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Processo nº 652/2023
(Autos de Recurso Contencioso)

Data do Acórdão: 09 de Maio de 2024

ASSUNTO:
- Renovação de autorização de residência


Rui Pereira Ribeiro













Processo nº 652/2023
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 09 de Maio de 2024
Recorrentes: (A), (B),
(C) e (D)
Entidade Recorrida: Secretário para a Economia e Finanças
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

  (A), (B), (C) e (D), com os demais sinais dos autos,
  vêm interpor recurso contencioso do Despacho proferido pelo Secretário para a Economia e Finanças de 23.06.2023 que indeferiu o pedido de renovação da autorização de fixação de residência de (B), (C) e (D), formulando as seguintes conclusões:
I. No dia 7 de Agosto de 2023, foi o Recorrente (A) notificado de um despacho proferido a 30 de Junho de 2023 pelo Exmo. Senhor Secretário para a Economia e Finanças, no qual se decidiu pela não renovação da autorização de residência da sua esposa (B), e seus filhos (C) e (D), nos termos do disposto no artigo 43º n.º 2 alínea 3) e n.º 3 da Lei n.º 16/2021 que estabelece o Regime jurídico do controlo de migração e das autorizações de permanência e residência na Região Administrativa Especial de Macau, ex vi, art. 23º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, conforme cópia que ora se junta e cujo teor, à semelhança dos demais documentos que forem juntos, se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
II. Em suma, nos termos do referido despacho, foi alegado que a (B), (C) e (D), não tem em Macau a sua residência habitual e que, por isso, não reúnem as condições para a manutenção da autorização de residência temporária que lhes havia sido concedida.
III. Isto porque, de acordo com os registos de entradas e saídas ocorridas entre o ano de 2015 e 30 de Abril de 2021, constatou-se que o número de dias que a (B) permaneceu em Macau em cada um dos referidos anos, foi, respectivamente, de 25, 11, 17, 5, 67 e 19 dias,
IV. E que, no respeitante a, (C), o mesmo terá permanecido em Macau, respectivamente, 42, 39, 15, 3, 0 e 0 dias, no mesmo período de tempo, ou seja, entre 2015 e 30 de Abril de 2021.
V. Já no respeitante à, (D), a mesma terá permanecido em Macau, no mesmo período de tempo, 2015 e 30 de Abril de 2021, respectivamente, 42, 41, 41, 4, 5 e 0 dias.
VI. Alegando a decisão recorrida que depois de uma reavaliação feita aos registos de entrada e saída da (B), (C) e (D), no período de 1 de Maio de 2020 e 31 de Outubro de 2022, nenhum deles entrou em Macau.
VII. O que, segundo a referida decisão, determina que tanto tanto (B) como (C) e (D) não têm em Macau a sua residência habitual.
VIII. Salvo o devido respeito, não podem os Recorrentes conformar-se com esta parte da decisão, a que determina a não renovação da autorização de residência de (B), (C) e (D), por entenderem que a mesma incorre no vício de violação de Lei, previsto no artigo 21.º, n.º 1, alínea d) do CPAC.
IX. O Recorrente (A) pese embora não seja o visado directo do acto recorrido, tem interesse directo, pessoal e legitimo na decisão ora recorrida, uma vez que a mesma, recai sobre um pedido de renovação da autorização de residência da sua esposa (B), e os filhos (C) e (D), apresentado pelo ora Recorrente.
X. Nos termos do disposto no artigo 33º do CPAC, têm legitimidade activa, entre outras, “As pessoas singulares ou colectivas que se considerem titulares de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos que tivessem sido lesados pelo acto recorrido ou que aleguem interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso”.
XI. A decisão em crise afecta o interesse dos Recorrente (A), (B), (C) e (D) e estes esperam obter um benefício decorrente da anulação da mesma.
XII. Por conseguinte, o Recorrente (A), é o destinatário do acto, conforme decorre da notificação (vide doc. 1) e, como tal, tem legitimidade activa para impugnar o acto em causa, na medida em que tanto o Recorrente (A) como os Recorrentes (B), (C) e (D) são titulares de um interesse directo, pessoal e legítimo legalmente protegido, designadamente, por serem lesados pelo acto aqui recorrido, como resulta do disposto na alínea a) do artigo 33.º do CPAC.
XIII. Em 6 de Novembro de 2015, foi pela primeira vez emitido o Bilhete de Identidade de Residente de Macau ao Recorrente (A), em virtude de um pedido por si apresentado enquanto quadro dirigente para o desempenho de funções de “...” da empresa denominada (X) Ltd., legalmente registada em Macau.
XIV. Sendo que, poucos meses depois, na sequência desse mesmo requerimento de autorização de residência em Macau apresentado pelo Recorrente, foi também emitido, respectivamente, em 18 de Novembro de 2016 o Bilhete de Identidade de Residente dos dois filhos do Requerente (D) e (C) e em 22 de Novembro de 2016 o Bilhete de Identidade de Residente da sua esposa (B), desta feita enquanto membros do seu agregado familiar a titulo de reunião familiar.
XV. Esta autorização de residência que foi concedida ao Recorrente, extensiva à sua esposa (B), e os filhos (C) e (D) tinha validade até dia 15 de Setembro de 2018.
XVI. Consequentemente, em 6 de Setembro de 2018 o Recorrente (A) apresentou o pedido de renovação da sua autorização de residência, bem assim, da renovação da autorização de residência do seu agregado familiar, ou seja, esposa e dois filhos.
XVII. No entanto, por razões alheias ao Recorrente (A), a decisão sobre as referidas renovações das autorizações de residência, apenas foram proferidas quase 5 anos depois.
XVIII. Decisão esta, a qual veio autorizar apenas a renovação da autorização de residência do Recorrente (A) e rejeitar a renovação da autorização de residência dos Recorrentes (B), (C) e (D).
XIX. Tendo-se para tal alegado que, pese embora o ora Recorrente (A) tivesse mantido todos os requisitos para que lhe fosse renovada a autorização de residência até então concedida, por sua vez, a Recorrente (B), (C) e (D), não revelavam ter em Macau a sua residência habitual.
XX. No respeitante à Recorrente (B), conforme se deixou alegado na defesa escrita apresentada pelo Recorrente em 8 de Fevereiro de 2021 (vide fls. 298 a 448) a mesma, encontrava-se directa e pessoalmente a prestar cuidados de saúde à sua mãe (E) de 102 anos de idade que, para além das fragilidades da idade ainda padecia de uma doença cardíaca grave (vide doc. 11 junto com a defesa escrita).
XXI. Embora a mãe da Recorrente (B) já se encontrasse diagnosticada com a referida doença desde Outubro de 2013, e desde essa data a Recorrente (B) tratasse dos assuntos relacionados com a doença da mãe, o certo, é que a Recorrente (B) desconhecia se a doença da mãe iria ser de longa ou curta duração, contrariamente ao que se alega na decisão recorrida, e além disso a Recorrente (B), sempre contou com o auxílio de terceiros para intermediar na responsabilidade que a mesma tinha por esses cuidados.
XXII. O que, permitia que a Recorrente (B) pudesse acompanhar e cuidar da mãe mesmo estando em Macau. Porque, como se disse, nessa altura ainda era possível faze-lo via intermediação de terceiras pessoas.
XXIII. Sucede que o estado de saúde da Recorrente (B), piorou de forma repentina, o que implicou a presença em pessoa por parte da Recorrente (B). O que levou, a que a mesma se tivesse que ausentar de Macau com mais frequência e por maiores períodos para acompanhar de perto os tratamentos médicos da sua mãe e bem assim para tratar dela, conforme a própria lhe pediu.
XXIV. Lamentavelmente, a mãe da Recorrente (B) acabou por falecer em 29 de Maio de 2022, e assim que a Recorrente (B) terminou de tratar de todas as formalidades relacionadas com a morte da mãe (inventário), a mesma voltou para Macau onde tem a sua residência e aqui se encontra presentemente.
XXV. Ao mesmo tempo, não se poderá olvidar que, conforme também se deixou referido da defesa escrita apresentada pelo Recorrente (A) (vide fls. 298 a 448), em 2018 o mesmo foi diagnosticado com um linfoma e câncer na tireóide que o levou a iniciar vários tratamentos e intervenções cirúrgicas (vide doc. 5 a 8 da defesa escrita). Tratamentos que, como é do conhecimento geral, são prolongados no tempo, com várias sessões e requerendo acompanhamento médico permanente, e apoio psicológico e físico por parte da família.
XXVI. Sendo de sublinhar que, nessa altura o Recorrente (A) encontrava-se na Austrália porque o diagnóstico da doença grave do Recorrente (A) somente foi feito na Austrália, depois de este de tudo ter feito e não ter encontrado em Macau resposta para o seu estado de saúde cada vez mais debilitante.
XXVII. Donde que, a esposa do Recorrente, (B), ausentou-se temporariamente de Macau, por razões atendíveis que se prenderam tanto com o cuidado de saúde da sua mãe, primeiramente, e posterior e adicionalmente, do seu marido aqui Recorrente (A). No entanto, nunca deixou de ter a sua residência em Macau.
XXVIII. Na verdade, o Recorrente (A) e a sua esposa a Recorrente, (B) até o ano de 2021 eram proprietários de duas fracções em Macau, sendo que, presentemente, depois de terem vendido umas das fracções no ano de 2021, por uma questão de investimento, ainda continuam a ser proprietários da fracção onde residem há mais de uma década. Fracção esta, na qual se encontram todos os seus bens pessoais, e onde se encontram as fotografias e recordações de família, inclusivamente, as da sua falecida mãe.
XXIX. Além do que, é em Macau que o Recorrente (A) e a sua esposa a Recorrente, (B) continuam a ter as suas contas bancárias em várias entidades bancárias, contratos de prestação de serviços de electricidade, água e telefone.
XXX. Isto sem deixar de referir que, mesmo durante o período em que a Recorrente, (B) teve de se ausentar de Macau, nunca deixou de ter conexão com Macau, com a sociedade de Macau, com os temas relevantes na sociedade de Macau, tendo para o efeito publicado diversos artigos em diversos jornais e revistas de Macau.
XXXI. Conforme se pode constatar pelo breve resumo apresentado (vide doc. 4), a Recorrente, (B), ao longo de mais de uma década tem revelado uma participação activa e bastante contributiva na sociedade de Macau, dadas as suas extraordinárias habilitações académicas e experiência profissional. O que pretende continuar a fazer em contributo para uma melhor formação académica dos residentes de Macau. É aqui que tem efectivamente a sua residência habitual.
XXXII. Quanto ao Recorrente (C), a ausência do mesmo ficou a dever-se ao facto do mesmo se encontrar a concluir os estudos universitários na (X) University of Technology .
XXXIII. Á semelhança a Recorrente (D), que terminou agora os seus estudos universitários na (Y) University e se irá graduar no presente mês de Setembro.
XXXIV. A tudo isto, acresce que, no início do ano de 2020, todo o Mundo viu-se confrontado com uma das maiores pandemias de todos os tempos, o Covid 19, e por todo o Mundo foram adoptadas medidas de protecção e segurança na propagação desse vírus que tem matado milhões de pessoas em todo o Mundo.
XXXV. Ou seja, se os Recorrentes (C) e (D) passaram em Macau muito pouco tempo, como se alega na decisão recorrida, não se ficou a dever ao facto de terem deixado de ter vontade de viver em Macau como local do seu centro de vida, ou seja, não se tratou de opção adoptada voluntariamente.
XXXVI. Mas sim, ao facto de estarmos a falar de dois jovens que precisaram de concluir os seus estudos na Austrália. E foi na Austrália, não por uma opção de não terem o propósito de não residir em Macau, conforme se alega na decisão recorrida, mas sim, porque era na Austrália) que era possível ter a formação académica que os mesmos pretendiam. Sendo do conhecimento público e por isso notório que a Austrália é conhecida por ter conceituadas Universidades e que, por isso, são a escolha de milhares de jovens. Ao que, acresceu o condicionamento pelas restrições impostas por medidas de combate á pandemia de COVID- 19 que levou à paralisação de todo Macau por longo período de tempo.
XXXVII. Posteriormente, a necessidade de realização de quarentenas em Macau que, no início começaram em 14 dias e chegaram a ser de até 21 dias, dificultaram o regresso dos Recorrentes (B), (C) e (D) à sua residência habitual em Macau, durante este período, os Recorrentes (B), (C) e (D) nunca deixaram de ter vínculo com Macau.
XXXVIII. Aliás, com todo respeito, do que aqui fica exposto, claro parece ser que, os Recorrentes (B), (C) e (D), por razões devidamente justificadas estiram ausentes de Macau e, que, como se referiu, se prende com questões de acompanhamento em cuidados de saúde da mãe da Recorrente (B), do Recorrente (A) e para efeito de estudos no exterior de Macau pelos Recorrentes (C) e (D).
XXXIX. Bem como, com as restrições de circulação de pessoas trazidas pela pandemia que, desde o início do ano de 2020 até há bem pouco tempo, manteve Macau praticamente encerrado para o mundo.
XL. Donde que, atento a todo o exposto, salvo devido respeito, não podem os Recorrentes concordar com a decisão recorrida na qual se fundamenta a não renovação da autorização de residência dos Recorrentes (B), (C) e (D), pelo facto dos mesmos não terem residência habitual em Macau.
XLI. De acordo com o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 4º da Lei n.º 8/1999, em conjugação com o disposto no n.º 5 do artigo 43º da Lei n.º 16/2021, ex vi alínea 3) do n.º 2 do artigo 23º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, a ausência temporária de Macau não determina que se tenha deixado de residir habitualmente em Macau, caso o titular embora não pernoite na RAEM, aqui se desloque regular e frequentemente para exercer actividades de estudo ou profissional remunerada ou empresarial. Do mesmo modo que, não foi intenção do legislador determinar que, aquele que por razões justificadas se tenha ausentado de Macau, deixe de aqui ter a sua residência habitual.
XLII. É certo que a autorização de residência de um “Requerente” está vinculada a requisitos legalmente estabelecidos, nomeadamente, o requisito de residência habitual na RAEM da Requerente de acordo com a alínea 3) do n.º 2 do artigo 43º da Lei n.º 16/2021 ex vi art. 23º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005.
XLIII. Em conformidade com a ratio legis dos n.ºs 3 e 4 do art. 4º da Lei n.º 8/1999 sobre o Residente Permanente e o Direito de Residência na Região Administrativa Especial de Macau, a ausência temporária de Macau não determina pura e simplesmente que se tenha deixado de residir habitualmente em Macau, porquanto, deverão ser tidas em conta as circunstâncias pessoais da ausência.
XLIV. O Artigo 4.º da Lei n.º 8/1999, designadamente, dispõe que um indivíduo reside habitualmente em Macau, nos termos da referida lei, quando reside legalmente em Macau e tem aqui a sua residência habitual.
XLV. Sendo que, nos termos do n.º 3 do art. 4º do mesmo preceito legal, refere que “Para os efeitos … da perda do direito de residência referida no n.º 2 do artigo 2.º, a ausência temporària de Macau não determina que se tenha deixado de residir habitualmente em Macau”,
XLVI. Assim, só quando a Administração fundamenta, com base em factos concretos, que o Requerente não teria intenção de permanecer definitivamente em Macau, fundamentalmente, mas não exclusivamente, com suporte nos elementos mencionados no artigo 8.º, n.º 2, da lei n.º 8/1999, poderá ter sido entendido que o mesmo deixou de ter residência habitual em Macau.
XLVII. E tal entendimento decorre também do Acórdão do Venerando Tribunal de Última Instância n.º 21/2014, e ainda do douto Acórdão do Venerando Tribunal de Segunda Instância n.º 473/2019 de 2 de Julho de 2019.
XLVIII. Por sua vez, acrescenta ainda o Acórdão do Venerando Tribunal de última Instância n.º 182/2020, de 21 de Janeiro de 2021 que: “A qualidade de “residente habitual”, implica, necessariamente, uma “situação de facto”, com uma determinada dimensão temporal e qualitativa, na medida em que aquela pressupõe também um “elemento de conexão”, expressando uma “íntima e efectiva ligação a um local” (ou território), com a real intenção de aí habitar e de ter, e manter, residência.
XLIX. Daí que se mostre de exigir não só uma “presença física” como a (mera) “permanência” num determinado território, (a que se chama o “corpus”), mas que seja esta acompanhada de uma (verdadeira) “intenção de se tornar residente” deste mesmo território, (“animus”), e que pode ser aferida com base em vários aspectos do seu quotidiano pessoal, familiar, social e económico, e que indiquem, uma “efectiva participação e partilha” da sua vida social.”
L. No presente caso, pese embora a decisão esteja fundamentada pela curta permanência em Macau no período de 2015 a 30 de Abril de 2020, justificadas parecem estar as circunstâncias pessoais e da ausência dos Recorrentes (B), (C) e (D), (vide art. 4º n.º 4, da lei n.º 8/1999).
LI. Circunstâncias concretas essas, de onde se pode concluir que mais do que as suas presenças físicas, os Recorrentes (B), (C) e (D) tinham (“animus”) – “intenção de se tornar residente” deste mesmo território e as suas ausências não se ficou a dever a uma perda ou ausência de (“animus”) – “intenção de se tornar residente” deste território, mas sim, ficou-se a dever ao facto dos Recorrentes (C) e (D) estarem a concluir os seus estudos fora de Macau, ao que se associaram, os condicionalismos implacáveis de uma pandemia gigantesca que afectou e continua a afectar milhões de pessoas por todo o mundo e que determinou que Macau, nos últimos 3 anos, tivesse que implementar diversas medidas restritivas de entrada no território e que os forçou a essa ausência.
LII. Razão pela qual, salvo devido respeito, se deve considerar justificadas as ausências de Macau dos Recorrentes (B), (C) e (D) para efeitos de perda da residência habitual e, consequentemente, deverá a douta decisão recorrida ser anulada por se encontrar inquinada com o vício de violação de lei, previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC, conforme o preceituado no artigo 124.º do CPA, e que aqui se invoca para os devidos efeitos legais.

  Citada a Entidade Recorrida veio o Senhor Secretário para a Economia e Finanças contestar, oferecendo o merecimento dos autos.
  
  Notificadas as partes para apresentarem alegações facultativas, vieram os Recorrentes fazê-lo.
  
  Pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público foi emitido parecer pugnando pela improcedência do recurso.
  
  Foram colhidos os vistos.
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
  
  O Tribunal é o competente.
  O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
  As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
  Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
  
  Cumpre assim apreciar e decidir.
  
III. FUNDAMENTAÇÃO

a) Dos factos
  
  A factualidade com base na qual foram praticados os actos recorridos consiste no seguinte:
a) No seguimento do pedido de renovação de autorização de residência em Macau formulado pelos Recorrentes (B), (C) e (D), foi o mesmo indeferido por Despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças datado de 23.06.2023, nos termos e com os fundamentos das Propostas nºs 0196/2014/01R e 0196/2014/02R elaboradas pela IPIM, as quais constam de fls. 32 a 44 (traduzidas a fls. 107 a 131) e com o seguinte teor:
«Propostas n.ºs 0196/2014/01R e 0196/2014/02R Requerente – (A)
Pedido de autorização de residência temporária de quadros dirigentes – renovação
É aplicável o RA n.º 3/2005

Despacho do SEF

No exercício das competências que me foram delegadas pela Ordem Executiva n.º 3/2020, concordo com o analisado na proposta e defiro, nos termos do disposto no artigo 19.º, n.º 2 do RA n.º 3/2005, os dois pedidos de renovação formulados pelo requerente. Por outro lado, nos termos do artigo 43.º, n.º 2, al. (3) e n.º 3 da Lei n.º 16/2021, aplicável subsidiariamente por força do artigo 23.º do mesmo RA, indefiro o pedido de renovação das autorizações de residência temporária concedidas, por extensão, ao cônjuge e aos dois descendentes do requerente.
Secretário para a Economia e Finanças

23 de Junho de 2023

Parecer do presidente substituto do Conselho de Administração do IPIM
Concordo com o analisado e proposto. Proponho o deferimento do pedido de renovação da autorização de residência temporária do seguinte interessado.
N.º
Nome
Relação
Propõe-se que a residência temporária seja autorizada até
1
(A)
Requerente
15/09/2021
Proponho o indeferimento do pedido de renovação da autorização de residência temporária dos seguintes interessados.
N.º
Nome
Relação
1
(B)
Cônjuge
2
(C)
Descendente
3
(D)
Descendente

No presente pedido, o requerente também pede a segunda renovação da sua autorização de residência temporária. Tendo em conta que o requerente foi impedido de apresentar o segundo pedido de renovação por ter colaborado com os trabalhos rigorosos de examinação, pelo que a não apresentação do respectivo pedido não lhe era imputável. Partindo do princípio da boa fé, afigura-se-nos que o peticionado pelo requerente é razoável e necessário, pelo que proponho que se renove, pela segunda vez, a autorização de residência temporária do seguinte interessado:
N.º
Nome
Relação
Propõe-se que a residência temporária seja autorizada até
1
(A)
Requerente
15/09/2024

À apreciação do Sr. SEF.
XX/presidente substituto
20 JUN 2022

Parecer do vogal executivo do Conselho de Administração do IPIM
Concordo com o proposto.
Vogal executivo
XX
20.01.2022

Parecer do chefe do DJFR
Concordo com o proposto.
Directora do DJFR
XX
19 JAN 2023

Assunto: Apreciação de pedidos de autorização de residência temporária

Exma. Sra. Directora do DJFR,
1. São os seguintes os dados de identificação e prazos de autorização de residência temporária (ATR) dos interessados:
N.º
Nome
Relação
DI/N.º
DI válido até
ART válida até
Renovação proposta da ATR até
Data do primeiro pedido de extensão
1
(A)
Requerente
Passaporte australiano RAxxxx
22/11/2032
15/09/2018

15/09/2021
N/A
2
  (B)
Cônjuge
Passaporte britânico 5xxxx
03/02/2026
15/09/2018

N/A
07/05/2014
3
(C)
Descendente
Passaporte australiano PAxxx
27/08/2028
15/09/2018

N/A

07/05/2014
4
(D)
Descendente
Passaporte australiano PAxxxx
23/08/2028
15/09/2018

N/A

07/05/2014
2. Em 15 de Setembro de 2015, foi concedida ao requerente (A), pela primeira vez, autorização de residência temporária, válida até 15 de Setembro de 2018. Ao mesmo tempo, foi concedida, por extensão, autorização de residência temporária ao seu cônjuge (B) e dois descendentes (C) e (D). O presente pedido de renovação foi formulado pelo requerente em 6 de Setembro de 2018.
3. O requerente apresentou, em 2 de Dezembro de 2022, o renovado passaporte australiano (n.º RAxxxx) para substituir o antigo passaporte como fundamento de pedido (vd. fls. 12 a 13).
4. De acordo com os dados dos autos, o requerente mantém com o cônjuge (B) a relação matrimonial. Não se constata qualquer antecedente criminal do requerente, seu cônjuge e dois descendentes.
5. Para provar mais prudentemente a relação filial entre o requerente e os descendentes (C) e (D), o requerente apresentou, no primeiro pedido que formulou, documentos comprovativos de registos de nascimento.
6. Para efeitos de renovação, o requerente apresentou os seguintes documentos comprovativos da relação de trabalho e os pertinentes documentos (vd. fls. 30 a 84 e 88):
Denominação do empregador: (X) LTD (vd. fls. 41)
Nome do cargo: ... (vd. fls. 87)
Salário básico: 190.000,00 patacas (vd. fls. 81)
Data da contratação: começou a exercer as funções em 6 de Novembro de 2015, agora com contrato de trabalho sem prazo (vd. fls. 41 a 111)
Dos documentos se constata uma divergência da data de ingresso mencionada no Boletim de Inscrição do Imposto Profissional – 1º Grupo (M/2) e da mencionada no certificado de trabalho (vd. fls. 41 e 111). De acordo com o documento de esclarecimento emitido pela entidade empregadora (fls. 88), os termos contratuais do requerente foram actualizados em 1 de Julho de 2016, pelo que a data de ingresso demonstrada no respectivo certificado de trabalho é 1 de Julho de 2016. Mas na verdade ele foi contratado em 6 de Novembro de 2015, ou seja, a data declarada pela entidade empregadora junto da DSF.
7. Além disso, de acordo com o certificado de trabalho apresentado pelo requerente ao IPIM, o seu cargo é “…” (fls. 41). No entanto, segundo revela o respectivo contrato de trabalho (fls. 31 a 32), o seu cargo é “...”. Portanto, o IPIM solicitou, por ofício, que o requerente apresentasse esclarecimento a este respeito. Posteriormente, o requerente apresentou um documento emitido pela entidade empregadora explicando que às vezes usa o título de “...” para efeitos da comercialização da empresa, mas o seu verdadeiro cargo é “...”, e as suas funções e responsabilidades não mudam devido aos títulos diferentes.
8. Da examinação dos documentos relativos ao presente pedido de renovação fica provado que o requerente continua contratado pela mesma empregadora como “...”, com o salário básico aumentado de 123.600,00 patacas para 190.000,00 patacas, superior à remuneração mediana dos quadros dirigentes do respectivo sector no 2º trimestre de 2022, que é de 35.000,00 patacas; o seu actual contrato não tem prazo; e declarou/pagou o imposto profissional de acordo com a lei.
9. Por ofícios n.ºs 05151/DJFR/2018, 03074/DJFR/2019 e 02160/DJFR/2020, respectivamente de 27 de Setembro de 2018, 19 de Junho de 2019 e 18 de Maio de 2020, o IPIM solicitou junto do CPSP os registos de migração do requerente e seu agregado familiar. São os seguintes os respectivos dados (vd. fls. 121 a 122, 144 a 145 e 228 a 240):
Período
Número de dias de permanência em Macau do requerente (A)
01/01/2015-31/12/2015
259
01/01/2016-31/12/2016
268
01/01/2017-31/12/2017
243
01/01/2018-31/12/2018
133
01/01/2019-31/12/2019
188
01/01/2020-30/04/2020
50

Período
Número de dias de permanência em Macau do cônjuge (B)
01/01/2015-31/12/2015
25
01/01/2016-31/12/2016
11
01/01/2017-31/12/2017
17
01/01/2018-31/12/2018
5
01/01/2019-31/12/2019
67
01/01/2020-30/04/2020
19

Período
Número de dias de permanência em Macau do descendente (C)
01/01/2015-31/12/2015
42
01/01/2016-31/12/2016
39
01/01/2017-31/12/2017
15
01/01/2018-31/12/2018
3
01/01/2019-31/12/2019
0
01/01/2020-30/04/2020
0

Período
Número de dias de permanência em Macau da descendente (D)
01/01/2015-31/12/2015
42
01/01/2016-31/12/2016
41
01/01/2017-31/12/2017
41
01/01/2018-31/12/2018
4
01/01/2019-31/12/2019
5
01/01/2020-30/04/2020
0
Obs: Ao requerente, seu cônjuge e dois descendentes foram concedidas autorizações de residência temporária em 15 de Setembro de 2015. Contados a partir dessa data, permaneceram em Macau, durante o ano de 2015, 61, 0, 3 e 3 dias, respectivamente.
Dos dados supra descritos resulta que em 2018 o requerente permaneceu relativamente poucos dias em Macau. Além disso, os respectivos registos de migração também não são suficientes para demonstrar que o seu cônjuge e os dois descendentes tiveram em Macau o centro da vida, pelo que deixa de se verificar a condição da manutenção da autorização de residência temporária.
10. Por conseguinte, o IPIM procedeu à audiência do requerente (vd. fls. 284 a 297). Posteriormente, o advogado constituído pelo requerente apresentou, em 8 de Fevereiro de 2021, a resposta escrita e os documentos pertinentes, com o seguinte conteúdo principal:
(1) O advogado não concorda com o IPIM quando este concluiu pela não residência habitual em Macau do requerente e seu agregado familiar, e diz que o IPIM não considerou criticamente as circunstâncias concretas dos interessados.
(2) Segundo o advogado, desde Maio e Junho de 2018 o requerente começou a apresentar sintomas de fraqueza relativos a determinada grave doença. Após se ter submetido a várias consultas médicas em Macau e a vários controlos de saúde no Hospital da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau, era ainda desconhecida a causa da doença. Foi apresentado, como prova, o relatório de um dos primeiros controlos de saúde a que o requerente se submeteu em Macau (fls. 324).
(3) Por não ter sido detectada a causa da doença, o requerente aceitou a sugestão do médico na Austrália e deslocou-se à Austrália em 27 de Junho de 2018, onde ficou em hospital durante 28 de Junho e 6 de Julho de 2018 para se submeter a uma séria de exames médicos. Em Setembro de 2018, o requerente foi diagnosticado com linfomas e cancro da tiróide. Portanto, o requerente precisava de submeter-se a tratamentos de quimioterapia e radioterapia em hospital australiano. O seu advogado apresentou os respectivos relatórios médicos e documentos de internamento hospitalar para corroborar isso (fls. 325 e 333). Em Março de 2019, o requerente voltou a Macau após a conclusão de diversos tratamentos.
(4) Segundo o advogado, por o requerente necessitar de tratamentos e consultas permanentes para tratar a doença, ele saiu de Macau de novo em Abril de 2020 com destino à Austrália para se submeter a tratamentos semelhantes (fls. 334). No entanto, devido às medidas de restrição impostas no início de 2020 para combater a pandemia Covid-19, o requerente não conseguiu regressar a Macau após os referidos tratamentos. Foi só em Julho de 2020, altura em que o Governo da RAEM disponibilizou os serviços especiais de ferry entre Hong Kong e Macau, é que conseguiu regressar a Macau.
(5) Posteriormente, o requerente precisava de deslocar-se novamente à Austrália em 24 de Novembro de 2020 para submeter-se a exames médicos (fls. 335). Devido à pandemia, tinha de cumprir na Austrália um período de quarentena de 14 dias. Além disso, por na altura não existir nenhum voo internacional para Macau, o requerente não conseguiu voltar a Macau após o tratamento.
(6) Segundo o advogado, o processo de tratamento de cancro é longo e difícil, pelo que é muito importante que o cônjuge e os dois descendentes do requerente fiquem ao lado e cuidem dele durante o processo.
(7) O advogado também submeteu documentos passados por médico australiano para provar que a partir de 2013 o cônjuge do requerente começou a cuidar do ascendente idoso e muito doente na Austrália (fls. 336).
(8) Ainda segundo o advogado, o filho do requerente, (C) encontra-se a estudar na (X) University of Technology na Austrália, e a filha (D) está a frequentar a Universidade (Y) na Austrália (fls. 337 a 342).
(9) O advogado defende que as deslocações frequentes do requerente à Austrália e as suas ausências, relativamente longas, de Macau deveram-se à sua necessidade de submeter-se aos tratamentos médicos na Austrália. Além disso, no período compreendido entre 2018 e 2020, o requerente sempre manteve as suas actividades profissionais em Macau assim como a sua ligação com Macau, tendo aqui o seu centro da vida pessoal e profissional. Também foi entrevistado por vários meios de comunicação social de Macau (fls. 343 a 447).
(10) Portanto, o advogado argumenta que o requerente tinha justa causa para se ausentar de Macau durante a maior parte de 2018, e que o IPIM deve considerar as circunstâncias concretas dos interessados. Ainda cita os n.ºs 3 e 4.º do artigo 4.º da Lei n.º 8/1999: “a ausência temporária de Macau não determina que se tenha deixado de residir habitualmente em Macau” e “relevam as circunstâncias pessoais e da ausência”, para sustentar que a Administração só pode inferir que o interessado tenha deixado de residir habitualmente em Macau quando os pressupostos fácticos concretos, sobretudo os elementos elencados no artigo 8.º, n.º 2 da Lei n.º 8/1999, levem à conclusão de que ele não tem a intenção de permanecer definitivamente em Macau.
(11) A resposta cita e transcreve parte do acórdão do TUI proferido no processo n.º 21/2014: “tem domicílio permanente ou definitivo em Macau quem, além de residir habitualmente em Macau, tem aqui centrada a sua economia doméstica, quem tem em Macau o centro da sua vida profissional e familiar (ou, quem não exercendo profissão em Macau, possui meios de subsistência estáveis), quem paga os seus impostos em Macau, com intenção de aqui permanecer definitivamente.” O mesmo aresto ainda refere que o “domicílio permanente (…) é um conceito indeterminado, sendo que na parte em que se refere ao centro da vida doméstica do residente, não confere à Administração qualquer margem de livre apreciação; já na parte em que se trata de apurar se o interessado tem intenção de permanecer definitivamente em Macau, há uma intenção de conferir à Administração uma margem de livre apreciação, por estar em causa um juízo de prognose, fundamentalmente, mas não exclusivamente, com suporte nos elementos mencionados no artigo 8.º, n.º 2, da Lei n.º 8/1999.”
(12) No que diz respeito à “residência habitual”, o advogado ainda cita o acórdão do TSI, processo n.º 473/2019 e o acórdão do TUI, processo n.º 182/2020, onde se pode ler: “Isto, como é óbvio, não se traduz numa (absoluta) impossibilidade de “ausência” – como pode suceder, por determinados períodos, como por exemplo, em resultado de compromissos profissionais, para férias ou visita de familiares e amigos (…)”, e “…muitas vezes – e em nossa opinião, adequadamente – se mostre de exigir não só uma “presença física” como a (mera) “permanência” num determinado território, (a que se chama o “corpus”), mas que seja esta acompanhada de uma (verdadeira) “intenção de se tornar residente” deste mesmo território (“animus”), e que pode ser aferida com base em vários aspectos do seu quotidiano pessoal, familiar, social e económico, e que indiquem, uma “efectiva participação e partilha” da sua vida social.”
(13) Logo, o avogado do requerente argumenta que, apesar da ausência do requerente e seu agregado familiar de Macau durante a maioria do tempo em questão (“corpus”), a qual se deveu às necessidades do requerente de submeter-se aos tratamentos médicos no exterior, do cônjuge de cuidar do ascendente idoso e muito doente na Austrália, e dos descendentes de estudar no exterior, assim como às restrições causadas pela pandemia Covid-19, os mesmos têm a intenção de se tornar residentes de Macau (“animus”). Portanto, todos têm a sua própria justa causa para ausentarem-se de Macau.
(14) O mandatário também cita os artigos 33.º e 43.º da Lei Básica da RAEM (LB) para defender que o indeferimento do presente pedido de renovação de autorização de residência temporária violará os direitos e garantias fundamentais conferidos aos interessados pela LB.
(15) O advogado salienta que o requerente tem várias habilitações académicas e ampla experiência, para além de gozar de notoriedade na indústria do jogo, quer em Macau quer na Ásia. Adianta que o requerente é uma pessoa com quase 60 anos de idade e com problemas de saúde, a não renovação da sua autorização de residência temporária implica que ele perca o emprego e, consequentemente, as receitas para sustentar a sua família.
(16) Acaba dizendo que o indeferimento do presente pedido de renovação de autorização de residência temporária violará o disposto nos artigos 33.º a 42.º da LB e no artigo 4.º, n.º 4 da Lei n.º 8/1999. Logo, pede que o pedido de renovação seja deferido.
11. Concluída a audiência, o requerente, através do advogado, pediu ao IPIM, em 29 de Outubro de 2021 e ao abrigo do artigo 97.º e 106.º da Lei n.º 16/2021, que a sua situação jurídica fosse reavaliada nos termos do artigo 43.º, n.º 5 da mesma Lei (fls. 480 a 482).
12. Em face da resposta acima exposta e do pedido de reavaliação, conjugados com o teor dos autos, foi feita a seguinte análise:
(1) Nos termos do disposto artigo 43.º, n.º 2, al. 3) da Lei n.º 16/2021, aplicável subsidiariamente por força do disposto nos artigos 18.º e 23.º do RA n.º 3/2005, os interessados devem manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, os pressupostos ou requisitos da concessão dessa autorização e a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão desta, assim como residir habitualmente em Macau;
(2) Dispõe o artigo 4.º, n.º 4 da Lei n.º 8/1999 que “Para a determinação da residência habitual do ausente, relevam as circunstâncias pessoais e da ausência, nomeadamente: 1) O motivo, período e frequência das ausências; 2) Se tem residência habitual em Macau; 3) Se é empregado de qualquer instituição sediada em Macau; 4) O paradeiro dos seus principais familiares, nomeadamente cônjuge e filhos menores.”
(3) Para assegurar o cumprimento das disposições legais acima referidas por parte dos interessados, o IPIM está obrigado, quer durante a apreciação do pedido de renovação da autorização de residência temporária, quer depois de renovada a mesma, a investigar se os interessados mantêm os requisitos legalmente exigidos, assim como a praticar, uma vez verificada a violação das respectivas normas legais, acto administrativo de cancelamento ou declaração de caducidade, ou indeferir o pedido de renovação.
(4) É a seguinte a análise sobre a permanência em Macau do requerente (A):
(4.1) Dos registos de migração fornecidos pelo CPSP resulta que, durante o período compreendido entre 2015 e 30 de Abril de 2020, o requerente permaneceu em Macau, respectivamente, 259 dias, 268 dias, 243 dias, 133 dias, 188 dias e 50 dias, por cada ano deste período. Esteve ausente de Macau durante a maior parte do ano de 2018.
(4.2) De acordo com a resposta do requerente e os pertinentes documentos de suporte apresentados pelo seu advogado, o requerente submeteu-se a diversas consultas médicas em hospitais em Macau, mas não foi descoberta a causa da doença, pelo que se deslocou à Austrália em Junho de 2018, onde ficou em hospital durante 28 de Junho e 6 de Julho de 2018 para se submeter a uma séria de exames médicos. Em Setembro de 2018, o requerente foi diagnosticado com linfomas e cancro da tiróide, pelo que precisava de ficar na Austrália a submeter-se a tratamentos. Em Março de 2019, o requerente voltou a Macau após a conclusão de diversos tratamentos médicos. Dada a necessidade permanente de submeter-se a tratamentos e consultas, o requerente deslocou-se novamente para Austrália em Abril de 2020 para se submeter a tratamentos semelhantes. No entanto, devido às medidas de restrição impostas no início de 2020 para combater a pandemia Covid-19, o requerente só conseguiu regressar a Macau em Julho de 2020. Posteriormente, o requerente precisava de deslocar-se novamente à Austrália em Novembro de 2020 para submeter-se a exames médicos. Segundo o seu advogado, foram estes os motivos que conduziram à ausência do requerente de Macau durante a maior parte dos anos de 2018 e 2020.
(4.3) Analisados os registos de entrada e saída de Macau fornecidos pelo CPSP, constata-se que as permanências do requerente em Macau nos anos de 2018 e 2020 encontram-se mais ou menos compatíveis com o declarado na sua resposta. Apesar das suas ausências de Macau durante a maior parte do ano de 2018, tais ausências temporárias deveram-se à sua necessidade de submeter-se a tratamentos da doença na Austrália.
(4.4) Dispõe o artigo 4.º, n.º 3 da Lei n.º 8/1999 que “a ausência temporária de Macau não determina que se tenha deixado de residir habitualmente em Macau.” Da análise crítica dos elementos e documentos dos autos resulta que as suas ausências de Macau durante o ano de 2018 foram meramente temporárias e foram justificadas. Além disso, já regressou a Macau, onde trabalha e reside e tem centrado o seu quotidiano. Atento o disposto no artigo 4.º, n.º 4 da Lei n.º 8/1999, afigura-se-nos que ele reside habitualmente em Macau e assim preenche a condição da manutenção da autorização de residência temporária.
(4.5) Por outro lado, dos números de dias de permanência em Macau e dos documentos comprovativos da relação de trabalho apresentados pelo requerente também flui que este cumpriu, durante todo o período de residência temporária autorizada, o seu contrato de trabalho, sendo assim mantida a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
(5) De seguida analisam-se as permanências em Macau do cônjuge (B) e dos dois descendentes (C) e (D):
(5.1) Dos registos de migração fornecidos pelo CPSP constata-se que, durante o período compreendido entre 2015 e 30 de Abril de 2020, o cônjuge do requerente permaneceu em Macau, respectivamente, 25 dias, 11 dias, 17 dias, 5 dias, 67 dias e 19 dias, por cada ano deste período. Durante o referido período, entrou em Macau 19 vezes, com permanências que variaram entre 3 e 19 dias. O descendente (C) permaneceu em Macau, respectivamente, 42 dias, 39 dias, 15 dias, 3 dias, 0 dias e 0 dias, por cada ano do mesmo período; durante tal período entrou em Macau 13 vezes, com permanências que variaram entre 1 e 18 dias; desde que saiu de Macau em 27 de Junho de 2018 e até 30 de Abril de 2020, não tem registo de entrada. Quanto à outra descendente (D), permaneceu em Macau, respectivamente, 42 dias, 41 dias, 41 dias, 4 dias, 5 dias e 0 dias, por cada ano do mesmo período; durante tal período entrou em Macau 17 vezes, com permanências que variaram entre 1 e 19 dias; desde que saiu de Macau em 12 de Dezembro de 2018 e até 30 de Abril de 2020, não tem registo de entrada.
(5.2) Apesar de o requerente declarar, no presente pedido de renovação, o endereço em Macau do cônjuge e dois descendentes (vd. fls. 5 a 7), considerando o número de entradas dos interessados em Macau e os respectivos períodos de permanência, é difícil concluir que eles tenham residência habitual em Macau.
(5.3) Quanto à permanência do cônjuge do requerente, o advogado constituído apresentou na audiência documentos passados por médico australiano que mostram que o cônjuge começou, a partir de 2013, a cuidar do ascendente idoso e muito doente na Austrália. Segundo o advogado, foi este o motivo que conduziu à sua ausência de Macau durante a maior parte do tempo em questão (fls. 336). No entanto, importa assinalar que o requerente formulou junto do IPIM o primeiro pedido de autorização de residência temporária em 7 de Maio de 2014 (fls. 574 a 582), com extensão da autorização para o seu cônjuge. Por outras palavras, antes de o requerente pedir a extensão da autorização de residência temporária para o cônjuge, devia saber que o descendente dela precisava de cuidados permanentes por causa de doença. Ciente disso, o requerente ainda pediu a autorização de residência temporária para o cônjuge, pelo que tal não pode ser a justa causa que impediu a interessada de vir viver para Macau. Acresce que, compulsado o formulário de «Informações dos membros do agregado familiar» (fls. 5), submetido pelo requerente para efeitos do presente pedido de renovação, constata-se que o cônjuge dele declara o “reagrupamento familiar” como “motivo do pedido de fixação de residência temporária na RAEM”. Isso mostra-se manifestamente incompatível com o que diz o requerente, ou seja, o cônjuge tem de permanecer na Austrália para cuidar do ascendente.
(5.4) No que toca às permanências dos dois descendentes, o advogado diz que se ausentaram de Macau durante a maior parte do tempo em questão por causa de estudo. Apresentaram-se os documentos comprovativos da frequência deles em instituições académicas australianas. Todavia, no supra referido formulário de «Informações dos membros do agregado familiar» (fls. 6 e 7), os dois descendentes declaram “estudo e reagrupamento familiar” como “motivos do pedido de fixação de residência temporária na RAEM”. Do mesmo formulário também se constata que os dois descendentes frequentaram escolas em Macau. No entanto, depois de autorizada a residência temporária, eles optaram por ir estudar para a Austrália, apesar de poder viver e estudar em Macau. Isso é manifestamente incompatível com os declarados “motivos do pedido de fixação de residência temporária na RAEM”, para além de revelar que os dois descendentes não têm o centro de estudo em Macau.
(5.5) Além disso, desde a concessão da autorização de residência temporária ao cônjuge e descendentes do requerente e até à presente data já decorreram 7 anos, no entanto, de entre os documentos apresentados pelo requerente para efeitos da renovação, não se vislumbra, para além do imóvel adquirido pelo casal em conjunto e dos extractos mensais do cônjuge, que o cônjuge e os descendentes tenham mais ligações com Macau, nem que tenham aqui centrado o seu quotidiano. Isso revela que Macau não é o lugar onde se centra a sua vida e que eles não têm uma forte intenção de permanecer definitivamente em Macau.
(5.6) Quanto ao paradeiro dos principais familiares, dos números de dias de permanência em Macau dos interessados e da resposta destes flui que o cônjuge do requerente, os dois descendentes e o(s) ascendente(s) do cônjuge residem actualmente na Austrália. Quer dizer que só o requerente trabalha em Macau, pelo que é difícil concluir que o cônjuge e os dois descendentes tenham em Macau o centro da vida familiar.
(6) Face ao exposto, realizada a audiência, verifica-se que o cônjuge e os dois descendentes do requerente não têm centrado em Macau o seu quotidiano nem a vida familiar, e que não existe qualquer causa justificativa que os impeça de residir em Macau. Razão pela qual, é de concluir que não residem habitualmente em Macau.
(7) Tendo o requerente requerido a reavaliação, o IPIM, a fim de verificar as permanências do cônjuge e descendentes do requerente após 30 de Abril de 2020, enviou o ofício n.º OF/03834/DJFR/2022 ao CPSP para solicitar os registos de migração dos respectivos interessados. São as seguintes as respectivas informações (fls. 533 a 534 e 540 a 545)
Período
Número de dias de permanência em Macau do cônjuge (B)
01/05/2020-31/12/2020
0
01/01/2021-31/12/2021
0
01/01/2022-31/10/2022
0

Período
Número de dias de permanência em Macau do descendente (C)
01/05/2020-31/12/2020
0
01/01/2021-31/12/2021
0
01/01/2022-31/10/2022
0

Período
Número de dias de permanência em Macau da descendente (D)
01/05/2020-31/12/2020
0
01/01/2021-31/12/2021
0
01/01/2022-31/10/2022
0
Fica demonstrado pelos dados acima expostos que o cônjuge e os dois descendentes não entraram em Macau no período compreendido entre 1 de Maio de 2020 e 2022. Ou seja, não residiram habitualmente em Macau neste período.
13. Face ao expendido, ficou provado que o requerente manteve, no período compreendido entre 15 de Setembro de 2015 e 15 de Setembro de 2018 (isto é, o prazo de residência temporária autorizada), os pressupostos que fundamentaram a concessão da sua autorização de residência temporária. Além disso, atentas as circunstâncias relativas à sua permanência em Macau e o certificado do registo criminal, não se verifica qualquer das situações previstas no artigo 43.º, n.º 2, al.s 1) a 3) da Lei n.º 16/2021, aplicável subsidiariamente por força do artigo 23.º do RA n.º 3/2005, pelo que se propõe ao Sr. SEF que, no exercício das competências delegadas pelo Chefe do Executivo através do n.º 1 da Ordem Executiva n.º 3/2020, e ao abrigo do disposto no artigo 19.º, n.º 2 do RA n.º 3/2005, defira o presente pedido de renovação do requerente (A), concedendo-lhe a autorização de residência temporária com validade até 15/09/2021.
14. A residência habitual do interessado na RAEM é condição da manutenção da autorização de residência, mas das informações de entrada e saída resulta que o cônjuge e os descendentes do requerente ausentaram-se de Macau na maior parte do tempo em questão. Portanto, realizada a audiência e atentas as situações previstas no artigo 4.º, n.º 4 da Lei n.º 8/1999, verifica-se que o cônjuge e os dois descendentes não residiram habitualmente em Macau durante todo o período de residência temporária autorizada. Por conseguinte, propõe-se ao Sr. SEF que, no exercício das competências delegadas pelo Chefe do Executivo através do n.º 1 da Ordem Executiva n.º 3/2020, e ao abrigo do disposto no artigo 43.º, n.º 2, al. 3) e n.º 3 da Lei n.º 16/2021, aplicável subsidiariamente por força do artigo 23.º do RA n.º 3/2005, indefira o pedido de renovação da autorização de residência temporária do cônjuge (B) e dos descendentes (C) e (D).
15. Em 16 de Janeiro de 2023, o requerente apresentou declaração ao IPIM pedindo a concessão simultânea da segunda renovação da autorização de residência temporária (fls. 571 a 573).
16. Quanto a este pedido, o IPIM entende que:
(1) A presente autorização de residência temporária do requerente seria renovada até 15 de Setembro de 2021, quer dizer que já decorreu o período de 180 dias a contar do termo da respectiva validade. Razão pela qual, é impossível para o requerente pedir a segunda renovação da autorização no prazo legalmente fixado.
(2) Compulsados os elementos dos autos, constata-se que, na apreciação do presente pedido de renovação de autorização de residência temporária, o IPIM, com o propósito de ter um conhecimento mais pormenorizado acerca do trabalho do requerente e das permanências dele e do seu agregado familiar em Macau, solicitou por várias vezes ao CPSP os registos de entrada e saída de Macau dos interessados, e notificou o requerente, por ofício e por telefone, para apresentar documentos complementares necessários à apreciação do pedido. O requerente colaborou activamente na submissão dos respectivos documentos.
(3) Por conseguinte, o requerente não apresentou o segundo pedido de renovação por motivo que não lhe era imputável (colaboração com os trabalhos rigorosos de examinação). Razão pela qual, e partindo do princípio da boa fé, somos da opinião de que o peticionado pelo requerente é razoável e necessário.
(4) Compulsados os documentos comprovativos do trabalho e do pagamento de remuneração entre Julho e Outubro de 2022 (fls. 91 a 100), constata-se que desde 16 de Setembro de 2018 (data de início do prazo da primeira renovação) até à presente data, o requerente trabalha para a “(X) LTD” exercendo o cargo de “...”, com salário básico de 190.000,00 patacas, valor superior à remuneração mediana dos quadros dirigentes não residentes do respectivo sector no 2º trimestre de 2022, que é de 35.000,00 patacas; e o seu actual contrato não tem prazo. Isso demonstra que o requerente trabalha em Macau de forma estável e contínua durante todo o período de residência temporária autorizada, mantendo a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da sua autorização.
(5) O IPIM, por ofícios n.ºs OF/05849/DJFR/2021 e OF/03834/DJFR/2022, de 22 de Dezembro de 2021 e 10 de Novembro de 2022, respectivamente, solicitou ao CPSP os registos de migração do requerente após 30 de Abril de 2020. São as seguintes as respectivas informações (fls. 485 a 491 e 533 a 539):
Período
Número de dias de permanência em Macau do requerente
01/05/2020-31/12/2020
138
01/01/2021-31/12/2021
189
01/01/2022-31/10/2022
213
Dos supra referidos números de dias de permanência do requerente em Macau e dos documentos comprovativos da relação laboral apresentados por este resulta que ele cumpriu, durante todo o período de residência temporária autorizada, o seu contrato de trabalho, mantendo assim a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização. Além disso, as respectivas informações relativas ao número de dias de permanência em Macau, conjugadas com a prova de morada residencial apresentada pelo mesmo (fls. 583), também revelam que o requerente residiu habitualmente em Macau no período acima referido, sendo assim preenchida a condição da manutenção da autorização de residência.
17. Da análise supra se depreende que o requerente mantém os pressupostos que fundamentaram a concessão da sua autorização de residência temporária; das circunstâncias relativas à sua residência em Macau e do certificado do registo criminal também não se vislumbra qualquer situação prevista no artigo 43.º, n.º 2, al.s 1) a 3) da Lei n.º 16/2021, aplicável subsidiariamente por força do artigo 23.º do RA n.º 3/2005. Portanto, propõe-se ao Sr. SEF que, no exercício das competências delegadas pelo Chefe do Executivo através do n.º 1 da Ordem Executiva n.º 3/2020, e ao abrigo do disposto no artigo 19.º, n.º 2 do RA n.º 3/2005, defira o presente pedido de renovação do requerente (A), concedendo-lhe a autorização de residência temporária com validade até 15/09/2024.».

b) Do Direito
  
  É do seguinte teor o Douto Parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público:
  «1.
  (B), (C) e (D), melhor identificados nos autos, vieram instaurar o presente recurso contencioso do acto do Secretário para a Economia e Finanças de indeferimento do pedido de renovação da autorização de residência temporária na Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China (RAEM), pedindo a respectiva anulação.
  A Entidade Recorrida, devidamente citada, apresentou contestação na qual pugnou pela improcedência do recurso contencioso.
  2.
  (i)
  (i.1)
  Salvo o devido respeito, parece-nos que os Recorrente não têm razão. Procuraremos, de modo breve, justificar.
  A residência habitual na RAEM é um pressuposto da manutenção e da renovação da autorização temporária de residência. É isso o que resulta da norma da alínea 3) do n.º 2 do artigo 43.º da Lei n.º 16/2021, a qual é aplicável à situação em apreço em virtude da norma remissiva constante do artigo 23.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, segundo a qual «é subsidiariamente aplicável aos interessados que requeiram autorização de residência temporária nos termos do presente diploma o regime geral de entrada, permanência e fixação de residência na Região Administrativa Especial de Macau».
  Podemos dizer que existe um certo consenso no sentido de fazer coincidir a residência habitual com o lugar onde determinada pessoa fixou com carácter estável e permanente o seu centro de interesses vitais, o centro efectivo da sua vida, constituindo, portanto, o local em torno do qual gravitam as respectivas ligações existenciais. Deste modo, não integra o dito conceito, o local que serve de mera passagem, ou aquele no qual uma pessoa está por curtos e intermitentes períodos de tempo (veja-se, por exemplo, neste sentido, o acórdão do Tribunal de Última Instância tirado no processo n.º 182/2020).
  Além disso, na densificação do conceito de residência habitual relevante em matéria atinente ao estatuto de residente da RAEM, têm também sido chamadas à colação as normas dos n.ºs 3 e 4 do artigo 4.º da Lei n.º 8/1999. Da norma do n.º 3 do artigo 4.º do mencionado diploma legal [com o seguinte teor: «para os efeitos do estatuto de residente permanente referido nas alíneas 2), 5), 8) e 9) do n.º 1 do artigo 1.º e da perda do direito de residência referida no n.º 2 do artigo 2.º, a ausência temporária de Macau não determina que se tenha deixado de residir habitualmente em Macau»] resulta que a residência habitual em Macau é compatível com a ausência temporária da Região (veja-se, neste mesmo sentido de que a ausência temporária não implica a quebra da residência habitual, o acórdão do Tribunal de Última Instância de 13.11.2019, processo n.º 106/2019 e o acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 2.7.220, processo n.º 473/2019) e, do n.º 4 do artigo 4.º da Lei n.º 8/1999 resulta, por sua vez, que, em caso de ausência temporária do residente, na determinação da residência habitual, relevam as circunstâncias pessoais e os motivos da ausência, nomeadamente: 1) o motivo, período e frequência das ausências; 2) se o ausente tem residência habitual em Macau; 3) se é empregado de qualquer instituição sediada em Macau; 4) o paradeiro dos seus principais familiares, nomeadamente cônjuge e filhos menores.
  Finalmente, com a entrada em vigor da Lei n.º 16/2021, verificou-se um alargamento do conceito de residência habitual para os efeitos aí previstos. Com efeito, através da norma do n.º 5 do artigo 43.º da Lei n.º 16/2021, o legislador veio esclarecer que o conceito de residência habitual relevante enquanto pressuposto da manutenção e da renovação da autorização de residência temporária, não exige que Macau constitua o centro efectivo da vida pessoal e familiar do interessado, o qual nem sequer precisa de aqui ter a sua habitação para pernoitar, porquanto, como resulta expressamente daquela norma, «não deixa de ter residência habitual o titular que, embora não pernoite na RAEM, aqui se desloque regular e frequentemente para exercer actividades de estudo ou profissional remunerada ou empresarial». Assim, ao lado das pessoas que em Macau fixaram com carácter estável e permanente o seu centro de interesses, o centro efectivo da sua vida, e que, por isso, residem habitualmente em Macau, também em relação às pessoas que aqui apenas exercem uma actividade, seja académica, seja profissional, seja empresarial, ainda que aqui não vivam, se tem de considerar, face ao critério legal, que aqui residem habitualmente, desde que aqui se desloquem «regular e frequentemente» para exercer tais actividades.
  (i.2)
  Face aos elementos de facto que fluem dos autos e que constituíram os pressupostos de facto do acto recorrido, parece-nos legítimo concluir que, como a Administração também concluiu, os Recorrentes, no período temporal que foi considerado pela Administração, ou sejam, entre 1 de Janeiro de 2015 e 30 de Abril de 2020, não tiveram residência habitual em Macau.
  Com efeito, resulta daqueles elementos que, durante esse tempo, a Recorrente (B), permaneceu em Macau durante 25 dias em 2015, 11 dias em 2016, 17 dias, em 2017, 5 dias em 2018, 67 dias em 2019 e 19 dias em 2020, o Recorrente (C), permaneceu em Macau durante 42 dias em 2015, 39 dias em 2016, 15 dias em 2017, 3 dias em 2018 e nenhum dia em 2019 e 2020, a Recorrente (D) permaneceu em Macau durante 42 dias em 2015, 41 dias em 2016, 41 dias em 2017, 4 dias em 2018, 5 dias em 2019 e nenhum dia em 2020. Assim, a partir desta factualidade, facilmente podemos dizer que, no período em causa, o Recorrente não estabilizou a sua vida em Macau, não tendo, pois, chegado a constituir aqui o centro permanente dos seus interesses mais relevantes, uma vez que, a nosso ver, é evidentemente incompatível com uma conclusão nesse sentido, o facto de os mesmos aqui terem permanecido por tão pouco tempo. A escassa permanência dos Recorrentes em Macau durante o lapso de tempo acima referido é demonstrativa, parece-nos, de que entre eles e a Região nunca chegou, pois, a formar-se o indispensável vínculo da residência habitual.
  Por isso, com todo o respeito por outro entendimento, estamos convictos de que não é legalmente viável procurar enquadrar as respectivas situações no conceito de ausência temporária previsto na norma do n.º 3 do artigo 4.º da lei n.º 8/1999. Só faz sentido falar de ausência temporária de Macau em relação a situações em que, antes dessa ausência, havia presença em Macau, e, portanto, residência habitual, o que, no caso, não ocorre.
  Além disso, também se não demonstra que os Recorrentes, no período temporal relevante, tenham preenchido os requisitos do conceito legal de residência habitual plasmado no n.º 5 do artigo 43.º da Lei n.º 16/2021, porquanto, como parece evidente, aqueles não se deslocavam regular e frequentemente a Macau para exercer actividades de estudo ou profissional remunerada ou empresarial.
  Deste modo e salvo o devido respeito, cremos plenamente justificada a conclusão da Administração no sentido de que faltava um pressuposto indispensável à renovação da autorização de residência dos Recorrentes, qual seja o da respectiva residência habitual em Macau.
  3.
  Face ao exposto, salvo melhor opinião, somos de parecer de que o presente recurso contencioso deve ser julgado improcedente.».
  
  O Douto Parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público vem de acordo com aquela que tem vindo a ser Jurisprudência deste Tribunal em situações idênticas.
  Acrescentaríamos apenas, que relativamente às alegadas justificações para que os Recorrentes (B), (C) e (D) não tivessem permanecido em Macau mais tempo não foi apresentada prova alguma.
  No que concerne à mãe da Recorrente (B) apenas foi junta a certidão de óbito não resultando daí que tivesse necessitado de cuidados todos estes anos e menos ainda que houvesse sido esta a filha a prestá-los.
  Relativamente ao estudo dos filhos do casal no estrangeiro dado o reduzido número de dias que estiveram em Macau impõe-se concluir que nem aqui passavam férias, o que é demonstrativo que mãe e filhos não tinham a sua residência em Macau.
  
  Destarte, concordando integralmente com a fundamentação constante do Douto Parecer supra reproduzido à qual integralmente aderimos sem reservas, sufragando a solução nele proposta entendemos que o acto impugnado não enferma dos vícios que os Recorrentes lhe apontam, sendo de negar provimento ao recurso contencioso.
  
  No que concerne à adesão do Tribunal aos fundamentos constantes do Parecer do Magistrado do Ministério Público veja-se Acórdão do TUI de 14.07.2004 proferido no processo nº 21/2004.
  
IV. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, negando-se provimento ao recurso mantém-se a decisão recorrida.
  
  Custas a cargo dos Recorrentes fixando-se a taxa de justiça em 8 Uc´s.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 09 de Maio de 2024
  
Rui Pereira Ribeiro (Juiz Relator)
Fong Man Chong (Primeiro Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng (Segundo Juiz-Adjunto)
Mai Man Ieng (Procurador-Adjunto do Ministério Público)
  

652/2023 REC CONT 66