Processo n.º 83/2024
(Autos de recurso contencioso)
Relator: Fong Man Chong
Data : 07 de Novembro de 2024
Assuntos:
- Pedido de informação fiscal proveniente de outra jurisdição e princípio do contraditório
SUMÁRIO:
I – Nos termos do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 8.º da Lei n.º 5/2017 (Regime jurídico de troca de informações em matéria fiscal), de 12 de Junho, o procedimento de troca de informações em matéria fiscal inicia-se mediante pedido devidamente justificado, apresentado pela autoridade competente da parte requerente (de outra jurisdição), acompanhado de todos os elementos que permitam a adequada identificação das pessoas singulares ou colectivas, e da respectiva pretensão.
II - Segundo se preceitua na norma do n.º 1 do artigo 9.º da citada Lei n.º 5/2017, a DSF deve notificar as pessoas singulares ou colectivas, a quem as informações respeitam, os fins da recolha da informação, suas origens e conteúdo, e é na sequência dessa notificação que as pessoas singulares ou colectivas afectadas podem interpor recurso contencioso com efeito suspensivo da decisão da troca de informações, com fundamento em erro na informação a remeter, salvo as excepções previstas na última parte do n.º 1 do artigo 9.º da citada Lei, em que não há lugar à respectiva notificação.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo n.º 83/2024
(Autos de recurso contencioso)
Data : 07 de Novembro de 2024
Recorrente : A
Entidade Recorrida : Chefe do Executivo da RAEM
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ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I – RELATÓRIO
A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando da decisão do Chefe do Executivo de troca de informações em matéria fiscal na sequência de pedido formulado pela República da Coreia, veio, em 29/01/2024, interpor o recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 10, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. 被上訴之行政行為接納大韓民國國稅局向澳門特別行政區提出專項信息交換的請求的決定批示(以下簡稱“被上訴決定”)及有關卷宗內的文件司法上訴人。
2. 上述接納大韓民國國稅局向澳門特別行政區提出專項信息交換的請求的決定之批示未有對司法上訴人作出通知。
3. 對於接納大韓民國國稅局向澳門特別行政區提出專項信息交換的請求的決定之批示,除給予應有之尊重外,司法上訴人不表認同。
4. 司法上訴人明確不同意澳門特別行政區行政長官向大韓民國國稅局提交擬送交的有關司法上訴人的信息。
5. 認為被上訴決定沾有在行使行政權力時有明顯錯誤而違反“行政當局與私人合作原則”和“參與原則”之瑕疵而可撤銷。(《行政訴訟法典》第21條第1款c)項,《行政程序法典》第9條和第10條)
6. 澳門特別行政區行政長官作出最終決定前亦未有對司法上訴人進行聽證。
7. 司法上訴人認為,上述接納大韓民國國稅局向澳門特別行政區提出專項信息交換的請求的決定的行政程序須對司法上訴人事先進行聽證。
8. 誠然,事先聽證的權利相對於《基本法》中維護的實體性質的權利,是一種輔助性權利。如果影響一項基本權利的關鍵內容,違反這一手續只會因此具有主要違反的性質―《行政程序法典》第122條第2款d項。
9. 綜上所述,被上訴行政行為因違反《行政程序法典》第9條所規定的“行政當局與私人合作原則”和第10條所規定的“參與原則”,故根據《行政程序法典》第122條第2款d項的規定,被上訴行政行為無效,故不產生任何法律效果。
10. 司法上訴人認為,擬送交的信息存在錯誤。
11. 財政局擬送交韓國稅務局的B有限公司有關司法上訴人銀行帳戶資料的複印本顯示,銀行帳戶編號為182XXX264及183XXX197。(參見文件2)
12. 司法上訴人於2023年5月17日結清並銷戶其於2019年9月6日在B有限公司開立的存款及定期賬戶(賬號:182XXX264,182XXX182)。(參見文件3)
13. 但在財政局證明書最後一頁所顯示的開戶清單中之三個帳號A/C 1. 268XXX346;A/C 2. 2XXX18及A/C 3. 018XXX887,而且開戶日期:2017年10月26日。(參見文件2)
14. 不難發現,韓國稅務局要求提供信息的銀行賬號與財政局的證明書中的開戶清單的賬戶號碼不一致。
15. 另外,就銀行帳戶編號為182XXX264的開戶日期及B銀行發出的B尚支證[2023]40號證明書中的開戶日期亦不一致。(參見文件2及3)。
16. 因此,司法上訴人認為所涉的擬送交的信息存在錯誤,故根據《行政程序法典》第124條的規定,被上訴行政行為沾有可撤銷的瑕疵。
綜上所述,謹請求尊敬的法官 閣下裁定司法上訴人的上訴理由成立,裁定:
1. 被上訴行政行為因違反《行政程序法典》第9條所規定的“行政當局與私人合作原則”和第10條所規定的“參與原則”,故根據《行政程序法典》第122條第2款d項的規定,被上訴行政行為無效,故不產生任何法律效果;或
2. 因被上訴決定所涉的擬送交的信息存在錯誤,故根據《行政程序法典》第124條的規定,被上訴行政行為沾有可撤銷的瑕疵,宣告撤銷被上訴決定。
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Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Chefe do Executivo da RAEM veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 33 a 39, tendo alegado o seguinte:
1. O recurso que ora se contesta tem por objecto o acto de aceitação do pedido1 de troca de informações a pedido que foi notificado ao Recorrente pela Direcção dos Serviços de Finanças ("DSF"), notificado ao peticionante através do ofício nº 1263/DIFT/DAIJ/2023/JK.
2. Sendo o presente recurso contencioso de mera legalidade, tem tão-somente "por finalidade a anulação dos actos recorridos ou a declaração da sua nulidade ou inexistência jurídica" - é o que dispõe o artigo 20.° do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC).
3. Assim, o que há a discutir nos presentes autos é a verificação ou não dos alegados vícios do acto administrativo, ora contestado, conforme o disposto no artigo 21.° do CPAC.
4. Pretende a recorrente a anulação do acto recorrido, assacando-lhe vício de violação de lei, com base no disposto no artigo 21.°, n.º 1, alínea c) do CPAC e artigos 9°, 10° e 93.° do CPA.
5. A entidade recorrida pugna pela improcedência do presente recurso devendo a decisão recorrida manter-se.
Vejamos
6. A troca de informações é uma ferramenta essencial para as autoridades fiscais em todo o mundo, a fim de assegurar que todos os contribuintes paguem o montante correcto de impostos.
7. As administrações fiscais, de modo a superar os crescentes obstáculos na obtenção de informações sobre transações internacionais, activos offshore e assuntos financeiros dos seus residentes, trabalharam em conjunto e empenharam-se na cooperação mundial através da troca de informações em matéria fiscal:
• A troca de informações a pedido2 é utilizada quando são necessárias informações adicionais para fins fiscais de outra jurisdição.
8. Foram estabelecidos outros meios complementares de assegurar os fins de combate a evasão e fraude fiscal, designadamente ao nível de outras formas de cooperação administrativa, como verificações fiscais simultâneas que permitam a duas ou mais jurisdições realizar auditorias simultâneas de pessoa(s) de interesse comum ou complementar, ou verificações fiscais no estrangeiro para recolher informações numa jurisdição estrangeira.
9. O que está em causa no pedido de informações em matéria fiscal apresentado é que a Parte Contratante requerente da informação considera que a mesma é ou pode ser previsivelmente relevante para a correcta liquidação de imposto no referido país relativamente ao Recorrente, contribuinte que se encontra sujeito a imposto nesse mesmo país. Tal facto enquadra-se integralmente quer na letra, quer no espírito, da Convenção Multilateral, quer no respectivo Regime jurídico da troca de informações em matéria fiscal - Lei n.º 5/2017, alterado pela Lei n.º 1/20223.
10. Conforme passamos a rebater não assiste qualquer razão ao Recorrente, relativamente aos argumentos apresentados na petição inicial, pelo que desde já se pugna pela improcedência do recurso.
11. Através de ofício, de 15 de Setembro de 2023, proveniente da Autoridade Tributária da Republica da Coreia cf páginas 2 a 5 do processo administrativo instrutor, foi efectuado um pedido de troca de informações, solicitando que a sociedade prestasse as seguintes informações constantes no memorandum:
"Account number: 182XXX264 and 183XXX197 with BANCO DA B
- Bank statements (including date, amount, balance and the counterpart of each transaction), and account opening forms(including documents attached thereto)."
12. A referida Parte Contratante4 e entidade requerente da informação efectuou circunstanciada identificação do seu contribuinte, o ora aqui Recorrente, com o devido enquadramento relevante constante na pagina 4 do processo administrativo instrutor.
13. Conforme se encontra obrigada quer pela Convenção Multilateral sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal (adiante designada por "Convenção"), quer pelo Regime Jurídico da Troca de Informações em Matéria Fiscal, doravante RJTIMF, aprovado pela Lei n.º 5/2017, de 12/6, alterado pela Lei n.º 1/2022 Cf Artigo 4° e 5.°, foi instruído o pedido mediante a proposta n.º 0159/DAIJ/2023, de 6/10/23 - Cf a paginas 6 e seguintes do processo administrativo instrutor, máxime ponto (7) na pagina 8.
14. É entendimento da entidade Recorrida estar integralmente verificado o pressuposto de informação previsivelmente relevante para efeitos de um pedido de troca de informações em matéria fiscal, cf máxime ponto (7) na página 8 processo do administrativo instrutor. Desde logo porque tal pressuposto deve ser entendido de forma ampla tal como consta dos standards definidos pela OCDE que constituem a base para a interpretação do pressuposto de previsível relevância para a troca de informações em matéria fiscal.- cfr. Comentários 3 e 4 à convenção modelo da OCDE de acordo de troca de informações em matéria fiscal.
15. Por outro lado, dado que a informação recolhida pela Autoridade Competente e transmitida ao abrigo do pedido de troca de informações está sujeita ao princípio de confidencialidade5 e como tal não é objecto de divulgação fora do âmbito das Partes. Isto porque é dever de um Estado, enquanto Parte contratante, manter a confidencialidade das informações obtidas "do mesmo modo que a informação obtida com base na legislação interna desse Estado". Essa determinação representa o coração da assistência recíproca entre as Administrações Tributárias dos países. Os comentários da OCDE a respeito desse parágrafo esclarecem que a confidencialidade não se limita apenas às informações propriamente ditas, mas alcançam todos os documentos, envolvendo, inclusive, as requisições formais entre os Estados Contratantes 15 (RAAD, Kees Van (org.). Materiais on international, TP & EU tax law. 15. ed. Haia: International Tax Center Leiden, 2015, p. 567).
16. Em conformidade com os procedimentos previstos no artigo 8.° do RJTIF, e após concordância da entidade Recorrida, foi efectuado pela DSF pedido de informação a entidade financeira, referida no pedido - BANCO DA B, S.A - através do ofício n.º 1237/DIFT/DAIJ/2023/JK, de 10/11/2023, Cf página 35 do processo instrutor.
17. Foi recebida a informação pretendida prestada pelo BANCO DA B, S.A constante a páginas 36 e seguintes do processo administrativo instrutor.
18. Apreciando os fundamentos alegados na petição inicial pelo Recorrente os mesmos incidem sobre a pretensa necessidade de audiência prévia, sendo certo que a mesma não é prevista no RJTIF, aprovado pela Lei n.º 5/2017, de 12/6, alterado pela Lei n.º 1/2022, que é lei especial relativamente ao CPA de Macau, sendo esta troca desejavelmente célere e ficando consagrado o direito de defesa - recurso contencioso com efeito suspensivo - previsto no n.º 3 do artigo 9.° - que a mesma se encontra a exercer.
19. Alega o Recorrente nos artigos 34 a 38 a existência de erros no "certificado" da DSF e nos dados a transmitir a Entidade Requerente da Informação da Parte Contratante, contudo cotejado o documento constante na pagina 50 do Processo Administrativo Instrutor não se alcança qualquer erro, quer na identificação do Recorrente, quer no período e nas contas já constantes do pedido - cf ponto 14 na página 4 do Processo Administrativo Instrutor.
20. Mais se esclarece que o referido "certificado" visa tão só confirmar a autenticidade, conferida pela Administração Fiscal da RAEM - a DSF - da informação prestada pelo BANCO DA B S.A.
21. Importa ainda aclarar que a aludida informação é clara e contem os movimentos por conta, explicitando a moeda, a data efeito, o valor e o saldo. Consta na página 54° do Processo Administrativo instrutor a seguinte menção:
戶名: A
賬戶號: 183XXX197 (主賬號: 182XXX182)
賬戶類型: 定期儲蓄賬戶
22. As três contas mencionadas no artigo 36 da PI constam da documentação fornecida pela entidade financeira - BANCO DA B S.A. - a página 59 do processo administrativo instrutor, como pertencendo ao Requerente, não sendo contudo fornecidos os extractos com os movimentos por não constarem expressamente do pedido. Não são erros do certificado da DSF.
23. Pelo que antecede, e embora abstractamente se admita a possibilidade e legalidade do recurso do acto de aceitação do pedido de troca de informações a pedido, em concreto, por tudo o que foi anteriormente explicitado, é manifesta a improcedência do mesmo, por meramente dilatório, com arrolamento de testemunha residente no interior da China, sem qualquer nexo com o conteúdo da informação a prestar constante do processo, nem explicitação dos factos que a mesma tem conhecimento directo para testemunhar. Concluímos que o acto é devido para cabal cumprimento das obrigações a que o Governo Popular Central da Republica Popular da China de forma livre se vinculou e expressamente obrigou a RAEM, e o contrario acarretaria um considerável perigo de quebra da confiança e do dever de colaboração com as autoridades fiscais de mais de 140 jurisdições fiscais em todo o mundo, com consequências negativas ao nível da reciprocidade bem como para a credibilidade internacional da RAEM.
Pelo exposto, e nos demais termos de Direito, com o douto suprimento de V.as Ex. as, deve o presente pedido ser julgado improcedente por não se verificar o alegado "vício de erro manifesto no exercício dos poderes administrativos, violando os "princípios da colaboração entre a Administração e os particulares" e da "participação". (Art.º 21.º n.º 1 al. c) do Código de Processo Administrativo Contencioso) Artigos 9.° e 10.° do Código do Procedimento Administrativo)", nem alegou nem conseguiu provar em concreto, porque de facto não existe, qualquer erro no conteúdo das informações fiscais a enviar a pedido.
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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o douto parecer de fls. 127 e 128, pugnando pelo improvimento do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
事由: Notification on the Exchange of Information on Request
Dear Mr A,
The National Tax Service of Republic of Korea has written to the Macao Financial Services Bureau ("FSB") in regards to a tax investigation, requesting FSB to conduct an Exchange of Information on Request ("EOIR") in accordance with Article 4 and 5 of the "Convention on Mutual Assistance in Tax Matters" ("Convention").
After FSB's examination, the EOIR was in accordance with Article 4(1) of Law no. 5/2017 "Legal Regime for the Exchange of Tax Information" ("Regime"), as amended by Law no. 21/2019 and no. 1/2022, and within the scope of taxation applicable to the Agreement. Furthermore, the requested information was foreseeable relevant to the implementation of the internal laws of the requesting parties. Accordingly, the Chief Executive accepted the EOIR pursuant to Article 8(1) of the Regime.
In relation to the procedure, FSB has collected the required information in accordance with Article 9(3) of the Regime, the person to whom the information relates may file a judicial appeal with suspensive effect against the decision owing to an error may occurred based on the information intended to be sent. In that case, the information could be accessible during office hours at the 4th floor of Public Accounting, Tax Investigation and Appeals Department of the FSB, located at the Avenida da Praia Grande, No.575, 579 e 585, Macau. Kindly make an appointment in advance.
The EOIR requested information as follows:
Identity of person under examination or investigation:
A ("Mr. A")
Name and address of entity believed to be in possession of the information requested (to the extent known):
1. BANCO DA B, S.A.
2. BANCO DA B, Limitada ("B")
Avenida XX NO.XX, Edif. XX, Macau
Information requested:
Account number: 182XXX264 and 183XXX197
(1) Bank statements (including date, amount, balance and the counterpart of each transaction);
(2) Account opening forms (including documents attached thereto).
Specific tax period of which the information is requested:
01/01/2019 – 31/12/2021
Result of the collection of the information:
The above required information as requested has been obtained from B. It would be provided to requesting party for the period of 01/01/2019 – 31/12/2021.
If you have any objections to the above, in accordance with the provisions of Article 36(8)(1) of Law no. 9/1999 "Judicial Organization Law", as amended by the adoption of Law no. 7/2004, Law no. 9/2004, Law no. 9/2009 and Law no. 4/2019, Article 74(a) of the "Administrative Procedure Code" approved by Decree Law no. 57/99/M and Article 25(2)(b) of the "Administrative Litigation Code" approved by Decree Law no. 110/99/M, you may file a judicial appeal with the Court of Second Instance within 60 days from the day following the receipt of this official letter.
If you have any enquiries, please contact Ms. C (Tel: +85385XXXX85) or Ms. D (TeI: +85385XXXX22)
Thank you very much for your kind attention.
* * *
IV – FUNDAMENTOS
A propósito das questões suscitadas pelo Recorrente, o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI teceu as seguintes doutas considerações:
“(...)
(i)
A, melhor identificado nos presentes autos, interpôs o presente recurso contencioso da decisão do Chefe do Executivo de troca de informações em matéria fiscal na sequência de pedido formulado pela República da Coreia
A Entidade Recorrida apresentou contestação na qual concluiu no sentido da improcedência do recurso.
(ii)
(ii.1)
O primeiro fundamento invocado pelo Recorrente para sustentar a sua pretensão impugnatória consiste na falta de audiência prévia a que alude o artigo 93.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
Salvo o devido respeito, parece-nos manifesta a improcedência deste fundamento. Muito brevemente, pelo seguinte.
Como resulta da simples leitura da Lei n.º 5/2017 (Regime jurídico de troca de informações em matéria fiscal), o procedimento aí previsto e regulado tem em vista a troca de informações no âmbito das convenções ou acordos em matéria fiscal celebrados entre a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), e outras jurisdições fiscais.
Está em causa, portanto, um procedimento que se desenvolve entre a RAEM e outras jurisdições fiscais e que, por isso, no essencial, se desenvolve à margem e, portanto, sem intervenção dos interessados particulares. Com efeito, de acordo com o disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 8.º da referida Lei n.º 5/2017, o procedimento de troca de informações a pedido, como é o que está em causa nos presentes autos, inicia-se mediante pedido devidamente justificado, apresentado pela autoridade competente da parte requerente, acompanhado de todos os elementos que permitam a adequada identificação das pessoas singulares ou colectivas, e da respectiva pretensão. Após a decisão do Chefe do Executivo de aceitação do pedido, a Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) notifica as instituições financeiras para lhe remeterem as informações necessárias à troca de informações a pedido, fixando-lhes um prazo mínimo de cinco dias úteis a contar da data da recepção da notificação para a apresentação das informações.
A intervenção dos particulares está reservada para o momento subsequente. Segundo se preceitua na norma do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 5/2017, a DSF deve notificar as pessoas singulares ou colectivas, a quem as informações respeitam, os fins da recolha da informação, suas origens e conteúdo, e é na sequência dessa notificação que as pessoas singulares ou colectivas, a quem as informações respeitam, podem interpor recurso contencioso com efeito suspensivo da decisão da troca de informações a pedido, com fundamento em erro na informação a remeter.
Deste modo, do que vimos de dizer resulta, estamos em crer, e salvo o devido respeito, ser destituída de sentido a invocação da preterição da audiência prévia no concreto contexto procedimental em que foi praticado o acto recorrido.
(ii.2)
O segundo e último fundamento do recurso apresentado respeita a um alegado erro nas informações a remeter.
Também aqui se nos afigura que o Recorrente não tem razão.
É certo, como vimos, que o erro nas informações a remeter constitui fundamento do recurso contencioso do acto recorrido. A verdade, porém, é que o alegado erro não ocorre no caso presente.
A partir da análise dos documentos constantes dos autos facilmente se constata o seguinte: (i) as autoridades fiscais da República da Coreia solicitaram à RAEM informações em relação às contas bancárias com os números 182XXX264 e 183XXX197 de uma instituição bancária a operar na RAEM, nomeadamente os extractos de movimentos dessas contas, respeitantes ao período situado entre 1 de Janeiro de 2019 e 31 de dezembro de 2021, e os formulários de abertura das mesmas; (ii) esse pedido foi aceite pela Entidade Recorrida e na sequência foi pedido à dita instituição que fornecesse as informações solicitadas; (iii) as quais foram fornecidas à DSF nos termos constantes dessa solicitação.
Significa isto, portanto, que as informações fornecidas, como é patente, respeitam às contas bancárias acima identificadas e só a estas e correspondem, portanto, ao objecto da solicitação da autoridade tributária da República da Coreia, inexistindo, pois, o invocado erro.
Contrariamente ao doutamente alegado pelo Recorrente, não se nos afigura que a relação constante de fls. 22 dos presentes autos, que o mesmo refere como indevida face ao teor daquela solicitação, revista qualquer relevância, quer na economia do procedimento de troca de informações propriamente dito quer na do presente recurso contencioso. Daí que não possa fundar-se ali a constatação da existência de um qualquer erro na informação a remeter pela RAEM.
(iii)
Pelo exposto, deve o presente recurso contencioso ser julgado improcedente.
É este, salvo melhor opinião, o parecer do Ministério Público.”
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Quid Juris?
Concordamos com a douta argumentação acima transcrita da autoria do Digno. Magistrado do MP junto deste TSI, que procedeu à análise de todas as questões levantadas, à qual integralmente aderimos sem reservas, sufragando a solução nela adoptada, entendemos que a decisão recorrida não padece dos vícios imputados pelo Recorrente, motivo pelo qual é de a manter nos seus precisos termos.
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Síntese conclusiva:
I – Nos termos do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 8.º da Lei n.º 5/2017 (Regime jurídico de troca de informações em matéria fiscal), de 12 de Junho, o procedimento de troca de informações em matéria fiscal inicia-se mediante pedido devidamente justificado, apresentado pela autoridade competente da parte requerente (de outra jurisdição), acompanhado de todos os elementos que permitam a adequada identificação das pessoas singulares ou colectivas, e da respectiva pretensão.
II - Segundo se preceitua na norma do n.º 1 do artigo 9.º da citada Lei n.º 5/2017, a DSF deve notificar as pessoas singulares ou colectivas, a quem as informações respeitam, os fins da recolha da informação, suas origens e conteúdo, e é na sequência dessa notificação que as pessoas singulares ou colectivas afectadas podem interpor recurso contencioso com efeito suspensivo da decisão da troca de informações, com fundamento em erro na informação a remeter, salvo as excepções previstas na última parte do n.º 1 do artigo 9.º da citada Lei, em que não há lugar à respectiva notificação.
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Tudo visto, resta decidir.
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V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pelo Recorrente que se fixam em 6 UCs.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 07 de Novembro de 2024.
Fong Man Chong
(Relator)
Ho Wai Neng
(1o Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong
(2o Juiz-Adjunto)
Mai Man Ieng
(Procurador-Adjunto)
1 Para cabal esclarecimento Cf despacho exarado na pagina 6 e ofício referido na página 45 a 47 do Processo administrativo Instructor (informação protegida por sigilo fiscal)
2 A fim de assegurar a aplicação efetiva do nível de transparência e de troca de informações a pedido, o Fórum Global iniciou, em 2010, um processo rigoroso e eficaz de avaliação e controlo pelos pares. Em 2015, o Fórum Global reforçou esta norma, ao incluir novos requisitos, especialmente no que se refere à disponibilidade de informações sobre os beneficiários efetivos.
3 Convenção Multilateral sobre Assistência Administrativa Mútua em Matéria Fiscal tal como emendada pelo Protocolo de 2010, mandada publicar pelo Aviso do Chefe do Executivo n.º 47/2018, publicado no BO N.º· 34/2018 em 2018.8.22, Considerando que, por Nota datada de 29 de Março de 2018, a República Popular da China, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 29° da Convenção, declarou junto do Secretário-Geral da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), na sua qualidade de Depositário, que a Convenção se aplica na Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China; https://bo.io.gov.mo/bo/ii/2018/34/aviso47.asp
4 De acordo com o Aviso do Chefe do Executivo n.º 47/2018, a República Popular da China, através da Nota datada de 29 de Março de 2018, Relativamente à extensão à RAEM da Convenção Multilateral sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal (adiante designada por "Convenção"), alterada pelo Protocolo de Revisão da Convenção sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal, Entrou em vigor na RAEM no dia 1 de Setembro de 2018, produzindo efeitos no ano fiscal que se inicia no dia 1 de Janeiro de 2019
5 Lei n.º 5/2017 - Artigo 19.º Confidencialidade
1. Todas as trocas de informações estão sujeitas às regras de confidencialidade e outras salvaguardas previstas nos acordos internacionais, incluindo as disposições que limitam a utilização das informações obtidas nas trocas, com vista a garantir o nível necessário de protecção de dados pessoais.
2. Todas as instituições financeiras, bem como os serviços e organismos públicos, estão sujeitos ao dever de confidencialidade referido no número anterior, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.*
3. Os funcionários da DSF que recolhem informações nos termos previstos na presente lei, em razão das suas funções, estão obrigados ao dever de sigilo profissional, mesmo após o termo daquelas funções, não podendo ser reveladas ou utilizadas as informações para outros fins que não a troca de informações em matéria fiscal.
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2024-83-informação-fiscal-pedido-exterior