Processo nº 677/2024
(Autos de Revisão e Confirmação de Decisões)
Data do Acórdão: 12 de Dezembro de 2024
ASSUNTO:
- Revisão de Sentença estrangeira
- Divórcio
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 677/2024
(Autos de Revisão e Confirmação de Decisões)
Data: 12 de Dezembro de 2024
Requerentes: A e B
Requeridos: Os mesmos
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
A e B, todos com os demais sinais dos autos,
vêm instaurar a presente acção para Revisão e Confirmação de Decisão Proferida por Tribunal Exterior de Macau.
Pelo Magistrado do Ministério Público foi emitido parecer no sentido de nada opor ao pedido de revisão e confirmação formulado.
Foram colhidos os vistos.
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
O Tribunal é o competente.
O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
Cumpre assim apreciar e decidir.
III. FUNDAMENTAÇÃO
a) Dos factos
1. Pelo Tribunal Popular do Distrito Guangning da Província Guangdong foi proferido Acórdão Cível (2010) Ning da série Min Chu n.º 539 em 05.12.2011 a qual em acção de divórcio instaurada por B contra A foi dissolvido o casamento tudo conforme consta de fls. 6 a 8 (traduzido de fls. 29 a 31) que aqui se dá por integralmente reproduzido;
2. Interposto recurso daquela decisão, em 29.05.2012 pelo Tribunal Popular Intermédio da Cidade de Zhaoqing da Província de Guangdong veio a ser proferida Acórdão Cível N.º 386 (2012) da série “Zhao Zhong Fa Min Zhong” na qual a decisão anterior foi confirmada e negado provimento ao recurso tudo conforme consta de fls. 9 a 14 (traduzido a fls. 32 a 37) que aqui se dá por integralmente reproduzido;
3. Da decisão referida na alínea anterior consta que:
«Tribunal Popular Intermédio da Cidade de Zhaoqing da Província de Guangdong
Acórdão Cível
N.º 386 (2012) da série “Zhao Zhong Fa Min Zhong”
Recorrente (réu no processo a quo): A, sexo masculino, nascido em 16 de Agosto de 1937, residente da Região Especial Administrativa de Macau, reside actualmente na cidade de Foshan, XXX.
Mandatário constituído: XXX, advogado do Escritório de Advogados WIT Hoope Law Firm.
Mandatária constituída: XXX, sexo feminino, nascida em 23 de Janeiro de 1988, de étnia Han, reside na cidade de Foshan, XXX.
Recorrida (autora no processo a quo): B, sexo feminino, nascida em 17 de Setembro de 1964, residente da Região Especial Administrativa de Macau, reside em Macau, XXX.
Na acção de divórcio litigioso entre o recorrente, A, e a recorrida, B, o recorrente não se conformou com o acórdão cível n.º 539 (2010) da série “Ning Min Chu” proferido pelo Tribunal Popular do Distrito Guangning, do qual recorreu para este tribunal. Foi constituído, nos termos da lei, o tribunal colectivo para julgar o caso. O processo encontra-se concluído.
O Tribunal a quo apreciou a acção e julgou provado o seguinte: A é residente da Região Administrativa Especial de Macau, depois de ter se divorciado da ex-mulher, conheceu, em 1998, B em Chikengzhen do Distrito Guangning da Província de Guangdong. Os dois viveram juntos e, em 11 de Março de 1998, nasceu a filha deles, C. Em 20 de Dezembro de 1998, os dois trataram do registo de casamento na Conservatória de Registo de Casamento dos Serviços dos Assuntos Cívicos do Distrito Guangning da Província de Guangdong, tendo obtido a certidão de casamento. Depois, B e a filha, C, passaram, sucessivamente, a viver em Macau e obtiveram o direito à residência. Nos últimos anos, B e A suspeitavam mutuamente de fidelidade e desconfiavam um do outro, o que conduziu à quebra da relação conjugal. Os dois discutiram sempre, não sendo capazes de viver juntos. Foi apurado ainda o seguinte: O apartamento XXX da cidade de Foshan (certidão de propriedade n.º XXX), cujo proprietário registado é A, a data de registo é 23 de Novembro de 2007. O apartamento XXX da cidade de Foshan (certidão de propriedade n.º XXX), cujos proprietários registados são A e D, a data de registo é 13 de Março de 2007. A tem um montante de HKD200.000,00 que se encontra depositado na sucursal de Lian Hua do Banco da China na cidade de Foshan. Na acção vertente, B requer a providência cautelar do apartamento XXX e da quantia de HKD200.000,00. Em 28 de Abril de 2011, a Companhia de Avaliação de Activos XXX, Lda. da cidade de Zhaoqing, incumbida pelo tribunal, efectuou a avaliação do apartamento XXX, tendo concluído que o apartamento valia RMB290,000,00. B aufere mensalmente um vencimento de MOP6.000,00 e de HKD8.000,00, respectivamente.
B apresentou acção de divórcio litigioso ao Tribunal a quo em 14 de Setembro de 2010, pedindo: 1. Seja decretado o divórcio entre B e A; 2. A filha legítima C fique na guarda de B, A pague a pensão de alimentos no valor de RMB1.500 mensais e as despesas com educação sejam suportadas por B e A em partes iguais; 3. Sejam partilhados em partes iguais os bens comuns do casal que se situam no apartamento XXX, no Bairro Chancheng da cidade de Foshan (certidão de propriedade n.º XXX) e no apartamento XXX, do Bairro Chancheng da cidade de Foshan. 4. As custas do presente processo sejam suportadas por A.
O Tribunal a quo entende que as questões litigiosas neste caso são: 1. Se este tribunal é competente para conhecer desta acção? 2. Se a relação marital entre B e A já realmente se rompeu? 3. Quem ficará com a guarda da filha, C, de B e de A? 4. Como se define e partilha os bens comuns entre B e A? 1. Este tribunal é competente para conhecer desta acção. B e A são actualmente residentes de Macau, China, este tem uma jurisdição diferente da do Interior da China. Porém, B e A casaram civilmente nos Serviços dos Assuntos Cívicos do Distrito Guangning e obtiveram daí a certidão de casamento, segundo a «Resposta do Supremo Tribunal Popular sobre se os Tribunais Populares do Interior da China podem admitir a acção de divórcio se ambas as partes viverem em Hong Kong depois de terem registado o casamento no Interior da China», “se ambos os cônjuges residam em Hong Kong/Macau e o seu casamento tenha sido registado no Interior da China, e agora ocorre uma acção de divórcio litigioso, caso o casal recorra ao Tribunal Popular do Interior da China, o Tribunal Popular do local onde foi registado o casamento ou do local onde foi feito o registo domiciliar pode admitir e apreciar a acção”. Portanto, tal tribunal, sendo o tribunal popular do local onde B e A registaram o casamento deles, tem competência para conhecer da acção em causa. 2. O relacionamento conjugal entre B e A já realmente se desfez. Embora B e A casassem civilmente de acordo com a sua vontade e da forma voluntária, eles conheceram-se mediante a apresentação por outrem, devido à falta de conhecimento mútuo antes do casamento e os dois casaram à pressa, além disso, é grande a diferença de idade entre os dois, eles desconfiavam e suspeitavam um do outro após o casamento, discutiam com frequência, não tendo sido construído um relacionamento conjugal real entre os dois, do qual resultou que os dois não pudessem viver juntos. Acresce que A também consentiu em tratar do divórcio em Macau, desde modo, reconhece-se, nos termos de lei, a ruptura definitiva da relação conjugal entre B e A, devendo ser concedido o divórcio pretendido. Pelo exposto, são procedentes os fundamentos invocados para o divórcio por B, este tribunal aceite-os. 3. É mais adequado para A ficar com a guarda da filha de B e de A. C, filha legítima de ambas as partes, vive sempre com A, a mudança do ambiente em que vive pode ser prejudicial ao seu crescimento, além disso, a própria filha manifestou a preferência de viver com o pai, por isso, deve C fica na guarda de A. A pensão de alimentos deve ser suportada por ambas as partes. De acordo com os rendimentos de B, e considerando-se as regras sobre a pensão de alimentos, fixa-se a pensão de alimentos para C no montante de HKD2.000,00 mensais a suportar por B, até que a filha complete 18 anos de idade.
As despesas de educação serão suportadas por ambas as partes B e A, de acordo com as quantias realizadas concretamente. B tem o direito de visitar a filha C, devendo assim A prestar auxílio. 4. Os bens comuns do casal entre B e A devem ser reconhecidos de acordo com a lei e partilhados segundo as regras de conveniência em vida. O apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan, registado por A como titular do direito real, como foi adquirido na constância da relação conjugal das partes, pertence ao bem comum do casal; O apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan, registado por A e D como titulares do direito real, como foi adquirido na constância da relação conjugal entre B e A, do qual o quinhão de A pertence ao bem comum das partes; A quantia de HKD200.000,00 depositada em nome de A na sucursal Lianhua do Banco da China, da Cidade de Foshan, como tal depósito foi feito na constância da relação conjugal das partes, pertence ao bem comum das partes; Na presente acção, B renunciou a partilha do apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan, sendo isto um acto do direito civil praticado por si própria, tal acto não prejudica o legítimo direito e interesse legal de outrem, devendo ser autorizado. Quanto ao apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan e ao depósito de HKD200.000,00, são partilhados de forma equivalente pelas partes segundo o valor dos bens. Tendo em consideração que actualmente A vive no apartamento XXX e que B também concorda com a atribuição do direito de propriedade do referido apartamento a A, é conveniente que o respectivo direito de propriedade seja atribuído a A, cabendo assim a A pagar a B 50% do valor avaliado do referido prédio para servir da partilha do bem comum do casal; Quanto ao depósito do valor de HKD200.000,00, também devem B e A deter 50% cada, cabendo a A pagá-lo a B. Pelo acima exposto, deve A pagar a B HKD100.000,00 e RMB145.000,00 a título da partilha dos bens comuns. Quanto aos bens comuns das partes existentes em Macau, o Tribunal não conseguiu apurá-los na presente acção, podendo ambas as partes negociar ou resolver isto por outras vias. Depois de citado, A, sem causa legítima, recusou-se a comparecer ao tribunal para a intervenção, nos termos da lei, pode determinar-se como ausência em audiência. Nos termos dos art.ºs 32.º, 36.º, n.º 3, 37.º, n.º 2, 38.º e 39.º, n.º 1 da «Lei do Casamento da República Popular da China», do art.º 130.º da «Lei de Processo Civil da República Popular da China», da «Resposta do Supremo Tribunal Popular sobre se os Tribunais Populares do Interior da China podem admitir a acção de divórcio se ambas as partes viverem em Hong Kong depois de terem registado o casamento no Interior da China», e dos art.ºs 5.º e 7.º, n.º 1 dos «Vários pareceres específicos do Supremo Tribunal Popular sobre a questão de prestação de alimentos aos filhos em casos de divórcio julgados pelos tribunais populares», foram decididos: 1. Autorizar o divórcio entre B e A. 2. Que ficará A com a guarda da filha C, nascida da relação conjugal das partes, cabendo a B e A suportar solidariamente os alimentos da filha. Assim deve B, a partir do mês em que entra em vigor o referido acórdão, pagar mensalmente os alimentos de C no valor de HKD2.000,00 até que esta complete 18 anos de idade. Quanto às despesas de educação de C, cabe às partes suportar a metade conforme as facturas de despesa realizada concretamente como prova. Terá B o direito de visita de C, devendo A prestar auxílio. 3. Que ficarão atribuídos a A o direito de propriedade do apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan, o quinhão do direito de propriedade detido por A relativo ao apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan, titulado por A e D, bem como a quantia de HKD200.000,00 depositada em nome de A na sucursal Lianhua do Banco da China, da Cidade de Foshan, assim deve A, no prazo de 10 dias contados a partir da data de entrada em vigor do referido acórdão, pagar a B HKD100.000,00 e RMB145.000,00, a título de quantia do património partilhado. Se a parte não cumprir o dever de prestação pecuniária segundo o prazo fixado no referido acórdão, deverá pagar juros em dobro sobre as dívidas durante o período de atraso no cumprimento, nos termos do art.º 229.º da «Lei de Processo Civil da República Popular da China». As despesas relativas à admissão do caso no valor de RMB1.250,00 (incluindo as de partilha dos bens), à avaliação no valor de RMB2.900,00, à medida cautelar de bens no valor de RMB2.720,00, totalizando RMB6.870,00, entre as quais ficam a cargo de B o valor de RMB5.870,00 e de A o valor de RMB1.000,00. B já pagou previamente o valor de RMB3.200,00, quanto às despesas ainda não pagas por B e à despesa a suportar por A, devem ser pagas ao referido Tribunal no prazo de 10 dias contados a partir da entrada em vigor do referido acórdão.
Inconformado com a decisão a quo, dela o recorrente A recorreu para este Tribunal alegando que: 1. O Tribunal a quo não só não tem competência para conhecer do presente caso, como também incorreu em grave violação processual no decurso de apreciação do caso: Nos termos das disposições da Lei de Processo Civil, a parte do caso de divórcio A nunca recebeu qualquer petição inicial, prova ou citação do tribunal e acórdão, bem como nunca interveio no julgamento do caso! Evidentemente, o Tribunal a quo privou o recorrente da intervenção na acção! 2. A não concorda com o divórcio, pois ele tratava B muito bem e depois de nascida a filha C, A envidou todos os esforços para requerer B e filha para reunião familiar em Macau. A não concorda com o divórcio, pois a guarda da filha não só fica exclusivamente com B. 3. O que o Tribunal a quo procedeu à partilha do valor de HKD200.000,00, depósito individual legal de A, e do apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan, também errou no reconhecimento de facto, mas de maneira nenhuma, B não tem direito a adquirir os supracitados bens. Pelo acima exposto, o Tribunal a quo não só não tem competência para conhecer do presente caso, como também incorreu em grave violação processual no decurso de apreciação do caso, existindo erro grave no reconhecimento dos factos e na aplicação da lei, pelo que veio interpor o recurso, pedindo ao Tribunal que nos termos da lei: 1. Anulação do acórdão n.º 539 (2010) da série “Nin Min Chu”, bem como rejeição de todos os pedidos formulados pela autora nos termos da lei. 2. Que ficam a cargo de B todas as despesas processuais do caso.
O recorrente A, para além das provas por si apresentadas em primeira instância, já não tem outra prova nova.
Alega a recorrida B que: É claro o reconhecimento dos factos feito pelo Tribunal a quo, é exacta a aplicação da lei, e são suficientes as provas, devendo ser mantida a decisão, e cabendo a A suportar as despesas das primeira e segunda instâncias. Quanto aos fundamentos concretos são os seguintes: 1. O Tribunal a quo tem competência para conhecer do presente caso, sendo A e B residentes originais do Interior da China, e foi A que requereu a fixação de residência em Macau, tendo este conhecido B em Foshan e feito as formalidades de casamento na Administração de Assuntos Civis do Distrito de Guangning. Nos termos das leis do Interior da China e de Macau, os Tribunais onde se contraiu o casamento tem competência para as causas de divórcio. Logo após B ter tentado a acção de divórcio junto do Tribunal de Guangning, A já tomou conhecimento do divórcio e por várias vezes, procurou a reconciliação com B, e tendo o Tribunal a quo, a pedido de A, organizado por várias vezes a reconciliação das partes, e por isso, B foi ao Tribunal de primeira instância muitas vezes para preparar-se para a reconciliação, mas nunca viu A. Durante este período, o Tribunal a quo, perante B, ligou telefonicamente muitas vezes para A, e este ora dizia que estava doente, ora dizia que estava em Macau, ou ora dizia que estava fora em negócio e não tinha tempo para vir. Antes e depois de realização da audiência, por duas vezes, o Tribunal ligou para ele, perguntando-lhe se tinha recebido os matérias processuais e citação sobre a realização de audiência, tendo A respondido afirmativamente e que não concordava com o divórcio, por isso não compareceu ao Tribunal. Daí pode-se saber o que ele disse não ter recebido qualquer petição processual, provas e citação era uma mentira para enganar o Tribunal. 2. A relação conjugal entre A e B já foi completamente rompida, pelo que B insiste em divorciar-se. Embora o relacionamento fosse melhor na fase inicial do casamento, A ficou desconfiado e começou a bater e repreender B muitas vezes em Foshan e em Macau. Para manter B, A escreveu uma carta de garantia prometendo não voltar a batê-la, mas logo ele voltou aos seus hábitos velhos, espancando e repreendendo B com mais violência ainda. B não conseguiu aguentar mais e intentou acção de divórcio junto do tribunal. Se A não estiver disposto a criar filha C, B podia criá-la. Como a renda de A é melhor do que a de B, ele deveria pagar uma pensão de alimento maior do que B. Pelo bem da filha, B adiou o pedido de divórcio até à presente data. Ao longo dos anos, o relacionamento conjugal entre as partes só existia superficialmente, mas na verdade já acabou, pois, as partes já se tornaram estranhas como não se conhecessem uma à outra, e fundamentalmente já não existem os sentimentos amorosos. O Tribunal a quo decretou o divórcio o qual está correcto, requer que o Tribunal Popular Intermédio se mantenha a mesma decisão. 3. É infundada a alegação feita na petição de recurso de A segundo a qual não são bens comuns do casal a quantia de HKD20.000,00(sic) e o apartamento XXX, Cidade de Foshan. O tribunal a quo decidiu o nosso divórcio, é adequada proceder a patilha dos bens comuns do casal. Além disso, temos duas propriedades em Macau após o casamento, mas A vendeu uma delas sem ter negociado comigo, a quantia obtida fica tudo com A. A receita de A foi muito pouco usada nas despesas familiares, a maior parte das despesas familiares é assumida por B. Se o Tribunal Popular de Intermédio decidir que ficará B com a guarda da filha C, A deve pagar os alimentos mensais da filha C no valor de HKD3.500,00.
A recorrida B, além de ter apresentado as provas na primeira instância, não apresentou mais novas provas.
Após a conciliação, as partes não chegaram a um acordo.
Este tribunal, após a apreciação, apurou: os factos apurados pelo Tribunal de primeira instância são basicamente verdadeiros, este tribunal confirmou-os. Além disso, apurou-se ainda que, em 30 de Setembro de 2010, o Tribunal a quo enviou pessoal para o apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan para notificar, por service by dropping documents, A da petição inicial de B e dos materiais da acção passiva relevantes do Tribunal de Primeira Instância, incluindo a citação sobre abertura de julgamento. Ao mesmo dia, A assinou uma «Confirmação de morada sobre a notificação de acto processual», na qual consta a morada de notificação confirmada por A, sendo: o apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan. Posteriormente, o Tribunal a quo, através da forma de correio exclusivo do tribunal, notificou por correio postal dos materiais de acto processual a A. Em 30 de Junho de 2011, o Tribunal a quo enviou novamente pessoal ao apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan, para encontrar A próprio e sua filha C, para investigar e apurar a verdade dos factos relevantes do presente caso. Durante o julgamento de segunda instância, A próprio dirigiu-se a este Tribunal, perante o Juiz do processo, para assinar a petição de recurso e procuração e declarar explicitamente: o tribunal a quo tinha notificado os materiais de acto processual a ele próprio, ele próprio não assinou o aviso da recepção da notificação; a assinatura de A que consta na «Confirmação de morada sobre a notificação de acto processual», constante do processo a quo é assinada por si próprio.
Este Tribunal entende: o presente processo é o divórcio litigioso. De acordo com o recurso na segunda instância e as opiniões da contestação entre as partes deste caso, o ponto crucial deste é: 1. A questão de se o Tribunal a quo tem competência sobre o presente caso; 2. A questão de se o caso é legal aquando do julgamento à revelia do Tribunal a quo; 3. A questão de se a ruptura dos sentimentos entre B e A ou não; 4. A questão de se é adequada a partilha dos bens comuns do casal de B e de A decidida pelo Tribunal a quo.
Sobre a questão se o Tribunal a quo tem competência sobre o presente caso. De acordo com o «Resposta do Supremo Tribunal Popular sobre se os Tribunais Populares do Interior da China podem admitir a acção de divórcio se ambas as partes viverem em Hong Kong depois de terem registado o casamento no Interior da China» “se ambos os cônjuges residam em Hong Kong/Macau e o seu casamento tenha sido registado no Interior da China, e agora ocorre uma acção de divórcio litigioso, caso o casal recorra ao Tribunal Popular do Interior da China, o Tribunal Popular do local onde foi registado o casamento ou do local onde foi registado como a residência permanente pode admitir e apreciar a acção”. A e B são residentes de Macau da China, mas as partes registaram o casamento nos Serviços dos Assuntos Cívicos do Distrito Guangning da Província de Guangdong e obtiveram a certidão de casamento, por isso, o Tribunal a quo entende ter competência para o presente caso. O Tribunal a quo tem razão. Este Tribunal mantém-se a mesma decisão.
Quanto à questão de se o caso é legal aquando do julgamento à revelia do Tribunal a quo. Conforme os factos apurados, aquando da instauração da acção de divórcio litigioso de B junto do Tribunal a quo, o tribunal a quo, nos termos da lei, notificou, por service by dropping documents, a A próprio, dos materiais da acção passiva incluindo a citação de abertura de julgamento. E, conforme a «Confirmação de morada sobre a notificação de acto processual» assinada por A, foram enviados os materiais de acto processual subsequentes. Na ocorrência de audiência de julgamento a quo, o Tribunal a quo também enviou pessoal para investigar e apurar a situação do caso a A próprio e à sua filha C. De acordo com o artigo 130.º da «Lei de Processo Civil da República Popular da China», “Se o réu se recusar a comparecer em tribunal sem causa de justificação após ter sido citado, ou se se retirar do tribunal sem autorização deste, pode ser proferida uma decisão à revelia.”, o Tribunal a quo, nos termos da lei, notificou A da citação e o mesmo não compareceu pelas duas vezes no Tribunal a intervir o julgamento sem causa de justificação, considera-se que desiste dos direitos de contestar provas nem deduzir excepções. O Tribunal a quo proferiu a decisão à revelia com base no apuramento dos factos do caso, o qual não é impróprio, este Tribunal mantém-se a mesma.
Quanto à questão se a ruptura dos sentimentos entre B e A ou não. B e A registaram o casamento, por sua iniciativa. Contudo, eles suspeitavam-se mutuamente, havia disputas frequentes entre as duas partes, causando que não conseguiram conviver. O Tribunal a quo, nos termo da lei, considera e verifica a ruptura dos sentimentos entre marido e mulher, pelo que decreta o divórcio entre as partes, não é inadequada, este Tribunal mantém-se a mesma decisão.
Quanto à questão de se é adequada a partilha pelo Tribunal a quo dos bens comuns do casal de B e de A. O Tribunal a quo, segundo os materiais das provas como os dados revelantes da conta do depósito em nome de A, emitidos pelo Banco da China, o resultado de inquirição dos dados sobre os apartamentos do Bairro Chancheng da Cidade de Foshan, e “relatório da avaliação do apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan” da Companhia de Avaliação de Activos XXX da Cidade de Zhaoqing, reconhece que o apartamento XXX, do Bairro Chancheng, Cidade de Foshan e a quantia de HKD200.000,00 depositada em nome de A, na sucursal Lianhua do Banco da China, da Cidade de Foshan, são os bens comuns do casal de B e de A que devem ser partilhados em partes iguais. Este Tribunal mantém a mesma decisão por existir fundamentos suficientes.
Pelo exposto, o Tribunal a quo entende que os factos claros, procedimento legítimo, o tratamento concreto correcto, mantém-se a mesma decisão nos termos da lei. A pretensão do recurso de A é infundada, pelo que deve ser rejeitado o seu recurso. De acordo com o artigo 153.º, n.º 1, alínea (1) da «Lei de Processo Civil da República Popular da China», é prolatado o seguinte:
Negar-se provimento ao recurso e manter-se a mesma decisão.
A despesa de admissão do caso de segunda instância deste na quantia de RMB1.750 de, ficar a cargo do recorrente A.
O acórdão é decisão final.
Juiz Presidente: XXX
Juiz: XXX
Juíza: XXX
(Carimbo-Tribunal Popular Intermédio da Cidade de Zhaoqing da Província de Guangdong)
29 de Maio de 2012
Estes documentos não há diferença dos originais
Escrivão: XXX»
b) Do Direito
De acordo com o disposto no nº 1 do artº 1199º do CPC «Salvo disposição em contrário de convenção internacional aplicável em Macau, de acordo no domínio da cooperação judiciária ou de lei especial, as decisões sobre direitos privados, proferidas por tribunais ou árbitros do exterior de Macau, só têm aqui eficácia depois de estarem revistas e confirmadas.».
Como é sabido nos processos de revisão e confirmação de decisões proferidas no exterior de Macau o Tribunal não conhece do fundo ou mérito da causa limitando-se a apreciar se a decisão objecto dos autos satisfaz os requisitos de forma e condições de regularidade para que possa ser confirmada.
Esses requisitos são os que vêm elencados no artº 1200º do CPC, a saber:
«1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública.
2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.».
Vejamos então.
Da certidão junta aos autos resulta que pelo Tribunal Popular Intermédio da Cidade de Zhaoqing da Província Guangdong foi confirmada a decisão do Tribunal Popular do Distrito Guangning da Província de Guangdong a qual decretou o divórcio entre Requerentes, nada havendo que ponha em causa a autenticidade daquelas decisões e o sentido das mesmas e que se tornaram definitivas o que corresponde na legislação da China Continental ao trânsito em julgado, estando assim preenchidos os pressuposto das al.s a) e b) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
Igualmente resulta das certidões juntas que as decisões não vieram de tribunal cuja competência haja sido provocada em fraude à lei e não versam sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau, estando preenchidos os requisitos da alínea c) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
Igualmente não consta que a questão tenha sido submetida a qualquer tribunal de Macau, não havendo sinais de poder ser invocada a litispendência ou caso julgado, pelo que se tem por verificada a condição da alínea d) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
Não resulta das certidões juntas que a decisão haja sido tomada sem que o Réu haja sido regularmente citado - o qual aliás, é aqui, também, Requerente e interpôs recurso da primeira delas - ou em violação do princípio do contraditório e da igualdade das partes, pelo que se tem por verificada a condição da alínea e) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
A sentença revidenda procede à dissolução do casamento por divórcio, direito que a legislação de Macau igualmente prevê – artº 1628º e seguintes do C.Civ. -, pelo que, a decisão não conduz a um resultado incompatível com a ordem pública, tendo-se também por verificada a condição da alínea f) do nº 1 do artº 1200º do CPC.
Termos em que se impõe concluir no sentido de estarem verificados os requisitos para a confirmação de decisão proferida por tribunal exterior a Macau.
IV. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acorda-se em conceder a revisão e confirmar a decisão do Tribunal Popular Intermédio da Cidade de Zhaoqing da Província Guangdong nos termos acima transcritos.
Custas pelos Requerentes nos termos do artº 19º do Acordo sobre a Confirmação e Execução Recíprocas de Decisões Judiciais em Matéria Civil e Comercial entre o Interior da China e a Região Administrativa Especial de Macau, publicado através do Aviso do Chefe do Executivo nº 12/2006 de 22.03.2006.
Registe e Notifique.
RAEM, 12 de Dezembro de 2024
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)
Seng Ioi Man
(1º Adjunto)
Fong Man Chong
(2º Adjunto)
677/2024 1
REV e CONF DE DECISÕES