos mil. O prémio devia ser consoante os lucros da sociedade, não é?
L
Isso não sei.
Mmo. Juíz
Quer dizer que isso já não sabe?
L
Exacto. O senhor Chan, eles os sócios é que decidiam.
Mmo. Juíz
Quer dizer, você achou que era um bónus ou um prémio? Foi o senhor Chan que lhe disse isso em 2015?
L
Já antes dessa data ele dizia isso."
Aqui retomando o depoimento na transcrição do Recorrente (pág. 49).
Pelo contrário, resultou directamente dos depoimentos prestados que não foi feita qualquer promessa ao Recorrente para participar nos lucros da 1.ª R.
A pág. 56 das alegações, o Recorrente interrompe a transcrição do depoimento de L entre o minuto 38:34 e o minuto 40:17 mas repomos aqui essa parte do depoimento, em virtude da enorme relevância da mesma:
L (3D1-R6E101420319), 2.° Tradutor
38:46 Mmo. Juiz
A testemunha disse que ela não perguntou ao senhor Ma para saber quanto é que ele pretende receber. Disse que perguntou qual é o montante para distribuir. Ela disse isso apenas.
38:56 Ilustre Mandatário do Recorrente
Sim, sim. Eu sei mas a senhora ao perguntar ao senhor Ma qual é o montante para distribuir, são os dois milhões, a senhora estava a perguntar ao senhor quanto é que ele ia receber em termos de prémio, ou não?
39:12 L
Não!
38:56 Ilustre Mandatário do Recorrente
Porque é que esta pergunta era feita a um não-sócio? O senhor Ma não era sócio. Estamos a falar em proveitos, em lucro, em lucros apurados ao longo do ano, ao longo dos anos da sociedade. Porque é que iam perguntar se era ara distribuir dois milhões ao senhor Ma que não é sócio? Porque é que lhe perguntavam a ele?
39:42 L
Porque ele dava pareceres. O senhor Chan também dava pareceres. Então eu precisava de dizer ao senhor Chan e o senhor Chan é que tomava a decisão.
39:56 Ilustre Mandatário do Recorrente
A senhora chamou-lhe director, veja lá. Então mas o consultor vai dar parecer sobre a distribuição dos lucros?
40:06 L
Isso é uma designação, um título. É como, então, por exemplo ...”
Aqui retoma a transcrição do Recorrente para a qual se remete.
O Recorrente insistiu, repetiu, perguntou por todas as formas se a distribuição era de dois milhões todos os anos e se o valor era distribuído, e até se indispôs com a testemunha (minuto 04:00 e seguinte, 3D117J-101420319, 2.º Tradutor). A testemunha respondeu, de forma firme, convincente e sempre coerente, o mesmo: os lucros não eram necessariamente de dois milhões todos os anos, a razão pela qual perguntava ao Recorrente anualmente sobre o montante que deveria ser distribuído era porque ele tinha a cargo as questões operacionais e porque ele sabia que montante a companhia podia dispor para distribuir aos sócios, ao 2.° e 3.º RR, e não ao Recorrente!
A testemunha L tem um conhecimento factual e profundo das operações da 1.ª Ré porque é sócia, administradora e trabalha de facto na empresa subcontratada que detinha a licença de segurança, facto que demonstrou.
A instâncias da mandatária dos RR., a mesma testemunha respondeu:
L [(3D11OJ-101420319), 2.º Tradutor, entre os minutos 17:29 e 18:55]
Mmo. Juiz
Você lembra-se daquela arvore? Será que foi por causa da Sincere? Por isso é que está lá?
L
É um dos motivos. Porque a Sincere também participou na prestação de serviços junto do Hotel H. Os funcionários da Sincere também trabalhavam lá.
Mmo. Juiz
Mas há duas companhias: a Trust Overseas e a Sincere. A sua intervenção nessas duas companhias é diminuta? ou só para dizer aquilo que o senhor Chan pedia? Porque são duas companhias diferentes.
L
Em relação a essas duas companhias claro que eu tinha de tratar dos assuntos relacionados porque pertencia ao senhor Chan.
Mmo. Juiz
Quer dizer que a Sincere, quanto ao funcionamento da Sincere, você tem conhecimento?
L
Sim.
Mmo. Juiz
E da B?
L
Eu é que tratava da papelada e através disso tomava conhecimento.
Mmo. Juiz
Não é só tomar conhecimento você participava activamente porque você enviava as cartas electrónicas e tudo, não é?
L
Sim.
Mmo. Juiz
E o que é que fazia mais na B?
L
Pagamento de salários, emissão de facturas, esse tipo de trabalho administrativo.
Mmo. Juiz
E tinha de fazer isso porque a mulher do senhor Chan pediu a senhora para prestar assistência?
L
Sim.
(...)
Entre os minutos 19:07 e 20:53
Mandatária dos RR.
Voltando aquele e-mail onde são pedidas opiniões, aqueles e-mails que enviava ao senhor A a pedir a opinião dele nos lucros, importa-se de explicar porque é que perguntava, ou seja, quais eram as funções do senhor A na empresa que se justificava que lhe perguntasse?
L
Porque ele tinha que fornecer as opiniões no funcionamento da administração da companhia e por isso em termos administrativos e operacionais ele tinha que dar a sua opinião. Tinha que saber por exemplo qual é o fundo que nos tínhamos, se houvesse algumas despesas, estimativas, também tinha de ter conhecimento disso.
Mandatária dos RR.
Porque ele ajudava a planear a planear as actividades económicas, os custos? É uma pergunta.
Ele ajudava a planear, por exemplo, ser era preciso equipamentos, se era preciso comprar fardas, ele ajudava a fazer isso.
L
Sim, sim.
Mandatária dos RR.
Portanto ele tinha de isolar, é uma pergunta também - ele tinha de isolar dos montantes que a L dizia ''isto está disponível" ele tinha de isolar o que tinha de reservar para despesas?
L
Sim."
Passagens do depoimento claríssimas e seguras da testemunha, que foi (também) arrolada pelo próprio Recorrente, e que demonstrou conhecimento directo da operação da empresa.
Mas que foram omitidas nas alegações do Recorrente.
A transcrição do Recorrente não é exacta, numa questão relevante, ao minuto 29:21 do depoimento, transcrito na pág. 50 das alegações do Recorrente:
(Mmo. Juíz: Não havia lucros?
L: Sim.)
29:20 Mmo. Juíz
E até houve prejuízo, é? (e não que "houve muitas vezes" lucros como se depreende da transcrição do Recorrente)
29:24 L
Sim. os sócios é que tinham de reforçar as despesas. Tinham de contratar pessoal tinham de pagar os salários.
29:32 Mmo. Juíz
E o senhor A o que é que recebia na altura?
29:34 L
Depois de operar durante um tempo é que começou a receber um salário. "
O Recorrente quis convencer, sem sucesso, o ilustre tribunal de que tinha direito a uma comparticipação nos lucros da 1.ª R. sem nunca ter investido uma pataca na sociedade e sem nunca ter tido outra participação para além das funções pelas quais recebia um vencimento.
A este propósito foi perguntada a testemunha M, a instâncias do colectivo (21.5.6 #12, 3D@EHI$101020319, 25:25)
''M
Eu só soube do trabalho porque o saldo da companhia era negativo. Era preciso investir muito, comprar muitas ... ambos os sócios investiram muito dinheiro e não se pensou como havia de ser no futuro. Apenas ele, o meu irmão, foi contratado e prometeu-se um salário.
Mma. Juíza
E quanto é que investiram?
M
Logo no início um milhão e depois as fardas, os walkie-talkies, foi feito um grande investimento.
Mma. Juíza
Mas qual o montante?
M
Eu não me recordo. Não gostava aqui de dar um valor que não corresponde à verdade.
Mma. Juíza
E o seu irmão? Pagou alguma coisa?
M
Tenho a certeza que não. (26:10)”
Até J, pessoa de confiança máxima do Recorrente já acima citada, confirmou no seu testemunho que o Recorrente era uma mero consultor [no testemunho parcialmente transcrito na pág. 95 das alegações do Recorrente, e que ora se acrescenta (21.5.13 #17 (3D@M)AW01020319)]:
"09:40 Ilustre Mandatário do Recorrente
O que é que foi o trabalho dos seus colegas e provavelmente do senhor A quando se iniciou este contrato de prestação de serviços de segurança privada no H. O que é que vocês fizeram? qual foi o papel de cada um? E o que é que fizeram efectivamente?
Para nós percebermos se houve algumas coisas novas. E o que é que fizeram e quem é que fez?
J
Depois da inauguração do hotel o senhor A dava muita importância em relação à segurança e a incêndio e ele era o nosso consultor dessa área de incêndio, em 2013 até houve o incêndio até houve o ensaio ...
Ilustre Mandatário do Recorrente
Não, não, não vamos falar de 2013, vamos falar de 2009 (...)".
Os depoimentos citados pelo Recorrente nas suas alegações não deixam dúvidas de que as testemunhas se limitam a reproduzir o que o próprio Recorrente lhes disse, como as próprias afirmam, e não sabem precisar nem concretizar o que o Recorrente lhes disse e não têm qualquer conhecimento de facto sobre a alegada posição de sócio do Recorrente.
Não têm qualquer razão de ciência para o que dizem e afirmam que apenas o ouviram da boca do Recorrente.
O depoimento da testemunha L [(3D1-R6E101420319), 2.º Tradutor] foi claro nesta matéria:
05:12 Ilustre Mandatário do Recorrente
Então a senhora conhece o senhor Veng, ajudava-o sempre, e conhece o senhor Ma. O que é que o senhor Ma fazia no meio disto tudo lá com o H?
05:23 L
O papel dele, portanto, sim, prestava opiniões à empresa, dar a sua opinião sobre o funcionamento com o papel de consultor.
É precisamente o facto de o Recorrente ter sido contratado como consultor que justifica este não se encontrar registado como trabalhador dependente na Direcção dos Serviços de Finanças, porque, de facto, não o era. A actuação da 1.ª R. é consistente com a posição que sempre tomou junto das autoridades públicas e que afirmou nos autos.
O que a prova testemunhal demonstrou sobejamente foi que o Recorrente se fazia passar, perante os trabalhadores da 1.ª R., por algo que não era - sócio - e que lhes exigia o tratamento de "patrão" o que é, no mínimo, abusivo!
É elucidativo o esclarecimento solicitado pela Mma. Juíza à testemunha I sobre a convicção deste acerca do Recorrente ser o "Patrão", parte que não se encontra transcrita nas alegações do recorrente e antecede e contextualiza a transcrição que se pode ler na página 35 e 36 das alegações.
I, 21.5.5 #12 (3D1-@_Hl01420319), 2.° Tradutor
00:07 Mma. Juíza
o J disse-lhe que o Sr. A é patrão. Esses termos foram ditos por ele, certo?
00:18 I
Sim
00:20 Mma. Juíza
E deu-lhe alguma informação a provar que ele é patrão? Ou seja, apenas disse que ele era patrão, quer ele era sócio? Por exemplo, ele tem participação social? Ele deu-lhe mais algumas informações para explicar por que é que ele é patrão?
00:37 I
Quanto a isso não. Não sei.”
Passagem demonstrativa de que a testemunha só está a repetir as palavras do Recorrente. Ideia que é reforçada com a conversa que acontece entre o minuto 1:27 e o minuto 4:13 do mesmo trecho citado pelo Recorrente.
Testemunha I (21.5.6#12, Tradutor 2, transcrição pelo Recorrente na pág. 36 das sua alegações):
1:44 Pergunta da Mma. Juiza:
Então durante os dois anos que você trabalhou, houve alguma cena ou algum acontecimento que você acha que ele é patrão?
1:55 Resposta da Testemunha:
Sim. Porque foi ele que liderava o senhor J, que nas reuniões, por exemplo nas patrulhas, também a instalação de câmaras, também foi o senhor J que fazia sob indicações de A.
2:22 Pergunta da Mma. Juiza:
Eu insisto a minha pergunta, você disse que ele dava indicações ao senhor J e depois ele desenhava os caminhos de patrulha, mas isto podia ser um gerente ou um patrão que fazia.
Duas possibilidades. Então porque é que você acha que ele é patrão e não acha que ele é apenas um mero gerente?
2:50 Resposta da Testemunha:
Porque depois de ingressar, eu sei que ele é um dos patrões.
2:54 Pergunta da Mma. Juiza:
Um dos patrões, não é? Porque é que ele lhe disse isso?
2:50 Resposta da Testemunha:
É que desde que Ingressei. foi ele que me ensinou, foi ele que me ajudou muito.
(...)
3:35 Pergunta da Mma. Juiza:
Então porque é que, é que eu não estou a perceber. Você como guarda de segurança e ele como seu chefe, porque é que lhe vai dizer que ele é patrão. E também você que o senhor Ma disse que era o patrão? Em que circunstância ou ocasião ele disse isso?
4:04 Resposta da testemunha:
Por exemplo, disse que "você esforça mais, você tem oportunidade de se promover, eu sou um dos patrões”.
4:11 Pergunta da Mma. Juiza:
Quer dizer, foi ele que lhe disse isso, não é?
4:13 Resposta da Testemunha:
Sim, sim. "(sublinhado nosso)
Testemunha J (21.5.13#17, Tradutor 2, transcrição pelo Recorrente na pág. 92 das sua alegações):
"19:11 Advogado:
O senhor sabe como é que, o senhor Ma aquele que se chama patrão, trabalhava nesta relação com a B, como é que eles funcionavam, recebia ordenado, havia um contrato. Em relação ao senhor Ma, o senhor sabe como é que era a relação da B no âmbito deste contrato com a H?
19:47 Testemunha:
Do meu conhecimento, a B tem o patrão e daquilo que me apercebi, ele era um dos sócios da companhia mas também só ouvi falar por parte dele que era sócio da B.
20:04 Advogado:
Ele dizia que era sócio da B?
20:07 Testemunha:
Sim.
Testemunha K (21.5.13#17, Tradutor 2, transcrição pelo Recorrente na pág. 111 das sua alegações):
"2:07:26 Testemunha:
Para além do ordenado, eram os lucros anuais que era distribuído entre os 3 sócios, ou seja, em 2017, 2018, mais ou menos em Janeiro, não foi distribuído, depois parece que depositaram a B.
2:07:47 Advogado:
Foi o senhor A que lhe disse? O senhor nunca viu documentos?
2:07:57 Testemunha:
Sim, foi o senhor A que me contou.
2:07:47 Advogado:
O que é que ele recebia em termos práticos? Se era uma percentagem, um montante? O ordenado 25,000 mil patacas? Ele disse-te alguma coisa sobre isso? Já percebeste que tem haver com o lucro, o que é que tinha deixado de receber?
2:08:26 Testemunha:
Quanto ao lucro, ele disse por ano 2 milhões destes lucros deveria ser distribuído entre os 3 sócios, ele tinha 30%, por isso, devia ser 600 mil.
2:08:39 Advogado:
Porque é que o senhor A lhe disse isto tudo? Que relação que vocês tinham para lhe dizer isto tudo? É um bocado suspeito, não é da família.
2:08:51 Testemunha:
Se calhar ele confia em mim, acha que sou uma pessoa honesta e, de facto, sou um bom trabalhador.
2:09:06 Advogado:
Portanto, o senhor ouviu da boca porque é uma pessoa de confiança e está sob juramente, aquilo que ouviu é da boca do senhor A. Não tem dúvidas sobre isso.
2:09:15 Testemunha:
Sim, sim."
A transcrição destas partes pelo Recorrente para demonstrar quer "era sócio" só podem resultar de uma confusão do próprio entre o papel e funções de um superior hierárquico de um conjunto de trabalhadores e o papel de proprietário, sócio de uma empresa. Confusão lamentável que não prova o que o Recorrente alega.
O Recorrente insiste em confundir uma posição de chefia com a posição de proprietário da empresa.
O Recorrente insiste na teoria desrazoável - já discutida e rebatida pelo próprio colectivo em audiência - de que é aos proprietários da empresa (os sócios) que cabe presidir a reuniões com o Hotel, elaborar políticas internas de funcionamento ou códigos de conduta.
Veja-se a citação feita pelo próprio Recorrente, na pág. 107 das suas alegações: "47:29 Juiz: Na verdade, os donos reais na verdade não tinham que fazer nada, ter reuniões ..."
Na visão, errada, do Recorrente, todos os trabalhadores, incluindo os trabalhadores com posições de chefia, estariam relegados a funções automatizadas, não decisivas, e sem conteúdo relevante.
Engana-se o Recorrente, todos os (bons) trabalhadores são essenciais a uma empresa e isso não faz deles sócios.
Tal entendimento do funcionamento de empresa não tem espelho no mundo empresarial real, onde os sócios podem ser o que quiserem desde que façam o investimento que lhes é solicitado e não têm qualquer obrigação de tomar decisões operacionais, ou estar presentes em situações operacionais, como arvora o Recorrente, mas apenas de escolher as pessoas que exercerão essas funções.
E, nessa medida, a presença do Recorrente em reuniões, a divulgação de políticas internas e código de conduta não têm o significado que este insiste em atribuir, uma vez que o Recorrente era o elo diário com os trabalhadores e com o hotel.
Não resultou provado que o Recorrente era responsável pela contratação de trabalhadores (quesito 22.º da BI). De todos os depoimentos citados pelo Recorrente apenas se depreende que era o Recorrente quem entrevistava alguns candidatos, e orientava o trabalho de cada um nas funções. Nenhuma testemunha citada pelo Recorrente demonstra que tivesse autonomia para contratar ninguém sem o consentimento do sócio-gerente CXX, sendo certo que se tal acontecesse poderia fazer parte do conteúdo funcional da sua posição, não sendo indício de que era sócio. Imagine-se o que seria das empresas com milhares de trabalhadores se os proprietários tivessem de contratar o pessoal ... ou que lógica empresarial isso seguiria.
Ainda assim, o depoimento de J transcrito pelo Recorrente na pág. 93 das suas alegações é muito claro:
“00:36 Juiz:
Qual a relação que tem com AXX Júnior A?
00:44 Testemunha:
É o meu patrão, foi ele que me contratou.
00:46 Juíz:
Contratou-o directamente e paga-lhe o salário?
00:51 Testemunha:
Quem o contratou não foi ele, foi a companhia. Foi ele que me apresentou o emprego.
00:58 Juiz:
Em relação à segurança B; alguma relação?
01:05 Testemunha:
Empregadora e empregado.
01:05 Juiz:
Quer dizer você tem duas entidades empregadoras?
01:12 Testemunha:
Foi a B que me contratou, o senhor A apresentou-me o emprego.
01:21 Juiz:
Mas que relação tem com ele?
01:12 Testemunha:
Ele é o meu superior.
01:29 Juiz:
Quer dizer só tem relação com ele por causa da companhia B. Ele é seu superior na companhia?
01:33 Testemunha:
Sim, superior na companhia.
01:36 Juiz:
E CXX que relação tem consigo?
01:42 Testemunha:
Eu sei que ele é o patrão da B. E o DXX também." (sublinhado nosso).
Também não resultou provado que que o lucro recebido pela 1.ª R. tivesse passado a ser recebido pelos 2.° e 3.° RR. através da Companhia de Serviços de Segurança F Limitada controlada por terceiros familiares (quesito 31.º da BI).
Nenhum depoimento citado pelo Recorrente o demonstra, nem apresentou qualquer prova do 2.° e/ou 3.° RR. terem qualquer controlo sob a F.
Pelo contrário, os testemunhos que ora se citam demonstram uma total autonomia das duas sociedades - B e F.
A instâncias do Mmo. Juiz, a testemunha M respondeu o seguinte, entre os minutos 04:35 e 07:30 [21.5.13 #17 (3D1A3)_W01420319), 2.º Tradutor]:
Ilustre Mandatário do Recorrente
34:37: Agora responde à minha pergunta. O que eu lhe perguntei foi, se a administração da H tiver que fazer reuniões formais como a B fez várias vezes entre administrações e fizeram documentos, e assinaram documentos, se for chamada quem é que vai em nome da F representar a F?
A Cynthia, a Cynthia. A Cyntia é que a assinou, a Cynthia é que vai.
A instâncias do Mmo. Juiz, a testemunha respondeu o seguinte, entre os minutos 02: 11 e 04:13 [21.5.13 #17 (3D@E($DG01420319), 2.º Tradutor]:
Mmo. Juiz
Trabalha para a F?
M
Sim.
Mmo. Juiz
E o que faz na F?
M
Eu faço trabalho interno, eu trabalho com expediente do escritório, os papéis.
(...)
03:27 Mandatária dos RR.
Eu gostaria de lhe perguntar quem é tem o controlo efectivo da F? Quem é que toma as decisões? Quem é que contrata? Quem é que controla a F?
M
A Cynthia e o António.
Mandatária dos RR.
o António é seu filho. E pode explicar qual é a participação efectiva do seu marido e do seu cunhado nesta sociedade?
M
Em termos de funcionamento, havendo falta de experiência, limitam-se a partilhar a sua experiência.”
Por último, não foi demonstrado que o Recorrente não recebeu o lucro referente aos anos de 2017, 2018 e 2019 (quesito 33.° e 42.°).
Desde logo, porque ficou sobejamente provado que ao Recorrente não eram devidos quaisquer lucros, de acordo com depoimentos acima transcritos.
Ademais se demonstrou que a 1.ª R não distribuiu qualquer lucro aos seus sócios - 2.° e 3.° RR - nos anos de 2017, 2018 e 2019 porquanto, sabendo com antecedência que o contrato com o hotel H iria terminar em Junho de 2019, entendeu transferir todos os proveitos da operação para uma reserva destinada a pagar as compensações legais devidas aos trabalhadores da empresa.
Também ficou demonstrado que os trabalhadores da 1.ª R. não receberam qualquer prémio nos anos de 2017, 2018 e 2019.
Ainda a este propósito, a instâncias da mandatária dos RR., a testemunha M depôs o seguinte [21.5.13 #17 (3D@E($DG01420319), 2.º Tradutor]: 13:40 Mandatária dos RR.
Sabe se foram distribuídos lucros aos sócios depois de 2017?
M
Não, uma vez que a companhia tinha que fechar e tínhamos que tratar do despedimento, razão porque os sócios não receberam nada. Também não houve distribuição de prémios aos trabalhadores .
A mesma testemunha, respondendo às questões colocadas pelo colectivo:
[21.5.13 #17 (3D@FOI6101020319, 04:42), 2.º Tradutor]
Mma. Juíza
Segundo a sua ideia, em 2017 já havia uns conflitos e o H ia deixar de vos entregar e por isso o seu marido não pretendia pagar-lhe esse montante. Foi por causa disso?
M
Não, não. Eu pessoalmente gostava de explicar, seja companhia ia encerrar pq não havia mais contratos era preciso pagar uma indemnização aos trabalhadores, de onde é que vinha o dinheiro para pagar essa indemnização? E o fundo de reserva? Era necessário ter fundo de reserva. Se já sabíamos.
Mma. Juíza
Então quer dizer que em 2017 não lhe pagar esse prémio nada tinha a ver com o conflito que vocês tinham?
M
Não, não. Em 2017 principio de 2017 houve um pagamento."
Bastante claro foi o depoimento de L sobre esta questão que se encontra transcrito nas alegações do Recorrente, a páginas 69 (0:35) até à página 72 (0:42), para o qual se remete, evitando a repetição.
Pelo acima exposto, é absolutamente infundado o recurso do Recorrente, assim se compreendendo a justeza e legalidade da decisão recorrida que deve ser mantida.
Do exposto, resulta ainda claro que não tem fundamento o pedido de reapreciação de prova do Recorrente porquanto não "ocorre flagrantemente uma desconformidade entre a prova produzida e a decisão tomada, nomeadamente quando não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação", conforme a posição já tomada pelo ilustre TSI (in Proc. 847/2018).
Nenhuma das transcrições apresentadas pelo Recorrente infirmam as decisões tomadas pelo ilustre tribunal a quo quanto à matéria de facto e, nessa medida, deve ser rejeitado o pedido de reapreciação da prova formulado pelo Recorrente.
*
Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
* * *
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
III – FACTOS ASSENTES:
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
- Da Matéria de Facto Assente:
1. O 2º Réu é cunhado do Autor, por ser casado com a irmã deste. (alínea A) dos factos assentes)
2. Conforme a AP. 41/02072009 e a AP. 15/12062018 (fls. 39 e 47 dos autos) do registo comercial, o 2.º Réu foi sócio da 1.ª Ré desde 26 de Junho de 2009 até 8 de Junho de 2018. (alínea B) dos factos assentes)
3. O 3.º Réu é irmão do 2.º Réu e foi sócio da 1.ª Ré entre 26 de Junho de 2009 e 14 de Novembro de 2017, conforme a AP. 41/02072009 e a AP. 12/01122017 (fls. 39 e 45 dos autos) do registo comercial. (alínea C) dos factos assentes)
4. O sócio U é primo da esposa do 3.º Réu. (alínea D) dos factos assentes)
5. Pela deliberação datada de 17 de Setembro de 2009, o 2º e o 3º Réus foram nomeados como únicos administradores da 1ª Ré (conforme a AP.17/30092009; fls. 40 a 41 dos autos). (alínea E) dos factos assentes)
6. Conforme a AP. 12/01122017 (fls. 45 dos autos), o 3.º Réu, através do contrato de 14 de Novembro de 2017, transmitiu a sua quota à sua filha S. (alínea F) dos factos assentes)
7. Conforme a AP. 15/12062018 (fls. 47 dos autos), o 2.º Réu transmitiu a sua última quota na 1.ª Ré ao seu filho R, através do contrato de 08 de Junho de 2018. (alínea G) dos factos assentes)
8. Conforme a AP. 17/12062018 (fls. 48 dos autos), a partir de 08 de Junho de 2018, S e R desempenham as funções de administrador da 1ª Ré. (alínea H) dos factos assentes)
9. O vencimento que a 1ª Ré acordou a pagar mensalmente ao Autor primeiro foi de MOP$25,000.00 (vinte e cinco mil patacas) mensais, e posteriormente elevado para as actuais MOP$34,700.00 (trinta e quatro mil e setecentas patacas) mensais. (alínea I) dos factos assentes)
10. A partir de 1 de Julho de 2019 quem ficará responsável pela gestão dos serviços de segurança privada no hotel H é a sociedade por quotas Companhia de Serviços de Segurança F Limitada. (alínea J) dos factos assentes)
11. São os administradores desta sociedade S e R. (fls. 120 e 121) (alínea K) dos factos assentes)
12. S é sócia desta sociedade tendo uma quota no valor de MOP50,000.00. (fls. 120) (alínea L) dos factos assentes)
13. R é sócio desta sociedade tendo uma quota no valor de MOP49,000.00. (fls. 120) (alínea M) dos factos assentes)
14. O Autor interpelou judicialmente – através de notificação judicial avulsa – a 1.ª Ré, missiva recebida por esta a 11 de Fevereiro de 2019, para cumprimento das prestações alegadamente em falta, havendo a resposta sido de que nada seria pago ao Autor. (alínea N) dos factos assentes)
- Da Base Instrutória: (no que à sua motivação concerne, vejam-se as fls. 922 a 930v)
15. Em finais de 2008 ou em princípio de 2009 começou a ser preparada a abertura de um novo hotel em Macau, sito no NAPE: o Hotel H, que veio a iniciar as suas operações no dia 21 de Setembro de 2009. (resposta ao quesito 1º da base instrutória)
16. A Companhia de Administração P Limitada (P Hotel Management Company Limited), entidade operadora do Hotel H, procurou, na fase de preparação para a abertura do hotel, uma empresa especializada em prestação de serviços de segurança que pudesse gerir todo o esquema de segurança privada do hotel. (resposta ao quesito 2º da base instrutória)
17. A 1.ª Ré, na pessoa do 2º Réu, convidou o Autor a montar e gerir o plano de segurança privada do Hotel H, e a supervisionar as operações diárias que caberiam à 1.ª Ré por virtude da sua contratação pela Companhia de Administração P Limitada. (resposta ao quesito 3º da base instrutória)
18. Um dos motivos do convite foi por causa da experiência do Autor no ramo da segurança, tendo trabalhado na Polícia Judiciária de Macau. (resposta ao quesito 4º da base instrutória)
19. O Autor aceitou o convite, tendo o Autor e a 1ª Ré acordado que o Autor recebesse da 1ª Ré um vencimento fixo e mensal enquanto gerente operacional da empresa e que o Autor se obrigasse a montar, organizar e gerir a estrutura de segurança do hotel H, e a associar-se ao exercício da actividade levada a cabo pela 1.ª Ré no hotel H. (resposta aos quesitos 6º, 7º e 8º da base instrutória)
20. O Autor chegou a participar nas negociações entre a 1ª Ré e Companhia de Administração P Limitada. (resposta ao quesito 10º da base instrutória)
21. Em 15 de Julho de 2009, foi celebrado o acordo de prestação de serviço, cuja cópia se encontra junta a fls. 280 a 300 dos autos, entre a 1.ª Ré e a Companhia de Administração P Limitada, através do qual aquela se tornou responsável pela gestão dos serviços de segurança das instalações do hotel H. (resposta ao quesito 11º da base instrutória)
22. O contrato de prestação de serviços acima referido foi sendo sucessivamente renovado até 30 de Junho de 2019. (resposta ao quesito 12º da base instrutória)
23. Em 09 de Fevereiro de 2015, 03 de Março de 2016, e 02 de Março de 2017, o Autor recebeu da 1ª Ré, cada vez nas datas indicadas, o montante de MOP600,000.00. (resposta ao quesito 14º da base instrutória)
24. Em data não apurada de 2017, começou a ocorrer desavenças entre o Autor e o 2º Réu. (resposta ao quesito 16º da base instrutória)
25. O vencimento fixo, referente aos meses de Agosto a Dezembro de 2017, foi pago ao Autor em Janeiro de 2018, após o protesto do Autor. (resposta aos quesitos 17º e 19º da base instrutória)
26. O Autor, desde a data não apurada em finais de 2009 até 30 de Junho de 2019, desempenhava as funções como gestor operacional da 1.ª Ré, relativamente aos serviços de segurança privada que esta prestava ao Hotel H. (resposta ao quesito 21º da base instrutória)
27. O Autor era responsável por organizar e gerir o plano de segurança do hotel. (resposta ao quesito 23º da base instrutória)
28. O Autor era responsável por resolver os problemas que surjam nas operações da empresa. (resposta ao quesito 24º da base instrutória)
29. Estando disponível para prestar os seus serviços 24 horas por dia. (resposta ao quesito 25º da base instrutória)
30. Tendo em conta que o Hotel H tem nas suas instalações não só um hotel, como fracções habitacionais, um clube nocturno, uma sauna, um parque de estacionamento e mesmo ao lado o casino H, bem como a sua localização, a gestão do plano de segurança privada do Hotel H é mais exigente do que a dos edifícios normais. (resposta ao quesito 26º da base instrutória)
31. Provado o que consta da resposta dada aos quesitos 6º, 7º e 8º. (resposta ao quesito 27º da base instrutória)
32. Provado o que consta da al. J dos Factos Assentes. (resposta ao quesito 31º da base instrutória)
33. Em 2017, 2018 e na primeira metade de 2019, para além do seu vencimento, o Autor não recebeu mais nenhuma quantia da 1ª Ré. (resposta ao quesito 33º da base instrutória)
34. A Companhia de Administração P Limitada não renovou a contratação da 1ª Ré, fazendo com que esta deixasse de poder prestar os seus serviços de segurança ao Hotel a partir de 1 de Julho de 2019. (resposta ao quesito 38º da base instrutória)
35. A Companhia de Administração P Limitada decidiu pela não renovação da contratação da 1ª Ré no final do primeiro semestre de 2019, uma vez que a 1ª Ré não conseguiu obter a alvará de exercício da actividade de segurança privada. (resposta ao quesito 39º da base instrutória)
36. Sabendo que ia encerrar operações com o hotel, e consciente das obrigações legais que teria de cumprir no futuro, a 1ª Ré entendeu guardar os lucros das operações para assegurar que dispunha das quantias necessárias a pagar indemnizações aos seus trabalhadores e para fazer face a outras despesas necessárias ao fecho das suas operações, despesas que foram antecipadas desde 2017 e que foram a razão da manutenção do rendimento na sociedade. (resposta ao quesito 40º da base instrutória)
37. PROVADO o que consta da resposta dada aos quesitos 33º e 40º. (resposta ao quesito 42º da base instrutória)
38. Sem considerar as indemnizações e despesas que a 1ª Ré teria que pagar, referidas na resposta dada ao quesito 40º, a 1ª Ré teve nos anos de 2017 e 2018 lucros à volta de MOP$2,000,000.00 em cada ano, e na primeira metade de 2019, lucros à volta de MOP$1,000,000.00. (resposta ao quesito 44º da base instrutória)
* * *
IV – FUNDAMENTAÇÃO
Na decisão anterior tecemos os seguintes argumentos neste ponto de recurso (que mantemos aqui por continarem a valer para apreciar as questões discutidas nesta parte do recurso):
A – Recurso interlocutório:
Para nos melhor percebermos o que se passou nessa fase de processo, importa ver cronologicamente o que aconteceu neste ponto:
Em 16/03/2020 o Autor/Recorrente apresentou um requerimento e 16 documentos, com o seguinte teor:
“
AXX, Autor nos autos à margem epigrafados e neles melhor identificado, notificado do Douto Despacho de V.Exa. de fls 329 e ss., vem pela presente e ao abrigo do disposto no artº 431 do Código de Processo Civil, mui respeitosamente, requerer,
Das diligências probatórias
I - Vem reiterar o pedido feito anteriormente para que seja à 1ª Ré ordenada a juncão aos autos da sua escrituração mercantil e documentos a ela relacionados relativa aos exercícios de 2017 e 2018, tal como requerido na Réplica e ao abrigo do disposto nos art°s 455 e 461 do CPC e 51°, 52° e 53° do Código Comercial na medida em que são particularmente relevantes para a descoberta da verdade material tendo em conta os quesitos Doutamente selecionados para a B.I.;
II - Ao abrigo do disposto no Artº 455 do CPC, e por serem fundamentais à descoberta da verdade material, vem requerer que a 1ª Ré venha juntar aos Autos os formulários da Direcção dos Serviços de Finanças M3/M4 relativos ao pagamento do imposto profissional dos seus empregados inscritos para os anos 2016, 2017, 2018 e 2019 (este último quando estiver disponível).
III - Ao abrigo do disposto no Art° 455 do CPC, e por serem fundamentais à descoberta da verdade material, vem requerer que a 1ª Ré venha juntar aos Autos os comprovativos dos pagamentos feitos ao Fundo de Segurança Social relativos aos anos de 2016, 2017, 2018 e 2019 até à presente data.
IV - Ao abrigo do disposto no Art° 455 do CPC, e por serem fundamentais à descoberta da verdade material, vem requerer que a 1ª Ré venha juntar aos Autos comprovativo do pagamento no Fundo de Segurança Social da Taxa de Contratação Mensal dos Trabalhadores Não Residentes, relativos aos anos de 2016, 2017, 2018 e 2019.
V - Ao abrigo do disposto no Artº 458 do CPC, e por serem fundamentais à descoberta da verdade material tendo em conta a douta selecção de factos controvertidos na B.I., vem requerer ao Douto Tribunal para que seja notificada a Companhia de Segurança F Limitada, melhor identificada no Doc. 31 junto com a Petição Inicial (p.i.) com sede na 澳門......大馬路...號......商業中心...樓...座para se digne vir aos autos juntar:
a) a sua escrituração mercantil e documentos a ela relacionados relativa aos exercícios de 2017 e 2018 e ao abrigo do disposto nos art°s 455 e 461 do CPC e 51°, 52° e 53° do Código Comercial,
b) os formulários da Direcção dos Serviços de Finanças M3/M4 relativos ao pagamento do imposto profissional dos seus empregados inscritos para os anos 2017, 2018 e 2019 (este último quando estiver disponível),
c) comprovativos dos pagamentos feitos ao Fundo de Segurança Social relativos aos anos de 2017, 2018 e 2019 até à presente data,
d) comprovativo do pagamento no Fundo de Segurança Social da Taxa de Contratação Mensal dos Trabalhadores Não Residentes, relativos aos anos de 2017, 2018 e 2019.
VI - Ao abrigo do disposto no art° 455º do CPC, requerer que seja notificada a 1ª Ré para vir aos Autos juntar original ou pública forma dos Documentos 5 a 10, 12, 13 a 27, 29 juntos com a p.i.
VII - Ao abrigo do disposto no artº 455º do CPC, requerer que seja notificada a 1ª Ré para vir aos Autos juntar original ou pública forma dos Documentos que ora se junta cópia ao presente requerimento e que vão identificados como Doc. 1 do presente requerimento para melhor enquadramento do tribunal,
VIII - Ao abrigo do disposto no art° 455º do CPC, requerer que seja notificada a 1ª Ré para vir aos Autos juntar original ou pública forma dos Documentos que ora se junta cópia ao presente requerimento e que vão identificados como Doc. 2 do presente requerimento para melhor enquadramento do tribunal.
IX - Ao abrigo do disposto no art° 455º do CPC, requerer que seja notificada a 1ª Ré para vir aos Autos juntar original ou pública forma dos Documentos que ora se junta cópia ao presente requerimento e que vão identificados como Doc. 3 do presente requerimento para melhor enquadramento do tribunal, e que se reportam a cartas enviadas pelo Autor à 1ª Ré a exigir o pagamento dos salários em atraso.
X - Ao abrigo do disposto no artº 455º do CPC, requerer que seja notificada a 1ª Ré para vir aos Autos juntar original ou pública forma dos Documentos que ora se junta cópia ao presente requerimento e que vão identificados como Doc. 4 do presente requerimento para melhor enquadramento do tribunal, e que se reportam a cartas enviadas pelo Autor à 1ª Ré a exigir o pagamento dos lucros em atraso.
XI - Ao abrigo do disposto no art° 455º do CPC, requerer que seja notificada a 1ª Ré para vir aos Autos juntar original ou pública forma do Documento de que ora se junta cópia ao presente requerimento e que vai identificado como Doc. 5 do presente requerimento para melhor enquadramento do tribunal.
XII - Vem mui respeitosamente requerer que seja aceite a junção de impressões de emails, que ora se juntam como Doc. 6 do presente requerimento, cujo conteúdo é relevante para a descoberta da verdade material, solicitando que lhe seja emitida guia de pagamento de multa ao abrigo do disposto no art° 450, nº2 do CPC.
Depoimento de Parte
XIII - Vem requerer, ao abrigo do disposto nos artºs 477° e ss. do CPC, o depoimento de parte dos 2° e 3º Réus, ambos relativamente aos Quesitos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 13, 14, 29 e 31 da douta B.I., na medida em que são factos cuja prova depende essencialmente do conhecimento pessoal dos mesmos.
XIV - Vem requerer, ao abrigo do disposto nos artºs 477° e ss. do CPC, o depoimento de parte de S, com domicilio em澳門......馬路...號......花園...樓...座, e T, com domicilio em 澳門.......街...號......花園大廈...樓...座, em representação da 1ª Ré, relativamente aos Quesitos 29, 31, 38, 39, 40, 44,
(…)”.
Em 28/05/2020 e na sequência das diligências probatórias requeridas pelo Autor/Recorrente, o Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho, que é objecto deste recurso interlocutório:
“(…)
Fls. 482 a 546:
Requerimento de várias diligências probatórias.
Prova documental
Vem o Autor requerer nos pontos I a XI, documentos à 1ª Ré e a terceiro.
Em primeiro lugar, não se especificaram os factos que com os documentos quer provar, mesmo após à solicitação do Tribunal (fls. 575v). Não basta dizer genericamente “os quesitos Doutamente seleccionados para a BI” ou “a douta selecção de factos contravertidos na BI”.
Por outro lado, no ponto I, o A. requer à 1ª R. entregar a sua escrituração mercantil e respectivos documentos a ela relacionados aos exercícios de 2017 e 2018. Como se sabe, a escrituração mercantil é um conjunto dos documentos ligados às actividades comerciais duma empresa ou sociedade, incluindo livro de balanços, de actas etc. Outra vez, o A. não identificou os documentos específicos ora pretender a Ré juntar. Não está conforme previsto no art. 455°, n.° 1 do CPC. Aliás, não se pode olvidar que a escrituração mercantil é de carácter secreta, só se pode divulgar nas circunstâncias limitadas (art. 52° do C. Comercial). Pelo exposto, indefere-se este ponto de requerimento.
No ponto II, III e IV, se requer à 1ª R. os formulários da DSF M3/M4 relativos ao pagamento do imposto profissional dos empregados inscritos para os anos 2016 a 2019, os comprovativos dos pagamentos feitos ao FSS de 2016 até a presente data, bem como o comprovativo do pagamento no FSS da Contratação Mensal dos Trabalhadores Não Residente relativos aos anos 2016 a 2019. Trata se de documentos relativos aos empregados da 1ª Ré, que não se relevam, sem mais explicações, para a decisão da presente causa. Assim sendo, é de indeferir estes requerimentos.
No ponto V, o A. requer os documentos acima mencionados, mas a terceiro – a Companhia de Segurança F Limitada. Pelas mesmas razões, sem necessidade de outras considerações, indefere-se este ponto.
Vem o A., nos pontos VI a XI, requer a 1ª R. juntar original ou pública forma de series de documentos cujas cópias juntas aos autos por aquele. A 1ª R., na sua resposta, defende que não impugna a genuinidade das cópias referidas, ou não possui os originais, ou não existe original por ser impressão de documento electrónico. Assim sendo, julga-se que a diligência ora requerida já não é necessária, pelo que se indeferem estes pontos.
Autorizo a junção dos documentos no ponto XII, emitindo guia de pagamento de multa prevista no art. 450°, n.° 2 do CPC, fixando o montante de 2UCs.
*
Depoimento de parte
Requer o A. o depoimento de parte da 1ª R. sobre os quesitos 29, 31, 38, 39, 40 e 44, e o da 2° e 3° RR. sobre os quesitos 3 a 8, 10, 13, 14, 29 e 31.
O depoimento da parte é um meio de prova destinado a provocar confissão, ou seja, factos desfavoráveis ao depoente.
Por estar em conformidade com os requisitos previstos no art. 345º do CC e art. 479º do CPC para a sua admissão, admitem-se os depoimentos de parte requeridos pelo A. No entanto, conforme se constata da certidão comercial da 1ª R., este obriga-se com a assinatura de apenas um administrator. Sendo suficiente o depoimento um deles, notifique 1ª R. a indicar uma pessoa com poderes suficientes para o efeito.
*
(…)
***
Notifique e DN.”
*
Houve lapso no correio, por a notificação ter sido enviada para o endereço do antigo escritório do ilustre mandatário do Autor/Recorrente, este veio a justificar a razão de não ter recebido tempestivamente o despacho, tendo apresentado, em 15/06/2020, um novo requerimento para cumprir o que foi ordenado pelo Tribunal a quo:
“AXX, Autor nos autos à margem epigrafados e neles melhor identificado, notificado do Douto Despacha de v.Exa. de Fls. 575 e ss vem mui respeitosamente expor e requerer o seguinte
I - Do Momento do presente requerimento
O mandatário do Autor alterou o seu endereço profissional em Janeiro do corrente ano para a Avenida da ......, Edf. ......, nº ..., ...º Andar Macau, mais ou menos pela altura em que também foram em si substabelecidos poderes de representação do autor para a presente acção (Cfr Doc. 1 que ora se junta).
Desde então, tem sido o mandatário do Autor notificado pelos tribunais de Macau para o seu nova endereço profissional, em cartas expedidas no âmbito de dezenas de acções onde representa uma das partes. No entanto, na presente acção, por motivo que não lhe pode ser imputável, continua o mandatário do Autor a ser notificado para o seu anterior endereço profissional.
A alteração do endereço profissional do Autor foi comunicada pela Associação dos Advogados de Macau aos tribunais e outras instituições da RAEM pelos canais formais para o efeito, sendo o mesmo utilizado pelos tribunais em todas as outras acções pendentes.
Assim, apesar de expedida em 21 de Abril de 2020, a notificação contenda o douto Despacha de V.Exa de fls 575 bem como a resposta dos Réus ao requerimento de prova do Autor, só há dias, mais concretamente na passada sexta-feira 12 de Junho de 2020, foi entregue ao mandatário do Autor por quem trabalha nos serviços administrativos do seu escritório anterior.
Já por duas vezes, por telefone, pediu o mandatário do Autor que fosse corrigida a morada profissional do mesmo neste processo, para as notificações.
Assim, atribuindo o sucedido a uma falha completamente desculpável dos serviços da secretaria do Douto Tribunal, mas também a uma falha desculpável do mandatário do Autor - que não adivinhou que pudesse estar a continuar a ser notificado para o endereço anterior mesmo depois de ter alertado os serviços administrativos - vem pelo exposto requerer a V.Exa se digne admitir a presente resposta e requerimento ainda que extemporâneo pois entregue além do prazo subsidiário previsto no Código de Processo Civil.
II - Da indicação dos quesitos a provar por documentos na posse da parte contrária e de terceiros
Dos Documentos pedidos, e que se encontram na posse da Ré,
no ponto I do seu requerimento, destinam-se os mesmos à prova, directa ou indirecta dos quesitos 8°,9°, 12º, 13° 14°, 15°,18°, 19°,27° 29°,31°,41° e 44.
no ponto II do seu requerimento, destinam-se os mesmos à prova, directa ou indirecta dos quesitos 9°,12°,22°,29°,31°,35° e 40°.
no ponto III do seu requerimento, destinam-se os mesmos à prova, directa ou indirecta e consequentemente à formação da convicção do Douto Tribunal em relação aos quesitos 9°,12°,22°,29°,31°,35° e 40°.
no ponto IV do seu requerimento, destinam-se os mesmos à prova, directa ou indirecta e consequentemente à formação da convicção do Douto Tribunal em relação aos quesitos 9°, 12°,22°,29°,31°,35°, e 40°.
- Dos Documentos pedidos, e que se encontram na posse de terceiro, no Ponto V, alíneas a), b), c), d), do seu requerimento probatório, destinam-se os mesmos à prova, directa ou indirecta dos quesitos 29º, 31º, 35º, 39º, 40º e 41.
- Quanto aos documentos juntos pelo Autor na seu requerimento probatório,
os Documentos 1, 2 destinam-se à prova directa ou indirecta, e sempre ao abrigo do principio da livre apreciação da mesma pelo Douto Tribunal, dos Quesitos, 8º, 9º, 12º, 13º, 14º, 15º, 17º, 18º, 19º, 27º, 31º, 33º,
o Documento 3 destina-se à prova directa ou indirecta, e sempre ao abrigo do princípio da livre apreciação da mesma pelo Douto Tribunal, dos quesitos 3°, 6°, 7°, 8°, 19° e 21°,
o Documento 4 destina-se à prova directa ou indirecta, e sempre ao abrigo do princípio da livre apreciação da mesma pelo Douto Tribunal, dos quesitos 3º, 6°, 8°, 13°, 14°, 18°, 19°.
Quanto ao Documento 5 junto ao seu requerimento probatório, o Autor mui respeitosamente requer que o mesmo seja desentranhado, pois não só seguiu incompleto como os documentos relativos anexados ao email já haviam sido juntos com a p.i ... motivo pelo qual se penitencia.
o Documento 6 destina-se à prova directa ou indirecta, e sempre ao abrigo do princípio da livre apreciação da mesma pelo Douto Tribunal, dos quesitos 3º, 4º, 5º, 7º, 10º, 14º, 21º, 22º a 25º, 26º, 27º.
III - Do depoimento de Parte
Quanto aos depoimentos de Parte requeridos pelo Autor relativamente aos 2º e 3º RR, e tendo em consideração o alegado pela 1ª Ré, vem o Autor, em defesa da sua pretensão, sublinhar que são já factos assentes que 2° e 3° Réu foram sócios e administradores da 1° Ré entre 26 de Junho de 2009 e 8 de Junho de 2018 e 26 de Junho de 2009 e 14 de Novembro de 2017.
Segundo a melhor doutrina, e veja-se, por todos, o Viriato Lima, Manuel de Direito processual Civil, pag 424, "o depoimento de parte só pode ter por objecto - factos relevantes e controvertidos ou necessitados de prova, - factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento".
Ora, os factos controvertidos nos quesitos 3° a 8, 10, 13, 14, 29 e 31 são i) factos de que os 2º e 3º RR têm conhecimento pessoal dado o período de 12 anos durante o qual foram os administradores da 1ª Ré, ii) são factos relevantes, iii) são factos de que por força do já provado e assente nos factos A, B e C, D, E, F e G os 2 e 3 RR devem ter conhecimento e, iv) no entender do douto tribunal são factos que necessitam de prova, caso contrário não estariam na B.I..
Ou seja, por serem considerados relevantes à boa decisão da causa, foram vertidos pelo Douto Tribunal para a Base Instrutória. Ou seja, necessitam de prova, prova essa que, pela natureza do conteúdo dos quesitos, muito dificilmente se fará de forma cabal sem o depoimento dos 2° e 3° RR. Por outro lado, em lado algum reduz a lei, a doutrina ou a jurisprudência o âmbito do depoimento de parte a factos pessoais.
Além de pessoais, pode também o depoimento de parte incidir sobre factos de que tenha conhecimento pessoal.
O que, manifestamente, dada a qualidade das funções desempenhadas pelos 2º e 3º RR. e o período pelas quais as desempenharam, facilmente se conclui.
Por outro lado,
Em relação ao depoimento de parte requerido à 1ª Ré, indicou o Autor o nomes dos seus administradores com o único intuito de acelerar o procedimento caso o douto tribunal deferisse o requerido, por um lado, e por desejar que ambos deponham.
Percebendo o alegado pela 1ª Ré, não pode o Autor concordar com o mesmo em relação à suficiência do depoimento de apenas um dos administradores em representação da 1ª Ré para o caso em concreto.
Vejamos, a prova é um direito das partes, estando, no entanto, submetido às regras e ao poder de direcção do tribunal e deve prosseguir o objectivo primordial da descoberta da verdade.
É fundamental que quem presta o depoimento de parte tenha conhecimento directo e pessoal dos factos, não podendo este converter-se num mero formalismo conducente a obter a confissão
No caso dos administradores das sociedades, por relação com situações específicas da sua actividade corrente, nem todos os administradores têm, nem têm de ter, conhecimento pessoal de todos os aspectos da gestão e da vida da sociedade.
A instrução do processo tem em vista a descoberta da verdade, finalidade a que o tribunal e as partes estão vinculados.
No âmbito do poder de direcção e do princípio do inquisitório consagrados no Código de Processo Civil, a disciplina da instrução é da responsabilidade do juiz.
A 1ª Ré só tem dois administradores e, podendo ambos representar a 1ª Ré, é natural que o seu conhecimento dos factos não seja o mesmo em relação a todos os factos sobre que incidirá o depoimento. É natural que o depoimento de um se complemente com o depoimento de outro, e ambos conjugados conduzam à descoberta da verdade material.
Pelo que, mui respeitosamente se reitera o pedido depoimento de ambos os administradores em representação da 1ª Ré, até porque a única consequência possível do deferimento é o fornecimento de mais informação e prova ao douto tribunal para este sabiamente valorar no momento certo.
Caso assim não se entenda, subsidiariamente, requer-se então que seja nomeada a Sra. S para depor em representação da 1ª Ré.
Quanto ao alegado pelos R.R. nos pontos 39 a 58 da resposta dos R.R ao requerimento probatório do Autor, vem o mesmo conceder que têm os R.R. razão e retirar o seu pedido correspondente, retratando-se pela demora causada.
Quanto ao demais alegado pelos RR na sua resposta, salvo melhor opinião em contrário, são conclusões em forma de antecipação daquilo que deveriam ser alegações pós-julgamento após prova feita de forma cabal. Quem não deve não teme, costuma dizer-se, e os motivos elencados pelas R.R. para não virem aos autos juntar os documentos que se requer e estão em sua posse não se coadunam com o princípio da descoberta da verdade material.
Um documento, per si, pode, como diz a Autora, servir para provar as obrigações nele contidas. Mas também pode, como é óbvio, conter indícios que embora, secundários ou acessórios, quando conciliados com a restante prova que se consegue fazer, revelam-se de extrema importância para a convicção do douto Tribunal na formação da sua convicção em relação ao quadro geral do litígio em causa, contruída facto a facto, e naturalmente da melhor solução a dar ao mesmo.”
Perante o alegado pelo ilustre mandatário do Autor/Recorrente, o Tribunal a quo proferiu, em 18/06/2020, uma nova decisão com o seguinte conteúdo:
“Compulsados os autos, verifica-se um lapso no quinto parágrafo da fls. 583. Que alí se consta “Por não estar” deve ser “Por estar”. Mando a rectificação em conformidade.
*
Fls. 585 a 593:
Vem o Autor apresentar a sua resposta ao despacho a fls. 575, justificando a sua apresentação extemporânea por mudança do escritório do mandatário.
Mostra-se que, consoante o documento ora junto com a resposta, o Ilustre Mandatário do Autor mudou o seu domicílio profissional em Janeiro do ano corrente. Não se sabe o motivo de que as informações não tinham chegado ao juízo. Seja como for, já é muito difícil até impossível investigá-lo neste momento. Pelo que, considero que o Autor tem justa causa, admitindo a presente resposta.
*
Na sua resposta, o Autor especificou os factos que com os documentos quer provar.
Todavia, mesmo com as especificações, não se alteram as decisões fundamentadas nas fls. 582 a 583, por não se ver a ligação (directa e ainda indirecta) entre os documentos requeridos e os factos a provar. Aliás, entende-se que para a aplicação do art. 455° do CPC, deve-se identificar precisamente, na medida do possível, o documento (ou os documentos) e não apenas um conjunto genérico de documentos como “toda a escrituração mercantil e documentos relacionados”.(cfr.《Código de Processo Civil Anotado》, José Lebre de Freitas, Volume 2.°, 2ª Edição, pag. 463)
*
No que diz respeito ao depoimento de parte, também mantenho a decisão a fls. 583, com fundamento já exposto.
Notifique a 1ª Ré para pronunciar o requerimento no 2° parágrafo na fls. 590.
*
Os restantes assuntos já foram decididos, sem necessidade de mais consideração.
*
Notifique.”
Quid Juris?
É de ver que, na sequência de aceitar a justificação do ilustre mandário do Autor/Recorrente, o Tribunal proferiu nova decisão, reiterando-se basicamente os mesmos fundamentos para indeferir os pedidos do Autor/Recorrente, tem razão?
Vejamos de imedito.
Ora, a casua de pedir do Autor consiste em, basicamente, no facto de por experiência profissional e relações pessoais que tinha na altura, conseguiu um contrato de prestação de serviços de segurança, celebrado pela Companhia de Administração P Limitada, devidamente identificada nos autos e a 1ª Ré, de que o Autor/Recorrente não era nem é sócio, como contrapartida o Autor tinha direito, segundo aquilo que foi alegado pelo Autor, a receber 30% sobre os lucros distribuíveis anuais da 1ª Ré.
Ora, um dos factos assentes veio a confirmar, parece-nos, a versão do Autor, que é o facto assente 14º com o seguinte teor:
Em 09 de Fevereiro de 2015, 03 de Março de 2016, e 02 de Março de 2017, o Autor recebeu da 1ª Ré, cada vez nas datas indicadas, o montante de MOP600,000.00. (resposta ao quesito 14º da base instrutória)
O que o Autor veio a reclamar é justamente as desavenças do ano 2018 e 2019, confome o que ficou provado no facto 16º (Em data não apurada de 2017, começou a ocorrer desavenças entre o Autor e o 2º Réu. (resposta ao quesito 16º da base instrutória)), a 1ª Ré deixou de pagar tais quantias.
Ora, nesta óptica, é decisivo saber que natureza é que assumias tais quantias (MOP$600,000.00) que a 1ª Ré pagava ao Autor/Recorrente, como este não é sócio, não tem acesso directo a tais informações da 1ª Ré, entendemos assim que os pedidos formulados por ele são legítimos e estão fundamentados, ou seja, nas escrituração mercantil da 1ª Ré, há-de ter elementos esclarecedores sobre a razão de pagamento de tais quantias (MOP$600,000.00).
Do mesmo modo, para indeferir os pedidos, o Tribunal a quo invocou abstractamente que o Autor/Recorrente não chegou a indicar concretamente os quesitos que pretendem ser provados mediante os documentos, cuja junção foi pedida pelo Autor, não é verdade esta afirmação, o requerimento do Autor indicou espressamente quais documentos que pretende obter e para provar quais quesitos.
Na mesma medida a razão de carácter segredo da escrituração mercantil invocado pelo Tribunal recorrido para indeferir os pedidos são insuficientes, visto que tal carácter não é absoluto, já que o artigo 52º do CCOM dispõe:
Carácter secreto da escrituração mercantil)
1. A escrituração mercantil dos empresários é secreta, sem prejuízo do disposto nos números seguintes e em disposições especiais.
2. A exibição ou exame geral dos livros, correspondência e demais documentos dos empresários só pode decretar-se, oficiosamente ou a requerimento de parte, nos casos de sucessão universal, suspensão de pagamentos, falência, liquidação de sociedades ou de outros empresários comerciais, pessoas colectivas, e quando os sócios tenham direito ao seu exame directo.
3. Fora dos casos previstos no número anterior, pode ser ordenada a exibição de escrituração mercantil, a requerimento de parte ou oficiosamente, quando o empresário a quem pertença tenha interesse ou responsabilidade no assunto que justifica a exibição; o exame restringir-se-á exclusivamente aos aspectos que tenham directa relação com a questão de que se trate.
Agora, se tais documentos fossem suficientes para comprovar os quesitos em causa? Já é uma questão diferente. Mas, o Tribunal devia ordenar a junção dos documentos pedidos. Se depois entender que eles são impertinentes, poderá ordenar o seu destrenhamento e condenar o Requerente nas multas. Mas não deve indeferir logo nesta fase os pedidos em causa.
Nesta matéria, importa realçar o que ficou consagrado nos artigos 6º e 8º do CPC, que manda:
Artigo 6º
(Poder de direcção do processo e princípio do inquisitório)
1. Incumbe ao juiz, sem prejuízo do ónus da iniciativa das partes, providenciar pelo andamento regular e célere do processo, ordenando as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção e recusando o que for impertinente ou meramente dilatório.
2. O juiz providencia oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais, sempre que essa falta seja susceptível de suprimento, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância ou, se estiver em causa alguma modificação subjectiva da instância, convidando as partes a praticá-los.
3. Incumbe ao juiz realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.
Artigo 8º
(Princípio da cooperação)
1. Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as partes cooperar entre si, contribuindo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio.
2. O juiz pode, em qualquer altura do processo, ouvir as partes, seus representantes ou mandatários judiciais, convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes e dando conhecimento à outra parte dos resultados da diligência.
3. As pessoas referidas no número anterior são obrigadas a comparecer sempre que para isso forem notificadas e a prestar os esclarecimentos que lhes forem pedidos, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 442.º
4. Sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo.
Nester termos, entendemos que as diligências probatórias requeridas pelo Autor/Recorrente são pertinentes e que têm valor para boa decisão da causa, o que é razão bastante para revogar o despacho impugnado, deferindo-se os pedidos em causa e ordenando-se que o Tribunal a quo aprecie tais provas e proferir nova decisão sobre a matéria de facto em conformidade e, repetido o julgamento, proferir nova decisão de mérito conforme as provas a produzir-se em sede própria (artigo 629º/3 do CPC).
Com o que fica prejudicado o conhecimento do recurso sobre o mérito interposto pelo Autor/Recorrente.
*
Ora, chegados a esta etapa, cumpre dar cumprimento ao ordenado pelo acórdão do venerando TUI. Assim, não é supérfluo transcrever a parte decisiva do acórdão para ficarmos perceber o âmbito do cumprimento que sobre nos recai.
“(…)
Para maior clareza expositiva, vale a pena atentar aqui que, in casu, o A. solicitava as seguintes diligências probatórias:
I – Que a 1.ª Ré junte aos autos a sua escrituração mercantil e documentos a ela relacionados relativa aos exercícios de 2017 e 2018;
II – Que a 1.ª Ré junte aos autos os formulários da Direcção dos Serviços de Finanças M3/M4 relativos ao pagamento do imposto profissional dos seus empregados inscritos para os anos de 2016, 2017, 2018 e 2019;
III – Que a 1.ª Ré junte aos autos os comprovativos dos pagamentos feitos ao FSS relativos aos anos de 2016, 2017, 2018 e 2019 até à presente data;
IV – Que a 1.ª Ré junte aos autos comprovativo do pagamento no FSS da taxa de contratação mensal dos trabalhadores não residentes, relativos aos anos de 2016, 2017, 2018 e 2019; e
V – Que a Companhia de Serviços de Segurança F Limitada junte aos autos:
a) A sua escrituração mercantil e documentos a ela relacionados relativa aos exercícios de 2017 e 2018;
b) Os formulários da Direcção dos Serviços de Finanças M3/M4 relativos ao pagamento do imposto profissional dos seus empregados inscritos para os anos de 2017, 2018 e 2019;
c) os comprovativos dos pagamentos feitos ao FSS relativos aos anos de 2017, 2018 e 2019 até à presente data;
d) comprovativo do pagamento no FSS da taxa de contratação mensal dos trabalhadores não residentes, relativos aos anos de 2017, 2018 e 2019.
Por sua vez, recorde-se também que o Acórdão recorrido fundamentou a decisão agora impugnada nos seguintes termos:
“Ora, a casua de pedir do Autor consiste em, basicamente, no facto de por experiência profissional e relações pessoais que tinha na altura, conseguiu um contrato de prestação de serviços de segurança, celebrado pela Companhia de Administração P Limitada, devidamente identificada nos autos e a 1ª Ré, de que o Autor/Recorrente não era nem é sócio, como contrapartida o Autor tinha direito, segundo aquilo que foi alegado pelo Autor, a receber 30% sobre os lucros distribuíveis anuais da 1ª Ré.
Ora, um dos factos assentes veio a confirmar, parece-nos, a versão do Autor, que é o facto assente 14º com o seguinte teor:
Em 09 de Fevereiro de 2015, 03 de Março de 2016, e 02 de Março de 2017, o Autor recebeu da 1ª Ré, cada vez nas datas indicadas, o montante de MOP600,000.00. (resposta ao quesito 14º da base instrutória)
O que o Autor veio a reclamar é justamente as desavenças do ano 2018 e 2019, confome o que ficou provado no facto 16º (Em data não apurada de 2017, começou a ocorrer desavenças entre o Autor e o 2º Réu. (resposta ao quesito 16º da base instrutória)), a 1ª Ré deixou de pagar tais quantias.
Ora, nesta óptica, é decisivo saber que natureza é que assumias tais quantias (MOP$600,000.00) que a 1ª Ré pagava ao Autor/Recorrente, como este não é sócio, não tem acesso directo a tais informações da 1ª Ré, entendemos assim que os pedidos formulados por ele são legítimos e estão fundamentados, ou seja, nas escrituração mercantil da 1ª Ré, há-de ter elementos esclarecedores sobre a razão de pagamento de tais quantias (MOP$600,000.00).
Do mesmo modo, para indeferir os pedidos, o Tribunal a quo invocou abstractamente que o Autor/Recorrente não chegou a indicar concretamente os quesitos que pretendem ser provados mediante os documentos, cuja junção foi pedida pelo Autor, não é verdade esta afirmação, o requerimento do Autor indicou espressamente quais documentos que pretende obter e para provar quais quesitos.
Na mesma medida a razão de carácter segredo da escrituração mercantil invocado pelo Tribunal recorrido para indeferir os pedidos são insuficientes, visto que tal carácter não é absoluto, já que o artigo 52º do CCOM dispõe:
(…)
Agora, se tais documentos fossem suficientes para comprovar os quesitos em causa? Já é uma questão diferente. Mas, o Tribunal devia ordenar a junção dos documentos pedidos. Se depois entender que eles são impertinentes, poderá ordenar o seu destrenhamento e condenar o Requerente nas multas. Mas não deve indeferir logo nesta fase os pedidos em causa.
Nesta matéria, importa realçar o que ficou consagrado nos artigos 6º e 8º do CPC, que manda:
(…)
Nester termos, entendemos que as diligências probatórias requeridas pelo Autor/Recorrente são pertinentes e que têm valor para boa decisão da causa, o que é razão bastante para revogar o despacho impugnado, deferindo-se os pedidos em causa e ordenando-se que o Tribunal a quo aprecie tais provas e proferir nova decisão sobre a matéria de facto em conformidade e, repetido o julgamento, proferir nova decisão de mérito conforme as provas a produzir-se em sede própria (artigo 629º/3 do CPC).
Com o que fica prejudicado o conhecimento do recurso sobre o mérito interposto pelo Autor/Recorrente.
*
Sintesese conclusiva:
Quando, em nome dos princípios inquisitório e de cooperação (artigos 6º e 8º do CPC) e também para a descoberta da verdade material, o Autor pediu ao Tribunal que fosse notificada a 1ª Ré (sociedade comercial) para juntar aos autos um conjunto de documentos de escrituração mercantil (mais do que 10), tendo justificado os pedidos em casua, para comprovar os quesitos expressamente indicados, porque ele, o Autor, não é sócio da 1ª Ré, mas existe um acordo entre eles, a 1ª Ré reconhecia ao Autor o direito de receber 30% sobre os lucros distribuíveis anuais, tendo a Ré cumprido tal acordo, procedendo ao pagamento de quantias nos anos 2015 a 2017 conforme os factos dados como assentes pelo Tribunbal recorrido, os pedidos do Autor devem ser atendidos porque são dados pertinentes e têm valor para a boa decisão da causa. Quando o Tribunal recorrido, sem razão bastante e ponderosa, indeferiu tais pedidos, incorreu na violação dos princípios acima referidos e como tal deve ser revogado o despacho impugnado, deferindo-se os pedidos e mandando-se a repetição do julgamento sobre a matéria de facto nos termos legalmente prescritos (artigo 629º/3 do CPC)”; (cfr., fls. 1188 a 1190, pág. 69 a 73 do Ac. recorrido).
Pois bem, tomando em consideração a transcrita fundamentação do Acórdão recorrido, cremos que se deve concluir que o Tribunal a quo apresentou uma fundamentação tão só dirigida ao primeiro pedido constante do requerimento probatório do A.: referente à junção aos autos da escrituração mercantil da 1ª R., (e dos documentos relacionados com a mesma).
Segundo Q, a falta de fundamentação “verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (…)”; (in ob. cit., pág. 221).
Adoptando-se esta perspectiva com a qual concordamos, e através da qual se deve consdierar que “cada diligência probatória” corresponde a “um pedido” (autónomo), afigura-se pois que a 1ª R., ora recorrente, tem razão quando aponta ao Acórdão recorrido o vício de “falta de fundamentação”.
Poder-se-ia, (quiçá), defender, que o Tribunal de Segunda Instância fundamentou a sua decisão relativamente a todas e cada uma das diligências probatórias requeridas quando afirmou no Acórdão ora recorrido que:
“Do mesmo modo, para indeferir os pedidos, o Tribunal a quo invocou abstractamente que o Autor/Recorrente não chegou a indicar concretamente os quesitos que pretendem ser provados mediante os documentos, cuja junção foi pedida pelo Autor, não é verdade esta afirmação, o requerimento do Autor indicou expressamente quais documentos que pretende obter e para provar quais quesitos.
(…)
Nestes termos, entendemos que as diligências probatórias requeridas pelo Autor/Recorrente são pertinentes e que têm valor para boa decisão da causa, o que é razão bastante para revogar o despacho impugnado, deferindo-se os pedidos em causa e ordenando-se que o Tribunal a quo aprecie tais provas e proferir nova decisão sobre a matéria de facto em conformidade e, repetido o julgamento, proferir nova decisão de mérito conforme as provas a produzir-se em sede própria (artigo 629º/3 do CPC)”; (cfr., pág. 70 e 72 do Ac. recorrido).
Donde que se poderia (eventualmente) sustentar que, ainda que de forma bastante sintética, o Tribunal recorrido não deixou de apresentar a sua motivação para a sua decisão de deferimento de todas as diligências probatórias cuja rejeição justificou a apresentação de recurso por parte do A..
Contudo, uma “leitura global” da decisão leva-nos a concluir noutro sentido.
Desde logo, importa atentar que a “fundamentação” apresentada limita-se a apontar motivos (específicos e concretos) relativos à apresentação da “escrituração mercantil da 1ª R.”, omitindo-se, por completo, qualquer justificação quanto à apresentação dos formulários M3/M4 da Direcção dos Serviços de Finanças relativos ao pagamento do imposto profissional dos empregados da 1ª R. inscritos para os anos de 2016, 2017, 2018 e 2019, bem como aos pagamentos feitos por esta 1ª R. ao Fundo de Segurança Social pelos anos de 2016, 2017, 2018 e 2019 até à presente data, (incluindo o pagamento da taxa de contratação mensal dos trabalhadores não residentes).
Por sua vez, acresce que tão pouco é apresentada qualquer motivação quanto à apresentação da escrituração mercantil de terceiro, (“COMPANHIA DE SERVIÇOS DE SEGURANÇA F LIMITADA”), e dos formulários M3/M4 da Direcção dos Serviços de Finanças relativos ao pagamento do imposto profissional dos empregados desse terceiro nos anos de 2017 e 2018 ou dos pagamentos feitos por esse terceiro ao Fundo de Segurança Social, (sendo, ainda, de notar que, até mesmo a “síntese conclusiva” do Acórdão recorrido volta a referenciar apenas e tão só o facto do A. ter pedido ao Tribunal que “fosse notificada a 1ª Ré (sociedade comercial) para juntar aos autos um conjunto de documentos de escrituração mercantil (mais do que 10), (…)”).
Nesta conformidade, e ressalvado o muito devido respeito, cremos nós que se impõe constatar que o Tribunal de Segunda Instância considerou procedente o recurso apresentado pelo A. contra a decisão de indeferimento das diligências probatórias acima indicadas sem que tivesse explicitado (qualquer) fundamentação para a alteração da decisão no que concerne às “diligências probatórias constantes dos pontos II a V do requerimento probatório do A.”, o que implica um “vício de falta de fundamentação” que é sancionado com o desvalor da nulidade nos termos do art. 571°, n.° 1, alínea b) do C.P.C.M., devendo-se, então, dar cumprimento ao disposto no art. 651°, n.° 2 do C.P.C.M. com a “baixa do processo a fim de se fazer a reforma da decisão anulada”. (Destaque nosso).
Que oferecemos a acrecentar perante o transcrito?
1) – Quando, com base nos artigos 52º e 53º do Código Comercial de Macau (CCOM), falamos de “escrituração mercantil”, estamos a empregar o seu sentido lato, abrangendo todos os escritos referentes às contas resultantes de exercício da actividade comercial, pondo nós o acento tónico na natureza desses documentos (escritos) e como tal recorremos à disposições constantes do CCOM;
2) – Nesta óptica, todos os pedidos indicados sob os nº I a V nos termos acima transcritos, são escrituração mercantil, ligada ao litígio nos termos fixados pelas Partes, sendo pouco relevantes quem tem na mão esses escritos comerciais;
3) – Salvo o merecido respeito, quando o venerando TUI concluiu que o acórdão anterior padece de vício de falta de fundamentação deve reportar-se ao pedido indicado na alínea V que contém o seguinte teor:
V – Que a Companhia de Serviços de Segurança F Limitada junte aos autos:
a) A sua escrituração mercantil e documentos a ela relacionados relativa aos exercícios de 2017 e 2018;
b) Os formulários da Direcção dos Serviços de Finanças M3/M4 relativos ao pagamento do imposto profissional dos seus empregados inscritos para os anos de 2017, 2018 e 2019;
c) os comprovativos dos pagamentos feitos ao FSS relativos aos anos de 2017, 2018 e 2019 até à presente data;
d) comprovativo do pagamento no FSS da taxa de contratação mensal dos trabalhadores não residentes, relativos aos anos de 2017, 2018 e 2019.
Efectivamente a referida Companhia, a quem foi dirigido o pedido de apresentação dos documentos não é parte deste processo, pergunta-se, porque foi formulado o pedido nesse sentido? O Autor alegou o seguinte:
“(…)
k) No que diz respeito à não especificação do documento ou dos documentos em concreto cuja apresentação se requeria, o Recorrente escolheu a formula "a escrituração mercantil e documentos com ela relacionados" porque da factualidade, segundo a tese defendida pelo Recorrente, decorre que existiu conluio do 2.° e 3.° Réus para, de forma intencional, impedir o Recorrente de receber não os lucros gerados pela 1.ª Ré e esvaziar a actividade desta transferindo o contrato de prestação de serviços de segurança celebrado com o único cliente e exclusiva fonte de rendimento da 1.ª Ré para outra sociedade, a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", ora, encontrando-se o Recorrente do lado de fora da actividade administrativa tanto da 1.ª Ré como da "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", não tem forma de saber como esta organizam os seus livros e fazem o lançamento do registo da sua actividade comercial, podendo, caso nomeasse apenas o livro de balanços ou outro qualquer livro de escrituração mercantil obrigatório, ver frustradas as suas necessidades de prova por não ser possível aferir toda a informação pertinente e, mais importante, aferir se realmente existiu conluio entre os 2.° e 3.° Réus para prejudicar os interesses do Recorrente, conforme decorre dos quesitos 29, 31, 32 (etc) da Douta Base Instrutória.
l) O Recorrente entendeu ser necessário que a 1.ª Ré e a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", terceira à presente acção, apresentassem toda a sua escrituração mercantil para comprovar a tese de que a 1.ª Ré é e sempre foi uma companhia viável e por força do conluio entre o 2.° e 3.° Réus, deixou de distribuir os lucros devidos ao Recorrente, apesar de existirem, e transferiu toda a sua actividade e trabalhadores (da 1.ª Ré) para a "Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", controlada pelo 2.° e 3.° Réus, com vista a desonerar a 1.ª Ré de pagar lucros ao Recorrente no futuro.
(…)”.
Esta argumentação do Autor tem a sua lógica e justifica nos termos apresentados. Eis a razão que este Tribunal deu ao Autor ao formular a pretensão nestes termos.
Só perante tais documentos é que, proventura, se percebe se efectivamente a “Companhia de Serviços de Segurança F Limitada", controlada pelo 2.° e 3.° Réus, fazia “algo” para desonerar a 1.ª Ré de pagar lucros ao Autor.
Quanto a eventual outra utilidade resultante desses documentos, nomeadamente para descoberta da verdade material, são aqui reproduzidos para todos os efeitos, nomeadamente para efeitos da fundamentação da nossa decisão, os argumentos invocados pelo Requerente/Autor/Recorrente aquando da apresentação da sua pretensão.
Assim, ao abrigo do disposto nos artigos 6º/3 e 458º, todos do CPC, conjugado com os artigos 52º e 53º do CCOM, é de deferir também o pedido em análise, julgando-se igualmente procedente esta parte do recurso.
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Com esta decisão, fica prejudicado o conhecimento de demais questões suscitadas pelas Partes neste recurso.
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Sintese conclusiva:
Quando, em nome dos princípios inquisitório e de cooperação (artigos 6º e 8º do CPC) e também para a descoberta da verdade material, o Autor pediu ao Tribunal que fosse notificada a 1ª Ré (sociedade comercial) para juntar aos autos um conjunto de documentos de escrituração mercantil (mais do que 10), tendo justificado os pedidos em casua, para comprovar os quesitos expressamente indicados, porque ele, o Autor, não é sócio da 1ª Ré, mas existe um acordo entre eles, a 1ª Ré reconhecia ao Autor o direito de receber 30% sobre os lucros distribuíveis anuais, tendo a Ré cumprido tal acordo, procedendo ao pagamento de quantias nos anos 2015 a 2017 conforme os factos dados como assentes pelo Tribunbal recorrido, os pedidos do Autor devem ser atendidos porque são dados pertinentes e têm valor para a boa decisão da causa. Quando o Tribunal recorrido, sem razão bastante e ponderosa, indeferiu tais pedidos, incorreu na violação dos princípios acima referidos e como tal deve ser revogado o despacho impugnado, deferindo-se os pedidos e mandando-se a repetição do julgamento sobre a matéria de facto nos termos legalmente prescritos (artigo 629º/3 do CPC).
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Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em conceder provimento ao recurso interlocutório interposto pelo Autor/Recorrente, revogando-se o despacho recorrido, deferindo-se as diligências probatórias e ordenando-se, depois de repetido o julgamento, proferir nova decisão de mérito em conformidade.
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Custas pelos Recorridos.
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Registe e Notifique.
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RAEM, 25 de Abril de 2024.
(Relator)
Fong Man Chong
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng
(Segundo Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong
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