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Processo nº 523/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 07 de Novembro de 2024
Recorrente: A
Recorrido: B
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  A, com os demais sinais dos autos,
  veio requerer a suspensão dos autos de execução CV1-20-0107-CES alegando que o crédito que havia aqui sido penhorado o havia sido antes no processo que correu termos sob o nº CV2-17-0188-CEO.
  Foi proferido despacho a indeferir o requerimento nos termos do despacho de fls. 117 traduzido a fls. 195v.
  
  Não se conformando com a decisão proferida veio A e agora Recorrente interpor recurso da mesma, formulando as seguintes conclusões e pedidos:
I. Objecto do recurso
1) O despacho proferido pelo MM.º Juiz do Juízo a quo em 05 de Março de 2024 neste processo (constante de fls. 439 do processo em epígrafe, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, doravante designado por “despacho recorrido”) tem o seguinte teor:
“Fls. 394-438:
O requerente, A, como terceiro, ele não pertence ao sujeito positivo ou negativo do processo in casu, pois, não tem legitimidade de apresentar qualquer requerimento, durante a realização do procedimento de execução, deste processo (solicitar ora processo que suspenda o crédito da promessa de compra da fracção “D39”).
Baseando nisso, indefiro o requerimento.
Como incidente, o requerente, A, tem que pagar às custas de 2UC.”
2) Salvo o devido respeito pelo Exm.º Juiz do Juízo a quo, o recorrente não se conforma nem concorda com o despacho recorrido.
3) Na óptica do recorrente, o despacho recorrido sofre de vício de erro de julgamento ou erro de aplicação da lei.
4) Pelo exposto, vem apresentar o presente recurso aos Exm.ºs Juízes do Tribunal de Segunda Instância.
II. Motivação do recurso
i. Fundamentos do despacho recorrido
5) Salvo o devido respeito pelo Exm.º Juiz do Juízo a quo, o recorrente não concorda que o litígio deva ser resolvido consoante os art.ºs 292.º e seguintes do CPC, ou seja, mediante embargos de terceiro.
6) Antes de mais, vamos explicar porque é que o procedimento de embargos de terceiro não é o meio processual correcto.
7) De acordo com as disposições do art.º 292.º, agora, o objecto do litígio é um crédito em dinheiro (o montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39”) e não o direito de aquisição da fracção “D39” (coisa determinada), porquanto a fracção “D39” é uma fracção do C, o terreno onde foi construído o edifício cuja concessão foi declarada caducada.
8) O montante do crédito penhorado que deriva do direito de promitente-comprador da fracção “D39” é uma determinada quantia que a promotora do empreendimento, D Limitada, deve pagar ao promitente comprador por não conseguir cumprir os contrato-promessa de compra e venda.
9) Em seguida, vamos analisar se o recorrente nesta causa satisfaz ou não os fundamentos para deduzir embargos de terceiro e tem ou não a legitimidade para intervir nos embargos de terceiro.
10) Primeiro, segundo o art.º 1175.º do CC, o bem penhorado neste processo é o montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” e o bem penhorado pelo recorrente é apenas o direito a um crédito, não existindo a questão de posse.
11) O recorrente não pode deduzir os embargos de terceiro pela razão de que a sua posse foi ofendida, porque o recorrente não tem a posse.
12) Segundo, a penhora do crédito inicia-se com a notificação emitida pelo tribunal ao devedor de tal direito.
13) Para comprovar que a penhora do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” por parte do recorrente é anterior à penhora do Juízo a quo, o recorrente apresentou ao Juízo a quo a certidão elaborada pelo Juízo do processo nº CV2-17-0188-CEO em 13 de Maio de 2022 e 17 de Outubro de 2022, respectivamente.
14) Da certidão referida resultou saber que o crédito do recorrente não foi liquidado;
15) Em 11 de Novembro de 2019, o recorrente pediu ao Juízo que conheceu do processo nº CV2-17-0188-CEO a penhora do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” e a penhora foi deferida em 6 de Dezembro de 2019 pelo juiz do processo;
16) Em 10 de Dezembro de 2019, o Juízo julgador do processo nº CV2-17-0188-CEO notificou a devedora, D Limitada, da penhora por meio da carta registada sem aviso de recepção;
17) Dado que a carta registada sem aviso de recepção não tinha aviso de recepção, o recorrente não era capaz de ter conhecimento, através de aviso de recepção, sobre a data em que a devedora, D Limitada, recebeu concretamente a notificação de penhora;
18) Em 06 de Janeiro de 2020, a devedora, D Limitada, respondeu por meio de fax ao Juízo que conheceu do processo nº CV2-17-0188-CEO, admitindo que a executada, E, dispõe de um crédito sobre a fracção “D39” (no valor de HKD1.648.140.00).
19) De acordo com o documento “acordo sobre a restituição dos preços de venda das fracções já recebidos e acordo para revogar os contratos-promessa de compra e venda das fracções do C” apresentado pela devedora, D Limitada, em 18 de Janeiro de 2019, a executada, E, convencionou com a devedora, D Limitada, o pagamento em prestações do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39”:
- 1ª prestação: restituir 20% do preço da fracção já pago, ou seja, HKD633.900,00, na data de celebração do acordo;
- 2ª prestação: restituir 30% do preço da fracção já pago, ou seja, HKD950.850,00, no prazo de meio ano a partir da data de celebração do acordo;
- 3ª prestação: restituir 50% do preço da fracção já pago, ou seja, HKD1.584.750,00, no prazo de um ano a partir da data de celebração do acordo;
- pagar adicionalmente 2% do preço da fracção (no valor de HKD63.390.00), a título de bonificação, dada pela promotora do empreendimento em conjunto com a última prestação de 50% do preço da fracção.
20) Na altura da resposta da devedora, D Limitada, ao Juízo, os pagamentos das 1ª e 2ª prestações foram efectivamente entregues à executada, E, faltando-lhe pagar apenas a 3ª prestação e a bonificação no valor total de HKD1.648.140,00.
21) Segundo o “acordo sobre a restituição dos preços de venda das fracçõe já recebidos e acordo para revogar os contratos-promessa de compra e venda das fracções do C”, o prazo de pagar a 3ª prestação e a bonificação venceu-se no dia 18 de Janeiro de 2020 (um ano a partir da data de celebração do acordo).
22) O montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” da executada, E, cuja penhora foi requerida pelo recorrente, era um crédito não vencido.
23) Dispõe o art.º 746.º, n.º 1 do CPC que logo que a dívida se vença, o devedor, se a não tiver impugnado, é obrigado a depositar a respectiva importância na entidade responsável pela Caixa Geral do Tesouro do Território, à ordem do tribunal, e a juntar ao processo o documento do depósito, ou a entregar a coisa devida ao exequente, que funciona como seu depositário.
24) Desde o início até ao fim, a devedora, D Limitada, não impugnou a dívida referida, ao contrário, admitiu expressamente a existência de tal dívida.
25) Depois de o prazo de pagamento da 3ª prestação e da bonificação, no valor total de HKD1.648.140.00, ter-se vencido em 18 de Janeiro de 2020, a devedora, D Limitada, devia depositar imediatamente, a quantia supra mencionada no Juízo que julgou o processo nº CV2-17-0188-CEO.
26) De facto, a devedora, D Limitada, teve conhecimento, pelo menos em 06 de Janeiro de 2020, da decisão de penhora do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” proferida pelo Juízo julgador do processo nº CV2-17-0188-CEO.
27) Assim, pelo menos em 06 de Janeiro de 2020, dia em que a devedora, D Limitada, teve conhecimento da decisão de penhora do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” proferida pelo Juízo julgador do processo nº CV2-17-0188-CEO, a penhora tinha sido realizada com sucesso e foi criado o direito real de garantia ao crédito do recorrente que tem como objecto o bem penhorado. Esta norma encontra-se no n.º 1 do art.º 812.º do CC, a penhora é a criação de uma garantia real sobre o crédito do exequente que tem como objecto os bens penhorados, por forma a que o crédito do exequente possa ser liquidado com preferência.
28) A doutrina entende que o direito real de garantia, em princípio, compreende hipoteca, direito de penhor, direito de retenção e privilégio creditório, não sendo estes direitos incompatíveis com a penhora ou outros actos de apreensão de bens praticados por tribunal.
29) Ou podemos dizer que o direito real de garantia é de natureza compatível com a medida de penhora, porque depois de o tribunal proceder à penhora, deve convocar os credores com garantia real sobre os bens penhorados para que, quando estejam cumpridos os requisitos legais, possam solicitar que os respectivos créditos sejam liquidados na ordem prevista na lei, com o preço obtido em posteriores vendas judiciais ou adjudicação.
30) Assim, o direito real de garantia dos demais credores do executado não será prejudicado pela penhora praticada, pelo que o recorrente também não pode deduzir embargos de terceiro com direitos incompatíveis.
31) Da análise acima feita verifica-se que, quanto a que o Juízo a quo indicou expressamente que o recorrente devia agir através de embargos de terceiro, este, na verdade, não é a forma correcta para resolver o presente caso e também padece de erro na aplicação da lei.
ii. Deve ser aplicada nesta causa a resolução prevista no art.º 764.º do CPC
32) Na óptica do recorrente, o art.º 764.º do CPC já previu soluções para o caso de pluralidade de execuções sobre os mesmos bens.
33) O Juízo que conheceu do Processo nº CV2-17-0188-CEO ordenou, em 6 de Dezembro de 2019, a penhora do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” envolvida no caso;
34) E em 10 de Dezembro de 2019, notificou a devedora, D Limitada, por meio da carta registada sem aviso de recepção;
35) Em 06 de Janeiro de 2020, a devedora, D Limitada, respondeu por meio de fax ao Juízo que conheceu do processo nº CV2-17-0188-CEO, admitindo que a executada, E, dispõe do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” envolvida no caso no valor de HKD1.648.140.00.
36) Antes de 18 de Janeiro de 2020, a dívida supra mencionada ainda não se venceu.
37) Após o vencimento da dita dívida (18 de Janeiro de 2020), a devedora, D Limitada, devia depositar imediatamente a quantia de HKD1.648.140.00 no Juízo julgador do processo nº CV2-17-0188-CEO.
38) Somente em 7 de Abril de 2022 é que a devedora, D Limitada, notificou o juiz que conheceu do processo n.º CV2-17-0188-CEO de que tinha depositado neste processo a mesma quantia de dinheiro (o montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” no valor de HKD1.648.140.00) em 28 de Março de 2022.
39) Analisado o teor de fls. 224 dos autos, o juiz do presente processo só decidiu aprovar a conversão do arresto do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” envolvida neste caso em penhora no dia 22 de Julho de 2021.
40) Comparadas as ordens de penhora feitas nos dois casos, é óbvia que a decisão de penhora feita no processo n.º CV2-17-0188-CEO (06 de Dezembro de 2019) e a data em que foi notificada à D Limitada, a penhora com sucesso (6 de Janeiro de 2020), são muito anteriores à decisão de penhora feita neste processo (22 de Julho de 2021).
41) A penhora é a criação de uma garantia real sobre o crédito do exequente que tem como objecto os bens penhorados, por forma a que o crédito do exequente possa ser liquidado com preferência. Esta norma encontra-se no n.º 1 do art.º 812.º do CC.
42) Toma-se por referência a opinião incisiva do Tribunal de Segunda Instância expressa no acórdão do processo n.º 616/2018, quando tenha lugar a conversão do arresto em penhora no processo de execução, não obstante, no plano substantivo, o critério para efeitos de graduação de créditos dever ser a data do registo de arresto e não a da conversão do arresto em penhora (artigo 812.º, n.º 2, do Código Civil), o que aplicamos atualmente é a regra especial do artigo 764.º do Código de Processo Civil, portanto, do ponto de visto do direito processual, para determinar em que processo de execução deverá ser procedido o pedido de reclamação de crédito, a data em que o juiz tomou a decisão de penhora e a data de conversão do arresto em penhora devem servir como critério para determinar a ordem das penhoras.
43) De acordo com o efeito do direito substantivo, quanto ao montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” em causa, visto que a penhora do recorrente foi anterior à do exequente neste processo, e tal penhora não necessita de ser registada, assim a data em que o juiz do processo de execução efetuou a penhora deve ser utilizada para determinar a anterioridade da penhora ou a ordem de pagamento dos credores.
44) Para os efeitos do direito processual, segundo o art.º 764.º, n.º 1, do CPC, no caso de mais de uma penhora sobre um mesmo bem, suspende-se a execução em que a penhora tenha sido posterior, devendo o exequente reclamar o crédito na execução em que a penhora seja mais antiga.
45) No caso dos autos, o Juízo a quo só deferiu o arresto do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” requerido pelo exequente, B (sic), em 16 de Dezembro de 2019. O mesmo Juízo deferiu a conversão do dito arresto em penhora apenas em 22 de Julho de 2021 e notificou a devedora, D Limitada, por meio da carta registada em 27 de Julho de 2021 (fls. 59v e 62 dos dos autos)
46) Para determinar se a reclamação de crédito deve ser realizada neste processo ou no processo n.º CV2-17-0188-CEO, as datas em que os juízes dos dois processos proferiram a decisão de penhora e a data em que o arresto foi convertida em penhora podem servir como critérios de juízo.
47) A penhora decidida pelo Juízo julgador do processo n.º CV2-17-0188-CEO é, em qualquer forma, anterior ao arresto decidido pelo Juízo a quo deste caso ou à decisão de converter o arresto em penhora.
48) Para a penhora de créditos que não está sujeito a registo, dispõe o art.º 742.º, n.º 1, do CPC que as datas de deferimento de penhora por parte dos juízos determinam a ordem dos processos.
49) O crédito do recorrente é anterior ao de B (sic), exequente neste processo. E o exequente neste processo, B (sic), deveria reclamar o seu crédito no processo de execução de penhora anteriormente apresentado (processo de execução n.º CV2-17-0188-CEO).
50) O ponto de vista acima também é sustentado pelo acórdão (288/2023) proferido pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância que tinha conhecido do recurso deste caso.
51) Por fim, acreditamos que o disposto no art.º 742.º, n.º 1, do CPC importa-se mais com o juízo que toma a primeira decisão de penhora, não com o tribunal onde o devedor deposita o dinheiro.
52) No caso vertente, o recorrente já juntou a certidão de penhora a este processo, tendo pedido a observância das disposições legais. Além disso, o Juízo que conheceu do processo n.º CV2-17-0188-CEO manifestou expressamente que permite ao recorrente requerer a medida neste processo que acha adequada.
53) O recorrente já deixou claro no primeiro requerimento que se fundamentou nas regras previstas no art.º 764.º do CPC, ou seja, o pedido do recorrente é suspender a execução do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39”, requerendo ainda que o exequente B (sic) reclame o crédito no processo de execução n.º CV2-17-0188-CEO.
54) Toma-se por referência o ponto de vista expresso no processo nº 174/2002 do Tribunal de Segunda Instância, logo que o juiz da execução tenha conhecimento de que os bens já foram penhorados noutro processo, deve ordenar a suspensão da execução dos bens e permitir que o exequente reclame o crédito no processo em que os bens foram penhorados em primeiro lugar.
55) Quando ocorrer a situação acima indicada (pluralidade de execuções sobre os mesmos bens), o juiz que proferiu a decisão de penhora posterior ordena a suspensão da execução, sendo isso o dever cumprido oficiosamente e uma aplicação correcta da lei.
56) O recorrente enfatizou constantemente que a sua pretensão desde o início até ao fim não é exigir o levantamento da penhora ou impugnar a decisão de penhora, mas sim aplicar correctamente as regras processuais previstas no art.º 764.º do CPC.
57) A norma do art.º 764.º do CPC não exige (nem é apropriada) que um terceiro duma relação processual deduza a sua pretensão através de embargos de terceiro, porquanto o juiz tem o dever de aplicar correctamente a lei, além disso, tal norma deve ser cumprida oficiosamente.
58) Caso o Juízo a quo não decida sustar a execução do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” envolvida no caso, a sua decisão violará o disposto no art.º 764.º, n.º 1, do CPC.
59) Face ao exposto, requerer-se ao Venerando Tribunal de Segunda Instância que julgue procedente a motivação do recurso supra apresentada, anule o despacho recorrido e ordene ao Juízo a quo que suste a execução do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” nos termos do art.º 764.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, para que o exequente neste processo reclame o crédito no processo n.º CV2-17-0188-CEO. Para tanto, o montante do crédito será entregue ao processo n.º CV2-17-0188- CEO e ficará à disposição do Juízo julgador do processo.
iii. Para produzir uma sentença com efeitos normais e úteis
60) Dado que o presente recurso tem efeito meramente devolutivo, o Juízo a quo não precisa de aguardar o resultado deste recurso para a aprovação da liquidação e pagamento do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39” ao exequente, B (sic).
61) Após a interposição do recurso pelo recorrente, o exequente, B (sic), requereu imediatamente ao Juízo a quo liquidação e pagamento, incluindo o pagamento a ele do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39”.
62) O Juízo a quo já deferiu o dito requerimento de pagamento. (fls. 443 dos autos deste processo)
63) Uma vez obtido pelo exequente, B (sic), o pagamento do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39”, o resultado do presente recurso deve limitar-se à revogação do despacho recorrido e à ordem ao Juízo a quo para suspender a execução do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39”
64) O recorrente tem razão para acreditar que o resultado deste recurso será provavelmente posterior ao pagamento do montante em causa ao exequente, B (sic).
65) De acordo com o princípio da economia processual, o recorrente entende que o resultado deste recurso não se deve limitar à revogação do despacho recorrido e à ordem ao Juízo a quo para suspender a execução do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39”, deve ainda abranger a ordem ao exequente, B (sic) de que, caso lhe seja pago o montante em causa, ele tem a obrigação de entregar o montante do crédito de HKD 1.648.140,00 obtido ao processo n.º CV2- 17-0188-CEO.
Face a todo o exposto, caso haja algumas omissões, requer-se aos Exm.ºs Juízes do Tribunal de Segunda Instância que:
1. indiquem as omissões para ser supridas nos termos da lei e admitam este recurso;
2. julguem procedente a motiva do recurso, e:
a) anulem o despacho recorrido;
b) ordenem ao Juiz a quo a sustação da execução do montante do crédito proveniente do direito de promitente-comprador da fracção “D39”, nos termos do art.º 764.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, a fim de permitir ao exequente deste processo reclamar o crédito nos autos do processo n.º CV2-17-0188-CEO;
c) ordenem ao Juízo a quo a entrega do montante do crédito obtido, no valor de HKD1.648.140,00, ao processo n.º CV2-17-0188-CEO, ficando o montante à disposição do Juízo julgador do processo; ou
d) caso ao exequente, B (sic) seja pago o montante em causa, ele tem a obrigação de entregar o montante do crédito de HKD 1.648.140,00 obtido ao processo n.º CV2- 17-0188-CEO;
e) condenem o recorrido no pagamento das custas processuais e honorários.
  
  O Exequente e agora Recorrido contra-alegou, não apresentando, contudo conclusões.
  
  Foram colhidos os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO

a) Dos Factos

1. No processo que correu termos sob o nº CV1-19-0019-CPV, actualmente CV1-20-0107-CES-A foi requerido o arresto por B, aqui Exequente contra E aqui Executada, o qual foi decretado por decisão de 16.12.2019 ordenando-se o arresto sobre o direito de crédito da Executada sobre a Devedora D Limitada relativamente à indemnização que tinha a receber proveniente do direito da Executada enquanto promitente comprador da fracção autónoma “D39” ali melhor identificada – cf. fls. 172 a 178 -;
2. Aquela decisão foi notificada com sucesso à Devedora D Limitada em 26.12.2019 – cf. fls. 101 a 102 -;
3. Nos autos de execução em que são Exequente o aqui Recorrente A e Executada E, o qual corre termos sob o nº CV2-17-0188-CEO em 11.11.2019 a Exequente requereu que se notificasse a D Limitada para informar da existência de créditos da Executada o que foi deferido por despacho de 06.12.2019 – cf. fls. 416 traduzido a fls. 423 e fls. 428 do indicado processo o qual requisitámos para consulta -;
4. A D Limitada foi notificada para prestar a informação nos termos do ofício de fls. 429 do indicado processo a qual aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;
5. Em 06.01.2020 a D Limitada informou perante o processo CV2-17-0188-CEO a existência do crédito – fls. 430 a 481 do indicado processo o qual requisitámos para consulta -;
6. No processo CV2-17-0188-CEO apenas em 17.11.2020 é requerida a penhora de bens da Executada que não o crédito em causa, penhora essa que foi ordenada por despacho datado de 26.11.2020 – cf. fls. 507 e 508 do indicado processo o qual requisitámos para consulta -.

b) Do Direito
  
  É do seguinte teor a decisão recorrida:
  «Fls. 394-438:
  O requerente, A, como terceiro, ele não pertence ao sujeito positivo ou negativo do processo in casu, pois, não tem legitimidade de apresentar qualquer requerimento, durante a realização do procedimento de execução, deste processo (solicitar ora processo que suspenda o crédito da promessa de compra da fracção “D39”).
  Baseando nisso, indefiro o requerimento.
  Como incidente, o requerente, A, tem que pagar às custas de 2UC.».
  Do despacho de sustentação consta que:
  «Nos termos do artigo 617.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, o presente Tribunal mantém-se a decisão recorrida, e, vem, subsidiariamente, o seguinte:
  Relativamente à promessa de compra da fracção “D39”:
1.) Em 06 de Dezembro de 2019, o processo CV2-17-0188-CEO, proferiu o despacho de penhora, mas, só no dia 28 de Março de 2022 é que tinha sido notificado a devedora, D (vide certidão, fls. 35);
2.) Em 16 de Dezembro de 2019, o processo CV1-20-0107-CES-A, proferiu o arresto, e foi notificado a devedora, D, a respectiva decisão, em 26 de Dezembro de 2019 (vide certidão, fls. 101 – 102v.) (o aludido arresto foi através do despacho proferido em 22 de Julho de 2021, converteu para a penhora, e notificado a devedora, D, em 15 de Fevereiro de 2022).
3.) Em 28 de Março de 2022, D depositou o valor neste processo (vide certidão, fls. 62).
  Nos termos do artigo 742.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, a penhora de créditos consiste na notificação ao devedor de que o crédito fica à ordem do tribunal da execução.
  Podemos ver desde as alíneas 1.) a 3.), acima referidas, o processo principal (CV1-20-0107-CES) in casu, tinha sido notificado em antes do que CV2-17-0188-CEO, à devedora para a entrega do aludido montante à disposição do tribunal, e a mesma já depositou o montante no CV1-20-0107-CES, pelo que não pode o terceiro em solicitar a transferência do dito montante, isto prejudicará notoriamente o interesse do exequente do CV1-20-0107-CES (ou seja, o processo principal de ora autos de apenso).
  Baseado com os fundamentos acima expostos, o pedido apresentado pelo recorrente é impossível de ser sustentado.
*
  Desentranhamento de ora autos de apenso e sobe ao Tribunal de Segunda Instância, que fará a acostumada justiça.
*
  Notifique e diligências necessárias.».
  
  A questão a decidir não apresenta complexidade de maior.
  Nos termos do nº 1 do artº 764º do CPC “pendendo mais do que uma execução sobre os mesmos bens, suspende-se quanto a estes a execução em que a penhora tenha sido posterior”.
  A penhora de créditos, como ocorre no caso dos autos, consiste na notificação ao devedor de que o crédito fica à ordem do tribunal da execução – cf. artº 742º do CPC -.
  Da factualidade apurada o que resulta é que no processo de arresto apenso a estes autos em 16.12.2019 foi decretado o arresto sobre o crédito aqui em questão relativamente à compensação devida à Executada pela perda do direito de crédito de aquisição da fracção D39.
  Essa decisão – a de arresto - foi efectivamente notificada à Devedora D Limitada em 26.12.2019.
  No processo que corre termos sob o nº CV2-17-0188-CEO apenas se oficiou à D Limitada para informar da eventual existência do crédito ao que esta respondeu por requerimento de 06.12.2019 a declarar que o crédito existia.
  Até 26.11.2020 não havia sido proferido despacho de penhora algum no processo CV2-17-0188-CEO, e este despacho de penhora ainda não incide sobre o crédito em causa nestes autos.
  Nos termos do nº 2 do artº 812º do C.Civ. tendo os bens do executado sido previamente arrestados a anterioridade da penhora reporta-se à data do arresto.
  Nos termos do nº 2 do artº 351º do CPC ao arresto aplicam-se as disposições relativas à penhora, isto é, o arresto realiza-se nos mesmos termos que a penhora pela notificação ao devedor de que o crédito fica à ordem do tribunal.
  Contrariamente ao que o Recorrente invoca o despacho que converte o arresto em penhora é uma mera formalidade que não tem qualquer influência quanto à data a que se reporta a anterioridade da penhora uma vez que nos termos da indicada disposição legal esta resulta da data em que se fez o arresto e não de qualquer outro despacho.
  Destarte, em face da factualidade apurada, estando demonstrado que a notificação do arresto ao devedor aconteceu em 26.12.2019 e que até essa data não havia sido notificada penhora alguma no processo CV2-17-0188-CEO, impõe-se concluir que não se prova que haja sido realizada penhora alguma antes da penhora realizada nestes autos, pelo que, nos termos do artº 764º do CPC não é nesta execução que deve ser ordenada a suspensão da penhora do crédito, caso hajam sido realizadas outras penhoras sobre este crédito noutros processos.
  
  Assim sendo, impõe-se concluir em conformidade mantendo a decisão recorrida e negando provimento ao recurso.

III. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, negando-se provimento ao recurso mantém-se a decisão recorrida.
  
  Custas a cargo do Recorrente.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 07 de Novembro de 2024
  
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)

Fong Man Chong
(1o Juiz-Adjunto)

Ho Wai Neng
(2o Juiz-Adjunto)
  

523/2024 CÍVEL 4