Processo nº 282/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data do Acórdão: 17 de Julho de 2024
ASSUNTO:
- Ónus da prova
- Não pagamento
SUMÁRIO:
- Não é ao credor ainda que invoque o não cumprimento que cabe o ónus da prova do não pagamento.
- Sendo o cumprimento uma excepção extintiva do direito do Autor/credor é ao Réu/devedor que cabe a prova do mesmo.
- Sendo admissíveis respostas explicativas aos quesitos, daí não pode resultar que se dê como provado um facto que não havia sido quesitado nem tão pouco invocado pelas partes.
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 282/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 17 de Julho de 2024
Recorrente: A
Recorrida: B Resorts, S.A.
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
A, com os demais sinais dos autos,
vem instaurar acção declarativa em processo comum do trabalho contra
B Resorts, S.A., também com os demais sinais dos autos.
Pedindo a condenação desta a pagar-lhe:
1) MOP$14,920.07, a título de trabalho extraordinário prestado, acrescida de juros legais até integral e efectivo pagamento, relativo ao período de 19/11/2005 a 31/12/2008;
2) MOP$101,606.41, a título de trabalho extraordinário prestado, acrescida de juros legais até integral e efectivo pagamento, relativo ao período de 01/01/2009 a 31/10/2021;
3) MOP$67,737.61, a título de descanso compensatório não gozado, acrescida de juros legais até integral e efectivo pagamento, relativo ao período de 01/01/2009 a 31/03/2021;
4) MOP$77,765.00, pela prestação de trabalho ao sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, relativo ao período de 19/11/2005 a 31/12/2008;
5) MOP$4,892.50, a título de descanso compensatório não gozado em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, relativo ao período de 19/11/2005 a 31/12/2008;
6) MOP$166,867.89, pela prestação de trabalho ao sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, relativo ao período de 01/01/2009 a 31/03/2021;
7) MOP$21,314.11, a título de descanso compensatório não gozado, em sequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, relativo ao período de 01/01/2009 a 31/03/2021;
8) Em custas e procuradoria condigna.
Proferida sentença, foi a Ré condenada a pagar ao Autor o valor de MOP135.256,50, acrescido de juros legais desde a data da decretação desta sentença até integral e efectivo pagamento, rejeita-se os restantes pedidos.
Não se conformando com a decisão proferida na parte relativa à condenação da Ré no pagamento da compensação devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, uma vez que a forma de cálculo usada se distancia da que tem vindo a ser usada por este Tribunal de Segunda Instância e do trabalho extraordinário, vem o Autor interpor recurso, formulando as seguintes conclusões e pedidos:
1) Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Ré na compensaçao devida ao Autor, ora Recorrente, pela prestação de 30 minutos que antecediam o início de cada turno e, bem assim, pelo trabalho prestado pelo Autor ao sétimo dia, após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho;
2) Pelas razões que adiante melhor se expõem, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de: (i) erro na apreciação da matéria de facto quanto ao conteúdo do ponto 5 da Matéria de Facto Assente, relativo à falta de condenação da Ré no pagamento ao Autor de uma compensação pelo período de 30 minutos que antecediam o início de cada turno, pelo período que medeia entre 01/11/2014 e 31/03/2020; (ii) erro de aplicação de direito quanto à concreta forma de cálculo devida pela prestação de trabalho ao sétímo dia, após a prestação pelo Autor de seis dias de trabalho consecutivo, em violação ao disposto no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M e dos artigos 42.º e 43.º da Lei n.º 7/2008, razão pela qual se impõe que a mesma seja substituída por outra que decida em conformidade com a melhor interpretação a conferir aos referidos preceitos.
Do ponto 5 da Matéria de Facto - da ausência de compensação pela prestação de 30 minutos que antecediam o início de cada turno, entre 01/11/2014 a 31/03/2020:
3) Resulta da matéria de fado provada, entre outra, que:
- “Desde o início da relação de trabalho até 31/10/2021, por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno (2.º);
“A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno, excepto entre 01/11/2014 e 31/03/2020. (5.º)” sublinhado nosso;
4) Da douta fundamentação da Decisão da Matéria de Facto, de 11/12/2023, concluiu o Tribunal a quo que a prestação pelo Autor de 30 minutos que antecediam o início de cada turno e relativa ao período que medeia entre 01/11/2014 a 31/03/2020 já teria sido pago, conforme resulta dos recibos de vencimento do Autor juntos pela Ré e relativos ao referido período de tempo;
5) Ora, salvo o devido respeito, a conclusão a que chegou o Tribunal de Primeira Instância não tem qualquer respaldo nem na Contestação, nem a mesma resulta da prova documental v.g., dos recibos de vencimento do Autor, relativamente ao período de 01/11/2014 a 31/03/2020;
6) Com efeito, o que a Ré alegou em sede de defesa por impugnação foi que: “(...) é falso que alguma vez a Ré tenha exigido ao Autor a sua comparência na local de trabalho, devidamente uniformizados, com pelo menos 30 minutos de antecedência relativamente ao início do turno” (cfr. art. 20.º da Contestação) e, bem assim, que “(…) desde que não excedidos os 30 minutos imediatamente antes do início de cada turno, este período de 30 minutos não poderia ser considerada como trabalho extraordinário (...) (cfr. art. 32.º da Contestação);
7) E a ser assim, já se deixa ver que, ao contrário do concluído pelo Tribunal a quo, a Ré nunca alegou (já) ter pago ao Autor o trabalho relativo aos 30 minutos que antecediam o início de cada turno, e, em concreto, nunca aceitou que os mesmos pudessem ter sido considerados como trabalho extraordinário;
8) Ou melhor, ainda que efectivamente resulte dos recibos de salário do Autor (aos quais a Ré nunca se reportou ao longo de todos os presentes autos e que apenas foram juntos após ter sido notificada para o fazer) que a Ré pagou ao Autor quantias a título de “Overtime”, nunca as mesmas disseram respeito ao período de 30 minutos que antecederam o início de cada turno;
9) Em concreto, entre 01/11/2014 a 31/03/2020 o Autor prestou, por diversas vezes, 12 horas de trabalho em cada dia, o que corresponde a 4 horas de trabalho extraordinário, tendo o mesmo sido devidamente compensado pela Ré nos termos da lei;
10) De onde, reconduzindo-se os pagamentos descritos como overtime (leia-se trabalho extraordinário) constante dos recibos de vencimento do Autor, ao pagamento de trabalho extraordinário – e não correspondente ao período dos 30 minutos do briefing que antecediam o início de cada turno - em caso algum poderia o Tribunal a quo considerar que o mesmo já se-encontra pago a título de trabalho extraordinário;
11) Em suma, ao invés do concluído pelo Tríbunal a quo, o facto de resultar dos recibos de salário do Autor que, relativamente a alguns meses, a Ré terá pago ao Autor uma quantia a título de trabalho extraordinário, nunca aquele diz respeito ao período de 30 minutos que antecediam o início da prestação de trabalho/turno, razão pela qual nunca o mesmo poderia constar do teor do ponto 5 da douta Matéria de Facto Assente, nem o mesmo foi sequer alegado pela Ré;
12) De onde, requer-se que a resposta ao ponto 5 da douta Sentença (correspondente ao quesito 5 da Base Instrutória) seja revisto e, em consequência, seja eliminado a parte final do mesmo, na parte em que se refere: “(…) excepto entre 01/11/2014 e 31/03/2020”, passando a redacção a ser a seguinte: 5. “A Ré não pagou ao Autor qualquer quantia pelo período dê 30 minutos que antecedia o início de cada turno”;
13) Em consequência, impõe-se que a douta Decisão seja revista, e a Ré ser condenada a pagar ao Autor a quantia de MOP$49,607.64 a título da prestação de 30 minutos que antecedem o início do turno relativamente ao período de 01/11/2014 a 31/03/2020, nos seguintes termos (n.º de dias de trabalho prestado X salário de base por hora com acréscimo de 50% / 2).
Sem prescindir,
Do trabalho prestado pelo Autor ao sétimo dia, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo, sua compensação e forma de cálculo:
14) Entendeu o Tribunal a quo na douta decisão condenar a Ré a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho) durante todo o período da relação laboral;
15) Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da Ré apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
16) Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho) deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprío dia de trabalho prestado;
17) Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida, de forma mais ou menos pacífica, pelo Tribunal de Segunda Instância, e nos termos da qual se tem entendido que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2);
In casu,
18) Resultando provado que, desde o início da relação de trabalho até 31/12/2008, o Autor prestou para a Ré um total de 1059 dias de trabalho efectivo - correspondente a 152 dias de trabalho prestado em dia de descanso semanal (1059/7 dias) – deve a Recorrida (B) ser, condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$55,732.32 a título do dobro da salário – e não só apenas MOP$27,866.16 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos, os legais efeitos se requer.
Acresce que,
19) Resulta da matéria de facto assente, entre outra, que:
- De 19/11/2005 a 31/03/2021, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (7.º)
- A que se seguia um período de vinte e quatro horas de não trabalho, em regra, no oitavo dia, que antecedia a mudança do turno. (8.º)
(…)
- De 01/01/2009 a 31/3/2021, a Ré não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas (…). (11.º)
- De 01/01/2009 a 31/03/2021 a Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho.» (12.º)
20) Não obstante a referida matéria de facto provada, com vista a apurar o valor que o Autor tinha a receber relativamente ao trabalho prestado em dia de descanso semanal, o tribunal a quo seguiu o seguinte raciocínio: dividiu o número dos dias de trabalho efectivos prestados pelo Autor e descontou os dias em que o Autor havia descansado ao 8.º dia, após a prestação de sete dias de trabalho consecutivos, apurando que o Autor terá direito a auferir a diferença entre os dois;
21) E, a ser assim, salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer existir um erro de julgamento traduzido, entre outro, no facto de se acreditar que a douta Decisão não ter factos para se poder chegar a tal resultado, nem que os mesmos constavam da Base Instrutória;
22) Ou melhor, diferentemente do que terá sido o entendimento do TJB, o que se impunha apurar era os dias de trabalho em que o Autor prestou trabalho para a Ré em cada 7.º dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho e não apurar a diferença entre o trabalho prestado ao 7.º dia com os dias de não trabalho que o Autor gozou no 8.º dia, isto é após 7 dias de trabalho consecutivo, e consequentemente nada havia a descontar aquando do apuramento do montante indemnizatório, a tal respeito;
23) Pelo exposto, deve a Recorrida (B) ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$149,019.93, a título de falta de marcação e gozo de descanso semanal – e não só de apenas MOP$20,794.95, conforme parece resultar da douta Sentença, correspondente ao seguinte (remuneração diária X número de dias de descanso);
24) Ao não entender assim, está o Recorrente em crer ter existido uma errada aplicação da norma em questão (leia-se, do art. 43.º da Lei n.º 7/2008) pelo Tribunal de Primeira Instância, o que em caso algum poderá deixar de conduzir, nesta parte, à nulidade da decisão recorrida, o que desde já e para os legais e devidos efeitos se invoca e requer.
Nestes itermos e nos mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve a douta Sentença ser julgada nula e substituida por outra que proceda à alteração da redação do ponto 5 da matéria assente e, bem assim, que atenda às fórmulas de cálculo tal qual formuladas pelo Autor/Recorrente, devendo a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente o seguinte:
a) a quantia de MOP$49,607.64 pela prestação de 30 minutos de trabalho que antecediam o início do turno, relativamente ao período de 01/11/2014 a 31/03/2020;
b) a quantia de MOP$55,732.32 (e não apenas MOP$27,866.16), pela prestação de trabalho ao sétimo dia, desde o início da relação de trabalho até 31/12/2008;
c) a quantia de MOP$149,019.93 (enao apenas MOP$20,734.95), pela prestação de trabalho ao sétimo dia, entre o período compreendido entre 01/01/2009 a 31/03/2021, tudo acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
Contra-alegando veio a Recorrida pugnar para que fosse negado provimento ao recurso, apresentando as seguintes conclusões:
I. Veio o Autor, ora Recorrente, insurgir-se contra a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base no que respeita à Compensação pela prestação de 30 minutos que antecediam o início de cada turno e à fórmula de cálculo seguida pela douta decisão recorrida quanto à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, por entender que, nesse particular, a sobredita decisão enferma de erro na apreciação da matéria de facto e de erro de aplicação de Direito e, nessa medida, mostra-se em violação do preceituado no artigo 17.º, do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, e ainda do artigo 42º e 43º da Lei n.º 7/2008;
II. Vem o Recorrente insurgir-se contra a sentença recorrida por entender que andou mal o Tribunal a quo que durante o período entre 01/11/2014 a 31/03/2020, já teria de ser pago o montante pedido pelo Autor a título de compensação pela prestação de 30 minutos que antecediam o início de cada turno, alegando que a conclusão que o Tribunal a quo teve não teve respaldo nem da Contestação nem da prova documental;
III. Salvo devido respeito, nada há a apontar à conclusão que o Tribunal a quo teve, pois é o que resulta dos recibos de vencimentos apresentados pela Ré, ora Recorrida, pois desses recibos de vencimento, é claro o pagamento por parte da ora Recorrida das horas extraordinárias relativamente à compensação pela prestação de 30 minutos que antecediam o inicio de cada turno durante esse período.
IV. Recibos esses que o autor não impugnou e também foi relativamente a esses recibos que o Autor conseguiu fazer prova dos montantes mensais pagos pela ora Recorrida a título de salários mensais, bem como a maior parte da base instrutória, não entendendo porque é que agora o ora Recorrente veio recorrer de uma decisão que a prova resulta desses mesmos recibos de vencimento, parece-nos que o autor somente quer aproveitar a parte que lhe convém da prova documental apresentada nos autos;
V. Não existe qualquer fundamento para que se altere a resposta ao ponto 5 da douta sentença, devendo se manter a redação desse mesmo ponto 5;
VI. Assim, parece-nos que o Tribunal a quo entendeu bem ao não condenar a ora Recorrida no pagamento da compensação pela prestação de 30 minutos que antecediam o início de cada turno durante o período entre 01/11/2014 a 31/03/2020, pelo que nesta parte o recurso terá necessariamente de improceder;
VII. Quanto à forma de cálculo adoptada pelo Tribunal a quo para apuramento da compensação pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal nada há a apontar à Decisão Recorrida, que mais não é do que a fórmula que é sufragada pelo Tribunal de Última Instância;
VIII. Nos termos do preceituado no artigo 17.º, n.º 6, alínea a) do Decreto-lei nº 24/89/M, estando em causa o pagamento do trabalho em dias de descanso semanal, pelo dobro da retribuição normal, tendo o Recorrente sido pago já em singelo, importa ter em conta esse salário já pago e pagar apenas o que falta (e não o dobro);
IX. A tese defendida pelo Recorrente nas suas doutas alegações subverte por completo a letra da lei e, a seguir-se tal tese, onde se lê que o trabalhador que aufira um salário mensal tem o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal quando presta trabalho nos dias de descanso semanal, ler-se-ia que o pagamento em apreço deveria corresponder ao triplo da retribuição normal;
X. A Decisão em Recurso para além de encontrar total sustentação na letra da lei, encontra-a também na jurisprudência unânime do Tribunal de Última Instância de Macau, nos Acórdãos proferidos no âmbito dos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007 e, bem assim, naquele que foi já entendimento unânime no Tribunal de Segunda Instância no Acórdão de 29.03.2001 no processo n.º 46/2001, para cuja fundamentação se remete;
XI. Diga-se aliás, que, em face da redacção conferida pela Lei 7/2008 ao artigo 43º, nº 2, 1), tornou-se evidente a opção legislativa no sentido de compensar o trabalhador pela prestação do trabalho em dia que seria de descanso com um dia (e não dois) de remuneração de base;
XII. E, bem assim, naquele que foi já entendimento unânime no Tribunal de Segunda Instância no Acórdão de 29.03.2001 no processo n.º 46/2001, de cujo sumário se aprende que “Não obstante, o trabalhador obrigado a trabalhar no dia de descanso deve auferir, para além do seu salário normal outro tanto equivalente àquele dia.” (destacado nosso);
XIII. Diga-se aliás, que, em face da redacção conferida pela Lei 7/2008 ao artigo 43º, nº 2, 1), tornou-se evidente a opção legislativa no sentido de compensar o trabalhador pela prestação do trabalho em dia que seria de descanso com um dia (e não dois) de remuneração de base;
XIV. Se o trabalhador já recebeu a remuneração só terá de receber o “equivalente a 100% dessa mesma remuneração a acrescer ao salário já pago” (neste sentido vide “Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau”, Miguel Pacheco Arruda Quental, págs. 283 e 284);
XV. Por entender que o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto no artigo 17º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, por ter condenado a Ré B, a pagar ao Autor apenas a quantia de MOP$27,866.16, e que deveria ter sido o montante de MOP$55,732.32, pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho),
XVI. E ainda, por entender que o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto no artigo 43º da Lei n.º 7/2008 por ter condenado a Ré B, a pagar ao Autor apenas a quantia de MOP$20,794.95 e que deveria ter sido o montante de MOP$149,019.93, pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal durante o período de 01/01/2009 a 31/03/2021, alegando que não obstante a matéria de facto provada o Tribunal a quo: “(...) seguiu o outro raciocínio: dividiu o número total dos dias de trabalho prestados pelo Autor e descontou os dias em que o mesmo havia descansado ao 8.º dia, após a prestação de sete dias de trabalho consecutivos, apurando que o Autor (apenas) terá direito a auferir a diferença entre os dois.”
XVII. Diga-se, desde logo que, quanto à actividade da empresa a mesma é pública e notória - é actividade de Casino e de laboração contínua -, ou seja, de vinte e quatro horas sobre vinte e quatro horas, como o Recorrente bem sabe pois foi guarda de segurança de um casino;
XVIII. Nem se diga que pela matéria dada como provada na resposta aos quesitos 9º e 11º da sentença pois bem sabe o Recorrente porque alegou nos artigos 7º, 12º e 24º da sua petição inicial que após sete dias de trabalho consecutivo o Autor Recorrente gozava um período de vinte e quatro horas de descanso, o que foi confirmado pela testemunha ouvida em audiência de discussão e julgamento e ainda conforme consta da fundamentação na resposta dada à matéria de facto;
XIX. Assim, se o Recorrente gozou efectivamente de um dia de dispensa ao trabalho em cada oitavo dia, o cômputo efectuado a final pelo douto Tribunal a quo de compensar o Recorrente pelo trabalho prestado ao sétimo dia de trabalho consecutivo entre 01/01/2009 a 31/03/2021, não poderia ter sido calculado de modo diferente pois no que respeita às compensações pelos dias de descanso semanal, com a entrada em vigor em 01/01/2009 da Lei n.º 7/2008, o legislador deixou de exigir o gozo consecutivo do descanso semanal por cada quatro semanas, conforme se prevê no nº 2 do art.º 42º da Lei nº 7/2008, isto é: «O gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal em caso de acordo entre as partes ou quando a natureza da actividade da empresa o torne inviável, casos em que o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semenas.».
XX. No caso dos autos e como supra se referiu, a Lei admite a concessão do descanso em cada oitavo dia como descanso semanal nos termos do nº 2 do art.º 42º da Lei nº 7/2008,
XXI. Ora, conforme o alegado pela B, ora Recorrida, nos artigos 59º e 60º da Contestação, por razões associadas às exigências do funcionamento da respectiva empresa, bem como, em função da natureza do sector de actividade da Recorrida - Casino - que é de laboração contínua, poderá o empregador ter a necessidade de fixar e atribuir esses dias de descanso semanal não ao sétimo dia, mas num outro dia do mês.
XXII. Nesta medida, verificando-se no caso sub judice uma das situações previstas no n.º 2 do artigo 42º da Lei n.º 7/2008 e resultando da matéria de facto dado como provada que o Recorrente gozou o descanso compensatório ao 8º dia, bem andou o douto Tribunal a quo no apuramento do montante indemnizatório, devendo, por isso, improceder também aqui o Recurso a que ora se responde.
XXIII. Pelo que e, face a todo o exposto, não tem o Recorrente qualquer razão no recurso que apresenta, devendo o mesmo ser julgado totalmente improcedente.
Foram colhidos os vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
Em sede de recurso vem impugnada a decisão sobre a matéria de facto no que concerne à resposta dada ao quesito 5º da Base Instrutória quanto à parte final deste no excerto “excepto entre 01/11/2014 e 31/03/2020”.
Sustenta o Autor e ora Recorrente que não ficou provado o pagamento dos 30 minutos de trabalho extraordinário no início de cada turno, porquanto a Ré e ora Recorrida em sede de contestação negava que tivesse exigido ao Autor que comparecesse no local de trabalho com 30 minutos de antecedência nem tão pouco alegou que tivesse pago o trabalho prestado nesse período.
Vejamos então.
No quesito 5º perguntava-se:
«A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno?»
E foi dado como provado que:
«A Ré não pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno, excepto entre 01.11.2014 e 31.03.2020.».
Nos termo do artº 335º do C.Civ. àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
Se o Autor vem pedir que lhe seja paga determinada quantia deve invocar os factos de onde emerge o seu direito e pedir a condenação da Ré a pagar.
Em termos lógicos e simplistas, estando todos obrigados a actuar de boa-fé, se o Autor pede a condenação da Ré a pagar é porque não recebeu.
Nos termos do nº 1 do artº 335º do C.Civ. ao Autor cabe invocar os factos “constitutivos do seu direito” a receber da Ré a quantia em cujo pagamento a quer ver condenada.
Por exemplo se o Autor vendeu algo à Ré invoca os factos constitutivos do contrato de venda e conclui pedindo a condenação da Ré a pagar.
Se o Autor prestou um serviço à Ré invoca os factos constitutivos do contrato de prestação de serviços que prestou e pede a condenação da Ré a pagar-lhe.
Se o trabalhador prestou trabalho extraordinário invoca os factos de onde se conclui que o prestou e pede a condenação da Ré entidade patronal a pagar.
É comum em todas estas situações o Autor dizer que não recebeu, mas esta alegação de que não recebeu, mais não tem do que o valor de impugnação antecipada de um eventual pagamento que a Ré venha a alegar em contestação em sede de excepção peremptória, e não facto constitutivo do seu direito, pois o direito a receber a quantia emerge da venda que fez, dos serviços que prestou, do trabalho extraordinário prestado, etc..
Se o Autor foi pago pela situação que invoca este facto é extintivo do direito ao pagamento que invoca.
A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado cabe àquele contra quem a invocação é feita nos termos do nº 2 do artº 335º do C.Civ..
Logo, se no caso dos exemplos usados o Réu pagou o preço da venda, dos serviços prestados, do trabalho extraordinário prestado cabe-lhe invocar e prova-lo.
Neste sentido veja-se em Jurisprudência comparada o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de Portugal, proferido em 12.07.2011 no processo que correu termos sob o nº 371793/08.5YIPRT.C1.
Logo no caso em apreço não tendo a Ré invocado o pagamento nada havia a quesitar porque o Autor não tem o ónus de alegar e provar o “não pagamento”.
Mas ainda que mal, haja sido formulado um quesito sobre o não pagamento, a resposta só podia ser Provado ou Não Provado.
Perguntar se não pagou não é a mesma coisa que perguntar se pagou.
Apesar de aparentemente ser a mesma coisa mas formulado na negativa ou positiva, não é.
Mas se for quesitado, impugnado e não provado, provando-se os factos constitutivos do direito do Autor, por exemplo que vendeu e entregou a coisa à Ré, mesmo que o não pagamento não se prove estão provados os factos constitutivos do direito do Autor e a decisão tem de ser de condenação da Ré a pagar o que se lhe pede, pois da não prova do “não pagamento” não resulta demonstrado que pagou, e em face da prova dos factos constitutivos do direito do Autor outra solução não se pode ter que não seja a procedência da acção.
Destarte, se por mais não fosse, quesitar se não pagou é irrelevante pois ou se prova que não pagou ou não se prova nada.
Ao passo que o pagamento sendo uma excepção extintiva do direito do Autor tem de ser invocado – em sede de excepção – pela Ré e provado por esta.
Como matéria de excepção que é tem de ser impugnada pelo Autor em sede de réplica sob pena de se ter como provada, salvo se na p.i. já vinha alegado que o pagamento não havia sido feito.
Se se provarem os factos constitutivos do direito do Autor, por exemplo que vendeu e entregou a coisa à Ré, se se provar que a Ré pagou apesar da prova dos factos constitutivos do direito do Autor a decisão tem de ser de absolvição da Ré porque esta já não tem obrigação de pagar. Se não se provar o pagamento, perante a prova dos factos constitutivos do Autor a decisão tem de ser condenação da Ré a pagar o que se lhe pede.
Daqui podemos ver que o efeito perante o quesitar o não pagamento e o pagamento são totalmente diferentes: quesitar o não pagamento é inócuo, quesitar o pagamento faz toda a diferença.
Daqui decorre uma outra consequência para o caso em apreço.
Aceitamos que o tribunal pode dar resposta explicativas mas apenas e tão só se couberem dentro do âmbito do que se pergunta, isto é, se respeitarem ao facto quesitado.
Como já se disse perguntar se não pagou é totalmente diferente de perguntar se pagou, até quanto ao ónus da prova.
Mas se se quesitar pagou, podemos responder que pagou apenas x ou pagou y, ou em vez do pagamento entregou Z que tem o mesmo valor, sendo certo que todas estas “explicações” têm a ver com o facto “pagamento”, entrega, cumprimento.
Agora se se perguntar não pagou, e se responder que não pagou salvo no período x ou y, isto quer dizer que não pagou numa parte mas noutra parte pagou.
Logo, esta a dar-se como provado um pagamento que é um excepção extintiva do direito do Autor ou modificativa se for parcial e que como tal havia de ter sido invocada, sujeita a contraditório e quesitada.
Assim sendo, ao responder que não pagou, mas pagou em parte, o tribunal não está a explicar ou a reduzir o facto mas a dar como provado um outro facto que não foi invocado, sujeito a contraditório e a prova.
Quesitar não pagou e responder pagou X, não é explicar é dar como provado algo que não se tinha quesitado – e no caso em apreço nem havia sido alegado, o que implica nulidade do julgamento por decidir com base em factos que não são invocados pelas partes -.
Destarte, sem prejuízo de entendermos que nem o quesito 5º havia de ser formulado, nunca a resposta que lhe foi dada o podia ter sido pois implica a prova de um facto que nunca se invocou, nem submeteu a contraditório, nem a prova e contraprova.
Tanto era o bastante para que a resposta explicativa dada ao quesito 5º fosse eliminada, sendo certo que o que se disse serve para todas as situações de alegados “não pagamentos”, cabendo reter que se pagou ao Réu cabe invocar e provar, salvo se a excepção não for impugnada1.
No caso em apreço a prova da parte final da resposta dada ao quesito 5º é ainda mais absurda.
Vejam-se os artigos 13º a 21º da contestação onde peremptóriamente se impugna e nega que o Autor tivesse que comparecer no local de trabalho, devidamente uniformizado, pelo menos 30 minutos antes do início de cada turno.
Depois nos artigos seguintes vem dizer-se que não se exigia mas que se quisesse devia estar e que a finalidade era outra e não era trabalho extraordinário.
Perante tal contestação, pergunta-se: Se a Ré nega que o Autor estivesse obrigado a comparecer nos tais 30 minutos antes de cada turno, se sustenta que não era trabalho extraordinário, se em momento algum invoca que pagou, como é que se deu como provado que pagou?!?
Não tendo sido invocado o pagamento do trabalho extraordinário prestado por esses 30 minutos antes de cada turno nunca o tribunal poderia ter dada ao quesito 5º a resposta que deu, pelo que, se impõe julgar procedente o recurso quanto à impugnação da matéria de facto, ficando a resposta apenas quanto ao restante nos seguintes termos:
“A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno. (5°)”
1. FACTOS
Da sentença recorrida e da procedência do recurso quanto à impugnação da matéria de facto, resulta demonstrada a seguinte factualidade:
- De 19/11/2005 ao presente, o Autor encontra-se ao serviço da Ré, a exercer funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente. (A)
- O Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré. (B)
- A Ré sempre fixou o local e o horário de trabalho do Autor, de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (C)
- O Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e instruções da Ré. (D)
- De 19/11/2005 a 31/10/2021, o Autor gozou de dias de férias anuais e de dias de dispensa ao trabalho nos dias seguintes: (E)
Período
Dias de férias e/ou de ausência
11/11/2006 a 05/12/2006
25
06/11/2007 a 27/11/2007
24
27/11/2008 a 27/12/2008
31
08/03/2009 a 10/12/2009
278
2010
24
10/05/2011 a 28/05/2011
24
09/10/2012 a 31/10/2012
24
08/10/2013 a 29/10/2013
24
11/11/2014 a 02/12/2014
24
01/12/2015 a 29/12/2015
29
06/12/2016 a 27/12/2016
24
10/10/2017 a 02/11/2017
24
08/12/2018 a 29/12/2018
24
30/11/2019 a 31/12/2019
32
2020
20
- Por razões associadas às exigências do funcionamento da respectiva empresa, bem assim, em função da natureza do sector de actividade da Ré - Casino - que é de laboração contínua. (F)
- De 19/11/2005 a 31/10/2021, a Ré pagou ao Autor as seguintes quantias a título de salário de base mensal e subsídio de alojamento: (1º e 14º)
De
A
Salário de base mensal
Subsídio de Alojamento
19-11-2005
31-12-2008
$5,500.00
$1,000.00
01-01-2009
31-01-2011
$5,500.00
$1,000.00
01-02-2011
31-07-2011
$5,775.00
$1,000.00
01-08-2011
31-12-2011
$6,275.00
$500.00
01-01-2012
31-01-2013
$6,903.00
$500.00
01-02-2013
31-12-2013
$7,318.00
$500.00
01-01-2014
31-12-2014
$7,684.00
$500.00
01-01-2015
31-07-2018
$8,069.00
$500.00
01-08-2018
31-07-2019
$10,000.00
$500.00
01-08-2019
31-10-2021
$10,600.00
$500.00
- Desde o início da relação de trabalho até 31/10/2021, por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (2°)
- Durante o referido período de tempo, tinha lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os "guardas de segurança", na qual eram inspeccionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (3°)
- De 19/11/2005 a 31/10/2021, o Autor compareceu ao serviço da Ré com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos, sem prejuízo da al. E) dos Factos Assentes. (4°)
- A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo período de 30 minutos que antecedia o início de cada turno. (5°)
- A Ré nunca conferiu ao Autor o gozo de descanso adicional remunerado, proporcional ao período de trabalho prestado. (6°)
- De 19/11/2005 a 31/03/2021, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (7°)
- A que se seguia um período de vinte e quatro horas de não trabalho, em regra, no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (8°)
- Entre 19/11/2005 e 31/12/2008, a Ré não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da al. E) dos Factos Assentes. (9°)
- Entre 19/11/2005 e 31/12/2008, a Ré não concedeu ao Autor qualquer um dia de descanso compensatório em sequência do trabalho prestado a cada sétimo dia após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho excepto os dias referidos na resposta data ao quesito 8°. (10°)
- De 01/01/2009 a 31/03/2021, a Ré não fixou ao Autor em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da al. E) dos Factos Assentes. (119) De 01/01/2009 a 31/03/2021 a Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia pelo trabalho prestado ao sétimo dia, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho. (12°)
- Entre 01/01/2009 e 31/03/2021, a Ré não concedeu ao Autor qualquer um dia de descanso compensatório em sequência do trabalho prestado a cada sétimo dia após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho excepto os dias referidos na resposta data ao quesito 8°. (13°)
2. DO DIREITO
O objecto do presente recurso versa sobre:
- o cálculo da indemnização devida pelo trabalho prestado ao sétimo dia, desde o início da relação de trabalho até 31.12.2008;
- o cálculo da indemnização devida pelo trabalho prestado ao sétimo dia, entre o período compreendido entre 01.01.2009 a 31.03.2021; e
- do trabalho extraordinário relativo ao período de 01.11.2014 a 31.03.2020.
Vejamos então.
Cálculo da indemnização devida pelo trabalho prestado ao sétimo dia, desde o início da relação de trabalho até 31.12.2008
No que concerne ao período de 19.11.2005 a 31.12.2008 a sentença recorrida seguiu o entendimento de que o trabalho prestado em dia de descanso semanal era remunerado pelo dobro, considerando que a aplicação do factor de multiplicação 2 inclui a remuneração normal devida por esse dia, pelo que, tendo o Autor/Recorrente sido pago por esse dia e tendo trabalhado em dia de descanso semanal, havia apenas que receber mais o valor correspondente a um dia de trabalho.
Contudo, não tem sido esse o entendimento sufragado por este Tribunal de Segunda Instância.
Consagra o artº 17º do Decreto-Lei nº 24/89/M, na redacção introduzida pelo nº 32/90/M o seguinte:
«Artigo 17º
(Descanso semanal)
1. Todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26º
2. O período de descanso semanal de cada trabalhador será fixado pelo empregador, com devida antecedência, de acordo com as exigências do funcionamento da empresa.
3. Os trabalhadores só poderão ser chamados a prestar trabalho nos respectivos períodos de descanso semanal:
a) Quando os empregadores estejam na eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a acréscimos de trabalho não previsíveis ou não atendíveis pela admissão de outros trabalhadores;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável e insubstituível para garantir a continuidade do funcionamento da empresa.
4. Nos casos de prestação de trabalho em período de descanso semanal, o trabalhador tem direito a um outro dia de descanso compensatório a gozar dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e que será imediatamente fixado.
5. A observância do direito consagrado no nº 1 não prejudica a faculdade de o trabalhador prestar serviço voluntário em dia de descanso semanal, não podendo, no entanto, a isso ser obrigado.
6. O trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago:
a) Aos trabalhadores que auferem salário mensal, pelo dobro da retribuição normal;
b) Aos trabalhadores que auferem salário determinado em função do resultado efectivamente produzido ou do período de trabalho efectivamente prestado, pelo montante acordado com os empregadores, com observância dos limites estabelecidos nos usos e costumes.».
A questão que se coloca consiste em saber se quando a lei fala em “dobro da retribuição normal” está a pensar apenas em o trabalho ser pago pela retribuição normal que seria devida pelo dia de descanso acrescida do equivalente à remuneração devida por mais um dia, ou se se pretende dizer que o “trabalho” prestado em dia de descanso semanal é pago com a retribuição equivalente ao dobro do que aquilo que seria devido por um dia de trabalho normal, sem prejuízo do trabalhador continuar a ter direito a receber o valor que já era devido por esse dia em que devia ter descansado.
Tem vindo a ser entendimento deste tribunal que a remuneração devida é igual ao dobro da remuneração normal, sem descontar o valor que é pago ao trabalhador por esse dia ainda que não trabalhasse.
A respeito de descanso semanal referem José Bento da Silva e Miguel Quental, em Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau, 2006, que: «As razões que justificam a existência de um dia de descanso prendem-se com motivos de ordem física e psíquica (recuperar do desgaste provocado por uma semana de trabalho), de ordem familiar (aproveitar esse dia para conviver com a própria família) e também por razões de ordem social e cultural (esse período permite o convívio com amigos, a participação em manifestações de carácter público, ou para que o trabalhador possa tratar de assuntos do seu próprio interesse junto, por ex. de repartições públicas, etc.).
A fixação do período de descanso semanal, nos termos do nº 2 do art. 17º, cabe ao empregador, e deve ser realizado (fixado) “com devida antecedência de acordo com as exigências de funcionamento da empresa”. Assim, e embora seja a entidade patronal quem tem o poder para determinar o dia de descanso semanal dos seus trabalhadores, tal fixação está, no entanto, subordinada às exigências de funcionamento da empresa. O que se compreende, atendendo a que no Território o normal é as empresas funcionarem todos os dias, inexistindo um dia de paralisação da actividade, logo torna-se necessário escalonar os dias de descanso semanal dos trabalhadores por forma a que a empresa se possa manter em funcionamento todos os dias da semana.
Como se referiu, a lei determina que o descanso semanal deve ser fixado com a “devida antecedência”: quer isto dizer que a entidade patronal deve avisar o trabalhador do seu dia de descanso com a antecedência suficiente, para que este possa organizar a sua vida de modo a poder usufruir efectivamente de todos os benefícios relacionados com o dia de descanso.».
O trabalho prestado em dia de descanso semanal reveste carácter excepcional, ainda que seja voluntariamente prestado, sendo as normas respectivas de carácter imperativo.
O trabalhador tem sempre o direito a receber a remuneração correspondente ao dia de descanso nos termos do artº 26º nº 1 do Decreto-Lei 24/89/M.
Destarte, tem este tribunal vindo a entender que quando na al. a) do nº 6 do artº 17º do indicado diploma legal se diz que “o trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago (…) pelo dobro” se está a consagrar o valor remuneratório do trabalho efectivamente prestado e indisponibilidade de gozar o dia de descanso semanal, independentemente e para além da remuneração desse dia à qual o trabalhador, como já se referiu, sempre teria direito.
Em igual sentido se disse no Acórdão deste tribunal de 27.02.2020 proferido no processo 1247/2019: «Não faria, aliás, sentido que fosse de outra maneira. Na verdade, se o trabalhador, mesmo sem prestar serviço nesse dia de descanso (v.g., domingo), sempre auferiria o correspondente valor (a entidade patronal não lho poderia descontar, visto que o salário é mensal), não faria sentido que, indo trabalhar nesse dia, apenas passasse a receber em singelo o trabalho efectivamente prestado. Seria injusto que apenas se pagasse ao trabalhador esse dia de serviço, que deveria ser de folga e descanso. Que vantagem teria então o trabalhador por prestar serviço a um domingo, se, além do que receberia mesmo sem trabalhar, apenas lhe fosse pago o valor do trabalho efectivamente prestado nesse dia de folga como se tratasse de um dia normal de trabalho?!
Por isso é que o legislador previu que o trabalho efectivamente prestado nesses dias pelo trabalhador, além do valor que já lhes seria devido em qualquer caso, fosse compensado em dobro pelo valor da retribuição normal diária. Quando a lei fala em dobro refere-se, obviamente, à forma de remunerar esse serviço efectivamente prestado nesses dias de descanso, sem prejuízo, como é bom de ver, do valor da remuneração a que sempre teria direito correspondente a cada um desses dias de descanso e que já recebeu.
Significa isto, assim, que a 1ª instância não poderia ter descontado o valor em singelo já recebido pelo Recorrente.
Trata-se, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma quase uniforme por este TSI, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: salário diário X nº de dias devidos e não gozados X 2.».
Assim sendo, sem necessidade de outras considerações e sendo esta a Jurisprudência consagrada de forma unânime nos Acórdãos proferidos por este tribunal, impõe-se decidir em conformidade, revogando a decisão recorrida nesta parte e substituindo-a por outra que respeite a indicada forma de cálculo da remuneração devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal.
Da factualidade apurada resulta que a remuneração base mensal do Autor era de MOP6.500,00 e na sentença sob recurso considerou-se que o Autor trabalhou 151 dias de descanso semanal até 31.12.2008, pelo que, lhe seria devida a remuneração igual a MOP65.433,332.
Cálculo da indemnização devida pelo trabalho prestado ao sétimo dia, entre o período compreendido entre 01.01.2009 a 31.03.2021
Quanto ao período a partir de 01.01.2009, verifica-se que contrariamente ao que estipula o artº 42º da Lei nº 7/2008 a Ré B não fixou ao Autor um período de descanso de 24 horas em cada semana (ou período de 7 dias).
O Autor trabalhava consecutivamente durante 7 dias e descansava ao 8º dia, conforme resulta da matéria de facto assente.
Relativamente a esta matéria tem «Este TSI tem entendido de forma unânime, que o trabalho prestado no sétimo após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho em cada semana deve ser qualificado como trabalho prestado no dia do descanso semanal, não obstante o Autor ter gozado um dia de descanso ao oitavo dia.
A razão de ser consiste em “o trabalhador não pode prestar mais do que seis dias de trabalho consecutivos, devendo o dia de descanso ter lugar, no máximo, no sétimo dia, e não no oitavo, nono ou noutro dia do mês, salvo acordo das partes em sentido contrário, no que toca ao momento de descanso a título de “compensação”, mas o critério para este efeito é sempre o período de sete dias como uma unidade” (cfr. Ac. do TSI, Proc. nº 89/2020, de 16/04/2020).
Assim, o descanso remunerado do trabalhador no oitavo dia não pode ser qualificado como descanso semanal sem acordo das partes ou quando a natureza da actividade da empresa não torne inviável o gozo no sétimo dia, antes deve ser qualificado como dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado no dia de descanso semanal a que se alude o nº 2 do artº 43º da Lei nº 7/2008.
Tem o Autor já gozado os dias de descanso compensatório a que se alude o nº 2 do artº 43º da Lei nº 7/2008, só fica por pagar-lhe o acréscimo de uma remuneração de base correspondente aos (…) dias de trabalho prestado no descanso semanal.» - cfr. Ac. do TSI, Proc. nº 83/2021, de 29.04.2021.
Pelo que, de acordo com o que tem vindo a ser o entendimento deste TSI, e tendo em consideração a matéria de facto apurada, tendo o Autor já gozado o dia de descanso compensatório a que teria direito (o descanso ao 8º dia), pelo trabalho prestado ao 7º dia tem este direito a receber apenas o acréscimo da remuneração correspondente a um dia de trabalho nos seguintes valores:
- Entre 01.01.2009 e 31.01.2011 : MOP6.500,00 / 30 dias x 66 dias (459 dias / 7 dias) = MOP14.300,00;
- Entre 01.02.2011 e 31.07.2011 : MOP6.775,00 / 30 dias x 22 dias (157 dias / 7 dias) = MOP4.968,33;
- Entre 01.08.2011 e 31.12.2011 : MOP6.775,00 / 30 dias x 22 dias (153 dias / 7 dias) = MOP4.968,33;
- Entre 01.01.2012 a 31.01.2013 : MOP7.403,00 / 30 dias x 53 dias (373 dias / 7 dias) = MOP13.078,63;
- Entre 01.02.2013 a 31.12.2013 : MOP7.818,00 / 30 dias x 44 dias (310 dias / 7 dias) = MOP11.466,40;
- Entre 01.01.2014 a 31.12.2014 : MOP8.184,00 / 30 dias x 49 dias (341 dias / 7 dias) = MOP13.367,20;
- Entre 01.01.2015 a 31.07.2018 : MOP8.569,00 / 30 dias x 176 dias (1231 dias / 7 dias) = MOP50.271,47;
- Entre 01.08.2018 a 31.07.2019 : MOP10.500,00 / 30 dias x 49 dias (341 dias / 7 dias) = MOP17.150,00;
- Entre 01.08.2019 a 31.03.2021 : MOP11.100,00 / 30 dias x 80 dias (557 dias / 7 dias) = MOP29.600,00;
Tudo no valor global de MOP159.170,363.
Cálculo da indemnização devida pelo trabalho extraordinário.
Tendo procedido o recurso quanto à impugnação da decisão da matéria de facto relativamente à resposta dada ao quesito 5º, e havendo na decisão recorrida já se decidido sobre o pagamento do trabalho extraordinário relativo aos 30 minutos de antecedência com que o trabalhador tinha de comparecer, aderindo à fundamentação de direito constante da decisão recorrida a qual não foi impugnada, impõe-se apenas contabilizar o valor em falta.
Assim, pelo trabalho extraordinário referente aos 30 minutos com que o trabalhador tinha de comparecer antes de cada turno, para além do valor de MOP58.674,77 já apurado na sentença recorrida, pelo período de 01.11.2014 a 31.03.2020 é devido o seguinte valor:
- De 01.11.2014 a 31.12.2014, deduzido de 24 dias de férias (facto da alínea E) e 5 dias de descanso ao oitavo dia, temos 32 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP7.684,00 (7.684:30:8x1,5x0,5=24,01x32=768,32) perfaz o valor de MOP768,32;
- De 01.01.2015 a 31.12.2015, deduzido de 29 dias de férias (facto da alínea E) e 42 dias de descanso ao oitavo dia, temos 294 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP8.069,00 (8.069:30:8x1,5x0,5=25,22x294=7.414,68) perfaz o valor de MOP7.414,68;
- De 01.01.2016 a 31.12.2016, deduzido de 24 dias de férias (facto da alínea E) e 43 dias de descanso ao oitavo dia, temos 299 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP8.069,00 (8.069:30:8x1,5x0,5=25,22x299=7.540,78) perfaz o valor de MOP7.540,78;
- De 01.01.2017 a 31.12.2017, deduzido de 24 dias de férias (facto da alínea E) e 43 dias de descanso ao oitavo dia, temos 298 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP8.069,00 (8.069:30:8x1,5x0,5=25,22x298=7.515,56) perfaz o valor de MOP7.515,56;
- De 01.01.2018 a 31.07.2018, deduzido de 27 dias de descanso ao oitavo dia, temos 185 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP8.069,00 (8.069:30:8x1,5x0,5=25,22x185=4.665,70) perfaz o valor de MOP4.665,70;
- De 01.08.2018 a 31.12.2018, deduzido de 24 dias de férias (facto da alínea E) e 16 dias de descanso ao oitavo dia, temos 113 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP10.000,00 (10.000:30:8x1,5x0,5=31,25x113=3.531,25) perfaz o valor de MOP3.531,25;
- De 01.01.2019 a 31.07.2019, deduzido de 27 dias de descanso ao oitavo dia, temos 185 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP10.000,00 (10.000:30:8x1,5x0,5=31,25x185=5.781,25) perfaz o valor de MOP5.781,25;
- De 01.08.2019 a 31.12.2019, deduzido de 32 dias de férias (facto da alínea E) e 15 dias de descanso ao oitavo dia, temos 106 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP10.600,00 (10.600:30:8x1,5x0,5=33,12x106=3.510,72) perfaz o valor de MOP3.510,72;
- De 01.01.2020 a 31.03.2020, deduzido de 5 dias de férias (facto da alínea E) e 11 dias de descanso ao oitavo dia, temos 75 dias de trabalho o que considerando o salário base de MOP10.600,00 (10.600:30:8x1,5x0,5=33,12x75=2.484,00) perfaz o valor de MOP2.484,00.
Destarte a título de trabalho extraordinário de 30 minutos antes do início de cada turno relativo ao período de 01.11.2014 a 31.03.2020 tem o Autor direito a receber o valor de MOP43.212,26 o que acrescido do valor já calculado e arbitrado e na sentença recorrida de MOP58.674.77 perfaz o valor global de MOP101.887,03.
Dos valores que o Autor tem direito a receber apurados neste recurso resulta que os relativos ao descanso semanal são superiores ao que se pedia e quanto ao trabalho extraordinário inferior, sendo o valor global daquilo a que o Autor tem direito a receber apurado nesta decisão de MOP267.815,95 e o valor global pedido em sede de recurso de MOP254.359,89 (49.607,64+55.732,32+149.019,93).
Logo, por força do disposto no artº 564º do CPC impõe-se limitar o valor da condenação ao do pedido, sendo a redução feita no valor da condenação pelo descanso semanal a qual passa a ser de MOP211.147,63 e não os MOP224.603,69 apurados.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, concedendo provimento parcial ao recurso, revogando a sentença recorrida na parte respeitante à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e pelo trabalho extraordinário prestado no período de 01.11.2014 e 31.03.2020 por este último vai a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de MOP43.212,26 para além dos MOP58.674,77 que já havia sido condenada na decisão recorrida e que não foi objecto de recurso e pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP211.147,63 acrescida dos juros moratórios fixados nos termos daquela decisão a qual em tudo o mais se mantém.
Custas pelo Autor e Ré na proporção do decaimento na primeira instância e nesta instância pela Recorrida.
Registe e Notifique.
RAEM, 17 de Julho de 2024
Rui Pereira Ribeiro (Relator)
Fong Man Chong (Primeiro Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng (Segundo Juiz-Adjunto)
1 Uma das razões porque o legislador exige que se individualize a matéria de excepção e reconvenção é para dentro do princípio da colaboração das partes e da boa-fé alertar a parte contrária de que ali poderá haver matéria para eventualmente impugnar.
2 A este respeito em sede de recurso pedia-se MOP55.732,32.
3 A este respeito em sede de recurso pedia-se MOP149.019,93.
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282/2024 CÍVEL 1