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Processo n.º 352/2024
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Relator: Fong Man Chong
Data : 04 de Julho de 2024

Assuntos:
- Indemnização resultante de introduzir alterações na obra sem consulta prévia do seu autor

SUMÁRIO:
Para efeitos da indemnização prevista no nº 2 do artigo 144.º (2. O dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem é livre de, quer durante a construção ou execução, quer após a sua conclusão, introduzir nela as alterações que desejar, mas deve consultar previamente o autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos.) do DL n.º 43/99/M, de 16 de Agosto, entre outros elementos, é preciso apurar o nexo de imputação entre a omissão indevida da consulta prévia e os danos daí decorrentes. Por outras palavas, o artigo 144.º n.º 2, do citado DL (direito de indemnização do autor do projecto pela falta da consulta prévia) não prescinde do apuramento da verificação da lesão do direito moral e dos danos efectivos provocados.
              O Relator,
     
_______________
              Fong Man Chong
Processo n.º 352/2024
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Data : 04 de Julho de 2024

Recorrente : Recurso Final / Recurso Interlocutório
- A

Recorridos : - Região Administrativa Especial de Macau (澳門特別行政區)
- Universidade de B de Macau (澳門B大學) (anteriormente designada Instituto de Formação B de Macau (澳門B學院))

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    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I – RELATÓRIO
A – Recurso interlocutório:
A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datado de 10/05/2021 (fls.875v a 877), veio, em 27/05/2021, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 942 a 963, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. O objecto do presente recurso cinge-se ao teor da decisão constante de fls. 875v. a 877, relativo ao conhecimento parcial do pedido formulado pelo Recorrente, nos termos da qual o Tribunal a quo absolveu os Recorridos quanto ao pedido de indemnização a título de dano de perda de chance, nos termos oportunamente formulados na Petição Inicial.
2. A causa de pedir da presente acção radica nas modificações à Biblioteca Internacional da Universidade de C que o Recorrente veio a conhecer em visita ao local (por todo o edifício, incluindo obviamente o seu interior, em visita guiada a convite e com responsáveis do B), no dia 15 de Dezembro de 2015, assim como nas modificações posteriores a essa mesma data, as quais chegaram ao conhecimento do Recorrente por via da consulta ao processo n.º 19/MF/2018/L, em 31 de Julho de 2018, processo esse que corre seus termos junto da DSSOPT.
3. Apesar de ser o autor da obra ora em apreço, o Recorrente foi totalmente alheio às alterações e modificações na sua obra de arquitectura, nunca lhe tendo sido comunicado o ensejo de as entidades responsáveis pretenderem proceder a alterações ou modificações na sua obra, nem tão-pouco sido consultado previamente, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 144.º do Regime do Direito de Autor e Direitos Conexos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 43/99/M e republicado pela Lei n.º 5/2012 (doravante, o "RDADC").
4. Com a omissão do dever de consulta prévia por parte dos Recorridos ao autor da obra, foi retirada ao Recorrente a chance, a real e efectiva hipótese, de obter os proventos desse mesmo trabalho, uma vez que a legalização das modificações efectuadas à obra em apreço foi desenvolvida por terceiros, tendo o Recorrente sido deixado totalmente à margem do procedimento.
5. Em Macau, as obras arquitectónicas gozam de tutela jurídica expressa na alínea g), do n.º 1 do artigo 2.º do RDADC, sendo tal tutela independente do seu mérito (artigo 1.º n.º 1 do mesmo diploma legal).
6. Enquanto criador intelectual da obra "Biblioteca Internacional da Universidade de C", o Recorrente é o titular originário dos direitos de autor sobre a mesma, sendo titular de um direito pessoal e de um direito patrimonial sobre a obra protegida (artigos 9.º, n.º 1 e 7.º, parágrafo 1, ambos do RDADC).
7. Nos termos do artigo 46.º do RDADC, uma das vertentes da tutela do direito de autor é o direito à integridade da obra, estatuindo-se no n.º 2 do artigo 144.º do RDADC a única excepção a tal direito, no que às obras de arquitectura concerne, nos seguintes termos: “O dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem é livre de, quer durante a construção ou execução, quer após a sua conclusão, introduzir nela as alterações que desejar, mas deve consultar previamente o autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos" (sublinhado e negrito nossos).
8. A omissão do direito de consulta plasmado no n.º 2 do artigo 144.º do RDADC é uma omissão ilícita e que acarreta para o Dono da Obra um dever de indemnizar o autor da obra de arquitectura.
9. Com os actos ilícitos praticados pelos Recorridos, viu-se o Recorrente impossibilitado de desenvolver e apresentar a sua proposta de compatibilização e harmonização das modificações perpetradas à obra de arquitectura "Biblioteca Internacional da Universidade de C", tendo sido retirada a chance ao Recorrente, a real e efectiva hipótese de obter os proventos desse mesmo trabalho, uma vez que essa intervenção foi desenvolvida por terceiros, sem nunca o Recorrente ter sido consultado para o efeito, conforme exigência legal.
10. A vantagem cuja possibilidade de alcance se gozava inicialmente, e que desapareceu pela actuação dos Recorridos, reveste o cariz de vantagem económica.
11. O dano de perda de chance terá de ser integrado e indemnizado em termos probabilísticos, ou seja, em percentagem, face ao dano final, pelo que a sua reparação deverá ser medida com relação à chance perdida, tendo sempre como pedra de toque o grau de probabilidade de obtenção da vantagem, algo que no presente caso se cifra em, pelo menos, 50%.
12. Ou seja, o dano da perda de chance que o Recorrente sofreu será equivalente a 50% do valor do projecto de arquitectura apresentado para a Obra de Construção que incide sobre o edifício da "Biblioteca Internacional da Universidade de C", correndo seus termos junto da D.S.S.O.P.T. sob o n.º 19/MF/2018/L.
13. Caso o Tribunal assim não o considere, por conceber um diferente grau de probabilidade, algo que apenas se concebe por mero dever de patrocínio, ainda assim deverá o douto Tribunal fixar um diferente quantum indemnizatório, através do recurso à equidade, conforme previsão constante do n.º 6 do artigo 560.º do Código Civil.
14. Todos os requisitos próprios da responsabilidade civil extra-contratual se encontram verificados no caso sub judice.
Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado. Consequentemente, deve a decisão constante de fls. 875v. a 877 ser revogada, substituindo-se por outra que condene os Recorridos nos termos oportunamente propostos, a título do pedido de indemnização por dano de perda de chance, determinando-se em consequência os ulteriores termos do processo até final.
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A Recorrida, Universidade de B de Macau (澳門B大學) (anteriormente designada Instituto de Formação B de Macau (澳門B學院)), veio, 11/08/2021, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 1056 a 1066, tendo formulado as seguintes conclusões:
      1. Após a entrega da antiga Biblioteca Internacional da Universidade de C ao B em 7 de Outubro de 2015, o Recorrente foi devidamente informado pelo 2.° Recorrido sobre os novos planos de utilização do espaço e teve deles integral conhecimento, tendo sido convidado pelo 2.º Recorrido a visitar as instalações em Janeiro de 2016;
      2. Em 12 de Maio de 2016 foi adjudicado directamente ao Recorrente o "Consultancy Service for B New Taipa Campus (Library Building) Renovation Project" para elaborar um parecer técnico sobre a viabilidade de serem adicionadas mais divisões interiores para servirem como salas de aulas, salas de professores, gabinetes de apoio técnico, para instruir um pedido de obras de modificação à DSSOPT;
      3. Em 23 de Maio de 2016, o Recorrente apresentou ao B o parecer técnico favorável à viabilidade de serem realizadas obras de modificação na antiga Biblioteca que permitissem a ampliação do número de divisões interiores destinadas a salas de aulas, gabinetes de professores e de apoio técnico;
      4. O Recorrente não só foi consultado sobre os planos do B para a utilização, modificação e optimização do antigo edifício da Biblioteca da Universidade de C, desde o início de 2016, como deu parecer favorável às obras de modificação no pedido formulado pelo 2.° Recorrido à DSSOPT;
      5. Em 5 de Dezembro de 2016, o B adjudicou ao Recorrente o "Service for design and application of floor plan of the replacement of chiller (air conditioning)" para efectuar o projecto de substituição do sistema de refrigeração do edifício e da sua configuração;
      6. O B convidou o Recorrente e mais três entidades para apresentarem propostas para o "Service for updating floor plans of construction and fire control", projecto que foi adjudicado à sociedade A Design Arquitectura Limitada, em 29 de Dezembro de 2016, por ter sido esta que apresentou a proposta que obteve melhor avaliação;
      7. O Recorrente tomou prévio conhecimento e foi consultado nos três projectos de obras de modificação do edifício da responsabilidade do B, como tal, não é verdade que o Recorrente tenha sido impedido de apresentar a sua proposta para o referido projecto, nem que tenha ocorrido omissão ilícita do dever de consulta prévia por parte dos Recorridos ao Recorrente, tendo-lhe sido retirada a chance, a real e efectiva hipótese de obter os proventos desse mesmo trabalho;
      8. Precisamente para demonstrar que existe uma subordinação da integridade da obra à funcionalidade que o dono da obra pretende obter, determina o n.º 2 do artigo 144.º do DL n.º 43/99/M, que o dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem é livre de, quer durante a construção ou execução, quer após a sua conclusão, introduzir nela as alterações que desejar mas deve consultar previamente o autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos;
      9. Como se explica no Despacho recorrido, a consulta prévia ali referida não tem por finalidade obter qualquer autorização do autor para as alterações visadas, pois mesmo que o autor não consinta a concretização das alterações introduzidas, por entender desvirtuarem a sua obra, nada pode fazer senão repudiar a paternidade desta, não aceitando que a autoria continue a ser-lhe imputada, como dispõe do n.º 2 do referido artigo 144.°;
      10. Ainda assim, a falta de consulta prévia ao autor do projecto, uma vez provada, cobre danos não patrimoniais mas não os lucros cessantes do arquitecto em consequência de não ter sido encarregado do projecto, pois a lei não confere ao arquitecto um exclusivo no projecto de modificações;
      11. Consequentemente, depois de consultado o autor do projecto original, o dono da obra pode decidir prosseguir a obra com outro arquitecto;
      12. Doutro passa, o n.º 1 do artigo 9.º do Código dos Direitos de Autor, em vigor à data da do contrato da empreitada de "Concepção-construção da Biblioteca Internacional da Universidade de C", celebrado em 1997, entre a Fundação Macau e a Companhia de Construção e Obras de Engenharia D, Limitada, determina que se resultar dos termos ou circunstâncias do acordo que o direito de autor fica a pertencer à entidade que custear a obra, o seu criador nada poderá exigir além da remuneração que tiver sido ajustada;
      13. A este propósito, esclarece o n.º 2 do artigo 9.° do mencionado CDA que a ausência do nome do autor da obra no local destinado para o efeito estabelece a presunção de que o direito de autor pertence à entidade que custear a obra, sendo certo que no edifício em causa nunca figuraram os nomes da Companhia de Construção e Obras de Engenharia D, Limitada ou do Recorrente;
      14. Não deve proceder o raciocínio adoptado pelo Recorrente para reclamar uma indemnização a título de dano de perda de chance equivalente a 50% do valor do projecto de arquitectura apresentado para a Obra de Construção que incide sobre o edifício da antiga Biblioteca, pretensão que é totalmente irrazoável para além de se tratar de um quantitativo indeterminado que o Tribunal a quo já censurou;
      15. Não compete ao Tribunal realizar os cálculos probabilísticos propostos pelo Recorrente para quantificar um valor que competia apenas ao Recorrente determinar e justificar; e
      16. Certo é que a lei não confere ao Recorrente nenhum direito exclusivo no projecto de modificações da obra, sendo que o dono da obrar após a consulta ao autor do projecto original, é livre de realizar a obra com outro arquitecto.
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Região Administrativa Especial de Macau (澳門特別行政區), representada pelo MP, ofereceu a resposta constante de fls. 1069 a 1074, tendo formulado as seguintes conclusões:
      A. 根據第43/99/M號法令核准之《著作權及有關權利之制度》第144條規定,對於建築作品或結合在建築作品內的造型作品,作者的著作權的法律保護並不妨礙建築物所有人針對建築物在興建過程中或興建後作出修改的權利。
      B. 上述條文第2款清楚規定“均可自由在有關作品中引入擬作出之修改”,儘管該條款規定在作出有關修改之前應預先諮詢設計圖作者之意見,然而,立法者並沒有單純因欠缺預先諮詢而直接賦予作者損害賠償的權利。
      C. 根據同條第3款規定,倘若作者與定作人之間於之前或作出預先諮詢之時並沒有達成任何協議,那麼設計圖作者僅有權拒絕承認其為經更改作品的作者,而該作品之所有人亦不得為本身之利益而引用原設計圖作者的姓名。該權利正正是相應於上述法令第7條規定作者著作人身權的保護—尤其是在作品表明作者身份、確保作品的真實性及完整性、以及就歪曲作品而影響作者名譽或聲譽提出反對方面。
      D. 雖然法律允許建築物的所有人有權自由作出有關修改,這不必然完全碾壓作者著作權最基本的保護內容,一旦作出修改,設計圖作者有權不確認修改後的建築物為其作品以及不得於該修改後的建築物再使用作者身份。
      E. 正正是該權利的法律保障被侵犯後,才存在不法性的要件而要求損害賠償。
      F. 單純欠缺預先諮詢並不構成侵犯主觀權利的不法性,這是因為預先諮詢並不屬於著作權本身的內容,只不過是定作人在作出修改前應進行的程序或手續,以便讓作者得以考慮一旦修改後的建築物是否仍確認為其作品以及是否允許定作人日後針對該修改後的建築物再使用作者身份。
      G. 本案中,上訴人於起訴狀中所主張的事實並非是第一或第二被上訴人對前C大學圖書館作出更改工程後,仍使用上訴人作為作者身份、又或者反對上訴人不確認經更改後的建築物,而只是沒有獲預先諮詢而失去所謂的獲判給更改工程的利潤。
      H. 明顯地,這並不存在所謂“不法性”的要件—即侵犯上訴人的著作人身權。
      I. 上述法令第144條絲毫沒有規定建築物的設計圖作者有權承接或取得修改工程,預先諮詢根本並不是為著讓作者取得或便於取得修改工程的機會。
      J. 在適用同一法令第7條第2款以及第26條的一般規定下,建築物設計圖作者的著作財產權僅限於許可第三人使用作品而有權收取報酬,並不包括亦不延伸至日後倘有修改的情況下必然取得修改設計的職業費用(horonários)或工程費用。
      K. 一旦在許可第三人使用有關作品而收取報酬後,其著作財產權的內容便已消耗,不可能再主張存在財產權利或其延伸。
      L. 毫無疑問,不論在條文的字面含義上還是整體的法律解釋上,均不存在預先諮詢是為著讓作者取得或便於取得修改工程的機會,或者使作者的著作財產權得以行使。
      M. 作為非合同民事損害賠償責任,必須符合第28/91/M號法令第2條及《民法典》第557條規定的行為與損害結果之間存在適當因果關係的要件。
      N. 在損害賠償之債中,澳門《民法典》所採取的是適當因果關係理論,即事實必須適宜造成損害,損害是該事實的適當效果。
      O. 不論根據上述法令第144條規定,還是上訴人於起訴狀中所主張的事實,並不存在第二被上訴人負有向上訴人判給有關建築物的修改工程的法定義務或合同義務。
      P. 上述法令第144條第2款規定的預先諮詢並非為著讓作者取得或便於取得修改工程的機會,而僅僅是給予作者考慮是否行使同條第3款的著作人身權利的保障。換言之,該預先諮詢與日後原設計圖作者是否會被判給或者有機會被判給修改工程並不存在任何適當因果關係或必然聯繫。
      Q. 欠缺按照上述法令第144條第2款規定向原設計圖的作者作出預先諮詢,與上訴人主張失去了獲判給修改工程的機會、甚至乎指稱喪失了本案更改工程的工程費的百分之五十的利潤,並不存在《民法典》第557條規定的適當因果關係。
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    B – Recurso da decisão final:
A, devidamente identificado nos autos, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, datada de 15/12/2023, veio, em 15/01/2024, recorrer jurisdicionalmente para este TSI com os fundamentos constantes de 1281 a 1296, tendo formulado as seguintes conclusões:
      1. O objecto do presente recurso respeita ao teor da sentença proferida pelo Tribunal a quo constante de fls. 1264 e seguintes dos autos (doravante, a "Sentença"), nos termos da qual aquele Tribunal decidiu absolver os ora Recorridos do pedido formulado pelo Recorrente, com base nos danos não patrimoniais por este sofridos, em resultado da omissão ilícita da consulta prévia devida ao Recorrente, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 144.º do Regime do Direito de Autor e Direitos Conexos (doravante, "RDADC").
      2. Salvo o devido respeito pelo Tribunal a quo, o Recorrente entende que a Sentença ora colocada em crise padece do vício de insuficiência e deficiência da matéria de facto integrada quer nos factos assentes, quer na base instrutória, algo que impediu o Tribunal a quo de dispor da base factual necessária e suficiente que lhe permitisse haver chegada a uma decisão justa e adequada relativamente ao caso sub judice, nos termos oportunamente apontados pelo Recorrente em sede de Reclamação contra a Selecção da Matéria de Facto, constante de fls. 895 e seguintes.
      3. A factualidade vertida no Facto Assente D) contém em si mesmo uma conclusão de facto errada, conclusão essa que foi devidamente ressaltada pelo Recorrente, uma vez que a obra de arquitectura ora em apreço não é caracterizada, em termos técnico-arquitectónicos, pela concepção de uma combinação de "três livros e um disco".
      4. A caracterização da obra de arquitectura deverá emergir da concepção da mesma - entenda-se, a caracterização da obra nos termos feitos pelo seu criador intelectual -, pelo que qualquer consideração a esse respeito deveria ter-se cingido ao teor do discurso plástico produzido pelo Recorrente em sede da Memória Descritiva da referida obra, constante de fls. 589 e 590 dos autos.
      5. A reapreciação deste facto em sede do presente Recurso é essencial porquanto a Sentença ora em crise formou o nexo de que as alterações perpetradas à obra de arquitectura não afectaram os elementos (supostamente) característicos da "concepção de 'três livros e um disco' (conforme apurado na alínea d) dos factos assentes, e resposta ao quesito 10.º da base instrutória)", logo "não ocorreu a mutilação nem a deformação da obra da sua autoria (do ora Recorrente), nem qualquer outro acto que a desvirtue e possa afectar a honra ou reputação do autor, susceptível de lesar o direito à integridade da obra", daí concluindo que "inexistiam, neste caso, danos ressarcíveis como decorrentes de lesão do direito moral do Autor (em especial, o direito à integridade da obra), por modo a conferir-lhe o direito à indemnização (páginas 12 e 13 da Sentença), residindo aí improcedência do pedido.
      6. Mutatis mutandis, impunha-se a reformulação do Quesito 10.º da base instrutória, uma vez que revela a errónea percepção por parte do Tribunal a quo no que concerne à concreta concepção e elementos caracterizadores da obra de arquitectura em apreço nos presentes autos, algo que teve influência na (incorrecta, salvo melhor e fundamentada opinião) decisão da causa.
      7. O interesse do ora Recorrente "em propor aquela versão diversa da que consta do despacho saneador" foi por a versão do Quesito n.º 10 que constou do despacho saneador não permitir gerar resposta com interesse para a boa decisão da causa, conforme se veio a verificar.
      8. Em sentido diametralmente oposto, afigura-se extremamente relevante determinar se as mesmas alterações à obra de arquitectura "impuseram um partido plástico e estético estranho" àquele que o autor da mesma (o Recorrente) concebeu, gizou e preconizou, partido esse que se pode retirar da Memória Descritiva constante de fls. 589 e 590, concretizados no teor do projecto original, conforme desenhos a tinta preta constantes de fls. 576 a 580.
      9. Por outro lado, ao não ter admitido a inserção ou aditamento à Base Instrutória dos artigos 6.º, 8.º e 15.º da Petição Inicial, conforme oportunamente requerido em sede de Reclamação contra a Selecção da Matéria de Facto, o Tribunal a quo - salvo melhor e fundamentada opinião - não permitiu a produção e/ou valoração de prova, bem como a sua devida apreciação, acerca de matéria de importância inegável para a boa decisão da causa.
      10. O Tribunal a quo deveria ter procedido à alteração da formulação adoptada no que concerne ao Facto Assente D) e Quesito n.º 10 da Base Instrutória, constante de fls. 878 e seguintes, nos termos oportunamente requeridos em sede de Reclamação contra a Selecção da Matéria de Facto, a fls. 895 e seguintes. Ademais, e conforme igualmente alegado em sede de Reclamação contra a Selecção da Matéria de Facto, o Tribunal a quo deveria ter aditado os factos decorrentes dos artigos 6.º. 8.º e 15.º da Petição Inicial à Base Instrutória, enquanto factos controvertidos, com importância inegável para a boa decisão da causa.
      11. Não o fazendo, salvo o devido respeito por entendimento diverso, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 430.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil.
      12. Constatando-se que à matéria de facto seleccionada pelo Tribunal a quo falta matéria relevante para a boa decisão da causa, salvo melhor e fundamentada opinião, o despacho que procedeu à selecção da matéria de facto e, em consequência, a própria Sentença objecto do presente recurso, ficaram inquinadas do vício de deficiência e insuficiência da matéria de facto seleccionada, previsto nas normas ínsitas no n.º 4 do artigo 629.º do Código de Processo Civil.
      13. Nos termos previstos no n.º 3 do artigo 430.º do Código de Processo Civil, "o despacho proferido sobre as reclamações apenas pode ser impugnado no recurso interposto da decisão final".
      14. O Recorrente teve oportunidade de apresentar Reclamação contra a Selecção da Matéria de Facto, conforme decorre de fls. 895 e seguintes, tendo tal reclamação sido indeferida por (alegadamente) infundada, nos termos pugnados em sede do despacho constante de fls. 915 e 915v..
      15. No modesto entendimento do Recorrente, afigura-se que este último citado despacho se encontra ferido de ilegalidade, por violar a norma ínsita no n.º 1 do artigo 430.º do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal a quo não corrigiu os factos assentes e os factos constantes da Base Instrutória, nem aditou factos à mesma, nos termos oportunamente explicitados e peticionados em sede de Reclamação contra a Selecção da Matéria de Facto.
      16. Atendendo à matéria factual constante do Quesito n.º 10, apesar de a mesma se afigurar como excessiva e sem jamais conceder quanto a esse ponto, ainda assim se deverá arguir que o teor factual do referido quesito (a saber, "as supra referidas alterações impuseram um partido plástico e estético estranho à obra originária. com a supressão dos respectivos elementos característicos da Biblioteca") merecia resposta positiva ("provado") por parte do Tribunal a quo, tendo em conta o teor dos Factos Assentes P) e R), bem como a resposta aos Quesitos n.º 7 e 11.
      17. Do mesmo modo, tal conclusão encontra sustentação nos dos documentos suporte das alterações à obra de arquitectura (maxime, os desenhos constantes de fls. 576 a 580 dos autos, assim como a Memória Descritiva constante de fls. 587 e seguintes - em particular, fls. 589 e 590).
      18. A desconformidade entre a prova ora nomeada e a decisão proferida pelo Tribunal a quo denota um erro de julgamento notório, uma vez que os elementos probatórios ora em apreço impõem uma decisão diferente àquela perfilhada pelo Tribunal a quo, na senda do entendimento perfilhado e exposto pelo Tribunal ad quem por exemplo, no acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 251/2019.
      19. Novamente à cautela, sem jamais prescindir e tendo apenas por base a matéria de facto seleccionada pelo Tribunal a quo, ainda assim considera o Recorrente que a subsunção dos factos ao Direito impunha decisão diversa àquela tomada em sede da Sentença.
      20. Enquanto criador intelectual da obra "Biblioteca Internacional da Universidade de C", o Recorrente é o titular originário dos direitos de autor sobre a mesma (artigo 9.º, n.º 1 do RDADC).
      21. À luz do RDADC - cfr. parágrafo 1 do seu artigo 7.º -, o autor é titular de um direito pessoal e de um direito patrimonial sobre a obra protegida.
      22. O direito pessoal de autor compreende os poderes, entre outros, de "assegurar a genuinidade e integridade da obra e opor-se a qualquer mutilação ou deformação e, de um modo geral, a todo e qualquer acto que a desvirtue e possa afectar a honra ou reputação do autor" - cfr. alínea d), do n.º 3 do artigo 7.º do RDADC.
      23. No que toca à solução a oferecer ao caso concreto, não deverá ser chamado à colação o disposto no n.º 2 do artigo 46.º do RDADC, uma vez que as alterações em causa nos presentes autos não se circunscrevem a meras adaptações necessárias à utilização da obra - i.e. à sua construção -, antes sendo verdadeiras alterações à obra de arquitectura designada “Biblioteca Internacional da Universidade de C", já depois de construída – i.e depois de utilizada -, merecedoras da protecção especial conferida ex vi do n.º 2 do artigo 144.º do RDADC.
      24. No que concerne especificamente às obras de arquitectura, o legislador consagrou um regime especial, nos termos do qual se estatui que "o dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem é livre de, quer durante a construção ou execução, quer após a sua conclusão, introduzir nela as alterações que desejar; mas deve consultar previamente o autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos" (cfr. n.º 2 do artigo 144.º do RDADC, sublinhado e negrito nossos).
      25. Mal andou (salvo melhor e fundamentada opinião) o Tribunal a quo ao tentar introduzir uma avaliação de cariz subjectivo às modificações introduzidas na obra passíveis de encontrarem guarida no n.º 2 do artigo 144.º do RDADC, algo que não foi previsto pelo legislador.
      26. Dúvidas inexistem de que, efectivamente, foram introduzidas alterações na obra de arquitectura da qual o Recorrente é autor, sem que o mesmo fosse previamente consultado acerca das mesmas.
      27. Jamais poderá valer a pretensão de que, para tais alterações serem juridicamente relevantes, deveriam ter ocorrido na fachada (vulgo, no exterior) do edifício. A existência de espaço interior um pressuposto essencial de uma obra de arquitectura, que a distingue de uma obra de escultura, ainda para mais tendo em conta o propósito específico da concepção e utilização do edifício, projectado como uma biblioteca, onde a utilização e apreciação pelo público teria, forçosamente de passar pelo interior da mesma.
      28. Assim, no caso sub judice, o dever de indemnizar encontra-se já fundamentado na omissão de efectivar a consulta ao autor da obra de arquitectura - o Recorrente - cuja responsabilidade impende sobre os Recorridos, nos termos legalmente aplicáveis.
      29. Ao não ter condenado os Recorridos ao pedido formulado pelo Recorrente, com base nos danos não patrimoniais por este sofridos, em resultado da omissão ilícita da consulta prévia devida ao Recorrente quanto às alterações introduzidas na obra de arquitectura em apreço nos presentes autos, nos termos pugnados em sede de Petição Inicial e Aperfeiçoamento do Pedido, o Tribunal a quo violou o disposto nas disposições contidas no artigo 7.º, n.º 1 e 3, alínea d), bem como no artigo 144.º, n.º 2, ambos do RDADC, nos artigos 489.º, n.º 3 e 490.º do Código Civil, bem como do artigo 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 28/91/M, de 22 de Abril.
      Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser declarado como procedente, por provado, determinando-se, em consequência, a anulação da decisão recorrida, com fundamento na deficiência e insuficiência da matéria seleccionada e integrada nos Factos Assentes e Base Instrutória, determinando a sua ampliação e correcção, em conformidade, remetendo-se o processo para novo julgamento, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 629.º do Código de Processo Civil.
      Subsidiariamente, caso assim não se entenda, que seja revogada a decisão sobre a matéria de facto, no que concerne especificamente ao Quesito n.º 10, determinando-se o referido querido como "Provado", devendo a Sentença ser revogada, substituindo-se a mesma por decisão que imponha a condenação dos Recorridos nos termos oportunamente expostos em sede de Petição Inicial.
      Subsidiariamente, caso igualmente também se entenda não ser possível a alteração da resposta à matéria de facto constante do Quesito n.º 10, deverá de todo o modo a Sentença ser revogada, substituindo-se a mesma por decisão que imponha a condenação dos Recorridos nos termos oportunamente expostos em sede de Petição Inicial.
*
A Recorrida, Universidade de B de Macau (澳門B大學) (anteriormente designada Instituto de Formação B de Macau (澳門B學院)), veio, 05/04/2024, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 1304 a 1337, tendo formulado as seguintes conclusões:
      1. O Recorrente invoca que a decisão recorrida de fls. 1264 sofre do vício de insuficiência e deficiência da matéria de facto integrada na matéria de facto assente e na base Instrutória, por não reflectir o seu pensamento;
      2. Certo é que foi o Recorrente que escreveu no artigo 17.º da petição inicial, 3 longas folhas, onde disserta sobre a combinação de "três livros e um disco", aceitando como correcta a caracterização que transcreveu de websites anónimos e sem visualizações;
      3. No artigo 20.º da douta petição, o Recorrente alega que existe um hino oficial do Edifício da Biblioteca Internacional da Universidade de C, com menção expressa às suas características arquitectónicas, sendo que a letra do hino fala de "três livros e um disco";
      4. No artigo 10.º da réplica, A fls. 625, acrescenta que "a letra do hino dedicado ao edifício não deve ser desconsiderada, visto que a referência ao partido plástico e arquitectónico da obra de arquitectura do A. é algo que não conhece paralelo em qualquer outro dos edifícios públicos da RAEM;
      5. Acresce que o Recorrente escreveu, no seu Portfolio, a fls. 1467v. dos autos, que a expressão plástica predominante do edifício é a sua estrutura longilínea constituída por três corpos paralelepípedos, separados nos seus interstícios, como se de três tomos se tratasse, pontuados por um corpo elíptico;
      6. Traduzindo a narrativa técnica que o Recorrente faz das características arquitectónicas da sua obra, para a linguagem comum: o design do edifício parece uma combinação de 3 livros (três tomos) e um disco (um corpo elíptico);
      7. Na resposta à reclamação do Autor de fls. 915, o Tribunal esclareceu que encontra-se apenas vinculado à matéria de facto alegada pelas partes nos articulados, mas não à formula concreta da formulação ou à expressão por elas utilizada, conclusão que vale para o facto assente D) e para o quesito 10.º, que faz referência aos quesitos 6.° e 9.°, que igualmente não ficaram provados;
      8. O Autor pretende que o Acórdão recorrido seja anulado e o julgamento repetido para incluir na Base Instrutória os artigos 6.º a 8.º e 15.º da petição inicial; uma vez que não concorda com a que determinou que os aditamentos requeridos não incidiam sobre matéria de facto relevante com interesse para a boa decisão da causa;
      9. Ao contrário do alegado, saber se o Recorrente é um arquitecto conhecido e prestigiado (artigo 6.º da petição inicial) não é relevante para a boa decisão da causa";
      10. O que interessa, neste caso, é saber que o Autor é arquitecto, que fez parte da equipa projectista e que foi o coordenador do projecto de arquitectura - factos assentes A) e C) e resposta ao quesito 2.°);
      11. A sua alegada fama não é, obviamente, um facto com interesse relevante para a boa decisão da causa;
      12. Também o alegado no artigo 8.º da petição inicial não é um facto com interesse relevante, pelo que andou bem o Tribunal a quo ao não incluir a lista dos vários concursos de arquitectura que o Recorrente diz ter vencido e ser o responsável pela concepção global;
      13. Sabe-se que o Recorrente foi o arquitecto que assinou e submeteu os desenhos de arquitectura à antiga Direcção dos Serviços de Solos Obras públicas e Transportes, mas não é relevante saber se o Recorrente é prestigiado e se a Biblioteca é um edifício de referência da RAEM;
      14. Ao contrário do alegado pelo Recorrente, a percepção do Tribunal a quo foi a correcta e assentou no que foi escrito na petição inicial, na réplica e no Portfolio do Autor/Recorrente;
      15. Como tal, deve ser negado provimento ao recurso que interpôs;
      16. A 2.ª Recorrida requer a ampliação do objecto do recurso nos termos do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 590.°, n.º 4 do artigo 599.° e n.º 5 do artigo 613.° do Código do Processo Civil;
      17. A 2.ª Recorrida indicou na sua alegação quais os pontos concretos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e quais os concretos meios probatórios, constantes dos autos, que impunham decisão diversa, como determinam as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 599.°;
      18. Entende a 2.ª Recorrida que o Tribunal a quo errou ao dar como provados os quesitos 4.º, 5.º, e 8.º - tal como consta da resposta aos quesitos de fls. 1254 e do Acórdão ora em escrutínio, de fls. 1267;
      19. No quesito 3.º o Tribunal recorrido deu como não provado que a Arquitecta F tenha intervindo como auxiliar do autor, depois da proposta, integrada pelo respectivo anteprojecto da obra de arquitectura, ter sido submetida a concurso;
      20. No quesito 5.°, o Tribunal a quo deu com provado que a obra de arquitectura foi divulgada como projectada pelo autor em duas revistas, com base nos docs. n.ºs 4 e 5, juntos com a petição inicial;
      21. Contudo, existe um erro manifesto na leitura que o Tribunal a quo fez desses documentos, pois nenhuma das revistas menciona que o Recorrente foi o único arquitecto da obra de arquitectura em questão;
      22. A informação contida nessas revistas conceituadas, bem como o que o Recorrente escreveu na réplica de fls. 625, tem de servir, necessariamente, para dar como provado o quesito 3.º e por não provado o quesito 5.°;
      23. Uma leitura atenta da revista World Architecture 9912 publicada pela Tsinghua University & Research Institute of Architectural Design, Beijing; permite ver na primeira página dessa revista de arquitectura (a fls. 81 dos autos) que o edifício da Biblioteca é uma obra dos arquitectos A e F;
      24. Na revista Macau Contemporary Architecture, editada pela Fundação Macau a fls. 85 dos autos, também é mencionado que se trata de uma obra da responsabilidade dos arquitectos A e F;
      25. O próprio Recorrente escreveu no seu Porfolio, a fls. 1046, na parte que respeita à Biblioteca Internacional da Universidade de C, que a equipa do projecto incluía os arquitectos A e F;
      26. Para além de que o Recorrente confessou no artigo 32.º da réplica (a fls. 625), que a Arquitecta F interveio como sua auxiliar;
      27. É inegável que as duas revistas registam os nomes de ambos os arquitectos como responsáveis pelo projecto de arquitectura, pelo que é errada a conclusão do Tribunal a quo de que as revistas dizem que o Recorrente é o autor do projecto;
      28. Salvo o devido respeitai o documento mais importante que um arquitecto tem de apresentar, para o licenciamento de uma obra, não é o anteprojecto (que é um esboço inicial a juntar a outros documentos para avaliação de propostas), mas sim os vários projectos de execução, que só foram apresentados após a assinatura do contrato pela Fundação Macau e pela D, Limitada;
      29. Impõe-se, assim, que seja alterada a decisão de facto nos dois segmentos, determinando-se que se dê por provado o quesito 3.° e, ao mesmo tempo, corrigido o quesito 5.º; uma vez que as duas revistas registam, sem margem para dúvidas, que a obra foi projectada pelos arquitectos A e F;
      30. Além disso, o Recorrente confessou no artigo 32.° da Réplica e no seu Portfolio a participação da Arquitecta F na equipa do projecto;
      31. Doutro passo, o Tribunal a quo referiu no Acórdão de fls. 1254 que fundou a sua convicção, para dar como provado o quesito 4.°, nos documentos de fls. 969 a 1044, que consistem em folhas impressas de páginas da internet;
      32. Algumas dessas páginas têm datas de publicação posteriores à data em que a presente acção foi intentada, veja-se, por exemplo, o Documento de fls. 969, datado de 15 de Março de 2020 que só foi lido por 3 pessoas, com fotografias que não são da antiga Biblioteca da Universidade, nem de qualquer outro edifício da RAEM - documento que o Tribunal a quo referiu no Acórdão de fls. 1254 ter servido para dar como provado o quesito 4;
      33. Na generalidade, tratam-se de páginas de internet anónimas, sem visualizações, sem identificação dos seus criadores e autores de conteúdos, que adoptam designações extravagantes para ocultar a sua origem (vg. jjl; zsyz; tl.swewe; 390p; 33dm.net; zhm.100ke, edu.bjtzsm.com, baike.sougou.com);
      34. Quando se diz que alguma pessoa ou acontecimento mereceu destaque em sítios da internet, aguarda-se pela indicação de websites com credibilidade, conhecidos dos diferentes sectores da sociedade, com audiência e facilmente referenciáveis, como sucede com os websites oficiais do Governo, de entidades oficiais, de organismos ou associações profissionais e culturais, de revistas da especialidade nacionais ou internacionais.
      35. Ninguém espera ser surpreendido por websites, de curta duração, com nomes codificados e bizarros como jjl; zsyz; tl.swewe: 390p; 33dm.net; zhm.100ke, edu.bjtzsm.com; baike.sougou.com; etc.;
      36. É verdade que o Tribunal pode valorar a prova com base no âmbito da "livre convicção", como registou a fls. 1254v., mas a prova documental deve ser credível e a sua origem e autoria facilmente identificáveis;
      37. In casu, as páginas repetem o mesmo conteúdo, palavra por palavra, a única coisa que as distingue são as inusitadas designações, todas compostas por letras misturadas com números, sem qualquer significado - precisamente porque os autores dessas réplicas electrónicas quiseram manter o anonimato;
      38. Páginas de internet com este tipo de designações codificadas causam, em geral, desconfiança quanto à sua origem e receio de contaminação com vírus informáticos;
      39. Entende a 2.ª Recorrida que páginas com denominações extravagantes, de origem e autoria desconhecidas não podem servir para fazer prova do quesito 4.°.
      40. Impõe-se, assim, modificar essa decisão, determinando-se que se dê por não provado o quesito 4.º;
      41. Finalmente, o Tribunal a quo considerou provado o quesito 8.°, que menciona que a 2.ª Ré não efectuou a consulta prévia ao Autor, relativamente ao projecto de alteração em apreço nos autos;
      42. Esclarece o Tribunal a quo, na decisão ora em crise, que o n.º 2 do artigo 144.° do DL n.º 43/99/M determina que o dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem é livre de, quer durante a construção ou execução, quer após a sua conclusão, introduzir nela as alterações que desejar, mas deve consultar previamente o autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos;
      43. Explica, de seguida, o Tribunal a quo, a fls. 1268 e ss., que se trata aqui não de qualquer modificação da obra - mas tão-só daquela que "a desvirtue e possa afectar a honra ou reputação do autor" - conforme o artigo 7.°, n.º 3, alínea d) do DL - em suma, as modificações aptas a lesar o direito à integridade da obra e provocar os danos consequentemente. Na situação vertente, invertemos a ordem das questões a apreciar e começamos por dizer que as verificadas alterações da obra não atribuem o direito de indemnização ao respectivo autor, ainda que tivesse sido comprovada a omissão indevida da consulta prévia. Portanto, nada permite concluir nos termos que o Autor alega nos artigos 170.º a 175.º da petição inicial: não ocorreu a mutilação nem a deformação da obra da sua autoria, nem qualquer outro acto que a desvirtue e possa afectar a honra ou reputação do autor, susceptível de lesar o direito à integridade da obra, mas sim apenas as alterações no espaço interior do edifício. Em que medida as ditas alterações puramente funcionais sejam ainda da honra e reputação do Autor, ele próprio não alegou, nem existe elemento trazido ao processo para responder;
      44. Terminando por concluir que inexistiam, neste caso, danos ressarcíveis como decorrentes de lesão do direito moral do Autor (em especial, o direito à integridade da obra), por modo a conferir-lhe o direito à indemnização.
      45. Não obstante, resulta dos autos que a 2.ª Recorrida consultou previamente o autor do projecto antes de introduzir quaisquer alterações, como sublinhou a Digna Magistrada do Ministério Público na sua contestação de fls. 288 e demonstrou nos documentos que juntou aos autos;
      46. As alterações da responsabilidade da 2.ª Recorrida tiveram início a partir do ano de 2016, no âmbito de três projectos: a) Consultancy service for B New Taipa Campus (Library Building) Renovatian Project", que foi directamente adjudicado ao Autor, em 18 de Maio de 2016, pelo valor de MOP50.000,00 (cinquenta mil Patacas), b) Service for design and application of floor plan of the replacement of chiller (air conditioning)", que foi adjudicado ao Autor após consulta a outras entidades, em 5 de Dezembro de 2016, pelo valor de MOP177.000,00 (cento e setenta e sete mil Patacas) e c) Service for updating floor plans of constructian and fire control", adjudicado à sociedade ADAL (e não ao Autor) após consulta a diversas entidades, em 29 de Dezembro de 2016, pelo valor de MOP250.000,00 (duzentas e cinquenta mil Patacas) - conforme resulta da Proposta n.º 592/SC/2016, de 28 de Dezembro de 2016, junta como 183;
      47. O Autor foi consultado para todos esses serviços e deu nota, nos orçamentos apresentados, que concordava com as obras de alteração no interior do edifício da antiga Biblioteca da Universidade, tal como resulta, com cristalina evidência, dos documentos juntos a fls. 175, 258 e 260, para o primeiro projecto; dos documentos juntos a fls. 179, 264 e 266, para o segundo projecto; e dos documentos juntos a fls. 183, 270 e 272, para o terceiro projecto;
      48. A 2.ª Recorrida é totalmente alheia às alterações efectuadas pela Universidade de C na Biblioteca em data anterior a 15 de Dezembro de 2015, data em que o Autor diz ter tomado conhecimento das mesmas;
      49, Certo é que o Autor tomou prévio imediato conhecimento dos três projectos da responsabilidade da 2.ª Ré, desde o ano de 2016, e apresentou propostas onde manifestou total concordância com as alterações;
      50. Entende a 2.ª Ré que a consulta prevista no n.º 2 do artigo 144.º do DL n.º 43/99/M foi cumprida durante os procedimentos abertos para os três projectos em que o Recorrente participou e manifestou a sua expressa concordância;
      51. Não obstante, a 2.ª Recorrida também consultou o Autor, em 9 de Fevereiro de 2018, para os termos do artigo 144.º, n.º 2 do DL n.º 43/99/M, de 16 de Agosto – conforme consta fls. 277 dos autos;
      52, O Autor pediu esclarecimentos adicionais à consulta realizada e a 2.ª Ré enviou uma segunda carta com explicações em 4 de Abril de 2018 (fls. 280), para depois, em 27 de Julho de 2018, enviar uma terceira carta (fls. 283), para lembrar ao Autor que o convite enviado, às diferentes entidades escolhidas para apresentarem propostas, dava nota de que os concorrentes não seriam informados da adjudicação a outros concorrentes;
      53. Ou seja, o Autor transformou a consulta realizada numa demorada troca de correspondência, com respostas sucessivas, em 9 de Fevereiro (a fls. 278), em 1 de Maio (a fls. 281) e em 24 de Agosto de 2018 (a fls. 285), com argumentos sobre o seu alegado direito;
      54. A consulta formal, nos termos do artigo 144, n.º 2 do citado diploma, foi realizada antes de serem autorizadas quaisquer obras pela DSSOPT, como o próprio Recorrente reconhece no artigo 41.° da sua douta petição inicial;
      55. Como tal, é falso afirmar que o Autor não foi consultado nos termos do artigo 144.°, n.º 2 do DL n.º 43/99/M, de 16 de Agosto;
      56. Determina o artigo 629.°, n.º 1, al. a) do Código de Processo Civil, que o Tribunal de Segunda Instância pode alterar a decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto, se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa - o que sucede nestes autos.
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Região Administrativa Especial de Macau (澳門特別行政區), representada pelo MP, ofereceu a resposta constante de fls. 1339 a 1349, tendo formulado as seguintes conclusões:
A. 上訴人主張就已確定事實D)項及疑問列第10)點中所撰述的“três livros e um disco”,即“三書一光盤”的部分存在錯誤明顯不能成立。
B. 首先,原告於起訴狀第17條中具體地陳述及援引對本案建築物的形像描述:“...遠望像由三本書及一面光盤組合而成...”(“...parece uma combinação de três livros e um disco”),明確重覆地強調及承認本案建築物的造型和美學風格的設計意念為“三書一光盤”。
C. 第一被告及第二被告亦在相應的答辯狀中亦承認及陳述本案建築物為“三書一光盤”的設計意念(第一被告答辯狀第87條及第二被告答辯狀第70條),質言之,於本案中所有當事人均明確地認同了本案建築物的建築特點為“三書一光盤”組合的設計意念。
D. 再者,上訴人就本案建築物當時所製作的《說明書》(Memória Descritiva)中提及的“造型解說”(Discurso Plástico)內容(卷宗第589至590頁)以及載於卷宗第576至580頁的建築圖則,第一被告便是依據上訴人起訴狀第17條結論該等書證內容才認定本案建築物設計意念可表述為“三書一光盤組合”。
E. 該文件附同於第一被告答辯狀內,上訴人從沒有對該文件的真實性及內容提出任何質疑。
F. 按照上述《說明書》清楚指出:“A expressão plástica predominante do edifício é a sua estrutura longilínia constituída por três corpos paralelepipédicos separados nos seus interstícios, como se de três tomos se tratassem, pontuados por um corpo elíptico que enuncia o auditório principal, e por um espaço vestibular.”
G. 雖然,上述內容並沒有使用了“三書一光盤組合”(uma combinação de três livros e um disco")相同的表述,毫無疑問,只不過是平白地藉著三維立體的結構形狀來闡明建築物的外觀設計,與“三書一光盤組合”的意思完全無異,後者是更形象他的表述方式而已。
H. 為此,原審法院基於各方當事人均沒有爭議而將“A obra de arquitectura da Biblioteca é caracterizada pela concepção de uma cominação de "três livros e um disco”作為既證事實D)項,以及將疑問列第10)點指出本案建築物具有“concepção de uma cominação de três livros e um disco”不存在任何的錯誤之處。
I. 值得指出的是,上訴人指稱應將疑問列第10)點改為起訴狀第171條的主張,然而,該條只是空泛及抽象地主張對本案建築物“施加了不同於原作品的造型和美學風格”(“um partido plástico e estético estranho à obra originária”),壓制了“建築物的特點元素”("elementos carterísticos da Biblioteca"),
J. 顯然無法具體及清楚表示原作品的造型和美學風格是什麼?所施加的更改或變更與原作品之間有何不同?如何對比?建築物有什麼特點元素?
K. 明顯地,起訴狀第171條純粹是一條結論性事實,倘若如上訴人主張那麼更改,上訴人根本無法作出證實。
L. 為此,原審法院於既證事實D)項及疑問列第10)點中明確指出本案建築物的“三書一光盤組合”的設計意念,明顯是有利於上訴人的舉證,而且屬案件良好裁判屬必須的事實內容。
M. 既證事實D)項及疑問列第10)點並不存在上訴人指稱的遺漏或不足的錯誤,不存在《民事訴訟法典》第629條算4款規定必須“擴大事實事宜範圍”從而發還原審法院重審的前提。
N. 另一方面,上訴人主張應將起訴狀第6條、第8條及第15條的事實列入為調查基礎疑問列範圍,這是因為該等事實對於作出本案良好裁判屬重要。
O. 我們亦不能認同上訴人主張。
P. 起訴狀第6條主張原告為本澳知名度高的建築師;起訴狀第8條主張原告曾獲得多個建築設計公共競投並作為相關計劃的總概念的創作人;起訴狀第15條主張本案建築物為本澳的地標建築。
Q. 關於起訴狀第6條及第15條,一方面僅為結論性及涉及主觀判斷的事實,另一方面,既證事實A)項及疑問列第5)點的事實,已足以給予法院作出良好裁判的事實依據;至於起訴狀第8條明顯對本案裁判無任何作用,上訴人於起訴狀中完全欠缺陳述所主張的不法行為如何損害其所謂的著作人身權及其嚴重程度的具體事實。
R. 同樣地,亦不存在《民事訴訟法典》第629條第4款規定必須“擴大事實事宜範圍”‒ 即增加起訴狀第6、8及15條列入調查基礎事實 ‒ 發還原審法院重審的前提。
S. 基於此,上訴人主張原審法院對於既證事實D)項、疑問列第10)點、以及起訴狀第6、8和15條存在篩選事實事宜不足及缺漏的主張不能成立。
T. 上訴人主張原審法院於卷宗第915及背頁的批示並沒有按照上訴人的異議作出更正,並駁回聲明異議,因此違反了《民事訴訟法典》第430條第1款規定。
U. 這明顯是與上訴人提出篩選事實事宜不足及缺漏的主張並無分別,基於上述分析,無需贅言,上訴人主張違反《民事訴訟法典》第430條第1款規定理由亦不能成立。
V. 關於上訴人主張原審法院對疑問列第10)點的回答存在錯誤審理方面,首先,再次強調疑問列第10)點的撰述並沒有任何錯誤、遺漏或過度,而且,從“...designadamente os que integram a concepção de “três livros e um disco””可見,是“尤其”涉及建築物的“三書一光盤組合”的外觀,並沒有排除針對建築物內部的特點元素。
W. 我們必須指出的是,疑問列第11點)已針對了有關的更改或變更是否涉及本案建築物內部空間,“As supra-referidas alterações eram circunscritas ao espaço interior do edifício da Biblioteca?”,而原審法院給予了證實的回答。
X. 對於疑問列第10)點,原審法院的心證依據正確地指出是基於證人G於庭審中的證言並向該證人出示卷宗上述圖則下,既設事實P)項更改工程計劃僅針對於建築物的內部,目的是是合法化,使本案建築物的內部安全設施符合法定標準。
Y. 上訴人並沒有質證上述證人的證言存在哪部分不正確或不實,
Z. 此外,上訴人亦沒有按照《民事訴訟法典》第599條第1款b)項及第2款規定,指出上述證人哪部分證言能夠證明本案建築物存在的內部更改或變更對上訴人聲稱的建築物造型或美學風格產生什麼影響。
AA. 再者,上訴人援引《說明書》提及的內部空間說明,只是概括地指出內部空間為縱向佈局,上訴人於起訴狀中完全沒有主張或陳述本案建築物內部空間有著什麼樣的造型或美學風格的具體事實,更沒有援引任何《說明書》的內容或解釋《說明書》內關於內部空間存在哪些建築特點元素,當然亦無法舉證之。
BB. 於起訴狀中,上訴人亦沒有主張或陳述有關更改或變更如何影響了本案建築物內部空間的風格或其影響程度的具體事實,當然亦無法舉證之。
CC. 顯然,上訴人只不過是事後藉詞《說明書》空泛地提及內部空間的說明,單純質疑原審法院對疑問列第10)點事實形成的心證。
DD. 無容贅言,上訴人主張原審法院錯誤審理疑問列第10)點的事實明顯不成立。
EE. 最後,關於上訴人主張被上訴判決違反第43/99/M號法令第144條規定方面,我們亦無法認同。
FF. 第43/99/M號法令第144條規定,對於建築作品或結合在建築作品內的造型作品,作者的著作權的法律保護並不妨礙建築物所有人針對建築物在興建過程中或興建後作出修改的權利。正如上述條文第2款清楚規定“均可自由在有關作品中引入擬作出之修改”。
GG. 儘管該條款規定在作出有關修改之前應預先諮詢設計圖作者之意見,然而,從上述條文的整體解釋,立法者並沒有單純因欠缺預先諮詢而直接賦予作者損害賠償的權利。
HH. 根據同條第3款規定,倘若作者與定作人之間於之前或作出預先諮詢之時並沒有達成任何協議,那麼設計圖作者僅有權拒絕承認其為經更改作品的作者,而該作品之所有人不得為本身之利益而引用原設計圖作者的姓名。
II. 該權利正正是相應於上述法令第7條規定作者著作人身權的保護 ‒ 尤其是在作品表明作者身份、確保作品的真實性及完整性、以及就歪曲作品而影響作者名譽或聲譽提出反對方面。
JJ. 亦即是說,雖然法律允許建築物的所有人有權自由作出有關修改,這不必然完全輾壓作者著作權最基本的保護內容,一旦作出修改,設計圖作者有權不確認修改後的建築物為其作品以及不得於該修改後的建物再使用作者身份。
KK. 正正是該權利的法律保障被侵犯後,才存在不法性的要件而要求損害賠償。
LL. 必須強調的是,單純欠缺預先諮詢並不構成侵犯主觀權利的不法性,這是因為預先諮詢並不屬於著作權本身的內容,只不過是定作人在作出修改前應進行的程序或手續,以便讓作者得以考慮一旦修改後的建築物是否仍確認為其作品以及是否允許定作人日後針對該修改後的建築物再使用作者身份。
MM. 即使欠缺預先諮詢,作者仍沒有失去行使第144條第3款的權利,亦即是說,針對經修改後的建築物有權拒絕確認為其作品或者決定是否允許定作人繼承使用作者的身份,正如上述所分析,這才是法律針對建築物的著作權給予的法律保障。
NN. 為此,只有在作者在沒有獲得預先諮詢而未能適時地對造成扭曲或歪曲原意的更改提出反對並拒絕承認變更後建築物,該等侵犯著作人身權的更改或變更行為才導致賠償結果。
OO. 值得補充的是,《民法典》第489條第1款規定,對於非財產損害賠償責任的前提是基於所遭受侵犯的是基於嚴重性應受法律保護的權益。
PP. 著作人身權 ‒ 作為非財產性質權利,必然是權利人所主張的侵犯是存在嚴重性而應受法律保護的程度,而並非在任何情況下主張的侵犯均導致產生損害賠償。
QQ. 本案中,正如上述所分析,第144條第2款規定向作者的預先諮詢的目的在於給予作者能夠在未作出更改或變更前及時行使同條第3款的權利,從而適時地避免對於扭曲或歪曲其作品真實性的更改而使第三人或公眾對作者的名聲遭受負面影響。
RR. 為此,作為非財產性質的權利,著作人身權必須在以下情況下才能視為基於嚴重性而應受法律保護:第一、符合上述法令第7條第3款d)項規定的情況,即存在對作品的真實性及完整性的刪除、歪曲或曲解的更改或變更;第二、基於該等更改或變更對於作者的名聲或聲譽遭受負面影響。
SS. 顯然,單純欠缺事先諮詢並不構成對該非財產權利的直接侵害,更不存在《民法典》第489條第1款所規定的“嚴重性而應受法律保護”。
TT. 基於此,我們認為被上訴判決並不存在違反第43/99/M號法令核准之《著作權及有關權利之制度》第7條第1及3款d)項及第144條第2款的規定。
* * *
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
    III – FACTOS
São os seguintes elementos considerados assentes pelo TA, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:

Da Matéria de Facto Assente:
- O Autor é um arquitecto que exerce a sua profissão em Macau (alínea A) dos factos assentes).
- Em 1997, a Fundação de Macau, em resultado de um concurso de Concepção/Construção, adjudicou à Companhia de Construção e Obras de Engenharia D, Limitada (designada por D) a execução da empreitada de “Concepção –construção da Biblioteca Internacional da Universidade de C”, e contratou com a mesma (conforme o doc. junto a fls. 161 dos autos) (alínea B) dos factos assentes).
- O projecto de arquitectura da Biblioteca Internacional da Universidade de C (doravante designada por Biblioteca) foi concluído por uma equipa projectista coordenada pela D, em que participou o Autor como arquitecto (alínea C) dos factos assentes).
- A obra de arquitectura da Biblioteca é caracterizada pela concepção de uma combinação de “três livros e um disco” (alínea D) dos factos assentes).
- O nome do Autor não constou do edifício da Biblioteca (alínea E) dos factos assentes).
- Em 7/10/2015, foi cedido o edifício da Biblioteca ao 2.º Réu, presentemente, designado por “Edifício Progresso” ou “Edifício Dianteira” em inglês “Forward Building” (conforme o doc. junto a fls. 166 dos autos) (alínea F) dos factos assentes).
- Em 18/5/2016, foi adjudicado ao Autor o serviço de consultadoria “氹仔新校區(圖書館大樓)空間規劃之顧問服務” no valor de MOP50,000.00 (conforme os docs. juntos a fls. 535 a 540 dos autos) (alínea G) dos factos assentes).
- O serviço de consultadoria supra-referido tem os seguintes contornos:
“…1. A feasibility study on modifying current space usage from mainly Library use to a mixed of Library (ground floor only), classrooms and offices use.
2. Site observation and evaluation and testing, if necessary.
3. Per related building laws and B requirement, provide preliminary design drawings including explanation and the whole renovation work schedule.
4. Estimation of cost of renovation work, design and work supervision fees as per the formula recognized…” (conforme os docs. ibid. dos autos) (alínea H) dos factos assentes).
- Em 23/5/2016, o Autor submeteu ao 2.º Réu o estudo de viabilidade conforme contratado (conforme o doc. junto a fls. 541 a 564 dos autos) (alínea I) dos factos assentes).
- Em 5/12/2016, foi adjudicado ao Autor o serviço para “展望樓更換冷水機組之設計及入則服務” no valor de MOP177,000.00 (conforme os docs. juntos a fls. 565 a 570v dos autos) (alínea J) dos factos assentes).
- O serviço supra-referido tem como o alcance no seguinte:
“…1. Issuance of Technical Specifications and conditions for purchasing Two New Air Condition Chillers, having in view items 1 to 12 [展望樓更換冷水機組之設計及入則服務(更正)] of your ref. 2604/075385/PT-PQL/2016 dated 07/11/2016, but not limited (all services ruled as well as per The Instructions, of acquisition of project services).
...
2. Equipment layout having in viewed future roof top uses;
3. Constructive specifications for civil works, namely supporting plinth slabs for the new equipment;
4. Alternatively, improved solution on raised steel members supports mounted on the existing concrete framework of the roof slab and walls (see sketches bellow), having in view improved mechanical absorption of the equipment, constructive continuity of thermal isolation and water proofing, easier overall cleaning, access and maintenance;
5. In the absence of a schedule of functions and occupancy, but having in view the life expectancy of the new equipment and the scope of future renovation of the Forward Building, the cooling requirement assessment of the building [item 8 of 展望樓更換冷水機組之設計及入則服務(更正), of your ref. 2604/075385/PT-PQL/2016 dated 07/11/2016], will have in consideration "maximum occupancy" as accessed in document our ref. 33-2016-B-DT02 dated 23.05.2016, unless advised otherwise.
6. Phases:
Phase 1: Items 1. to 12. [展望樓更換冷水機組之設計及入則服務(更正)] of your ref. 2604/075385/PT-PQL/2016 dated 07/11/2016 to be submitted within 30 days following the issuing of B’s PO (purchase order) as confirmation.
Phase 2: During tender and installation.
• Analysis of supply proposals;
• Assistance in inspecting site works and testing after installation;...”
(conforme os docs. ibid.) (alínea K) dos factos assentes).
- Em 28/11/2016, o 2.º Réu convidou o Autor para apresentar a proposta relativamente ao serviço de “展望樓建築及消防圖則更新服務” (conforme o doc. junto a fls. 573 dos autos) (alínea L) dos factos assentes).
- O supra-referido trabalho tem o teor seguinte:
“…1. B學院展望樓為一座五層高建築物,總建築面積約18,812平方米。
2. 設計公司需完成展望樓建築圖則及消防系統圖則,包括向土地工務運輸局及消防局等部門回覆意見書。
3. 設計公司需提供因不合規例已需修改間隔之所有改善建議。
4. 設計公司需提供責任聲明書及跟進所有入則事宜。
5. 設計公司需提供註冊編制技術員資料。
6. 服務期約90天。
7.原圖則只包括平面圖。
8.設計公司需支付簽署圖則、文件及相關所引致之一切費用…” (conforme o doc. junto a fls. 573v dos autos) (alínea M) dos factos assentes).
- Em 12/12/2016, o Autor apresentou sua proposta ao 2.º Réu (conforme o doc. junto a fls. 574 a 575v dos autos) (alínea N) dos factos assentes).
- Em 28/12/2016, o referido serviço foi adjudicado à “A Design Arquitectura Limitada” (conforme o doc. junto a fls. 571 a 572 dos autos) (alínea O) dos factos assentes).
- Em 19/1/2018, o 2.º Réu dirigiu o pedido de aprovação do projecto (de alteração) da obra de modificação do “Edifício Progresso”, na fase de projecto, à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, que correu os seus termos no processo n.º 19/MF/2018/L (conforme o doc. junto a fls. 317 a 351 dos autos) (alínea P) dos factos assentes).
- Em 8/8/2018, o Chefe da Divisão de Licenciamento do Departamento de Urbanização da DSSOPT proferiu o despacho de concordância na proposta n.º 3220/DURDEP/2018, em que se propôs no ponto 7, o seguinte teor “…7 結論:鑒於本處建築師未能發出可行意見;建議有關的更改工程計劃DMS-13447/2018 de 24/1,仍須遵守以下第7.1~7.3點作出修改並建議提醒工程所有人:“貴 學院可想本局總檔案組,申請各項專業的圖則,其案卷編號為426/1997/L (C大學國際圖書館)。此外,應向財政局咨詢更改的意見。
7.1本處建築師建議書第3.1~3.2、11.1~11.4點之意見;
7.2 本建議書第6.2~6.4點之意見;
7.3 上述第4~5點各部門的意見,當中CB意見書第φ2點g項可按經修訂的《防火安全規章》執行…” (conforme o doc. junto a fls.103v a 104 dos autos) (alínea Q) dos factos assentes).
- Em 18/12/2018, o 2.º Réu apresentou o segundo pedido de aprovação do projecto (de alteração) da obra de modificação do “Edifício Progresso”, instruído na modalidade de “modificação/legalização” (conforme o doc. junto a fls. 355 a 388 dos autos) (alínea R) dos factos assentes).
- Relativamente à matéria requerida pelo 2.º Réu na alínea P), a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes não efectuou nenhuma consulta prévia ao Autor (alínea S) dos factos assentes).
*
Da Base Instrutória:
- A participação do autor na equipa projectista referida na alínea C) dos factos assentes foi de coordenador apenas do projecto de arquitectura (resposta ao quesito 1.º da base instrutória).
- O Autor é o único arquitecto identificado ao longo de todos os projectos de arquitectura relativos à obra de arquitectura da Biblioteca (resposta ao quesito 2.º da base instrutória).
- A obra de arquitectura em apreço tem sido indicada como projectada pelo Autor, nos diversos sítios electrónicos da internet (resposta ao quesito 4.º da base instrutória).
- A mesma obra de arquitectura foi divulgada como projectada pelo Autor nas seguintes revistas publicadas:
- World Architecture, tomo n.º 9912 e 1999, publicada pela Tsinghua University & Research Institute of Architectural Design, Beijing, e
- Macau Contemporary Architecture, da China Architecture & Building Press, Beijing (resposta ao quesito 5.º da base instrutória).
- O projecto de alteração cuja aprovação se requer na alínea P) dos Factos Assentes já se encontrava executado antes da apresentação do respectivo pedido (resposta ao quesito 7.º da base instrutória).
- Relativamente ao projecto de alteração acima referido, o 2.º Réu não efectuou a consulta prévia ao Autor (resposta ao quesito 8.º da base instrutória).
- As alterações documentadas nas bases digitais das plantas e as incluídas no requerimento da alínea P) dos factos assentes eram circunscritas ao espaço interior do edifício da Biblioteca (resposta ao quesito 11.º da base instrutória).
      
* * *
    IV - FUNDAMENTOS
A – Recurso interlocutório:
(...)
O conhecimento parcial do pedido formulado – a indemnização a título de dano de perda de chance no valor de MOP 1,293,471.29 ou equitativamente fixado – alínea b) do pedido:
Conforme o alegado na petição inicial, que se reitera repetidamente nos seus posteriores articulados, o Autor limita-se a arrogar como criador da concepção global relativamente à obra da arquitectura em causa, tendo o direito de autor na vertente pessoal (veja-se, entre os outros, os artigos 10.º, 74.º, 75.º, 131.º e 132.º da p.i., os artigos 18.º, 23.º e 24.º da réplica), tanto mais que invocou, como causa de pedir, a introdução das alterações pelos dois Réus à obra de arquitectura sem consulta prévia ao mesmo, supostamente lesiva do referido direito pessoal de autor, com base no artigo 144.º, n.º 2 do DL n.º 43/99/M, de 16 de Agosto, com o conteúdo republicado pela Lei n.º 5/2012 (veja-se, entre os outros, os artigos 25.º a 27.º e 43.º a 50.º da p.i.).
Com base nisso, vem-se formulando o pedido comtemplado na alínea b) – a indemnização a título de dano e perda de chance. Na tese do Autor, tal perda ocorreu uma vez que o mesmo “se viu impossibilitado de desenvolver e apresentar a sua proposta de compatibilização e harmonização das modificações perpetradas à obra de arquitectura… para o edifício “Biblioteca Internacional da Universidade de C…”, “Tendo-sido retirada a chance, a real e efectiva hipótese de obter os proventos desse mesmo trabalho, uma vez que essa intervenção foi desenvolvida por terceiros, sem nunca o A. ter sido consultado, conforme exigência legal.” (conforme alegado nos artigos 146.º e 147.º da p.i.).
Cremos, salvo melhor opinião, que não obstante a permanência da matéria de facto controvertida, considerando as várias soluções jurídicas plausíveis da questão de direito, o conhecimento do peticionado nesta parte conduzirá, necessariamente, à improcedência do pedido, motivo pelo qual se antecipa, sem necessidade de mais provas, a decisão sobre o mérito da causa, nos termos do artigo 429.º n.º 1 alínea b) do CPC.
Vejamos então.
Tratando-se do direito pessoal de autor, o seu titular em geral goza dos poderes contemplados no disposto do artigo 7.º, n.º 3 do DL n.º 43/99/M:
- a) Manter a obra inédita (direito ao inédito);
- b) Reivindicar a paternidade da obra e ser identificado como autor no original, em cada exemplar e em qualquer publicidade (direito à paternidade de obra);
- c) Retirar a obra de circulação (direito de retirada);
- d) Assegurar a genuinidade e integridade da obra e opor-se a qualquer mutilação ou deformação e, de um modo geral, a todo e qualquer acto que a desvirtue e possa afectar a honra ou reputação do autor (direito à integridade da obra).
Em matéria do direito à integridade da obra, a regra geral aplicável é qualquer modificação da obra necessita do acordo do seu autor. Como se depreende da norma citada do artigo 7.º n.º 3 do DL, as alterações que desvirtuem a obra, ou a prejudiquem, ou atinjam a honra ou a reputação do autor são consideradas violadoras da obra, o que permite ao respectivo autor, se não tiver dado o seu consentimento nos termos do artigo 46.º, n.º 1 do referido DL, exercer o poder de oposição às modificações ocorridas.
Por outro lado, as alterações que não desvirtuam a obra, necessárias à sua utilização pela forma autorizada não carecem do consentimento ou autorização do autor da obra. Trata-se das alterações exigidas pela adaptação da obra, nos termos do artigo 46.º, n.º 2 do referido DL.
No entanto, fixa-se, a propósito das obras de arquitectura, o regime excepcional, conforme estabelecido no artigo 144.º do DL n.º 43/99/M o seguinte:
“1. O autor de obra de arquitectura, ou de obra plástica incorporada em obra de arquitectura, tem o direito de fiscalizar a respectiva construção ou execução em todas as fases e pormenores, de maneira a assegurar a exacta conformidade dessa construção ou execução com o projecto, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2. O dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem é livre de, quer durante a construção ou execução, quer após a sua conclusão, introduzir nela as alterações que desejar, mas deve consultar previamente o autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos.
3. Não havendo acordo entre o dono da obra e o autor do projecto, pode este repudiar a paternidade da obra modificada, ficando vedado ao proprietário invocar para o futuro, em proveito próprio, o nome do autor do projecto inicial.”
Conjugadas as normas acima citadas, em especial, os n.ºs 2 e 3 do referido preceito, estando em causa uma obra de arquitectura, ao contrário do que sucede no regime geral, o dono de obra em princípio é livre de introduzir nela as alterações desejadas, sendo obrigado à consulta prévia ao autor do projecto.
Importa, porém, que a consulta prévia aqui referida não tem por finalidade obter qualquer autorização do autor para as alterações visadas, pois mesmo que o autor não consente a concretização das alterações introduzidas por entender desvirtuarem sua obra, nada pode fazer senão repudiar a paternidade desta, ou seja, podendo o mesmo não aceitar que a autoria continue a ser-lhe imputada, “ficando vedado ao proprietário invocar para o futuro, em proveito próprio, o nome do autor do projecto inicial”. Uma vez repudiada a paternidade da obra, o dono de obra só viola o respectivo direito à integridade se continuar a usá-la como criação do autor original.
Portanto, verifica-se, aqui, uma subordinação da integridade da obra à respectiva funcionalidade. Ou melhor dizendo, fica reduzida a protecção do autor das obras de arquitectura, que se encontra na dependência das exigências técnicas do construtor e do gosto do dono de obra. Nesta linha, parece-nos que os danos indemnizáveis que se reclama ao abrigo do citado artigo 144.º, n.º 2 não pudessem ter o mesmo alcance daqueles provocados ao direito à integridade da obra nas situações fora do problemático especial da obra de arquitectura.
Se assim é, a indemnização é devida não pelo facto de a construção não se realizar segundo o projecto do autor, mas “por causa a falta de consulta prévia ao autor do projecto...Observe-se enfim que esta indemnização, porque se integra no direito pessoal, cobre os danos não patrimoniais mas não os lucros cessantes do arquitecto em consequência de não ter sido encarregado do projecto. A lei não confere ao arquitecto um exclusivo no projecto de modificações. Por isso pode o dono de obra, consultado o autor do projecto inicial, decidir prosseguir a obra com outro arquitecto” (cfr. José de Oliveira Ascensão, Direito de Autor e Direitos Conexos, Coimbra Editora, pp. 185 a 187).
E a posição mais radical é assumida por Luís Menezes Leitão, para quem o arquitecto não adquire direito à indemnização, entendendo que este artigo 60.º (correspondente ao artigo 144.º da nossa Lei), “reconhece ao arquitecto o direito de fiscalizar a construção e execução da obra de arquitectura, em ordem a assegurar a exacta conformidade com o projecto, não podendo o dono da obra efectuar modificações sem consulta prévia ao arquitecto, sob pena de indemnização por perdas e danos, mas não permite ao arquitecto opor-se a essas modificações. Efectivamente, não faria sentido que o arquitecto pudesse opor-se às modificações de um edifício, uma vez que naturalmente, em caso de conflito entre o direito do proprietário do edifício e o direito de autor sobre o projecto arquitectónico, deverá prevalecer aquele, que é consideravelmente mais importante. Basta, para resolver o conflito, permitir-se ao autor repudiar a concepção do edifício após a modificação do projecto, caso em que o proprietário deixa de poder invocar em seu benefício o nome do autor do projecto original (art. 60º, nº 3). Nesse caso naturalmente que o arquitecto não adquire direito a indemnização…” (Cfr. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito de Autor. 2.ª Edição, Almedina, pp. 157 a 158).
Atento ao que antecede, consensual nas posições doutrinárias, e se bem interpretamos o alcance da norma do artigo 144.º, n.º 2 do referido DL, pese embora a menção expressa da “indemnização por perdas e danos ”, termo habitual para se referir aos danos ocorridos em geral, não há que falar aqui senão na indemnização pelos danos emergentes em sentido técnico jurídico civil, sendo excluídos do seu âmbito os lucros cessantes eventualmente ocorridos por causa da falta da consulta prévia.
Nestes termos expostos, absolve-se os dois Réus deste pedido formulado pelo Autor.
(...)

*
Quid juris?
Perante o decidido e o fundamentado do Tribunal recorrido, é da nossa conclusão que o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis, tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, ex vi do artigo 1º do CPAC, é de manter a decisão recorrida, negando-se provimento ao recurso interposto pelo Autor/Recorrente nesta parte.
*
Prosseguindo:

B – Recurso contra a decisão que decidiu o pedido de não aditar as matérias constantes do artigo 6º a 8º e 15º da PI à Base de Instrução, interposto pelo Autor:

Os artigos em causa contêm o seguinte teor:
      “(...)
      6.º
      O A. é arquitecto conhecido e prestigiado em Macau,
      7.º
      Exercendo a sua profissão na R.A.E.M. há mais de 25 anos, no seu próprio atelier, com dedicação, mérito e brio.
      8.º
      Ao longo da sua carreira, o A. venceu vários concursos públicos de arquitectura, sendo criador da concepção global, assim como do respectivo projecto, a título exemplificativo, das seguintes obras de arquitectura:
      - Estações do Sistema de Metro Ligeiro do segmento C250, de onde foi escolhido o modelo de estação tipo para os restantes segmentos da ilha da Taipa C260 e C270.
      (vd. http://www.mdduq.com/macau/105/LRT.htm);
      - Hospital Psiquiátrico do Centro Hospitalar Conde de S. Januário
      (vd. http://www.mdduq.com/macau/79/Taipa-hospital.htm);
      - Nova Sede da Assembleia Legislativa da R.A.E.M
      (vd. http://www.mdduq.com/macau/47/legaas1.htm);
      - Edifício dos Tribunais Superiores da R.A.E.M.
      (vd. http://www.mdduq.com/macau/32/tribunais1.htm);
      - Biblioteca Internacional da Universidade de C
      (âmbito desta acção).
      (vd. http://www.mdduq.com/macau/33/internlib.htm);
      - Jardim de Infância de D. José da Costa Nunes
      (vd. http://www.mdduq.com/macau/18/kindergarten1.htm);
      - Edifício das instalações do Grande Prémio de Macau
      (vd. http://www.mdduq.com/macau/GP/grandprix.htm), entre outros (Documento 2).
      (...)”

Neste ponto, o Tribunal a quo proferiu a seguinte decisão:
      “Fls. 884 a 886, 895 a 900, 909 a 912 e 913 a 914 dos autos:
      De acordo com o disposto no artigo 430.°, n.º 1 do CPC, o juiz selecciona a matéria de facto, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito. E no n.º 2 do mesmo preceito legal, prevê-se a possibilidade da reclamação da matéria de facto seleccionada com fundamento em deficiência, excesso ou obscuridade.
      Com base na regra acima plasmada, vejamos se as reclamações ora deduzidas são ou não justificadas.
      Quanto à reclamação deduzida pelo Autor:
      Na parte que respeita aos factos assentes:
      Não se admite a correcção requerida em relação às alíneas D), E) e O), os factos aí vertidos são da formulação clara e suficiente. Aliás, o juiz encontra-se apenas vinculado à matéria de facto alegado pelas partes nos articulados, mas não à forma concreta da formulação ou à expressão por elas utilizada.
      Não se admite também, por tratar-se da matéria irrelevante "segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito", a reformulação requerida para as alíneas A), N) e o aditamento em relação às alíneas DD), NN) e QQ).
      Em relação à alínea C), pese embora a impugnação do Autor na sua réplica, o que ele quis realçar é nada mais do que o papel essencial de coordenador técnico que ele ocupava naquela equipa projectista, facto esse que já foi atendido na alínea 1) da Base Instrutória e que não é incompatível com a formulação aqui adoptada.
      Quanto à alínea S), importa que a referência aqui feita para alínea P) não se reporta ao acto de requerimento apresentado em 19/1/2018, mas ao assunto abordado naquele acto, sendo redundante a inclusão da alínea R), por se tratar aí do "segundo pedido de aprovação do projecto".
      Na parte que toca à base instrutória fixada:
      O quesito vertido na alínea 6) é esclarecedor, aliás não se vê o interesse do Autor em propor aquela versão diversa da que consta do despacho saneador.
      Quanto aos quesitos incluídos nas alíneas 7), 8), 9) e 10), pela mesma razão acima assinalada, não se admite as alterações propostas.
      Em relação à inclusão dos novos quesitos 12.° e 13.°, correspondentes aos artigos 35.° e 36.° da petição inicial, e 14.° a 18.°, em correspondência aos artigos 6.° a 8.°, 15.° e 16.° da petição inicial, mais uma vez, os aditamentos aqui sugeridos não incidem sobre a matéria de facto relevante com interesse para boa decisão da causa.
      Nestes termos, é indeferida a reclamação do Autor por ser infundada.
      *
      Quanto à reclamação deduzida pelo 2.° Réu:
      Em relação aos dois quesitos novos cujo aditamento se requer, entendemos o seguinte:
      A matéria proposta no quesito 12.º “O 2.º Réu é totalmente alheio a quaisquer alterações efectuadas na Biblioteca em data anterior a 15 de Dezembro?” a qual constitui uma mera impugnação dos factos já alegados pelo Autor, não carece da quesitação autónoma, sendo possível ao Réu fazer contraprova do facto constante do quesito 6.°.
      Quanto à matéria proposta no quesito 13.°, “O 2.º Réu é apenas responsável pelos três projectos referidos nas alíneas G, J e L dos Factos Assentes, tendo o Autor deles tomado prévio conhecimento, uma vez que foi convidado pelo 2.º Réu a apresentar propostas para aqjudicação dos três serviços em causa?”, a formulação proposta é conclusiva, naquele sentido de tentar definir por esta via o alcance da responsabilidade do 2.° Réu, assim como no de concluir se o Autor tomou prévio conhecimento dos referidos factos, pelo que não se pode aceitar. Aliás, a sua inclusão não se nos afigura necessária porquanto em relação a tal matéria, não deixa de ser possível chegar a uma conclusão num ou noutro sentido, face à globalidade dos factos condensados.
      Pelo que, a sua reclamação também não merece o nosso acolhimento.
      *
      Notifique, nos termos do art.º 431.º, n.º 1 do C.P.C, ex vi do art.º 99.°, n.º 1 do C.P.A.C.
      D.N.”

Tem razão o Tribunal a quo, efectivamente as matérias constantes do artigo 6º a 8º e 15º são irrelevantes para apreciar os pedidos formulados pelo Autor e para efeitos da aplicação do artigo 144º/3 do DL nº 43/99/M, 16 de Agosto.
Não está em causa a fama profissional do Autor, mas sim as alterações introduzidas na obra em causa justifica ou não as indemnizações reclamadas pelo Autor.
Pelo que, na ausência de fundamentos, julga-se improcedente esta parte do recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
*
Relativamente ao pedido da alteração da resposta dada ao quesito 10º, este tem o seguinte teor:
As supra-referidas alterações impuseram um partido plástico e estético estranho à obra originária, com a supressão dos respectivos elementos característicos da Biblioteca, designadamente os que integram a concepção de “três livros e um disco”?
Não provado.

O Colectivo fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:
“(…)
Quanto ao quesito 7º (alteração/legalização de obras anteriormente feitas fora dos trâmites legais) foi determinante o depoimento da testemunha G, a qual, apesar de ter sido demandada pelo autor noutra acção, prestou depoimento claro, pormenorizado, coerente, firme (contrariamente a alguns outros depoimentos produzidos que foram de pendor defensivo, evasivo, interessado e conclusivo) e revelador de razão de ciência por ter sido ela quem, como arquitecta, fez os desenhos necessários à referida “legalização”, os quais manifestavam as obras de alteração que haviam sido executadas.

Relativamente aos quesitos 9º a 11º (repercussão das alterações em termos estéticos) foi determinante para a formação da convicção o depoimento da testemunha G, avaliado nos termos referidos e em conjugação dos os desenhos juntos aos autos por ela elaborados e por ela pormenorizados e explicados em sede de audiência de julgamento.”

Ora, importa destacar os seguintes aspectos:
1) – Não se encontram elementos probatórios suficientes constantes dos autos que imponham uma decisão diversa da fixada pelo Colectivo;
2) – Igualmente não se encontram elementos que apontem para erro na apreciação de provas pelo Tribunal recorrido, nomeadamente a resposta atacada é incompatível com os elementos que serviram de base à convicção do julgador;
3) – O que o Recorrente está a fazer é atacar a convicção do julgador, o que não é motivo suficiente para que o Tribunal ad quem altere a resposta.
4) Pelo que, é de julgar igualmente improcedente esta parte do recurso, mantendo-se a resposta dada ao quesito 10º da BI.
*
Por cautela e nos termos do disposto no artigo 590º e 599º/4 do CPC, a 2ª Recorrida veio pedir a ampliação do objecto do recurso no que se refere à matéria constante dos quesitos 4º, 5º e 8º da BI.
Ora, como o recurso de impugnação da matéria de facto interposto pelo Autor foi julgado improcedente e mantém-se a decisão sobre a matéria de facto, fica prejudicado o conhecimento desta parte do recurso interposto pela Ré por inútil.
*
Prosseguindo,
C – Recurso da decisão final:
Como o presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, importa ver o que este decidiu. Este proferiu a douta decisão com base nos seguintes argumentos:
    
I. Relatório
Autor A, melhor id. nos autos,
Vem intentar a presente
Acção para Efectivação da Responsabilidade Civil Extracontratual
Contra
1.ª Ré REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU e
2.º Réu INSTITUTO DE FORMAÇÃO B
com os fundamentos apresentados constantes da p.i. de fls. 2 a 48 e 836 a 844,
Concluiu pedindo que:
“a) uma indemnização por violação do direito moral do A., em resultado da omissão ilícita da consulta ao autor do projecto originário que foi alvo de modificação, indemnização essa deverá fixada pelo douto Tribunal com base equidade, a qual nunca deverá inferior a MOP646.735,65;
b) uma indemnização a título de dano de perda de chance, equivalente a 50% do valor do projecto de arquitectura apresentado para a Obra de Construção que incide sobre o edifício da “Biblioteca Internacional da Universidade de C”, correndo seus termos junto da DSSOPT sob o n.º 19/MF/2018/L, valor esse se computa em MOP1.293.471,29, ou em alternativa, uma indemnização a fixar pelo douto tribunal com base na equidade;
c) assim como sejam os Réus condenados a suportar quaisquer custas e encargos processuais, aos quais deverá acrescer os custos com procuradoria condigna.
*
O 2.º Réu contestou a acção com os fundamentos de fls. 123 a 159 dos autos.
A 1.a Ré contestou com os fundamentos de fls. 288 a 303v dos autos.
*
O Autor replicou com os fundamentos de fls. 625 a 658 dos autos.
*
Pelo despacho proferido a fls. 875v a 877 dos autos, foram os Réus absolvidos do pedido indemnizatório respeitante ao dano de perda de chance no valor de MOP1,293,471.00.
*
Este Tribunal é o competente em razão da matéria e da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e de legitimidade “ad causam”.
O processo é o próprio.
Inexistem nulidades, ou questões prévias que obstem a apreciação “de meritis”.
*
Procedeu-se a julgamento com observância do devido formalismo.
***

II. Fundamentação

1. De Facto
Dos autos resulta assente a seguinte factualidade com interesse para a decisão da causa:
(...)
***

2. De Direito
Conforme se alega na petição inicial, o ora Autor arroga-se ser autor do projecto de arquitectura da obra do Edifício da “Biblioteca Internacional da Universidade de C”, submetido pela Companhia de Construção e Obras de Engenharia D, Limitada por ocasião do concurso público realizado no ano de 1996, em que a solução arquitectónica foi por ele produzida. Nestes termos ditos, ele, enquanto criador intelectual do projecto arquitectónico em causa, sofreu danos em virtude da lesão do seu direito moral, alegadamente, em resultado das modificações ou alterações que haviam sido introduzidas em 2015 pelos Réus sem tê-lo consultado previamente, devendo portanto ser estes chamados à responsabilização ao abrigo do disposto no artigo 144.º, n.º 2 do DL n.º 43/99/M.

Importa antes determinar a titularidade do direito de autor associado a esta obra arquitectónica, designadamente, do respectivo direito moral.

Desde logo, o que está em causa é a obra que foi concluída em 1997, por uma equipa projectista coordenada pela Companhia de Construção e Obras de Engenharia D, Limitada na execução da empreitada que lhe foi adjudicada pela Fundação de Macau (conforme alíneas B) e C) dos factos assentes). Tratando-se do direito constituído antes da entrada em vigor do DL n.º 43/99/M de 16 de Agosto, a titularidade determina-se com base na lei anterior, isto é, o Código do Direito de Autor aprovado pelo DL n.º 46980, de 27 de Abril de 1966, estendido a Macau pela Portaria n.º 679/71, de 7 de Dezembro, mas com o alcance de protecção concedida por novo diploma, com ressalva dos “negócios jurídicos validamente celebrados face à legislação anterior”, segundo o previsto na norma transitória - o artigo 221.º, n.ºs 1 e 2 do DL n.º 43/99/M.

De acordo com o previsto no artigo 8.º, n.º 1 do Código do Direito de Autor, “O direito de autor pertence ao criador intelectual da obra.” E tal direito não fica excluído segundo o n.º 3 do preceito legal pelo facto de “ela ser feita por encomenda ou por conta alheia ou mesmo no cumprimento de um dever funcional ou de um contrato de trabalho.” No caso em concreto, apesar de ser o trabalho de projecto concluído pela equipa coordenada por D, adjudicatária da empreitada, foi o ora Autor o criador intelectual da obra, por ser ele que desempenhava função do coordenador do projecto de arquitectura, sendo aliás o único arquitecto identificado ao longo de todos os projectos apresentados (conforme resposta aos quesitos 1.º e 2.º da base instrutória).

Assim sendo, na ausência da convenção das partes de que “o direito de autor fica a pertencer à entidade que custear a obra ou a publicar”, a que se refere no artigo 9.º, n.º 1 do Código do Direito de Autor, o Autor enquanto criador intelectual da obra, permanece titular originário do direito de autor associado à mesma, em especial, dos direitos morais ou pessoais nele abrangidos, que são apenas transmissíveis nos termos previstos na lei (cfr. o art. 5.º, n.º 2 do referido Código).

No alcance dado pela norma do artigo 7.º, n.º 3 da nova Lei - DL n.º 43/99/M, o direito pessoal de autor compreende, o direito ao inédito de “manter a obra inédita; (alínea a)), o direito à paternidade da obra, de “reivindicar a paternidade da obra e ser identificado como autor no original, em cada exemplar e em qualquer publicidade” (alínea b)), o direito de retirada, de “retirar a obra de circulação, nos termos do artigo 48.º” (alínea c)), o direito à integridade da obra, de “assegurar a genuinidade e integridade da obra e opor-se a qualquer mutilação ou deformação e, de um modo geral, a todo e qualquer acto que a desvirtue e possa afectar a honra ou reputação do autor” (alínea d)). (A propósito da tipicidade dos direito pessoais, veja-se José de Oliveira Ascensão, Direito de Autor e Direitos Conexos, Coimbra Editora, pp. 167 a 169).

Os danos cuja indemnização aqui é peticionada, resultavam das lesões do direito moral do autor, designadamente na vertente do direito à integridade da obra, em consequência das supostas modificações e alterações introduzidas na obra de projecto de arquitectura da “Biblioteca Internacional da Universidade de C”, sem ser precedida da consulta ao respectivo autor.

Em matéria da tutela do direito à integridade da obra, a regra geral que se aplica é qualquer modificação da obra necessita do acordo do seu autor. Mas convém não ignorar que “a lei não quer aqui estabelecer nada que se pareça com uma soberania do autor sobre a utilização da obra. Não são todas e quaisquer modificações que são consideradas violações da integridade da obra, mas apenas aquelas que prejudiquem a obra ou atinjam a honra ou a reputação do autor” (cfr. obra. cit. p.180).

Nesta linha, conforme se depreende da norma do artigo 7.º, n.º 3 do DL, as alterações que desvirtuem a obra, ou a prejudiquem, ou atinjam a honra ou a reputação do autor são consideradas como violadoras do direito à integridade da obra e legitimam o respectivo autor, que não tenha dado o seu consentimento, a exercer o poder de oposição às modificações ocorridas, nos termos previstos na alínea d) do preceito legal.

Por outro lado, as alterações ou melhor, adaptações que não desvirtuem a obra, necessárias à sua utilização pela forma autorizada não carecem mais do consentimento ou autorização por parte do autor, segundo o estabelecido no artigo 46.º, n.ºs 1 e 2 do referido DL.

No entanto, sendo a obra protegida a de arquitectura, situamo-nos no âmbito do regime excepcional. Dispõe o artigo 144.º do DL n.º 43/99/M o seguinte:
“1. O autor de obra de arquitectura, ou de obra plástica incorporada em obra de arquitectura, tem o direito de fiscalizar a respectiva construção ou execução em todas as fases e pormenores, de maneira a assegurar a exacta conformidade dessa construção ou execução com o projecto, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2. O dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem é livre de, quer durante a construção ou execução, quer após a sua conclusão, introduzir nela as alterações que desejar, mas deve consultar previamente o autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos.
3. Não havendo acordo entre o dono da obra e o autor do projecto, pode este repudiar a paternidade da obra modificada, ficando vedado ao proprietário invocar para o futuro, em proveito próprio, o nome do autor do projecto inicial.” (sublinhado nosso).

Pois bem, ao contrário do que sucede no regime geral, o dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem, é livre de introduzir nela as alterações, quer modificações, quer meras adaptações, por ele desejadas, sendo este apenas incumbido do dever de consulta prévia ao autor – conforme disposto no n.º 2 do preceito legal. Importa, porém, que a consulta prévia aqui exigida não visa obter nenhuma autorização ou consentimento do autor para as alterações desejadas, porquanto ainda que o autor se contenda com as mesmas, nada poderá fazer senão repudiar a paternidade desta, isto é, não aceitar que a autoria da obra continua a lhe ser imputada, assim “ficando vedado ao proprietário invocar para o futuro, em proveito próprio, o nome do autor do projecto inicial” – segundo se prevê no n.º 3. Tendo sido repudiada a paternidade, só ocorrerá violação do direito à integridade da obra, se esta continuar a ser usada pelo dono da obra como criação do autor original.

Como tal, constata-se, no conflito entre o direito de autor do projecto de arquitectura e o direito de propriedade sobre o suporte, uma subordinação da integridade da obra à respectiva funcionalidade. Ficará mais reduzida a protecção do autor das obras de arquitectura do que em termos gerais, que se encontra na dependência das exigências técnicas do construtor e do gosto do dono de obra. (cfr. António de Sá e Melo, Manual de Direito de Autor e Direitos Conexos, pp.160 a 161)

Se assim é, os danos ressarcíveis que se possa reclamar ao abrigo do citado artigo 144.º, n.º 2 do DL são relativamente limitados. A indemnização é devida não pelo facto de a construção não se realizar segundo o projecto do autor, mas por causa da falta de consulta prévia ao autor do projecto. Em termos mais precisos, é em consequência dessa falta da consulta prévia, que não foi ao autor dada a oportunidade de repudiar a paternidade da obra modificada, e desse modo, a autoria da mesma continua a ser lhe imputada. Aí para efeito indemnizatório, o nexo de imputação que se deva estabelecer entre a omissão indevida da consulta prévia e os danos daí decorrentes. Por outras palavas, a existência da norma do artigo 144.º n.º 2, donde resulta o direito de indemnização do autor do projecto pela falta da consulta prévia não prescinde do apuramento da verificação da lesão do direito moral e dos danos efectivos provocados, como seu pressuposto.

E ademais, recapitulando, do que se trata aqui não é de qualquer modificação da obra – mas tão-só aquelas que “a desvirtue e possa afectar a honra ou reputação do autor” – conforme o artigo 7.º, n.º 3, alínea d) do DL – em suma, as modificações aptas a lesar o direito à integridade da obra e provocar os danos consequentemente.

Na situação vertente, invertemos a ordem das questões a apreciar e começamos por dizer que as verificadas alterações da obra não atribuem o direito de indemnização ao respectivo autor, ainda que tivesse sido comprovada a omissão indevida da consulta prévia.

Pois, segundo a matéria de facto dada como provada, as alterações introduzidas à obra de arquitectura, designadamente, as “documentadas nas bases digitais das plantas de todos os pisos de actual edifício do Campus do Instituto de Formação B”, eram “circunscritas ao espaço interior do edifício da Biblioteca” (conforme resposta aos quesitos 6.º e 11.º da base instrutória). Por outro lado, resultou não provado que “As supra-referidas alterações impuseram um partido plástico e estético estranho à obra originária, com a supressão dos respectivos elementos caraterísticos da Biblioteca, designadamente, os que integram a concepção de “três livros e um disco” (conforme apurado na alínea d) dos factos assentes, e resposta ao quesito 10.º da base instrutória). Neste sentido, as alterações realizadas mostram-se irrelevantes para os efeitos indemnizatórios pretendidos.

Portanto, nada permite concluir nos termos que concluiu o Autor conforme se alega nos artigos 170.º a 175.º da petição inicial: não ocorreu a mutilação nem a deformação da obra da sua autoria, nem qualquer outro acto que a desvirtue e possa afectar a honra ou reputação do autor, susceptível de lesar o direito à integridade da obra, mas sim apenas as alterações no espaço interior do edifício. Em que medida as ditas alterações puramente funcionais sejam ainda lesivas da honra ou reputação do Autor, ele próprio não alegou, nem existe elemento trazido ao processo para responder.

Nestes termos, somos de concluir que inexistiam, neste caso, danos ressarcíveis como decorrentes de lesão do direito moral do Autor (em especial, o direito à integridade da obra), por modo a conferir-lhe o direito à indemnização.

Em segundo lugar, apesar de ter sido o 2.º Réu, a quem foi cedido o edifício da Biblioteca em 7/10/2015, e quem dirigiu em 19/1/2018 o primeiro pedido de aprovação do projecto de modificação, na fase de projecto, à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, assim como o segundo pedido de aprovação, em 18/12/2018, instruído na modalidade de “modificação/legalização (conforme apurado nas alíneas F) e P), R) dos factos assentes), não foi dado como provado que “até à data 15/12/2015, sem consulta prévia ao Autor, foram introduzidas pelos dois Réus as alterações documentadas nas bases digitais das plantas de todos os pisos do actual edifício do Campus do Instituto de Formação B” (conforme resposta ao quesito n.º 6 da base instrutória). Aliás, “o projecto de alteração cuja aprovação se requer na alínea P) dos Factos Assentes já se encontrava executado antes da apresentação do respectivo pedido” (conforme resposta ao quesito 7.º da base instrutória).

Pelo que, além da inexistência das alterações susceptíveis de causar danos ao Autor, é ainda evidente que as mesmas não são comprovadamente imputáveis aos dois Réus aqui demandados, o que impõe a absolvição destes dos pedidos formulados pelo Autor.
***

III. Decisão
Assim, pelo exposto, decide-se:
Julgar improcedente a acção e em consequência, absolver a 1.a Ré RAEM e o 2.º Réu Instituto de Formação B dos pedidos formulados pelo Autor A.
*
Custas pelo Autor.
*
Registe e notifique.
*
Quid juris?
Ora, bem vistas as coisas, é de verificar-se que, praticamente, todas as questões levantadas pelo Recorrente já foram objeto de reflexões e decisões por parte do Tribunal recorrido, e nesta sede, não encontramos vícios que demonstrem a incorrecta aplicação de Direito, muito menos os alegados vícios invalidantes da decisão atacada.
Perante o decidido e o fundamentado do Tribunal recorrido, é da nossa conclusão que o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis, tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, ex vi do artigo 1º do CPAC, é de manter a decisão recorrida, negando-se provimento ao recurso interposto pelo Autor/Recorrente.
*
Síntese conclusiva:
Para efeitos da indemnização prevista no nº 2 do artigo 144.º (2. O dono de obra construída ou executada segundo projecto da autoria de outrem é livre de, quer durante a construção ou execução, quer após a sua conclusão, introduzir nela as alterações que desejar, mas deve consultar previamente o autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos.) do DL n.º 43/99/M, de 16 de Agosto, entre outros elementos, é preciso apurar o nexo de imputação entre a omissão indevida da consulta prévia e os danos daí decorrentes. Por outras palavas, o artigo 144.º n.º 2, do citado DL (direito de indemnização do autor do projecto pela falta da consulta prévia) não prescinde do apuramento da verificação da lesão do direito moral e dos danos efectivos provocados.

*
Tudo visto, resta decidir.
* * *
    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento aos recursos (interlocutório e contra a decisão final) interposto pelo Autor/Recorrente, confirmando-se a sentença recorrida do TA.
*
Custas pelo Recorrente.
*
Notifique e Registe.
*
RAEM, 04 de Julho de 2024.
Fong Man Chong
(Relator)
Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong
(Segundo Juiz-Adjunto)



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