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Processo nº 258/2023
(Autos de Revisão e Confirmação de Decisões)

Data do Acórdão: 20 de Junho de 2024

ASSUNTO:
- Revisão de sentença
- Divórcio


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Rui Pereira Ribeiro












Processo nº 258/2023
(Autos de Revisão e Confirmação de Decisões)

Data: 20 de Junho de 2024
Requerente: A
Requerida: B
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  A, com os demais sinais dos autos,
  vem instaurar a presente acção para Revisão e Confirmação de Decisão Proferida por Tribunal Exterior de Macau, contra
  B, também com os demais sinais dos autos.
  
  Citada a Requerida editalmente para querendo contestar esta silenciou, pelo que, nomeando-se defensor para o efeito, veio este igualmente a silenciar.
  Pelo Magistrado do Ministério Público foi emitido parecer no sentido de nada opor ao pedido de revisão e confirmação formulado.
  
  Foram colhidos os vistos.
  
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
  
  O Tribunal é o competente.
  O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
  As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
  Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
  
  Cumpre assim apreciar e decidir.
  
III. FUNDAMENTAÇÃO

a) Dos factos

1. Pelo Tribunal Popular do Distrito de Doumen, Cidade de Zhuhai, Província de Guangdong da República Popular da China foi proferido Decisão Cível a qual tem eficácia jurídica desde 10.06.2013;
2. Da decisão referida na alínea anterior consta que:
«Tribunal Popular do Distrito de Doumen, Cidade de Zhuhai,
Província de Guangdong
Decisão Cível
(2012) Zhu Dou Fa Min Yi Chu Zi n.º 1314
O Autor, A, do sexo masculino, nascido em 21/2/1978, de etnia han, residente de Macau, residente em Macau, na XXX, titular do Bilhete de Identidade de Residente n.º XXX.
A Ré, B, do sexo feminino, nascida em 10/11/1986, de etnia han, residente anteriormente na XXX (cujo registo domiciliar localizado na Cidade de Zhuhai da RPC “XXX”), ora se encontra em paradeiro desconhecido, e, titular do Bilhete de Identidade de Residente n.º XXX.
Quanto ao litígio do divórcio apresentado pelo Autor A contra a Ré B, este tribunal, em 24/10/2012, autuou o caso e admitiu-o, de acordo com a lei, formou um tribunal colegial e procedeu-se à audiência pública. O Autor, A, compareceu no tribunal para intervir na acção. A Ré, B foi legalmente citada pelo tribunal e recusou-se a comparecer em tribunal sem causa de justificação. O caso já foi apreciado e findo.
O Autor A alegou que: o registo do casamento foi realizado entre o Autor e a Ré em 27/4/2007, depois de se terem conhecido em Fevereiro de 2006. A Ré deixou o Autor desde 20/4/2008 até ao presente momento, o que resultou numa ruptura de sentimentos entre marido e mulher, pelo que foi intentada a acção a fim de se divorciar da Ré.
O Autor A apresentou a certidão de casamento e o certificado de registos de casamento para o provar.
A Ré, B, estava ausente, não contestou nem provou.
O tribunal examinou as provas acima enumeradas: as fontes de provas apresentadas pelo Autor são legítimas, o conteúdo é verdadeiro e o caso é relevante, para provar que entre o Autor e a Ré existe uma relação de marido e mulher. Assim, o tribunal acreditou-os.
O tribunal, de acordo com os elementos de prova confirmados e na transcrição do julgamento, considera que os factos do processo são os seguintes:
Em Fevereiro de 2006, o Autor e a Ré foram apresentados um ao outro e apaixonaram-se e, em 27 de Abril de 2007, registaram o seu casamento nos Serviços de Assuntos Civis de Zhuhai. No início do casamento, o Autor e a Ré viveram na casa da Ré em Macau e, a relação entre as duas partes estava geral. Em Abril de 2008, a Ré separou-se do Autor por este se encontrar temporariamente desempregado e voltou a viver na casa da mãe dela. De Abril de 2008 a Junho de 2008, o Autor deslocou-se várias vezes a casa da mãe da Ré para procurar a Ré e contactou-a várias vezes para lhe pedir que regressasse a Macau, mas sem sucesso. O Autor também pediu aos seus familiares que o ajudassem a convencer a Ré a regressar a Macau, mas em vão. Desde Junho de 2008, o Autor não conseguiu contactar a Ré e as duas partes vivem separadas desde então. O Autor, com o motivo da ruptura da relação entre o marido e a mulher, tendo requerido, junto deste tribunal, que se divorciasse da Ré. O tribunal admitiu o caso e, de acordo com os endereços do registo domiciliar da Ré e de residência da Ré fornecido pelo Autor, tentou enviado directamente os dados de acção passiva e os termos de citações sobre a comparência no tribunal nos termos da lei, mas sem sucesso, pelo que os enviou, por anúncio público nos termos da lei, limitando-se à Ré no prazo designado para comparecer no tribunal a fim de responder ao processo. Após o termo do prazo, a Ré não compareceu em tribunal para responder à acção. O tribunal julgou o processo à revelia, em conformidade com a lei.
Além disso, verificou-se que os Autor e Ré não tiveram filhos após o casamento.
O Tribunal considerou que, o Autor e a Ré, embora casados há muitos anos, mas no casamento só viveram juntos durante mais de um ano, as duas partes não prestaram atenção à manutenção da relação entre marido e mulher. A Ré deixou o Autor e não o contactou durante quase 5 anos, sendo esta a principal razão da ruptura da relação entre marido e mulher. O Autor requereu que se divorciasse da Ré, com razões suficientes, pelo que o tribunal o suportou. A Ré ausentou-se sem contestar, pelo que considerou que a Ré desistiu de excepção. Tendo em conta o que precede, em conformidade com o disposto na alínea 4) do n.º 3 do artigo 32.º da «Lei do Casamento da RPC» e no artigo 144.º da «Lei de Processo Civil da RPC», a decisão é a seguinte
É decretado o divórcio de A e da Ré B, e extingue-se a relação matrimonial a partir da data da presente decisão.
As despesas de admissão deste processo é de RMB$300,00, a cargo do Autor A.
Se não se conformar com esta decisão, o Autor A poderá recorrer no prazo de 30 dias a contar da data de notificação da decisão, e a Ré B poderá recorrer no prazo de 15 dias a contar da data de notificação da decisão, para este Tribunal, com cópia para o número das partes contrárias, a fim de interpor recurso junto do Tribunal Popular Intermédio da Cidade de Zhuhai
Juiz Presidente Du Xianjiao
Juiz Wang Min
Juízes em exercício Lai Baojun
   (Carimbo* Tribunal Popular do Distrito de Doumen da Cidade de Zhuhai)
25 de Fevereiro de 2013
   Esta cópia é igual ao original
Escrivão Lai Baojun»

b) Do Direito

  De acordo com o disposto no nº 1 do artº 1199º do CPC «Salvo disposição em contrário de convenção internacional aplicável em Macau, de acordo no domínio da cooperação judiciária ou de lei especial, as decisões sobre direitos privados, proferidas por tribunais ou árbitros do exterior de Macau, só têm aqui eficácia depois de estarem revistas e confirmadas.».
  Como é sabido nos processos de revisão e confirmação de decisões proferidas no exterior de Macau o Tribunal não conhece do fundo ou mérito da causa limitando-se a apreciar se a decisão objecto dos autos satisfaz os requisitos de forma e condições de regularidade para que possa ser confirmada.
  Esses requisitos são os que vêm elencados no artº 1200º do CPC, a saber:
  «1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
  a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
  b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
  c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
  d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
  e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
  f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública.
  2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.».
  
  Vejamos então.
  
  Da certidão junta aos autos resulta que pelo Tribunal Popular do Distrito de Doumen, Cidade de Zhuhai, Província de Guangdong foi decretado o divórcio entre Requerente e Requerida, nada havendo que ponha em causa a autenticidade da mesma e o sentido da decisão, estando assim preenchido o pressuposto da al. a) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
  Consta da certidão que a decisão passou a ter eficácia jurídica desde a data indicada o que equivale na legislação de Macau ao trânsito em julgado estando assim preenchido o pressuposto da al. b) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
  Igualmente resulta da certidão junta que a decisão não veio de tribunal cuja competência haja sido provocada em fraude à lei e não versa sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau, estando preenchidos os requisitos da alínea c) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
  Igualmente não consta que a questão tenha sido submetida a qualquer tribunal de Macau, não havendo sinais de poder ser invocada a litispendência ou caso julgado, pelo que se tem por verificada a condição da alínea d) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
  Não resulta das certidões juntas que a decisão haja sido tomada sem que a Ré haja sido regularmente citada ou em violação do princípio do contraditório e da igualdade das partes, pelo que se tem por verificada a condição da alínea e) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
  A sentença revidenda procede à dissolução do casamento por divórcio, direito que a legislação de Macau igualmente prevê – artº 1628º e seguintes do C.Civ. -, pelo que, a decisão não conduz a um resultado incompatível com a ordem pública, tendo-se também por verificada a condição da alínea f) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
  
  Termos em que se impõe concluir no sentido de estarem verificados os requisitos para a confirmação de decisão proferida por tribunal exterior a Macau.
  
IV. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acorda-se em conceder a revisão e confirmar a decisão do Tribunal Popular do Distrito de Doumen, Cidade de Zhuhai da Província de Guangdong da República Popular da China nos termos acima transcritos.
  
  Custas pelo Requerente sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
  Fixam-se os honorários ao defensor nomeado em MOP3.000,00 por analogia com o nº 6.7. da tabela anexa ao despacho do Chefe do Executivo nº 59/2013.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 20 de Junho de 2024
  
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  (Relator)
  
  Fong Man Chong
  (1º Adjunto)
  
  Ho Wai Neng
  (2º Adjunto)
  
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REV e CONF DE DECISÕES