Processo n.º 458/2024
(Autos de suspensão da eficácia)
Data : 04 de Julho de 2024
Requerente : A
Entidade Requerida : Secretário para a Segurança
* * *
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I - RELATÓRIO
A, Requerente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho do Secretário para a Segurança, datado de 03/06/2024, veio, em 13/06/2024, junto deste TSI pedir a suspensão da eficácia do referido despacho, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 6, tendo alegado o seguinte:
I - 事實部分
A) 概況
1. 聲請人持有中國內地居民身份證號為XXX(文件三)。
2. 聲請人自2011年7月開始於澳門大學就讀理學學士學位(電機及電腦工程)之課程。
3. 並於2014年7月1日獲頒發該學士的畢業證書(文件四)。
4. 期後,聲請人於同年8月在開始澳門大學就讀理學碩士學位(電機及電腦工程)之課程。
5. 並於2019年7月31日獲頒發上述碩士學位之畢業證書(文件五)。
6. 同年8月23日,聲請人亦開始在澳門大學就讀哲學博士學位(電機及電腦工程)之課程。
7. 有關課程完成日期預計為2024年8月31日(文件六)。
8. 直到目前為止,聲請人已經向有關實體提交論文,並正在等待進行論文答辯的通知。
9. 目前,上述論文答辯預計將會在2024年8月31日前完成,並畢業。
10. 在就讀博士學位期間,聲請人獲得內地XX公司的錄用通知書,聲請人被通知其在完成及取得相應的學位課程的畢業證書(即其於應徵時正在修讀的博士學位課程)後,內地XX公司將聘請其到中國深圳擔任研究工程師一職,有關薪金每月為CNY43,500.00(文件七及八)。
11. 也說是說,根據XX公司的要求,聲請人必須完成其於應徵時正在修讀的博士學位課程,方能被錄用(文件八)。
12. 為了讓聲請人滿足入職條件,即完成澳門大學就讀哲學博士學位(電機及電腦工程)課程及取得相關課程的畢業證書,XX人事部負責人多次與聲請人了解其完成課程的情況,並為其入職之期限作出延期(文件九)。
B) 關於學生類「逗留特別許可」延期申請
13. 為著能繼續完成博士課程,聲請人於2024年2月16日向治安警察局及逗留事務廳遞交「逗留特別許可」延期申請。
14. 於2024年3月5日,聲請人收悉澳門治安警察局居留及逗留事務廳發出之通知書(編號為200001/SPDARPEST/2024P),有關行政當局的審批意向為不予批准(文件十),並通知聲請人就上述之意向提交書面聽證。
15. 聲請人於2024年4月20日提交書面聽證。
16. 期後,於2024年5月2日,聲請人收悉由治安警察局局長於2024年4月26日所作出不批准聲請人所提交之學生類「逗留特別許可」延期申請決定的通知書,編號為400416/SPDARPNOT/2024P(文件十一)。
17. 聲請人便於2024年5月2日向保安司司長提起必要訴願。
18. 隨後,於2024年6月11日,聲請人收悉保安司司長駁回必要訴願之決定(文件十二)。
C) 刑事判決
19. 根據上述警察局局長及保安司司長所作出決定的依據(文件二及十),其依據主要為聲請人所涉及的兩個刑事案件。
20. 於2022年9月8日,聲請人以直接正犯及既遂方式觸犯一項第3/2007號法律《道路交通法》第89條配合第94條第二項規定及處罰的「逃避責任罪」(案件編為CR1-22-0190-PCS),並被處以四十五日罰金,而此判決書已於2022年9月28日轉為確定(文件十三)。
21. 於2023年11月22日,聲請人以直接共同正犯既遂及連續犯方式觸犯一項《刑法典》第244條第1款b項所規定及處罰的三項「偽造文件罪」,合共判處1年6個月徒刑,暫緩2年執行(案件編號為CR2-23-0116-PCC)(文件十四)。
22. 而聲請人於2023年12月12日,針對上述有罪判決提出上訴(文件十五),而上述案件仍處於上訴待決階段。
II - 法律部分
23. 根據《行政訴訟法典》第120條b項,保安司司長所作出的決定,有關行為消極行為,但當中亦有部分積極內容,有關行政行為之效力屬可被中止。
24. 本案情況亦同時具備《行政訴訟法典》第121條第1款的所有要件。
a) 執行保安司司長於2024年6月3日所作出的批示之內容,將對聲請人及其在司法上訴中所維護之利益做造成難以彌補的損失
25. 根據上述事實內顯示,聲請人的博士課程預計將於2024年8月31日完成。
26. 而且,聲請人已收取XX公司的錄用通知書,入職條件之一為完成博士學位課程。
27. 執行行政當局的決定,這意味著聲請人必須離開澳門特區境內,並且沒有按時完博士論文答辯及順利畢業,繼而喪失在XX公司擔任研究工程師的工作機會。
28. 聲請人花費了將近五年時間,在澳門大學就讀博士學位課程,而其將於2024年8月31日前畢業,卻基於行政當局的不批准學生類「逗留特別許可」延期申請之決定,而導致聲請人喪失取得博士學位的資格及工作的機會。
29. 對於聲請人來說,倘無法取得哲學博士學位(電機及電腦工程)課程之畢業證書,就等同於其已花費了的五年學習時間將付諸一炬,而這些時間的損失是永遠無法彌補的。
30. 再者,XX技術有限公司是全球領先的ICT(信息與通信)基礎設施和智能終端提供商,其給予聲請人的工作機會、職位及工作條件非常不錯,倘聲請人喪失了這樣的機會,將來要找到同等待遇及/或到背景優悅的公司工作的機會,可以說是微乎其微,可見,喪失了這樣機會的損失亦是難以彌補的。
31. 可見,預料執行有關行為,將導致聲請人造成精神和財產性損失,將對聲請人或其在司法上訴中所維護或將在司法上訴中維護之利益造成難以彌補之損失。
32. 因此,符合《行政訴訟法典》第121條第1款a項。
b) 中止有關批示之效力不會對公共利益造成嚴重侵害
33. 行政當局不批准聲請人學生類「逗留特別許可」延期申請的主要原因是基於聲請人涉及在兩個刑事案件當中。
34. 就CR1-22-0190-PCS一案,該案的判決是於2022年9月8日作出,並於2022年9月28日轉為確定,且聲請人亦已執行其相應的處罰,這滿足了刑罰的一般預防(公共利益被保護的一種方式)。
35. 此外,從該判決的作出,距今已有約一年十個月的時間,聲請人在此段期間從來沒有作出導致損害澳門特區的公共安全和秩序的行為,這滿足了刑罰的特別預防(公共利益被保護的另一種方式)。
36. 另一方面,關於CR2-23-0116-PCC案件,目前仍處於上訴待決階段,根據《基本法》29條及《刑事訴訟法典》第49條第2款,在澳門特區奉行判決轉為確定前推定無罪之原則。
37. 可見,在判決轉為確定前,並不能用該等事實予以認定聲請人逗留在澳門的行為會導致損害澳門特區的公共利益。
38. 再者,根據文件十五(聲請人針對CR2-23-0116-PCC判決提出的上訴)內所陳述的理由可見,聲請人從沒有作出任何觸犯「偽造文件罪」的行為,即聲請人根本沒有對任何公共利益造成損害。
39. 基於上述原因,均可反映出中止有關行政行為的效力,並不會嚴重侵害到澳門特區的任何公共利益。
40. 因此,本案符合《行政訴訟法典》第121條第1款b項的情況。
c) 不存強烈跡象顯示有關司法上訴屬違法之情況
41. 根據文件二編號為400501/SPDARPNOT/2024P的通知書的最後一段可見,聲請人可就保安司司長作出的決定向中級法院提起司法上訴,本案所針對保安司司長的決定具有可訴。
42. 故此,雖然在提交本聲請書之時尚未提起司法上訴,之後針對保安司司長所提起的司法上訴當中,亦不存在任何強烈跡象顯示有關司法上訴屬違法之情況。
43. 因此,本案亦符合《行政訴訟法典》第121條第1款c項的情況。
請求:
裁定本保存程序成立,並下令暫停保安司司長於2024年6月3日所作出批示之效力。
*
Citada a Entidade Requerida, o Senhor Secretário para a Segurança veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 73 a 83, tendo alegado o seguinte:
1. Pretende o Requerente obter ao abrigo do disposto nos artigos 120.° e seguintes do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC) a suspensão da eficácia do acto administrativo que indeferiu o pedido de prorrogação da autorização especial de permanência para fins de estudo na Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), que anteriormente lhe havia sido concedida.
2. O mecanismo de suspensão da eficácia do acto administrativo tem natureza e estrutura do processo cautelar, tendo como requisitos a instrumentalidade, o "fumus bonni júris", o "periculum in mora", e, até certo ponto, a proporcionalidade (Acórdão do TSI, processo 30/00/A).
3. A concessão da referida suspensão da eficácia depende da verificação, cumulativa, do pressuposto do artigo 120.° e os três requisitos gerais do n.º 1 do artigo 121.°, todos do CPAC.
4. Para tal, o Requerente argumenta que o acto em causa, apesar de conteúdo negativo tem uma vertente positiva, que a execução imediata lhe causaria prejuízos de difícil reparação e que a suspensão não causará grave lesões ao interesse público.
Analisando,
5. Dispõem o artigo 120.° do CPAC, que há lugar a suspensão de eficácia quando os actos tenham conteúdo positivo, ou quando tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a essa vertente.
6. "In casu", o acto de indeferimento do pedido de prorrogação da autorização especial de permanência detém tais atributos, apesar de conteúdo negativo, apresenta uma vertente positiva, pois, a decisão de não renovação, vem necessariamente alterar a situação actual e pré-existente.
No entanto,
7. A eficácia do acto só é susceptível de ser suspensa em sede de procedimento cautelar, se verificados, cumulativamente, também, os requisitos gerais do n.º 1 do artigo 121.° do CPAC.
8. De acordo o n.º 1 do artigo 121.°, a suspensão de eficácia dos actos administrativos pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, e é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
"a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso".
Neste enquadramento,
9. Em conformidade com o disposto no artigo 121.° ora citado, para obter a suspensão da eficácia de um acto administrativo o Requerente deve satisfazer cumulativamente tais requisitos, um positivo e dois negativos.
10. O requisito positivo traduz-se na existência de prejuízo de difícil reparação que a execução do acto possa causar, já os dois requisitos negativos referem-se, respectivamente, à inexistência de grave lesão do interesse público e à não verificação de fortes indícios de ilegalidade do recurso.
11. Bastará a falta de algum daqueles três requisitos, para que a providência requerida seja indeferida.
Quanto ao alegado prejuízo de difícil reparação,
12. Atendendo à petição de suspensão de eficácia que aqui se dá por reproduzida, é indicado como prejuízo de difícil reparação, a impossibilidade de conclusão do programa de doutoramento que o Requerente se encontra a frequentar.
13. Ainda segundo o Requerente, o acto administrativo tem como consequência necessária e directa, para além da impossibilidade de conclusão do doutoramento, um vasto conjunto de prejuízos a ele associados, passados e sobretudo futuros, que condicionaram, de sobremaneira, a sua vida profissional e pessoal.
14. Em termos factuais, o Requerente iniciou o programa de doutoramento em 23 de Agosto de 2019.
15. Até à data já percorreu todo o programa doutoral e entregou a tese, estando a conclusão do mesmo dependente da defesa pública da referida tese.
16. Mais refere, que a defesa pública da tese será em data a marcar pelo estabelecimento de ensino responsável e deverá ocorrer até 31 de Agosto de 2024.
E assim,
17. Apesar do alegado, e atendendo à matéria factual apresentada, cujo ónus recai sobre o Requerente, não se pode concordar, nem tal se demonstra provado, que exista prejuízo de difícil reparação, se não vejamos,
18. Para o preenchimento do requisito, da alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º não basta indicar um prejuízo, este tem de ser de difícil reparação.
19. O qual, segundo a jurisprudência da RAEM, "Existe prejuízo de difícil reparação naquelas situações em que a avaliação dos danos e a sua reparação, não sendo de todo em todo impossíveis, podem tornar-se muito difíceis".
20. O prejuízo alegado materializa-se na impossibilidade de defendera tese de doutoramento, a qual, segundo o conhecimento geral e público, se concluirá em não mais que um par de horas, em data a marcar pelo respectivo estabelecimento de ensino.
21. Ou seja, não está em causa a frequência do programa de doutoramento, mas tão somente a conclusão do mesmo, a qual se esgotará num evento único, numa determinada data, que será agendada para o efeito.
22. Sendo a data, em concreto, nesta fase uma incógnita, o Requerente tem uma espectativa pessoal, sem qualquer certeza, pode ser tanto em breve quanto possível ou porventura até não ocorrer no período peticionado, tanto mais que a marcação não depende da sua vontade.
23. Além do mais se poderá alvitrar, se a data ainda não está determinada, certamente a mesma poderá ser convencionada entre as partes e até porventura ser passível de alteração, não tem de ser neste período, podendo ser aproximada ou afastada no tempo.
24. Esta incerteza e até indefinição do que eventualmente possa ou não vir a ocorrer, "de per si", não permite estabelecer nexo de causalidade entre o acto e o prejuízo alegadamente sofrido, é de todo impossível ao julgador extrair um juízo de prognose acerca dos danos prováveis.
25. Naturalmente, não se afasta a hipótese do acto administrativo poder trazer inconvenientes e até prejuízos para o Requerente, mas a suspensão da eficácia do acto, enquanto procedimento cautelar, deve quedar-se pela existência de prejuízo de difícil reparação, o qual, o Requerente não logra provar e que até nem se verifica.
26. Na verdade, não é certo de todo que a suspensão da eficácia do acto proporcione ao Requerente a possibilidade de conclusão do doutoramento, que este necessite do prazo total até 31 de Agosto, ou mesmo, que este não tenha de solicitar mais prazo.
No mesmo sentido, e não menos importante,
27. Convirá relembra, que a decisão administrativa indeferiu o pedido de prorrogação da autorização especial de permanência, não se trata de uma ordem de expulsão.
28. A eventual expulsão não decorre directamente da execução do- despacho que indeferiu o pedido de prorrogação, mas sim de uma outra decisão que venha a ser tomada pela entidade competente no âmbito de um outro procedimento administrativo.
29. E assim, a prestação das referidas provas académicas não está absolutamente dependente da suspensão da eficácia do acto, por ventura, o Requerente utilizando outro instrumento legal que lhe permita entrar na RAEM poderá alcançar tal desiderato.
Ou,
30. No limite, afinal se o Tribunal vier a dar razão ao Requerente, que estamos em querer que tal não acontecerá, não será de deixar de se equacionar da possibilidade, que certamente existirá, de remarcar junto do estabelecimento de ensino a defesa pública da tese de doutoramento.
31. Evidentemente, fica claro que a conclusão do programa de doutoramento não está intrinsecamente depende do acto administrativo em cogitação, nem, uma eventual concessão da suspensão da eficácia do mesmo garante a realização da defesa da tese, e bem assim a conclusão do referido doutoramento.
32. Assim, há-de reconhecer-se que o Requerente manifestamente não logra demonstrar que a execução do acto em apreço lhe causa previsivelmente prejuízo de difícil reparação, ou seja, não se encontra preenchido o requisito da alínea a) do artigo 121.° do CPAC, que é de verificação obrigatória.
Quanto à grave lesão para o interesse público,
33. Como anteriormente já teve a oportunidade de se referir, a suspensão da eficácia de um acto administrativo, depende, da verificação cumulativa dos requisitos previstos no artigo 121.°, designadamente da inexistência de grave lesão do interesse público.
34. Trata-se de um requisito negativo, cuja valoração em concreto, deverá considerar a gravidade da lesão do interesse público com o diferimento da execução do acto suspendendo.
35. O Requerente, durante a permanência na RAEM, foi condenado pela prática de diversos crimes, em dois processos distintos, pese embora, um dos quais ainda não tenha transitado em julgado.
36. Tal conduta, desconforme com a lei penal, é bem demonstrativa do perigo para a segurança e ordens públicas da RAEM que o Requerente representa.
37. Ora, é esse precisamente o interesse público concretamente prosseguido pelo acto administrativo, o qual está na base da decisão administrativa que indeferiu o pedido de prorrogação da autorização especial de permanência.
38. A permanência do Requerente na RAEM possibilita que este continue a exercer as actividades e ou funções, nas quais praticou factos que levaram às condenações criminais, o que se traduz num perigo potencial para a segurança e ordens públicas da RAEM.
39. E assim, só poderá concluir-se que a permanência do Requerente na RAEM, determina grave lesão do interesse público, nos termos e para os efeitos do artigo 121.°, n.º 1, al. b) do CPAC.
Assim, e em
CONCLUSÃO,
40. O Requerente, manifestamente, não logra demonstrar que da execução do acto em apreço resulta, previsivelmente, prejuízo de difícil reparação.
41. A suspensão da eficácia do acto administrativo determina grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto.
42. Por total falência dos requisitos previstos, nas alíneas a) e b) artigo 121.º do CPAC, existe obstáculo à procedência da pretensão cautelar do Requerente, contrariamente ao alegado no requerimento.
*
O Digno. Magistrado do MP oferece o seu douto parecer de fls.87 a 89, pugnando pelo indeferimento do pedido.
* * *
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III - FACTOS
São os seguintes factos considerados assentes com interesse para a decisão do pedido, conforme os elementos juntos no processo:
Despacho
Assunto: Recurso hierárquico
Recorrente: A
Considerando o teor do Despacho do Senhor Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública de 26/04/2024 e da petição de recurso hierárquico, que aqui se dão por reproduzidos, verifico estar provada toda a matéria de facto a qual se dá desde já como assente.
No caso vertente, o Recorrente foi, e em processos diferentes, condenando por crimes cometidos na RAEM, o que, e apesar de um deles ainda não ter transitado em julgado, infere um juízo de perigosidade que objectivamente recai sobre si, derrubando a confiança que havia sido depositada que observaria as leis da RAEM, com a qual previamente se havia comprometido.
Os interesses individuais não devem prevalecer sobre os interesses públicos, pelo que nos termos da alínea 2) do n.º 2 do artigo 23.º da Lei n.º 16/2021, podem ser recusados os pedidos de autorização de permanência na RAEM, de quaisquer pessoas, não residentes, por constituírem perigo para a segurança ou ordem públicas, designadamente, por estas terem praticado actos tipificados como crimes.
Dúvidas não subsistem que a prática de crimes ou a sua preparação na RAEM constituem-se como formas possíveis da demonstração da existência de perigo abstracto para a segurança ou ordem públicas, nem tão pouco sobre a prática, pelo Recorrente, destes factos típicos durante a sua permanência na RAEM.
Assim, tudo ponderado, concluo que a decisão proferida é legal, não obstante, mostra-se inadequadamente fundamentada, pelo que, ao abrigo do art.º 161, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, modifico-a como segue:
Ratifico o acto de indeferimento do pedido de prorrogação da Autorização Especial de Permanência na RAEM, proferido pelo Comandante do Corpo de Pólicia de Segurança Pública em 26/04/2024, alterando a fundamentação legal nele referida, ou seja, o requerente constitui perigo para a segurança ou ordem públicas, pelo que nos termos e para os efeitos da alínea 2) do n.º 2 do artigo 23.º da Lei n.º 16/2021, indefere-se o pedido.
Gabinete do Secretário para a Segurança da Região Administrativa Especial de Macau,
aos 03 de Junho de 2024.
O Secretário para a Segurança
XXX
* * *
IV – FUNDAMENTOS
A propósito das questões suscitadas pelo Requerente, o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI teceu as seguintes doutas considerações:
“(...)
1.
A, melhor identificado nos autos, veio instaurar o presente procedimento cautelar de suspensão de eficácia do acto praticado pelo Secretário para a Segurança que indeferiu o recurso hierárquico do acto que indeferiu o pedido de prorrogação da autorização especial de residência para fins de estudo na Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China (RAEM) do Requerente.
A Entidade Requerida, devidamente citada, ofereceu contestação em pugnou pelo indeferimento do pedido.
2.
(i)
Decorre do disposto nos artigos 120.º e 121.º, n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), que a suspensão de eficácia dos actos administrativos que tenham conteúdo positivo ou que, tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva é concedida quando se verifiquem os seguintes requisitos:
• a execução do acto causar previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso contencioso;
• a suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente produzido pelo acto;
• do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
Estes requisitos do decretamento da providência cautelar da suspensão de eficácia são de verificação cumulativa bastando a não verificação de um deles para que tal decretamento resulte inviável, sem prejuízo, no entanto, do disposto nos n.ºs 2, 3 e 4 do citado artigo 121.º do CPAC (assim, entre outros, o Ac. do Tribunal de Última Instância de 4.10.2019, processo n.º 90/2019).
(ii)
No caso sujeito, verifica-se que a Requerente pretende a suspensão de eficácia de um acto negativo, por isso que se trata de um acto de indeferimento de uma pretensão que a mesma formulou perante a Administração de prorrogação de autorização de especial de residência para fins de estudo na RAEM.
No entanto, apesar de se tratar de um negativo, o acto suspendendo tem uma vertente positiva, na exacta medida em que afecta a sua situação jurídica preexistente. É esse o sentido que tem sido uniformemente seguido pelos nossos Tribunais.
Legalmente admissível, portanto, face ao disposto na alínea b) do artigo 120.º do CPAC a peticionada suspensão de eficácia.
Por outro lado, do processo não resultam fortes indícios de ilegalidade do recurso contencioso, sendo que, como se sabe, esta verificação ser reporta, no essencial, aos pressupostos processuais do recurso contencioso (v. g. a tempestividade do recurso ou a recorribilidade do acto) e não a qualquer juízo, ainda que perfunctório, sobre o respectivo mérito. Por isso, mostra-se verificado o requisito previsto na alínea c) do n.º 1 do artigo 121.º do citado diploma legal.
Também nos parece, não obstante a alegação em contrário da Entidade Requerida e ressalvado o devido respeito, que a suspensão de eficácia do acto, a ser decretada, não será susceptível de causar grave lesão do interesse público, pelo que se deve ter por verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC. De resto, a Administração não lançou mão, como podia ter feito, da faculdade que a lei lhe confere no n.º 2 do artigo 126.º do CPAC.
Resta, pois, a questão que é, aliás, a única que, em bom rigor, é controvertida nos presentes autos: a de saber se a execução do acto suspendendo causará à Requerente, previsivelmente, prejuízo de difícil reparação.
Vejamos.
Está em causa, como já dissemos, o pedido de suspensão de eficácia do acto da Entidade Requerida que indeferiu o pedido de prorrogação da autorização de residência do Requerente em Macau, alegando esta que a execução desse acto de indeferimento, pelas implicações que acarreta, nomeadamente a de ter de abandonar a Região, lhe causará, segundo diz, prejuízo de difícil reparação, uma vez que o impedirá de concluir o seu doutoramento na Universidade de Macau e, de, em consequência, poder vir a obter um emprego que lhe está «prometido» numa grande empresa multinacional do sector tecnológico com sede em Shenzhen.
Não nos parece que seja de acolher esta alegação do Requerente tendo em vista a pretendida suspensão de eficácia. Pelo seguinte.
De acordo com a própria alegação do Recorrente, o seu doutoramento está na fase final, faltando apenas a discussão pública da respectiva dissertação. Ora, para esse efeito, não se mostra necessário que o Requerente mantenha a autorização de residência em Macau. Bastará que, no dia que venha a ser designado pela instituição universitária para aquela prestação de provas, ele obtenha autorização para aqui se deslocar para desse modo atingir a finalidade em causa. Podemos convir que a situação seria diferente se a execução do acto impedisse o Requerente de terminar, por uma questão de dois ou três meses, a própria dissertação de doutoramento, colocando assim em causa todo um esforço de anos, obstaculizando à própria obtenção do referido grau académico. Não é isso, no entanto, o que está em causa.
Não está demonstrado, minimamente que seja, um nexo de causalidade entre a «execução» do acto e qualquer prejuízo de difícil reparação, nomeadamente, aquele que foi alegado pelo Requerente, por isso que, mesmo que o acto seja «executado» e o Requerente venha a ter de abandonar a Região daí não resultará, à luz de uma regra de causalidade adequada, e pela razão acima referida, a impossibilidade de concluir o seu doutoramento.
Daí que propendamos a considerar que não se mostra preenchido o requisito a que alude a alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC.
3.
Pelo exposto, salvo melhor opinião, parece ao Ministério Público que deve ser indeferido o pedido de suspensão de eficácia.”
*
Quid Juris?
Relativamente às considerações acima transcritas, com elas basicamente concordamos, à excepção da parte respeitante ao preenchimento ou não do requisito exigido pelo artigo 121º/1-a) do CPAC.
Ou seja, a execução imediata acarreta da decisão em causa ou não prejuízo de difícil reparação para o Requerente? A este propósito, este alegou, entre outros, os seguintes argumentos:
“(…)
25. 根據上述事實內顯示,聲請人的博士課程預計將於2024年8月31日完成。
26. 而且,聲請人已收取XX公司的錄用通知書,入職條件之一為完成博士學位課程。
27. 執行行政當局的決定,這意味著聲請人必須離開澳門特區境內,並且沒有按時完博士論文答辯及順利畢業,繼而喪失在XX公司擔任研究工程師的工作機會。
28. 聲請人花費了將近五年時間,在澳門大學就讀博士學位課程,而其將於2024年8月31日前畢業,卻基於行政當局的不批准學生類「逗留特別許可」延期申請之決定,而導致聲請人喪失取得博士學位的資格及工作的機會。
29. 對於聲請人來說,倘無法取得哲學博士學位(電機及電腦工程)課程之畢業證書,就等同於其已花費了的五年學習時間將付諸一炬,而這些時間的損失是永遠無法彌補的。
30. 再者,XX技術有限公司是全球領先的ICT(信息與通信)基礎設施和智能終端提供商,其給予聲請人的工作機會、職位及工作條件非常不錯,倘聲請人喪失了這樣的機會,將來要找到同等待遇及/或到背景優悅的公司工作的機會,可以說是微乎其微,可見,喪失了這樣機會的損失亦是難以彌補的。
31. 可見,預料執行有關行為,將導致聲請人造成精神和財產性損失,將對聲請人或其在司法上訴中所維護或將在司法上訴中維護之利益造成難以彌補之損失。
32. 因此,符合《行政訴訟法典》第121條第1款a項。
b) 中止有關批示之效力不會對公共利益造成嚴重侵害
33. 行政當局不批准聲請人學生類「逗留特別許可」延期申請的主要原因是基於聲請人涉及在兩個刑事案件當中。
(…)”.
Importa destacar os seguintes aspectos:
1) – Efectivamente o Requerente já está em fase final do estudo do grau de Doutoramento, falta apenas a marcação da discussão da respectiva dissertação (que será em finais de Agosto deste ano), conforme o que foi alegado;
2) – Para um estudante, a quebra imediata da vida académica nestas circunstâncias representa certamente um “choque” psicológico, e daí um conjunto de situações imprevisíveis e incertas que possam surgir, ex. a partir deste momento ele deixará de ter a “autorização especial” concedida para estudos para ele, ou seja, passará a ser um “estudante indocumentado”, o que é efectivamente um ataque psicológico para ele enquanto estudante.
3) – A experiência de vida diz-nos que a referida situação afecta certamente o seu estudo e a sua preparação da tese (ex. revisões de texto, comunicação presencial com o orientador, procura de bibliografia na biblioteca da UM …etc), tudo isto representa um prejuízo para ele, pois esta situação não é economicamente avaliável!
4) – No caso de ele não conseguir apresentar a tese à luz do calendário escolar pré-pleaneado, provavelmente ele terá de pedir prolongação do prazo para esta finalidade e pagará eventualmente mais propinas. Tudo isto constitui prejuízo de difícil reparação.
5) – Pelo expendido, é da nossa conclusão que o Requerente preenche os requisitos exigidos pelo artigo 121º/1 do CPAC, motivo pelo qual é de deferido o pedido, determinando a suspensão do despacho que indeferiu o pedido da renovação da autorização especial para estudo concedida ao Requerente.
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V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em deferir o pedido da suspensão da eficácia do despacho que indeferiu o pedido da renovação da autorização especial para estudo concedida ao Requerente.
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Sem custas por isenção subjectiva.
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Notifique.
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RAEM, 04 de Julho de 2024.
Fong Man Chong
(Relator)
Ho Wai Neng
(1º Adjunto)
Tong Hio Fong
(2º Adjunto)
Mai Man Ieng
(Procurador-Adjunto)
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2024-458-estudante-doutorando-UM