Processo nº 147/2023
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 17 de Outubro de 2024
ASSUNTO:
- Impugnação específica
- Conclusões sintéticas
SUMÁRIO:
- Se a Autora não cumpriu integralmente o despacho de aperfeiçoamento, continuando a misturar a impugnação de facto com a de direito, bem como não formulou conclusões de forma sintética e adequada a uma apreensão eficaz do objecto do recurso e das questões que nele cumpre decidir, é de rejeitar o recurso interposto pela Autora.
O Relator
Ho Wai Neng
Processo nº 147/2023
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 17 de Outubro de 2024
Recorrentes: (A) (Autora)
(B) (1ª Ré)
(C) (2ª Ré)
(D) (3ª Ré)
Recorridas: As Mesmas
(E) (4ª Ré)
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – RELATÓRIO
Vem a Autora (A) recorrer dos despachos e da sentença do Tribunal a quo, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
(1) Do despacho saneador de 12/04/2014:
a) Nos termos do art. 58º do CPC têm legitimidade processual os sujeitos da relação material controvertida tal como é configurada pelo autor, não relevando para o efeito a relação material controvertida como ela existe na realidade, pois esta é já uma questão relativa ao mérito ou fundo da causa, e não à sua forma.
b) Assim, a legitimidade das partes tem de ser aferida sempre e apenas pelo que o autor alega na petição inicial e na réplica, se nesta foi alterada a causa de pedir, verificando-se a legitimidade passiva quando os factos alegados pelo autor são susceptíveis de viabilizarem uma qualquer das soluções plausíveis da questão de direito em causa.
c) No caso dos autos para apurar se a 4ª Ré tem legitimidade passiva não interessa averiguar se a mesma é efectivamente titular da relação material de incumprimento contratual e responsabilidade civil alegada pela Autora, mas apenas se esta nos seus articulados alegou factos suficientes para justificar que a mesma se ocupe do objecto do processo.
d) A Autora, entre o mais e em súmula, pede a condenação solidária das quatro Rés a pagarem-lhe determinada quantia em dinheiro a título de indemnização com fundamento em incumprimento de vínculos obrigacionais inicialmente criados por via contratual com as 1ª a 3ª Rés no âmbito de um concurso para atribuição de uma concessão para exploração de jogos em casino na RAEM, alegando que acordou com as 1ª a 3ª Rés concorrerem em conjunto à atribuição de uma concessão de jogo, tendo efectivamente concorrido, mas durante o concurso as 1ª a 3ª Rés terminaram a “participação” com a Autora e “associarem-se” a outra concorrente que veio a conseguir a pretendida concessão, o que não aconteceu com a Autora apenas por causa da “transferência” das Rés, que a concessão foi obtida com base em projecto concebido e elaborado pela Autora, conforme Proposta de Candidatura / Adjudicação ao Concurso de Jogo de 07-Dezembro de 2001, elaborada em conjunto pela Autora e pelas 1ª a 3ª Rés, que logo que obtida a concessão e terminada a “participação” entre a Autora e as 1ª a 3ª Rés foi constituída a 4ª Ré para explorar tal actividade comercial, que a 4ª Ré foi criada nos termos da estratégia empresarial definida inicialmente pela Autora, a qual tinha acordado com as 1ª a 3ª Rés que, uma vez obtida a concessão, o grupo empresarial (C) / (D), contratualmente entendido como compreendendo as 1ª a 3ª Rés ou uma sua qualquer subsidiária, constituiria uma sociedade de Macau directa ou indirectamente detida ou controlada por elas, com participação no capital social da Autora, para celebrar com esta um contrato de desenvolvimento e gestão do casino, com carácter de exclusividade, que duraria até ao termos do prazo da concessão e que assumiria retroactivamente os direitos e obrigações resultantes para as 1ª a 3ª Rés de todos os acordos que estas haviam antes firmado com a Autora, e que foi expressamente estabelecido que todas as referências feitas à (E) na Proposta de Candidatura incluíam esta nova subsidiária
e) Estes factos são suficientes para afirmar a legitimidade passiva da 4ª Ré, pois segundo eles a 4ª Ré foi criada em conformidade e em decorrência dos acordos firmados entre a Autora e as 1ª a 3ª Rés e adquiriu retroactivamente, por efeito das obrigações e condições contratualmente assumidas, os direitos e obrigações resultantes desses acordos para as 1ª a 3ª Rés.
f) E a Autora apresenta na petição e na réplica argumentação suficiente com vista ao enquadramento jurídico de tais factos, nomeadamente o parentesco estrutural entre a situação dos autos e o contrato para pessoa a nomear, que sabidamente produz efeitos retroactivos, a assunção de direitos e obrigações, o princípio da liberdade contratual para justificar que a situação contratual definida não se enquadra em qualquer modelo contratual típico, que em face deste princípio nada impede que um contrato produza os seus efeitos tanto em relação ao contraente originário como relativamente a futuros intervenientes, nomeadamente a pessoa nomeada, e invoca o princípio da boa fé.
g) Se a 4ª Ré assume retroactivamente, por qualquer meio, os direitos e as obrigações resultantes para as 1ª a 3ª Rés dos contratos iniciais, assume quer o dever de cumprir essas obrigações em espécie, executando o acordado, quer de as cumprir em sucedâneo, por via de uma indemnização, mormente se o faz conhecedora de todo o processo negocial, que apenas o fazia em decorrência da violação do contrato que estas haviam celebrado com aquela.
h) A 4ª Ré tem, pois, legitimidade passiva para a presente causa em que é parte da relação material controvertida tal como esta é configurada pela Autora, pelo que decidindo de outro modo a decisão recorrida violou o disposto no art. 58º do CPC.
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A 4ª Ré (E) respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 1329 a 1336 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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(2) Do despacho de 15/12/2021:
A. A contradita não tem por objecto “factos relevantes para o exame e decisão da causa” (art. 433º do CPC), mas sobre “qualquer circunstância capaz de abalar a credibilidade do depoimento” da testemunha. (art. 543º do CPC).
B. O meio de prova do art. 455º do CPC só é admitido “se os factos que a parte pretende provar tiverem interesse para a decisão da causa”, isto é, se forem “factos relevantes para o exame e decisão da causa” (art. 433º do CPC).
C. Tal resulta, ainda, dos arts. 442º/2 do CPC e 337º/2 do CC, o qual se refere à “prova dos factos constitutivos do direito alegado” (art. 335º/1 do CC).
D. O meio de prova em causa não se aplica à prova de “qualquer circunstância capaz de abalar a credibilidade do depoimento” (art. 543º do CPC), mas à prova de “factos relevantes para o exame e decisão da causa” (art. 433º do CPC).
E. Tal decorre do art. 544º/2 do CPC, o qual determina que “a parte [que deduziu a contradita] pode comprová-la por documentos ou testemunhas, notando o nº 3 que “os documentos podem ser oferecidos (...)” pela requerente.
F. Os meios de prova delineados no art. 544º/2 são taxativos confirmam o que resulta das normas previamente citadas: os arts. 433º e 455º do CPC respeitam somente a factos que constituem a causa de pedir na acção.
G. A contradita é um incidente contra a testemunha, não contra a parte contrária. De facto, as testemunhas não são “das partes”, mas por elas arroladas.
H. Pelos motivos supra, ordenar a exibição do livro de registo de acções viola as supra citadas normas do CPC.
I. Acresce que era na prática impossível revelar parte dos nomes dos accionistas sem que tal revelasse a identidade de quem é accionista da autora e de quem não é.
J. O despacho recorrido tinha duas finalidades cumulativas: (i) permitir saber se as testemunhas eram accionistas da autora; (ii) não permitir que as rés soubessem que eram os accionistas da autora. Sucede, porém, que a segunda finalidade era de realização prática impossível.
K. Para além de as rés não gozarem do direito de pedir esta prova, tratar-se, caso dele beneficiassem, de um abuso de direito (art. 326º do CC), em vista da conduta das partes nestes autos, em processos nos EUA e do fim que pretendem visar com o requerimento de prova: saber quem são os accionistas da autora e não saber se as testemunhas são accionistas da autora (o que a sugestão da autora permitira determinar).
L. Caso as rés beneficiassem desse direito probatória, estaríamos, ainda, perante uma colisão de direitos (art. 327º do CC), devendo prevalecer o que em concreto se deva considerar superior, a não violação de dados pessoais e informação pessoal de terceiros, que não são parte nesta acção.
M. Desta forma, seria ainda violado os princípios da proporcionalidade e da protecção da privacidade da terceiros, até porque a contradita não assenta em razões de objectivas de suspeita e fundamentos suficientes que justifiquem fazer uso do meio de prova previsto no art. 455º do CPC (se o mesmo fosse admissível - e não é).
N. Por fim, e antes de mais, o Tribunal deverá fixar ao recurso efeito suspensivo, nos termos do art. 607º/3 do CPC.
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As 1ª a 3ª Rés (B) (C) e (D) responderam à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 10898 a 10912 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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(3) Da sentença de 28/04/2022:
1. O Acórdão que decidiu da matéria de facto considerou provadas questões que eram matéria de direito. O TSI deverá fazer essa distinção e ignorar, enquanto tal, factos tidos como provados no Acórdão que são matéria de direito.
2. Resultou do decurso da acção que:
a. As rés estavam adstritas ao cumprimento de obrigações vinculativas;
b. As rés incumpriram e violaram essas obrigações;
c. O contrato estava em vigor no momento do incumprimento;
d. A autora teria obtido uma concessão (com as rés).
e. A autora sofreu danos calculados nos relatórios dos seus dois técnicos.
3. Subsidiariamente, para o caso de se entender que não houve incumprimento contratual, haveria sempre responsabilidade civil das rés perante a autora por
a. Violação dos direitos de autor da autora, por cópia flagrante e uso de um direito intelectual da autora: a proposta de adjudicação a concurso.
4. Nestes autos, o incumprimento está provado. Assim, restaria demonstrar que:
a. Havia contrato vinculativo à data do incumprimento; e
b. O incumprimento causou danos à autora.
Ambas foram provadas (matéria de facto) e demonstradas (matéria de direito).
Questão Prévia 1: documento das rés falsificado
5. As rés entregaram à Comissão do Concurso um documento falsificado (fls. 10189 e ss.): documento de fls. 296 (ou 10213), por confronto com o documento de fls. 10212. As rés não negaram ou impugnaram tal alegação. O documento falsificado corresponde ao documento através do qual o futuro da história de Macau se alterou: o documento de associação da (E) à (F).
Questão Prévia 2: Lista de Testemunhas e sua Caraterização Processual
6. Prestaram depoimento, oral ou escrito, 21 testemunhas. Dessas 21, cinco (5) foram irrelevantes: (T1), (T3), (T5), (T6), (T7). Das restantes 16, (T8) e (T9) em particular pouco disseram. Das 16 testemunhas relevantes, oito (8) prestaram depoimento em audiência, oito (8) prestaram por escrito ou carta rogatória.
7. O Tribunal deverá analisar os depoimentos das testemunhas tendo em atenção a ligação da maior parte delas às rés e o interesse que revelaram em proteger as rés, apresentando-se voluntariamente. Alguns testemunhos foram dolorosamente parciais em favor das rés, de que se destacam os de (T10) e (T11). Ainda assim, a autora fez prova de todos os factos de relevo que se propunha provar.
Questão Prévia 3: Efeitos processuais de documentos juntos pelas rés
8. As rés juntaram inúmeros documentos que contêm informação favorável à autora e que vieram depois tentar negar mais tarde. Documentos apresentados pelas rés fazem prova contra ela se não fizerem qualquer reserva, como sucedeu relativamente a todos os documentos que juntaram. Assim, todos os documentos que as rés pode e deve ser usado contra elas se depuserem nesse sentido: arts. 326º, 344º, 359º, 368º, 370º, 387º/2 e 399º do CC e arts. 5º, 9º, 471º, 472º e 562º/2 do CPC.
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
9. O Tribunal recorrido considerou matéria de facto, tópicos que a recorrente entende constituírem matéria de direito ou implicarem juízos de direito relevantes. Assim, sem prejuízo de entender que alguns dos quesitos não contêm matéria de facto, mas de direito (como referido nas alegações), irá usar a linguagem de “prova” dos quesitos, apesar de que nalguns casos – como alertado nas alegações – deveria usar-se antes a linguagem de “demonstração” por implicarem matéria de direito.
10. Assim, e considerando a ressalva constante da conclusão anterior, alega-se, em sede de impugnação da matéria de facto, que o TSI deverá alterar a matéria de facto dada como provada no Acórdão e Sentença recorridos nos termos seguintes:
a. O Tribunal deve dar como provados, na íntegra, com o teor com que foram quesitados, os seguintes factos (uns dados como não provados, outros só dados como parcialmente provados pelo Tribunal recorrido): Quesitos 1, 2, 3, 4, 6, 7, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 17, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 52, 54, 58, 61.
b. Os Quesitos 48 a 50, 53, 66, 67 e 70 não deverão ser dados como provados.
c. O Quesito 5 deverá ser dado como provado com o seguinte teor: “A Autora e as 1ª a 3ª Rés acordaram não praticar, directa ou indirectamente, qualquer acto que possa ter reflexos negativos na contraparte, nos termos consignados na cláusula 2(C) da carta referida na al. E dos Factos Assentes”.
d. O Quesito 8 deverá ser dado como provado com o seguinte teor: “Consta da carta referida em E) dos Factos Assentes que qualquer Parte pode pôr termo à carta, mediante notificação escrita remetida à outra Parte se os Contratos Definitivos não forem celebrados até 15 de Novembro de 2001, resultando da mesma que tal notificação resolutiva unilateral só pode ser enviada após 15 de Novembro de 2001”.
e. O Quesito 15 deverá ser dado como provado com o seguinte teor: “(T8) e (T10) participaram, como representantes do Grupo (C*), incluindo da 1ª a 3ª rés, na apresentação da candidatura que teve lugar no dia 4 de Janeiro de 2002 e a que respeita o documento nº 6 junto com a petição inicial”.
f. O Quesito 16 deverá ser dado como provado com o seguinte teor: “Em Janeiro de 2002, antes ainda do dia 15, iniciaram-se negociações entre as Rés e a Autora para prorrogação da carta-contrato referida na al. E dos Factos Assentes”.
g. Os Quesitos 18 e 18-A deverão ser conjuntamente dados como provados com o seguinte teor: “Autora foi convocada pela Comissão do Concurso a nova consulta, a qual teve lugar em 15 de Janeiro de 2002, pelas 17:30 horas, tendo a apresentação sido conduzida por (T8), representante da autora e do Grupo (C*) (incluindo das rés)”.
h. O Quesito 19-A deverá ser dado como provado com o seguinte teor: “Foi em representação das rés que, em 25/01/2002, (T8) enviou à autora o fax referido na alínea GG) dos factos assentes”.
i. O Quesito 39 deverá ser dado como provado como foi quesitado, acrescentando-se a seguinte frase no seu final (como provada): “A 4ª ré manteve a sua actividade durante o período da concessão”.
j. O Quesito 40 tornou-se irrelevante para a decisão da causa pelo facto de a acção não ter sido decidida antes do final do prazo da concessão.
k. Quanto aos Quesitos 41 e 44, deve ser dado como provado que (T8) e (T10) eram representantes das três rés, em nome das quais actuavam.
l. O Quesito 43 deverá ser dado como provado com o seguinte teor: “A “(E)” constituía o Grupo (C*)”.
m. O Quesito 69 deverá ser dado como provado, apagando-se a palavra “Sempre”, que não dever ser tido por provada.
CAPÍTULO I: AS TRÊS (3) RÉS SÃO RESPONSÁVEIS
11. O Tribunal deve determinar que as três rés estavam vinculadas contratualmente perante a autora e não somente a 1ª ré, e que cada referência num documento a uma das rés deve ser entendida como se referindo às três rés e ao Grupo (C*), como resulta dos Factos Assentes e dos Quesitos provados tal como pugnado pela recorrente na impugnação da matéria de facto. Como tal, o TSI deve julgar as três rés responsáveis perante a autora na mesma medida em que a 1ª ré o é.
12. (T8) e (T10) eram também representantes das 2ª e 3ª rés, e não só da 1ª ré, pelo que a sua assinatura e conduta também as vinculava.
CAPÍTULO II: RELAÇÃO CONTRATUAL VINCULATIVA
13. A discussão sobre se A (G), toda ela, em si, tem ou não natureza vinculativa é de relevância subsidiária para esta acção. O que interessa determinar para a decisão da causa é se as cláusulas que a autora acusa as rés de terem violado são ou não vinculativas. Basta a violação de uma única obrigação contratual para que exista incumprimento e obrigação de indemnizar.
14. A (G) constitui, quanto ao conteúdo e objecto, um contrato de consórcio (arts. 528º e 529º/a) e b) do Cód. Comercial).
15. A (G) tinha duas finalidades ou segmentos: (i) obtenção e (ii) exploração de uma concessão de jogo, sendo a primeira condição da segunda (fls. 53, 1º parág., e 1112): “obtain a gaming license”; “develop and operate a casino, hotel and related resorts”. A (G) cobria dois períodos e duas actividades e, logo, dois conjuntos distintos de obrigações contratuais; (i) o período do concurso e as actividades relativas à obtenção de uma concessão; (ii) o período e a actividade de exploração da concessão a obter pela (H).
16. O segundo segmento não chegou a acorrer por facto imputável às rés, que se separaram da autora e se apresentaram a concurso, com uma proposta de adjudicação idêntica à da autora, associadas a uma sua concorrente (art. 790º CC). Do incumprimento (art. 787º CC) do primeiro segmento resultou a impossibilidade culposa da prestação (art. 790º CC) do segundo por causa imputável às rés.
17. Uma vez que a não prestação do segundo segmento é consequência inevitável do incumprimento do primeiro, bastará demonstrar o incumprimento do primeiro segmento para ficar demonstrado que a impossibilidade de prestação do segundo é culposa e imputável às rés. Serão assim ambos os incumprimentos (dos dois segmentos) imputáveis às rés.
18. Assim, o que está primeiramente em causa nesta acção é o primeiro segmento: violação dos deveres ou obrigações relativas ao concurso para obtenção de uma concessão pela autora (associada às rés) e respeitantes ao período do concurso até à adjudicação provisória (em 8-Fevereiro-2002).
19. Por outro lado, não está primeiramente em causa nestes autos um pedido de indemnização por resolução, denúncia ou revogação unilateral ilícitas da (G), pelas rés, por via da carta expedida em 6-Fevereiro-2002. O término do vínculo (cláusula 13G) poderá constituir uma denúncia, revogação unilateral ou resolução. Os efeitos desta são diferentes dos das duas primeiras, pois aquelas são livres e não necessitam (geralmente) de causa justificativa lícita (ainda que possam estar sujeitas a condição), enquanto a segunda depende de obediência à lei ou do contrato (art. 426º/1 CC).
20. Porém, a questão de saber se a carta de 6-Fevereiro-2002 (denúncia, revogação unilateral ou resolução) constitui um acto lícito ou ilícito, violador ele mesmo de obrigações contratuais e/ou legais e gerador de responsabilidade civil é somente subsidiária, porque as rés violaram a relação contratual com a autora enquanto ela estava em vigor.
a. Ou seja, estando o contrato em vigor no momento do incumprimento, estamos perante o incumprimento de um contrato (parcialmente) vinculativo e vigente, não sendo necessário discutir se a sua dissolução em data posterior foi ilícita, pois a violação ocorreu quando estava plenamente em vigor e a produzir os seus efeitos vinculativos.
b. De qualquer modo, alega-se subsidiariamente que o contrato foi ilicitamente dissolvido pelas rés pela carta de 6-Fevereiro-2002.
21. A vinculação contratual mútua das partes resulta da (G) e de outras fontes (outros actos jurídicos). A (G) é um acordo entre as partes, cujo teor foi dado como provado no Facto Assente E. Algumas das suas cláusulas são vinculativas, outras não são vinculativas. A autora assenta a sua acção de responsabilidade civil no incumprimento pelas rés de cláusulas contratuais que a (G) declara expressamente serem vinculativas (para além de obrigações derivadas de outras fontes).
22. A Sentença recorrida conseguiu um feito pouco usual: considerar não vinculativa(s) cláusula(s) que a (G) declara serem expressamente vinculativa(s) e considerar vinculativa(s) cláusula(s) que a (G) declara expressamente não vinculativa(s). As cláusulas relevantes da (G) são as seguintes (Facto Assente E): Introdução; Cláusulas 2(C) [erro de escrita], 9, 10, 13(E), 13(F) e 13(H) e últimos parágrafos (determinando que a proposta das rés foi aceite e quais as cláusulas vinculativas e não vinculativas). A referência no Intróito à cláusula 1C é lapso, sendo, antes, notoriamente, uma referência à cláusula 2C.
23. Um dos efeitos jurídicos que resultará de meras cláusulas de intenções (que não incluem as Cláusulas 2(C), 9, 10, 13(E), 13(F) e 13(H), que são vinculativas) será a de estabelecer o quadro de “obrigações” mútuas que as partes estão dispostas a assumir entre si e que deverão ser tidas como assumidas por conduta – escrita ou comportamental – em que as partes revelem vontade de se vincular ou criem na parte contrária essa expectativa nos termos do art. 228º/1 do CC. Esta vinculação não será necessariamente na sua globalidade, devendo a vinculação mútua resultar da conduta das partes, podendo essa conduta revelar adesão volitiva a umas cláusulas, mas não a outras.
a. Outro dos efeitos jurídicos será como quadro interpretativo dos actos de vontade das partes, devendo as cláusulas não vinculativas da (G) servir de referência interpretativa para actos potencialmente vinculativos futuros que as partes venham a adoptar.
24. As cláusulas 2C, 10 e 13H não são meras cláusulas de intenções, mas cláusulas expressamente tidas pelas partes como vinculativas.
25. As obrigações referidas nas alíneas b) a h) da Conclusão 88 são vinculativas nos termos expressamente determinados na (G). A “obrigação” constante da alínea a) não é vinculativa nos termos expressamente determinados na (G) (porém, esta obrigação tornou-se vinculativa por via de outras fontes).
a. Que algumas cláusulas seriam necessariamente vinculativas resulta desde logo da Cláusula 13G, a qual refere se a (G) for denunciada ou resolvida (“terminated”), “this letter shall no force and effect and the Parties shall have no further obligations hereunder or liability”.
26. Nos termos do art. 391º CC, “Obrigação é o vínculo jurídico por virtude do qual uma pessoa fica adstrita para com outra à realização de uma prestação”, sendo as rés responsáveis nos termos dos arts. 477º, 787º, 790º (477º e 556º) do CC.
27. Existem as seguintes outras fontes autónomas de obrigações (para além da (G)), umas confirmam, outras acrescentam ao que resulta da (G):
a. Proposta de Adjudicação da 7-Dezembro-2001 (fls. 62-192);
b. Carta à Comissão do Concurso de 20-Dezembro-2020 (fls. 2640);
c. Declaration of Relationship de 17-Dezembro-2001 (fls. 2607-12 e 9114-17);
d. Comunicações escritas entre as partes e com a Comissão do Concurso (fls. ).
28. Autora e rés ficaram vinculadas entre si pelo conteúdo da Proposta de Adjudicação apresentada à Comissão, a qual é fonte obrigações mútuas entre autora e rés. A Proposta de Adjudicação constitui (i) um acordo das partes, (ii) de natureza vinculativa, sendo o primeiro acto jurídico expresso de onde resulta que a obrigação (a) elencada na Conclusão 88.a) se tornou vinculativa: Realizar os melhores esforços para a obtenção de uma concessão, mantendo-se em associação com a autora até final do concurso (Cláusula 2B da (G), entre outras).
29. O facto de a Proposta de Adjudicação não estar assinada pelas rés não afecta a vinculabilidade, pois as rés alegam ter escrito a Proposta, terem elas mesmo entregue a Proposta à Comissão do Concurso, terem feito a sua defesa duas vezes junto da Comissão de Concurso e assumido que a Proposta também era sua, que constituem actos tácitos de aceitação da força jurídica da proposta de adjudicação. Tratou-se tão só de seguir os termos dos arts. 54º/2 e 3, 61º/3 e 4 do RA nº 26/2001.
30. A reprodução pela Proposta de Adjudicação do essencial da carta de intenções, omitindo que a mesma não é vinculativa, nem está sujeita a qualquer prazo, revela que as partes quiseram estabelecer que tais obrigações e responsabilidades eram vinculativas e não sujeitas a qualquer termo. Tal revela que as partes modificaram os termos da (G) na Proposta de Adjudicação: Transcreveram as obrigações e responsabilidades das partes que já constavam da (G): não transcreveram intencionalmente para a Proposta dois limites das “obrigações” e “responsabilidades”: que as não eram vinculativas e que (G) referia dois prazos.
31. Uma vez que uma obrigação é um vínculo jurídico (art. 391º CC) e que a violação ou não cumprimento da obrigação gera responsabilidade (arts. 477º, 787º e 790º CC), a não inclusão de uma cláusula de excepção afirmando a não vinculatividade dessas obrigações tem o efeito de lhes atribuir a vinculatividade que resulta do art. 391º CC. Tal resultava ainda do contexto legal, designadamente do Regulamento Administrativo (“RA”) nº 26/2001: Art. 28º/1-4) e 2-4 do RA 26/2001.
32. Que relação contratual passou a ser configurada também pelo teor vinculativo da Proposta de Adjudicação resulta da Carta de 20-Dezembro-2001 (fls. 2640), que afirma que a relação das partes passou a ser governada por dois documentos: a “Letter o Intent” e a “Tender” (e não só pela (G)): “as set forth in the Tender”; “as amended above”. O carácter mutuamente vinculativo da Proposta de Adjudicação resulta, ele próprio, acrescidamente, de acto tácito e de contratação resultante de acto concludente.
33. A Proposta constitui um acto jurídico que produz, consequentemente, efeitos jurídicos. No caso, revelava, designadamente, que as rés actuariam como sociedade gestora da autora, nos termos do Regulamento Administrativo nº 26/2001, o qual implica a existência de um vínculo contratual durante o período do concurso. E caberá aplicar o art. 228º/1 CC, quer quanto à Proposta de Adjudicação, quer quanto aos actos tácitos que confirmam a natureza jurídica vinculativa da Proposta de Adjudicação e, em geral, da relação autora-rés.
34. Da carta de 20-Dezembro-2001 resultam efeitos vinculativos autónomos do facto de tornar vinculativa a Proposta de Adjudicação: esta carta torna a relação das partes vinculativa por duas vias distintas: (i) por confirmar que a Proposta é vinculativa; (ii) por conter texto adicional que confirma, de qualquer modo, que as partes estavam entre si contratualmente vinculadas.
35. Três dias antes de ser assinada a carta de 20-Dezembro-2001 (fls. 2640), (T10) assinou uma Declaration of Relationship (fls. 2607-12) em nome das rés, reconhecida por notário público (assinatura a fls. 9114-117), que não foi entregue à Comissão pelos representantes das rés. A autora também assinou essa Declaração.
36. Ainda que só tivesse sido assinada pelas rés, tratando-se de uma “Declaration of Relationship”, e não de um contrato entre as partes, tem relevância interpretativa de outros actos e comportamentos das partes.
a. Das obrigações identificadas na Conclusão 88, excepto a “obrigação” (a), resultam já expressamente da (G). Os principais contributos deste documento é tornar vinculativa uma “obrigação” que já constava da (G) mas ainda sem força vinculativa, quer constante do intróito (fls. 53), quer das suas cláusula 2B, 3 e 4 (fls. 54): a obrigação de realizar os melhores esforços para a obtenção de uma concessão, mantendo a associação com a autora até final do concurso.
b. Confirma-se aqui (“upon (H*) being granted the concession”) que os contratos definitivos só seriam celebrado após obtenção da concessão, como já resultava da (G). Não se tratava de uma “obrigação” a cumprir durante o período do concurso. Este erro da Sentença recorrida deve ser corrigido pelo TSI.
37. As cláusulas 2C, 10 e 13 foram vinculativas desde 18-Outrubro-2001 (G); o intróito e as cláusulas 2 (2B em particular, excepto a 2C), 3 e 4 da (G) tornaram-se vinculativas a partir de 7-Dezembro-2001 por virtude da Proposta de Adjudicação, em particular.
a. Enquanto um contrato, como a (G), visam estabelecer efeitos para o futuro (com base em termos contratuais que não existiam antes da (G)); a Declaration of Relationship visa esclarecer a relação existente entre as partes à Comissão de Concurso, referindo-se, pois, ao passado. A Declaration of Relationship não é um contrato: é uma declaração destinada a esclarecer qual a relação contratual existente entre as partes. Por esse motivo, tem óbvia relevância interpretativa da relação contratual estabelecida entre a autora e as rés, para efeitos, designadamente, do art. 228º/1 do CC. Deste documento resulta claro que a relação entre as partes era uma relação juridicamente vinculativa.
38. A (G), por um lado, e os documentos referidos supra, por outro, são fonte de obrigações jurídicas vinculativas entre autora e rés. E são, não só fontes autónomas de juridicidade, como fontes que se confirmam entre si e formam um todo vinculativo entre autora e rés. A elas há que acrescentar uma outra fonte de juridicidade vinculativa: as condutas das partes que constituem acto tácito que gera obrigações jurídicas vinculativas entre as partes de forma absolutamente inequívoca, nos termos do art. 209º/1 CC e do art. 565º do Cód. Comercial: “as partes ficam vinculadas pelos usos em que consentirem e pelas práticas que entre elas se estabelecerem.” As declarações tácitas e expressas têm o mesmo valor jurídico.
39. O concurso de jogo obrigava a um vínculo entre a concorrente e a sociedade gestora proposta: Art. 28º/1-4) e 2/4 do RA 26/2001 (ver, ainda, art. 5º do CC). Está provado nos autos que as rés participaram no concurso de jogo, não como concorrentes, mas como entidade gestora e a autora como concorrente. Assim, por virtude do Art. 28º/1-4) e 2/4 do RA 26/2001, a mera participação das rés no concurso em conjunto com a autora, incluindo nas consultas e reuniões da Comissão do Concurso, implicava aceitação desse vínculo jurídico entre concorrente e sociedade gestora, ou seja, entre autora e rés, nos termos dos arts. 209º/1 e 565º citados supra.
40. As partes continuaram tacitamente em relação jurídica, participando no concurso de jogo nos termos constantes da (G) e demais fontes das obrigações entre as partes, tendo mantido (ou renovado) tacitamente a sua relação contratual.
41. A Carta de 3-Jan-2002 à Comissão de Jogo de Nevada: (I) e (C*) “through a newly formed (J) Company, (E), LLC (“(E*)”), will participate as a shareholder of (H*)” (linguagem de vinculação) constitui nova demonstração da vinculação das rés perante a autora.
42. Sinal da vinculação foi ainda o facto de (T8) e (T10) se terem tornado em Dezembro administradores da Autora desde 05/12/2001, com poderes para vincular a autora, um até Novembro de 2004, outro até Novembro de 2005.
CAPÍTULO III: RELAÇÃO CONTRATUAL ATÉ 6-FEV-2002
43. Dos Factos Assentes e dos Quesitos que deverão ser dados como provados tal como pugnado pela recorrente na impugnação da matéria de facto, ficou plenamente demonstrado nos autos que a relação só terminou quando as rés comunicaram à autora o término da relação contratual (que consubstancia a natureza de denúncia, revogação unilateral ou resolução). Essa comunicação foi enviada no dia 06/02/2002, pelo que até lá as obrigações derivadas da relação contratual entre as rés e a autora se mantinham vinculativas, cujo incumprimento gera responsabilidade civil e obrigação de indemnizar.
44. Cláusula 13G da (G) não é vinculativa.
45. É tudo menos claro que a cláusula 13G preveja uma denúncia (ou revogação unilateral) e não uma resolução. Não sendo vinculativa, o contrato deveria ser “pontualmente cumprido” pelas rés (art. 400º/1 CC) e só o poderiam extinguir por resolução nos termos da lei: art. 426º/1 CC, pois a (G) não confere às rés o direito potestativo de o terminar, nem à autora a sujeição que resulta da atribuição desse direito à contraparte. Ao considerar esta cláusula vinculativa o Tribunal recorrido errou.
46. Mesmo que a cláusula fosse vinculativa (e não é), ela não dispõe que a (G) expira ou caduca em 15 de Novembro. Ela estabelece que partes “podem” terminá-la (denunciar ou resolver) através de uma interpelação (“upon written notice”) entregue à outra parte se os contratos definitivos não forem celebrados até 15-Janeiro-2002 e que “thereafter” – ou seja, “a partir dessa data” – A (G) não produzirá efeitos. A palavra “expirar” só aparece uma única vez num único local da (G): nos parágrafos finais a propósito da aceitação da proposta contratual das rés.
47. A data em que a (G) deixa de produzir efeitos é a data em que a interpelação for recebida pela outra parte. A data de 15-Janeiro-2002 constitui a data em que uma condição suspensiva opera, pois a denúncia é um “negócio jurídico unilateral receptício” (Ac. do TSI nº 297/2016, de 12.Set.2019), ou seja, que só se torna eficaz quando recebido pela parte contrária.
48. Fica, assim, patente que: (i) Não se trata de uma caducidade ou extinção por efeito do tempo; (ii) Trata-se de uma denúncia, revogação unilateral ou resolução por acto unilateral de vontade; (iii) O exercício desse acto de denúncia está sujeito a uma condição suspensiva, só podendo ocorrer em data posterior a 15-Jan-2002, por constituir um negócio jurídico unilateral receptício: art. 263º CC.
a. As rés só poderiam denunciar a (G) após 15-Janeiro-2002 e somente no caso de os contratos definitivos (i) não terem sido celebrados até essa data e – acrescente-se – (ii) se fosse o caso de deverem e poderem ter sido celebrados até essa data. Só havia obrigação de celebração dos contratos definitivos após obtenção de uma concessão pela autora: (G), cláusulas 6 e 7; “upon (H*) being granted the concession” (Declaration of Relationship, cláusula D (fls. 2608-9).
b. O devedor sob condição suspensiva (no caso, as rés) obriga-se “a abster-se de quaisquer comportamentos que prejudiquem a integridade do direito”, o que constitui decorrência do disposto no art. 265º do CC. As rés, porém, agiram de má-fé durante a pendência da condição suspensiva, por todas as razões que estão na base do incumprimento da relação contratual.
49. A celebração dos acordos definitivos não constituía uma obrigação, pois não era vinculativa (cláusula 12, cláusula 2, proémio, cláusulas 3D, 5 e 7, cláusula 3ª do aditamento). Se a autora não tinha a obrigação de celebrar os contratos definitivos, não podem fluir da sua não celebração efeitos jurídicos que se produzam na esfera jurídica da autora.
50. Assim, (i) a cláusula 13G não era vinculativa; (ii) a cláusula 13G não era uma cláusula de caducidade; (iii) o direito de denúncia ou resolução constituía um acto de vontade que configura um direito potestativo; (iv) direito esse que só poderia ser exercido após 15-Janeiro-2002; (v) a celebração dos contratos definitivos não era vinculativa, não podendo da sua não celebração fluir quaisquer efeitos jurídicos que possam ser usados contra a autora.
51. As rés ainda estavam a trabalhar no definitive agreements em 26/01/2002 (fls. 3030, linha de 25/01/2002 e anteriores), de modo que tal não celebração não poderia ser imputada à autora. E nunca os definitive agreements chegaram sequer a ser negociados, contrariamente ao que as rés falsamente alegaram nos autos acusando a (H*) de os não ter aceite.
52. O Tribunal recorrido cometeu o erro de procurar tornar um modo contratual de extinção do contrato dependente de declaração unilateral de vontade (cláusula 13G) num modo automático de extinção (caducidade), que não existe na (G).
53. A cláusula 10 é vinculativa (diferentemente da cláusula 13G). E tem um prazo. Porém, não tem nada que ver com a vigência da (G): resulta explicitamente do seu teor tem somente que ver com o dever de não negociar com terceiros; não estabelece qualquer prazo de vigência do contrato. A cláusula sobre a cessação de vigência do contrato é a cláusula 13G, não a cláusula 10.
54. Acresce que, de qualquer modo, a cláusula 10 não ajuda a tese sufragada pelo Tribunal e pelas rés. Esta cláusula estabelece: “until the earlier of November 15, 2001, or termination of negotiations upon written notice”. O segundo segmento da frase respeita ao caso de as negociações terminarem após 15 de Novembro (que passou a 15 de Janeiro com a renovação da (G)). Por isso surge em segundo lugar, após “November 15”. A finalidade da norma é clara: enquanto estiver a decorrer negociações entre as partes, a cláusula mantém-se eficaz.
55. As rés só poderiam negociar exclusivamente com a autora enquanto as negociações estivessem pendentes: as negociações estiveram pendentes desde antes de dia 15-Janeiro-2002 (o que não é controverso) até à recepção da carta de 6-Fevereiro-2002.
a. Logo, durante esse período – não só a (G) se mantinha em vigor (dado que a cláusula 10 nada tem que ver com a extinção do contrato), como – as rés só podiam negociar com a autora. Entre 15-Janeiro-2002 e 6-Fevereiro-2002 as rés violaram a cláusula 10 do contrato ao negociarem com a (F).
56. Mesmo que as partes só tivessem usado a (G) para estabelecer a sua relação contratual (e outros documentos e condutas são fonte de obrigações contratuais para além da (G)), (i) o Tribunal não poderia aplicar às cláusulas 2(C) e 13(H) o regime de prazo da cláusula 10: pois esta respeita somente às obrigações descritas na própria cláusula 10, não no respeitante às restantes cláusulas do contrato, (ii) nem poderia interpretar esta cláusula com base num princípio de má-fé, restringindo o seu sentido a uma “notice” de término de negociações anterior ao prazo de 15 de Janeiro.
57. O argumento do abuso de direito é usado, sempre, como argumento a título subsidiário nestas alegações.
58. No caso de denúncia ao abrigo da cláusula 13G, ou ao abrigo das cláusulas 13G e 10 (uma não vinculativa, a outra não incidente sobre a cessão da vigência do contrato), as rés não poderiam ter posto fim ao contrato sem dar um aviso prévio à autora. Porém, as rés denunciaram o contrato por carta de 06/02/2002 sem dar aviso prévio, o que constitui violação do dever de agir de boa fé, nos termos da doutrina e jurisprudência consensuais (art. 7º/3 do CC).
59. As rés, cientes da situação de dependência da autora face às rés em matéria de experiência na gestão do jogo e proposta de adjudicação, teria de ter dado aviso prévio com um prazo razoável que lhe permitisse em tempo útil: (i) encontrar uma empresa gestora com experiência na exploração do jogo; (ii) elaborar uma proposta de adjudicação cuja execução estivesse dependente de uma associação à (E).
a. As rés, porém, não deram aviso prévio, tendo denunciado o contrato no final do concurso – por carta e fax enviados no dia 6-Fevereiro.
b. A violação do dever do art. 752º/2 existe mesmo que não houvesse abuso de direito, pois constitui um dever das rés resultante de lei imperativa, tornando ilícita a denúncia (independentemente de esta ser ilícita também por outros motivos) e, logo, fazendo as rés incorrer em incumprimento definitivo do contrato.
c. Acresce que, para além da violação referida na Conclusão anterior, as rés agiram em abuso de direito (se tivessem o direito de denúncia), pois estimularam a autora a investir na associação cooperante com as rés para, sem lhe conceder prazo razoável para encontrar alternativa, destruíram a possibilidade de a autora obter uma concessão, tendo por isso ficado classificada em último lugar.
60. Nos termos da doutrina, durante o período de aviso prévio:
a. O contrato denunciado equipara se a um contrato com termo certo;
b. As partes sabem que o mesmo cessa em determinada data, podendo organizar a sua actividade em vista da cessação do vínculo que a denúncia implica;
c. As partes continuam adstritas a realizar as suas prestações;
d. E continuam adstritas a fazê-lo de boa fé.
61. A conduta das rés constitui violação do dever de boa fé e abuso de direito, previstos nos arts. 326º e 752º/2 do CC, e incumprimento contratual derivado de violação de normas legais imperativas, consubstanciado (i) no dever de boa fé e, subsidiariamente, (ii) no dever de não agir em abuso de direito. Trata-se, ainda, de uma conduta que viola as regras ético-jurídicas dominantes na sociedade de Macau.
62. (T8) e (T10), representantes das rés, eram administradores da autora, mas violaram os seus deveres fiduciários praticando factos subsumíveis no crime de infidelidade.
63. A data de 15-Janeiro-2002 consta da renovação do contrato (G) pelo facto de que, aquando da data de renovação, estava previsto que o concurso terminasse antes de 31-Dezembro-2001, pelo que autora e rés tinham a intenção de estabelecer um prazo que terminasse em data posterior ao término do concurso. Tal é fundamental para efeitos de interpretação do contrato (G), demonstrando que intenção comum das partes foi a de se manterem vinculadas até ao final do concurso.
64. De qualquer modo, a (G) foi renovada. Foi-o por carta de 7-Fevereiro-2002 (fls. 298). E havia-o sido antes verbalmente.
65. Acresce que, caso o contrato não se mantivesse em vigor após 15-Janeiro-2002 e não se tivesse renovado, ter-se-ia sempre renovado tacitamente e por conduta concludente, pela conduta das rés durante o concurso (acima descrita), quer perante a Comissão, quer perante a autora, entre 15-Janeiro-2002 e 6-Fevereiro-2002.
66. Aliás, mesmo que o contrato tivesse caducado em 15-Janeiro-2002 (em contradição frontal com o que ele estipula), a renovação tácita é algo que resulta da lei, doutrina e jurisprudência. Foi isso que sucedeu nestes autos, pelos factos referidos no ponto 646 das alegações.
67. Tal constitui um caso típico de continuação de execução pelas rés das prestações do contrato de consórcio a que se obrigou perante a autora: colaborar na obtenção de uma concessão, em nome da autora, com as rés como gestora. Ou seja, o contrato ter-se-ia renovado em virtude da conduta das rés.
68. A mera manutenção das rés no concurso com a autora é, por si só, manifestação da manutenção da relação contratual, quer por tal constituir acto tácito, quer porque neste caso o silêncio valeria como declaração negocial (art. 210º do CC). Porém, mais do que manter-se no concurso (silêncio), as rés praticaram diversos actos de participação activa no mesmo que valem como declarações negociais tácitas.
69. Nos termos do Art. 59º/1 RA 26/2001: “A proposta de adjudicação é o documento pelo qual a concorrente manifesta ao Governo a vontade de contratar e indica as condições em que se dispõe a fazê-lo.” E como denota a carta de 20/12/2001 (fls. 2640), a relação contratual das partes passou a ser regulada por dois documentos: a (G) e Proposta de Adjudicação, o que confirma que a relação das partes passou a estar também vinculada pela Proposta de Adjudicação. Ora, a Proposta de Adjudicação não tem qualquer data de término de vigência. Aliás, toda a linguagem da Proposta é, não só um vínculo até ao final do Concurso, mas um vínculo até ao final da Concessão.
70. As rés confessaram expressamente que se mantiveram associadas à autora até finais de Janeiro de 2002: fls. 5850, ponto 67; fls. 5949. E a autora aceitou a admissão expressamente: fls. 5949 (arts. 80º e 489º do CPC).
71. Que a relação contratual se manteve muito para além de 15/01/2002 e até Fevereiro de 2002, resulta ainda das cartas enviadas pelas rés a fls. 281, 296 e 296-97, na última das quais (8-Fev-2002) as rés confessam: our letter dated February 6, 2002 faxed to you on that date in which the (E) terminated the (G)”, a qual contém uma declaração confessória. Se a (G) tivesse expirado em 15-Janeiro-2002 como o Tribunal assevera, as rés nunca teriam enviado uma carta a denunciar a (G).
CAPÍTULO IV: PÓS-EFICÁCIA DAS OBRIGAÇÕES
72. Muitas obrigações contratuais sobreviveram à extinção do contrato. Assim, mesmo que o Tribunal recorrido estivesse certo – e não está – no sentido de o contrato se extinguiu em 15-Janeiro-2002, as rés continuariam adstritas a cumprir as obrigações vinculativas da (G) até ao final do concurso.
73. Trata-se da doutrina da pós-eficácia das obrigações (culpa post factum finito), da qual resulta “um dever lateral de conduta de lealdade, no sentido de que a boa-fé exige, segundo as circunstâncias, que os contratantes, depois do fim da relação contratual, omitam toda conduta mediante a qual a outra parte se veria despojada ou essencialmente reduzida das vantagens oferecidas pelo contrato”.
74. Se o contrato tivesse cessado a sua vigência em 15-Janeiro-2002 e as rés se tivessem separado da autora em 1-Fevereiro-2002 (como alegam), teriam o dever secundário ou lateral, resultante do princípio da boa fé, de prestar as informações referidas supra no ponto 671 das alegações.
75. As rés estavam adstritas, atentas as circunstâncias e a finalidade do contrato de consórcio (G) a cumprir deveres de boa fé (os quais se encontravam, aliás, eles mesmos, previstos na (G)) e que mantiveram a sua força vinculativos para com as partes mesmo após a (alegada) extinção da (G). Assim – e em consequência (i) do princípio da boa fé (art. 752º/2 do CC), (ii) das circunstâncias das partes descritas nestas alegações e (iii) da natureza e finalidade do contrato das partes (participação no concurso de jogo, obtenção de uma concessão e exploração, em conjunto, do jogos de fortuna ou azar em casino-resort) – as rés mantinham-se adstritas, mesmo após a cessação de vigência do contrato (G), a cumprir as seguintes obrigações plasmadas no contrato: Cláusulas 2C, 10 e 13H. Recorde-se que foram as rés quem redigiu a (G), como confessou (T10) (Q46, fls. 6893 e ss.).
76. O facto de os deveres laterais de boa fé resultantes de lei imperativa terem sido positivados no contrato, nem por isso perdem a sua normatividade imperativa resultante da lei (mesmo que não resultasse já do contrato). Outros deveres resultantes do princípio da boa fé, não previstos na (G), mantêm eficácia pós-contratual, como os do ponto 426 das alegações.
77. Assim, as rés estavam sujeitas à obrigação legal, derivada do art. 752º/2 do CC, de “[omitir] toda conduta mediante a qual a outra parte [autora] se veria despojada ou essencialmente reduzida das vantagens oferecidas pelo contrato”. Ora, tal foi o que sucedeu, tendo a autora ficado classificada em último lugar no concurso em consequência da conduta das rés pelos factos descritos nas alegações.
78. Ou seja, mesmo que a (G) tivesse cessado a sua vigência em 15-Janeiro-2002, as rés tinham deveres de lealdade para com a autora resultantes do princípio de boa fé que sobreviviam à cessão de vigência do contrato (alguns, aliás, plasmados no próprio contrato) que as rés violaram, em consequência do que a autora “se [viu] despojada ou essencialmente reduzida das vantagens oferecidas pelo contrato” com as rés.
79. Consequentemente, as rés são responsáveis perante a autora por incumprimento destes deveres, cuja violação constitui “um ilícito ainda contratual”, que constitui incumprimento e gera responsabilidade civil das rés, no valor pedido.
CAPÍTULO V: CÓPIA DA PROPOSTA DE ADJUDICAÇÃO DA (H*)
80. As rés usaram, no seu consórcio com a (F), uma proposta de adjudicação idêntica à da autora. Tal constitui, não só um acto de incumprimento do contrato (G), incumprimento dos deveres acessórios e deveres laterais de lealdade derivados do princípio da boa fé, como uma violação do direito de autor (DL nº 43/99/M).
81. A “expression of interest” foi expressamente absorvida na própria (G) e, portanto, tornou-se um elemento da relação consorcial, pertencendo a ambas as partes. De resto, trata-se não só de um documento distinto da proposta de adjudicação da autora, como não releva para a questão da titularidade da proposta de adjudicação.
82. A titularidade ou co-titularidade da proposta de adjudicação era da autora. As rés partilharam e entregaram o seu conteúdo à (F) e usaram-no (com a (F)) para obter uma concessão, pela (F), com uma proposta que era materialmente da autora. Não pediram autorização à autora. Nem sequer informaram a autora (o que constitui outra violação do dever de lealdade contratual e pós-contratual).
83. O Tribunal errou ao não considerar que as propostas eram materialmente idênticas. Como errou ao não considerar que as rés a entregaram à (F). Como errou, ao não considerar que a titularidade da Proposta era da autora e não das rés. No mínimo, seria da co-titularidade da autora, pois foi sua co-autora e foi a sua proposta de adjudicação ao concurso (Kinmonth Q88, fls. 7463: “the preparation of the tender submission was a collaborative effort by all parties”).
84. Fica, assim, provado, sem necessidade de mais prova que a Proposta do consórcio (F)-(E) era materialmente idêntica à Proposta do consórcio (H*)-(E). Por outras palavras, o consórcio (F)-(H*) venceu uma concessão com base na Proposta de Adjudicação da (H*): a proposta de adjudicação com que a (H*) se apresentou a concurso em Dezembro de 2001.
85. A propriedade intelectual sobre a proposta de adjudicação pertence à autora (pelas razões aduzidas supra nas alegações).Tal constitui um acto ilícito, quer por violação do pacta sunt servanda, mas ainda por decorrência dos arts. 1º/1 e 3, 2º/1-a), 5º/1 a contrario, 7º, 9º/1 e 2 (“Presume-se que o criador intelectual é aquele cujo nome for indicado como tal na obra”), 10º, 14º, 21º, 26º a contrario, 55º, 56º, 220º do Decreto-Lei nº 43/99/M. Tal ilicitude é simultaneamente: (i) Fonte de responsabilidade civil extracontratual nos termos dos arts. 477º e ss.; (ii) Fonte de responsabilidade civil contratual por (a) incumprimento do contrato e (b) da pós-eficácia das obrigações derivadas do princípio da boa fé. Ou seja, constitui um ilícito e faz as rés incorrer em responsabilidade civil independentemente da existência ou inexistência de um contrato ((G) e demais fontes da relação contratual autora-rés) e do incumprimento contratual.
86. Trata-se de uma fonte de responsabilidade civil autónoma, de natureza extracontratual, assente em normas especiais do DL nº 43/99/M, sujeitas a prazo de prescrição de 50 (cinquenta) anos, como consta do art. 21º do aludido Decreto-Lei, normas essas directamente aplicável à protecção de propriedade intelectual (direito de autor) que as rés violaram ao entregar à (F) e/ou ao usar na candidatura do consórcio (F)-(C*) ao concurso de jogo. As rés beneficiaram da Proposta de Adjudicação da autora sem autorização da autora e sem darem o benefício devido à autora pelo benefício ilícito que tiraram da mesma. Tal constitui acto ilícito, violação das aludidas normas do DL nº 43/99/M e fá-las incorrer em responsabilidade civil nos termos do art. 477º e ss. do CC.
87. Assim, os deveres jurídicos vinculativos de não prestar informações a terceiros, de não praticar actos que se reflectissem negativamente na autora e respeito pela confidencialidade da informação do consócio autora-rés, constantes da (G) e da relação contratual entre autora e rés, foram também violados pela conduta das rés de partilha e de uso (pelas rés e por terceiro) da Proposta de Adjudicação da autora.
CAPÍTULO VI: INCUMPRIMENTO DO CONTRATO
88. Obrigações de natureza contratual e legal violadas pelas rés:
a. Realizar os melhores esforços para a obtenção de uma concessão, mantendo a associação com a autora até final do concurso: Intróito e Cláusula 2B da (G), art. 752º/1 e 752º/2 do CC, art. 565º do Cód. Comercial.
b. Não denunciar ou resolver o contrato (G) em violação das normas legais (arts. 326º, 426º, 752º/1, 752º/2 do CC, art. 532º/b) do Cód. Comercial) e cláusulas contratuais (cláusula 13G), incluindo sem concessão de aviso prévio;
c. Não praticar quaisquer actos que “possam reflectir-se negativamente” na (H*): Cláusula 2C da (G) e art. 752º/2 do CC.
d. Negociar exclusivamente com a (H*): Cláusula 10 da (G), arts. 326º e 752º/2 do CC, art. 532º/a) do Cód. Comercial.
e. Não solicitar ou encorajar (através da prestação de informações ou doutro modo) quaisquer perguntas ou respostas relativas ao concurso de jogo (o negócio objecto da (G)): Cláusula 10 da (G), arts. 326º e 752º/2 do CC, art. 532º/a) do Cód. Comercial.
f. Não celebrar qualquer acordo com terceiro relativo ao concurso de jogo (o negócio objecto da (G)): Cláusula 10 da (G), arts. 326º, 752º/1 e 752º/2 do CC, art. 532º/a) e 565º do Cód. Comercial.
g. Não revelar informação confidencial: Cláusula 13H da (G), art. 532º/a) e b) do Cód. Comercial, artigos citados do DL nº 43/99/M;
h. Agir de boa fé no cumprimento e na cessação do vínculo contratual (arts. 326º e 752º/2 CC).
89. Actos de incumprimento contratual (consistentes em violação das obrigações contratuais e legais das rés para com a autora):
a. Separação da (H*);
b. Não concessão de aviso prévio à (H*) aquando da denúncia;
c. Ter informado a Comissão do Concurso no dia 01/02/2002 e só ter informado a autora por carta expedida a 06/02/2002 (impossibilitando a autora de encontrar alternativas);
d. Negociação com a (F);
e. Negociação com a (F) ao mesmo tempo que negociava com a XXX;
f. Partilha com a (F) (e uso) do teor da Proposta de Adjudicação ou do Sumário Executivo da autora;
g. Associação à (F).
90. Trata-se de condutas comprovadamente ocorridas antes da recepção pela autora da carta enviada pelas rés em 6-Fevereiro-2002 (fls. 296), logo de condutas praticadas quanto o contrato (G) estava em vigor.
91. Para contar como incumprimento do contrato (constituído pela (G) e demais fontes da relação contratual, incluindo actos tácitos, bem como deveres laterais de lealdade), basta que os actos de incumprimento tenham sido praticados antes da recepção da carta datada de 6-Fev-2002, como se vê facilmente que sucedeu com todos os actos das rés de incumprimento.
ACTOS DE INCUMPRIMENTO
Subsecção (i): Separação da (H*)
92. Ao separarem-se da Autora em 01/02/2002, as rés violaram:
a. O Intróito da (G), o qual se tornou vinculativo em consequência:
i. da Proposta de Adjudicação de 7-Dezembro-2001 (fls. 62-192),
ii. da Declaration of Relationship (fls. 2607-12, assinada a fls. 9114-17) (pontos 207.d, 209.b e 210.b, entre outros, das alegações),
iii. da carta de 20-Dez-2001 (fls. 2640);
iv. da conduta das rés ao longo do concurso até 31-Jan-2002;
b. Cláusula 2B da (G) (que se tornou vinculativa em consequência dos actos jurídicos referidos nos pontos i a iv da alínea anterior);
c. Cláusula 13G da (G)
i. Se for considerada não vinculativa, como é o caso, o término do contrato é mais prementemente ilícito: violaram os arts. 752º/1 e 426º/1 do CC;
ii. Se for considerada vinculativa, a sentença recorrida violaria o teor da cláusula, pois os seus efeitos só se produziriam com a recepção da carta de 6-Fevereiro-2002 e nunca por caducidade em 15-Janeiro;
iii. De qualquer modo, a conduta das rés violaria esta cláusula ainda, porque
I. a condição suspensiva nele estabelecida (não celebração dos contratos definitivos) não é vinculativa (pontos 274.b.ii, 276.c, 278-284 das alegações e Parecer de Carlos Ferreira de Almeida, pontos 280, 291 e 308 das alegações);
II. nos termos da (G), os contratos definitivos só poderiam ser celebrados após a obtenção de uma concessão (pontos 278-284 das alegações);
d. Proposta de Adjudicação de 7-Dezembro-2001 (fls. 62-192) (pontos 169-198 das alegações);
e. Declaration of Relationship assinada por (T10) (fls. 2607-12, assinada a fls. 9114-17) (pontos 204-214 das alegações);
f. Carta de 20-Dez-2001 (fls. 2640) (pontos 199-203 das alegações);
g. Conduta das rés e autora ao longo do concurso até 31-Jan-2002, incluindo comunicações escritas (pontos 215 e ss. das alegações);
h. Art. 400º/1 do CC (trata-se, como sucede com o art. 752º/1 do CC, de uma violação do princípio pacta sund servanda);
i. Art. 426º/1 do CC (violação dos termos jurídicos – convencionais ou legais – de acordo com os quais se pode fazer cessar um contrato);
j. Art. 752º/1 do CC (violação do princípio pacta sund servanda: “A resolução ilícita não é inválida: representa o incumprimento do contrato”);
k. Art. 752º/2 do CC: violação do princípio da boa fé, evitando – quer no cumprimento, quer na denúncia, causar prejuízos evitáveis na parte contrária;
l. Art. 565º do Cód. Comercial.
Subsecção (ii): Não concessão de aviso prévio à (H*) aquando da denúncia
93. As rés separaram-se da autora em 01/02/2002 sem darem aviso prévio. Este é um argumento subsidiário relativamente ao argumento de que a denúncia foi ilícita (Subsecção anterior). Aqui alega-se que o modo como a denúncia foi exercida é um ilícito adicional pelo facto de não ter sido dado aviso prévio, o que viola o princípio da boa fé. As rés teriam de ter dado à autora prazo para empresa gestora com experiência na exploração do jogo e elaborar uma proposta de adjudicação cuja execução estivesse dependente de uma associação à (E). Tal consubstancia violação do dever de boa fé (art. 752º/2 do CC) e abuso de direito (art. 326º do CC) que gera responsabilidade civil da parte das rés.
Subsecção (iii): Só ter informado a autora da denúncia em 06/02/2002 após informar a comissão no dia 01/02/2002 (impossibilitando a autora de encontrar alternativas)
94. Este fundamento é também subsidiário relativamente ao argumento da ilicitude da denúncia. Aqui alega-se que, independentemente de ter sido ilícita fazer uso da denúncia, o modo como a denúncia foi exercida constitui ele mesmo um ilícito pelo facto de as rés não terem informado a autora após terem praticados actos incompatíveis com a manutenção do contrato com a autora:
a. As rés informaram a Comissão em 1-Fev (FACTOS ASSENTES “KK” e “LL” – fls. 1123) e só informaram a Autora em 6-Fev (FACTOS ASSENTES “QQ”, “RR” e “SS” – fls. 1124);
b. Na Subsecção anterior alegou-se que as rés não deram aviso prévio antes de operarem a denúncia do contrato;
c. Nesta Subsecção alega-se que as rés não informaram a autora após, em 1-Fevereiro, terem informado a Comissão que se tinham separado da autora e após se terem associado a uma concorrente da autora (a (F)), e, por isso, praticado um acto incompatível com a manutenção do contrato com a autora;
d. É absolutamente injustificado terem iniciado negociações com a (F) em Janeiro e não terem informado a autora imediatamente;
e. É absolutamente injustificado terem-se associado à (F) em 01/02/2002 e não terem informado a autora imediatamente;
f. É absolutamente injustificado terem informado a Comissão do Concurso no dia 01/02/2002 que se tinham separado da autora e associado à (F) e não terem informado a autora imediatamente;
g. Os documentos de fls. 10205-06 (juntas também a fls. 10173-74) e 10208-09 (datas de 2 e de 4 de Fevereiro), só foi enviada a 6 de Fevereiro (fls. 10210-11 e também 296-97), revelam que as rés agiram premeditada e intencionalmente ao não informarem a autora prontamente, pois tinham uma carta preparada anteriormente para enviar, mas não a enviaram, tendo esperado pelo final do concurso para informarem a autora (quando esta já nada poderia fazer para tentar remediar a situação em que as rés a colocaram);
h. Ao actuarem como actuaram as rés violaram deveres de boa-fé (art. 752º/2 do CC) e
i. Agiram em abuso de direito (art. 326º do CC);
j. Violaram a pós-eficácia das obrigações, derivadas do princípio da boa fé (caso se considerasse – erradamente – que o contrato se extinguiu em 15-Janeiro);
k. Violaram, ainda, os usos e práticas existentes em matéria de relação consorcial e, em particular, em concursos públicos (art. 565º do Cód. Comercial):
l. A conduta das rés é indesculpável, quer jurídica, quer eticamente; não existe qualquer justificação plausível que não seja de má-fé para estarem a negociar com a autora no dia 31 de Janeiro às 19:09 horas (fax) os termos da associação com a XXX (fls. 2713 e 2717; 5666 e 5670-71; 9723 e 9724-25) – em conjunto com a autora – e a negociar com a (F) no mesmo dia, sem o informar à autora naquele dia, nem informarem no dia seguinte que tinham comunicado à Comissão a sua separação da autora;
m. Tal constitui um acto ilícito e gera responsabilidade civil das rés.
Subsecção (iv): Negociações com a (F)
95. As rés começaram a negociar com a (F) no início de Janeiro de 2002. Em qualquer caso, as rés confessaram que estavam em negociações com a (F) em finais de Janeiro de 2001.
96. Entrar em negociações com a (F) viola:
a. A cláusula 10 da (G) (confirmada por outras fontes contratuais) na vertente em que proíbe negociações com terceiros até término das negociações com a autora, que só ocorreu após 06/02/2002);
b. A cláusula 10 da (G) na vertente em que proíbe a solicitação ou encorajamento de quaisquer perguntas ou respostas relativamente ao concurso de jogo, incluindo a prestação de informação ou outros modos de solicitação ou encorajamento, os quais ocorreram necessariamente;
c. A cláusula 2C da (G), que proíbe a prática de actos que se reflictam negativamente na autora (o que é manifestamente o caso);
d. A cláusula 13H da (G), que proíbe a revelação a outrem de informações confidenciais relativas ao consórcio, o que necessariamente ocorreu;
e. O Intróito e Cláusula 2B da (G), que se tornaram vinculativas na sequência das outras fontes contratuais, os quais impõem às rés realizar os melhores esforços para a obtenção de uma concessão, mantendo a associação com a autora até final do concurso;
f. Art. 752º/2 do CC: agir de boa fé;
g. Deveres secundários e laterais, derivados do princípio da boa fé;
h. Art. 326º do CC: não exercer os seus direitos em abuso de direito;
i. A pós-eficácia das obrigações, derivadas do princípio da boa fé (caso se entendesse que o contrato havia cessado anteriormente, o que não é o caso);
j. O art. 532º/a) e b) do Cód. Comercial;
k. O art. 565º do Cód. Comercial, quer relativamente às práticas formadas entre as partes, quer relativamente aos usos aplicáveis à participação em concursos públicos.
97. Assim, a conduta das rés violou, quer o contrato, quer as normas injuntivas aplicáveis, quer as obrigações contratuais que mantiveram a sua eficácia caso se considere que o contrato se extinguiu em 15-Janeiro-2001 (pós eficácia das obrigações, que se alega a título subsidiário). Tais regras foram ainda violadas acrescidamente pelo facto de as rés não terem informado a autora – apesar de estarem no concurso com a autora e a negociar com a autora a associação com a XXX até à noite de 31-Janeiro-2002.
Subsecção (v): Negociação com a (F) ao mesmo tempo que negociava com a XXX
98. As rés negociariam ao mesmo tempo com a XXX, em conjunto com a autora (fls. 2713-17, topo da folha: fax enviado às 19:09 de dia 31 de Janeiro), e com a (F), contra os interesses da autora. No dia 31-Janeiro-2002, pelo menos, estava a negociar com ambos, o que constituiu uma conduta eticamente miserável e ilícita.
99. Tal constitui violação as regras sobre a negociação com terceiros, bem como, adicionalmente, deveres específicos de boa fé. Assim, esta conduta viola, para além das cláusulas da (G), as normas seguintes:
a. Art. 752º/2 do CC: agir de boa fé;
b. Deveres secundários, derivados do princípio da boa fé;
c. Art. 326º do CC: não exercer os seus direitos em abuso de direito;
d. A pós-eficácia das obrigações, derivadas do princípio da boa fé;
e. O art. 532º/a) e b) do Cód. Comercial;
f. O art. 565º do Cód. Comercial, quer relativamente às práticas formadas entre as partes, quer relativamente aos usos aplicáveis à participação em concursos.
Subsecção (vi): Partilha com a (F) (e uso) do teor da Proposta de Adjudicação ou do Sumário Executivo da autora
100. Ao partilharem a Proposta de Adjudicação da autora, ou uma cópia materialmente idêntica, com a (F) e ao fazerem uso e dela tirarem proveito sem autorização e proveito da autora, as rés violaram as seguintes normas contratuais e legais:
a. A cláusula 2C da (G), que é também vinculativa nos termos da (G) e proíbe a prática de actos que se reflictam negativamente na autora;
b. A cláusula 13H da (G), que proíbe a revelação a outrem de informações confidenciais relativas ao consórcio autora-rés;
c. O Intróito e Cláusula 2B da (G), que se tornaram vinculativas na sequência das outras fontes contratuais, os quais impõem às rés realizar os melhores esforços para a obtenção de uma concessão, mantendo a associação com a autora até final do concurso;
d. Art. 752º/2 do CC: agir de boa fé;
e. Deveres secundários, derivados do princípio da boa fé;
f. Art. 326º do CC: não exercer os seus direitos em abuso de direito;
g. A pós-eficácia das obrigações, derivadas do princípio da boa fé;
h. O art. 532º/a) e b) do Cód. Comercial;
i. O art. 565º do Cód. Comercial, quer relativamente às práticas formadas entre as partes, quer relativamente aos usos aplicáveis à participação em concursos;
j. Tal viola, pois, o que resulta dos Factos Assentos J, I, L (fls. 1117).
101. As rés argumentaram com base no facto de a cláusula 10 exigir que os documentos confidenciais fossem marcados como tal. Trata-se é um argumento irrelevante à luz do art. 228º/1 do CC, como demonstrado nas alegações.
Subsecção (vii): Associação das rés à (F)
102. A associação das rés à (F) constitui, conjuntamente com a separação da autora, o mais grave incumprimento contratual das rés. Que a autora se associação em consórcio à (F), entre 1 e 6 de Fevereiro de 2002, está provado nos autos de modo inquestionável.
103. Ao associarem-se à (F) (e sem nunca informarem a autora!), as rés violaram as seguintes normas contratuais e legais:
a. O Intróito da (G), os quais impõem às rés realizar os melhores esforços para a obtenção de uma concessão, mantendo a associação com a autora até final do concurso, e que se tornou vinculativo pelos movidos referidos supra;
b. Cláusula 2B da (G) (que se tornou vinculativo pelos movidos referidos supra);
c. A cláusula 2C da (G), que proíbe a prática de actos que se reflictam negativamente na autora;
d. A cláusula 10 da (G), quer na vertente que proíbe negociações com terceiros, quer na vertente em que proíbe a solicitação ou encorajamento de quaisquer perguntas ou respostas relativamente ao concurso de jogo, incluindo a prestação de informação ou outros modos de solicitação ou encorajamento;
e. Cláusula 13G da (G), caso a mesma seja tida por vinculativa (caso contrário há incumprimento do contrato por cessão ilícita da sua vigência);
f. A cláusula 13H da (G), que proíbe a revelação à (F) ou outrem de informações confidenciais relativas ao consórcio autora-rés;
g. Proposta de Adjudicação de 7-Dez-2001 (fls. 62-192) (pontos 169-198 das alegações);
h. Declaration of Relationship (fls. 2607-12, assinada a fls. 9114-17) (pontos 204-214 das alegações);
i. Carta de 20-Dez-2001 (fls. 2640) (pontos 199-203 das alegações);
j. Conduta das rés e autora ao longo do concurso até 31-Jan-2002, incluindo comunicações escritas (pontos 215 e ss. das alegações);
k. Art. 400º/1 do CC: Trata-se, tal como sucede com o art. 752º/1 do CC, de uma violação do princípio pacta sund servanda, dado que a associação constitui um acto de incumprimento do contrato com a autora;
l. Art. 426º/1 do CC: violação das regras de acordo com os quais se pode fazer cessar um contrato a que se está vinculado;
m. Art. 752º/1 do CC: violação do princípio pacta sund servanda, na medida em que a associação à (F) implica o incumprimento do contrato com a autora;
n. Art. 752º/2 do CC: violação do princípio da boa fé, pois a associação a um concorrente, tal como o cumprimento dos contratos, está sujeita a deveres de boa fé, evitando prejuízos evitáveis na parte contrária;
o. Deveres secundários, derivados do princípio da boa fé;
p. Art. 326º do CC: não exercer os seus direitos em abuso de direito;
q. A pós-eficácia das obrigações, derivadas do princípio da boa fé;
r. O art. 532º/a) e b) do Cód. Comercial;
s. O art. 565º do Cód. Comercial, quer relativamente às práticas formadas entre as partes, quer relativamente aos usos aplicáveis à participação em concursos.
Além de todas estas regras referidas supra,
104. A conduta das rés descrita em todas as Subsecções desta Secção violou ainda outras regras, designadamente os arts. 153º a 173º do Cód. Comercial, de entre as quais as normas mais relevantes são analogicamente aplicáveis ao caso em apreço.
105. Acresce que, tendo tornado impossível o cumprimento do contrato – exploração e operação de uma concessão de jogo – as rés são responsáveis pela não exploração e operação do jogo pela autora nos termos acordados com as rés, o que gera incumprimento do contrato: art. 779º/1 do CC (impossibilidade de cumprimento imputável às rés).
106. Cada um destes actos de incumprimento cumpre o requisito de materialidade da violação geradora de incumprimento definitivo do contrato por perda de interesse, que se alegou e se volta a aqui a alegar: art. 797º/1-b) e 2 do CC. Trata-se de um caso de incumprimento total e definitivo.
DENÚNCIA OU RESOLUÇÃO ILÍCITA E IMPOSSIBILIDADE CULPOSA
107. As rés resolveram ilicitamente o contrato. Ou seja, para além de actos de incumprimento, o término da relação foi ilegal, pois a resolução ou denúncia ilegal de um contrato constitui um acto de incumprimento do mesmo. Daí resultou a impossibilidade imputável às rés de cumprirem o segundo segmento temporal do contrato (o primeiro segmento era a participação conjunta para obtenção de uma concessão): a exploração e operação do jogo durante o período da concessão que teriam obtido não fosse a conduta das rés.
MOMENTO DO INCUMPRIMENTO
108. Basta que os actos de incumprimento tenham sido praticados antes da entrega da carta de 6-Fev-2002 para que as rés tenham incumprido o contrato. Na verdade, as rés começaram a violar o contrato no início de Janeiro de 2002. Mas mesmo que assim não tivesse sido, violaram-no inequivocamente no final de Janeiro de 2002.
a. Mesmo que assim não fosse, e o contrato tivesse cessado os seus efeitos em 15-Jan-2002, as rés estavam vinculadas pelo contrato em virtude da pós-eficácia das obrigações.
b. Que as rés praticaram vários actos em 1-Fevereiro-2002 (antes, pois, de 6-Fevereiro-2002) está provado nos autos.
CAPÍTULO VII: A (H) TERIA OBTIDO UMA CONCESSÃO
109. O Tribunal recorrido errou quando considerou que a autora não teria obtido uma concessão. O TSI deve dar como provado que a autora teria obtido uma das três concessões caso as rés tivessem cumprido as suas obrigações contratuais para com a autora, como resulta da prova e das regras jurídicas aplicáveis para formação deste juízo de prova.
DISCRICIONARIEDADE DA COMISSÃO DO CONCURSO
110. A comissão detinha as seguintes competências: (i) Uma competência procedimental decisória: prática de actos administrativos tendencialmente destacáveis; (ii) A competência para elaborar o Relatório Fundamentado, uma competência procedimental preparatória, de natureza opinativa.
111. A competência da Comissão preenche, na íntegra, as várias vertentes, do poder discricionário: trata-se de um poder habilitado por lei de atribuição de competência (art. 44º do RA 26/2001), tendo em vista um fim legal concretizador de um interesse público especificado – isto é, a escolha das adjudicatárias que “apresentem as condições mais vantajosas para a Região na exploração e operação adequadas dos jogos de fortuna ou azar em casino” (art. 78º/1 do RA 26/2001).
112. Havia um total de sete critérios e elementos legais de ponderação, avaliação e consideração, indicados de forma não exaustiva (“designadamente”: art. 78º/2 do RA). A comissão podia erigir outros critérios e elementos, mas não o fez. Este exercício consubstanciou, simultaneamente, uma discricionariedade de apreciação e uma discricionariedade de acção. A Comissão emitiu juízos com a natureza de avaliação técnica, com elementos de prognose e de ponderação autónoma de factores complexos, tendo em vista a tomada de uma decisão final com consequências políticas.
113. A discricionariedade consiste numa liberdade de escolha entre várias soluções tidas como igualmente possíveis. Teríamos então uma margem volitiva, ao passo que nos conceitos indeterminados essa margem era de cognição. Trata-se do momento volitivo da discricionariedade. Há que distinguir:
a. Discricionariedade na prática de actos administrativos versus discricionariedade regulamentar;
b. Discricionariedade administrativa (volitiva) versus discricionariedade técnica;
c. Discricionaridade de apreciação versus discricionaridade de acção.
114. No caso da Comissão do Concurso todas estas dimensões da discricionariedade estavam presentes, dispondo a Comissão de uma larguíssima margem de discricionariedade, em particular volitiva. Estava em causa decidir do interesse público da RAEM. O Tribunal recorrido confundiu discricionariedade volitiva com discricionariedade técnica.
115. Tendo a experiência sido eleita pela comissão como factor de avaliação prevalecente – e, atento o facto notório da experiência da (C*), bem como a pontuação acrescida atribuída pela comissão à concorrente associada à (C*), em função da dita experiência –, é um juízo elementar de prognose póstuma postular, com elevadíssimo grau de certeza, que qualquer outra concorrente que se tivesse associado à (C*) teria sido, precisamente por esse mesmo motivo, adjudicatária de uma das três concessões adjudicadas.
STANDARD DE PROVA E ÓNUS DA PROVA
116. Nos termos do art. 437º do CPC, o ónus da prova só é aplicável quando existe uma “dúvida sobre a realidade de um facto”. No caso em apreço, face às dezenas de provas, não existe dúvida sobre se a autora obteria uma concessão. Por isso, não há que aplicar o ónus da prova. Resta a necessidade de formar uma convicção judicial aplicando o standard de prova.
117. O standard de prova em processo civil é o da teoria da probabilidade prevalente. Art. 558º/1. Deve preferir-se a hipótese que seja “mais provável que não”, “que é mais provável que seja verdadeira do que seja falsa”. O que está, portanto, em causa em matéria de valoração da prova, não é a autora de fazer um esforço probatório maior do que as rés. O ónus da prova não tem relevância para, nem interfere com o standard de prova. Tal é ainda mais relevante quando estamos perante a prova de um facto hipotético e não de um facto histórico, como é o caso.
PROVA DE QUE AUTORA TERIA OBTIDO UMA CONCESSÃO
118. Resulta da prova produzida e do princípio da discricionariedade volitiva e regulamentar que a autora teria vencido a concessão associada às rés. Tal é particularmente relevante quando o concurso é suposto ser decidido, não só numa avaliação critério a critério, como ainda – e principalmente – numa avaliação global da concorrente em face do interesse público da RAEM. A Comissão tinha discricionariedade na atribuição da ponderação dos critérios. Tal resulta dos arts. 78º/1 e 2 e 82º do RA 26/2001. Conforme resultou da prova produzida e é uso em concursos públicos, na RAEM e fora dela (art. 565º Cód. Comercial), a avaliação das concorrentes deve ser feita recorrendo-se a uma avaliação global e não só critério a critério.
119. A sentença recorrida não valorizou o testemunho dos membros da Comissão. Nenhum membro da Comissão disse que a Autora não teria vencido uma concessão. Pelo contrário, resultou do seu depoimento que a autora teria obtido uma concessão.
120. O facto de o Chefe do Executivo da RAEM ter atribuído, fora de um concurso público, e arriscando violar a Lei do Jogo, uma subconcessão precisamente à (E), demonstra que o Chefe do Executivo sempre quis que a (E) obtivesse uma concessão.
121. Tendo em conta o standard de prova que o Tribunal deve aplicar da probabilidade prevalente (mais provável do que não), não existem dúvidas de que deve dar o facto como provado, pois é mais provável do que não que a autora tivesse obtido uma concessão.
CAPÍTULO VIII: CÁLCULO DOS DANOS: INDEMNIZAÇÃO
122. Os danos foram calculados por dois especialistas que agiram imparcialmente, tendo a autora junto dois pareceres técnicos que falam por si: (a) Parecer Técnico (“Expert Report”) do Professor (L) (fls. 9746-9770); (b) Parecer Técnico (“Expert Report”) de (M) e (N) (fls. 9771-9811). Ambos denotam uma postura intencionalmente “conservadora” na contabilização dos danos.
a. (L) conclui que o valor da indemnização a pagar será “superior a MOP 62,286,757,913.00”. (M) e (N) concluem que a indemnização a pagar será de “MOP 57.9 billion, or US $7.4 billion based on current exchange rates”.
b. Os MOP 62.2 mil milhões de (L) e os MOP 57.9 mil milhões de (M) diferenciam-se pelo articulado nos pontos 3.4 e 3.5 (fls. 14-16) do parecer de (L) e nos pontos 39 a 41 (fls. 22-23) do parecer de (M).
c. Ambos assentam a sua análise nas regras financeiras em vigor na RAEM, bem como na sua conjugação com as regras de cálculo de danos estabelecidas no Código Civil da RAEM (que são similares às aplicáveis nos EUA).
123. Independentemente do montante dos danos, provada a responsabilidade civil das rés, o Tribunal haveria sempre de ter que reconstituir a situação que existiria e o contrato tivesse sido cumprido pelas rés (art. 556º do CC). Por esse motivo, como os dois Técnicos explicam, a melhor metodologia é usar como referência os lucros da (E) Macau SA, pois geriu o mesmo modelo (ver contrato de subconcessão, parte final) e foi gerido pela (E) (tal como, nos termos da (G), teria sido gerido pela (E) se a autora tivesse obtido uma concessão).
124. Os relatórios técnicos das rés foram de uma pobreza financeira confrangedora, não tendo qualquer credibilidade. Para além de terem cometido erros básicos, o testemunho de (O) foi surrealmente pobre.
125. O Tribunal deve dar como provado que a autora teve o prejuízo indemnizável correspondente ao valor constante dos relatórios técnicos acrescidos dos valores a determinar nos termos do art. 560º/6, na parte em que os Técnicos disseram não fazer uma avaliação.
CAPÍTULO IX: JUROS
126. As rés deverão ser condenadas a pagar juros desde a data da citação até integral cumprimento. Os juros deverão começar a correr relativamente a cada uma das rés desde a data da respectiva citação e a partir da última citação para todas, solidariamente. As rés consideram-se todas citadas, salvo melhor opinião, em 5-Maio-2012 (fls. 375, 380, 389), pelo que os juros começaram a correr relativamente às três rés desde esta data em regime de solidariedade (art. 567º CCom; arts. 490º/1, 505º, 506º e 512º do CC). Relativamente às rés citadas primeiramente (fls. 385 e 387), o prazo deverá correr quanto à parte citada a partir da data da respectiva citação (2-Março-2012).
127. As rés poderiam ter feito um depósito ou pagamento parcial, mas optaram por não efectuar qualquer pagamento. Como tal, estão sujeitas ao pagamento de juros desde a data da citação até integral cumprimento.
128. A taxa de juro legal é de 11.75% no caso dos autos por aplicação conjugada do art. 552º/1 do CC e do art. 1º da Ordem Executiva nº 29/2006 (9.75%), conjuntamente com o art. 569º do CCom e o art. 1º da Ordem Executiva nº 29/2006.
129. Que se trata de um “crédito de natureza comercial” resulta claro (i) do art. 3º/1-b), aplicado conjugadamente com os arts. 1º/b) e 3º/2; (ii) do art. 3º/1-a) (dado tratar-se de uma relação de consórcio); e, se necessário, do art. 563º todos do CCom.
130. Assim, as rés devem ser condenadas solidariamente a pagar de juro de mora à taxa legal de 11.75% desde 2-Março-2002 (duas rés) e 5-Maio-2002 (as três rés) até integral pagamento.
CAPÍTULO X
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
131. Pelos motivos constantes das alegações, não existem quaisquer fundamentos legais ou factuais para a condenação da autora como litigante de má-fé, pelo que as três decisões do Tribunal recorrido que condenam a autora devem ser revogadas.
132. O efeito resultante destas condenações é que a autora perde o benefício do apoio judiciário e, sendo uma sociedade em liquidação, não tem, nem pode ter actividade comercial, ficaria prejudicada por falta dos meios financeiros que as rés têm em abundância. A incapacidade financeira da autora para pagar custas judiciais não é por facto imputável à autora, mas por exigência da lei. Como alegaram as rés, a autora não pode ter actividade comercial (lucrativa), porque tal lhe é proibido fazer pela Lei do Jogo e pelo Código Comercial.
133. As presentes alegações assentam, entre outros, nos artigos seguintes: 1º, 2º, 5º, 7º, 8º, 9º, 209º, 210º, 211º, 214º, 216º, 220º, 221º, 222º, 226º, 228º, 229º, 230º, 231º, 263º, 265º, 273º, 287º, 288º, 326º, 327º, 334º, 335º, 339º, 341º, 342º, 345º, 347º, 348º, 350º, 353º, 354º, 355º e ss., 386º e ss., 391º, 392º, 396º, 398º, 399º, 400º, 426º e ss., 451º e ss., 477º, 490º/1, 505º, 506º, 512º, 552º, 556º, 557º, 558º, 560º, 563º, 567º, 752º e ss., 787º e ss., 790º e ss., 798º, entre outros, do Código Civil; dos artigos 1º, 2º, 3º, 4º, 234º, 235º, 236º, 245º e ss., 454º e ss., 528º a 535º e ss., 548º, 550º, 563º, 565º, 567º, 569º, 573º, entre outros, do Código Comercial; dos artigos 1º, 7º e ss. (incluindo designadamente os 16º, 18º, 21º), 51º, entre outros, da Lei nº 16/2001; dos artigos 1º, 2º/1-a) e 2, 3º e ss., 7º, 8º, 9º a 17º, 18º, 21º e ss., 26º e ss., 41º e ss. (incluindo 46º), 54º, 55º e ss., entre outros, do DL nº 43/99/M; dos artigos 1º, 2º, 15º, 16º, 17º e ss., 28º, 29º e ss., 44º e ss. (incluindo designadamente o 51º), 59º e ss., 63º e ss., 75º e ss., 78º, 90º, entre outros, do Regulamento Administrativo nº 26/2001; dos Despachos do Chefe do Executivo nºs 215/2001, 216/2001, 217/2001, 250/2001, 259/2001, 26/2002 e 143/2002; da Ordem Executiva nº 29/2006, normas que individualmente ou em conjunto as rés violaram pela sua conduta ou ao abrigo das quais devem ser condenadas solidariamente a indemnizar a autora.
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As 1ª a 3ª Rés responderam à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 12546 a 12638 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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Vêm as 1ª a 3ª Rés (B) (C) e (D) recorreram dos despachos do Tribunal a quo, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
(1) Do despacho de 11/03/2016:
A. Por acórdão proferido pelo TSI em 19 de Junho de 2014 (processo n.º 599/2013), confirmado pelo acórdão proferido pelo TUI em 6 de Maio de 2015 (processo n.º 3/2015), transitado em julgado em 21 de Maio de 2015, foi revista e confirmada a sentença proferida no âmbito do processo que correu termos no United States District Court do Nevada sob o n.º 2:07-cv-00xx-JCM-PAL, na parte em que foi confirmada pelo United States Court of Appeals for the Ninth Circuit em 10 de Abril de 2009, no âmbito do processo n.º 07-1xxx (a Sentença do Nevada).
B. A Sentença do Nevada julgou improcedente a accão intentada pela Recorrida contra as Recorrentes no âmbito do processo n.º 2:07-cv-00xx-JCM-PAL (o Processo do Nevada), relativamente a todos os factos ocorridos depois de 15 de Janeiro de 2002.
C. Na base da Sentença do Nevada está a aplicação do statute of limitations do Nevada, tendo sido julgado que a acção havia sido, relativamente àqueles factos, proposta para além do prazo fixado de 4 anos para contratos orais e de 3 anos para obrigações fiduciárias.
D. O Processo do Nevada foi proposto pela Recorrida contra as ora Recorrentes e outras entidades.
E. No Processo do Nevada, a Recorrida formulou um pedido substancialmente idêntico ao que a Recorrida formulou contra as Recorrentes nestes autos.
F. A causa de pedir do Processo do Nevada é substancialmente idêntica à causa de pedir invocada pela Recorrida nestes autos contra as Recorrentes.
G. A Sentença do Nevada transitou em julgado, não sendo mais susceptível de recurso ordinário.
H. A Sentença do Nevada foi proferida on the merits and with prejudice, isto é, sobre o mérito da causa e com efeito preclusivo.
I. Em 5 de Junho de 2015, em articulado superveniente, a Recorrente invocou a excepção dilatória de caso julgado.
J. O douto despacho de fls. 1860 e segs. (o Despacho Recorrido) dá como assente que, entre o Processo do Nevada e os presentes autos, existe identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, que a Sentença do Nevada transitou em julgado, que foi devidamente revista e confirmada em Macau e que faz caso julgado material no Nevada, onde tem efeito preclusivo.
K. Porém, entende também o Tribunal a quo que cabe à lex fori - 1eia-se à ordem jurídica de Macau - determinar se a Sentença do Nevada tem, em Macau, força de caso julgado e efeito preclusivo, nos termos do disposto nos artigos 416.º, 417.º, 575.º e 576.º do CPC.
L. Conclui o Despacho Recorrido que a interpretação da Sentença do Nevada leva a concluir que caducou o direito de acção no Nevada mas não que se tenha extinguido o direito da Recorrida que nessa acção a Recorrida pretendia fazer valer.
M. Por estas razões, o Tribunal a quo julgou improcedente a excepção de caso julgado.
N. Face ao Direito do Nevada, a Sentença do Nevada é tida como uma decisão de mérito e com efeito preclusívo, quer porque assim o decidiu o United States District Court do Nevada, quer porque esse é o efeito prescrito pela Regra 41(b) do Nevada Rule of Civil Procedure, quer ainda porque esse é o efeito compatível com o leading case do Nevada sobre efeitos preclusivos, XXX Corporation v. Ruby.
O. Não compete à lei de Macau determinar os efeitos da Sentença do Nevada, é ao Direito do Nevada que compete essa tarefa.
P. Uma vez revista e confirmada a Sentença do Nevada em Macau, cabe aos tribunais de Macau receber os efeitos produzidos segundo o Direito do Estado de origem da decisão, no que se denomina por extensão de eficácia da sentença estrangeira.
Q. Por outras palavras, reconhecer uma sentença estrangeira é atribuir-lhe no Estado do foro (Estado ad quem) os efeitos que lhe competem segundo a lei do Estado onde foi proferida (Estado de origem ou Estado a quo).
R. Esta é a solução que melhor combate o forum shopping, assegura a harmonia internacional de julgados e tutela a confiança e expectativas das partes na estabilidade das situações jurídicas já constituídas.
S. Esta é também a solução que decorre da alínea b) do n.º 1 do artigo 1200.º do CPC.
T. A dicotomia entre rights e remedies, tradicional dos direitos de common law e motivada por específicas razões históricas, é arcaica e tem vindo esbater-se, sobretudo no que respeita à distinção entre os efeitos da prescrição e os efeitos da limitation os actions.
U. A maior parte das jurisdições de common law têm vindo, desde há décadas, a qualificar as decisões proferidas com base em limitation of actions como decisões de mérito e com efeito preclusivo, mesmo quando proferidas por tribunais estrangeiros.
V. Não existe diferença substancial entre um direito prescrito e um direito que já não pode ser accionado judicialmente, sendo que a distinção é puramente ilusória e apenas encoraja a prática de forum shopping.
W. Na essência, o Tribunal a quo procedeu a uma revisão de mérito da Sentença do Nevada, no que se adivinha uma velada crítica à opção feita pelo United States District Court do Nevada em aplicar a lex fori qua tale em matéria de limitation of actions.
X. Não compete ao Tribunal a quo proceder a esta revisão de mérito, que o TSI e o TUI negaram e a que a Recorrida não tem direito.
Y. Acresce que, a seguir a qualificação apontada pelo Tribunal a quo, de caducidade do direito de acção, esta constituiria, na ordem jurídica de Macau, uma excepção peremptória, levando à consequente absolvição do pedido, conforme imposto pelo n.º 3 do artigo 412.º do CPC, e não a uma mera excepção dilatória que permitisse à Recorrida propor subsequente acção igual.
Z. O Despacho Recorrido violou o disposto nos artigos 412.º, 413.º, 416.º, 417.º, 576.º, 1199.º, 1200.º e 1202.º do CPC.
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A Autora respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 225 a 319 do apenso A, com ampliação do âmbito do recurso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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(2) Do despacho de 31/05/2016:
A. Os autos encontram-se na fase preparatória da audiência de instrução e julgamento, com a expedição de cartas rogatórias para Portugal, Estados Unidos da América e Hong Kong.
B. Com o cumprimento das cartas rogatórias passar-se-á em pleno à fase de produção de prova, com a necessidade de as partes procederem à preparação do julgamento em, para já, três jurisdições diferentes.
C. Esta preparação acarreta para as Rés um dispêndio muitíssimo significativo, resultante da necessidade de contratar mandatários aptos a intervirem em três jurisdições, de forma a poderem acompanhar devidamente a inquirição das testemunhas em causa.
D. Os mandatários terão de estar inteiramente cientes de todos os detalhes do processo, o que implicará um esforço e dispêndio de horas assinalável
E. As Rés não podem, de forma alguma, poupar quaisquer esforços nesta tarefa, quer face aos valores em discussão nesta causa, que são já muitíssimo elevados, quer sobretudo face àquilo que vem sendo propalado pela Autora e que foi devidamente divulgado pela comunicação social, isto é, que em causa estarão 70% dos lucros auferidos pelo grupo (C**) em Macau, valor que, de acordo com os relatos da imprensa, ascenderá, até à data, a MOP64.000.000.000,00 (sessenta e quatro mil milhões de patacas), sem contar com os lucros futuros.
F. Por outro lado, está pendente um recurso do douto despacho proferido a fls. 1860 e segs. dos autos, onde se discute a excepção de caso julgado invocado pelas Rés e se a decisão proferida pelo Tribunal do Nevada é, ou não, de mérito.
G. No douto despacho de fls. 1890, V. Exa. expressamente acautela a possibilidade de vir a ser proferida sentença nestes autos sem que o recurso tenha ainda sido conhecido, o que constituiria um desfecho a evitar.
H. Também no douto despacho saneador foi feita referência à possibilidade de se vir a suspender a instância, caso o processo de revisão de sentença estrangeira não estivesse concluído antes da fase de julgamento destes autos, com o que se pretendia evitar que o julgamento tivesse lugar sem que se pudesse conhecer da excepção de caso julgado.
I. Nem todos os processos são iguais, quer em função dos interesses em jogo, da complexidade, da dimensão e, consequentemente, do esforço que o seu julgamento requer de todos os intervenientes, desde logo do próprio Tribunal e também das partes.
J. Os presentes autos não representam a normalidade no que respeita à complexidade da causa de pedir nem no que respeita ao valor dos interesses em jogo; pelo contrário, trata-se de um processo que revela uma complexidade muito superior à normal e onde os valores em jogo excedem em muito a mediania, atingindo números que raramente terão sido atingidos em processos judiciais tramitados nos tribunais de Macau.
K. Por outro lado, o princípio da economia processual, assente no artigo 87.º do Código de Processo Civil, assume, nestes autos, uma relevância menor, por razões várias: (i) a Autora é uma sociedade comercial que se encontra em fase de liquidação, por imposição legal, há já mais de 14 anos, não tendo qualquer actividade que não seja litigar com as Rés; (ii) a Autora só optou por dar início a um primeiro processo contra as Rés, no Estado do Nevada, depois de decorrido o prazo naquele Estado vigente para poder submeter o caso à apreciação dos tribunais; (iii) a Autora só decorridos 10 anos sobre os factos deu início à presente demanda; (iv) a própria conduta da Autora nestes autos tem relevado pouca celeridade.
L. Os princípios da economia processual e da celeridade deverão, assim, ser aplicados de forma hábil, devidamente sopesados no caso concreto.
M. Nessa medida, fazer prevalecer o princípio da celeridade processual sobre o princípio da economia parece ser, em termos gerais, uma boa solução, salvo quando, pela complexidade dos actos processuais a praticar, a economia processual assuma um peso bem maior na equação.
N. Na realidade, a partir desta fase, a intervenção processual das Rés irá obrigá-las a rodearem-se de todos os meios necessários à plena e intransigente defesa dos seus direitos, com a referida contratação de equipas de mandatários forenses em diversas jurisdições, o que obrigará a um dispêndio de vários milhões de dólares norte-americanos.
O. Acresce que pendente de recurso está também a própria intervenção da Ré originária (E), que fora absolvida da instância no despacho saneador, recurso esse que igualmente sobe em separado e de imediato.
P. Proceder à audiência de discussão e julgamento ou mesmo, para já, à inquirição de testemunhas por carta rogatória, sem que estas duas questões - excepção de caso julgado e excepção de ilegitimidade passiva -, estejam resolvidas pelos tribunais superiores, pode redundar num gigantesco exercício inútil, onde o princípio da economia processual fica totalmente prejudicado, em benefício do princípio da celeridade que as circunstâncias do caso aconselham a desvalorizar.
Q. O Tribunal a quo, em desabono da posição perfilhada pelas Rés entendeu que, tendo sido já expedida uma carta rogatória, o pedido de devolução causaria “desconforto”,
R. As Recorrentes desconhecem a situação actual da carta rogatória a ser expedida para Portugal, sendo certo que, por se destinar a ouvir um membro do Governo de Portugal, este usará certamente da prerrogativa de depor por escrito, o que em muito limita a participação das partes na inquirição.
S. Quanto às demais cartas rogatórias, é conhecimento das Recorrentes que ainda não foram expedidas.
T. Nenhum prejuízo decorreria para o princípio da economia processual, pois, que a carta rogatória dirigida às autoridades de Portugal fosse cumprida.
U. O douto despacho recorrido violou o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 220.º e no n.º 1 do artigo 223.º, conjugados com o artigo 7.º, e ainda no artigo 87.º, todos do Código de Processo Civil.
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A Autora respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 34 a 58 do apenso B, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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(3) Do despacho de 04/09/2019:
1. O objecto do presente recurso cinge-se à passagem do despacho proferido pelo Tribunal a quo, constante de fls. 4490 a 4491v., em que foi deferido o requerimento de ampliação/alteração do pedido formulado pela Recorrida (doravante, o “Requerimento”).
2. Ao admitir o requerimento de “ampliação” do pedido da Recorrida, o Tribunal a quo proferiu uma decisão que influi directamente no valor da presente causa, que presentemente se cifra em MOP$96,454,156,627.00.
3. Uma vez que a execução imediata da decisão ora colocada em crise poderá causar às Recorrentes prejuízo irreparável ou de extremamente difícil reparação, por força dos preparos e custas judiciais que lhes poderão vir a ser cobrados e que estas jamais conseguirão recuperar, graças ao benefício do apoio judiciário de que a Recorrida, por ora, goza, assim como pelo facto de ser uma sociedade em liquidação, sem património conhecido, deverá ao presente recurso ser atribuído efeito suspensivo da decisão recorrida, nos termos do disposto na alínea e) do n.º 2 do artigo 607.º do Código de Processo Civil.
4. No Requerimento, a Recorrida tece uma série de considerações que afrontam não só a realidade dos factos, como os argumentos por si própria aduzidos nos seus articulados.
5. No Requerimento, a Recorrida procede à alteração do seu pedido primitivo (conforme aliás confessado pela própria no artigo 19.º do Requerimento), ainda que sob as vestes de uma mera “ampliação”, requerendo a condenação das Recorrentes por danos alegadamente causados a título de lucros cessantes, em MOP$96,454,156,627.00, relativamente ao período entre 2004 e 2018 (alegadamente equivalente a 70% do lucro obtido pelas Recorrentes, com base nos Documentos 1 a 15 juntos com o Requerimento), acrescido de 70% dos lucros obtidos pelas mesmas a partir de Janeiro de 2019 até ao final da concessão de jogo.
6. A Recorrida não procedeu a uma mera modificação de forma, antes tendo modificado a verdadeira substância do seu pedido primitivo, verificando-se que o novo pedido deduzido se traduz num pedido materialmente novo, com a sua própria individualidade jurídica.
7. A Recorrida, na sua P.I., não deduziu qualquer pedido provisório, genérico, alternativo, cumulativo ou a complementar por qualquer meio; a Recorrida fez um pedido certo, único e específico, como bem se pode ver através da mera leitura do artigo 141.º da sua P.I., assim como do seu pedido primitivo.
8. A Recorrida deduz um pedido líquido e final na sua P.I., atendendo a critérios por si qualificados como aleatórios e tendo como base um juízo de equidade - este apontado pela Recorrida como indispensável -, vindo com o seu Requerimento ignorar esse mesmo pedido, obliterando-o por completo, colocando de parte o juízo de equidade e os critérios aleatórios, arrogando-se no direito de vir deduzir um pedido novo, de cariz cumulativo, um deles líquido e outro genérico, desta feita assente numa suposta indemnização devida a título de lucros cessantes, por referência aos lucros alegadamente obtidos pelas Recorrentes com a exploração de jogo levada a cabo pela (E) ao longo do período da sua subconcessão, algo que, nos termos do disposto na 1.ª parte, do n.º 2 do artigo 217.º do Código de Processo Civil, teria de ter sido feito em sede de réplica, algo que não sucedeu.
9. Por esse motivo, a alteração do pedido formulada pela Recorrida deveria ter sido indeferida pelo Tribunal a quo, ao contrário do que efectivamente se veio a verificar, tendo esse Tribunal dado amparo a uma pretensão legalmente inadmissível, por violar o disposto no n.º 2 do artigo 217.º do Código de Processo Civil.
10. Jamais o Requerimento deverá ser visto como uma mera ampliação do pedido original da Recorrida, uma vez que o mesmo contraria de forma clara o teor das disposições legais contidas na 2.ª parte, do n.º 2 do artigo 217.º do Código de Processo Civil e no artigo 563.º do Código Civil.
11. Desde logo, nos termos da 2.ª parte do n.º 2 do artigo 217.º do Código de Processo Civil, a Recorrida apenas poderia ampliar o seu pedido caso tal ampliação se revelasse como o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, algo que, no caso concreto, não sucede.
12. De facto, no seu pedido primitivo, apesar de se encontrar na posse de todos os elementos que lhe permitiriam alicerçar um pedido (ainda que infundado) assente em lucros cessantes, como vem agora fazer no seu Requerimento, a Recorrida optou por formular um pedido certo, com base na equidade e em critérios aleatórios, tendo fixado o seu quantum indemnizatório em três mil milhões de patacas.
13. O novo pedido formulado pela Recorrida no Requerimento ora em apreço não vem acrescentar um conteúdo acessório ou complementar da mesma natureza, nem tão-pouco a Recorrida no seu pedido original apenas quis acautelar parte do seu direito.
14. O pedido original formulado na P.I. enformou e conformou a solicitação por parte da Recorrida de uma actuação judicial determinada e que está na base do processo, sendo aquele o efeito jurídico pretendido com a acção proposta.
15. Nem se venha contrapor que a Recorrida ressalvou a hipótese de, melhor documentada, vir a desenvolver o seu pedido durante o decurso da acção (artigo 141.º da P.I.), uma vez que não bastava à Recorrida ressalvar a hipótese de vir desenvolver o seu pedido original, para que este pudesse efectivamente vir a ser desenvolvido.
16. Tal possibilidade de desenvolvimento tem de ser aferida casuisticamente, atendendo não só ao facto de o pedido original ser (ou não) passível de desenvolvimento, como ainda, em caso de resposta afirmativa a essa mesma premissa, ao facto de a ampliação sugerida se afigurar como um efectivo desenvolvimento do pedido original, algo que no caso em concreto não sucede.
17. Já no que concerne à suposta aplicação da disposição legal contida no artigo 563.º do Código Civil ao caso sub judice, ter-se-á igualmente de concluir que a mesma não oferece respaldo à pretensão manifestada pela Recorrida no seu Requerimento, visto que o processo não veio revelar quaisquer danos que fossem superiores aos inicialmente previstos.
18. O Tribunal a quo, no despacho ora colocado em crise, parece entender que o Requerimento da Recorrida deve ser qualificado como um articulado superveniente, atendendo à remissão feita no citado despacho para as disposições contidas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 426.º do Código de Processo Civil.
19. Como é fácil de ver, o Requerimento apresentado pela Recorrida não se compagina com os requisitos formais de um articulado, sendo apresentado como um simples requerimento.
20. Para além disso, em face das condições de admissibilidade de um articulado superveniente, previstas nos artigos 425.º e seguintes do Código de Processo Civil, verifica-se que o Requerimento da Recorrida jamais poderia ter merecido deferimento por parte do Tribunal a quo.
21. Desde logo, a Recorrida teria de ter feito prova de que os factos alegados no Requerimento se afiguravam como objectivamente supervenientes ou que o conhecimento de tais factos havia ocorrido a posteriori, o que não sucedeu.
22. O Requerimento, enquanto suposto articulado superveniente, deveria igualmente ter sido apresentado 15 dias depois da ocorrência da factualidade subjacente ao mesmo, ou do seu conhecimento por parte da Recorrida, o que não se verificou.
23. A Recorrida teria igualmente de fazer a correspondente prova da superveniência do facto ou do conhecimento do facto, sendo de rejeitar o articulado superveniente em que não sejam oferecidas as provas de que os factos nele deduzidos ocorreram nos 15 dias anteriores à produção desse articulado ou que só nesse período a Recorrida deles teve conhecimento, algo que também não ocorreu.
24. Assim sendo, deveria o hipotético articulado superveniente da Recorrida ser rejeitado, por manifestamente extemporâneo, pelo menos no que respeita aos factos expostos pela Recorrida relativos aos Relatórios de Contas da (E) Macau S.A. ínsitos no artigo 11.º do seu Requerimento, com as inerentes consequências face ao novo pedido formulado, tendo o Tribunal a quo, no despacho ora colocado em crise, violado as disposições contidas nos artigos 425.º e 426.º do Código de Processo Civil.
25. O Código Civil consagrou o instituto jurídico do abuso do direito no seu artigo 326.º, materializando-se o mesmo como uma das pedras angulares de todo o nosso sistema jurídico.
26. Actualmente, a aplicação do instituto do abuso do direito em sede do direito processual civil é algo que se afigura indiscutível e absolutamente pacífico.
27. A Recorrida sabe, melhor que ninguém, que jamais poderia exigir das Recorrentes uma indemnização por lucros cessantes.
28. Mesmo que fosse verdadeira a versão dos factos trazida aos autos pela Recorrida - e não o é, não passando de uma fantasia criativa - ainda assim a pretensão da Recorrida carece totalmente de fundamento, como ela bem sabe.
29. O descuido e despreocupação com que a Recorrida formula o seu novo pedido resultam de uma grosseira negligência e são próprios de quem nada tem a perder, alicerçado no facto de a Recorrida ainda se encontra (abusivamente) a gozar de apoio judiciário.
30. De facto, assumindo que a Recorrida assenta o seu novo (e manifestamente infundado) pedido por lucros cessantes nos lucro auferidos pela (E), o cálculo que deles faz enferma de erros grosseiros, os quais, novamente, só se explicam pela leviandade com que a Recorrida pauta a sua conduta, uma vez que litiga à custa dos cofres da RAEM.
31. Ainda que se laborasse sob a premissa errónea de que os fundamentos da presente acção fossem julgados procedentes - o que jamais se concede e apenas por mero dever de patrocínio se cogita -, a verdade é que feito o ajustamento proporcional ao investimento planeado e realizado, levando em conta os prejuízos de 2002 e 2003, as quantias devidas às Recorrentes, o investimento de capital e todas as despesas já enunciadas, o suposto e alegado dano da Recorrida seria, para a participação de 72.5% no capital da concessionária, de aproximadamente 800 milhões de patacas.
32. No entanto, esse valor hipotético teria ainda de ser devidamente mitigado por todos os riscos adicionais que poderiam ter impedido a Recorrida de obter quaisquer lucros em Macau, ainda que tivesse obtido uma concessão provisória para a exploração de jogos de fortuna ou azar em casino, mesmo que com as Recorrentes.
33. Para além disso, o novo pedido formulado assenta na premissa falsa de que o hipotético incumprimento contratual das Recorrentes teria acarretado para a Recorrida a perda da oportunidade de investir na indústria do jogo de Macau, algo que é facilmente desmentido pelo facto de que, caso a Recorrida (ou um dos seus sócios, uma vez que a Recorrida se encontra em liquidação) efectivamente quisesse ter investido na indústria do jogo de Macau, a mesma poderia ter adquirido acções de uma das concessionárias ou subconcessionárias, mormente da (F) ou da (C**) China.
34. A Recorrida pretende, de forma manifestamente infundada, arrogar-se no direito de obter lucros sobre uma actividade que nunca desenvolveu, sem ter alguma vez procedido a qualquer investimento, ou sequer corrido qualquer tipo de risco, típico em qualquer negócio.
35. As supra tecidas considerações encontram respaldo no relatório elaborado por XXX, directora executiva da XXX Consulting, oportunamente junto aos Autos com o requerimento das Recorrentes datado de 02/09/2019, no qual a reputada consultora procedeu à realização dos cálculos necessários ao apuramento do que suposta e alegadamente seria o dano sofrido pela Recorrida, caso os fundamentos da presente acção fossem julgados procedentes - premissa essa meramente hipotética, jamais se concedendo tal possibilidade - e para cujo teor respeitosamente se remete V. Exas..
36. Por mais voltas que a Recorrida pretenda dar aos facto, nunca por nunca conseguirá demonstrar que lhe não foi atribuída uma concessão por razões imputáveis às Recorrentes. A proposta apresentada pela Recorrida estava condenada ao fracasso, por razões que a si são exclusivamente imputáveis.
37. Vir, neste contexto, exigir das Recorrentes uma qualquer indemnização, ainda para mais a título de lucros cessantes, configura um uso manifestamente abusivo do processo por parte da Recorrida, bem sabendo esta que não tem qualquer fundamento ou base factual de onde possa erigir tal pretensão.
38. Em luz da argumentação supra expendida sobre a qual se alicerça a alegação de que a Recorrida actuou em manifesto abuso do processo no âmbito do Requerimento ora em apreço, conclui-se que o Tribunal a quo, ao deferir o citado Requerimento, violou a disposição contida no artigo 326.º do Código Civil.
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A Autora respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 4781 a 4798 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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(4) Do despacho de 28/05/2021:
1. Vem o presente recurso interposto do Despacho de fls. 5061 e seguintes, que indeferiu o pedido de reagendamento da audiência de discussão e julgamento formulado pelas Recorrentes no seu requerimento de fls. 4894 a 4898 (o “Despacho Recorrido”).
2. No requerimento das aqui Recorrentes sobre o qual recaiu o Despacho Recorrido pedia-se que, com fundamento nas restrições à circulação de pessoas adoptadas em Macau com vista ao controlo da pandemia COVID 19, fosse dada sem efeito a audiência designada para se iniciar em 16 de Junho de 2021, sendo a mesmo reagendada para data posterior.
3. Com efeito, as aludidas restrições traduzem-se em que: (i) os legais representantes das Recorrentes, todas com sede nos Estados Unidos da América, assim como os seus advogados nesta jurisdição, estejam de todo impedidos de entrar na Região; (ii) algumas das testemunhas das Recorrentes estejam de todo impedidos de entrar na Região e depor em audiência de julgamento; e (iii) outras testemunhas das Recorrentes, mesmo que autorizadas a entrar na Região, vejam essa sua entrada extraordinariamente onerada, tendo em conta os seus compromissos profissionais e as medidas de observação médica e de autogestão de saúde a que terão que se sujeitar em Macau.
4. O Despacho Recorrido estribou-se essencialmente na consideração de que nestes autos a audiência fora já adiada por duas vezes, razão por que as regras constantes dos artigos 531.º, n.º 1, e 554.º, n.º 3, do Código de Processo Civil impediriam que a audiência fosse uma vez mais adiada.
5. As regras enunciadas como fundamento do indeferimento foram incorrectamente interpretadas e aplicadas, tendo o Tribunal a quo confundido os conceitos de “reagendamento” e “adiamento”, com grave dano para a posição das Recorrentes e levantando sérias dificuldades à descoberta da verdade material e consequente boa resolução do litígio sub iudicio.
6. Dar sem efeito e reagendar não é o mesmo que adiar: (i) adiamento é a designação da figura jurídica que se verifica quando aberta a audiência, esta não pode prosseguir por motivo previsto na Lei; (ii) reagendamento refere-se à situação em que, depois de agendada uma determinada data para realização da audiência, uma qualquer circunstância superveniente vem tornar desnecessário ou inconveniente às finalidades do processo que a audiência vá por diante na data prevista.
7. Nos presentes autos, por um lado, nunca qualquer das partes requereu, assim como o Tribunal a quo nunca determinou, qualquer adiamento da audiência de discussão e julgamento; por outro lado, à data em que as Recorrentes submeteram o seu requerimento de fls. 4894 a 4898, e à data em que o Tribunal a quo proferiu o Despacho Recorrido, a audiência ainda não tinha sido aberta.
8. Entender o contrário, i.e., tomar a pretensão das Recorrentes como um adiamento, poria em crise o que tem sido, de um modo geral, a actuação do Tribunal Judicial de Base perante as dificuldades de produção de prova testemunhal resultantes das medidas de controlo da pandemia COVID 19.
9. Mais ainda: a não se reconhecer distinção entre adiamento e reagendamento, teria então que concluir-se que nos presentes autos teria sido cometida a mesma ilegalidade (a fls. 4881), adiando-se a audiência pela segunda vez, o que certamente não aconteceu.
10. Em luz da argumentação supra expendida, conclui-se que o Tribunal a quo, ao indeferir o pedido de reagendamento da audiência de discussão e julgamento formulado pelas Recorrentes, violou as disposições dos artigos 531.º, n.º 1 e 554.º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
11. Mesmo que se entendesse que o Tribunal a quo estaria correcto naquele entendimento e que a tramitação prevista nos artigos 531.º, n.º 1, e 554.º, n.º 3, do Código de Processo Civil impedia de facto que a audiência fosse dada sem efeito e reagendada para momento posterior, não poderia, ainda assim, deixar-se de, ao abrigo do princípio da adequação formal previsto no artigo 7.º do Código de Processo Civil, deferir a pretensão das Recorrentes.
12. Ao recusar o reagendamento total da audiência, forçando o início da produção de prova testemunhal em Junho de 2021, o Despacho Recorrido criou um contexto processual que faz perigar a inquirição presencial de diversas testemunhas que se encontram fora de Macau, todas elas essenciais e com conhecimento detalhado da matéria em discussão.
13. A verificar-se que uma ou mais dessas testemunhas não poderão ser inquiridas presencialmente no Tribunal a quo, o Despacho Recorrido terá criado perturbação injustificada na actividade probatória, ficando os depoimentos daquelas testemunhas relegados para a forma escrita, coarctando o julgador na sua capacidade de apreender, com a devida amplitude, a verdade dos factos.
14. Com vista a obter-se uma decisão justa, deverá dar-se prioridade à produção de prova em conformidade com o princípio da imediação, segundo o qual se prescreve que a convicção do julgador deverá formar-se após contacto pessoal com as fontes de prova, sem delegações ou intermediações, com proximidade física e temporal entre o Tribunal e a prova produzida.
15. À luz do princípio da adequação formal previsto no artigo 7.º do Código de Processo Civil, colocado numa situação em que a tramitação processual prescrita na lei faz perigar, nas concretas circunstâncias do caso, a viabilidade da imediação da produção de parte significativa e essencial da prova, é dever do juiz ajustar a tramitação àquelas circunstâncias, determinando os actos que se mostrem necessários para o efeito.
16. A isto acresce que, por via da recusa do Despacho Recorrido de reagendar a audiência, ficou também em crise o princípio da concentração, plasmado no artigo 439.º do Código de Processo Civil.
17. A tudo acresce que o início da audiência em Junho de 2021, no contexto então (e ainda) existente de limitação de circulação de pessoas e, em particular, de proibição de entrada em Macau de cidadãos estrangeiros não residentes, criou um quadro de total impedimento da comparência dos representantes das Recorrentes na audiência de discussão e julgamento.
18. A presença dos seus representantes na audiência constitui um direito fundamental das Recorrentes, ao abrigo da garantia de acesso aos tribunais e da tutela jurisdicional efectiva que lhes é assegurada pelo artigo 36.º, n.º 1 da Lei Básica.
19. A prevalecer a visão do Despacho Recorrido sobre a proibição de novo adiamento, terá então que concluir-se que, nas presentes circunstâncias, a tramitação assim prevista na lei se materializa numa afronta às finalidades do processo, neste caso a de produzir uma decisão obtida com precedência de igual e efectivo acesso e participação contraditória na actividade judicial por todas as partes processuais, nos termos dos artigos 1.º, 3.º, n.º 3 e 4.º do Código de Processo Civil, e em linha com o já mencionado artigo 36.º, n.º 1 da Lei Básica.
20. Não tendo procedido aos competentes ajustes à tramitação dos autos, o Despacho Recorrido incorreu, também por esta via, em violação do disposto no artigo 7.º do Código de Processo Civil, pelo que deve ser revogado.
21. A violação, pelo Despacho Recorrido, das normas acima indicadas tem influência sobre o exame da causa, na medida em que, à data da apresentação das presentes alegações de recurso, a audiência de discussão e julgamento está a decorrer (i) em inobservância do princípio da concentração, com grande espaçamento temporal entre sessões, e (ii) sem assistência nem participação dos representantes das Recorrentes, em condições de desigualdade de armas perante a Recorrida.
22. Tal influência ameaça aprofundar-se no futuro próximo, caso venha a ocorrer que, por ver a sua entrada em Macau totalmente impedida ou gravemente onerada, uma ou mais das testemunhas arroladas pelas Recorrentes não possa prestar o seu depoimento pessoalmente e com imediação, como teria sido possível se o Despacho Recorrido tivesse atendido a pretensão das Recorrentes.
23. A descrita influência no exame da causa justifica, nos termos do disposto no artigo 628.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, o provimento do presente recurso.
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A Autora respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 6716 a 6732 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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(5) Do despacho de 17/06/2021:
1. Vem o presente recurso interposto das três decisões contidas no despacho proferido pelo douto Tribunal a quo a fls. 5705 a 5707 (o “Despacho Recorrido”): (i) a decisão vertida no parágrafo 2., nos termos especificados na sua nota de rodapé 5, que determina que existirá uma única oportunidade para colocar questões suplementares às testemunhas que tenham prestado depoimento por escrito; (ii) a decisão vertida no parágrafo 4., conjugada com o teor dos parágrafos 5., 7. e 8., que determina que 15 de Dezembro de 2021 será a data-limite para a produção de prova testemunhal em audiência; e (iii) a decisão vertida no parágrafo 6., que considerou não ser admissível a inquirição de testemunhas por videoconferência, por faltar disposição legal sobre essa matéria.
2. No Despacho Recorrido, o Tribunal a quo consignou decisões que, ao invés de facultarem às partes o pleno recurso aos meios de prova admissíveis, como o princípio da tutela jurisdicional efectiva impõe, acabam por restringir tais meios de prova.
3. Do direito à prova decorre não poder ser retirada às partes a faculdade de recorrer a todos os meios de prova ao seu alcance, para demonstração dos factos alegados, sob pena de inadmissível violação das mais elementares garantias previstas tanto na lei ordinária como na Lei Básica, tudo redundando em efectiva denegação de justiça.
Parágrafo 2. do Despacho Recorrido
4. A decisão contida no parágrafo 2. do Despacho Recorrido, nos termos especificados na sua nota de rodapé 5, por um lado, exclui desde já que as partes possam requerer qualquer ronda adicional de esclarecimentos sobre os depoimentos prestados por escrito, e, por outro lado, arreda, a priori, a possibilidade de as partes virem a requerer a renovação, na presença do Tribunal, dos depoimentos prestados por escrito.
5. As Recorrentes discordam do entendimento assim consignado no referido parágrafo 2., resultante, no seu entender, de uma incorrecta interpretação e aplicação da norma prevista no n.º 4 do artigo 541.º do Código de Processo Civil, bem como de violação dos princípios do contraditório e do inquisitório.
6. Em primeiro lugar, o Despacho Recorrido violou norma expressa, na medida em que o n.º 4 do artigo 541.º do Código de Processo Civil não deixa margem para dúvida no que respeita à possibilidade de renovação do depoimento ou de esclarecimentos em caso de depoimento por escrito.
7. Em segundo lugar, ao permitir às partes apenas uma única oportunidade para colocar questões suplementares quanto ao conteúdo do depoimento por escrito, o Despacho Recorrido viola o princípio do contraditório previsto no n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil.
8. Em terceiro lugar, ao coarctar, a priori, a possibilidade de as partes virem a requerer determinada diligência probatória, o Tribunal a quo incorre em violação dos princípios processuais da verdade material e do inquisitório.
9. Em quarto e último lugar, ao decidir sobre a não possibilidade de renovação dos depoimentos escritos ou de pedido de esclarecimentos sobre eles antes de tais depoimentos serem produzidos e introduzidos nos autos - i.e., com base numa realidade que ainda não se materializou -, a decisão contida no parágrafo 2. do Despacho Recorrido violou o disposto no n.º 4 do artigo 541.º do Código de Processo Civil, devendo, por isso, ser revogada.
Parágrafo 4. do Despacho Recorrido
10. O Despacho Recorrido, no seu parágrafo 4., enferma de erro de julgamento e viola o artigo 6.º, n.º 3, do Código de Processo Civil e os princípios da vinculação do juiz pelo pedido e da apreciação de todos os factos que interessam para a decisão da causa, constantes dos artigos 563.º, n.º 2 e 430.º do Código de Processo Civil, bem como o princípio da universalidade e liberdade dos meios de prova, na medida em que afastou a possibilidade de produção de prova testemunhal em audiência após 15 de Dezembro de 2021, em qualquer circunstância e quaisquer que sejam os desenvolvimentos que entretanto se registem na instrução e discussão da causa.
11. O Despacho Recorrido desconsidera o dever, imposto pela Lei ao Tribunal a quo, de realizar as diligências que sejam necessárias à descoberta da verdade e à boa resolução da causa, tanto mais que nada impede que, se necessário, a produção de prova em audiência tenha lugar para lá da data de 15 de Dezembro próximo.
12. Não se vê, nem o Despacho Recorrido a apontou, motivo que justifique forçar o encerramento da audiência de julgamento em 15 de Dezembro de 2021, com óbvio detrimento dos interesses da administração da Justiça, em particular quando foi a própria Recorrida que decidiu intentar a presente acção quase uma década depois da ocorrência dos factos em análise.
13. O facto de algumas testemunhas das Recorrentes estarem impedidas de entrar na Região e depor em audiência de julgamento não foi valorado devidamente pelo Tribunal a quo ao proferir o Despacho Recorrido, uma vez que é previsível que em 15 de Dezembro de 2021 continuem em vigor as medidas restritivas da circulação de pessoas que impedem de todo a deslocação daquelas testemunhas ao Tribunal.
Parágrafo 6. do Despacho Recorrido
14. O parágrafo 6. do Despacho Recorrido considerou não ser admissível a inquirição de testemunhas por videoconferência, por inexistência de norma legal sobre essa matéria, e ainda porque o Tribunal não dispõe das instalações necessárias para o efeito.
15. As Recorrentes discordam de tal entendimento, por considerarem que (i) a base legal para a inquirição das testemunhas por videoconferência pode ser encontrada no artigo 542.º do Código de Processo Civil, o qual tem amplitude suficiente para permitir a tomada de depoimentos por videoconferência a testemunhas que se encontrem fora de Macau, e (ii) a invocada inexistência de instalações para a realização de tal inquirição é um argumento improcedente, visto que as instalações específicas não são necessárias e o equipamento existe e está por regra presente na própria sala de audiências.
16. Mesmo que se entendesse que os artigos 542.º e 88.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, na sua literalidade, não permitem a inquirição de testemunhas por videoconferência, não poderia, ainda assim, deixar-se de, ao abrigo do princípio da adequação formal previsto no artigo 7.º do Código de Processo Civil, admitir a produção de prova testemunhal por videoconferência.
17. Ao contrário do que o Despacho Recorrido parece sustentar, a realização de diligências ad hoc que se revelem necessárias ou úteis em face de circunstâncias específicas do processo não deve ter-se proibida simplesmente devido à ausência de previsão expressa quanto à admissibilidade de tais diligências.
18. Assim, e mesmo que se entendesse não caber na letra do artigo 542.º de Código de Processo Civil a possibilidade de tomada de depoimentos a testemunhas por via de videoconferência, nas presentes circunstâncias, o Tribunal a quo deveria socorrer-se do seu poder de adequação formal para permitir que a prova testemunhal se produza através do meio mais expedito, seguro e aproximado ao de uma inquirição pessoal, assegurando, em particular, sua oralidade e quase imediação.
19. Mais concretamente, a fim de ajustar a tramitação da causa nos termos que as circunstâncias exigem, o Tribunal a quo deveria lançar mão do poder de adequação formal e, no que à matéria do presente recurso importa, permitir a inquirição por videoconferência das testemunhas que se encontram fora da Região e que, em virtude das restrições impostas pelo combate à pandemia COVID 19, não possam comparecer em Tribunal na data designada para a sua inquirição, ou vejam essa comparência onerada pela imposição de medidas de quarentena à chegada a Macau e/ou ao regresso aos seus países de origem.
20. Não tendo procedido aos competentes ajustes à tramitação dos autos, o Despacho Recorrido incorreu, também por esta via, em violação do disposto no artigo 7.º do Código de Processo Civil, pelo que deve ser revogado.
21. A violação, pelo Despacho Recorrido, das normas acima indicadas tem influência sobre o exame da causa, na medida em que as três decisões em causa configuram restrições em matéria de produção de prova testemunhal.
22. A descrita influência no exame da causa justifica, nos termos do disposto no artigo 628.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, o provimento do presente recurso.
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A Autora respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 6734 a 6745 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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(6) Do despacho de 24/10/2022:
1. Em 19 de Setembro de 2022, foi emitida guia para pagamento de preparos com o n.º TJB20220123420, no valor de MOP48.230.860,00;
2. O cálculo de tais preparos teve por base a atribuição à Acção Principal do valor tributário de MOP96,454,156,627.00, na sequência de alteração/ “ampliação” do pedido formulada pela Autora em 15 de Julho de 2019;
3. As Recorrentes haviam respondido a esse requerimento de alteração/ “ampliação”, impugnando o seu teor e fazendo uma detalhada análise económica e financeira que demonstrava como a ampliação excedia largamente quaisquer danos de que a Autora alegadamente devesse ser ressarcida.
4. Sustentaram então as Recorrentes que o pedido de alteração/ “ampliação” do pedido não tinha fundamento atendível, configurando um exercício absolutamente abusivo, contrário aos ditames da boa fé e ao arrepio dos elementos constantes dos autos;
5. O Tribunal a quo considerou que o pedido formulado pela Autora era passível de enquadramento nos artigos 217.º, n.º 2, e 416.º, n.º 1 e 2, do CPC, tendo aceitado o mesmo;
6. As Recorrentes interpuseram recurso do despacho que deferiu a alteração/ “ampliação”, requerendo expressamente que o recurso fosse admitido com subida imediata e em separado, assim como que lhe fosse atribuído efeito suspensivo;
7. O recurso então interposto pelas Recorrentes foi admitido com subida diferida e com efeito meramente devolutivo;
8. Nos termos do artigo 602.º do CPC, esse recurso ficou a aguardar pelo primeiro que, depois dele, viesse a subir imediatamente na Acção Principal, nomeadamente, na falta de outro, o recurso a interpor da decisão de mérito;
9. A Sentença da Acção Principal foi proferida em 28 de Abril de 2022;
10. Nela, o Tribunal Judicial de Base julgou totalmente improcedente o pedido da Autora, e, em conformidade, absolveu integralmente as aqui Recorrentes;
11. Mais considerou que a Autora litigou de má fé relativamente a determinadas alegações que produziu e condutas processuais que protagonizou, entre elas a formulação do pedido alterado/“ampliado”, cujo valor a Sentença da Acção Principal considerou ter sido empolado de forma gravemente negligente;
12. A Autora interpôs recurso da Sentença da Acção Principal, tendo apresentado alegações de recurso a que as ora Recorrentes responderam em 19 de Setembro de 2022, tendo sido a apresentação dessas contra-alegações que motivou a emissão da Guia ora em crise;
13. Entendem as Recorrentes que a cobrança de preparos inicial e para julgamento em valor tão elevado não pode ter lugar, por várias ordens de razões a que o Tribunal recorrido decidiu não atender:
Violação do princípio da igualdade das partes
14. Dispõe o artigo 4.º do CPC que “[o] tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais”;
15. O princípio da igualdade das partes filia-se no princípio geral de igualdade previsto no artigo 25.º da LB, assim como no artigo 14.º do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos;
16. Face aos contornos do caso em concreto, verifica-se que não vêm existindo uma identidade de oportunidades e paridade simétrica entre as posições das partes, configurando a Guia ora colocada em crise um exemplo notório da enorme desigualdade entre essas posições;
17. A Autora, por gozar de apoio judiciário, não se vê confrontada com as consequências da alteração/ “ampliação” do seu pedido, para montantes absolutamente astronómicos. de forma gravemente negligente;
18. Por seu turno, as Recorrentes estão oneradas com o potencial pagamento de um montante astronómico para responderem ao recurso interposto pela Autora de uma sentença que julgou totalmente improcedente o pedido formulado contra as Recorrentes, montante esse que poderão nunca ter hipótese de reaver;
Prolongamento dos efeitos do abuso processual da Autora
19. A exigência daquele montante é ainda mais chocante quando se constata que o valor da Acção Principal foi ditado exclusiva e arbitrariamente pela Autora, que, não tendo que pagar preparos, pôde dar-se ao luxo de pedir o valor que bem entendeu;
20. O instituto do apoio judiciário de que a Autora beneficia tem por escopo contribuir para a concretização do princípio de igualdade de armas entre as partes e como garantia de acesso à Justiça a quem não se encontra dotado dos meios necessários para tal;
21. In casu, o que observa é que a Autora faz do apoio judiciário a principal arma do seu “arsenal”, usando-o para atacar as Recorrentes, tornando-lhes a litigância tão exorbitantemente dispendiosa que as força a tomar decisões processuais com base igualmente em considerações económicas;
22. Tal abuso torna-se ainda mais gritante quando se recorda que na Sentença da Acção Principal a Autora foi condenada como litigante de má fé, sendo um dos fundamentos para tal condenação a conduta gravemente negligente na dedução, em sede de alteração/ “ampliação” de um pedido tão extraordinariamente exagerado e infundado;
23. A litigância de má fé reconduz-se à figura mais ampla do abuso de direito, prevista no artigo 326.º do Código Civil;
24. O escopo geral do instituto do abuso de direito é o de proteger a parte contra quem o exercício abusivo é dirigido, evitando que tenha suportar os efeitos do abuso;
25. Tal protecção alcança-se mediante a paralisação desses efeitos, podendo envolver diferentes tipos de tutela, consoante as características e consequências do abuso que concretamente esteja em causa;
26. A Autora litiga com apoio judiciário na modalidade de dispensa de preparos, o que significa que ao longo da tramitação dos autos não tem feito qualquer pagamento susceptível de garantir, mesmo que em parte, a responsabilidade por custas que sobre ela venha a recair a final;
27. Acresce que a Autora é uma sociedade em liquidação, não possuindo qualquer activo conhecido que sirva de garantia patrimonial daquela responsabilidade, ou de qualquer outra;
28. É, pois, seguro que a Autora não cumprirá com qualquer condenação em custas de que venha a ser alvo, nem por meio de preparos, nem de pagamento voluntário, nem de execução coerciva;
29. A tutela útil da posição das Recorrentes face à conduta abusiva da Autora deve, assim, consistir em evitar que tenham de despender preparos acrescidos, evitando que o dano se produza, justificando-se uma interpretação teleológica e por maioria de razão da norma do artigo 386.º, n.º 1 do CPC;
30. Tal resposta é também justificada pela já vista natureza do instituto do abuso de direito enquanto resposta do sistema à antijuridicidade, e, em qualquer caso, pode enquadrar-se no âmbito dos poderes de direcção processual previstos no artigo 6.º do CPC, orientados que estão para a composição justa do litígio;
Violação do direito de propriedade, do princípio da proporcionalidade tributária e do direito a tutela jurisdicional efectiva
31. Ao imobilizar e potencialmente retirar uma parcela de elevado valor do património das Recorrentes, à margem de qualquer relação com o plausível valor económico da Acção Principal, a exigência de preparos no montante em causa constitui uma erosão desproporcional, inadequada e desnecessária do direito de propriedade das Recorrentes, direito fundamental estatuído e protegido nos artigos 6.º e 103.º, n.º 3, da LB;
32. Acresce que a taxa de justiça que serve de base ao cálculo dos preparos exigidos às Recorrentes é manifestamente desproporcional face à actividade judicial que visa remunerar, em termos tais que cerceiam o direito das Recorrentes a uma tutela jurisdicional efectiva;
33. A taxa de justiça traduz-se na contrapartida ou “preço” cobrado pelos Tribunais, correspondente aos serviços prestados no âmbito de um processo submetido à apreciação jurisdicional;
34. Sendo uma taxa em sentido técnico, com carácter bilateral e sinalagmático, e tendo como correspectivo ou contraprestação a actividade jurisdicional exercida pelos Tribunais, a taxa de justiça não pode estar isenta de ponderações de justiça e proporcionalidade sobre o seu valor;
35. Na determinação do valor da taxa de justiça, a Lei manda atender ao valor da causa, procurando estabelecer uma relação entre esse valor e a retribuição devida pela actividade dos Tribunais (cf. artigo 12.º, n.º 1, do RCT);
36. Trata-se de um sistema que funciona adequadamente em processes normais, assegurando que as custas pagas reflectem o custo do processo para o erário público e são proporcionais ao valor do pedido em si mesmo;
37. Contudo, em resultado da inusitada alteração/ “ampliação” do pedido levada a cabo pela Autora em 2019, o pedido passou a ser de MOP96.454.156.627,00 - um valor totalmente anormal, sem precedentes na história judicial da RAEM;
38. Neste contexto, a aplicação estrita dos critérios legais resultou no apuramento da taxa de justiça do recurso da Sentença da Acção Principal em MOP$96.450.200,00;
39. Ora, tributar a apreciação de um recurso com urna taxa de justiça de valor superior a 96 milhões de patacas constitui violação do princípio da proporcionalidade e de normas fundamentais da LB;
40. No seu artigo 106.º, a LB reconhece “a política de baixa tributação anteriormente seguida em Macau” e manda que a Região Administrativa Especial dê continuidade a essa política, produzindo, “por si própria, as leis respeitantes aos tipos e às taxas dos impostos e às reduções e isenções tributárias, bem como a outras matérias tributárias.”;
41. Constitui princípio basilar que da aplicação formal das normas legais não pode resultar a ofensa de valores fundamentais do ordenamento jurídico, como sejam os princípios da justiça material e, em particular, o princípio da proporcionalidade, em especial na sua vertente de proibição do excesso;
42. E mais se reforça o entendimento da exigência firme de juízos de proporcionalidade na aplicação do Direito quando se bule com direitos fundamentais, aqui se impondo ao intérprete-juiz o princípio da sua vinculação aos direitos fundamentais e concomitante interpretação conformadora;
43. Sendo verdadeiro que a LB não veicula de forma expressa o princípio da proporcionalidade, também verdadeiro é que emanações ou afloramentos do princípio da proporcionalidade são comummente aceites e dados como adquiridos;
44. Para além do patamar superior da LB face a qualquer instrumento legislativo da RAEM, a estatuição do princípio da proporcionalidade é vasta e diversificada, apresentando-se corno um sólido acquis no ordenamento jurídico de Macau;
45. Disso são exemplos o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, artigo 4.º, n.º 1, e artigo 25.º, ou o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, artigo 4.º, Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, artigos 2.º e 12.º, n.º 4;
46. A aplicação de tal princípio é ainda imposta pelos limites imanentes aos tributos bilaterais, nos quais se inclui a taxa de justiça;
47. É a violação da proporcionalidade em sentido estrito, enquanto vínculo de correspectividade entre prestações, que as Recorrentes invocam em abono da sua posição;
48. Estando em causa uma taxa de justiça, de cujo pagamento depende a prática de actos em juízo, impõe-se concluir que as normas tributárias que permitem a fixação da dita taxa em valores como os aplicados nos presentes autos coarctam intoleravelmente o efectivo acesso dos sujeitos passivos aos Tribunais e à Justiça;
49. Nenhum indivíduo médio ou sociedade média é verdadeiramente livre de conformar a sua conduta processual de acordo com a prossecução dos seus legítimos interesses se, por simples que seja, cada pedido, oposição ou recurso for tributado em dezenas ou centenas de milhões de patacas, por consequência cega e automática do valor da causa;
50. A aceitar-se este estado de coisas, poderá verificar-se a aplicação de normas ao caso concreto, mas estar-se-á a abrir a porta para a denegação de Justiça, a ablação de direitos fundamentais, a violação de normas superiores do ordenamento jurídico;
51. É, pois, necessário que o resultado da aplicação formal dos critérios legais seja subordinado a um juízo de ponderação material - de proporcionalidade em sentido estrito - com a actividade efectivamente exercida pelos Tribunais;
52. É manifesto que o valor de taxa de justiça de MOP96.450.200,00 é de tal forma ausente de correlação com a actividade jurisdicional que é solicitada aos Tribunais - rectius, apenas a este Tribunal de Segunda Instância - que se mostra insanavelmente desproporcional e irrazoável;
53. Os preparos agora exigidos às Recorrentes importam num valor de tal magnitude que não é razoável esperar que qualquer utente do sistema de justiça da RAEM, qualquer que seja o seu estatuto económico-financeiro, deva ter de pagá-lo;
54. Acresce que, mesmo que possa considerar-se que o supra mencionado juízo de proporcionalidade apenas possa ser feito a final, quando esteja já encerrada a actividade do Tribunal, não pode deixar de atender-se às respectivas considerações no momento da exigência às partes de preparos;
55. Os preparos são meros adiantamentos por conta da taxa de justiça devida a final, pelo que a sua exigência deverá estar subordinada às mesmas ponderações de correspectividade e proporcionalidade que recaem sobre a própria taxa;
56. Como tal, não pode deixar de atender-se a que a exigência de preparos no valor de MOP48.230.860.00 não tem, também ela, qualquer relação com a actividade jurisdicional que este Tribunal será chamado a exercer;
57. A não ser tomada em linha de conta a sustentada ideia de proporcionalidade e de equilíbrio, serão colocados elevados entraves ao direito de acesso aos Tribunais, redundando em violação do direito a tutela jurisdicional efectiva plasmado no artigo 36.º da LB;
Desaplicação das normas em que se baseia a exigência de preparos adicionais, com fundamento em violação da Lei Básica
58. No seu artigo 83.º, a LB prescreve que os tribunais da Região Administrativa Especial de Macau exercem independentemente a função judicial e estão apenas sujeitos à lei - e a primeira delas (hierarquicamente falando) é, precisamente, a LB, tal como estatui o seu artigo 11.º;
59. Anote-se ainda o estatuído no n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 13/2009: “[a] validade das leis, dos regulamentos administrativos independentes, e dos regulamentos administrativos complementares e demais actos normativos internos da RAEM depende da sua conformidade com a Lei Básica”;
60. Os Tribunais têm plenos poderes para conhecer da violação da LB por normas do ordenamento jurídico interno da Região e, quando concluam que tal violação ocorre, têm igualmente plenos poderes para desaplicar as normas em causa;
61. Embora nenhuma norma da LB atribua aos Tribunais, de forma expressa, o poder de conhecer de violações das suas normas por preceitos constantes de leis, regulamentos ou outros actos normativos hierarquicamente inferiores, a efectiva existência de um tal poder extrai-se de várias normas da mesma LB;
62. Concretamente, o 2.º parágrafo do artigo 143.º da LB autoriza os Tribunais a interpretarem, no julgamento de causas, as normas da referida Lei que se contenham nos limites da autonomia da Região;
63. Esta autorização não teria qualquer sentido se os Tribunais, na sua actividade de interpretação das mencionadas normas da LB, não pudessem concluir que elas são contrariadas por normas hierarquicamente inferiores, e não pudessem, em consequência, desaplicar os preceitos violadores, tanto mais que o artigo 11.º da mesma LB expressamente consigna que nenhuma lei, decreto-lei, regulamento administrativo ou acto normativo da Região pode contrariar a LB;
64. Assim, impõe-se que este Tribunal desaplique as normas do RCT que determinam a fixação da taxa de justiça por puro cálculo aritmético e sem atender a juízos de proporcionalidade entre o valor dessa taxa e a intensidade da actividade dos Tribunais no julgamento da causa, por violação do princípio da igualdade ancorado no artigo 25.º da LB, com uma dimensão processual de igualdade de armas, bem como por desconsideração do princípio geral da proporcionalidade em matéria de direitos fundamentais. e por violação do direito fundamental a uma tutela jurisdicional efectiva, prescrito no artigo 36.º da LB;
Crédito das Recorrentes por preparos de recurso não devidos
65. Em 2 de Junho de 2016 e em 19 de Setembro de 2016, no âmbito dos apensos A e B da Acção Principal, as Recorrentes pagaram o valor de MOP3.007.520,00, a título de preparos inicial e para julgamento de recursos ordinários interpostos pelas Recorrentes (o primeiro, da decisão que indeferiu a excepção de caso julgado, o segundo, do despacho que indeferiu a suspensão da instância);
66. À época, as respectivas guias de preparos foram emitidas e pagas porque o primeiro recurso foi admitido para ser apreciado em separado e com subida imediata;
67. Porém, ambos aqueles recursos acabaram por ser admitidos no regime de subida diferida, razão por que não seriam devidos por eles quaisquer preparos;
68. Nem a Secretaria, ao emitir a Guia, nem o Despacho Recorrido, tomaram em consideração o valor assim pago (e supervenientemente indevido) pelas Recorrentes, e nunca restituído;
69. Tal valor sempre deveria ser levado a crédito das Recorrentes e deduzido a qualquer preparo de recurso que se considere ser devido por elas;
Suspensão a Instância - Recurso Prejudicial
70. Toda a discussão que se leva a cabo no presente recurso está predicada na admissão da alteração/ “ampliação” do pedido formulado pela Autora na Acção Principal - “ampliação” que a Sentença da Acção Principal julgou ter sido manifestamente exagerada, por negligência grave da Autora, ao ponto de esta ter sido condenada enquanto litigante de má fé;
71. A pretensão deduzida pelas Recorrentes, e cujo indeferimento motivou a interposição do presente recurso, foi a de que fosse dada sem efeito a Guia em apreço, cujo cálculo teve na sua base, precisamente, a admissão da alteração/ “ampliação” do pedido;
72. Não fora aquela admissão e a alteração do valor processual e tributário da Acção Principal que dela resultou, os preparos para recurso a cobrar pela apresentação das contra-alegações das Recorrentes teriam sido calculados com base no valor tributário de MOP$3,000,000,000.00 que a Autora inicialmente atribuiu à Acção Principal;
73. O mesmo é dizer que, se o recurso interposto pelas aqui Recorrentes do despacho que admitiu a alteração/ “ampliação” do pedido vier a ser provido, o presente recurso perderá a sua razão de ser;
74. Por via de um tal provimento, a alteração/ “ampliação” deduzida pela Autora será rejeitada, por inadmissível, com o que não subsistirá qualquer motivo para a alteração do valor processual e/ou tributário da Acção Principal;
75. Nesse contexto, retornando a Acção Principal ao seu primitivo valor processual e tributário, os valores já preparados pelas Recorrentes em 2016 a título de preparos para recurso são suficientes para fazer face aos novos preparos a liquidar, e assim deixará de ter qualquer relevância toda a discussão que constitui o objecto do presente recurso;
76. A descrita dependência reclama que, nos termos do disposto no artigo 223.º, n.º 1, primeira parte, do CPC, se determine a suspensão da presente instância recursória, até decisão definitiva do Recurso Prejudicial;
Suspensão de anterior recurso sobre matéria idêntica
77. Em 10 de Julho de 2021 as Recorrentes receberam uma guia para pagamento de reforço de preparos inicial e para julgamento da Acção Principal, que pretendia cobrar a diferença entre os preparos inicial e para julgamento oportunamente pagos pelas Recorrentes, com base no valor do pedido formulado na petição inicial de 19 de Janeiro de 2012, e aqueles que resultariam da alteração/ “ampliação” formulada pela Autora, diferença essa que a secção computou em MOP93.454.200,00;
78. Por requerimento de 20 de Julho de 2021, que deu origem ao incidente processado como Apenso C da Acção Principal, as Recorrentes requereram que fosse dada sem efeito essa guia;
79. Indeferida tal pretensão, as Recorrentes interpuseram recurso, que foi admitido com subida imediata e efeito suspensivo, e cujos fundamentos são, no essencial idênticos aos do presente;
80. Posteriormente, as Recorrentes requereram que a apreciação do aludido recurso fosse suspensa até trânsito em julgado da decisão a recair sobre o mesmo Recurso Prejudicial que ora invocam;
81. E, em 5 de Julho de 2022, este Tribunal de Segunda Instância atendeu à pretensão das Recorrentes, determinando a suspensão da instância recurs6ria nos termos que vinham requeridos;
82. As razões que estiveram na base dessa decisão procedem integralmente quanto ao presente recurso;
83. Como tal, deverá ser ordenada a suspensão da presente instância recursória, ficando esta a aguardar a decisão que venha a incidir sobre o Recurso Prejudicial, sendo que, em caso de provimento deste, o presente recurso perderá razão de ser e utilidade;
Subsidiariamente - motivo justificado de suspensão
84. Como acima se explanou, entendem as Recorrentes que se está, in casu, em presença de uma verdadeira relação de dependência entre os dois recursos em apreço, em termos tais que justificam que a presente instância recursória seja suspensa;
85. Não obstante, mesmo que assim não se entenda, consideram as Recorrentes que a requerida suspensão deverá ser de igual modo decretada, ainda que por fundamento distinto;
86. Dispõe o mesmo artigo 223.º, n.º 1, in fine, que o juiz pode ordenar a suspensão da instância quando para tal ocorra motivo justificado, distinto da dependência da decisão a proferir numa outra causa;
87. No caso em apreço, a conveniência de se dirimir primeiramente a questão da admissibilidade da alteração/ “ampliação” do pedido formulado pela Autora na Acção Principal afigura-se evidente;
88. Na verdade, ainda que viesse a considerar-se que a decisão do presente recurso não está estritamente dependente da decisão a proferir no Recurso Prejudicial, não poderia negar-se que, do prisma da economia e eficácia processual, existem vantagens em que a decisão do presente recurso aguarde pela do Recurso Prejudicial;
89. A admissão da alteração/ “ampliação” do pedido da Autora na Acção Principal é, como se disse supra, o evento processual em que radica a discussão que constitui o objecto do presente recurso;
90. A suspensão da instância recursória será, pois, apta a evitar que os recursos deste Tribunal de Segunda Instância se mobilizem, eventualmente em vão, para a apreciação de um conjunto complexo de questões, que o Recurso Prejudicial poderá, em caso de provimento, cortar pela raiz.
*
Foram colhidos os vistos legais.
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II – FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1. A Autora é uma sociedade anónima que se encontra em liquidação, tendo por objecto social a exploração de jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casino. (已證事實A項)
2. No Outono de 2001 o Governo da R.A.E.M. anunciou publicamente que iria lançar um concurso para a exploração de jogos de fortuna ou azar em casino na Região. (已證事實B項)
3. A Autora decidiu apresentar-se a concurso e precisava de encontrar empresas com experiência na actividade de exploração de casinos dispostas a participar no empreendimento. (已證事實C項)
4. A Autora, formou a ideia de que teria sucesso em Macau um casino constituído segundo o Venice-themed resort que a (E) Resort possui e opera em Las Vegas, Nevada. (已證事實D項)
5. Na sequência de anteriores negociações – e ainda antes da abertura do Concurso do Jogo em Macau – a 1ª Ré elaborou e endereçou à Autora uma”Letter of Intent”, redigida na língua inglesa, datada de 18 de Outubro de 2001, assinada por (T8), em sua representação, junta com a Petição Inicial como documento nº 2, cujo teor aqui se dá por reproduzido e do qual consta, em tradução para a língua portuguesa, designadamente que:
“Assunto: Proposta para desenvolvimento de um Casino em Macau
Exmo. Senhor (X1)
O objectivo desta “Letter of Intent” é o de apresentar uma proposta nos termos da qual a (E) Venture Development, uma sociedade comercial de responsabilidade limitada do Estado de Nevada, pretende, directa ou indirectamente através de uma ou mais filiais (todos, de ora em diante, colectivamente designados como “(E*)”), trabalhar em conjunto com a (A), uma sociedade de Macau (o “Promotor”) no sentido de obterem uma concessão para exploração de jogos de fortuna e azar e levarem a cabo o desenvolvimento e exploração de um casino, hotel e outras utilidades (o “Resort”) num determinado terreno descrito em baixo a ser adquirido pelo Promotor (o “Terreno”). O objectivo desta carta é o de estabelecer uma declaração geral de intenções acerca do modo como pretendemos levar a cabo o negócio (transactions) aqui contemplado:
1. Distribuição do Capital Social pelos sócios do Promotor:
Nome
Percentagem do Capital Social
Uma sociedade subsidiária totalmente dominada pelo XX Bank (“XXB”)
51%
(E*) (ou filial desta)
Opcão de Compra de 27,5%
Sr. (X1)
10%
Sócios locais – Sr. (X2) e Sr. (X3)
11,5%
100%
… A única actividade do Promotor será titular o Resort, …. A (E*) é uma subsidiária da (E) Casino Resort Hotel, proprietária e operadora do maior casino, hotel, centro comercial, centro de conferências e de facilidades de feiras comerciais no mundo, sendo um operador experiente de casinos num mercado altamente regulado.
2. A (E*) celebrará um acordo de desenvolvimento com o Promotor. Este acordo de desenvolvimento estabelecerá o método de selecção de designers, incluindo o arquitecto, o designer de interiores e o empreiteiro, entre outros. … O design do Resort basear-se-á na experiência e conhecimento da (E*), em estudos de mercado e nas contribuições de investidores locais. A (E*) trabalhará em conjunto com todos os profissionais seleccionados na obtenção do design pretendido para o Resort. As equipas técnicas (para a áreas do jogo, da contabilidade e do direito), bem como os consultores jurídicos, políticos e contabilísticos da (E*), nos EUA e em Macau, coordenarão as respectivas actividades com as do Promotor, quer quanto ao design do Resort, quer quanto à obtenção da licença para exploração dos Jogos de Fortuna e Azar. O Promotor ressarcirá todas as despesas da (E*) realizadas no âmbito da prestação destes serviços, incluindo os salários atribuídos aos funcionários da (E*) (com excepção dos salários de (T8) e (T12)), viagens, despesas correntes, consultadoria e design. Todos os planos finais estarão sujeitos a aprovação conjunta. Serão também estabelecidas conjuntamente as metas intermédias relativamente todos os procedimentos governamentais, de modo a fiscalizar a viabilidade do projecto, garantir a emissão da licença de exploração e assegurar a obtenção de todas as deliberações necessárias à sua execução. A continuidade do processo de planeamento dependerá da satisfação dessas metas intermédias. O acordo de desenvolvimento conterá uma cláusula sobre a taxa de consultadoria a ser paga pelo Promotor à (E*), equivalente a 3% dos custos totais do projecto, a qual não prejudicará o ressarcimento das despesas supramencionadas. …. No caso da licença de exploração do Resort ser emitida em nome da (E*), a taxa de consultadoria será paga, mediante opção da (E*), no momento do “cumprimento substancial” (noção que será definida pelos Contratos Definitivos ) da primeira fase do Resort ou no momento do incumprimento, pelo Promotor, em completar essa primeira fase do Resort, cuja data será estabelecida pelos Contratos Definitivos...
A. O promotor concordará em adquirir, por termos razoavelmente aceitáveis pela (E*), um terreno...
B. O promotor e a (E*) deverão envidar todos os esforços no sentido de obterem quaisquer autorizações, licenças ou deliberações necessárias ao licenciamento do projecto. Sem prejuízos desses esforços, o Promotor e a (E*) deverão coordenar e comunicar com os Governos da RAEM e da R.P. da China, e fazer lobby para a obtenção da concessão de jogo e para a aprovação de leis e regulamentos de jogo de nível aceitável. O Promotor e a (E*) devem manter contactos regulares com vista à coordenação de todas estas actividades e comunicações.
C. O Promotor e a (E*) devem comprometer-se a cumprir todas imposições aplicáveis das leis da R.P. da China e dos EUA (incluindo, mas não se limitando ao “US Foreign Corrupt Practices Act” e ao “Nevada Gaming Control Act and Regulations”) na condução de todas as actividades de qualquer modo relacionadas com o Resort e devem contribuir, cooperar e coordenar-se mutuamente no cumprimento de tais leis. O Promotor e quaisquer dos seus funcionários, representantes, consultores ou associados devem abster-se de, directa ou indirectamente, praticar quaisquer actos que possam produzir efeitos negativos sobre a (E*). Igualmente, a (E*) e quaisquer dos seus funcionários, representantes, consultores ou associados devem abster-se de, directa ou indirectamente, praticar quaisquer actos que possam produzir efeitos negativos sobre o Promotor, exceptuando os actos cuja prática seja exigida da (E*) por entidades reguladoras.
3. A (E*) celebrará um acordo de gestão com o Promotor com vista à gestão do Resort. Esse acordo incluirá uma taxa de gestão a ser paga à (E*), a qual consistirá nos seguintes valores:
i. …
A. ...
B. ...
C. Após emissão de licença de exploração de jogos de fortuna e azar devidamente comprovada, ou após selecção enquanto promotor preferencial pela Comissão de Jogos de Macau, a (E*) recrutará e formará todo o pessoal de gestão e restantes envolvidos na exploração do casino proposto e instalações conexas. O contrato de gestão terá duração igual ao termo pelo qual a licença de exploração do Resort tiver sido emitida, incluindo renovações, e conterá as cláusulas que as partes acordarem entre si.
D. O contrato de gestão definitivo atribuirá ao Promotor o direito de fiscalização periódica das contas e registos da (E*).
4. A (E*) celebrará com o Promotor um acordo de licenciamento relativo à utilização de nomes e materiais da (E*), incluindo a designação “E**” para fins operacionais e de marketing relacionados com o Resort. Este acordo deverá prever uma taxa de licenciamento, a ser paga à (E*), no montante de 1,5% do total das Receitas Brutas do Resort, durante todo o período de utilização, pelo Resort, de tais nomes e materiais. O acordo de licenciamento cessará automaticamente a partir do momento em que a (E*) manifeste não poder participar na gestão ou exploração do Resort.
5. O Promotor concorda desde já em conceder à (E*), aquando da celebração dos Contratos Definitivos referidos em baixo, um direito de opção de compra de 27% das acções em circulação do Resort. Este direito poderá ser exercido dentro de dois anos após a atribuição da concessão de jogo para o Resort ou um ano após a conclusão do Resort, consoante o que for posterior (“Data de Exercício”). O preço de aquisição das acções objecto do direito de opção (“Preço de Aquisição”) será igual ao “custo” efectivo das mesmas para o Promotor, acrescido dos lucros não distribuídos. “Custo” corresponderá ao valor contabilístico líquido das verbas investidas no Resort, tal como fiscalizadas por uma empresa de auditoria internacionalmente reconhecida e designada pela (E*), dividido pelo número total de acções em circulação, de modo a conhecer-se o preço de aquisição por acção a pagar pela (E*).
A. ....
6. Estes termos estão, naturalmente, condicionados à aprovação pela Comissão de Jogo de Macau (“CJM”) e pela Nevada Gaming Control Board [Comissão de Jogo de Nevada] (“NGCB”), bem como ao licenciamento pela CJM e NGCB de quaisquer pessoas ou entidades de algum modo relacionadas ou afiliadas com o Promotor, incluindo, nomeadamente, os seus gestores, administradores, funcionários, accionistas, mutuantes, fornecedores ou consultores do Promotor, nos termos exigidos pelas CJM e NGCB. Se a CJM e a NGCB não aprovarem a estrutura das transacções referidas nesta carta, a estrutura será modificada por forma a obter os mesmos resultados financeiros sem risco ou consequência para as licenças tituladas por quaisquer pessoas ou entidades afiliadas da (E*), incluindo, nomeadamente, a (C) e a (D). É naturalmente aceite que a entidade irá efectivamente investir deverá ser apta e licenciável de acordo com as leis dos Estados Unidos da América, Nevada, China, Macau e quaisquer outras leis ou regulamentos aplicáveis. No caso de qualquer participante no projecto proposto não ser considerado aceitável por qualquer autoridade reguladora, deverá ser imediatamente excluído de qualquer participação no projecto ser imediatamente desassociado do projecto em qualquer qualidade possível.
7. Estes termos e os Contratos Definitivos estão também condicionados à aprovação da legislação do Jogo de Macau que sejam consideradas satisfatórias pela (E*) e ao acordo do Promotor em cumprir todas os controles internos recomendados pela (E*) para facilitar as operações casino e do resort (incluindo, nomeadamente, disposições relativas a jogo responsável, crédito, contabilidade e controlo de cobranças, procedimentos e práticas, exclusão de pessoas não idóneas e outras matérias).
8. ...
9. ...
10. A partir da data da celebração desta carta, até não depois de 15 de Novembro de 2001 ou até à notificação escrita do término das negociações, o Promotor deverá negociar exclusivamente com a (E*) e a (E*) deverá negociar exclusivamente com o Promotor para realização das transacções aqui consideradas, e não solicitará ou encorajará (através da prestação de informações ou de qualquer outra forma) quaisquer outras perguntas ou propostas, ou celebrar qualquer outro acordo, relativos ao negócio objecto deste acordo. Estas obrigações deverão ser respeitadas por todas as afiliadas, sócios, outros participantes, directos e indirectos, do Promotor ou da (E*).
11. A realização dos negócios aqui estabelecidos deverá ainda respeitar o seguinte:
A. ...
B. A forma e o conteúdo dos Contratos Definitivos e de todos os outros documentos e instrumentos a serem entregues, nos termos do presente acordo, deverão ser objecto da concordância da (E*) e do Promotor.
12. Os termos e as condições básicas previstas nesta proposta deverão ser mais detalhadamente estabelecidos nos contratos de construção, exploração e de opção de compra de acções (conjuntamente designados “Contratos Definitivos”) a ser celebrados entre a (E*) e o Promotor e preparados pelos respectivos advogados. Os Contratos Definitivos deverá conceder às partes o poder de fazer declarações, estabelecer garantias e indemnizações, tal como é habitual em negócios similares. Os Contratos Definitivos conterão os termos mutuamente aceites de resolução de conflitos, os quais determinarão que qualquer litígio que não possa ser solucionado negocialmente: i) deverá ser submetido ao Sr. (X1) e Sr. (T8), na qualidade de representantes, respectivamente, do Promotor e da (E*), para mediação, e se a disputa não for solucionada por esta via, deverá ser submetida a Arbitragem vinculativa, com um árbitro independente, escolhido por ambas as partes, com experiência e conhecimento do assunto em litígio. É intenção das partes preparar, negociar e executar os Contratos Definitivos, logo que possível, com a celebração a ser agendada logo que todas as condições precedentes se mostrem cumpridas.
13. Assuntos Diversos
A. …
B. …
C. Esta carta “letter of intent” está sujeita à lei de Macau;
D. Os direitos e obrigações respectivos das partes aqui prescritos não serão transmitidos sem o consentimento prévio escrito da contraparte; a (E*) pode, porém, transmitir os seus direitos e obrigações para qualquer entidade detida ou por si controlada, directa ou indirectamente, pela (C) ou qualquer um das suas subsidiárias.
E. O Sr. (X1) declara e garante que tem o completo poder e autoridade para celebrar esta carta-contrato em representação do Promotor, XXB, do Sr. (X2), do Sr. (X3) e de si mesmo, bem como para os vincular nos termos estabelecidos em baixo.
F. A (E*) declara e garante que tem o completo poder e autoridade para celebrar esta carta-contrato em representação da (E*) e suas afiliadas, bem como para as vincular nos termos estabelecidos em baixo.
G. Qualquer Parte pode pôr termo à carta-contrato, mediante notificação escrita remetida à outra Parte a partir do que esta carta não terá força ou produzirá efeitos; e as Partes não terão quaisquer outras obrigações ou responsabilidades se os Contratos Definitivos não forem celebrados até 15 de Novembro de 2001, inclusive. Contudo, as Partes podem mutuamente acordar, por escrito, em estender o tempo para preparação dos Contratos Definitivos por períodos adicionais.
H. Ambas as partes, por si e em representação das respectivas afiliadas, agentes, representantes e consultores, concordam em manter em estrita confidencialidade e não revelar a quaisquer outra pessoa, entidade, parte, firma ou pessoa colectiva (excepto agentes ou representantes de cada uma das partes, os quais também estão vinculados pelo estabelecido neste parágrafo), sem o expresso consentimento escrito da parte contrária (excepto quando tal seja exigido em requerimentos ou por garantias ou legislação do jogo), qualquer informação confidencial da Parte contrária (“Informação Confidencial”). A expressão Informação Confidencial não inclui informação que: (i) passa a estar disponível ao público que não seja resultado de divulgação pela parte que recebe as informações ou os seus representantes, agentes ou funcionários; (ii) fosse do conhecimento da parte receptora, de um modo não confidencial, antes de sua divulgação à parte receptora; ou (iii) se torne acessível à parte receptora de forma não confidencial. Cada parte deverá limitar a divulgação e acesso a Informação Confidencial por parte dos seus administradores, gerentes, funcionários, agentes, consultores, representantes, advogado, ou autoridades reguladoras com jurisdição sobre as Partes. Antes de ser fornecida à outra Parte Informação Confidencial, tal informação deverá ser assinalada como “Confidencial”.
Esta carta não constitui um acordo vinculativo (excepto nos termos especificamente estabelecidos em baixo) e não revela que tal acordo exista. Esta carta é antes uma expressão de nossa intenção mútua que não impõe, nem deve impor, qualquer obrigação ou responsabilidade sobre as partes, excepto no que concerne ao estabelecido nas secções 1(C), 9, 10, 13(E), 13(F) e 13(H) deste documento. Se esta Carta for aceitável para si, por favor, assine a cópia em anexo e devolva-a para mim para o endereço indicado no topo da página da presente carta antes de 18 de Outubro de 2001, ou esta proposta caducará”. (已證事實E項)
6. (T8) era, em 18/10/2001, presidente e “Chief Operating Officer” da 1ª e da 2ª Rés. (已證事實F項)
7. A carta foi assinada por (X1) na qualidade de representante da Autora, de XX Bank (XXB) e de accionistas locais, bem como em seu próprio nome. (已證事實G項)
8. A seguir, a carta foi remetida à 1ª Ré, para o lugar da sua sede. (已證事實H項)
9. Pela carta referida em E) as partes acordaram negociar exclusivamente entre si, não pedindo nem prestando informações a terceiros, e não manifestando interesse por outros projectos ou neles participando, por qualquer via. (已證事實I項)
10. E acordaram não transmitir a terceiros direitos e obrigações resultantes da carta referida em E) sem consentimento prévio escrito da contraparte. (已證事實J項)
11. E submeter o acordado na carta referida em E) à lei de Macau. (已證事實K項)
12. E manter em estrita confidencialidade e não revelar a terceiros, sem o expresso consentimento escrito da parte contrária, qualquer informação confidencial. (已證事實L項)
13. Em 2 de Novembro de 2001 foi publicado, na I Série do Boletim Oficial, o Despacho do Chefe do Executivo nº 217/2001, de 1 de Novembro que declarou aberto um concurso público para a atribuição de três concessões para a exploração de jogos de fortuna ou azar em casino na R.A.E.M., pelo prazo máximo de 20 anos, a atribuir, na sequência de um acto de adjudicação, por via da celebração de contrato administrativo de concessão para a exploração de jogos de fortuna ou azar em casino a celebrar entre o Governo, em representação da Região, e a adjudicatária. (已證事實M項)
14. O nº 3 do referido Despacho determinou que a apresentação a concurso seria feita até ao dia 7 de Dezembro de 2001. (已證事實N項)
15. Em consequência da fixação do prazo para apresentação a concurso, as partes decidiram alterar o entre elas acordado, o que veio a ser concretizado por aditamento de 15 de Novembro de 2001, redigido na língua inglesa e assinado pelas mesmas pessoas e nas mesmas qualidades com que o fizeram na carta referida em E), aditamento esse que constitui o documento nº 3 junto com a petição inicial com o seguinte teor em tradução para a língua portuguesa:
“O presente aditamento vem alterar e modificar, mas somente nos termos estabelecidos adiante, os termos e condições da “letter of intent” …, datada de 18 de Outubro de 2001, celebrada entre o (E) Venture Development (“(E*)”), (A) (Promotor), Sr. (X1), em seu nome próprio, e em nome da XX Bank (“XXB”), do Sr. (X2) e do Sr. (X3) (os Srs. (X2) e (X3) são conjuntamente designados “Accionistas Locais”).
1. As palavras “15 de Novembro de 2001”, na secção 10 e 13 (G), constantes das “letter of intent” supra indicada, devem ser eliminadas, passando a estar substituídas pelas palavras “15 de Janeiro de 2002.
2. ….
3. A (E*) deverá, assim que possível, encontrar-se com os representantes do “Nevada Gaming Control Board (“NGBC”), e deverá enviar todos os melhores esforços para solicitar autorização para alterar o ponto 5 da “letter of intent”, de forma a que, em vez de uma opção de compra, a (E*) deva, após obtenção de todas as licenças e aprovações para si e para o Resort, adquira 27,5% do capital social em circulação, do resort, pelo “Custo” actualmente definido na Carta-Contrato; desde que a (E*) possa ter opção de vender essa acções ao XXB (“a Venda”) a qualquer momento dentro dos primeiros doze (12) meses da abertura do Resort, caso seja por si discricionariamente determinado que não é capaz de participar na exploração ou gestão do Resort. A Venda poderá ser exercida pela (E*), enviando ao XXB, com pelo menos quinze (15) dias de antecedência, e por escrito, uma notificação desse exercício. Na efectiva data dessa notícia, o XXB deverá pagar à (E*) por transferência bancária para uma conta designada pela (E*), os custos da (E*) pelas suas acções no Resort, acrescido de juros incorridos calculados à taxa básica [prime rate] do Citibank. Imediatamente após recibo de confirmação da recepção de tal transferência, a (E*) deverá transferir, por via dos necessários documentos, os seus 27,5% da suas acções no Resort para o XXB.
A. Se a Venda for aceite pelo “Nevada Gaming Control Board (“NGBC”), tal deverá ser incluído no Contrato Definitivo. Se a venda não for aceite pelo “Nevada Gaming Contral Board (“NGCB”), então, deverá o Contrato Definitivo conter a opção originalmente descrita na “letter of intent”.
4. Todas as restantes cláusulas da “letter of intent”, que não sejam contrárias ao aqui estabelecido, continuarão plenamente a vigorar e a produzir efeitos.
…”(已證事實O項)
16. Por efeito de tal alteração, o prazo de 15 de Novembro de 2001 passou para 15 de Janeiro de 2002. (已證事實P項)
17. Em 07 de Dezembro de 2001 a Autora apresentou a sua Proposta de Candidatura/Adjudicação ao Concurso do Jogo. (已證事實Q項)
18. A Proposta apresentada pela Autora havia sido elaborada em conjunto por esta e pelas 1ª a 3ª Rés. (已證事實R項)
19. Na proposta de candidatura ao concurso do jogo o projecto a desenvolver seria inspirado no modelo Venice-themed resort, que a (E) Resort possui e operava em Las Vegas, Nevada. (已證事實S項)
20. Incluindo a Autora, apresentaram-se a concurso 21 concorrentes. (已證事實T項)
21. Em 14 de Dezembro de 2001, (T1), Presidente da Comissão do Concurso, criada pelo Despacho do Chefe do Executivo nº 216/2001, de 31 de Outubro, comunicou a admissão, condicionalmente, de todas as concorrentes à fase subsequente, pelo que nenhum candidato ficou excluído, e concedeu prazo até 21 de Dezembro para que as concorrentes sanassem as irregularidades formais detectadas. (已證事實U項)
22. Em 28 de Dezembro de 2001 a Comissão do Concurso excluiu 3 das 21 concorrentes por não satisfazerem os requisitos exigidos. (已證事實V項)
23. Em 02 de Janeiro de 2002 a Comissão do Concurso decidiu admitir a proposta de adjudicação da Autora, bem como as de outras 17 concorrentes, à fase subsequente do Concurso. (已證事實W項)
24. Seguiu-se uma fase de consulta das concorrentes, durante a qual as 18 concorrentes fizeram perante a Comissão do Concurso uma apresentação da sua candidatura. (已證事實X項)
25. A Autora preparou e elaborou com a 1ª e a 2ª Rés e com o XXB o texto da apresentação de candidatura que costa do Doc. nº 6 junto com a P.I., que aqui se dá por reproduzido, designadamente na parte em que se pergunta “quem é a (H*)L?” e se refere (Fls. 206): - XXB, THE (E); GROUP OF LOCAL PARTNERS. (已證事實Y項)
26. Em todas as folhas da referida apresentação constam os logótipos da (E), da Autora e do XXB. (已證事實Z項)
27. A apresentação da proposta teve lugar no dia 4/1/2002 e nela participaram (X1), (T8), (T10) e (P) (已證事實AA項)
28. Entre 15 e 19 de Janeiro de 2002 a Comissão do Concurso realizou outras consultas com algumas concorrentes, tendo a Autora sido uma delas. (已證事實BB項)
29. No dia 7 de Dezembro, dia em que terminou o prazo de apresentação de candidaturas, foi proferido o Despacho do Chefe do Executivo nº 250/2001, publicado em 10 de Dezembro de 2001, que determinou o regime jurídico aplicável à associação de sociedades concorrentes. (已證事實CC項)
30. Em 22 de Janeiro de 2002, nos termos do Despacho do Chefe do Executivo nº 250/2001 de 10 de Dezembro, a Comissão do Concurso notificou as sociedades concorrentes de que se podiam associar, querendo, até ao dia 31 de Janeiro de 2002. (已證事實DD項)
31. Naquela data as Rés não eram accionistas da Autora. (已證事實FF項)
32. Em 25 de Janeiro de 2002, sexta-feira, (T8) enviou um fax à Autora, na pessoa de (X1), cuja cópia consta como documento nº 7 junto com a P.I, que aqui se dá por reproduzido, propondo, designadamente, a extensão do prazo referido na carta identificada em E) de 15 de Janeiro para 15 de Fevereiro, com uma proposta de alteração da mesma carta. (已證事實GG項)
33. O formulário do fax tem um espaço para informar se se trata de uma comunicação urgente e não tinha qualquer menção de urgência. (已證事實HH項)
34. O fax foi enviado para o número de fax de um escritório de Taiwan, que não é a morada que consta da Carta referida em E), nem a da sede da Autora, não fixando aquele fax prazo para resposta, nem indicando o meio pelo qual o mesmo deveria ser respondido. (已證事實II項)
35. No dia 1 de Fevereiro de 2002 a 1ª Ré apresentou-se a concurso com a concorrente (F). (已證事實JJ項)
36. Também nesse dia 01/02/2002 a 1ª ré dirigiu uma carta à Comissão do Concurso, assinada, em sua representação, por (T10), junta com a petição inicial como documento nº 8), onde faz constar, designadamente, o seguinte: “Nós vimos respeitosamente notificar-vos de que terminámos [severed] as nossas ligações [relationship] com a Concorrente” [(H*), ora Autora] “e pusemos termo a qualquer outra participação com a Concorrente na candidatura a uma licença para casino”. (已證事實KK項)
37. A 1ª Ré concluiu a carta dizendo “Nós estamos a apresentarmo-nos a concurso com a (F) Casino Limitada”. (已證事實LL項)
38. Na mesma data (1/2/2002) a Concorrente (F) Casino, S.A., representada pelo seu Administrador XXX, escreveu uma carta à Comissão do Concurso em que comunica que a (F) “tenciona, caso lhe seja atribuída uma concessão para a exploração de jogos em Macau, celebrar um contrato com a “(E) Venture Development” pelo qual esta assumirá poderes de gestão como sociedade gestora, relativamente à concorrente [(F)]”. (已證事實MM項)
39. No grupo (F)/(E), a XX Limited teria 48%, a 1ª Ré teria 30% das acções, XXX teria 12%, e outros accionistas teriam 10%.(已證事實NN項)
40. Em 6 de Fevereiro de 2002 a 1ª Ré comunicou à Comissão do Concurso que, no seguimento da carta datada de 1 de Fevereiro de 2002, vem apresentar o Acordo com a sociedade (F) Casino, S.A., o qual efectivamente apresentou. (已證事實OO項)
41. Acordo esse assinado por (T8) e XX Fan. (已證事實PP項)
42. Em 6 de Fevereiro de 2002, (T10), actuando, pelo menos, em representação da 1ª Ré na primeira comunicação escrita enviada pelas Rés à Autora desde o fax de 25 de Janeiro de 2002, enviou, um fax e uma carta à Autora, cujo teor aqui se dá por reproduzido e consta do documento nº 12 junto com a petição inicial, onde era referido, designadamente, que “é com muita frustração e tristeza que eu tenho de formalmente informá-lo de que a (E) vem terminar as negociações com a (H*) e retirar a proposta de Segunda Alteração e renovação da “letter of intent”. (已證事實QQ項)
43. O fax de 06/02/2002 não foi enviado para a morada constante da Carta referida em E) nem para a sede da Autora. (已證事實RR項)
44. A carta de 06/02/2012 foi enviada por via postal para a sede da Autora, não tendo a comunicação sido recebida nesse dia. (已證事實SS項)
45. Em 7 de Fevereiro de 2002, (X1), administrador da Autora enviou um fax a (T8), cujo teor aqui se dá por reproduzido e consta do Doc. 13 junto com a petição inicial, dizendo, designadamente, confirmar por escrito o acordo de prorrogação do contrato por mais 30 dias, até 15 de Fevereiro de 2002. (已證事實TT項)
46. Em 8 de Fevereiro de 2002, (T10) reagiu ao fax enviado por (X1) a (T8) dizendo, designadamente:
“Caro XX ,
Recebi uma cópia do seu fax, datado de 7 de Fevereiro de 2002, dirigido a (T8). A sua carta não faz referência à nossa carta datada de 6 de Fevereiro de 2002, enviada por fax para si no dia em que a (E) denunciou “the (G)”, mas eu sei que a recebeu, porque recebi um telefonema de um dos seus consultores nesse dia que me disse que você havia conversado com ele sobre isso.
Quanto à nossa proposta do Segundo Aditamento, relativo à “letter of intente”, cujo prazo expirou em 15 de Janeiro de 2002, primeiro, já nos havia sido dito, explicitamente, que os seus termos não eram por si aceites, segundo, não obstante ter sido recusado, nós revogámo-lo formalmente em 6 de Fevereiro de 2002, e terceiro, a proposta do Segundo Aditamento não alterou as disposições dos parágrafos 10 e 13 (H) da “letter of intent”, concedendo a cada parte o direito de denunciar a “letter of intent” por notificação escrita à outra, que foi o que a (E) fez em 6 de Fevereiro.
A sua carta é mais um exemplo dos assuntos que levaram a (E) a terminar as suas negociações com a (A). Todavia está uma vez mais a ignorar as nossas comunicações.
A nossa relação consigo terminou e nada mais há a discutirmos relativamente à candidatura da (A)”. (已證事實UU項)
47. Em 8 de Fevereiro de 2002 o Chefe do Executivo proferiu o Despacho nº 26/2002, publicado no dia 11 de Fevereiro, onde Determinou o seguinte:
“as três concessões para a exploração de jogos de fortuna ou azar em casino postas a concurso público são adjudicadas provisoriamente às seguintes concorrentes do concurso público, por se considerar terem apresentado as propostas mais vantajosas para a Região:
- “(F) Casino, S.A.”;
- “(Q)”;
- “(R)”. (已證事實VV項)
48. Se a Autora tivesse obtido a concessão, teria as funções ou o papel de adquirir o terreno para o fim pretendido e de financiar o empreendimento, através do XXB. (已證事實WW項)
49. Em data posterior àquela em que a (F) Casino, S.A. obteve a concessão para a exploração de jogos de fortuna ou azar em casino terminou a parceria entre o grupo (E) e (F), tendo aquele passado a desenvolver por si só o projecto com base na atribuição de uma subconcessão. (已證事實XX項)
50. A 4ª Ré é uma sociedade comercial anónima, de direito local, constituída em 21 de Junho de 2002. (已證事實YY項)
51. O acordo que a 1ª Ré efectuou com a (F) e apresentou à Comissão do Concurso em 6-Fevereiro-2002 havia sido negociado em Hong Kong e Macau entre 1 e 6 de Fevereiro. (已證事實ZZ項)
52. Em 26 Junho 2002, foi celebrado o contrato de concessão com a (F), que previa que a 4ª Ré seria a sociedade gestora da concessionária e como tal responsável pela gestão operacional durante o período de concessão. (已證事實AAA項)
53. Em 19/12/2002 foi celebrado o contrato de subconcessão entre a (F) e a 4ª Ré. (已證事實BBB項)
54. Na sequência da celebração do contrato de subconcessão, a sociedade (E) Macau Ltd vem explorando directamente os jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casino desde que foi inaugurado o seu primeiro casino na RAEM, em 18 de Maio de 2004. (已證事實CCC項)
55. (T8) assinou a carta referida na alínea E dos Factos Assentes em representação da 1ª Ré. (對待證事實第1條的回答)
56. Pela carta referida na alínea E dos Factos Assentes, a Autora e a 1ª Ré manifestaram a intenção de trabalhar conjuntamente para obterem uma concessão de jogo na R.A.E.M. e desenvolverem e explorarem um casino, hotel e outras utilidades denominadas “Resort”. (對待證事實第2條的回答)
57. A Autora e a 1ª Ré acordaram não praticar, directa ou indirectamente, qualquer acto que possa ter reflexos negativos na contraparte, nos termos consignados na cláusula 2(C) da carta referida na al. E dos Factos Assentes. (對待證事實第5條的回答)
58. A Autora e a 1ª Ré acordaram que a carta referida na al. E dos Factos Assentes vigoraria até 15 de Novembro de 2001, podendo qualquer uma das partes, ainda antes da referida data de 15 de Novembro de 2001, pôr termo à mesma carta, mediante notificação escrita remetida à outra parte. (對待證事實第8條的回答)
59. Na Proposta de candidatura apresentada pela Autora em 7 de Dezembro de 2001, o XXB e a 3ª Ré foram designados por “sponsors” e “partners” no “business consortium”. (對待證事實第10條的回答)
60. Consta da proposta apresentada pela Autora o seguinte: (fls. 80 dos autos)
“競投公司(A)是一家在澳門註冊的公司,如獲得娛樂場執照後,其主要股東結構如下:
股東名稱 持股量
(E)或(E)的關聯公司 27½%
XXB 20%
常務董事 10%
其他 42½%
總計 100%”
(對待證事實第11條的回答)
61. (T8), e (T10) participaram, como representantes do Grupo (C*), na apresentação da candidatura que teve lugar no dia 4 de Janeiro de 2002 e a que respeita o documento nº 6 junto com a petição inicial. (對待證事實第15條的回答)
62. Em Janeiro de 2002, antes ainda do dia 15, iniciaram-se negociações entre a Autora e a 1ª Ré para a prorrogação do prazo de vigência da carta referida na al. E dos Factos Assentes que, por força do aditamento mencionado na al. O dos Factos Assentes, tinha sido prorrogado para 15 de Janeiro de 2002. (對待證事實第16條的回答)
63. Em 15 de Janeiro de 2002, a Autora foi chamada pela Comissão do Concurso a nova consulta, na qual acompanhou, como representante do Grupo (C*), (T8). (對待證事實第18條的回答)
64. A apresentação da Autora teve lugar em 15 de Janeiro de 2002, pelas 17:30 horas. (對待證事實第18-A條的回答)
65. A (F) Casino S.A. não foi chamada pela Comissão do Concurso a nova consulta que decorreu entre 15 a 19 de Janeiro de 2002. (對待證事實第19條的回答)
66. Foi em representação da 1ª Ré que, em 25 de Janeiro de 2002, (T8) enviou à Autora o fax referido na alínea GG) dos Factos Assentes. (對待證事實第19-A條的回答)
67. A Proposta de Adjudicação apresentada pela Autora em 7 de Dezembro de 2001 encontra-se junta a fls. 62 a 193 dos autos; a Proposta de Adjudicação apresentada pela (F) Casino S.A. em 4 de Dezembro de 2001 encontra-se junta a fls. 6145 a 6245v dos autos, e a proposta subsequente apresentada pela mesma em 1 de Fevereiro de 2022, a fls. 2722 a 2740 dos autos. (對待證事實第24條的回答)
68. Provado apenas o que consta da alínea R dos Factos Assentes. (對待證事實第25條的回答)
69. Provado apenas o que consta da resposta ao quesito 24º. (對待證事實第26條的回答)
70. Foi em representação da 1ª Ré que (T10) enviou à Autora a carta e fax, referidos na al. QQ dos Factos Assentes, em 06 de Fevereiro de 2002. (對待證事實第28條的回答)
71. A (F) Casino, SA obteve a adjudicação provisória de uma das três concessões para a exploração de jogos de fortuna ou azar em casinos. (對待證事實第30條的回答)
72. A (E) Macau S.A. foi constituída com vista a celebrar os acordos definitivos mencionados na carta datada de 6 de Fevereiro de 2002 (fls. 2753 a 2761), entre os quais o acordo definitivo no que respeita à participação por parte da 1ª Ré ou seus filiais no capital social da (F) Casino S.A.. (對待證事實第31條的回答)
73. Em consequência de a (E) Macau S.A. ter obtido a subconcessão, esta explora, entre outras actividades e estabelecimentos, o Casino XXX, em Macau, e o Casino do (E) Macau Resort. (對待證事實第36條的回答)
74. Provado o que consta da resposta dada ao quesito 72º. (對待證事實第37條的回答)
75. Provado o que consta da resposta dada ao quesito 72º. (對待證事實第38條的回答)
76. Foi fixado como termo do prazo da subconcessão da (E) Macau S.A. o dia 26 de Junho de 2022, que corresponde ao prazo de duração da concessão da (F) Casino S.A, e que seria o prazo de concessão da Autora se esta tivesse ganhado o concurso e assinado com a Administração o respetivo contrato de concessão. (對待證事實第39條的回答)
77. Provado o que consta da resposta ao quesito 15º. (對待證事實第44條的回答)
78. Em 19 de Janeiro de 2002, (X3), por conta da Autora, informou que as moradas e contactos da Autora, tanto em Taipé como em Macau, haviam sido alterados. (對待證事實第45條的回答)
79. Essa informação foi prestada por correio electrónico, tendo (T8) como um dos destinatários. (對待證事實第46條的回答)
80. O fax datado de 25 de Janeiro de 2002 foi enviado, precisamente, para o número de fax que, em 19 de Janeiro de 2002, (X3) havia comunicado como sendo o contacto da Autora em Taipé. (對待證事實第47條的回答)
81. A Autora recebeu o fax de 25 de Janeiro de 2002 no próprio dia. (對待證事實第48條的回答)
82. A carta referida na al. QQ dos Factos Assentes, subscrita por (T10), foi remetida à Autora por fax e foi recepcionada pela Autora no próprio dia em que foi enviada. (對待證事實第49條的回答)
83. O fax referido na al. TT dos Factos Assentes, datado de 7 de Fevereiro de 2002 e remetido a (T8) por (X1) em representação da Autora, foi enviado depois de a Autora ter tomado conhecimento do fax da véspera, enviado por (T10). (對待證事實第50條的回答)
84. A proposta foi encaminhada à Autora em 25 de Janeiro de 2002, para os contactos que esta havia comunicado como sendo os seus, tendo sido recebida nessa mesma data, por fax. (對待證事實第53條的回答)
85. No dia 1 de Fevereiro de 2002, a (F) Casino S.A. apresentou à Comissão a proposta subsequente junta a fls. 2722 a 2740 dos presentes autos. (對待證事實第55條的回答)
86. Em 19 de Dezembro de 2002, o contrato de concessão com a (F) Casino S.A. foi alterado de forma a permitir a subconcessão à (E) Macau S.A. para a exploração directa dos jogos de fortuna e azar em casino. (對待證事實第56條的回答)
87. O presidente do Conselho de Administração da Autora, (X1), não foi destinatário do e-mail enviado por (X3) em 19 de Janeiro de 2002, facto que é do conhecimento das Rés. (對待證事實第63條的回答)
88. A morada de Taipei, indicada no e-mail enviado por (X3) em 19 de Janeiro de 2002, não foi a sede social da Autora consignada no registo comercial da Autora, facto que é do conhecimento das Rés. (對待證事實第64條的回答)
89. A Autora é uma sociedade constituída em Macau que conforme o registo comercial, tem sempre a sua sede aqui em Macau, o que as Rés conheciam. (對待證事實第65條的回答)
90. Em 18 de Janeiro de 2002, o dia anterior ao da comunicação que constitui o documento n.º 6 junto à contestação (fls. 491 dos autos), o próprio (X1), Presidente do Conselho de Administração da Autora, remeteu a (T8) uma mensagem electrónica (fls. 752 dos autos) na qual solicitava o envio, por DHL, de 4 cópias da documentação que serviu de base à apresentação feita em 15 de Janeiro de 2002, bem como 4 VCD. (對待證事實第66條的回答)
91. Na mesma comunicação electrónica, (X1) comunica a (T8) a alteração dos contactos da Autora, tanto em Macau como em Taipé. (對待證事實第67條的回答)
92. Os novos contactos são, precisamente, aqueles que (X3) comunica a um grupo de destinatários mais alargado no dia seguinte. (對待證事實第68條的回答)
93. Sempre a Autora, no seu papel timbrado, exibiu uma morada em Macau e uma morada em Taipé. (對待證事實第69條的回答)
94. O documento de fls. 752 é a representação impressa de uma mensagem electrónica elaborada e enviada por via informática por (X1). (對待證事實第70條的回答)
95. Desde 2002 a 2018, a (E) MACAU S.A. tem os seguintes resultados do exercício, conforme a respectiva demonstração financeira apresentada periodicamente à Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos:
Ano
Resultado do exercício (MOP)
Fls.
2002
(48.955.119,00 de prejuízo)
3073
2003
(94.09.508,00 de prejuízo)
3073
2004
952.407.365,00
3073
2005
2.371.660.110,00
3086
2006
2.971.919.830,00
3102
2007
1.579.576.944,00
3119
2008
1.414.469.914,00
3124
2009
1.750.000.000,00
3131
2010
5.334.000.000,00
3136
2011
9.063.000.000,00
3142
2012
10.143.000.000,00
3149
2013
17.908.000.000,00
3154
2014
20.732.000.000,00
3160
2015
12.259.000.000,00
3166
2016
10.418.000.000,00
3173
2017
13.544.000.000,00
3179
2018
16.019.000.000,00
3185
(對待證事實第72條的回答)
*
III – FUNDAMENTAÇÃO
I. Dos recursos da Autora
(1) Do despacho de 15/12/2021:
Não achamos que tem alguma utilidade prática em conhecer deste recurso por seguintes razões:
- A Autora nunca chegou a exibir na audiência de julgamento o livro de registo de acções na presença dos representantes das Rés, pelo que a contradita em causa não foi efectivamente realizada;
- A não apresentação do livro do registo por parte da Autora não determinou qualquer efeito negativo em desfavor da mesma, especialmente na formação da convicção do Tribunal a quo na resposta dos quesitos, pois ficou expressamente consignado no acórdão do julgamento da matéria de facto o seguinte:
“…
另外,在開始就本案的爭議事實作分析前,亦有必要就被告方在審判聽證中,針對原告的證人(T13)、(T14)及(T15)提出的反駁(contradita),並且要求就該三名證人現時是否屬於原告的股東的問題上,裁定基於原告拒絕出示其股東名冊因而相關的舉證責任須倒置等問題作出說明。
雖然原告沒有按照卷宗第9104頁的批示,出示其股東名冊,以顯示(T13)、 (T14)及(T15)現時是否原告的股東,然而 – 亦無論《民事訴訟法典》第442條第2款以及《民法典》第337條第2款所提及的舉證責任倒置能否適用於我們現正分析的、針對有關證人提出的反駁的附隨事項 – 本案不存在《民法典》第337條第2款所提到的“不能提出證據”的情況(就“不能提出證據”的判定,見中級法院2019年5月23日於第928/2018號卷宗的合議庭裁判)。事實上,雖然股東名冊對於證明某人是否為相關股份有限公司的股東是最為直接的方法,但即使沒有查看股東名冊,也還有其他方法作出相應的證明。再者,三名被告亦提交了證據(例如,卷宗第2579、9319、9321、9332、9333、9335、9351、9353、9354頁等),用以證明三名證人的股東身份。因此,法庭認為本案不符合相關法定要件,三名被告要求相關舉證責任倒置的聲請不能成立。
儘管上述由三名被告所提交的文件足以顯示,(T13)、(T14)及(T15)在2001年,曾經以原告的股東身份進行表決,法庭對於三名證人是否已獲退還出資,或基於嗣後的原因現時已非原告的股東,仍存有一定疑問(就此,尤見(T15)的證言)。
在此情況下,儘管原告確沒有向法庭出示其股東名冊,案中現存證據尚未能令我們穩妥地得出上述三名證人現時仍然是原告的股東此一結論,亦因此,法庭僅能按照上述提及的書證,認定三名證人曾經為原告的股東。
得出此一結論後,亦有必要指出的是,被告方質疑上述三名證人的可信性時所提出的兩項理據(分別是:1. 三人現時仍然是原告的股東;2.三人在美國進行的訴訟未有出現)一定程度上存在不相容甚至是矛盾之處。試想,儘管三名證人以往曾為原告的股東(甚至假設他們一如被告方所主張般現時仍然具股東身份),此一身份不正正能夠說明他們為何會知道與本案有關的事實(例如見卷宗第9733、9737至9740頁等照片)?並因此或非一如被告方所指般,屬完全與本案無關的人(一如三名被告在第10389至10390頁第36點亦承認的,某一證人與當事人之間存在利益關連,除了有機會使證人的中立性受質疑外,亦可以支持證人是知情的重要人物)?
事實上,他們三人以往曾經是原告的股東(甚至純粹假設他們一如三名被告所主張般現時仍然是原告的股東),只會更大程度地支持他們確曾在事發時參與事件的某些環節,因而直接或間接地得悉某些事實。故此,法庭不會因為他們曾是原告的股東,亦不會由於三名被告質疑他們沒有在美國的訴訟中出現此等因素,繼而壟統地排除他們的證言或視他們的證言必然是不可靠。
然而,同樣有必要強調的是,這亦不代表法庭會不假思索地全盤接納上述三名證人的證言必然反映現實。事實上,在上述三名證人提供其書面證言時,距事件發生已有20多年,故此,對於三名證人(以及其他在本案中就20多年前的事實作證的其他證人)的記憶的可靠性,法庭必須謹慎衡量。
連同事發至今已有多年此一因素,鑑於本案訴訟雙方具有高度的對抗性、涉案經濟利益巨大、事發時只代表或只服務於其中一方當事人的證人主觀情感上傾向該當事人的可能性,法庭會採取謹慎及批判的態度,從而對不論是原告或三名被告所羅列的證人證言作出分析及評價。一般而言,證人的證言若然沒有其他證據(尤其是文件證據,例如是文件存檔記錄、雙方的通訊紀錄等)佐證其可靠性,則只有當相關部份的證言屬按照一般經驗法則以及事物的性質具備合理性,並且是證人能夠有說服力地說明其獲悉有關事實的途徑及原因下提供者,法庭才會採納。在此強調一點,法庭注意到原告在卷宗第10176及10177頁提交的文件,亦注意到原告對(T10)的證言的可信性所提出的質疑,故在審視(T10)的證言時,亦必然與所有其他證人一樣,採取相同的謹慎態度。
…”.
- Do teor acima transcrito resulta de forma clara que o Tribunal a quo, não obstante ter alguma dúvida quanto à qualidade dos indivíduos em causa (serem ou não sócios da Autora no momento do depoimento), acabou por aceitar os mesmos a deporem como testemunha.
Pelo exposto, não é de conhecer deste recurso interlocutório.
*
(2) Da sentença final:
Questão prévia:
Por despacho do Relator proferido a fls. 12202 e segs. dos autos, foi a Autora/Recorrente convidada a “aperfeiçoar a motivação do recurso, separando a impugnação da matéria de facto com a impugnação de direito e especificando quais os pontos concretos da matéria de facto de cada quesito que considera incorrectamente julgados, bem como reformular, de forma sintética, a conclusão do recurso em conformidade com o aperfeiçoamento, sob pena da rejeição do recurso”.
A Autora/Recorrente respondeu ao convite e apresentou novas alegações aperfeiçoadas e as respectivas conclusões nos termos constantes fls. 12213 a 12536 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
Devidamente notificadas, as partes contrárias responderam nos termos constantes a fls. 12546 a 12638 dos autos, pugnando pela rejeição do recurso da sentença final por continuar a não ter cumprido o ónus de formular conclusões sintéticas, não obstante ter sido convidada para o efeito.
Cumpre agora analisar e decidir se a Autora, ora Recorrente, ter cumprido integralmente o despacho de aperfeiçoamento.
Num primeiro momento, parece que a Autora tenha cumprido o despacho de aperfeiçoamento, já que reorganizou a estrutura da motivação do recurso, especificando a Parte I como parte da impugnação da matéria de facto, e a Parte II como impugnação de direito. Além disso, reduziu o número de conclusões de 198 para 133.
No entanto, melhor analisando o teor da motivação aperfeiçoada, verifica-se que a Autora continua a misturar a impugnação de facto com a impugnação de direito, bem como não formular conclusões sintéticas.
A saber:
Na Parte II, com o título de “MATÉRIA DE DIREITO”, Capítulo VIII, sob o epigrafe “CÁLCULO DOS DANOS: INDEMNIZAÇÃO”, alegou a Autora o seguinte:
753. Neste capítulo discute-se o montante dos danos. Os danos foram calculados por dois especialistas que agiram imparcialmente, tendo a autora junto dois pareceres técnicos que falam por si:
a. Parecer Técnico (“Expert Report”) do Professor (L) (fls. 9746-9770);
b. Parecer Técnico (“Expert Report”) de (M) e (N) (fls. 9771-9811).
754. Vejamos os méritos profissionais do Prof. (L):
a. (L) é economista, vive em Macau há quase 20 anos, sendo Professor de Finanças Públicas e Contabilidade de Gestão e Orçamental no Instituto X e de Economia na Universidade X,
b. Tendo também exercido funções docentes de Economia na Universidade XX. Antes, ensinou disciplinas de Economia e Gestão de Empresas no reputado Instituto Superior Técnico, em Lisboa.
c. Estudou na Universidade de Coimbra, no Imperial College em Londres e na University of Manchester.
d. É uma voz conhecida na comunicação social de Macau, quer escrita, quer televisiva, tendo participado como comentador em programas semanais de análise da actualidade económica e política da TDM e sendo Senior Analyst do grupo media Macau Business, onde escreve regularmente artigos de incidência económica e financeira.
e. A sua reputação pessoal e profissional em Macau é inquestionável. Referiu ter as “competências técnicas e profissionais para elaborar este parecer e obter as conclusões que nele expresso” e acrescentou (ponto 1.2.6):
este parecer corresponde à minha genuína opinião profissional, formada com base em critérios objectivos e imparciais, sobre o cálculo de danos a que a (H*) teria direito partindo das assunções legais, factuais e contratuais referidas no parecer.
755. E, agora, os méritos profissionais de (M) e (N):
a. (M) formou-se no Darmouth College e University of Harvard.
b. É o Presidente e Chief Executive Officer (CEO) da XX Inc., uma empresa da especialidade com cerca de 200 funcionários e escritórios nos Estados Unidos, China (Xangai), Índia, Reino Unido, Alemanha e França.
c. Dino tem por clientes empresas das 500 maiores multinacionais do mundo (Fortune 500: https://fortune.com/fortune500/).
d. Com mais de 25 anos de experiência, exerceu funções de topo em empresas como a XXX, XXX, XXX, XXX, XXX, entre outras.
e. Durante a sua vida liderou ou assessorou mais de 120 transacções que totalizam 400 mil milhões de USD, mais de 50 com valores superiores a mil milhões de USD.
f. Tem, ainda, enorme experiência em empresas de jogo e casinos, incluindo em transacções e avaliações que envolviam a XXX Entertainment, a XXX, a XXX, a XXX, a XXX e a XXX Holdings.
g. É autor de inúmeras publicações na área de especialidade e o seu nome é citado frequentemente por autores diversos em revistas económicas e financeiras, tendo realizado trabalhos conjuntos, incluindo para a University of Harvard.
h. A sua reputação é intocável e este processo não representa um valor que o surpreenda, como a lista de folha 8 do seu Parecer revela. Conforme refere no parágrafo 7 do seu Parecer:
I am committed to the highest standards of professionalism, personal integrity, ethics, and impartiality. It is my duty to use reliable methodologies, analytical processes, and underlying data in conducting lost profits calculations. In terms of impartiality, I believe my opinions and estimation of damages presented herein would be the same as if I were retained by the Defendants.
i. (M) foi auxiliado por (N), Chief Financial Officer (CFO) da XX Consulting Inc..
j. (N) tem mais de 25 anos de experiência, estudou na Georgetown University e é um CPA (“Certified Public Accountant”), tendo já sido CFO do X Group e gestor na X Company, X Services, X International.
756. As competências e experiência dos três profissionais que elaboraram os dois pareceres técnicos que se juntam são insuspeitáveis.
a. (L) é professor universitário em três universidades da RAEM.
b. (M) é o Presidente da X e seu CEO,
c. (N) é o CFO.
757. Mais importante, uma leitura dos dois pareceres ora juntos permite compreender a solidez dos raciocínios, a preocupação em explicar os conceitos, a insistência na imparcialidade da análise.
758. Acresce que ambos denotam uma postura intencionalmente “conservadora” na contabilização dos danos. Isto é, em caso de dúvida, ambos os pareceres fazem descer os valores pedidos pela autora. Ambos referem que, na verdade, aplicando os critérios económico-financeiros e legais que cabe ao Tribunal aplicar, os valores seriam superiores aos valores que eles apresentam.
759. Contrariamente aos pareceres juntos pelas rés – em que a preocupação foi sempre diminuir o valor da indemnização que as rés deveriam pagar à autora (como o testemunho de (O) ainda mais acentuou) – os pareceres de (L) e (M) revelam uma preocupação ético-profissional inversa: diminuir o valor da indemnização pedida pela parte (autora) que lhes solicitou os pareceres.
760. (L) conclui que o valor da indemnização a pagar será “superior a MOP 62,286,757,913.00”. (M) conclui que a indemnização a pagar será de “MOP 57.9 billion, or US $7.4 billion based on current exchange rates”.
761. Os MOP 62.2 mil milhões de (L) e os MOP 57.9 mil milhões de (M) diferenciam-se pelo articulado nos pontos 3.4 e 3.5 (fls. 14-16) do parecer de (L) e nos pontos 39 a 41 (fls. 22-23) do parecer de (M). Ou seja, enquanto (L) desconta ao valor de fees previstas no acordo entre autora e rés os valores efectivamente pagos à (C*), (M) entende não retirar esses valores numa atitude conservadora derivada, designadamente, da falta de elementos detalhados nos relatórios financeiros divulgados pela (E) Macau na DICJ e no Boletim Oficial.
762. Ambos assentam a sua análise nas regras financeiras em vigor na RAEM, bem como na sua conjugação com as regras de cálculo de danos estabelecidas no Código Civil da RAEM (que são similares às aplicáveis nos EUA). Caberá ao Tribunal e às partes aplicar o direito, mas as regras de cálculos de danos – quer as Normas de Relato Financeiro, quer as regras do Código Civil –, sendo regras jurídicas, são regras de natureza financeira que cabe aos autores do parecer considerar e aplicar (como os engenheiros e arquitectos aplicam as regras de construção previstas na lei).
763. Sinal da sua imparcialidade consiste em concordarem com vários dos argumentos usados nos pareceres juntos pelas rés e em criticarem, ainda que de forma cortês, argumentos e números usados pela autora ((H*).
764. Independentemente do montante dos danos, provada a responsabilidade civil das rés, o Tribunal haveria sempre de ter que reconstituir a situação que existiria e o contrato tivesse sido cumprido pelas rés (art. 556º do CC).
765. Por esse motivo, como os dois Técnicos explicam, a melhor metodologia é usar como referência os lucros da (E) Macau SA, pois geriu o mesmo modelo (ver contrato de subconcessão, parte final) e foi gerido pela (E) (tal como, nos termos da (G), teria sido gerido pela (E) se a autora tivesse obtido uma concessão).
766. Os relatórios técnicos das rés foram de uma pobreza financeira confrangedora, não tendo qualquer credibilidade, autorizando que se diga que foram não mais do que o resultado de um pagamento feito. Aliás, o parco currículo dos Técnicos das rés revela que certamente pessoas mais qualificadas não se curvaram a escrever e dizer o que os técnicos contratados pelas rés tiveram o desplante de defender.
767. (O): ele disse que o cálculo a fazer era deduzir todas as despesas a todas as receitas. Mas as amortizações e depreciações não são despesas e ele deduziu-as das receitas! Uma contradição elementar, erro que nem um estudante de economia cometeria. Violou o critério usado no seu relatório, nos relatórios da (E) e nas normas financeiras aplicáveis em Macau e nos EUA, em que as amortizações e depreciações são deduzidas de receitas para determinar o lucro, apesar de não serem uma despesa. E confundiu balanço com demonstração de resultados.
768. A autora tinha obviamente capacidade de investimento maior do que o que a (E) tinha, pois o consórcio da (H*) incluía a (E) mais o XXB, logo tinha necessariamente que ter maior capacidade financeira do que a (E) sozinha. Negar isto revela a completa impreparação ou falta de honestidade dos relatórios apresentados pelas rés.
769. Capacidade de investimento da autora:
a. XXB + (C*)
b. Capitais próprios vs Financiamento
i. Fls 207 “Fully Committed Financing”
ii. Fls. 10170 (carta de 20-Dez-2001 à Comissão):
“all financing for both Phase I and Phase II is covered by XXB's December 3 letter”;
“XXB’s commitment to provide … all financing” to both Phase I ($500M) e Phase II ($600M): US$1.1 B
“in the total amount required for such investment and obligations”
iii. Fls. 10172 (carta de 27-Dez-2001 à Comissão sobre o “method of financing”) “we currently believe”; “expectations”; “the contemplated financing structure … does not assume any use of funds, either profit or free cash flow from a temporary casino on Phase I”.
iv. 10154: carta da (C*) ao Nevada Gaming Commission Board: “Financing Commitment from XXB”.
770. No sentido aqui pugnado, veja-se o Contrato de subconcessão: fls. 9204, de onde se retira que o investimento proposto pela (E) era menor do que o investimento proposto pela (H*), sendo, por isso, absurdo defender que a (H*) propôs um investimento menor do que aquele que a (E) investiu, pois a (E) havia-se proposto investir metade do que a (H*) havia proposto investir…
771. Autora e rés pretendiam, já entre si, investir muito mais em Macau do que o que consta da Proposta: 10160-63 (Jan 2002, fls. 10155) – “Expanding the Facility” e “Long Term Plan” “by land reclamation”.
772. A fls. 10163, depois de falar “investment of over $1 billion US”, referem: “For the long term, The (E) group encourages the further expansion of Macao’s tourism destination base by relcaming lands of approximately 10 sq. kilometers from the sea … to accommodate a number of Las Vegas style destination mega-resorts” (no plural).
773. Por estes motivos, e com base nos dois relatórios técnicos da autora – provados que estão os Quesitos 31–40, 56, 58, 61, 72, 73 – ajustados ou alterados nos termos prescritos nos relatórios técnicos juntos pela autora, o Tribunal deve determinar que a autora teve o prejuízo indemnizável correspondente ao valor constante dos relatórios técnicos acrescidos dos valores a determinar nos termos do art. 560º/6, na parte em que os Técnicos disseram não fazer uma avaliação. (o sublinhado e o realçado são nossos)
774. Tal levará a compensação devida à autora acima dos valores apresentados pelos Técnicos: note-se que a autora não está a discordar dos seus Pareceres, está a chamar a atenção para o facto de os Pareceres não terem – como neles se refere expressamente – contabilizado alguns dos lucros cessantes, que compete agora ao Tribunal decidir equitativamente.
775. A autora considera aqui integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais e processuais os relatórios técnicos constantes de fls. 9746-9811.
Face ao supra transcrito, não temos qualquer margem de dúvida em afirmar que a matéria alegada no Capítulo VIII da Parte II da motivação consubstancia numa impugnação de facto.
No que respeita às conclusões, a Autora, no Capítulo VII, sob o título de “A (H) TERIA OBTIDO UMA CONCESSÃO” da Parte II (Matéria de Direito), formulou o seguinte:
109. O Tribunal recorrido errou quando considerou que a autora não teria obtido uma concessão. O TSI deve dar como provado que a autora teria obtido uma das três concessões caso as rés tivessem cumprido as suas obrigações contratuais para com a autora, como resulta da prova e das regras jurídicas aplicáveis para formação deste juízo de prova.
DISCRICIONARIEDADE DA COMISSÃO DO CONCURSO
110. A comissão detinha as seguintes competências: (i) Uma competência procedimental decisória: prática de actos administrativos tendencialmente destacáveis; (ii) A competência para elaborar o Relatório Fundamentado, uma competência procedimental preparatória, de natureza opinativa.
111. A competência da Comissão preenche, na íntegra, as várias vertentes, do poder discricionário: trata-se de um poder habilitado por lei de atribuição de competência (art. 44º do RA 26/2001), tendo em vista um fim legal concretizador de um interesse público especificado – isto é, a escolha das adjudicatárias que “apresentem as condições mais vantajosas para a Região na exploração e operação adequadas dos jogos de fortuna ou azar em casino” (art. 78º/1 do RA 26/2001).
112. Havia um total de sete critérios e elementos legais de ponderação, avaliação e consideração, indicados de forma não exaustiva (“designadamente”: art. 78º/2 do RA). A comissão podia erigir outros critérios e elementos, mas não o fez. Este exercício consubstanciou, simultaneamente, uma discricionariedade de apreciação e uma discricionariedade de acção. A Comissão emitiu juízos com a natureza de avaliação técnica, com elementos de prognose e de ponderação autónoma de factores complexos, tendo em vista a tomada de uma decisão final com consequências políticas.
113. A discricionariedade consiste numa liberdade de escolha entre várias soluções tidas como igualmente possíveis. Teríamos então uma margem volitiva, ao passo que nos conceitos indeterminados essa margem era de cognição. Trata-se do momento volitivo da discricionariedade. Há que distinguir:
a. Discricionariedade na prática de actos administrativos versus discricionariedade regulamentar;
b. Discricionariedade administrativa (volitiva) versus discricionariedade técnica;
c. Discricionaridade de apreciação versus discricionaridade de acção.
114. No caso da Comissão do Concurso todas estas dimensões da discricionariedade estavam presentes, dispondo a Comissão de uma larguíssima margem de discricionariedade, em particular volitiva. Estava em causa decidir do interesse público da RAEM. O Tribunal recorrido confundiu discricionariedade volitiva com discricionariedade técnica.
115. Tendo a experiência sido eleita pela comissão como factor de avaliação prevalecente – e, atento o facto notório da experiência da (C*), bem como a pontuação acrescida atribuída pela comissão à concorrente associada à (C*), em função da dita experiência –, é um juízo elementar de prognose póstuma postular, com elevadíssimo grau de certeza, que qualquer outra concorrente que se tivesse associado à (C*) teria sido, precisamente por esse mesmo motivo, adjudicatária de uma das três concessões adjudicadas.
STANDARD DE PROVA E ÓNUS DA PROVA
116. Nos termos do art. 437º do CPC, o ónus da prova só é aplicável quando existe uma “dúvida sobre a realidade de um facto”. No caso em apreço, face às dezenas de provas, não existe dúvida sobre se a autora obteria uma concessão. Por isso, não há que aplicar o ónus da prova. Resta a necessidade de formar uma convicção judicial aplicando o standard de prova.
117. O standard de prova em processo civil é o da teoria da probabilidade prevalente. Art. 558º/1. Deve preferir-se a hipótese que seja “mais provável que não”, “que é mais provável que seja verdadeira do que seja falsa”. O que está, portanto, em causa em matéria de valoração da prova, não é a autora de fazer um esforço probatório maior do que as rés. O ónus da prova não tem relevância para, nem interfere com o standard de prova. Tal é ainda mais relevante quando estamos perante a prova de um facto hipotético e não de um facto histórico, como é o caso.
PROVA DE QUE AUTORA TERIA OBTIDO UMA CONCESSÃO
118. Resulta da prova produzida e do princípio da discricionariedade volitiva e regulamentar que a autora teria vencido a concessão associada às rés. Tal é particularmente relevante quando o concurso é suposto ser decidido, não só numa avaliação critério a critério, como ainda – e principalmente – numa avaliação global da concorrente em face do interesse público da RAEM. A Comissão tinha discricionariedade na atribuição da ponderação dos critérios. Tal resulta dos arts. 78º/1 e 2 e 82º do RA 26/2001. Conforme resultou da prova produzida e é uso em concursos públicos, na RAEM e fora dela (art. 565º Cód. Comercial), a avaliação das concorrentes deve ser feita recorrendo-se a uma avaliação global e não só critério a critério.
119. A sentença recorrida não valorizou o testemunho dos membros da Comissão. Nenhum membro da Comissão disse que a Autora não teria vencido uma concessão. Pelo contrário, resultou do seu depoimento que a autora teria obtido uma concessão.
120. O facto de o Chefe do Executivo da RAEM ter atribuído, fora de um concurso público, e arriscando violar a Lei do Jogo, uma subconcessão precisamente à (E), demonstra que o Chefe do Executivo sempre quis que a (E) obtivesse uma concessão.
121. Tendo em conta o standard de prova que o Tribunal deve aplicar da probabilidade prevalente (mais provável do que não), não existem dúvidas de que deve dar o facto como provado, pois é mais provável do que não que a autora tivesse obtido uma concessão.”
No entanto, na parte das alegações correspondentes (Capítulo VII da Parte II, expõe simplesmente:
752. “Esta matéria foi discutida nos Pontos 236 a 294, a propósito do Quesito 29, para onde remetemos, e onde se conclui que a (H*) teria obtido uma das três concessões caso as rés tivessem honrado a sua palavra e cumprido as suas obrigações contratuais com a autora.”
Como se vê, a Autora optou por alegar duma forma sintética e concluir duma forma extensa e repetitiva (parcial) o que tinha alegado para a impugnação da decisão de facto sobre o quesito 29º (vide os pontos nos. 236 a 294 das alegações), misturando mais uma vez a impugnação de facto com a impugnação de direito.
Além disso, a Autora aproveitou o convite do Tribunal para ampliar a impugnação da matéria de facto sobre os quesitos 41º, 43º, 48º a 50º, 52º, 53º, 66º, 67º, 69º e 70º, bem como acrescentar os meios probatórios (a título exemplificativo, vide os pontos nºs 207 a 212, 215 a 217, 300, 316, 326 a 329, 331, 341 e 343 das alegações) que não tenham sido invocados nas alegações iniciais.
Na motivação inicial do recurso, a Autora indicou os depoimentos das testemunhas (T13), (T14) e (T15) apenas para fundamentar a impugnação da decisão sobre a matéria de facto relativa aos quesitos 1º a 15º, 17º, 18º, 22º e 24º a 27º (cfr. os pontos nºs 127, 235, 242, 504 e 505 das alegações da motivação inicial), nunca os indicou como meio probatório de suporte da impugnação da resposta dos quesitos 20º, 21º, 23º, 31º, 36º, 43º, 48º a 50º, 52º, 53º, 61º. 66º, 67º e 70º.
Face ao exposto, é de concluir que a Autora não cumpriu integralmente o despacho de aperfeiçoamento, continuando a misturar a impugnação de facto com a de direito, bem como não formulou conclusões de forma sintética e adequada a uma apreensão eficaz do objecto do recurso e das questões que nele cumpre decidir.
Sobre a mesma matéria, o TUI, por despacho do Relator do Proc. nº 76/2022, decidiu o seguinte:
“…
In casu, na sua motivação de recurso para este Tribunal de Última Instância, apresentou o ora recorrente “129 conclusões”.
E, após o nosso convite, veio apresentar “120 conclusões”.
Ora, sem embargo do muito respeito por outro entendimento, mostra-se-nos assim claro que tais “novas conclusões” não se encontram em conformidade com a “letra” e “ratio” do preceituado no citado art. 598º, n.º 1 do C.P.C.M., pois que, (em face do “expediente” agora em causa), totalmente inviável é considerar que o ora recorrente “concluiu, de forma sintética…”.
Não se olvida que às partes assiste (totalmente) o – muito legítimo – direito de alegar o que por bem entenderem em defesa dos seus direitos e interesses.
Sem dúvida alguma!
Porém, como em tudo nesta vida, importante é também que o exercício de qualquer direito respeite os seus (e determinados) limites, especialmente, os impostos pelo “bom senso das coisas” e pelas (naturais) “regras da razoabilidade”…
Se assim não fosse, encontrada estava a forma para se “entorpecer a acção da justiça”, com evidente e incalculável prejuízo para todos os que recorrem aos Tribunais para fazer valer as suas pretensões.
Imagine-se, pois, (como mera hipótese), se seria aceitável (e viável) que todas as peças e expedientes processuais apresentados ao Tribunal tivessem uma “extensão imprópria”, com longas alegações e conclusões, com repetições, e sem qualquer objectividade e precisão…?
Ora, como se nos apresenta evidente, não se mostra possível admitir que assim suceda, sob pena de total impedimento de os Tribunais cumprirem as funções que por Lei lhes são atribuídas.
Por sua vez, tem-se igualmente presente que se deve privilegiar a “substância” à “forma”, emitindo-se – sempre que possível – pronúncia sobre o “mérito” das questões colocadas.
Porém, a situação em apreço, (infelizmente), também não permite tal solução.
Assim, e certo sendo que ao ora recorrente foi dada a oportunidade de apresentar “novas conclusões” em conformidade com o estatuído no art. 598º do C.P.C.M., esclarecendo-se o mesmo da solução que seria adoptada caso não o fizesse, resta agora decidir como segue.
3. Em face do que se deixou exposto, decide-se rejeitar o presente recurso.
…”.
Este despacho foi objecto da reclamação à Conferência e onde foi integralmente confirmado por Acórdão de 08/02/2023.
Por outro lado, a título do Direito Comparado, o STJ de Portugal também tem decidido no mesmo sentido (vide Acórdão de 18/06/2013, Proc. nº 483/08.0TBLNH.L1.S1, in www.dgsi.pt):
“…
É certo que o recorrente, após a Exmª Relatora da Relação ter proferido o supra-referido despacho de aperfeiçoamento, diminui o número do que chamou conclusões. Porém, não reduziu a complexidade nem a inteligibilidade delas. Com efeito, os diversos itens persistem em ser longos e, portanto, não existiu por parte do recorrente qualquer preocupação de sintetismo. Além disso, continua, atendendo aos fundamentos da acção e à decisão proferida, a ser muito difícil e, em certos aspectos até impossível, vislumbrar os fundamentos por que pede a modificação da decisão recorrida. Ou seja, permanece muito complicado, senão inexequível, vislumbrar as questões ou assuntos concretos que o recorrente, de forma juridicamente consequente, quer ver apreciados e decididos pelo Tribunal Superior. As chamadas conclusões estão redigidas de modo pouco compreensível (sob o ponto de vista de coerência legal), não habilitando o tribunal a conhecer e compreender os fundamentos de impugnação aduzidos. São constituídas por longos parágrafos aí se introduzindo além de factos, normas jurídicas, jurisprudência e comentários.
Como se afirmou no acórdão deste STJ de 6-12-2012 (www.dgsi.pt/jstj.nsf), no que respeita ao procedimento posterior ao despacho de aperfeiçoamento de conclusões proferido pelo relator, “não basta que a parte tenha procurado amputar a desmesurada extensão das conclusões originárias, reduzindo-as em certa medida, sendo necessário que, independentemente do grau de redução dessa desproporcionada extensão inicial, as novas conclusões se possam considerar sintéticas e adequadas a uma apreensão eficaz do objecto do recurso e das questões que nele cumpre decidir”.
Continuando as chamadas conclusões a padecer do defeito de serem longas, incongruentes e confusas, não podem valer como conclusões de recurso.
Por outro lado, como se disse acima, é nas conclusões que se sintetiza a exposição crítica do corpo das alegações. Pois bem, em grande parte das chamadas conclusões introduz-se matéria não referenciada no corpo das alegações, o que significa que essas apeladas conclusões extravasam a matéria do alegado. Estamos a referirmo-nos, concreta e essencialmente, ao pedido de apreciação da matéria de facto, assunto que, como se vê, não foi levado ao corpo das alegações (vide fls. 502 a 523).
Concorda-se com o recorrente quando afirma que a formulação de conclusões, consoante a extensão e a complexidade do litígio em apreço, pode ser mais ou menos longa. Também é certo que multiplicidade das circunstâncias em apreciação impõe, forçosamente, um maior número de conclusões.
Mas esta argumentação ao invés de consolidar a posição do recorrente, contraria essa sua orientação. É que atendendo aos fundamentos da acção e ao teor da decisão recorrida, parece-nos patente que, não só não se verifica uma complexidade jurídica acentuada na causa, como também a factualidade a considerar é limitada. Seria por isso, a nosso ver, simples, desde que se integrasse correctamente o discutido e o que estava em causa no pleito, concluir sinteticamente indicando os fundamentos de alteração da decisão.
Por tudo o exposto se nos afigura que o recorrente não cumpriu o ónus que lhe é imposto pelo dito art. 685º A nº 1 (apresentar conclusões sintéticas), pelo que o douto acórdão recorrido merece confirmação.
Defende também a recorrente que a decisão recorrida ao não permitir o recurso “representa um impedimento de acesso à Justiça de todo inconstitucional”.
O douto acórdão recorrido respondeu à objecção dizendo que “o apelante não foi, todavia, impedido de aceder à Justiça: recorreu e recebeu um convite para corrigir os termos do recurso. Convite que aceitou sem que, no entanto, tenha procedido às correcções que lhe foram indicadas. Não foi, pois, o tribunal que impediu o recorrente de aceder à Justiça. Foi, isso sim, o apelante que não quis ou, não soube, colocar as questões que queria que fossem apreciadas e conhecidas”.
A falta de razão do recorrente parece-nos evidente porque fora do Direito Penal não resulta da Constituição nenhuma garantia genérica de direito ao recurso de decisões judiciais. Por outro lado, o princípio constitucional do acesso ao direito e à justiça, expressamente consagrado no citado artigo 20º da Constituição (que “assegura a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos”) não consagra o direito ao recurso para um outro tribunal, sendo também certo que não existe disposição expressa na Constituição que imponha o direito de recurso em processo civil, apesar de em processo e em matéria penal, o artigo 32º estabelecer o duplo grau de jurisdição. Alguns autores têm considerado como constitucionalmente incluído no princípio do Estado de direito democrático o direito ao recurso de decisões que afectem direitos, liberdades e garantias constitucionalmente garantidos, mesmo fora do âmbito penal. Em relação aos restantes casos (como é o caso dos autos) tem-se entendido que o legislador apenas não poderá suprimir ou inviabilizar globalmente a faculdade de recorrer. Isto porque a Lei Fundamental prevê expressamente os tribunais de recurso. Mas considera-se que o legislador ordinário tem ampla margem de conformação do âmbito dos recursos. Neste sentido, refere-se no acórdão deste STJ de 6-12-2012 já acima referido que “são várias as decisões deste Tribunal que não julgaram violadoras da Constituição diversas normas contendo ónus processuais, cujo incumprimento conduz à rejeição de recursos, como, por exemplo, o Acórdão n.º 403/2000 (também disponível na página Internet do Tribunal, em www.tribunalconstitucional.pt e publicado no Diário da República, II Série, n.º 286, de 13 de Dezembro de 2000) - em que se apreciou a conformidade constitucional da exigência, constante do artigo 72.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho de 1981, de arguição de nulidades da sentença no próprio requerimento de interposição do recurso, sob pena de extemporaneidade – ou o Acórdão n.º 122/2002 (igualmente disponível em www.tribunalconstitucional.pt) – no qual o Tribunal não julgou inconstitucional a norma do n.º 2 do artigo 690.º-A do Código de Processo Civil, interpretada no sentido de o recorrente, sob pena de rejeição do recurso tocante à matéria de facto, dever apresentar, em separado da alegação, a transcrição dactilografada das passagens da gravação em que funda o erro na apreciação das provas”.
Não vemos, assim, que o tribunal recorrido, ao não apreciar o recurso em razão de o recorrente não realizar conclusões juridicamente válidas, viole qualquer preceito constitucional, mais particularmente o art. 20º da Constituição supra referenciado.
O recurso é, pois, insubsistente.
…”.
Face ao expendido, é de rejeitar o recurso da sentença final interposto pela Autora.
*
(3) Do despacho saneador de 12/04/2014:
Segundo o alegado na petição inicial, a responsabilidade da 4ª Ré funda-se no incumprimento culposo do acordo por parte das 1ª a 3ª Rés.
Assim, a existência da responsabilidade por parte das 1ª a 3ª Rés no pagamento da indemnização pedida constitui pressuposto da responsabilidade solidária da 4ª Ré.
Ora, uma vez rejeitado o recurso da sentença final e confirmada consequentemente a decisão da absolvição total dos pedidos contra as 1ª a 3ª Rés torna-se inútil apreciar a questão de saber se a 4ª Ré é ou não parte legítima nos presentes autos, já que ainda que seja parte legítima, nunca pode ser condenada face à absolvição total dos pedidos contra as 1ª a 3ª Rés.
Assim, não é de conhecer deste recurso interlocutório.
***
II. Dos recursos interlocutórios das Rés:
Nos termos do nº 2 do artº 628º do CPCM, “Os recuros que não incidam sobre o mérito da causa e que tenham sido interpostos pelo recorrido em recurso de decisão sobre o mérito só são apreciados se a sentença não for confirmada”.
Ora, com a rejeição do recurso da sentença final da Autora, torna-se então desnecessária a apreciação dos recursos interlocutórios das Rés.
*
III. Da litigância má-fé:
Como supra referimos, foi proferido o despacho de aperfeiçoamento para a Autora separar a impugnação da matéria de facto com a impugnação de direito e especificando quais os pontos concretos da matéria de facto de cada quesito que considera incorrectamente julgados, bem como reformular, de forma sintética, a conclusão do recurso em conformidade com o aperfeiçoamento.
No entanto, a Autora aproveitou o convite de aperfeiçoamento para ampliar a impugnação da matéria de facto sobre os quesitos 41º, 43º, 48º a 50º, 52º, 53º, 66º, 67º, 69º e 70º, bem como acrescentar os meios probatórios (a título exemplificativo, vide os pontos nºs 207 a 212, 215 a 217, 300, 316, 326 a 329, 331, 341 e 343 das alegações), que não tenham sido invocados nas alegações iniciais.
Dispõe o artº 385º do CPCM que:
Artigo 385.º
(Litigância de má fé)
1. Tendo litigado de má fé, a parte é condenada em multa.
2. Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
3. Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má fé.
No caso em apreço, a Autora conhece perfeitamente, ou tem obrigação de conhecer o alcance do despacho de aperfeiçoamento.
Sabe perfeitamente ou tem obrigação de saber não poder aproveitar o despacho de aproveitamento para ampliar a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e acrescentar os meios probatórios não invocados na motivação inicial.
Não é crível que a Autora o tenha feito sem se dar conta da ampliação, uma vez que acrescentou 10 quesitos à impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Trata-se duma ampliação grande que não pode ter passado sem conhecimento da Autora.
Ou seja, a Autora agiu de forma dolosa, ou pelos menos, de negligência grosseira.
Assim, ao abrigo das al. a) e d) do nº 2 do artº 385º do CPCM, não pode deixar de ser condenada a Autora como litigante de má-fé, com aplicação da multa correspondente.
Por outro lado, entendemos que o mandatário da Autora tem responsabilidade pessoal nos actos pelos quais se revelou a má fé, já que como advogado experiente não pode ignorar o alcance do despacho de aperfeiçoamento, bem como o âmbito da impugnação da decisão sobre a matéria de facto inicial.
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IV – DECISÃO
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:
- não conhecer dos recursos interlocutórios da Autora;
- rejeitar o recurso da sentença final da Autora;
- não conhecer dos recursos interlocutórios das Rés; e
- condenar a Autora como litigante de má-fé, com multa de 30UC.
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Sem custas nos recursos interlocutórios da Autora e das Rés.
Custas do recurso da sentença final pela Autora.
Notifique e registe.
Transitado o presente aresto, cumpre-se a comunicação a que se alude no artº 388º do CPCM.
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RAEM, aos 17 de Outubro de 2024.
Ho Wai Neng
(Juiz Relator)
Tong Hio Fong
(1º Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong
(2º Juiz-Adjunto)
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147/2023