Processo nº 176/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data do Acórdão: 11 de Julho de 2024
ASSUNTO:
- Direito à informação dos sócios
SUMÁRIO:
- O direito à informação do sócio traduz-se no:
※ Direito à consulta mas apenas dos documentos elencados na lei, só podendo obter cópias nos casos indicados.
※ Direito à informação em sentido estrito quanto a matéria da ordem de trabalho da Assembleia Geral razoavelmente necessário ao exercício do direito de voto, e informação escrita sobre a gestão da sociedade ou qualquer operação social em particular.
※ Direito à inspecção quanto a factos que consubstanciem suspeitas de graves irregularidades da vida da sociedade.
- No Código Comercial de Macau o direito de consulta do sócio cinge-se aos documentos elencados no artº 209º do C.Com..
- Da alínea g) do nº 1 do artº 209º do C.Com. não resulta um “direito a consultar” mas um “direito à informação em sentido estrito” o qual não abrange a possibilidade de consulta de todo e qualquer documento.
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 176/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 11 de Julho de 2024
Recorrentes: A, Limitada, B, C, D, E, F e G
Recorrida: H Limitada
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
1. RELATÓRIO
H Limitada, com os demais sinais dos autos,
Veio requerer exame judicial à sociedade contra
A, Limitada, B, C, D, E, F e G, todos, também, com os demais sinais dos autos.
Vem a Requerente pedir que seja ordenado:
A. O fornecimento por todos os requeridos das informações seguintes imediatamente/no prazo indicado por V. Ex.ª, ao abrigo do art.º 1263.º, n.º 1 do Código de Processo Civil:
a. As correspondências, os documentos sobre os pedidos e os relatórios eventualmente tidos durante todos os anos com o governo da RAEM, o Chefe do Executivo, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas, o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigo Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético) e outros serviços públicos, faca ao projecto de gás natural que à 1.ª requerida foi concedido;
b. Actas de assembleia de sócios eventualmente realizada desde a constituição da 1.ª requerida;
c. Actas das reuniões realizadas em 2021 entre a 1.ª requerida ou a I, como uma das accionistas da 1.ª requerida, com o governo da RAEM, a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental), a empresa subsidiária do J e a parte terceira, face à concessão do serviço público de importação e transporte de gás natural; caso não existisse a acta de reunião, favor de especificar, por inscrito e em forma de relatório, o conteúdo de tais reuniões;
d. Os contratos de renovação, as condições de renovação e os documentos respeitantes à discussão das cláusulas elaborados entre a 1.ª requerida e o governo da RAEM no período entre 2018 e 2020, face à concessão em causa;
e. Os documentos respeitantes ao direito de prioridade atribuído pelo contrato de concessão em causa que chegaram exercer todos os requeridos;
B. Nos termos do art.º 211.º, n.ºs 2 e 3 do Código Comercial e do art.º 1263.º, n.º2 do Código de Processo Civil, seja designado um auditor para proceder ao exame dos itens seguintes, pelo que, sugere-se que seja designada a empresa de auditores K ou auditor desta, como possui especialização em contabilidade (com sede em Macau na Avenida de XX n.ºXX, Edif. XX, XXº andar):
a. A deliberação relativa à distribuição de prémios de desempenho aos cinco membros da Comissão Executiva, aprovada na assembleia extraordinária de sócios realizada em 22 de Janeiro de 2018, em particular, deve indicar quais os cinco membros que foram distribuídos, os montantes recebidos e a forma de cálculo de tal montante;
b. Matéria relativa à substituição da carta de garantia bancária e o fluxo do valor de MOP30.000.000 da original carta de garantia após a troca;
C. Tendo em consideração que os 2.º a 8.º requeridos, durante o exercício de funções como administradores da 1.ª requerida violaram gravemente os seus deveres, constituindo a justa causa de destituição, nos termos do art.º 389.º, n.º5 do Código Comercial, pelo que, pede-se sinceramente a V.Ex.ª que, nos termos do art.º 211.º, n.º5 do Código Comercial, no apuramento das respectivas irregularidades, seja ordenada a destituição das funções dos 2.º a 8.º requeridos como administradores da 1.ª requerida; e
D. Nos termos do art.º 211.º, n.º6 do Código Comercial, seja condenada a 1.ª requerida a suportar as custas e remunerações de auditor;
E. Ao mesmo tempo, seja julgado que a 1.ª requerida tem direito de regresso contra os 2.º a 8.º requeridos face às irregularidades, bem como seja fixado o montante de indemnização;
F. Nos termos do art.º 1262.º, n.º2 do Código de Processo Civil, sejam citados todos os requeridos, para, querendo, deduzir a oposição no prazo legal.
Citados os Requeridos vieram estes deduzir oposição.
Pelo Tribunal Recorrido foram julgadas improcedentes as excepções de ineptidão da forma de processo e de ilegitimidade, vindo a julgar-se parcialmente procedente a acção nos seguintes termos:
- Nos termos do artigo 1263.º, n.º 1 do CPC, ordenar os 1ª a 7º requeridos a prestar à requerente, no prazo de 30 dias, a seguinte informação: a. Correspondência, documentos de pedido e relatórios, se os houver, entre a 1ª requerida e o Governo da RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas e o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigamente o GDSE), ao longo dos anos, em relação ao projecto de gás natural concedido à 1ª requerida; b. Actas das reuniões da assembleia geral realizadas desde a constituição da 1ª requerida (com excepção das actas das reuniões da assembleia geral realizadas entre o ano de 2017 e o ano de 2021).
- Indeferir o pedido da requerente de ordenar os 1ª a 7º requeridos a fornecer os documentos referidos nas alíneas c., d. e e. da Alínea(sic) A dos Pedidos Finais;
- Deferir a realização de exame judicial ao seguinte facto da 1ª requerida (a deliberação tomada na reunião extraordinária da assembleia geral realizada em 22 de Janeiro de 2018 no sentido de distribuir prémios de desempenho a cinco membros da comissão executiva, devendo apurar, inclusivamente, quem foram os referidos cinco membros, os montantes dos prémios recebidos e o modo de cálculo desses montantes);
- Indeferir o exame judicial ao facto relativo à substituição de banco subscritor de garantia e ao paradeiro da quantia de 30.000.000,00 patacas da garantia original;
- Julgar parcialmente procedente a excepção de abuso de direito deduzida pelos 1ª a 3º e 5º a 7º requeridos, e não apreciar o requerimento de exame à sociedade apresentado pela requerente com fundamento na confusão das contas da 1ª requerida;
- Julgar improcedente a excepção de irregularidade na forma de processo deduzida pelos 2º a 7º requeridos em relação à Alínea C dos Pedidos Finais;
- Concluído o exame judicial, considerar se devem ser tomadas medidas contra os 2º a 7º requeridos (Alínea C dos Pedidos Finais), e determinar o responsável pelas custas processuais e remuneração do auditor (Alínea D dos Pedidos Finais);
- Quanto à Alínea E dos Pedidos Finais, absolver os requeridos da acção.
A fim de designar o auditor responsável pelo exame, foi enviada uma carta à Comissão Profissional dos Contabilistas solicitando a recomendação de um auditor para intervir como perito neste processo.
Nomeio o auditor recomendado pela Comissão Profissional dos Contabilistas como perito responsável pela realização do exame judicial, fixando-lhe um prazo de 45 dias para o efeito, com o seguinte objecto do exame: os factos relativos à deliberação tomada na reunião extraordinária da assembleia geral, realizada em 22 de Janeiro de 2018, no sentido de distribuir prémios de desempenho a cinco membros da comissão executiva, inclusivamente, quem foram os referidos cinco membros, os montantes dos prémios recebidos e o modo de cálculo desses montantes.
Não se conformando com aquela sentença vieram todos os Requeridos interpor recurso da mesma sendo que:
- Pela A, Limitada foram apresentadas as seguintes conclusões de recurso:
1) Antes de tudo, o juízo recorrido entende que a recorrente ofendeu o direito à informação da recorrida, ordenando à recorrente a prestação da correspondência, dos requerimentos e relatórios nos anos passados, caso existam, sobre o projecto de gás natural adjudicado à recorrente entre esta e a RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas (STOP), o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (DDGSE, anteriormente o Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético,GDSE) e outros departamentos governativos.
2) A recorrente não nega que a recorrida, enquanto sócia, tem direito à informação legalmente prevista. No entanto, no parecer da recorrente, o direito à informação conferido pela lei não pode ser exercido sem qualquer restrição ou totalmente à vontade sem norma. No que toca ao presente caso, segundo a recorrente, a documentação solicitada pela recorrida excede o âmbito do direito à informação exercível por esta e que deve ficar sujeita a devidas restrições.
3) Tal como aponta o TSI no acórdão n.º 682/2022, o direito à informação do sócio de sociedade é constituído pelo direito à informação em sentido estrito, pelo direito à consulta e pelo direito à inspecção. É antes o relatório sobre a gestão da sociedade elaborado pela administração a que o sócio tem direito, em vez da documentação sobre a gestão da sociedade que se pode obter directamente mediante solicitação.
4) Além disso, a sentença n.º CV2-18-0028-CPE proferida pelo 2.º Juízo Cível do TJB que foi citada pelo TSI no acórdão n.º 682/2022 também aponta que o relatório a que o sócio tem direito tem a ver, obrigatoriamente, com questões concretas sobre a gestão da sociedade, sobretudo a respeito de actividades determinadas da exploração; não se tratando de um relatório global sobre a gestão da sociedade.
5) A recorrida é uma das sócias da recorrente. A recorrente nunca lhe negou o direito à informação que a recorrida tem. Porém, nos termos do art.º 209.º, n.º 1, alínea g) do Código Comercial e com base na jurisprudência acima citada, a informação a ser colocada à disposição por parte da recorrente conforme a sentença recorrida já excede de longe o âmbito estabelecido pela lei do direito à informação exercível pelo sócio da sociedade.
6) De facto, a recorrida nunca pediu obter relatórios sobre a gestão da sociedade elaborados pela administração; nem no presente processo formulou tal pedido.
7) O tribunal a quo, no entanto, mandou na sentença recorrida que a recorrente prestasse a correspondência, os requerimentos e relatórios nos anos passados, caso existissem, entre esta e a RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas (STOP), o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (DDGSE, anteriormente o Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético,GDSE) e outros departamentos governativos, o que violou evidentemente o art.º 209.º, n.º 1, alínea g) do Código Comercial, excedendo largamente o âmbito do direito conferido pelo próprio direito à informação.
8) Dado que a única actividade da recorrente era executar o Contrato de Concessão do Serviço Público de Importação e Transporte de Gás Natural na Região Administrativa Especial de Macau, ao exercer o direito à informação, a recorrida devia esclarecer o fundamento de facto ou o motivo por que se solicitava à administração da recorrente prestar os relatórios de gestão da recorrente, em vez de exigir em termos gerais a prestação da totalidade de correspondência, requerimentos e relatórios com os serviços do governo.
9) Além disso, na petição inicial a recorrida mencionava que alguns documentos prestados pela recorrente não tinham a ver com o contrato de concessão.
10) Portanto, resulta do comentário da recorrida sobre a documentação prestada pela recorrente que a recorrida, já com uma ideia bem definida sobre a documentação a que queria ter acesso, considera que nem todas as informações prestadas pela recorrente têm a ver com o contrato de concessão.
11) Além disso, a recorrente, enquanto sociedade detentora de exclusivo que fornecia gás natural nos cursos superior e mediano em Macau, quando se tratava de obras de construção públicas de instalação de gasodutos nos cursos superior e mediano, era dever da Administração entrar em contacto com a recorrente por carta para inquirir sobre o impacto das obras de construção públicas na instalação de gasodutos e a fim de certificar-se da segurança dos gasodutos. Estava em causa um grande número de correspondência, de projectos, de propostas e de relatórios com uma multiplicidade de serviços governativos, incluindo mas não só, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT, agora a Direcção dos Serviços de Obras Públicas, DSOP), o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (anteriormente o Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético) e o IAM (anteriormente o IACM).
12) Tendo em conta o facto de que é desde há umas décadas que a recorrente mantém a correspondência com a RAEM e os outros serviços do governo e a quantidade gigantesca dos documentos, está em causa uma pletora de conteúdos, como por exemplo projectos de gasodutos, desenhos de géneros mais variados de obras de construção pública e propostas, que variam em números na ordem de umas dezenas de milhares de páginas. Tal documentação, obviamente, não tem a ver com o contrato de concessão.
13) No presente caso, a recorrida insiste na afirmação unilateral de que a recorrente terá faltado a promover a renovação nas negociações com o governo sobre a renovação do contrato de concessão, nem exercido o direito de preferência; de que terá recusado várias vezes prestar à recorrida informações sobre a operação da sociedade, o que demostra que na realidade, a recorrida só desejava obter a documentação concernente a renovação do contrato de concessão e o direito de preferência.
14) Ao formular o pedido, no entanto, ampliou excessivamente a âmbito dos documentos solicitados, ultrapassando de longe o âmbito de direito à informação delimitado pelo art.º 209.º, n.º 1, alínea g) do Código Comercial, sem indicar a documentação em relação a que assunto em específico a ser prestado pela recorrente, pelo que o juízo a quo não devia ter deferido o pedido na sentença recorrida.
15) Já para não mencionar o facto de que tal como referido atrás, o art.º 209.º, n.º 1, alínea g) do Código Comercial confere ao sócio apenas o direito de obter o relatório sobre a gestão da sociedade elaborado pela administração, em vez da documentação sobre a gestão da sociedade que se pode obter directamente mediante solicitação.
16) Além disso, nos termos do art.º 49.º do Código Comercial, a recorrente devia conservar a documentação durante só 5 anos. Ou seja, passado os cinco anos, a recorrente, na qualidade de empresária comercial, já não se obriga à conservação.
17) De facto, a documentação nos “anos passados” que o tribunal a quo exige à 1.ª requerida prestar vai para além do âmbito do dever de conservação da recorrente.
18) Portanto, na opinião da recorrente, o tribunal a quo aplicou erradamente o art.º 49.º e o art.º 209.º, n.º 1, alínea g) do Código Comercial, violando ambos os artigos, pelo que é de revogar a decisão na sentença recorrida dirigida aos requeridos 1.ª - 7.º de prestar “a correspondência, os requerimentos e relatórios nos anos passados, caso existam, sobre o projecto de gás natural adjudicado à 1.ª requerida entre esta e a RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas (STOP), o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (DDGSE, anteriormente o Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético,GDSE) e outros departamentos governativos”, mudando a decisão no sentido de indeferir o requerimento; no caso de divergência, é de modificar a decisão exigindo a prestação da correspondência, dos requerimentos e relatórios datados apenas dos cinco anos mais recentes, caso existam, com a RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas (STOP), o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (DDGSE, anteriormente o Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético,GDSE) e outros departamentos governativos.
19) Além disso, o tribunal a quo também ordenou que a recorrente prestasse as actas de assembleia de accionistas (excepto as actas de assembleia de accionistas dos anos compreendidos entre 2017 e 2021) desde a sua fundação.
20) É imprescindível indicar que desde a fundação da recorrente em 2006 até 2016, era sempre a recorrida que administrava a recorrente. A recorrida estava encarregada de convocar reuniões da assembleia de accionistas. Então, a recorrida está a par, pelo menos das actas da assembleia de accionistas desde a fundação da sociedade até 2016 e detém-nas. A recorrida vem agora, porém, solicitar as actas nos anos passados à recorrente. É um pedido deveras imotivado!
21) Desde Dezembro de 2016 quando a recorrida vendeu 45% das suas acções à I, Limitada (doravante designada simplesmente por “I”), detém apenas 5% das acções, enquanto os outros 95% estão em posse da L (doravante designada simplesmente por “I”) e da I.
22) Como a partir daquele momento é que a accionista qualificada da recorrente é a I, então conforme o estatuto da sociedade comercial da recorrente, a I nomeia representante da companhia como presidente da mesa da assembleia geral. Ou seja, só a partir daquele momento é que são os representantes da I que estão encarregados de convocar reuniões da assembleia de accionistas.
23) Tal como referia o tribunal a quo, a recorrente já prestou à recorrida as actas da assembleia de accionistas de 2017 a 2021. Desde 2021 até à data de apresentação das presentes alegações, a recorrente convocou duas reuniões da assembleia de accionistas, mais precisamente em 15/01/2022 e em 30/05/2023. Já foram prestadas cópias das actas das reuniões da assembleia de accionistas à recorrida.
24) Verdade seja dita, a recorrente nunca recusou prestar actas da assembleia de accionistas, pois até submeteu as actas das reuniões realizadas entre 2010 e 2016 mesmo na oposição. Segue daqui que a recorrente nunca recusou a prestação das actas da assembleia de accionistas e que o direito à informação da recorrida nesse aspecto já está satisfeito.
25) Dado o erro notório por parte do juízo recorrido no apuramento e na apreciação da matéria de facto, a recorrente pede ao Mm.º Juiz revogar a decisão contida na sentença recorrida de ordenar a prestação das actas de assembleia de accionistas (excepto as actas de assembleia de accionistas dos anos compreendidos entre 2017 e 2021) desde a fundação da 1.ª requerida, mudando a decisão no sentido de indeferir o pedido.
26) Por fim, a ver do juízo recorrido, há irregularidades no pagamento do bónus de desempenho no ano 2018, pelo que se continua o exame judicial.
27) Porém, por um lado, o tribunal a quo entende que não era irrazoável que a recorrente em 2018 tivesse pague à comissão executiva e a todo o pessoal o bónus de desempenho referente ao exercício 2017, dando por inexistente qualquer irregularidade no caso da recorrente; por outro lado, menciona que visto que a recorrida não participou na 2.ª reunião extraordinária da assembleia de accionistas de 2018 (ou seja em 22/01/2018) realizada pela recorrente e que o bónus não foi declarado na Declaração Anual de Rendimentos entregue à DSF, dá-se por prováveis irregularidades administrativas no caso da recorrente.
28) O tribunal a quo começou por julgar razoável a decisão tomada durante a reunião da assembleia de accionistas de 2018 sobre o pagamento do bónus de desempenho referente ao exercício 2017 à comissão executiva e a todo o pessoal, não havendo nada de inapropriado; só para depois acusar irregularidades administrativas no caso da recorrente. Na fundamentação da sentença recorrida vê-se evidentemente conclusões contraditórias.
29) Uma vez dado por certo que não há irregularidade no pagamento efectuado em 2018 pela recorrente do bónus de desempenho referente ao exercício 2017 à comissão executiva e a todo o pessoal, a recorrente não teria tido qualquer necessidade de subtrair isso ao conhecimento da recorrida.
30) De facto, a recorrente nunca esconsou o facto da recorrida. À luz do doc. 24 da petição da recorrida, na “reunião ordinária anual da assembleia de accionistas de 2018” realizada em 23/05/2019, os accionistas discutiram e verificaram sobretudo a conta anual e o relatório respeitante ao exercício e aprovaram-nos.
31) Se bem que a recorrida não tenha participado na reunião deliberativa de 22/01/2018 que aprovou o bónus de desempenho no montante de MOP 830.000,00, presenciou, porém, a reunião deliberativa da assembleia de accionistas de 23/05/2019 que aprovou a conta anual e o relatório respeitante ao exercício 2018. A recorrida terá também lido minuciosamente a conta anual e o relatório respeitante ao exercício resultante daquela reunião. Na conta anual está incluído o bónus de desempenho distribuído. A recorrida não levantou qualquer pergunta na reunião.
32) O que importa é o facto de que o tribunal a quo confirmou o hábito de longa data da recorrente de distribuir gratificações. Mesmo em 2016 em que se registou uma perda de 47.584.000,00, a recorrida confirmou a distribuição de bónus no montante de MOP 300.000,00, como gratificação pela segurança da operação. A recorrida, portanto, estava ao corrente do uso de distribuir gratificações e estava de acordo.
33) A Lei das Relações de Trabalho vigente dita que se distinguem entre a remuneração de base e a remuneração variável. Na remuneração de base estão incluídas as prestações periódicas, ao passo que a remuneração variável se refere a prestações não periódicas. O bónus aqui em causa é evidentemente uma forma de remuneração variável. Portanto, não é de todo banido que a recorrente qualifique o bónus pague aos empregados como “ordenados e salários”. O mais essencial é que a recorrente tenha declarado veridicamente o salário que cada empregado tinha recebido, incluindo as gratificações.
34) Além disso, nunca é qualificável como “irregularidade” administrativa a declaração ou não do bónus distribuído na rubrica “gratificações” da discriminação dos gastos com o pessoal na “Declaração de Rendimentos - Grupo A do Imposto Complementar de Rendimentos”.
35) Perante tais pressupostos de facto, a sentença recorrida ordenou que se procedesse ao exame judicial sobre a distribuição de bónus por parte da 1.ª requerida. Salvo o devido respeito, a recorrente considera que a sentença recorrida enferma do vício de oposição entre o fundamento e a decisão.
36) Nos termos do art.º 571.º, n.º 1, alínea c) do CPC, é nula a sentença que enferma do vício acima referido.
37) Com base no acima referido, é de revogar a sentença recorrida na parte de “Defere-se proceder ao exame judicial sobre os seguintes assuntos da 1.ª requerida (acerca da distribuição do bónus de desempenho aos 5 membros da comissão executiva aprovada na deliberação durante a reunião extraordinária da assembleia de accionistas realizada em 22/01/2018, incluindo os membros a quem se distribuiu o bónus de desempenho, o montante que cada um recebeu e a modalidade de cálculo do montante)” e de “Agora nomeia-se imediatamente o auditor sugerido pela Comissão Profissional dos Contabilistas como o perito encarregado do exame judicial. O período do exame judicial está fixado, de 45 dias. Eis o objecto do exame judicial: acerca da distribuição do bónus de desempenho aos 5 membros da comissão executiva aprovada na deliberação durante a reunião extraordinária da assembleia de accionistas realizada em 22/01/2018, incluindo os membros a quem se distribuiu o bónus de desempenho, o montante que cada um recebeu e a modalidade de cálculo do montante.”
- Pelos 2º a 7º Requeridos foram apresentadas as seguintes conclusões de recurso:
1. Em 19 de Janeiro de 2022, a H Limitada (ou seja, “recorrida”) intentou a acção de exame à sociedade contra os 2º a 7º recorrentes, pedindo ordenar-lhes oferecer uma série de documentos e reconhecer o seu direito de demanda da indemnização contra eles pela qualquer irregularidade eventual.
2. Após realizada a audiência, o Tribunal a quo deu provimento parcial à acção.
3. Salvo o devido respeito, os 2º a 7º requeridos entendem que a decisão de dar provimento parcial aos recorrentes (sic.), proferida pelo Tribunal a quo, padece dos vícios da contradição entre os fundamentos e a decisão e do erro na aplicação do Direito.
a. Contradição entre os fundamentos e a decisão
4. No caso, o Tribunal a quo entendeu que a atribuição de prémios de desempenho de 2017 pela 1ª requerida à Comissão Executiva e empregados mesmo se registando perda naquele ano não manifestou irregularidade grave. Porém, por outro lado, apoiou o pedido do exame do destino dos prémios com fundamento na possibilidade de esquivar-se da recorrida ao atribuir os prémios.
5. Desde que o Tribunal a quo já reconheceu que a atribuição dos prémios não gerou irregularidade, não devia (nem era necessário) esquivar-se da requerida (sic.) ao fazê-lo.
6. A recorrida não compareceu na assembleia de 22 de Janeiro de 2018, em que se aprovou por deliberação a atribuição dos prémios no montante de MOP$830.000,00, mas participou na assembleia de accionistas de 23 de Maio de 2019, em que se aprovaram por deliberação a Conta de Exercício do ano 2018 e a informação (vide a fls. 9 do doc. 24 do requerimento).
7. De resto, a 1ª requerida é contribuinte do Imposto Complementar Grupo A, todas as suas despesas são averiguadas pelo auditor (vide o doc. 24 do requerimento).
8. E mais, ao abrigo do art.º 58.º da Lei das Relações de Trabalho, a retribuição do trabalho compreende a remuneração de base e a remuneração variável, e os prémios constituem um tipo de remuneração variável.
9. Por isso, não se pode excluir a possibilidade de a 1ª requerida ter integrado os prémios recebidos pelos empregados em “Ordenados e salários”.
10. Pelo que, a declaração ou não da atribuição dos prémios no branco de “gratificações” da “Discriminação dos gastos com o pessoal” da “Declaração Anual de Rendimentos (Grupo A do Imposto Complementar de Rendimentos)” não constitui qualquer “irregularidade” na gerência.
11. Em face desses factos, o Tribunal a quo autorizou o exame judicial à matéria de atribuição dos prémios, salvo o devido respeito, os 2º a 7º requeridos entendem que existe contradição entre os fundamentos e a decisão a quo. Ao abrigo do art.º 571.º n.º 1 alínea c) do CPC, é nula a sentença quando padeça do referido vício.
12. Pelo que, devem ser revogadas as seguintes partes da decisão do Tribunal a quo: “É autorizado o exame judicial a realizar à 1ª requerente sobre o seguinte assunto (quanto ao assunto de atribuição de prémio de desempenho a 5 membros da Comissão Executiva, aprovado por deliberação da assembleia de accionistas especial de 22 de Janeiro de 2018, incluindo a fixação dos membros receptores do prémio de desempenho, os respectivos valores e o método de cálculo)”, e “Agora nomeia-se imediatamente o auditor a propor pela Comissão Profissional dos Contabilistas como examinador para proceder ao exame judicial a realizar com o prazo de 45 dias, tendo por objecto o assunto de atribuição de prémio de desempenho a 5 membros da Comissão Executiva, aprovado por deliberação da assembleia de accionistas especial de 22 de Janeiro de 2018, incluindo a fixação dos membros receptores do prémio de desempenho, os respectivos valores e o método de cálculo.”
b. Erro na aplicação do Direito
i. Erro na aplicação do art.º 1207.º n.º 5 do CPC e art.º 209.º n.º 5 do Código Comercial
13. Na fundamentação o Tribunal a quo indicou que, a 2ª espécie de documentos (actas das reuniões da assembleia geral) oferecidos pelos 2º a 7º requeridos são incompletos, portanto, ordenou-os a fornecer os respectivos documentos.
14. Todavia, segundo o depoimento da testemunha M, prestado na audiência, de 17:30 a 20:56, (vide Recorded on 24-Feb-2023 at 16.40.57(4$O@4X@G01920319)), de facto, a recorrida tem as actas das reuniões da assembleia geral de vários anos.
15. Acresce que, de acordo com o doc. 1 do requerimento, o administrador da recorrida é N. E segundo o doc. 2 do requerimento, o referido indivíduo foi nomeado por ela, de 2006 até 28 de março de 2018, como administrador da 1ª requerida.
16. Quando desempenhava o papal de administrador como representante da recorrida, a recorrida já obteve todos os livros da Companhia.
17. Ao abrigo do art.º 1207.º n.º 5 do CPC, o Tribunal deve investigar oficiosamente e considerar os referidos factos.
18. Pelo que, os factos são suficientes para concluir que está satisfeito o direito à informação da recorrida, assim sendo, não está preenchido o pressuposto de requerimento do exame judicial, previsto pelo art.º 209.º n.º 5 do Código Comercial.
19. Com base nisso, deve ser revogada a decisão de ordenar os 1ª a 7º requeridos a oferecer à requerente dentro de 30 dias as actas das reuniões da assembleia geral realizadas desde a instituição da 1ª requerente (salvo as dos anos 2017 a 2021), substituindo-a por outra que indefira o respectivo pedido.
ii. Erro na aplicação do art.º 209.º n.º 1 alínea g) do Código Comercial
20. O Tribunal a quo decidiu, nos termos do art.º 209.º n.º 1 alínea g) do Código Comercial, que “a. No tocante ao projecto de gás natural da 1ª requerida como concessionária, as eventuais correspondências, requerimentos e informações, enviadas até hoje, entre a 1ª requerida e RAEM, Chefe do Executivo, Secretaria para os Transportes e Obras Públicas, Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigo Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético) e outros órgãos do Governo;”.
21. Salvo o devido respeito, os 2º a 7º requeridos entendem que a referida disposição legal não concede aos accionistas o direito a consultar arbitrariamente os documentos entre a companhia e o terceiro.
22. No tocante ao direito à informação, o Código Comercial tem disposições diferentes correspondentes a diversas situações: quando se trate dos livros da companhia (alínea a) a d)), os accionistas têm o direito de consulta em qualquer situação, contudo, no que diz respeito aos outros documentos e informações; quando se trate de “todos os demais documentos” (alínea e)) e “quaisquer informações” (alínea f)), esses documentos/informações só podem ser requeridos, legal ou estatutariamente, antes das assembleias gerais ou antes de se proceder à votação, o teor desses documentos/informações tem que ser pertinente apenas aos assuntos da assembleia geral e razoavelmente necessário ao esclarecimento.
23. Os documentos entre a 1ª requerida e o Governo, solicitados pela recorrida, não são livros, nem foram requeridos antes das assembleias gerais ou antes de se proceder à votação.
24. Pelo que, só pode, segundo a alínea g), requerer à administração informação escrita sobre a gestão da sociedade, nomeadamente sobre qualquer operação social em particular.
25. O TSI também adoptou a posição igual no acórdão n.º 682/2022 e na sentença do proc. n.º CV2-18-0028-CPE.
26. No caso, a recorrida nunca solicitou aos 1ª a 7º requeridos o “relatório da gestão”, nem justificou porque solicitou todos os documentos entre a 1ª requerida e os órgãos do Governo desde a concessão do projecto de gás natural.
27. De facto, a 1ª requerida tem exercido as actividades do projecto concedido por 15 anos, os documentos entre ela e o Governo são quase todos os documentos da sua Companhia, os administradores também mudavam constantemente, se a recorrida possa, sem qualquer motivo, consultar todos os referidos documentos, sem dúvida, isso afecta gravemente os trabalhos dos administradores e é absolutamente um pedido irrazoável.
28. Acredita-se que, quando o legislador restringe o direito dos accionistas à informação, pela disposição do art.º 209.º n.º 1 alínea g) do Código Comercial, tem como objectivo evitar a ocorrência do referido caos.
29. Pelo que, esse pedido da recorrida não satisfaz o pressuposto legal do art.º 209.º n.º 1 alínea g) do Código Comercial, deve ser revogada pelo erro na aplicação do Direito a decisão de ordenar os 1ª a 7º requeridos a oferecer os respectivos documentos.
iii. Violação do art.º 49.º do Código Comercial
30. Se os Exmo. Juízes não admitam o referido entendimento, os 2º a 7º requeridos entendem que o acórdão recorrido viola o art.º 49.º n.º 1 do Código Comercial, uma vez que, segundo essa disposição, os empresários comerciais (incluindo companhias limitadas) só têm o dever de conservar por 5 anos os livros e documentos da sua empresa devidamente ordenados.
31. A ordem de fornecimento dos documentos enviados entre a requerida e o Governo “até hoje” já supera efectivamente o âmbito do dever de conservação.
32. Salvo o devido respeito, os 2º a 7º requeridos entendem que o Tribunal a quo violou o art.º 49.º n.º 1 do Código Comercial quando ordenou os 1ª a 7º requeridos a oferecer os documentos fora do dever de conservação de 5 anos.
33. Pelo que, esta parte da decisão do Tribunal a quo também deve ser revogada.
Pela Recorrida foram apresentadas contra-alegações quanto aos recursos interpostos apresentando as seguintes conclusões:
A) Contradição entre os fundamentos da sentença recorrida e a sua decisão?
a) Decidiu a sentença recorrida: “Autorizou o exame judicial das matérias seguintes da 1.ª requerida (relativo à distribuição do prémio de desempenho a cinco membros da comissão executiva aprovada por deliberação na assembleia geral extraordinária realizada em 22 de Janeiro de 2018, incluindo os membros que lhes foi distribuído o prémio de desempenho, os respectivos valores recebidos e a forma de cálculo desses valores);
b) Face a essa decisão, os recorrentes consideram que a sentença recorrida incorreu em contradição pelos fundamentos seguintes:
1) A sentença recorrida, por um lado, indicou que na distribuição do prémio de desempenho de 2018 não se conseguiu demonstrar a irregularidade grave ocorrida na 1.ª recorrente, mas por outro lado, indicou que provavelmente o prémio foi distribuído quando a recorrida foi contornada; pois entre dois factos provados existe contradição.
2) Os documentos para a declaração de contribuição junto da Direcção dos Serviços de Finanças são baseados totalmente no relatório do auditor, tendo o relatório do auditor sido também aprovado pela assembleia de sócios. O prémio é uma remuneração variável e portanto, pode ser incluído nos salários e vencimentos.
c) Salvo o devido respeito, a recorrida não se conforma com o supracitado ponto de vista e a posição, por isso, vai especificar um por um a seguir:
d) Indica a sentença recorrida que tendo em consideração o melhoramento das condições de funcionamento da 1.ª recorrente no ano 2018 e que no passado também foi distribuído o prémio perante a situação de prejuízos. Por isso, o juiz do Tribunal a quo considerou que na distribuição do prémio de desempano de 2018 não se consegue demonstrar a irregularidade grave ocorrida na 1.ª recorrente.
e) Indicaram os recorrentes nos pontos 8 a 30 da alegação do recurso que uma vez que a sentença recorrida já considerou que a distribuição de prémio não envolve a irregularidade, a distribuição de prémio também não devia (também não havia necessidade) contornar a recorrida.
f) Embora os recorrentes tenham considerado que eles não deviam/não precisavam de contornar a recorrida para distribuir o prémio, isto só é uma alegação concludente feita pelos recorrentes.
g) Na verdade, não existe nenhuma relação causal entre se o conteúdo substantivo de um acto é legal ou se o acto foi praticado de maneira legal ou não.
h) Tal como no caso em apreço, é verdade que não houve qualquer irregularidade grave na distribuição de prémio, mas a sentença recorrente não exclui a existência de irregularidade e o que não se pode ignorar é que a distribuição de prémio foi deliberada e aprovada através duma assembleia de sócios não convocada e que a recorrida não foi notificada para comparecer à assembleia de sócio nem sabia de nada sobre o conteúdo da deliberação.
i) Indicam os recorrentes que mesmo que a recorrida não tenha participado na supracitada assembleia de sócios, participou na assembleia de sócios realizada em 23 de Maio de 2019 e por deliberação, aprovou as contas de 2018 que incluem o respectivo prémio, bem como na assembleia a recorrida também não suscitou qualquer dúvida.
j) Tal como foi indicado pelos recorrentes, a recorrida efectivaemente participou na assembleia de sócios realizada em 23 de Maio de 2019 e aprovou por deliberação as contas de 2018, mas tanto as contas do referido ano, como os documentos para a declaração de contribuição junto da Direcção dos Serviços de Finanças, os quais não mostram directamente o valor do prémio, também não conseguem reflectir a existência do referido prémio, o seu fluxo e forma de cálculo.
k) Igualmente, embora a sentença recorrida considere que a distribuição de prémio de desempenho de 2018 não envolva a irregularidade, isto não quer dizer que não exista a irregularidade quanto ao valor, à forma de cálculo e ao verdadeiro fluxo do prémio, etc..
l) Invocaram os recorrentes na alegação do recurso que tal prémio pertence a uma remuneração variável, não excluindo que a 1.ª recorrente o tenha incluído na coluna de “salários e vencimentos”.
m) É de salientar que, na fase de julgamento em primeira instância, nunca os recorrentes invocaram o supracitado argumento, e independentemente de que se é tempestiva ou não a invocação neste momento, através da alegação dos recorrentes, pode-se verificar que os mesmos só adivinharam e/ou deduziram que o prémio tinha sido incluído em outra coluna e pelo que utilizaram a expressão “não excluindo”.
n) Segundo a sentença recorrida, tendo o juiz do Tribunal a quo entendido que podia acontecer a situação em que os recorrentes pretendiam contornar a recorrida, bem como nos documentos de declaração de contribuição apresentados pela 1.ª recorrente junto da Direcção dos Serviços de Finanças no referido ano, não foi declarado o conteúdo do prémio, tal acto em si próprio já pode reflectir que na gestão podia existir a irregularidade na 1.ª recorrente, razão pela qual V. Ex.ª julgou que se deve proceder ao exame do respectivo prémio.
o) A sentença recorrida procedeu a uma completa análise e juízo de todos os factos, e também não existe qualquer contradição e conflito entre os factos provados. Evidentemente os recorrentes entenderam mal o conteúdo da sentença, e/ou tentaram distorcer os argumentos da sentença recorrida de tal modo a interpor o presente recurso.
p) Pelo acima exposto, pede-se sinceramente a V. Ex.as que se dignem julgar improcedente o recurso, mantendo a sentença recorrida e rejeitando o recurso quanto a esta parte.
B) Errada aplicação da lei?
q) Decidiu a sentença recorrida: “O fornecimento pelos 1.ª a 7.º requeridos das informações abaixo indicadas no prazo de 30 dias:
a. As correspondências, os documentos sobre os pedidos e os relatórios eventualmente tidos durante todos os anos com o governo da RAEM, o Chefe do Executivo, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas, o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigo Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético) e outros serviços e entidades públicos, faca ao projecto de gás natural que à 1.ª requerida foi concedido;
b. As actas da assembleia de sócios realizada desde a constituição da 1.ª requerida (com execpção das actas da assembleia de sócios de 2017 a 2021);
➢ Al. a):
Errada aplicação dos art.º 209.º, n.º1, al. g) e do art.º 49, todos do Código Comercial
r) Face à decisão na supracitada al. a), todos os recorrentes entendem que a sentença recorrida ampliou o âmbito do direito à informação da recorrida (todo o sócio tem direito a consultar informação feita pela administração) e obrigação da 1.º recorrente sobre a conservação de documentos (como empresário comercial só deve conservar os documentos durante 5 anos), em particular, erradamente aplicou os art.º 209.º, n.º1, al. g) e art.º 49.º, do Código Comercial.
s) Salvo o devido respeito, a recorrida não se conforma com o supracitado ponto de vista e posição.
t) Tal como foi indicado pela sentença recorrida, através do acórdão do TSI n.º190/2022, nele já foi julgado expressamente que a recorrida tem direito a consultar os documentos relativos aos contratos de concessão celebrados entre a 1.ª recorrente e o governo, nos termos do art.º 209.º, n.º1, al. g) do Código Comercial.
u) Nos termos dos art.ºs 574.º, n.º1 e 576.º do Código de Processo Civil, a supracitada sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga tem força obrigatório entre as partes, isto quer dizer, também foram confirmados o sentido e o âmbito do direito à informação previsto no art.º 209.º, n.º1, al. g) do Código Comercial que vem agora exercer a recorrida.
v) Segundo o supracitado acórdão, embora nele sejam diferentes os objectos (destinatários) que pretendeu consultar a recorrida, sendo um objecto a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental e o outro a 1.ª recorrente, são iguais os fundamentos do pedido, os factos e o conteúdo; igualmente também com base em que a recorrida é sócia da 1.ª requerida, exercendo o direito à informação previsto no art.º 209.º, n.º1, al. g) do Código Comercial, a fim de consultar os documentos relativos aos contratos de concessão celebrados entre a 1.ª recorrente e o governo.
w) Pelo que, nos termos do art.º 580.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumpre-se a que transitou em julgado em primeiro lugar. Quer dizer, de acordo com a disposição indicada no ponto anterior, tendo em consideração que o supracitado acórdão do TSI n.º190/2022 já transitou em julgado e, por isso também impede o tribunal eventualmente decidir em sentido contrário sobre a mesma pretensão e/ou pedido. (também o acórdão do TSI n.º58/2006 tem o mesmo entendimento sobre isso)
x) Além disso, na alegação do recurso, os recorrentes também invocaram que a sentença recorrida erradamente aplicou os art.ºs 209.º, n.º1, al. g) e 49.º do Código Comercial. Igualmente o supracitado argumento e/ou facto nunca foi invocado no processo de primeira instância, também não foi apreciado e discutido pelo Tribunal a quo, pelo que não deve ser invocado e tratado no recurso.
y) Indica o acórdão do TUI n.º38/2022 que: “Sendo os “recursos” meios de impugnação de decisões judiciais, destinados à reapreciação ou reponderação das matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal a quo e não meios de “renovação da causa” através da apresentação de novos fundamentos de sustentação do pedido em matéria não anteriormente alegada ou “formulação de pedidos diferentes” não antes formulados, claro se apresenta que o mesmo se tem de dirigir a uma questão suscitada e apreciada.1”
z) Pelo acima exposto, pede-se sinceramente a V. Ex.as que se dignem julgar improcedente o recurso, mantendo a sentença recorrida e rejeitando o recurso quanto a esta parte.
➢ Al. b):
Errada aplicação do art.º 1207.º, n.º5 do Código de Processo Civil e do art.º 209.º, n.5 do Código Comercial
aa) Face à decisão na supracitada al. b), todos os recorrentes entendem que a sentença não considerou as matérias seguintes que devia considerar, pelo que a sentença recorrida erradamente aplicou o art.º 1207.º, n.º5 do Código de Processo Civil e do art.º 209.º, n.º5 do Código Comercial:
i. Indica a testemunha M que todas as vezes, depois de realizada a assembleia de sócios, teoricamente/deve ser entregue a acta à recorrida; e
ii. N, administrador dos recorrentes, no período compreendido entre 2016 e Março de 2018, exercia funções de administrador da 1.ª recorrente, altura em que já obteve os dados de todos os livros da sociedade da 1.ª recorrente.
bb) Salvo o devido respeito, a recorrida não se conforma com o supracitado ponto de vista e posição.
cc) Não se falando as palavras incertas e vagas tais como “deve” e “teoricamente falando” utilizadas na audiência pela supracitada testemunha e pelo defensor dos recorrentes,
dd) Como todos sabemos que o que é regido pelo art.º 209.º do Código Comercial é um direito que pode ser exercido pelos sócios, pois no prazo de duração e/ou manutenção da qualidade de sócio, podem os sócios, a qualquer momento, de forma repetida e por várias vezes, exercer o supracitado direito.
ee) Mesmo que anteriormente já lhe tenham sido fornecidos os documentos, o seu direito à informação não vai ser limitado ou reduzido. Se os documentos tiverem sido fornecidos antes, já não se puder exigir novamente a sua consulta, tal como alegam os recorrentes, o direito à informação que pode ser exercido por todos os sócios a qualquer momento passará a ser um direito “descartável”.
ff) Por outro lado, N, administrador dos recorrentes, efectiavmente exerceu funções de administrador da 1.ª recorrente no período compreendido entre 2016 e Março de 2018, mas isto não quer dizer que ele, depois de deixar de exercer funções, ainda tinha que conservar tais informações.
gg) Igualmente o que o administrador dos recorrentes chegou a obter/tratar tais livros, não levou a que fosse privado o direito à informação da recorrida, na qualidade de sócio.
hh) Os recorrentes não só tinham o ponto de vista e posição contrários às regras de experiência comum, como também erradamente invocaram que a sentença recorrida errou na aplicação do art.º 1207.º, n.º5 do Código de Processo Civil e do art.º 209.º, n.º5 do Código Comercial.
ii) Tal como acima foi indicado, nunca os recorrentes invocaram o supracitado argumento no processo de primeira instância, e uma vez que tal argumento novo não foi apreciado pelo Tribunal a quo, também não deve ser invocado e tratado no recurso.
jj) Pelo acima exposto, pede-se sinceramente a V. Ex.as que se dignem jular improcedente o recurso, mantendo a sentença recorrida e rejeitando o recurso quanto a esta parte.
***
Por fim, por mera cautelar de patrocínio, vem, nos termos do art.º 590.º, n.º2 do Código de Processo Civil, a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença recorrida, prevenindo a hipótese de procedência das questões suscitadas pelos recorrentes.
* Als. a) e d) da parte A do último pedido,
kk) Tal como foi reconhecido na sentença recorrida, a 1.ª recorrente era concessionária do projecto de gás natural que lhe foi concedido, podendo ser considerados como informações de operação da 1.ª recorrente, as correspondências, os documentos sobre os pedidos e os relatórios eventualmente tidos durante todos os anos com o governo da RAEM, o Chefe do Executivo, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas, o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigo Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético) e outros serviços e entidades públicos, faca ao projecto de gás natural que à 1.ª recorrente foi concedido;
ll) Em 24 de Novembro de 2021, a recorrida, na qualidade de sócia da 1.ª recorrente, exigiu à 1.ª recorrente que fornecesse os documentos abaixo indicados (vd. 76 e 76v dos autos):
1) As correspondências, os documentos sobre os pedidos e os relatórios eventualmente tidos durante todos os anos com o governo da RAEM, o Chefe do Executivo, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas, o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigo Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético) e outros serviços e entidades públicos, faca ao projecto de gás natural que à 1.ª requerida foi concedido;
2) …
3) …
mm) Mas finalmente só foram fornecidos pela 1.ª recorrente 20 e tal páginas de documento de formato PDF, os quais só são pequena parte do conteúdo que a recorrida pretendia consultar. (vd. factos provados 15 e 16 da sentença)
nn) Foi indicado na fundamentação da sentença que devido a que a 1.ª requerente não forneceu à recorrida os supracitados documentos do tipo 1), o direito de consulta da requerente não foi satisfeito.
oo) Pelo que, a sentença recorrida, nos termos do art.º 209.º, n.º1, al. g) do Código Comercial, reconheceu que a recorrida tem o direito a exigir da 1.ª recorrente o fornecimento dos supracitados dados de exploração, e julgou procedente esta parte da recorrida, ordenado aos 1.ª a 7.º recorrentes o fornecimento à recorrida dos respectivos documentos.
pp) Quanto à alínea d) da parte A do último pedido, indica a sentença recorrida que, “Face aos documentos indicados pela requerente na al. d) e e) da parte A) do último pedido, não tendo a requerente exposto nem provado que tivesse solicitado à 1.ª requerida o fornecimento de tais documentos e que tivesse sido rejeitado. Tendo em consideração que o Tribunal só vai intervir no caso desde que 1.ª requerida se recuse a fornecer as informações exigidas pela requerente (vd. art.º 209.º, n.ºs 4 e 5 do Código Comercial, deve-se julgar improcedentes os fundamentos do pedido da requerente que solicitou a todos os requeridos o fornecimento dos contratos de renovação, das condições de renovação e dos documentos respeitantes à discussão das cláusulas (al. d) da Parte A do pedido último) elaborados entre a 1.ª requerida e o governo da RAEM no período entre 2018 e 2020, face à concessão em causa, bem como dos eventuais documentos respeitantes ao direito de prioridade atribuído pelo contrato de concessão em causa que chegassem exercer todos os requeridos (al. e) da Parte A do pedido último).2
qq) Na verdade, segundo a oposição apresentada pela 1.ª recorrente no presente processo, tendo a mesma alegado ter apresentado um conteúdo de email para servir de prova documental (vd. fls. 478 dos autos, anexo 16 à oposição) e tal documento já era a correspondência tida entre a 1.ª recorrente e o governo da RAEM, face à actividade de gás natural, e os documentos anexos ao email, já eram os documentos exigidos pela recorrida na al. d) da Parte A do último pedido:
- Minuta do contrato de revisão da A, Lda._GDSE_201904004 (versão final).docx
- Minuta do contrato de revisão da A, Lda._GDSE_201904004 (versão final) – PT final.docx
- Minuta do contrato de revisão da A, Lda._GDSE_201904004 (versão final) – PT final.pdf
rr) Isto quer dizer, os documentos indicados na al. d) da Parte A do último pedido (os contratos de renovação, as condições de renovação e os documentos respeitantes à discussão das cláusulas elaborados entre a 1.ª recorrente e o governo da RAEM no período entre 2018 e 2020 face à concessão em causa) justamente estão abrangidos pelos documentos do tipo 1) indicados nos factos n.º42 da presente petição (ou seja a correspondência tida com o governo da RAEM sobre a actividade de gás natural).
ss) Face ao acima exposto, tendo em consideração que a recorrida já expôs os factos de ser impedido o seu direito à informações, tais factos também foram dados como provados pelo Tribunal a quo.
tt) Evidentemente existe uma contradição entre os fundamentos da sentença e sua decisão, pede-se sinceramente a V. Ex.as que, nos termos do art.º 571.º, n.º1, al. c) do Código de Processo Civil, julguem nula a sentença recorrida, declarando procedentes a supracitada impugnação e o pedido invocado pela recorrida na al. d) da parte A do último pedido, ordenado aos 1.ª a 7.º recorrentes que fornecessem à recorrida os respectivos documentos.
Pelo acima exposto, pede-se sinceramente a V. Ex.as que se dignem julgar improcedentes as motivações dos recorrentes, mantendo a sentença recorrida e rejeitando todos os recursos;
Caso V. Ex.as entendam procedentes parcialmente as motivações dos recorrentes, pede-se sinceramente a V. Ex.as que, nos termos do art.º 571.º, n.º1, al. c) do Código de Processo Civil, julguem nula a sentença recorrida, declarando procedente a supracitada impugnação.
Foram colhidos os vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
a) Dos Factos
Na decisão recorrida foi dada por assente a seguinte factualidade:
1. O capital social da 1ª requerida é de cento e doze milhões de patacas (MOP112.000.000,00);
2. As sócias da 1ª requerida e as quotas que detêm:
1) L (L有限公司) (doravante designada por “L”) detém uma quota que vale cinquenta e seis milhões de patacas (MOP56.000.000,00);
2) I Limited (I有限公司) (doravante designada por “I”) detém uma quota que vale cinquenta milhões e quatrocentas mil patacas (MOP50.400.000,00);
3) H Limitada (H有限公司) detém uma quota que vale cinco milhões e seiscentas mil patacas (MOP5.600.000,00).
3. O órgão de administração da 1ª requerida é o conselho administrativo, e foi instalada uma comissão executiva sob subordinação ao mesmo, cujos elementos se seguem:
1) O 2º requerido, B, administrador, actual presidente do conselho de administração, nomeado sob proposta das sócias da 1ª requerida, L e/ou I;
2) O 3º requerido, C, administrador, actual administrador do conselho de administração, nomeado sob proposta das sócias da 1ª requerida, L e/ou I;
3) O 4º requerido, D, administrador, actual administrador do conselho de administração, nomeado pelas sócias da 1ª requerida, L e I mediante a deliberação proferida numa assembleia de sócios realizada sem convocatório escrito;
4) O 5º requerido, E, elemento da comissão executiva do órgão de administração, actual presidente da comissão executiva, designado por uma das sócias da 1ª requerida, L;
5) O 6º requerido, F, elemento da comissão executiva do órgão de administração, actual director financeiro da comissão executiva, designado por uma das sócias da 1ª requerida, L;
6) A 7ª requerida, G, elemento da comissão executiva do órgão de administração, actual subgerente geral da comissão executiva;
4. A requerente é uma das sócias da 1ª requerida.
5. A I é a filial integral da L, ambas detêm noventa e cinco por cento (95%) da quota da 1ª requerida na totalidade.
6. Gerindo e operando totalmente a 1ª requerida através da designação dos seus trabalhadores para os cargos do órgão de administração da 1ª requerida (n.ºs 1 e 2 do art.º 11º do estatuto da 1ª requerida), ou seja, a L é a sócia dominante, e controladora e operadora efectiva da 1ª requerida.
7. Em 15 de Dezembro de 2006, a RAEM e a 1ª requerida celebraram um contrato de concessão do “Serviço Público de Importação e Transporte de Gás Natural na RAEM” (doravante designado por “contrato de concessão”) com a duração de 15 anos (cfr. fls. 61 a 75 dos autos).
8. No artigo 1º do contrato de concessão celebrado com a 1ª requerida dispõe-se que à 1ª requerida concede o direito de explorar o serviço público de importação e transporte de gás natural na RAEM, que consiste:
1) Na aquisição de gás natural, no estado gasoso ou liquefeito, e a sua colocação na RAEM;
2) Nas actividades de recepção de gás natural no estado gasoso ou liquefeito;
3) No transporte, fornecimento e venda de gás natural em alta ou média pressão aos operadores de redes de distribuição e aos consumidores directos.
9. O aludido “Serviço Público de Importação e Transporte de Gás Natural na RAEM” concedido à 1ª requerida é a única e exclusiva actividade explorada pela mesma.
10. A subsistência do contrato de concessão afecta directamente a subsistência da 1ª requerida.
11. Em 24 de Novembro de 2021, a requerente, na qualidade da sócia da 1ª requerida, exigiu à 1ª requerida que lhe fornecesse os seguintes documentos (cfr. fls. 76 e 76v. dos autos):
1) As correspondências, os documentos de pedido e os relatórios recebidos e enviados, ao longo dos anos, ao Governo da RAEM, ao Chefe do Executivo, à Secretaria para os Transportes e Obras Públicas, ao Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (o então Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético), se os tiver havido, relativos ao projecto de gás natural concedido à 1ª requerida;
2) Os seguintes documentos existentes desde a instalação da 1ª requerida:
a) As contas anuais (incluindo sobretudo, mas não exclusivamente as demonstrações do resultado do exercício e/ou as contas de demonstração de resultados e os balanços) e os relatórios respeitantes ao exercício;
b) As actas das assembleias de sócios;
c) Os registos de cumprimento da responsabilidade fiscal e as respectivas credenciais (incluindo sobretudo, mas não exclusivamente as declarações da contribuição industrial e do imposto complementar de rendimentos apresentadas à Direcção dos Serviços de Finanças e as respectivas guias de pagamento de impostos).
3) As actas das reuniões realizada em 2021 entre a 1ª requerida ou uma das sócias da 1ª requerida, L e o Governo (nomeadamente a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental), a sociedade da J Limited e terceiro sobre a concessão do serviço público de importação e transporte de gás natural na RAEM; e, a inexistência das aludidas actas deve ser comunicada por escrito à requerente e os conteúdos das reuniões devem ser expostos por relatório.
12. Em 24 de Novembro de 2021, a requerente também apresentou à Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental o pedido de consulta de todos os processos relativos ao contrato de concessão em questão (cfr. fls. 79 a 80 dos autos).
13. A seguir, em 30 de Novembro de 2021, a 1ª requerida enviou uma carta à advogada da requerente, afirmando: “(…) Devido à quantidade volumosa dos documentos em causa, esta sociedade tem de demorar mais tempo na preparação de documentos e irá comunicar oportunamente à H Limitada do horário da consulta de documentos.” (Doc. 6 da petição inicial)
14. Em 30 de Novembro de 2021, a 1ª requerida respondeu à requerente que “nos termos legais, a requerente só tem direito à consulta de parte de documentos solicitados”.
15. Em dez dias depois (10 de Dezembro de 2021), a 1ª requerida forneceu à requerente um disco compacto com ficheiros de documentos (donde consta 20 documentos de formato PDF), nomeadamente:
- O extracto do relatório de auditor de 2016 (chinês);
- O relatório do conselho administrativo de 2016 (assinado);
- O relatório do conselho administrativo de 2017 (assinado);
- O balanço da A, Limitada de 2017;
- O relatório do conselho administrativo de 2018 (assinado);
- O relatório do conselho administrativo de 2019 (assinado);
- O balanço da A, Limitada de 2018;
- O balanço da A, Limitada de 2019;
- O relatório do conselho administrativo de 2020 (assinado);
- O balanço da A, Limitada (A) de 2020.
16. Os documentos supracitados são apenas uma parte de documentos solicitados pela requerente, pelo que, em 11 de Dezembro de 2021, ela exigiu novamente à 1ª requerida que lhe fornecesse os documentos em causa (Doc. 8 da petição inicial).
17. Em 13 de Dezembro de 2021, a 1ª requerida enviou uma carta à advogada da requerente, comunicando que: “(…) Face ao documento 3 mencionado na carta de V. Ex.ª, datada de 25 de Novembro de 2021, esta sociedade não consegue fornecer o aludido documento a V. Ex.ª por não possuir as respectivas informações. Quanto aos restantes documentos, vem comunicar a V. Ex.ª que a consulta dos sobreditos documentos poderá ser efectuada no dia 15 de Dezembro de 2021, durante o horário de expediente desta sociedade (09:00-12:00 e 14:30-17:30), na sala de reuniões do escritório da A, Limitada (endereço: (…)).” (Doc. 9 da petição inicial).
18. Quando a requerente se deslocou ao supracitado local na data e hora designadas pela 1ª requerida, para efeitos de consulta de processos, não lhe foram disponibilizados os 1º e 3º tipos de documentos em apreço e apenas lhe foram disponibilizados os seguintes documentos (Doc. 10 da petição inicial):
- As actas das assembleias de sócios de 2017 a 2021;
- As contas anuais e os relatórios respeitantes ao exercício de 2016 a 2020; e
- As informações fiscais de 2016 a 2021.
19. Os documentos mencionados no ponto anterior são cópias guardadas no computador (cópias electrónicas de formato PDF), a par disso, a 1ª requerida não forneceu os originais dos referidos documentos (mormente os livros de actas de assembleias de sócios materiais) à requerente.
20. Em 15 de Dezembro de 2021, M (empregado da 1ª requerida que recebeu a representante da requerente na consulta de processos) disse à requerente que tinha de pedir antecipadamente orientações de seu superior hierárquico e de jurista para poder disponibilizar o 1º tipo de documentos solicitado pela requerente.
21. De acordo com o artigo 7º do Capítulo III do “Estatuto” da 1ª requerida: “1. Consideram-se órgãos da sociedade a assembleia geral, o conselho administrativo, o conselho fiscal e o secretariado da sociedade. 2. A comissão executiva instalada sob subordinação ao conselho administrativo responsabiliza-se pela execução das decisões do conselho administrativo.”.
22. De acordo com o n.º 1 do artigo 11º do Capítulo III do “Estatuto” da 1ª requerida: “1. Ao conselho administrativo cabe a administração da sociedade; e a comissão executiva é instalada sob subordinação ao conselho administrativo, que se responsabiliza pelo funcionamento da sociedade em conformidade com as deliberações do conselho administrativo e o regime de gestão dos órgãos da sociedade.”.
23. De acordo com o n.º 2 do artigo 12º do Capítulo III do “Estatuto” da 1ª requerida: à comissão executiva são conferidas as seguintes competências:
1) Elaborar os cálculos do desenvolvimento das actividades de médio e longo prazo e os planos anuais do desenvolvimento das actividades da sociedade que serão entregues ao conselho administrativo consoante o procedimento e executados depois de serem aprovados pela assembleia geral (alínea a) do n.º 2 do art.º 12º do Capítulo III do “Estatuto”);
2) Elaborar e ajustar os orçamentos anuais que serão entregues ao conselho administrativo consoante o procedimento e executados depois de serem aprovados pela assembleia geral (alínea b) do n.º 2 do art.º 12º do Capítulo III do “Estatuto”);
3) Representar judicial e extrajudicialmente a sociedade (alínea c) do n.º 2 do art.º 12º do Capítulo III do “Estatuto”);
4) Gerir as actividades quotidianas da sociedade (alínea g) do n.º 2 do art.º 12º do Capítulo III do “Estatuto”).
24. Mesmo que, enfim, a requerente tenha acesso à consulta das actas das assembleias de sócios dos últimos anos, apenas lhe disponibiliza os respectivos ficheiros electrónicos e não os livros de actas de assembleias de sócios materiais.
25. As actas das assembleias de sócios fornecidas pela 1ª requerida à requerente são incompletas, faltando a folha 30 (cfr. fls. 412 dos autos).
26. Nos termos do artigo 3º do contrato de concessão: “Prazo da concessão
1. O prazo da concessão é de 15 anos, contados a partir do dia seguinte ao da celebração do presente contrato, sem prejuízo do exercício pelo concedente do direito de resgate, rescisão e extinção do contrato ou de prorrogação do prazo devido a sequestro da concessão.
2. O prazo da concessão pode, a pedido da concessionária, ser renovado por períodos iguais ou inferiores ao primeiro período concedido.
3. 36 meses antes do termo da concessão, concedente e concessionária negociarão sobre a prorrogação da concessão.
4. Concedente e concessionária devem realizar, 5 anos antes do termo da concessão, uma reunião para revisão da execução do contrato e determinar as medidas necessária para o seu melhoramento.
5. No termo da concessão a concessionária goza do direito de preferência na atribuição da nova concessão, sobre o mesmo objecto, se se encontrar em igualdade de condições com outros concorrentes.
27. Conforme o n.º 1 do artigo 13º do contrato de concessão, o direito de preferência é um dos direitos da concessionária (1ª requerida).
28. Recentemente, em mais de dez anos, o custo de gás natural tem subido constantemente e houve uma grande subida do valor cambial do renminbi que foi usado para pagamento de gás à fornecedora primária, por isso, o custo de gás natural ultrapassou enormemente o “gate price” fixado no aludido contrato de concessão, surgindo a situação de “upside down price”.
29. A 1ª requerida pediu várias vezes à RAEM que, conforme as disposições do contrato de concessão (mormente os artigos 2º, n.ºs 7 e 8, e 3º, n.º 3 do Anexo III ao contrato), procedesse à revisão e correcção do “gate price”, e que, nos termos do disposto no art.º 11º da Lei n.º 3/90/M, de 14 de Maio, lhe prestasse assistência financeira, mas o resultado foi infrutífero, por conseguinte, dos últimos anos até agora, a A, Limitada tem tido avultados prejuízos, com valor aproximado de trezentos milhões de patacas (MOP300.000.000,00).
30. Com mais de dez anos de prejuízos contínuos, nos finais de 2019, registou-se pela primeira vez o saldo positivo na conta anual da 1ª requerida (com lucro líquido), porém os prejuízos acumulados durante vários anos perfazem aproximadamente um valor total de trezentos milhões de patacas.
31. À luz do n.º 2 do art.º 35º do contrato de concessão celebrado entre o Governo e a 1ª requerida: “A extinção da concessão opera a reversão para o concedente de todos os bens e direitos afectos às actividades concedidas”.
32. Segundo o n.º 1 do art.º 37º do contrato de concessão celebrado entre o Governo e a 1ª requerida: “Em caso de rescisão do contrato por incumprimento, nos termos do artigo 31º e extinção da concessão por qualquer das circunstâncias previstas no artigo 35º do presente contrato, todos os bens e direitos afectos à concessão revertem a favor do concedente”.
33. A única actividade operada pela 1ª requerida é a execução do contrato de concessão, pois, em caso de extinção da concessão, todos os equipamentos e instalações, bens e direitos da 1ª requerida, afectos à actividade operada, revertem a favor da RAEM.
34. A 1ª requerida só pode continuar a operar a actividade de gás natural e transformar prejuízo em lucro quando haja a renovação do contrato de concessão e/ou a celebração de novo contrato de concessão com a RAEM.
35. Já em 2018, a 1ª requerida e a RAEM negociaram várias vezes sobre a renovação do contrato de concessão, redigindo um contrato de renovação/revisão com base no contrato de concessão.
36. Conforme o documento, com o número de entrada de 2019: 2320, e etiquetado sob o n.º GDSE00008504, disponibilizado em 10 de Dezembro de 2021 pela Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental da RAEM aos requeridos: “O novo contrato de concessão, com validade de 15 anos, criou um mecanismo de preço relativamente razoável, favorecendo à A, Limitada na redução de prejuízo e aumento de lucro. O Governo da RAEM exige que, em caso de renovação do contrato, a A, Limitada tenha de acrescentar duzentos milhões de patacas do capital registado, a fim de reduzir o rácio da dívida. Conforme o cálculo efectuado com “Discounted Cash Flow Technique”, com a data de referência fixada em 1 de Janeiro de 2020, a taxa de inflacção de 4%, o imposto de rendimentos de 12% e a taxa interna de retorno de 9%, a A, Limitada poderá obter um lucro líquido, no valor total de 625 milhões de patacas, durante o prazo de validade do contrato.” (cfr. fls. 290 dos autos).
37. Em 10 de Dezembro de 2021, a requerente pediu à Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental a emissão da cópia do documento mencionado no ponto anterior, mas do disco compacto emitido pela referida Direcção não consta o documento em apreço, pelo que a requerente intentou uma acção no Tribunal Administrativo da RAEM, com vista a salvaguardar o seu direito à informação e obter o documento em falta.
38. Em Abril de 2019, foi concluída a revisão do novo contrato de concessão, só restam a apreciação e autorização da RAEM.
39. Os 2º a 7ª requeridos, como administradores da 1ª requerida, não tendo subadjudicado na RAEM o projecto da concessão a terceiro, intentaram uma acção de preferência.
40. Já em 2017, a sócia dominante da 1ª requerida, L, para promover continuamente a actividade de gás natural em Macau, efectuou uma análise profunda e formou uma conclusão rigorosa, expondo várias soluções, nomeadamente, através da optimização do capital social, introduz-se a empresa estatal forte em Macau, J Limited, à 1ª requerida, para concretizar a operação saudável e sustentável da actividade em causa.
41. A requerente tem conhecimento do assunto descrito no ponto anterior e, sem causar prejuízos à 1ª requerida e a si próprio, em princípio, concorda com isso.
42. Em 29 de Novembro de 2021, a filial integral da L (sócia dominante da 1ª requerida), O. Ltd. (O有限公司) e a P, Limitada (P有限公司) formaram uma nova sociedade – Q Limitada (Q有限公司) –, com sede da pessoa colectiva em Macau, na Taipa, na Avenida XX, n.ºs XX, R/c, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis de Macau, sob o n.º 9XX29 (SO).
43. A actividade operada pela Q Limitada (Q有限公司) é: “a prestação, em regime exclusivo, do serviço público de aquisição, importação, armazenagem, transporte, distribuição e venda de gás natural na RAEM”.
44. No dia seguinte ao termo do prazo do contrato de concessão (16 de Dezembro de 2021), o Chefe do Executivo delegou os poderes ao Secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo Arrais do Rosário, para outorgar o “Contrato de Concessão do Serviço Público de Fornecimento por Grosso de Gás Natural” que foi publicado no Boletim Oficial.
45. Parte dos empregados da 1ª requerida foi despedida em 16 de Dezembro de 2021.
46. Parte dos empregados da 1ª requerida que tinha sido despedida em 16 de Dezembro de 2021, foi recrutada em 17 de Dezembro de 2021 pela Q Limitada a que tinha sido atribuída a nova concessão.
47. Em 17 de Dezembro de 2021, o “Contrato de Concessão do Serviço Público de Fornecimento por Grosso de Gás Natural” celebrado entre a RAEM e a Q Limitada foi lavrado de folhas XX do Livro 3XXA da Divisão de Notariado da Direcção dos Serviços de Finanças. Pelo aludido contrato, a RAEM atribuiu à Q Limitada o direito de assegurar, em regime exclusivo, o serviço público de fornecimento por grosso de gás natural na RAEM, aí se incluindo a sua aquisição, importação, armazenagem, transporte, distribuição e venda por grosso, de gás natural nos seus diferentes estados físicos, o que foi publicado no Boletim Oficial de Macau.
48. O 5º requerido já era administrador da Q Limitada (Q有限公司) logo no início da sua instalação.
49. Nas seguintes cinco assembleias gerais extraordinárias realizadas (na cidade de Beijing no Interior da China), não foram dirigidas, com 15 dias de antecedência, as cartas convocatórias à requerente:
- 4 de Agosto de 2017 – 1ª assembleia geral extraordinária de 2017;
- 4 de Janeiro de 2018 – 1ª assembleia geral extraordinária de 2018;
- 22 de Janeiro de 2018 – 2ª assembleia geral extraordinária de 2018;
- 8 de Outubro de 2020 – 1ª assembleia geral extraordinária de 2020;
- 1 de Julho de 2021 – 2ª assembleia geral extraordinária de 2021.
50. As deliberações tomadas nas assembleias gerais extraordinárias supracitadas tratam das resoluções sobre a atribuição de gratificações de centenas de milhares de patacas e a substituição duma garantia de dezenas de milhões de patacas.
51. Não foi notificada, por escrito, a requerente das convocações das assembleias gerais em apreço.
52. De acordo com o “Relatório do conselho administrativo de 2017” da 1ª requerida, publicado no Boletim Oficial: “Segundo o relatório de auditor, durante o ano de 2017, a A, Limitada teve receita de vendas de gás natural de 487.620.000,00 patacas, custo de vendas de gás natural de 462.090.000,00 patacas, prejuízo anual de 4.940.000,00 patacas, prejuízo cumulativo de 265.000.000,00 patacas, contadas desde 2006. Até 31 de Dezembro de 2017, a A, Limitada teve activos totais de 173.890.000,00 patacas e passivos totais de 327.040.000,00 patacas.”.
53. De acordo com a “Declaração do Imposto Complementar de Rendimentos – Grupo A”, referente ao ano de 2017, apresentada pela 1ª requerida à Direcção dos Serviços da RAEM, e o relatório de contabilista juntado à Declaração, registou-se naquele ano um prejuízo de quatro milhões, novecentas e quarenta e duas mil, seiscentas e trinta e uma patacas (MOP4.942.631,00).
54. Na 2ª assembleia geral extraordinária de 2018 da 1ª requerida, realizada em 22 de Janeiro de 2018, foi aprovada a seguinte deliberação: “Os sócios concordaram, por unanimidade, que seria dotada da sociedade um montante de oitocentas e trinta mil patacas (MOP830.000,00) destinado às gratificações de desempenho de 2017, designadamente: quinhentas mil patacas (MOP500.000,00) para a comissão executiva (5 pessoas) e trezentas e trinta mil patacas (MOP330.000,00) para trabalhadores das repartições”.
55. Na 2ª assembleia geral extraordinária de 2021, realizada em 1 de Julho de 2021, por deliberação, R deixou de desempenhar o cargo de administrador da 1ª requerida a partir de 1 de Julho de 2021 e foi nomeado o novo administrador (D).
56. Conforme a certidão do registo comercial da A, Limitada, emitida em 25 de Novembro de 2021 pela Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis de Macau, R ainda desempenha o cargo de administrador da 1ª requerida.
57. Os 2º a 7ª requeridas não requereram o registo da destituição de R em 15 dias depois da tomada da deliberação pela 1ª requerida.
58. Pela deliberação, a 1ª requerida atribuiu gratificações aos trabalhadores e aos elementos da comissão executiva, mas no campo de “Discriminações de gastos com pessoal – Gratificações e bónus” da “Declaração do Imposto Complementar de Rendimentos – Grupo A”, referente ao ano de 2018, apresentada pela 1ª requerida à Direcção dos Serviços da RAEM, se apresenta: “---”.
59. Do campo de “Gastos com pessoal” das Demonstrações financeiras da 1ª requerida, referentes ao período de Janeiro a Dezembro de 2017, constam:
Demonstrações financeiras de Janeiro-Dezembro/2017 – Gastos com pessoal
Mês
Gastos com pessoal do mês
Gastos com pessoal acumulados durante o ano
Janeiro
MOP741.339,06
MOP741.339,06
Fevereiro
MOP692.854,30
MOP1.434.193,36
Março
MOP770.180,23
MOP2.204.373,59
Abril
MOP778.425,26
MOP2.982.798,85
Maio
MOP820.032,11
MOP3.802.830,96
Junho
MOP751.518,57 (valor mostrado pelo antigo sistema contabilístico)
MOP4.554.349,53 (valor cumulativo dos montantes mostrados pelo antigo sistema contabilístico)
MOP741.785,97 (valor mostrado pelo novo sistema contabilístico)
MOP4.544.616,93 (valor cumulativo dos montantes mostrados pelo novo sistema contabilístico)
Julho
MOP673.146,86
MOP5.217.763,79
Agosto
MOP683.066,19
MOP5.900.829,98
Setembro
MOP248.946,20
MOP6.149.776,18
Outubro
MOP716.476,04
MOP6.866.252,22
Novembro
MOP641.946,83
MOP7.508.199,05
Dezembro
MOP694.820,76
MOP8.203.019,81
60. Em cumprimento do artigo 28º, n.º 1 do contrato de concessão, antes da celebração do contrato de concessão, a requerente, sendo sócia que ocupava na altura 50% da quota da sociedade, pagou a metade do montante de trinta milhões de patacas (MOP30.000.000,00), a título de caução exigida pelo concedente, ou seja, o valor de quinze milhões de patacas (MOP15.000.000,00).
61. A caução foi paga por garantia feita junto do Banco S, S.A.
62. Na assembleia geral extraordinária realizada em 4 de Janeiro de 2018, foi aprovada a seguinte deliberação: “1. Concordaram que a A, Limitada negociaria e faria junto do Banco Industrial e Comercial da China (Macau), S.A. a garantia bancária de trinta milhões de patacas (MOP30.000.000,00) para servir de caução do contrato de concessão, usando a quantia extraída da garantia feita junto do Banco S e a quantia de trinta milhões de patacas (MOP30.000.000,00) do depósito em dinheiro para pagamento do empréstimo bancário. 2. Concordaram que a garantia em causa seria caucionada pela T Limited (T有限公司).” (cfr. fls. 202v. a 203 dos autos).
63. Em 4 de Agosto de 2021, a 1ª requerida apresentou o pedido de substituição de garantia à Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental, uma vez que a taxa de depósito a prazo foi diminuída no Banco S, pretendendo, portanto, depositar o montante da caução, no valor de trita milhões de patacas, no Banco U, e, por seu turno, seria emitida a respectiva garantia à RAEM pelo referido banco (cfr. fls. 249 dos autos).
64. Pela deliberação da 1ª assembleia ordinária do conselho administrativo de 2018, realizada em 28 de Março de 2018, foram apreciados e aprovados o relatório de demonstrações financeiras de 2017 e o relatório de auditor. Nessa assembleia estava presente o representante da requerente, V (cfr. fls. 404 e 406 dos autos, cujo teor de dá aqui por integralmente reproduzido).
65. Pela assembleia ordinária do conselho administrativo em apreço, os administradores concordaram que seriam submetidos o relatório de demonstrações e o relatório de auditor em questão à apreciação da assembleia de sócios e do conselho fiscal.
66. Segundo o relatório de demonstrações supramencionado, o valor dos gastos com pessoal é de 8.203.020,00 patacas (cfr. fls. 391 e 403 dos autos, cujo teor de dá aqui por integralmente reproduzido), sendo compatível com o valor total final exposto nas demonstrações financeiras apresentadas pela requerente.
67. Durante a 1ª assembleia ordinária do conselho administrativo de 2018, realizada em 28 de Março de 2018, o representante da requerente, V, não levantou nenhuma questão sobre o relatório de demonstrações e o relatório de auditor em causa.
68. Na mesma data (28 de Março de 2018), pela deliberação da assembleia anual geral de sócios de 2017, datada de 28 de Março de 2018, foram aprovados o relatório de demonstrações e o relatório de auditor em causa (cfr. fls. 411 e 411v. dos autos).
69. O representante da requerente também estava presente na supracitada assembleia, tendo levantado a mão para manifestar a sua concordância, e assinado a acta da dita assembleia.
70. A 1ª requerida não tem a acta mencionada pela requerente no ponto 3 do Doc. 4 da petição inicial.
71. Em 25 de Novembro de 2021, depois da recepção do pedido de consulta de documentos formulado pela requerente, a 1ª requerida forneceu cooperativamente as respectivas informações à requerente.
72. Para satisfazer, dentro do âmbito jurídico, o direito de acesso à informação da requerente, a 1ª requerida orientou os seus trabalhadores a acompanharem o assunto logo após a recepção do pedido, só que eram volumosos os documentos solicitados pela requerente, pelo que, em 30 de Novembro de 2021, a sociedade requerente foi comunicada de que era necessário demorar mais tempo na preparação de documentos e seria comunicada a mesma para consulta de documentos quando estivessem preparados os documentos.
73. À altura, a sociedade da 1ª requerida estava com escassez dos recursos humanos, e tinha dificuldade na mobilização de pessoal por precisar negociar com a fornecedora primária sobre o fornecimento de gás e preparar os contratos de fornecimento de gás e dos demais fornecimentos (em 25 de Novembro de 2021, altura em que recebeu o pedido de consulta de documentos formulado pela requerente, a 1ª requerida ainda não foi oficialmente notificada pelo Governo da RAEM ou pela Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental da não renovação do contrato de concessão).
74. Por ser vasto o âmbito dos documentos solicitados pela requerente e precisar verificar se esses documentos são legalmente consultáveis, a 1ª requerida ficou com grande volume de trabalho de análise, selecção e preparação. Por conseguinte, em 10 de Dezembro de 2021, a 1ª requerida forneceu primeiramente à requerente um disco compacto com ficheiros de documentos, donde constava parte do conteúdo do documento mencionado no ponto 2 do pedido formulado pela requerente, e, depois, continuou a preparar os documentos que poderiam ser consultados pela requerente.
75. Em 15 de Dezembro de 2021, a 1ª requerida comunicou à requerente que poderia dirigir-se à sala de reuniões do escritório da 1ª requerida para consultar a restante parte do documento mencionado no ponto 2, com vista a satisfazer o direito à informação da requerente.
76. O método de consulta de documentos adoptado pela 1ª requerida visa facilitar a requerente na consulta de documentos, ou seja, a requerente pode consultar os documentos no computador sem virar as folhas destes.
77. Em 15 de Dezembro de 2021, a 1ª requerida, ao entregar à representante da requerente o disco compacto com versão electrónica dos documentos solicitados, comunicou-lhe que, em caso de necessidade, lhe poderia disponibilizar os originais dos documentos, para efeitos de conferição.
78. A folha 30 da acta da assembleia de sócios em falta (alegada pela requerente) contém lapso de escrita, não foi assinada e foi cancelada, tornando-se inútil, pelo que não foi disponibilizada à requerente.
79. Em 15 de Dezembro de 2006, a 1ª requerida celebrou com o Governo da RAEM um contrato de concessão do “Serviço Público de Importação e Transporte de Gás Natural na RAEM”, com duração de 15 anos que terminaria em 16 de Dezembro de 2021.
80. De acordo com os n.ºs 4 e 3 do art.º 3º do contrato de concessão, 5 anos antes do termo do contrato de concessão, a 1ª requerida e concessionária (sic) devem rever a execução do contrato e determinar as medidas necessária para o seu melhoramento; 36 meses antes do termo do contrato, a 1ª requerida e concedente negociarão sobre a renovação da concessão.
81. Desde Dezembro de 2016, a 1ª requerida requereu ao então Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético (doravante designado por “GDSE”) a instauração do processo relativo ao cumprimento e revisão do contrato de concessão, a fim de poder realizar, com maior brevidade possível, a renovação do contrato de concessão.
82. De Dezembro de 2016 a Dezembro de 2017, a 1ª requerida cooperou activamente no cumprimento e revisão do contrato, com vista a satisfazer a exigência do GDSE.
83. Conforme o Relatório n.º 060/2017, elaborado pelo GDSE em 10 de Julho de 2017, que aborda o assunto relativo à modificação do “Contrato de Concessão do Serviço Público de Importação e Transporte de Gás Natural na RAEM”, a 1ª requerida irá apresentar ao Governo da RAEM duas grandes direcções de modificação, principalmente: a) O projecto de construção do Terminal LNG na ilha de Huang Mao; e b) O mecanismo do preço de gás natural (cfr. fls. 423 a 426)
84. O Gabinete para o Desenvolvimento do Sector Energético (GDSE) elaborou ainda a Proposta n.º 416/2017, datada de 15 de Dezembro de 2017, com base nas alterações propostas pela 1ª requerida para o contrato de concessão (i.e., contrato de renovação), que apresentava uma análise detalhada das alterações propostas pela 1ª requerida. A respectiva Proposta foi aprovada pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP) em 21 de Dezembro de 2017 (fls. 427 a 438).
85. Em 28 de Dezembro de 2017, a 1ª requerida recebeu uma carta do GDSE confirmando a prorrogação do prazo do contrato de concessão (quer dizer a renovação do contrato de concessão) e solicitando a apresentação de uma lista de pessoas responsáveis pelo acompanhamento do assunto (fls. 439).
86. Em 13 de Março de 2018, teve lugar a primeira ronda de negociações entre a 1ª requerida e o GDSE relativamente à alteração do contrato de concessão (ou seja, contrato de renovação).
87. Durante o período compreendido entre a data acima referida e Agosto de 2018, a 1ª requerida e o GDSE realizaram uma série de negociações sobre os pormenores das alterações ao contrato de concessão, durante as quais foram tidas várias reuniões sobre os pormenores.
88. Em 20 de Agosto de 2018, a 1ª requerida completou a versão revista do contrato de concessão e submeteu-a à apreciação do GDSE.
89. Em 16 de Novembro de 2018, na sequência das alterações propostas pelo GDSE, a 1ª requerida apresentou a nova versão revista do contrato de concessão ao GDSE (Documento 11 da Oposição da 1ª requerida).
90. Durante as negociações do contrato de renovação, o GDSE levantou a questão relativa ao rácio de endividamento. Segundo o GDSE, o rácio de endividamento da 1ª requerida ao longo dos anos era demasiado elevado e não cumpria os requisitos do artigo 11º, n.º 2 do contrato de concessão, pelo que solicitou que fosse apresentada uma solução para o problema antes da conclusão da alteração ao contrato de concessão (Documento 12 da Oposição da 1ª requerida).
91. Para o efeito, a L, sócia da 1ª requerida, enviou uma carta ao GDSE esclarecendo as razões fundamentais do elevado rácio de endividamento, afirmando que só com a aprovação da versão revista do contrato de concessão é que era possível melhorar a estrutura da dívida e reduzir o rácio de endividamento (Documento 13 da Oposição da 1ª requerida).
92. Além disso, ao longo do período em causa, a 1ª requerida apresentou ao GDSE muitos documentos complementares relativos às alterações ao contrato de concessão, com vista a que a renovação do contrato fosse concretizada o mais rápido possível (Documento 14 da Oposição da 1ª requerida).
93. Em 31 de Dezembro de 2018, o GDSE emitiu o Relatório n.º 177/2018 sobre o processo de alteração (I) do Contrato de Concessão do Serviço Público de Importação e Transporte de Gás Natural na Região Administrativa Especial de Macau, no qual apontou os pormenores do processo de alteração do contrato entre a 1ª requerida e o GDSE, tendo o Anexo III ao Relatório apresentado um resumo detalhado dos eventos importantes da A (Documento 15 das objecções da 1ª requerida).
94. Em Abril de 2019, a 1a requerida e o GDSE chegaram finalmente a um acordo sobre a alteração do contrato de concessão (ou seja, o contrato de renovação), tendo a redacção finalizada sido enviada pela 1ª requerida ao GDSE por correio electrónico em 12 de Abril de 2019, juntamente com a versão portuguesa (Documento 16 da Oposição da 1ª requerida).
95. Embora a alteração do contrato tenha sido concluída, a 1ª requerida foi informada pelo GDSE que, devido à aproximação da mudança do Chefe do Executivo da Região Administrativa Especial de Macau, a assinatura do contrato será efectuada pelo próximo governo após a mudança do Chefe do Executivo.
96. A este respeito, a sócia da 1ª requerida, L, enviou uma carta à 1ª requerida a chamar a atenção para a situação (Documento 17 da Oposição da 1ª requerida).
97. A 1ª requerida continuava a aguardar a resposta do GDSE sobre o calendário exacto da assinatura após a entrada em funções do novo Chefe do Executivo.
98. A 1ª requerida, através da sua administração, sempre promoveu a assinatura da renovação do contrato de concessão com o Governo da RAEM. O contrato de renovação negociado entre a 1ª requerida e o Governo da RAEM foi finalizado e a versão finalizada foi enviada por correio electrónico para o então GDSE, mas a Administração nunca providenciou pela assinatura da alteração (sic) do contrato de concessão.
99. Em 26 de Novembro de 2020, a 1ª requerida enviou uma carta de esclarecimento ao GDSE (afirmando que os responsáveis da sede do Grupo I e do seu Sucursal de Gás Natural, empresa superior da A, tinham indicado que não existia qualquer plano de trabalho para a integração das actividades de gás natural do J e da I em Macau, e que a I não tinha qualquer intenção de iniciar a integração das suas actividades de gás natural com o J) e, em 30 de Novembro de 2020, enviou também uma missiva de esclarecimento ao Chefe do Executivo, em que solicitou a continuação dos trabalhos de alteração à renovação do contrato de concessão (documentos 18-19 da Oposição da 1ª requerida).
100. Em 30 de Julho de 2021, a 1ª requerida enviou uma carta à Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA) (o GDSE foi integrado na DSPA em 2021), solicitando uma resposta à renovação do contrato de concessão para dar passos em frente nos respectivos trabalhos (Documento 20 da Oposição da 1ª requerida).
101. O Governo da RAEM esperava que o fornecimento de gás natural a montante e a jusante fosse objecto dum mesmo contrato de concessão. Ao mesmo tempo, antes de a respectiva proposta ser concretizada, o Governo da RAEM propôs à 1ª requerida a renovação do contrato por meio ano ou um ano, de modo a facilitar uma “transição” suave.
102. A 1ª requerida enviou também uma carta à requerente (datada de 15 de Outubro de 2021) explicando a situação e salientando que o Governo da RAEM estava a considerar a renovação de meio ano ou um ano nos mesmos termos do contrato de concessão então celebrado (documento 21 da Oposição da 1ª requerente).
103. Tendo em conta que se aproximava o termo do prazo do contrato de concessão, a 1ª requerida se encontrava numa posição passiva. O Governo da RAEM tentou adoptar uma abordagem “de duas passos”, ou seja, por um lado, pretendia promover o plano de fusão das concessões de gás natural a montante e a jusante em Macau, e, por outro, antes de ter a certeza de que será adoptado na prática, sempre estava a arrastar o processo de renovação do contrato de concessão com a 1ª requerida, sem estar claro quanto à decisão de renovar ou não o contrato.
104. A 1ª requerida estava numa posição passiva, e a decisão sobre se o contrato de concessão podia ou não ser renovado no âmbito do mesmo objecto não dependia da 1ª requerida.
105. Desde o início da revisão do cumprimento do contrato de concessão, em Dezembro de 2016, até ao início formal da negociação para a renovação do contrato, em Março de 2018, a requerente estava plenamente consciente de todo o processo, incluindo a respectiva intenção do Governo da REAM. A 1ª requerida não lhe escondeu nada.
106. A requerente tinha proposto que, se a 1ª requerida não conseguisse obter a renovação do contrato de concessão, o Governo da RAEM deveria pagar à requerente os 9% das receitas acordados durante a vigência do contrato de concessão, sob pena de a 1ª requerida instaurar acção indemnizatória contra o Governo da RAEM.
107. Quando a 1ª requerida foi criada em 2006, a requerente e a L detinham, cada uma, uma participação de 50%, e o capital social registado era de MOP50.000.000,00.
108. Em 2010, o capital social foi aumentado para MOP72.000.000,00 e a requerente e a L ainda detinham 50% cada.
109. Em 2014, o capital social foi aumentado para MOP112.000.000,00 e a requerente e a L ainda detinham 50% cada.
110. Em 2016, a requerente transferiu uma quota de 45% para a «I Limited» pelo valor original, ficando a requerente com apenas uma quota de 5%.
111. De 2006 a 2016, ou seja, o período durante o qual a requerente geriu a 1ª requerida, a empresa sofreu grandes perdas (aproximadamente MOP260.208.000,00 cumulativamente), com um rácio de endividamento muito elevado, de 194%.
112. Só quando a L e a I Limited detinham, em conjunto, 95 por cento das quotas da 1ª requerida é que as duas sócias se esforçavam por reduzir as perdas da empresa.
113. As perdas da 1ª requerida resultaram exclusivamente das operações comerciais.
114. A 1ª requerida promoveu activamente a renovação do contrato. Na ausência de uma resposta definitiva do Governo da RAEM no sentido de não renovação do contrato de concessão, a 1ª requerida continuou a envidar os seus melhores esforços para explorar a empresa.
115. Só em 14 de Dezembro de 2021 é que a DSPA deu uma resposta verbal ao presidente do conselho de administração da 1ª requerida (ou seja, o 2º requerido) no sentido de não renovar o contrato de concessão.
116. Tendo em conta a expiração iminente do contrato de concessão em 16 de Dezembro de 2021, a sócia da 1ª requerida (I) solicitou uma assembleia geral urgente assim que foi informada da notícia. Quando a requerente foi notificada através de convocatória, alegou que se tratava de uma convocação indevida por violar os estatutos (menos de 15 dias de antecedência). A assembleia acabou por não se realizar (Documento 23 da Oposição da 1ª requerida).
117. O Contrato de Concessão do «Serviço Público de Fornecimento por Grosso de Gás Natural», celebrado entre o Governo da RAEM e a Q Limitada, em 17 de Dezembro de 2021, tem por objecto: a aquisição, importação, armazenagem, transporte, distribuição e venda por grosso, de gás natural nos seus diferentes estados físico (cfr. artigo 2º do contrato de concessão no documento 14 da petição inicial).
118. O objecto do contrato de concessão atribuído à 1ª requerida em 2006 consiste:
1) Na aquisição de gás natural, no estado gasoso ou liquefeito, e a sua colocação na Região Administrativa Especial de Macau;
2) Nas actividades de recepção de gás natural no estado gasoso ou liquefeito;
3) No transporte, fornecimento e venda de gás natural em alta ou média pressão aos operadores de redes de distribuição e aos consumidores directos.
(cfr. artigo 1º do contrato de concessão no documento 3 da petição inicial).
119. O contrato atribuído à 1ª requerida limitou-se a permitir-lhe o transporte, fornecimento e venda de gás natural em alta ou média pressão à P (operadora de redes de distribuição) e à W (consumidor directo).
120. O novo contrato de concessão, todavia, inclui o gás natural em pressão inferior à média, quer dizer que permite o transporte, fornecimento e venda directos de gás natural aos operadores de instalações de gás (prédios residenciais) e aos clientes comerciais; além disso, foi acrescentada a distribuição e a venda por grosso de gás natural nos seus diferentes estados físico.
121. O novo contrato de concessão tem um âmbito mais largo do que o do contrato de concessão da 1ª requerida, ou seja, o contrato de concessão de 2006 apenas abrangia o fornecimento de gás natural a montante e a meio, enquanto o contrato de concessão de 2021 abrange o fornecimento de gás natural a montante, a meio e a jusante.
122. A 1ª requerida não tem capacidade para prestar serviços de fornecimento de gás natural a jusante em termos de equipamento e recursos.
123. Nos termos do artigo 3.º, n.º 5.º do contrato de concessão da 1ª requerida, no termo da concessão a 1ª requerida apenas goza do direito de preferência na atribuição da nova concessão, sobre o mesmo objecto, se se encontrar em igualdade de condições com outros concorrentes.
124. A 1ª requerida não discutiu com a DSPA e a Companhia a J quaisquer questões relacionadas com o novo contrato de concessão, e o que alegou a requerente – que as participantes da reunião tinham acordado sobre os termos e condições – não era verdade.
125. O(s) representante(s) da 1ª requerida tem(têm) vindo a expressar o seu pedido de renovação do contrato de concessão nas reuniões anteriores com a DSPA.
126. Ao longo de todo o processo de negociação sobre a renovação do contrato, a 1ª requerida sempre deu conhecimento e explicações à requerente.
127. Nos termos do contrato de concessão de 2006, a concessionária só podia transportar, fornecer de vender gás natural aos operadores de redes de distribuição (as entidades titulares dos direitos de construção e exploração da rede de distribuição de gás natural, i.e. a P) e aos consumidores directos (as entidades titulares dos direitos de construção e exploração de centrais termoeléctricas, ou seja, a CEM).
128. De acordo com o contrato de concessão de 2021, a concessionária pode transportar, distribuir e vender por grosso gás natural a todos os consumidores (incluindo operadores de redes de distribuição, consumidores directos, operadores de instalações de gás (edifícios residenciais) e utilizadores comerciais, entre outros).
129. Como uma sociedade detentora de exclusivo, o objecto social da 1ª requerida estava limitado ao objecto da concessão, podendo apenas exercer a actividade de fornecimento de gás natural a montante e a meio.
130. Todavia, o objecto da Q Limitada abrange o fornecimento de gás natural a montante, a meio e a jusante.
131. Devido à diferença no objecto da concessão, o Governo da RAEM não notificou a 1ª requerida para exercer o direito de preferência estipulado no contrato de concessão.
132. A Q Limitada não foi criada pela 1ª requerida.
133. Em 14 de Dezembro de 2021, a 1ª requerida recebeu uma notificação verbal da DSPA no sentido de não renovação do contrato.
134. Com a perda do seu direito à exclusividade e a extinção do objecto, a 1ª requerida teve de despedir os seus empregados.
135. A contratação, pela Q Limitada, dos trabalhadores despedidos foi da decisão desta última.
136. Desde a constituição da 1ª requerida até 14 de Dezembro de 2021, a requerente nunca se opôs a ser convocada por telefone ou por fax, e participou em reuniões por vídeo, tendo depois juntado a sua assinatura.
137. Durante o período em que a requerente foi presidente da mesa da assembleia geral, as seguintes reuniões ou foram “não convocadas por escrito/com data da convocatória inferior a 15 dias da data da reunião” ou “realizadas fora de Macau” (cfr. documentos 24 a 48 da Oposição da 1ª requerida):
N.º
Designação da reunião
Data da reunião
Local da reunião
Convocação
Documentos
1
Assembleia geral extraordinária
11/10/2010
Pequim
Sem convocação escrita
24
2
Assembleia geral ordinária anual
26/03/2011
Sala de Conferências da L, Sucursal de Gás Natural, sita na Rua XX, n.º XX, XX.º andar, distrito Xicheng, Pequim, China
Data da convocatória: 15/03/2011
25
3
Assembleia geral extraordinária
12/05/2011
Sede da pessoa colectiva
Sem convocação escrita
26-29
4
Assembleia geral ordinária anual
29/03/2012
Sala de Conferências da L, Sucursal de Gás Natural, sita na Rua XX, n.º XX, distrito Chaoyang, Pequim, China
Data da convocatória: 23/03/2012
30
5
Assembleia geral
04/11/2012
Hotel XX
Sem convocação escrita
31
6
Assembleia geral
13/12/2012
Hotel XX
Sem convocação escrita
32
7
A 3ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2013
14/06/2013
Sala de Conferências n.º 923 da L, Sucursal de Gás Natural
Sem convocação escrita
33
8
A 5ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2013
16/12/2013
Sala de Conferências n.º 1021 do Edifício n.º XX, sito na Rua XX, n.º XX, distrito Chaoyang, Pequim, China
Sem convocação escrita
34
9
A 1ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2014
08/01/2014
Macau
Sem convocação escrita
35
10
A 3ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2014
20/05/2014
Sede da pessoa colectiva
Data da convocatória: 13/05/2014
36
11
A 4ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2014
21/07/2014
Sala de Conferências da H Limitada, no X, XX.º andar, XX-N, XX, no.XX
Sem convocação
37
12
A 1ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2015
29/05/2015
Sala de Conferências da H Limitada, no X, XX.º andar, XX
Sem convocação escrita
38-39
13
A 2ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2015
03/08/2015
Sala de Conferências da I, Sucursal de Gás Natural, Pequim
Sem convocação escrita
40
14
A 4ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2015
25/11/2015
Sala de Conferências da I, Sucursal de Gás Natural, Pequim
Sem convocação escrita
41
15
Assembleia geral ordinário anual de 2015
27/04/2016
Sede da pessoa colectiva
Data da convocatória: 21/04/2016
42-45
16
A 1ª sessão extraordinária da assembleia geral de 2016
07/12/2016
H Limitada
Sem convocação escrita
46
17
Assembleia extraordinária
07/12/2016
H Limitada
Sem convocação escrita
47
18
Assembleia extraordinária
07/12/2016
H Limitada
Sem convocação escrita
48
138. Durante o período em que a requerente foi presidente da mesa da assembleia geral, sempre efectuou a convocação através destes meios, tendo também realizado as assembleias gerais no exterior de Macau.
139. A situação operacional da 1ª requerida de 2006 a 2021 consta de fls. 484 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
140. Desde a cedência da quota de 45% da requerente à I Limited em 2016, o que tornou a L e a I Limited titulares de um total de 95% das quotas sociais da 1ª requerida, foram tomadas várias medidas para abordar o problema de perdas da A, tanto a nível externo como interno, com o apoio da I, incluindo a coordenação da I com os fornecedores de gás a montante para baixar temporariamente o preço de aquisição de gás natural e optimização da estrutura da dívida, entre outras.
141. O prejuízo antes de impostos da 1ª requerida em 2016 foi de 47.583.926,00 patacas. Em comparação, o prejuízo antes de impostos em 2017 foi de apenas 4.942.631,00 patacas.
142. A 1ª requerida, através dos esforços dos membros da administração e da sócia I, conseguiu reduzir o preço de compra de gás de RMB3,668 por metro cúbico para RMB2,16 por metro cúbico, o que resultou no facto de os preços de compra e venda deixar de estar invertidos e num ligeiro lucro bruto.
143. A 1ª requerida também reduziu os seus custos financeiros através da redução das despesas de funcionamento da empresa e através dos seguintes meios:
(1) A sócia I Limited concedeu um empréstimo a juros baixos de 25 milhões de dólares americanos através da T para substituir a dívida a juros elevados. O empréstimo original de sócio (sic) de 20,32 milhões de dólares foi substituído e a taxa de juro do empréstimo foi reduzida de 3% para aproximadamente 2%;
(2) Conversão de dívida remunerada em dívida não remunerada. Por um lado, liquidação da dívida com juros elevados pelo atraso no pagamento de gás para com a Y e, por outro lado, os quatro credores locais em Macau concordaram que os juros e a cláusula penal pelo pagamento em atraso de dívida deixariam de ser calculados a partir de 1 de Julho de 2017;
(3) Reembolso de 23,3 milhões de patacas ao Banco U (taxa de juro original de cerca de 3,45%);
(4) Reduzir a taxa de juro do empréstimo da conta a descoberto do S. Após repetidas negociações com o S, foi acordado que a taxa de juro do empréstimo seria reduzida dos 4,5% para cerca de 2%.
144. As remunerações dos trabalhadores (incluindo vencimentos, segurança social, seguros e benefícios) para o ano de 2017 totalizaram cerca de 8,2 milhões de patacas.
145. A fonte de gás mais barata e a substituição de dívidas acima referidas levaram a uma redução dos custos operacionais da 1ª requerida.
146. Além disso, a 1ª requerida celebrou um acordo de fornecimento provisório de oxigénio(sic) com a W, que também resultou num aumento de receitas.
147. Devido aos supra referidos trabalhos de reestruturação da 1ª requerida, a carga de trabalho dos seus trabalhadores também aumentou, pelo que a 1ª requerida decidiu recompensar todos os seus trabalhadores através de prémios de desempenho no valor total de 830.000,00, o que equivale a cerca de 10% dos seus custos com pessoal para esse ano.
148. A 1ª requerida tinha sempre o hábito de pagar bónus, mesmo em 2016, quando o prejuízo do ano foi de 47,584 milhões, a requerente(sic) concordou em pagar um bónus de MOP300.000,00 como incentivo para a operação segura para o ano de 2016 (Documento 48 da Oposição da 1ª requerida).
149. "Despesas com pessoal" na "Conta de Demonstração de Resultados" e "Dinheiro pago a e para empregados" na "Demonstração dos Fluxos de Caixa Consolidada" não são o mesmo conceito.
150. O montante total das "despesas com pessoal" na Declaração de Rendimentos de 2017 (Grupo A do Imposto Complementar de Rendimentos) da 1ª requerida foi de MOP8.203.020,00 (ver fls. 5 do documento 1 da Oposição da 1ª requerida).
151. As "despesas com pessoal" no Relatório Anual de Auditoria de 2017 da 1ª requerida totalizaram MOP8.203.020,00 (ver documento 49 da Oposição da 1ª requerida).
152. As "Despesas com Pessoal" da 1ª requerida são consistentes na "Conta de Demonstração de Resultados", na "Declaração do Imposto Suplementar de Rendimento" e no "Relatório do Auditoria".
153. Na primeira reunião ordinária do conselho de administração da 1ª requerida para o ano de 2018, realizada em 28 de Março de 2018, deliberou-se aprovar o Relatório de Contas Finais e o Relatório de Auditoria relativos ao ano de 2017. Na referida reunião esteve também presente o representante da requerente, V (fls. 17 do Documento 1 da Oposição da 1ª requerida).
154. Na assembleia geral anual ordinária para o ano de 2017, realizada em 28 de Março de 2018, deliberou-se aprovar os respectivos Relatório de Contas Finais e Relatório de Auditoria. O representante da requerente, que também estava presente, também levantou a mão em sinal de concordância e assinou a acta da assembleia.
155. Dispõe o artigo 28.º, n.º 1 do Contrato de Concessão do Serviço Público de Importação e Transporte de Gás Natural na Região Administrativa Especial de Macau que “Para garantia do cumprimento dos deveres emergentes do contrato de concessão, a concessionária prestou caução, no valor de $ 30 000 000,00 (trinta milhões de patacas)…”
156. O n.º 5 do mesmo artigo estabelece que “A caução a que se refere o presente artigo e outras que a concessionária esteja obrigada a constituir a favor do concedente, podem ser prestadas por depósito em dinheiro, garantia bancária ou seguro-caução autónomo.”
157. A 1ª requerida prestou a caução através de garantia bancária. Ou seja, depositou MOP 30.000.000,00 (trinta milhões de patacas) no S como garantia, e o S emitiu ao Governo da RAEM uma garantia de montante igual.
158. Para a empresa, se o banco subscritor da garantia aceitar garantia de crédito, a empresa pode melhorar a sua eficiência da utilização do capital.
159. A substituição de garantia mencionada na deliberação da assembleia geral destinava-se precisamente a evitar a colocação do dinheiro, como garantia, no banco a uma taxa de juro mais baixa. Ou seja, visava levantar os 30 milhões de patacas anteriormente depositados no S a uma taxa de juro mais baixa para reembolsar os empréstimos bancários concedidos a uma taxa de juro mais elevada. O modus operandi específico consistia em a T Limited prestar garantia ao Z Macau, que por sua vez emitiu uma garantia ao Governo da RAEM para a 1ª requerida, para substituir a anterior garantia emitida pelo S.
160. A deliberação acima referida sobre a substituição de garantia acabou por não ter sido executada, tendo-se a garantia emitida pelo S mantido até à data.
161. O pedido apresentado pela 1ª requerida à DSPA em 4 de Agosto de 2021 para substituição de banco em que a caução se encontrava depositada, foi uma solução alternativa proposta pela administração da 1ª requerida em benefício da empresa, depois de a supra referida deliberação não ter podido ser executada.
162. O 4º requerido tornou-se administrador da 1ª requerida a partir de 1 de Julho de 2021.
163. O 7º requerido foi director-geral adjunto da Comissão Executiva da 1ª requerida de 6 de Novembro de 2012 a 4 de Maio de 2013, membro da Comissão Executiva da 1ª requerida de 14 de Maio de 2013 a 26 de Abril de 2017, e director-geral adjunto da Comissão Executiva da 1ª requerida de 27 de Abril de 2017 a 23 de Dezembro de 2021.
164. Eram da responsabilidade do 7º requerido a gestão do pessoal, a formação dos trabalhadores, a cultura empresarial e os recursos humanos da empresa.
165. Em 16 de Dezembro de 2021, o 7º requerido deixou a empresa.
166. O sistema contabilístico da 1ª requerida foi substituído em Junho de 2017 (doravante designado por "novo sistema financeiro"). As contas relativas aos meses de Janeiro a Maio de 2017 ainda estavam a ser feitas utilizando o antigo sistema financeiro.
167. No antigo sistema financeiro, as "Despesas com o pessoal" encontravam-se reflectidas na "Conta de Demonstração de Resultados"; o novo sistema financeiro demonstra as "Despesas com o pessoal" na "Demonstração das despesas de gestão (consolidada)", em vez da "Demonstração dos fluxos de caixa consolidados".
168. As demonstrações financeiras de Julho e Agosto de 2017 fornecidas pela 1ª requerida à requerente não incluíam a Demonstração das despesas de gestão (consolidada) de Julho e Agosto de 2017.
169. A "Demonstração das despesas de gestão (consolidada)" para os meses de Junho a Agosto de 2017, apresentada pela 1ª requerida, foi exportada do sistema contabilístico.
170. Relativamente à demonstração financeira para o mês de Junho de 2017, a 1ª requerida apresentou um documento utilizando os sistemas antigo e novo, respectivamente.
171. Nas demonstrações financeiras de Junho produzidas pelos sistemas antigo e novo, houve uma diferença em termos do valor da remuneração dos empregados, tendo o antigo sistema apresentado MOP751.518,57 e o novo sistema MOP741.785,97. Isto deveu-se principalmente ao facto de que, durante a introdução dos itens discriminados, alguns itens não foram considerados pelo novo sistema como pertencentes a "Remuneração dos Funcionários", mas foram incluídos, no antigo sistema, na “Remuneração dos Empregados”, e daí a diferença de valor.
172. Desde Julho de 2017, as demonstrações financeiras apresentadas pela 1ª requerida à autora foram inteiramente produzidas pelo novo sistema, as quais incluíam cinco tipos de demonstrações: o balanço consolidado, a demonstração consolidada de lucros e distribuição de lucros, a demonstração consolidada dos fluxos de caixa, a demonstração consolidada de lucros e distribuição de lucros por inquérito de penetração e o inquérito holográfico de activos.
173. Em Agosto de 2017, as demonstrações financeiras apresentadas pela 1ª requerida à autora não continham a demonstração de lucros consolidados e de distribuição de lucros por inquérito de penetração, havendo apenas as outras quatro demonstrações.
174. De Setembro de 2017 a Dezembro de 2017, as demonstrações financeiras apresentadas pela 1ª requerida à autora foram fixas em seis tipos, incluindo o balanço consolidado, a demonstração consolidada de lucros e distribuição de lucros, a demonstração consolidada dos fluxos de caixa, o inquérito holográfico de activos (sic), a demonstração de despesas financeiras (consolidada), e a demonstração de despesas de gestão (consolidada).
175. As demonstrações financeiras relativas ao mês de Julho de 2017 incluíam a "demonstração consolidada dos lucros e da distribuição dos lucros por inquérito penetrante". Os itens discriminados n.ºs 3 a 7 desse documento mostram que o montante dos salários e benefícios dos trabalhadores para esse mês totalizou MOP673.146,86, que é o mesmo valor que as "despesas com pessoal" apresentados pela 1ª requerida para esse mês.
176. Devido às dificuldades de deslocação entre o interior da China e Macau em consequência da epidemia, após a aprovação da deliberação da assembleia geral de 1 de Julho de 2021, ainda não foi possível processar o documento de nomeação de novo administrador, D, pelo que o registo não foi efectuado em tempo útil.
b) Do Direito
Questão prévia.
Nas suas contra alegações de recurso pela Requerente/Recorrida vem a final pedir que se declare nula a decisão recorrida com base no disposto no artº 571º nº 1 al. c) do CPC.
Nos termos do nº 3 do artº 571º do CPC a alegada nulidade pode ser fundamento de recurso.
O recurso da decisão é interposto no prazo de 10 dias a contar da respectiva notificação, sem prejuízo de poder ser interposto recurso subordinado em igual prazo mas a contar da notificação do despacho que admita o recurso da parte contrária.
No caso em apreço a Requerente/Recorrida nem interpôs recurso, nem recurso subordinado, pelo que, não pode este tribunal conhecer da invocada nulidade da decisão.
Dos recursos interpostos.
Nestes autos foi interposto recurso da decisão proferida pelos Requeridos insurgindo-se aqueles contra os seguintes segmentos do decidido:
A) Nos termos do artigo 1263.º, n.º 1 do CPC, ordenar os 1ª a 7º requeridos a prestar à requerente, no prazo de 30 dias, a seguinte informação:
a. Correspondência, documentos de pedido e relatórios, se os houver, entre a 1ª requerida e o Governo da RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas e o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigamente o GDSE), ao longo dos anos, em relação ao projecto de gás natural concedido à 1ª requerida;
b. Actas das reuniões da assembleia geral realizadas desde a constituição da 1ª requerida (com excepção das actas das reuniões da assembleia geral realizadas entre o ano de 2017 e o ano de 2021).
B) Deferir a realização de exame judicial ao seguinte facto da 1ª requerida (a deliberação tomada na reunião extraordinária da assembleia geral realizada em 22 de Janeiro de 2018 no sentido de distribuir prémios de desempenho a cinco membros da comissão executiva, devendo apurar, inclusivamente, quem foram os referidos cinco membros, os montantes dos prémios recebidos e o modo de cálculo desses montantes);
No segmento A) a. da decisão recorrida está em causa a consulta de “Correspondência, documentos de pedido e relatórios, se os houver, entre a 1ª requerida e o Governo da RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas e o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigamente o GDSE), ao longo dos anos, em relação ao projecto de gás natural concedido à 1ª requerida”.
Com fundamento na alínea g) do nº 1 do artº 209º do C.Com. na decisão recorrida entendeu-se que os Requeridos estavam obrigados a facultar os referidos documentos à Requerente.
Cita-se na decisão recorrida uma passagem do Acórdão de 24.03.2022 deste Tribunal proferido no processo que correu termos sob o nº 190/2022, contudo o objecto de decisão não era a informação a prestar pela sociedade mas a informação pedida por um sócio sobre negócios da sociedade com a Administração Pública.
Do texto do citado Acórdão com interesse para a decisão destes autos, consta que:
«(…)
O direito à informação sobre a vida da sociedade por parte dos sócios de uma sociedade comercial por quotas encontra-se consagrado em termos gerais no artº 209º do C. Comercial e, na parte especial do código, norma alguma existe que dispõe quanto ao direito à informação por parte dos sócios de uma sociedade por quotas.
In casu, pretende a requerente ser informada sobre o que se tem passado entre a B, de que é sócio, e a Administração da RAEM, no âmbito de execução do contrato de concessão celebrado entre estes últimos.
As tais informações sobre as actividades desenvolvidas na vida da sociedade são perfeitamente integráveis na informação a que se refere o artº 209º/1-g) do C. Comercial, que reza que todo o sócio tem direito a requerer, por escrito, à administração, informação escrita sobre a gestão da sociedade, nomeadamente sobre qualquer operação social em particular.
É verdade que o artº 209º do C. Comercial que consagra do direito à informação por parte dos sócios.
Todavia, o tal direito está inserido no contexto das relações entre os sócios e a sociedade, reguladas pelos artºs 194º e s.s. do mesmo código.
Tendo em conta o contexto em que está inserido o artº 209º/1-g), que consagra o direito à informação por parte dos sócios, é de concluir que ao reconhecer o direito à informação aos sócios mediante o requerimento dirigido à administração da sociedade, o legislador quis circunscrever o exercício do direito às relações internas entre os sócios e a sociedade e que não teve a intenção de estender o direito de forma que os sócios possam contornar a administração da sociedade para se dirigir directamente aos terceiros com os quais a sociedade tem negócios jurídicos celebrados, mesmo que estes negócios possam ter reflexos na esfera jurídica dos sócios, nomeadamente aquando da participação nas eventuais perdas do exercício da sociedade.
Aliás, o legislador já teve o especial cuidado de assegurar a efectividade do direito à informação que reconhece aos sócios, o que é bem demonstrado pelo preceituado no artº 209º/4 do C. Comercial, à luz do qual em caso de recusa da informação solicitada, o sócio pode requerer ao tribunal que ordene que esta lhe seja prestada, fundamentando o pedido. …... se o pedido for deferido, os administradores responsáveis pela recusa devem indemnizar o sócio pelos prejuízos causados e reembolsá-lo das despesas que fundadamente tenha realizado.
Assim sendo, no caso em apreço, não obstante dotada de legitimidade processual activa para reagir judicialmente contra a decisão administrativa reputada por negatória da sua pretensão de obter certidão de determinados elementos constantes de um procedimento administrativo, a requerente A Macau carece sempre de legitimidade substantiva por não ser titular do direito à informação que pretende fazer valer contra a Administração da RAEM ao abrigo do artº 64º/2 do CPA.
(…)
Resumindo e concluindo:
O sócio de uma sociedade comercial por quotas, enquanto tal, não pode obter junto da Administração da RAEM certidão dos elementos constantes do procedimento administrativo desenvolvido no âmbito da execução de um contrato de concessão de serviço público, de que é parte concessionária a sociedade, por carecer da legitimidade substantiva, dada a falta do direito subjectivo à informação que pretende fazer valer ao abrigo do artº 64º/2 do CPA, nas relações imediatas para com a Administração da RAEM.».
Em alegações de Recurso cita-se o Acórdão de 07.12.2022 deste Tribunal proferido no processo que correu termos sob o nº 682/2022 e onde se diz:
«Acerca do direito à informação dos sócios, pode-se tomar como referência o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal n.º 1484/19.9T8LRA.C1.S1 de 19/10/2021, em que se lê: “A expressão direito à informação a que alude o art. 214.º, n.º 1, do CSC, reveste sentido amplo, abrangendo três direitos parcelares do sócio de sociedade por quotas: o direito à informação em sentido estrito que se consubstancia no pedido de conhecimento da vida societária, a concretizar através de perguntas que entenda formular sobre os actos substantivos e concretos de gestão, praticados ou a praticar pelos gerentes, e respectivas consequências, obrigando-os a fornecer respostas verdadeiras, completas e elucidativas; o direito à consulta da documentação da sociedade (escrituração, livros e outros documentos), com a exigência da sua exibição, a efectuar na sede da sociedade, com o auxílio de perito ou especialista contratado pelo sócio interessado se assim o entender; e o direito à inspecção concretizada através da actividade necessária para que o sócio vistorie os bens sociais.”
Simplesmente dito, o direito à informação do sócio de sociedade é constituído pelo direito à informação em sentido estrito, pelo direito à consulta e pelo direito à inspecção.
…
À luz da prescrição acima citada, salvo para a votação pela assembleia de sócios, o direito à informação em sentido estrito do sócio da sociedade está sujeito às restrições seguintes:
I. É antes o relatório sobre a gestão da sociedade elaborado pela administração a que o sócio tem direito, em vez da documentação sobre a gestão da sociedade que se pode obter directamente mediante solicitação.
Tal como indica o 2.º Juízo Cível do TJB na sentença n.º CV2-18-0028-CPE: “O direito à informação é, em primeiro lugar, um direito a obter conhecimento de factos, não um direito a obter provas de factos, seja através do fornecimento de documentos, seja através do fornecimento de simples cópias de documentos.”
II. O relatório a que o sócio tem direito tem a ver, obrigatoriamente, com questões concretas sobre a gestão da sociedade, sobretudo a respeito de actividades determinadas da exploração; não se tratando de um relatório global sobre a gestão da sociedade.
A sentença n.º CV2-18-0028-CPE acima citada referia também esta questão: “Fora da assembleia geral ordinária, o direito dos sócios à informação sobre a gestão é pontual, versando sobre questões concretas do sócio a respeito de aspectos determinados da gestão. Nem se compreenderia bem, nem seria praticável, que cada sócio tivesse um direito a ser pessoalmente informado em qualquer altura, por escrito, sobre a gestão “global”, o que obrigaria a administração a ter em permanência um relatório da gestão sempre em actualização para poder satisfazer tal direito dos sócios.”».
Como resulta das duas decisões citadas o sócio tem direito a consultar – cf. al. a) a e) do nº 1 do artº 209º do C.Com. -, requerer cópias de deliberações ou lançamentos nos livros referidos nas alíneas a) a d) – cf. al. h) do nº 1 do artº 209º do C.Com. -, solicitar informação – cf. al. f) e g) do nº 1 do artº 209º do C.Com. – e requerer o exame judicial à sociedade, isto é, direito à inspecção – cf. artº 211º do C.Com. –.
Concretizando, e como no Acórdão citado já se diz o direito à informação do sócio traduz-se no:
- Direito à consulta mas apenas dos documentos elencados e só podendo obter cópias nos casos indicados.
- Direito à informação em sentido estrito quanto a matéria da ordem de trabalho da Assembleia Geral razoavelmente necessário ao exercício do direito de voto, e informação escrita sobre a gestão da sociedade ou qualquer operação social em particular.
- Direito à inspecção quanto a factos que consubstanciem suspeitas de graves irregularidades da vida da sociedade.
Na decisão recorrida cita-se Doutrina Portuguesa sobre o direito de informação do sócio.
Contudo o quadro normativo do Código das Sociedades Comerciais Portuguesas é bastante diferente do Código Comercial de Macau.
No caso Português o Direito à informação varia em função do tipo da sociedade, sendo que no caso das sociedades por quotas o nº 1 do artº 214º do CSC consagra que “os gerentes devem prestar a qualquer sócio que o requeira informação verdadeira, completa e elucidativa sobre a gestão da sociedade e bem assim facultar-lhe na sede social a consulta da respectiva escrituração, livros e documentos. A informação será dada por escrito, se assim for solicitado”.
Como resulta da disposição legal citada o direito de consulta na legislação Portuguesa é muito mais abrangente do que na de Macau permitindo a consulta de todo e qualquer documento3.
No Código Comercial de Macau o direito de consulta do sócio está muito mais limitado, cingindo-se aos documentos elencados no artº 209º do C.Com. à semelhança do que acontece em Portugal quanto às sociedades anónimas e em comandita por acções.
Destarte, da alínea g) do nº 1 do artº 209º do C.Com. não resulta um “direito a consultar” mas um “direito à informação em sentido estrito” o qual não abrange a possibilidade de consulta de todo e qualquer documento. Sem prejuízo de se sustentar que numa interpretação mais alargada do preceito se possa entender que o sócio tenha não só direito à informação por escrito quanto ao assunto objecto da mesma como também à consulta dos documentos que a fundamentam, o pedido de informação tem de ter por objecto um negócio/operação em concreto o que não se coaduna com a consulta aleatória de toda a documentação referente à relação com um ou mais clientes, cabendo a quem pede a informação especificar objectivamente o que pretende.
Sobre o Direito à informação em sentido estrito veja-se Jorge Manuel Coutinho de Abreu na obra indicada a pág. 246/248:
«O direito à informação em sentido estrito pode ser exercido fora das assembleias gerais ou nelas. No primeiro caso, têm os sócios o poder de exigir do órgão de administração informação “verdadeira, completa e elucidativa” sobre a “gestão da sociedade” ou “assuntos sociais” (arts. 181º, 1, 214º, 1, 291º, 1) – sobre, por exemplo, negócios realizados pela sociedade, abertura ou encerramento de estabelecimentos ou secções sociais, relações de cooperação com outra empresas, relações com sociedades coligadas, resultados de pareceres económicos, jurídicos ou financeiros solicitados pela sociedade, atuação de membros de órgãos sociais em determinadas circunstâncias. Titular deste direito é qualquer sócio nas sociedades em nome coletivo, por quotas, em comandita simples e – quanto aos sócio comanditados – por ações (arts. 181º, 1, 214º, 1, 474º, 480º). Não assim nas sociedades anónimas e (quanto aos sócios comanditários) em comandita por ações. De acordo com o nº 1 do art. 291º, só os “acionistas [um ou mais - agrupados] cujas ações atinjam 10% do capital social podem solicitar, por escrito, ao conselho de administração ou ao conselho de administração executivo que lhes sejam prestadas, também por escrito, informações sobre assuntos sociais”.
Nas assembleias gerais das sociedades de qualquer tipo todo o sócio que nelas participe pode requerer que lhe sejam prestadas (pelo órgão social que para tal esteja habilitado) informações verdadeiras, completas e elucidativas que lhe permitam formar opinião fundamentada sobre os assuntos sujeitos a deliberação (cabendo nestes assuntos relações com sociedades coligadas). É o que resulta do art. 290º, 1 e 2, aplicável diretamente às sociedades anónimas e por remissão de vários preceitos às sociedades dos outros tipos (arts. 189º, 1, 214º, 7, 474º, 478º). Explicite-se um ponto: também os sócios sem direito de voto ou impedidos de o exercer têm direito a ser informados em assembleia geral quando nela possam participar e participem. Também eles têm direito a “formar opinião fundamentada sobre os assuntos sujeitos a deliberação”, pois podem intervir na discussão desses assuntos e reagir contra as deliberações sobre eles tomadas.».
Assim sendo, enferma a decisão recorrida de erro sobre o julgamento quanto a esta matéria impondo-se conceder provimento ao recurso e revogar a decisão de autorizar a consulta de “Correspondência, documentos de pedido e relatórios, se os houver, entre a 1ª requerida e o Governo da RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas e o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigamente o GDSE), ao longo dos anos, em relação ao projecto de gás natural concedido à 1ª requerida”.
Mais vem interposto recurso do sector da decisão recorrida que autoriza a consulta das “Actas das reuniões da assembleia geral realizadas desde a constituição da 1ª requerida (com excepção das actas das reuniões da assembleia geral realizadas entre o ano de 2017 e o ano de 2021)”.
Ora quanto a esta parte vale tudo quanto se disse supra tendo o sócio direito a consultar os livros de actas da assembleia geral, sendo certo que, não é por ter sido quem estava no exercício da administração ao tempo ou por já as ter visto aquando da sua realização que está impedido de o fazer.
Pelo que, são infundados todos os argumentos invocados em sede de recurso, impondo-se decidir em conformidade e manter o decidido.
Relativamente à terceira parte da decisão recorrida que foi impugnada e que consiste em “Deferir a realização de exame judicial ao seguinte facto da 1ª requerida (a deliberação tomada na reunião extraordinária da assembleia geral realizada em 22 de Janeiro de 2018 no sentido de distribuir prémios de desempenho a cinco membros da comissão executiva, devendo apurar, inclusivamente, quem foram os referidos cinco membros, os montantes dos prémios recebidos e o modo de cálculo desses montantes)”, o que consta da decisão recorrida é o seguinte:
«Cumpre agora analisar se existem motivos para realizar exame judicial à sociedade.
Dispõe o artigo 211.º, n.º 1 do Código Comercial que “Se algum sócio tiver fundadas suspeitas de graves irregularidades na vida da sociedade pode, indicando os factos em que se fundamentam as suspeitas e quais as irregularidades, requerer ao tribunal a realização de exame à sociedade para apuramento destas.”
Estatui o artigo 1262.º, n.º 1 do CPC que “Quem pretenda a realização de exame judicial à sociedade, comercial ou civil, nos casos em que a lei o permita, deve expor os motivos do exame, bem como indicar os pontos de facto que interesse averiguar e as providências que repute convenientes.”
Ou seja, o objecto do exame judicial é o apuramento das irregularidades que o requerente suspeita existir. Para o efeito, deve o requerente expor os motivos do exame e indicar os pontos de facto que interesse averiguar.
No caso em apreço, a requerente indicou os seguintes dois pontos de facto que interesse averiguar:
a. A deliberação tomada na reunião extraordinária da assembleia geral realizada em 22 de Janeiro de 2018 no sentido de distribuir prémios de desempenho a cinco membros da comissão executiva, devendo apurar, nomeadamente, quem foram os referidos cinco membros, os montantes dos prémios recebidos e o modo de cálculo desses montantes;
b. A substituição do banco subscritor da garantia, e o paradeiro da quantia de 30.000.000,00 patacas da garantia original substituída.
O objectivo do exame judicial é apurar as irregularidades de que a requerente suspeita através da realização de exame aos pontos de facto que este pretende averiguar. Por conseguinte, ao analisar se é necessário realizar exame judicial, convém apenas considerar se as irregularidades de que a requerente tem suspeitas são suficientes para justificar a realização de exame judicial aos pontos de facto que interesse averiguar.
De entre as irregularidades alegadas pela requerente, apenas os ponto 3 (falta de convocação da assembleia geral, privando os sócios dos seus direitos de participação e de voto), ponto 4 (prejuízo dos interesses da sociedade, dos sócios e dos credores) e a parte 1 do ponto 6 (discrepâncias com as declarações fiscais) têm a ver com o ponto de facto a. supra.
Apenas o ponto 7 (substituição de garantia) das referidas irregularidades indicadas pela requerente diz respeito ao ponto de facto b. supra.
Por conseguinte, para efeitos de determinar se deve ser ordenada a realização de exame judicial, só é necessário considerar os factos referidos nos referidos pontos 3, 4, 6 (parte 1), e 7, não sendo necessário averiguar as outras irregularidades (ou seja, as restantes irregularidades invocadas pela requerente) que não estão relacionadas com os supra referidos pontos de facto a e b.
Com efeito, as restantes irregularidades indicadas pela requerente (incluindo “a administração não promoveu a renovação do contrato de concessão e o exercício do direito de preferência”, e “aproveitou-se das funções administrativas para obter benefícios indevidos”) constituíram a causa de pedir do pedido de condenar os 2º a 7º requeridos a assumir responsabilidade indemnizatória perante a 1ª requerida. Como atrás se referiu, este Tribunal indeferiu tal pedido, pelo que não há necessidade de apreciação.
Ficou provado que a requerente não foi notificada, com 15 dias de antecedência, da carta de convocatória para a deliberação(sic) da 2ª reunião extraordinária da assembleia geral do ano de 2018, realizada em 22 de Janeiro de 2018 (na qual todos os sócios concordaram em atribuir 830.000,00 patacas da empresa como prémios de desempenho para o ano de 2017, das quais 500.000,00 patacas para a comissão executiva (5 pessoas) e 330.000,00 patacas para alguns dos trabalhadores), e que a reunião teve lugar em Pequim.
Os 1ª a 7º requeridos alegaram que, considerando os usos comerciais da 1ª requerida, não se tratava de falta de convocação para a assembleia geral, nem havia qualquer intenção de evitar a requerente. No entanto, os 1ª a 7º requeridos não provaram que a 1ª requerida tivesse notificado a requerente, de outra forma, de que a 2ª reunião extraordinária da assembleia geral do ano de 2018 iria ter lugar em 22 de Janeiro de 2018.
Tendo em conta que dos factos provados não resulta que a 1ª requerida tenha notificado a requerente, de outra forma, de que a 2ª reunião extraordinária da assembleia geral do ano de 2018 iria ter lugar em 22 de Janeiro de 2018, e que os usos comerciais apenas se aplicam aos contratos celebrados entre empresários comerciais (artigo 565.º do Código Comercial), e não são aplicáveis ao presente processo, atendendo também ao facto de o conteúdo da deliberação tomada na reunião da assembleia geral em causa ser relevante para os interesses da requerente enquanto sócia, afigura-se-nos que não se pode excluir a possibilidade de a 1ª requerida intencionalmente afastar a presença da requerente da referida reunião.
A ver da requerente, o facto de a 1ª requerida ter pago um total de 830.000,00 patacas à comissão executiva e funcionários, apesar de ter registado um prejuízo de 4.942.631,00 patacas no ano de 2017, prejudicou os interesses da requerente e dos credores da 1ª requerida.
Provou-se que os trabalhos de reestruturação levados a cabo pela 1ª requerida no ano de 2017 resultaram num aumento do trabalho dos seus funcionários, e foram eficazes (o prejuízo antes de impostos do ano de 2016 foi de MOP47.583.926,00, e o prejuízo antes de impostos para o ano de 2017 foi reduzido para MOP4.942.631,00), pelo que a 1ª requerida decidiu recompensar todos os seus trabalhadores através de bónus de desempenho. Além disso, foi provado que a 1ª requerida tinha o hábito de atribuir prémios e, mesmo em 2016, quando registou uma perda anual de MOP47.584.000,00 patacas, a 1ª requerida atribuiu um montante de MOP300.000,00 como bónus de operação segura do ano de 2016.
Considerando que não foi sem razão justificada que a 1ª requerida atribuiu os prémios de desempenho do ano de 2017 à comissão executiva e a todos(sic) os trabalhadores na 2ª reunião extraordinária da assembleia geral do ano de 2018, e que a 1ª requerida sempre tinha o hábito de atribuir bónus, somos da opinião de que a atribuição do bónus de desempenho para o ano de 2017 pela 1ª requerida à comissão executiva e a todos os funcionários, apesar das perdas incorridas nesse ano, não demonstra graves irregularidades por parte da 1ª requerida.
Além disso, também se provou que na “Declaração de Rendimentos - Grupo A do Imposto Complementar de Rendimentos” apresentada pela 1ª requerida à DSF no ano de 2018, esta não declarou os prémios que deliberou atribuir aos trabalhadores e membros da comissão executiva na referida 2ª reunião extraordinária da assembleia geral do ano de 2018.
Tal como se referiu supra, não se pode excluir a possibilidade de a 1ª requerida intencionalmente afastar a presença da requerente da referida reunião, e a 1ª requerida não declarou os prémios em questão na “Declaração de Rendimentos - Grupo A do Imposto Complementar de Rendimentos”. No nosso entender, os factos acima referidos podem demonstrar a eventual existência de irregularidades. Portanto, há de apurar as eventuais irregularidades alegadas pela requerente através de averiguar o paradeiro dos mencionados prémios de desempenho.».
Nas alegações e conclusões de recurso quanto a esta matéria sustenta-se essencialmente que há contradição entre os fundamentos e a decisão.
Está errada essa conclusão.
O que se diz na decisão recorrida é que apesar de se ter provado que era costume a atribuição de bónus e de ter havido uma melhoria significativa nos resultados da empresa, não deixa de haver outros factos tais como os relacionados com a falta de convocação da assembleia geral onde a deliberação foi tomada e a não declaração para efeitos fiscais da atribuição do bónus que justificam a realização do exame.
Aderindo quanto a esta matéria aos fundamentos constantes da decisão recorrida entendemos ser de mantê-la improcedendo o recurso nesta parte.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos julga-se parcialmente procedente o recurso e em consequência:
- Revoga-se a decisão recorrida na parte em que autoriza a consulta de “Correspondência, documentos de pedido e relatórios, se os houver, entre a 1ª requerida e o Governo da RAEM, o Chefe do Executivo, a Secretaria para os Transportes e Obras Públicas e o Departamento de Desenvolvimento e Gestão do Sector Energético (antigamente o GDSE), ao longo dos anos, em relação ao projecto de gás natural concedido à 1ª requerida”;
- Mantém-se a decisão de autorizar a consulta das “Actas das reuniões da assembleia geral realizadas desde a constituição da 1ª requerida (com excepção das actas das reuniões da assembleia geral realizadas entre o ano de 2017 e o ano de 2021)”;
- Mantém-se a decisão recorrida de “Deferir a realização de exame judicial ao seguinte facto da 1ª requerida (a deliberação tomada na reunião extraordinária da assembleia geral realizada em 22 de Janeiro de 2018 no sentido de distribuir prémios de desempenho a cinco membros da comissão executiva, devendo apurar, inclusivamente, quem foram os referidos cinco membros, os montantes dos prémios recebidos e o modo de cálculo desses montantes)”;
- Em tudo o mais que não foi objecto deste recurso se mantém a decisão recorrida.
Custas a cargo dos Recorrentes em 1/3 e da Recorrida em 2/3.
Registe e Notifique.
RAEM, 11 de Julho de 2024
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)
Fong Man Chong
(1o Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng
(2o Juiz-Adjunto)
1 O negrito e o sublinhado são nossos
2 Os negritos e sublinhados são nossos.
3 Veja-se Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Almedina, Vol. III, pág. 295/296 e Curso de Direito Comercial, Jorge Manuel Coutinho de Abreu, 6ª Ed., Almedina, Vol. II pág. 248.
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176/2024 CÍVEL 39