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Processo nº 37/2024
(Autos de recurso jurisdicional)
   





ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A (甲), com os restantes sinais dos autos, recorreu contenciosamente para o Tribunal de Segunda Instância do despacho do SECRETÁRIO PARA A ECONOMIA E FINANÇAS de 19.01.2023 que indeferiu o pedido de renovação da sua autorização de residência na R.A.E.M. que tinha sido estendida aos seus familiares; (cfr., fls. 2 a 61 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Oportunamente, por Acórdão de 13.12.2023, (Proc. n.° 228/2023), foi o recurso julgado procedente, anulando-se o acto administrativo recorrido; (cfr., fls. 567 a 590).

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Do assim decidido, traz agora a entidade administrativa o presente recurso, pedindo a revogação do Acórdão recorrido; (cfr., fls. 601 a 606-v).

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Após contra-alegações do agora recorrido a pedir a improcedência do recurso, (cfr., fls. 608 a 628), e remetidos os autos a esta Instância, foram os mesmos com vista ao Exmo. Representante do Ministério Público que em douto Parecer considera que o recurso merece provimento; (cfr., fls. 645 a 648-v).

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Corridos os vistos dos Mmos Juízes-Adjuntos, vieram os autos à conferência.

Nada obstando, passa-se a apreciar e decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Pelo Tribunal de Segunda Instância vem indicada como “provada” a seguinte matéria de facto:

“a) Ao Recorrente foi concedida, em 22 de Janeiro de 2014, autorização de residência temporária pelo período de 18 meses, com fundamento na norma da alínea 1) do artigo 1.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 por ser titular de um projecto de investimento, em apreciação nos competentes serviços da Administração, que foi considerado relevante para a RAEM – cf. fls. 292 a 296 do PA -;
b) Em 22 de Outubro de 2015, o Recorrente, requereu a renovação da autorização temporária de residência, o que veio a ser deferido por decisão de 16 de Dezembro de 2015, de novo pelo período de 18 meses, a contar do termo da primeira autorização, ou seja, até 22 de Janeiro de 2017;
c) Em 16 de Novembro de 2016, o Requerente apresentou junto do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), novo pedido de renovação da autorização de residência temporária, o qual foi indeferido por Despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças datado de 19.01.2023, nos termos e com os fundamentos da Proposta nº 0030/2013/02R elaborada pela IPIM, a qual consta de fls. 64 a 69 traduzida a fls. 305 a 318 e com o seguinte teor:
Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau
Proposta n.º 0030/2013/02R
Requerente – A
O pedido da autorização de residência temporária do titular de projecto de investimento relevante – Renovação aplicável do Regulamento Administrativo n.º 3/2005
Parecer do Secretário para a Economia e Finanças
No uso das competências conferidas pela Ordem Administrativa n.º 3/2020, concordo com a análise da presente Proposta e, nos termos do disposto nos art.º 17.º, n.º 1, al. 1), art.º 18.º, n.º 1 e art.º 19.º, n.º 2 do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, indefiro os pedidos da renovação da autorização de residência para o requerente e os membros do agregado familiar.
Secretário para a Economia e Finanças
Lei Wai Nong
19 de Janeiro de 2023

Parecer do Presidente do Conselho de Administração do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau, substituto
Concordo com a análise e proposta e, proponho que seja indeferido o pedido da renovação de autorização de residência temporária dos seguintes interessados:
N.º
Nome
Relação
1
A(甲)
Requerente
2
B (乙)
Cônjuge
3
C (丙)
Descendente
Submeto à apreciação e decisão do Secretário para a Economia e Finanças.
IPM
Em 19 JAN 2023
Entrada Assinatura: (ass.: vide o original)

(ass.: vide o original)
D, Presidente, substituto
31 de Agosto de 2022
(códigos de barra)
06722/GSEF/EN/2022
Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau
Proposta n.º 0030/2013/02R
Requerente – A
O pedido da autorização de residência temporária do titular de projecto de investimento relevante – Renovação aplicável do Regulamento Administrativo n.º 3/2005
Parecer do vogal executivo do Conselho de Administração do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau
Concordo com o parecer constante da Proposta.
(ass.: vide o orignal)
vogal executivo
E
30/08/2022

Parece do Chefe do Departamento Jurídico e de Fixação de Residência
Concordo com o parecer da Proposta e submeto à apreciação e decisão superior.
(ass.: vide o original)
F,
Directora do Departamento Jurídico e de Fixação de Residência
23 de Agosto de 2022
Assunto: apreciação do pedido da autorização de residência temporária
Directora do Departamento Jurídico e de Fixação de Residência:
1. A identificação dos interessados é a seguir:
N.º
Nome
Relação
Data de nascimento
Documento de identificação e número
A autorização de residência temporária originalmente concedida até
1
A (甲)
Requerente
1985/07/24
Passaporte da China n.º XXXXXXXX
2017/01/22
2
B (乙)
Cônjuge
1984/09/23
Passaporte da China n.º XXXXXXXX
2017/01/22
3
C (丙)
Descendente
2009/06/08
Passaporte da China n.º XXXXXXXX
2017/01/22

2. Em 22 de Janeiro de 2013, o requerente apresentou um pedido da autorização de residência temporária do titular do projecto de investimento relevante, com base na detenção de 24% das acções da “[Empresa]”, cujos fundamentos do pedido são os seguintes:
Firma: [Empresa]
Capital social registado: MOP100.000,00
Proporção das acções: 24%, equivalente a MOP24.000,00
Objecto social: o investimento em terrenos, a engenharia de construção e a exploração hoteleira
Local de operação: [Endereço(1)], 5º andar H, em Macau (arrendamento)
Local de construção: [Rua(1)], S/N, n.ºs 25, 27, 29, 31, 33 e 35, em Macau (adquisição)
Número policial e descrição:(1) S/N: 3372, 3373; (2)N.º 25:3374, (3) N.º 27: 3375; (4) N.º 29:3376; (5) N.º 31: 3377; (6) N.º 33:3378; (7) N.º 35: 3379
3. De acordo com o respectivo projecto de investimento, a companhia adquiriu vários lotes da [Rua(1)] em Macau, para desenvolver e construir um hotel de duas estrelas, e pretendeu investir MOP121.160.000,00 em 2013 e 2015 para construir este empreendimento e contratar 68 trabalhadores locais para operação. Após a realização da análise complexa, era considerado que o projecto de investimento do requerente podia ser considerado relevante e iria contribuir para o desenvolvimento da indústria do turismo e do mercado laboral de Macau, por isso, foi proposto que desse consideração positivo ao pedido. Em seguida, foi concedida em 22 de Janeiro de 2014 ao requerente a autorização de residência temporária com a validade de 18 meses (vide os documentos de fls. 292 a 296).
4. Em 22 de Outubro de 2015, o requerente apresentou a este Instituto o 1.º requerimento da renovação da autorização de residente temporária (requerimento n.º 0030/2013/01R). Após a análise dos documentos comprovativos do investimento apresentados pelo requerente, verifica-se que o requerente ainda detém 24% das acções da [Empresa], considerando que a situação jurídica é consistente com as condições relevantes consideradas aquando da concessão da autorização de residência temporária, e que cumpriu os deveres de declaração e pagamento dos impostos relevantes, mas, tendo em vista que o projecto do empreendimento de construção do hotel ainda não foi implementado, propôs-se que o requerimento da renovação do requerente fosse autorizado pelo fundamento do projecto de investimento, e em 16 de Dezembro de 2015, foi lhe concedida a renovação da autorização de residência temporária com a validade de 18 meses.
5. Em 16 de Novembro de 2016, o requerente apresentou a este Instituto o presente pedido da renovação da autorização de residência temporária. Para os efeitos da renovação, o requerente apresentou a este Instituto os documentos comprovativos de tal projecto de investimento, cujos elementos são os seguintes (vide os documentos de fls. 27 a 93):
Firma: [Empresa]
Capital social registado: MOP100.000,00
Proporção das acções: 24%, equivalente a MOP24.000,00
Objecto social: o investimento em terrenos, a engenharia de construção e a exploração hoteleira
Local de operação:
(1) [Endereço(1)], 5º andar H, em Macau (arrendamento)
(2) [Rua(1)], S/N, n.ºs 25, 27, 29, 31, 33 e 35, em Macau (adquisição)
6. Uma vez que os documentos apresentados pelo requerente não demonstram o andamento da implementação de tal investimento, através do ofício n.º 02565/GJFR/2017, este Instituto informou em 6 de Abril de 2017 o requerente da apresentação complementar de documentos comprovativos para evidenciar tal investimento já implementado em Macau (vide o documento de fls. 100).
7. Em 26 de Abril de 2017, o requerente apresentou um série de documentos das situações operacionais em 26 de Abril de 2017, e também apresentou em 27 de Junho de 2017 uma declaração, esclarecendo que, devido aos factores externos, o prazo de construção foi atrasado, mas, esta Companhia iria intensificar o andamento do desenvolvimento deste projecto, o trabalho de cobertura foi concluído em 19 de Junho de 2017, e o hotel estava previsto para entrar em operação no terceiro trimestre do ano 2018, bem como apresentou o livro de obra como documento comprovativo (vide o documento de fls. 79).
8. Para acompanhar a implementação deste empreendimento, através do ofício n.º 00649/DJFR/2018, este Instituto informou em 30 de Janeiro de 2018 o requerente da apresentação complementar dos seguintes documentos (vide os documentos de fls. 101 a 102):
(1) Relatório do Contador / Auditor do ano 2017;
(2) Última Declaração do Imposto Complementar de Rendimentos – Grupo B (modelo M/1) (cópia);
(3) Mapas-guias de pagamento das contribuições do Fundo de Segurança Social desde 1.º trimestre de 2017 até último trimestre (cópia);
(4) Último imposto profissional – Relação Nominal – Empregos / Assalariados do Grupo 1 (modelo M3/M4) (cópia);
(5) Documento comprovativo de recepção da obra geral da DSSOPT (cópia);
(6) Licença de operação do hotel (cópia);
(7) Fotografias dos lugares de trabalho;
(8) Documento comprovativo da utilização dos espaços operacionais (contrato de arrendamento (com a validade não inferior a meio ano) / contrato-promessa de compra e venda / certidão de registo predial (emitida nos últimos três meses)).
Mas, o requerente não apresentou os documentos acima referidos, entregou documentos comprovativos para verificar que o projecto em questão foi implementado em Macau.
9. Além disso, este Instituto já realizou uma inspecção in loco sobre as situações operacionais da “[Empresa]”. De acordo com o relatório de inspecção (vide o documento de fls. 105 a 112), o ambiente e as instalações operacionais in loco mostram que o estabelecimento desta companhia não está realmente em funcionamento, existindo dúvidas sobre as situações declaradas pelo requerente nos autos, como o investimento em terrenos, a engenharia de construção e a exploração hoteleira, e considerando que há indícios de que o respectivo projecto de investimento não está implementado em Macau, pelo que, relativamente a tal situação, este Instituto procedeu, em 12 de Novembro de 2018, através do ofício n.º 05844/DJFR/2018, a uma audiência escrita do requerente (vide o documento de fls. 113 a 118).
10. O procurador do requerente apresentou um parecer escrito em 3 de Dezembro de 2018, indicando que, devido às necessidades operacionais da “[Empresa]”, o escritório mudou-se para um outro prédio com a maior área, e não conseguiu apresentar a este Instituto o documento comprovativo da mudança do local de funcionamento pela razão de que ainda não tinha apresentado uma declaração para a DSF. Além disso, a obra de construção do hotel desta companhia, sito na [Rua(1)], n.ºs 21-25 e [Rua(2)], n.º 179, já foi concluída, e passou pela vistoria da CEM e por alguns vistoria de incêndio, e o Corpo de Bombeiros já emitiu um parecer conhecido como “a certidão de conclusão da obra”, mas, o pedido de exploração do hotel e outros locais de funcionamento ainda tinha que esperar ser aprovado pela Direcção dos Serviços de Turismo (vide os documentos de fls. 119 a 196).
11. Nos termos do disposto no art.º 17.º, n.º 1, al. 1) do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, este Instituto só pode conceder a autorização de residente temporária com a validade de 18 meses, renovável por uma vez, ao titular de projecto de investimento relevante e membros elegíveis do seu agregado familiar; e nos termos do disposto nos art.º 18.º, n.º 1 e art.º 19.º, n.º 2 do Regulamento acima referido, a renovação pressupõe a manutenção, na pessoa do interessado, dos pressupostos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial.
12. Quanto aos presentes autos, importa salientar que foi primeiramente concedida ao requerente a autorização de residência temporária com a validade de 18 meses, com fundamento de que detém 24% das acções da [Empresa], exerce o investimento em terrenos, a engenharia de construção e a exploração hoteleira, e pretende-se contratar 68 trabalhadores residentes. Em seguida, foi concedida ao requerente a primeira renovação da autorização de residência temporária com a validade de 18 meses, com base também no projecto de investimento relevante, mas, após a análise dos documentos apresentados pelo requerente no presente pedido de renovação (segunda), demonstra-se que o projecto de investimento ainda não foi obtive uma licença para a autorização de funcionamento para o exterior e, de acordo com o recibo de contribuições do regime obrigatório do Fundo de Segurança Social, esta companhia só contractou três trabalhadores residentes no primeiro trimestre do ano 2018 (vide o documento de fls. 149). Através de tais situações, não é suficiente provar que o projecto de investimento hoteleiro da [Empresa], sito na [Rua(1)], tem condicionalismos para a exploração, pelo que se considera que o projecto de investimento utilizado pelo requerente como fundamento do pedido ainda não se encontra completamente implementado em Macau, não se mostra preenchida a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
13. Pelo exposto, este Instituto procedeu, em 1 de Julho de 2019, através dos ofícios n.ºs 01994/DJFR/2019 e 02673/DJFR/2019, respectivamente, a uma audiência escrita dos requerente e seu cônjuge (vide os documentos de fls. 202 a 207).
14. O procurador do requerente apresentou em 16 de Julho de 2019 o parecer escrito e os documentos comprovativos, cujo conteúdo é seguinte:
(1) Para a concretização do projecto de investimento, o requerente e os sócios vêm aumentar o investimento de MOP9.633.573,00, a fim de acelerar a implementação e concretização do projecto;
(2) A Direcção dos Serviços de Turismo já aprovou o plano de abertura do Hotel XX, e dos estabelecimentos relevantes “Restaurante XX” e “Bar XX”;
(3) A decoração interior do hotel está concluída, e os equipamentos também estão pronto. O Hotel está pronto a funcionar e aguarda a emissão da licença oficial;
(4) De acordo com o recibo de contribuições do regime obrigatório do Fundo de Segurança Social, a [Empresa] contractou três trabalhadores residentes no primeiro trimestre do ano 2019;
(5) Em seguida, o requerente apresentou a este Instituto em 27 de Dezembro de 2019 uma licença emitida pela Direcção dos Serviços de Turismo em 17 de Dezembro de 2019 (vide os documentos de fls. 260 a 265) e, apresentou em 24 de Janeiro de 2020 um recibo de contribuições do regime obrigatório do Fundo de Segurança Social, demostrando que esta companhia contratou 12 trabalhadores residentes no 4.º trimestre do ano 2019 (vide o documento de fls. 288).
15. Relativamente às supras respostas dadas pelo requerente, a análise é seguinte:
(1) Após a análise dos pareceres escritos e documentos comprativos, mesmo que o requerente apresentasse uma licença emitida em 17 de Dezembro de 2019 pela Direcção dos Serviços de Turismo, importa salientar que, em 22 de Janeiro de 2014, foi primeiramente concedida ao requerente a autorização de residência temporária com a validade de 18 meses, pelo fundamento do titular do projecto de investimento relevante. Em seguida, dos respectivos documentos não se mostra que tal projecto de investimento foi definitivamente implementado em Macau, e foi concedido ao requerente em 16 de Dezembro de 2015 a renovação da autorização de residência temporária pelo fundamento do titular do projecto de investimento relevante, com a validade de 18 meses, até 22 de Janeiro de 2017. Mas, através da licença de funcionamento acima referida, mostra-se que a licença de funcionamento foi emitida pela Direcção dos Serviços de Turismo em 17 de Dezembro de 2019 para tal projecto de investimento, ou seja, já passaram quase seis anos desde que foi concedida ao requerente a autorização de residência temporária;
(2) De facto, relativamente à não implementação de tal projecto de investimento, este Instituto já procedeu, em 12 de Novembro de 2018 e 1 de Julho de 2019, respectivamente, a duas audiências do requerente (vide os documentos de fls. 113 e 202). O requerente tinha apresentado a este Instituto a licença de funcionamento emitida em 17 de Dezembro de 2019 pela Direcção dos Serviços de Turismo, mas, esta licença apenas pode provar que a companhia obteve a autorização de funcionamento, não tendo o requerente apresentado outros documentos para comprovar que tal projecto de investimento já está em funcionamento para o exterior, bem como, através do recibo de contribuições do regime obrigatório do Fundo de Segurança Social, mostra-se que esta companhia apenas contractou doze trabalhadores residentes no quatro trimestre do ano 2019, e existe um grande divergência com o número de 68 trabalhadores residentes que pretendia contratar no primeiro pedido, o que se demonstra que a situação operacional de tal projecto de investimento ainda não foi totalmente implementada;
(3) Após a análise, tendo em vista que, nos termos do disposto no art.º 17.º, n.º 1, al. 1) do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, foram concedidas ao requerente a autorização de residência temporária e a primeira renovação desta autorização, pelo fundamento do titular do projecto de investimento relevante, mas, no presente pedido da renovação (segunda), dos respectivos documentos se demonstra que tal projecto de investimento ainda não se encontra completamente implementado, o que não se mostra preenchida a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização inicial.
16. Pelo acima exposto, após a realização do procedimento de audiência, uma vez que o projecto de investimento em que fundamentou o pedido do requerente ainda não foi completamente implementado em Macau até ao presente, o que não se encontra preenchida a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização inicial, e excepto o primeiro pedido da autorização de residência temporária, foi concedida ao requerente uma renovação da autorização de residência temporária, pelo fundamento do titular do projecto de investimento relevante, com a validade de 18 meses, pelo que se propõe que o Secretário para a Economia e Finanças, no uso das competências conferidas pelo Chefe do Executivo através do n.º 1 da Ordem Administrativa n.º 3/2020 e, nos termos do disposto nos art.º 17.º, n.º 1, al. 1), art.º 18.º, n.º 1 e art.º 19.º, n.º 2 do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, indefira o presente pedido da renovação da autorização de residência temporária para o requerente.
Submete-se à apreciação e visto.
Director-adjunto da Divisão dos Assuntos de Fixação de Residência
(ass. e carimbo: vide o original)
G
22 de Agosto de 2022
d) O Recorrente foi notificado daquele despacho em 01.03.2023 – cf. fls. 365 do PA -”; (cfr., fls. 580 a 586).

Do direito

3. Como resulta do que se deixou relatado, vem a entidade administrativa recorrer do Acórdão pelo Tribunal de Segunda Instância prolatado que concedeu provimento ao anterior recurso contencioso pelo agora recorrido aí interposto.

Para tal decisão, assim ponderou o Tribunal de Segunda Instância no seu Acórdão objecto do presente recurso:

“O acto impugnado foi praticado com base na alínea 1) do nº 1 artº 17º do Regulamento Administrativo 3/2005 porquanto se considerou que a situação dos Requerentes se enquadrava na previsão da alínea 1) do artº 1º do mesmo diploma.
Rezam as indicadas disposições daquele Regulamento Administrativo o seguinte:
Artigo 1.º
Âmbito pessoal de aplicação
Podem requerer autorização de residência temporária na Região Administrativa Especial de Macau, nos termos do presente diploma, as seguintes pessoas singulares não residentes:
1) Os titulares de projectos de investimento, em apreciação nos competentes serviços da Administração, que sejam considerados relevantes para a Região Administrativa Especial de Macau;
2) Os titulares de investimentos que sejam considerados relevantes para a Região Administrativa Especial de Macau;
3) (revogado)
4) Os adquirentes de bens imóveis que cumpram os requisitos previstos no artigo 3.º
Artigo 17.º
Autorizações de residência temporária
1. Podem ser concedidas as seguintes autorizações de residência temporária ao abrigo do presente diploma, sem prejuízo do disposto no número seguinte:
1) Autorização de residência temporária com a validade de 18 meses, renovável por uma vez, aos interessados a que se refere a alínea 1) do artigo 1.º e membros elegíveis do seu agregado familiar;
2) Autorização de residência temporária com a validade de 3 anos, renovável, aos restantes interessados e membros elegíveis do seu agregado familiar.
2. O período de validade das autorizações de residência temporária referidos no número anterior não pode, em caso algum, exceder os 30 dias que precedem a caducidade do documento de viagem do interessado ou da autorização de regresso ou de entrada em outro país ou território.

Como resulta da letra da lei, expressamente, a alínea 1) do artº 1º visa as situações em que:
- O projecto de investimento esteja em apreciação pelos serviços competentes da RAEM;
- O projecto seja considerado relevante para a RAEM.

Ora projecto é algo que se pretende vir a fazer mas ainda não se iniciou.
Por exemplo o projecto de uma casa é o desenho de como a casa vai ser construída mas não significa a construção da casa.
Projecto ir viajar a determinado local significa que há a intenção de o fazer mas ainda não se está a fazer.
Um projecto de um investimento é a intenção de vir a investir, investimento é fazer o investimento.
A alínea 1) do citado artº 1º fala de projecto de investimento a alínea 2) do artº 1º fala de investimento.
Por outro lado, “em apreciação” significa algo que está sob análise que ainda não foi autorizado nem negado. Algo que está a ser estudado, analisado pela entidade competente da Administração.
Admitamos que alguém quer abrir em Macau determinado estabelecimento que está sujeito a uma autorização especial. Nesse caso antes de começar o investimento o sujeito Requerente tem de solicitar à Administração autorização para o fazer.
Entre o pedido de autorização e o deferimento do mesmo a realização do investimento está em apreciação pelos serviços competentes.
Durante o período em que o pedido do projecto de investimento está em apreciação, verificado o segundo requisito que seja do interesse relevante para a RAEM, o Requerente pode ser autorizado a residir na RAEM nas condições da alínea 1) do nº 1 do artº 17º, isto é, pode ser concedida autorização de residência por 18 meses, renovável uma única vez por igual período.
Decorridos 36 meses sem que tenha havido decisão, ainda que seja imputável à administração não mais pode ser autorizada a residência por esse motivo, tendo o Requerente que aguardar no exterior, se continuar a ter interesse, pela decisão e na realização do investimento uma vez obtida aquela (a autorização).
Esta solução compreende-se perfeitamente uma vez que o Requerente nesta fase, por ainda nada ter sido autorizado e o pedido estar em apreciação, não ter feito investimento algum.
O prazo de 18 meses renovável por igual período destina-se a permitir ao Requerente que possa acompanhar na RAEM o pedido que fez e está sob apreciação, facilitando-se que aqui resida durante esse período para proceder às diligências e ao diálogo a que haja lugar com a administração durante o processo de apreciação.
De igual modo se compreende a limitação do prazo a 18 meses mais 18 meses, por ser esse prazo que no total equivale a 3 anos mais do que suficiente para em situações normais se apreciar o pedido.
E, em última instância se a administração não der resposta no assinalado prazo também não há prejuízo de maior para o Requerente porque o investimento ainda não se iniciou, sendo o tempo de espera um risco conhecido e assumido pelo próprio.
Porém, se já tiver havido investimento realizado, esta solução seria completamente absurda, raiando até a má-fé da administração se alguém no decurso do investimento se vir subitamente impossibilitado de continuar a residir na RAEM, apenas porque se esgotou tão curto prazo de 36 meses, quando haja diligenciado para instalar e pôr em funcionamento o seu investimento e o insucesso se deva, quiçá, a atrasos dos procedimentos da administração.

Por outro lado, com “projecto de investimento em apreciação” não se confunde a obtenção de licença para o estabelecimento funcionar seja ele um restaurante, um hotel, etc., porque aqui o investimento já se começou a realizar, só se concluindo com a obtenção da necessária licença ao seu funcionamento.
Se assim fosse então no caso em apreço qual era a licença que estava em apreciação? A do destino a dar ao terreno? A de obras? A de exploração de hotel?
Não é da obtenção deste género de licenças que visa a apreciação a que alude a alínea 1) do artº 1º havendo uma errada interpretação da lei nesse sentido e um errado enquadramento jurídico da situação subjacente a estes autos.

Na situação dos autos o pedido de residência foi motivado porque o Requerente era sócio de uma sociedade a qual ia adquirir terrenos, construir um edifício destinado a instalar um hotel, instalar o hotel, pô-lo a funcionar e explorá-lo.
Não há aqui um projecto de investimento, mas um investimento que em momento algum esteve em “apreciação”.
No caso do Requerente a sociedade foi constituída, os terrenos foram construídos, diligenciou-se pela construção do prédio, fez-se a construção, instalou-se o Hotel e obteve-se a autorização para o Hotel funcionar.
Na prática o Requerente esteve a realizar o investimento. A compra de uma casa realiza-se num acto único. A construção de uma fábrica realiza-se em vários actos, mas não está “em apreciação”.
A situação do Requerente nunca se enquadrou na alínea 1) do artº 1º mas sim na alínea 2) do artº 1º do Regulamento Administrativo 3/2005, ou seja o Requerente é titular de um investimento relevante para a RAEM que, no caso é ser sócio de uma sociedade, sociedade essa que tinha como objectivo construir e explorar um hotel.
Ora em todo este processo o que há que apreciar é se o investimento foi feito ou não, o que, não sendo aqui objecto de decisão, mas parece merecer resposta positiva.
Por outro lado, em face da factualidade apurada só este entendimento faz sentido sob pena de admitirmos que o legislador consagrava soluções absurdas.
Seria em algum lugar e no estado da técnica admitir como razoável que em 18 meses era possível adquirir terrenos, construir um edifício, instalar nesse edifício um hotel, obter todas as licenças necessárias à construção e ao funcionamento do mesmo e iniciar a exploração do hotel?
E diz-se 18 meses porque o prazo fixado há-de ser suficiente para o efeito, sendo as renovações para funcionar em casos excepcionais em que houve demora superior ao que seria de esperar, por isso é 18 meses que se deve considerar e não 36.
A resposta só pode ser negativa.
Sendo sabido que o legislador sempre toma a decisão mais acertada, justa e adequada à situação nunca pode ter sido este o pensamento legislativo.
O facto da sociedade do Requerente necessitar de várias licenças e autorizações desde a compra do terreno até poder iniciar a exploração do Hotel isso não faz deste investimento um projecto de investimento em apreciação, este projecto está sim em execução, em fase de realização do investimento, isto é, o investimento está a ser feito.
E a lei em momento algum distingue investimento realizado ou em realização falando apenas de titular do investimento que por natureza é algo dinâmico.
Se durante a realização do investimento o investidor e Requerente da autorização de residência que foi concedida com base na realização do mesmo, em vez de actuar diligentemente construir o hotel à velocidade de um tijolo por mês, a situação subjacente é de que não está a realizar o investimento, não manteve a situação jurídica relevante e entramos no âmbito de aplicação do artº 18º do Regulamento Administrativo nº 3/2005.
Se o processo de construção do hotel decorre nomeadamente com as vicissitudes normais do processo, os atrasos do costume e justificados, então o investimento está a ser realizado e a situação jurídica relevante mantém-se.
Destarte, a decisão recorrida enferma do vício de violação de lei uma vez que a situação do Requerente e aqui Recorrente jamais se enquadrou na alínea 1) do nº 1 do artº 17º do indicado Regulamento Administrativo, sendo que, o que lhe havia de ter sido concedido era a autorização de residência por 3 anos a que alude a alínea 2) do mesmo preceito, renovável desde que se verificasse a situação juridicamente relevante que a motivou, isto é, desde que se mantivesse o investimento, situação esta que já é compatível com a aquisição de terenos, construção do edifício, instalação do hotel, inicio da exploração, etc., sendo um processo evolutivo, que cabe demonstrar que se está a diligenciar nesse sentido.
Procedem assim as conclusões de recurso quando imputam ao acto recorrido o vício de violação de lei, impondo-se nos termos do artº 124º do CPA concluir pela anulabilidade da decisão recorrida decidindo em conformidade”; (cfr., fls. 586 a 590).

Aqui chegados, e atentas as “razões” que levaram o Tribunal de Segunda Instância a decidir nos termos que decidiu, “quid iuris”?

Vejamos.

Em síntese, entendeu o Tribunal de Segunda Instância que o acto administrativo aí recorrido – que indeferiu o pedido de renovação da autorização de residência em Macau do então recorrente, e ora recorrido – padecia de “errada interpretação da lei e de errado enquadramento jurídico da situação subjacente aos autos”, considerando que a “decisão recorrida enfermava do vício de violação de lei uma vez que a situação do Requerente e aqui Recorrente jamais se enquadrou na alínea 1) do nº 1 do artº 17º do indicado Regulamento Administrativo, sendo que, o que lhe havia de ter sido concedido era a autorização de residência por 3 anos a que alude a alínea 2) do mesmo preceito, (…)”.

Ora, sem prejuízo do muito respeito por melhor entendimento, temos para nós que o assim decidido não se pode manter.

Explicitemos, o porque neste nosso ponto de vista.

Pois bem, na óptica do Tribunal de Segunda Instância, a (verdadeira) “questão” a decidir nos presentes autos estava em saber se a “situação” do então recorrente, agora recorrido, (e que a “matéria de facto” dada como provada atrás retratada nos dá conta), integrava:
- um “projecto de investimento”, tal como previsto no art. 1°, n.° 1 do Regulamento Administrativo n.° 3/2005; ou,
- um “investimento”, nos termos do referido n.° 2 do mesmo art. 1°.

E, tendo a Administração considerado que a “situação” em questão se devia qualificar como um “projecto de investimento”, (e o ora recorrido, como seu “titular”), entendeu, porém, o Tribunal de Segunda Instância que assim não devia ser, pois que aquela mesma situação retratada na aludida matéria de facto justificava um outro enquadramento jurídico, devendo antes ser considerado como um (efectivo) “investimento”, já efectuado e materializado, acarretando, assim, como natural consequência, uma diversa aplicação do estatuído no art. 17° do mesmo Regulamento Administrativo n.° 3/2005 quanto aos “prazos de validade” da autorização de residência, (nos “projectos de investimento”, por um prazo de 18 meses, renovável por uma vez, nos “investimentos”, por um prazo de 3 anos, renovável), e que, por sua vez, levou a outro entendimento quanto à (im)possibilidade da pelo recorrido pretendida renovação da sua autorização de residência.

Ora, (sem se querer aqui repetir o que já foi pelo Tribunal de Segunda Instância considerado), cabe salientar que um “projecto”, é, grosso modo, aquilo que alguém “planeia”, “pensa” ou “pretende fazer”, como sucede com o “esboço de um trabalho” que se pretende realizar, ou com a “primeira redacção” de uma Lei que (posteriormente) se submete para aprovação, e, em matéria de “obras de construção”, o “plano para a sua realização”, nele se integrando a sua representação gráfica e escrita, com planos e peças desenhadas, memória descritiva, medições, orçamento e caderno de encargos, contendo assim todas as instruções e determinações, (assim como os documentos técnicos necessários) para definir e explicitar as fases e modo para se levar a cabo a construção, (ou execução), da obra, (projectada).

Economicamente falando, um “projecto de investimento” é usualmente considerado como um conceito passível de ser entendido em duas acepções: enquanto “plano” – ou “intenção” – de investimento, e, por sua vez, enquanto “estudo”, ou seja, como o processo escrito onde se demonstra a ponderação sobre os prós e contras da dita “intenção de investimento” (ou negócio), e que, assim, e no fundo, acaba por ser o que normalmente sucede em “momento anterior” da (efectiva) aplicação de recursos ou capital, ou seja, do “investimento”, que se espera venha a gerar rendimentos no futuro.

Ora, sendo de recordar desde já que o Regulamento Administrativo n.° 3/2005 fixa o “Regime de fixação de residência temporária de investidores, quadros dirigentes e técnicos especializados”, e revogou o anterior Decreto-Lei n.° 14/95/M de 27.03, igualmente adoptado para criar “incentivos específicos à captação de investimentos de reconhecida relevância económica e à fixação de recursos humanos de elevada qualidade, capazes de fixar no Território empresários, quadros dirigentes e técnicos especializados”, apresenta-se-nos pois de considerar igualmente que, no caso dos autos, em causa está algo mais do que um (mero) “projecto de investimento”, pois que, estando já “concluída a construção do (projectado) edifício” onde se irá instalar uma unidade hoteleira, (com um total de 176 camas, distribuídas em 79 quartos duplos e 18 individuais), inegável se nos apresenta que efectuado já está um (relativamente) considerável “investimento financeiro”.

Porém, importa igualmente atentar no que segue.

É que, tanto a decisão de concessão da autorização de residência temporária, como a renovação dessa mesma autorização, (pelo período de 18 meses), tiveram exactamente por fundamento (jurídico) o prescrito na alínea 1) do art. 1° do Regulamento Administrativo n.° 3/2005, ou seja, o fundamento de que a situação do interessado requerente era enquadrável, não como um “investimento”, mas, antes, como um (mero) “projecto de investimento” que foi considerado relevante.

E, assim sendo, como efectivamente foi, inclusivé aceite pelo próprio interessado, impõe-se então concluir que este “acto administrativo” de concessão e renovação da autorização de residência pelo período de 18 meses – com fundamento na alínea 1) do art. 1° do Regulamento Administrativo n.° 3/2005 – consolidou-se na ordem jurídica como “caso decidido”, (pois que até podia ter sido objecto de impugnação pelo interessado, caso o mesmo considerasse que se justificava uma autorização de residência com outro enquadramento e por outro prazo, nomeadamente, o prazo de 3 anos a que se refere o n.° 2 do art. 17° do Regulamento Administrativo n.° 3/2005), passando, a constituir, como tal, “pressuposto vinculativo da actuação posterior da Administração”.

Por isso, no momento da apreciação do novo pedido de renovação da autorização de residência (agora em questão), estava a Administração obrigada a considerar como pressuposto jurídico inarredável da sua actuação, a decisão de autorização que antes tinha efectivamente concedido, ou seja, a autorização por 18 meses com fundamento em “projecto de investimento”, (e não aquela que, eventualmente, podia ter concedido, mas que não concedeu, ou seja, a autorização de residência pelo período de 3 anos com fundamento em “investimento” considerado relevante).

E, nesta conformidade, vista cremos estar a solução, pois que não parece lícito – ou aceitável – que, em sede de um recurso contencioso, possa o Tribunal de Segunda Instância modificar oficiosamente a “fundamentação jurídica” de um acto administrativo (de autorização de residência), que nem sequer pelo próprio recorrente questionado foi para, como base nessa modificação, e à luz dessa “nova fundamentação” (alternativa ou ficcionada), aferir e apreciar da legalidade administrativa do acto praticado e recorrido (de indeferimento de uma renovação de autorização de residência).

Dest’arte, impõe-se a decisão que segue.

Decisão

4. Em face do exposto, em conferência, acordam conceder provimento ao recurso, revogando o Acórdão recorrido.

Custas em ambas as Instâncias pelo recorrido.

Registe e notifique.

Macau, aos 03 de Julho de 2024


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Álvaro António Mangas Abreu Dantas

Proc. 37/2024 Pág. 10

TUI 37/2024 - Pág. 11