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Processo nº 695/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data do Acórdão: 16 de Janeiro de 2025

ASSUNTO:
- Marcas
- Imitação

_____________________
Rui Pereira Ribeiro









Processo nº 695/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 16 de Janeiro de 2025
Recorrente: A Inc.
Recorridas: Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico e
B有限公司 (parte contrária)
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

  A Inc., com os demais sinais dos autos,
  veio interpor recurso judicial da decisão do Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico que autorizou o pedido de registo da marca N/137154 formulado pela B有限公司, pedindo que seja revogado o respectivo despacho e recusado o pedido de registo da marca em causa.
  Cumprindo o disposto no artº 278º do RJPI veio a DSEDT a remeter ao tribunal o processo administrativo referente ao pedido de registo de marca a que se reportam os autos.
  
  Pelo Tribunal recorrido foi proferida sentença negando provimento ao recurso judicial interposto.
  
  Não se conformando com a sentença proferida veio a Recorrente interpor recurso daquela decisão apresentando as seguintes conclusões:
A. Por douta sentença datada de 2 de Abril de 2024, foi o recurso judicial interposto pela Recorrente julgado improcedente, tendo o Tribunal a quo decidido manter o despacho da Chefe do Departamento de Propriedade Industrial da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico (DSEDT) que concedeu o registo da marca registando.
B. Com o devido respeito, a Recorrente discorda do entendimento do Tribunal a quo e da DSEDT, por, como a Recorrente demonstrará melhor infra, a marca em crise consistir numa imitação das marcas da Recorrente e a sua concessão facilitar actos de concorrência desleal, causarão prejuízos graves à imagem da Recorrente e a diluição das suas marcas.
C. In casu, como o Tribunal a quo e a DSEDT reconhecem é incontestável que o primeiro e segundo requisitos da imitação estão preenchidos.
D. Enquanto ao terceiro requisito da imitação, importa destacar, desde já, que todas as marcas “LUCKY STRIKE” da Reclamante se caracterizam pela existência de dois círculos concêntricos (“”), sendo que este elemento gráfico á a parte essencial das marcas da Reclamante.
E. Como facilmente se percebe, a marca registanda e a marca N/47839 da Reclamante são graficamente quase idênticas, na medida em que os dois círculos são a imagem típica e característica da imagem dos produtos “LUCKY STRIKE” da Reclamante.
Marca Registanda
Marca da Reclamante


F. Por sua vez, a marca registanda é também composta por dois círculos, um dentro do outro, sendo que apenas se assinalam duas pequenas diferenças: i) a marca registanda não tem qualquer linha a separar os dois círculos. Ao invés esta separação é feita através dos diferentes tons de preto, cinzento e branco do circulo exterior; ii) e a marca registanda contém a expressão “祥雲/LUCKY CLOUDS”.
G. Aceitar que a adição de uma qualquer expressão por cima de uma marca figurativa pertencente a terceiro é suficiente para permitir o registo da nova marca é negar o direito exclusivo conferido ao titular da marca prioritária.
H. Além do elemento figurativo, vejamos agora a marca registanda em comparação com as marcas N/72357 e N/77515 (através do qual é fácil perceber que as marcas são nominativas, fonéticas e conceptualmente semelhantes):
Marca Registanda
Marcas da Reclamante


I. Verifica-se que a marca registando imita igualmente estas marcas da Reclamante: apesar de serem sinais coloridos, estas são igualmente constituídas por dois círculos, um dentro do outro, separados por uma linha branca.
J. Além desta semelhança gráfica, verifica-se ainda que a marca registanda imita também o elemento nominativo e fonético das marcas da Reclamante.
K. Com efeito, a marca registanda contém a expressão “LUCKY CLOUDS” no meio do círculo interior da marca, o que claramente evoca o elemento nominativo, escrito em letras garrafais, das marcas da Reclamante – “LUCKY STRIKE”.
L. A maior parte dos Residentes de Macau são fluentes em língua chinesa, assim como a maioria dos turistas de Macau são provenientes da China continental, pelo que a associação da marca registanda às marcas da Reclamante é ainda mais gritante, visto que o consumidor comum mais facilmente confunde “LUCKY CLOUDS” com “LUCKY STRIKE”.
M. Acrescenta-se ainda que o elemento principal “LUCKY” das ambas as marcas pode ter o significado de “幸運” ou “吉祥”, e que a marca registanda escolheu precisamente uma palavra representativa “祥” na composição da marca, mostrando claramente a tentativa de criar confusão entre consumidores.
N. Ora, os consumidores em Macau, por não dissecarem a composição dos elementos das marcas no momento da aquisição do produto, facilmente confundirão a marca registanda com as maras da Reclamante, pois são gráfica e foneticamente semelhantes – o elemento gráfico composto pelos dois círculos e o elemento nominativo “LUCKY” são aqui preponderantes.
O. Está-se, assim, perante a apresentação a registo de um sinal cujos elementos preponderantes e mais distintivos são o fonético e o visual: em termos fonéticos, visuais e conceptuais as marcas são claramente confundíveis – nos termos do art. 215.º n.º 1c) do RJPI: facilmente induzindo o consumidor em erro ou confusão e associação com a marca notória, anteriormente registada em nome da Reclamante. A marca registanda, carece, pois, por completo, de originalidade.
P. Tal é, ainda, especialmente flagrante, quando se considera que as marcas da Reclamante são conhecidas do público consumidor, como se estabeleceu supra, o que levará, inevitavelmente, a que produtos com a marca registanda sejam adquiridos com a convicção de se estarem a adquirir produtos da Reclamante, verificando-se, assim, uma situação de concorrência desleal.
Q. Com efeito, “quanto maior for a notoriedade da marca anterior maior é o risco de confusão com uma marca posterior”.
R. Consequentemente, o pedido de registo da marca registanda deverá ser recusado nos termos do artigo 214º nº 2 alínea b) e artigo 215º nº 1 do RJPI.
S. Adicionalmente, sem prejuízo dos fundamentos invocado supra, o pedido de registo da marca registanda deverá ser recusado nos termos do artigo 214º, nº 1 alínea b) e c) e artigo 215º nº 1 do RJPI.
T. Salvo o devido respeito, a Recorrente não concorda com a conclusão do Tribunal a quo, uma vez que a própria avaliação do estatuto da marca deve ser feita em consideração de que em Macau, “são proibidas todas as formas de publicidade e promoção ao tabaco, aos produtos de tabaco e aos cigarros electrónicos, incluindo a publidade oculta, dissimulada e subliminar, através de suportes publicitários ou serviços da sociedade da informação (…)”, proibição estabelecida pela Lei n.º 5/2011.
U. Assim, parece muito pouco razoável a exigência de elementos publicitários para demonstrar a notoriedade e prestígio de uma marca que distingue produtos de tabaco.
V. Ainda sobre a questão de imitação, durante o curso do presente recurso, as autoridades competentes filipinas e mexicanas, entre outras, pronunciam a favor da Recorrente sobre a imitação da marca registanda “”.
W. Ora, no caso vertente, não subsistem dúvidas de que o pedido de registo da marca registanda deverá sempre ser recusado porque é idóneo a causar confusão com os produtos da Reclamante, pelo que se trata de um acto apto a facilitar situações de concorrência desleal.
X. Como se disse, os produtos oferecidos pela Requerente sob a marca registanda irão ser vistos pelo público como estando associados à Reclamante ou autorizados por esta – o que é falso.
Y. Pois, dúvida não existe de que a colocação no mercado de produtos sob a marca registanda iria necessariamente causar um potencial desvio de clientela.
Z. Acresce que, como se explicou anteriormente, existem semelhanças inquestionáveis entre as marcas da Reclamante e a marca registanda, pelo que é impossível argumentar que o pedido de registo da Requerente constitui uma mera coincidência.
AA. Assim, a Requerente não tem – nem pode ter – um interesse legítimo e atendível no registo da marca em analise, pois esta imita marcas da Reclamante e potencia actos de concorrência desleal, estando a Requerente de má-fé, pelo que o pedido de registo da marca registanda deverá ser recusado nos termos do artigo 214º nº 1 alínea b) e c), artigo 214º nº 2 alínea b), artigo 215 nº 1e artigo 214º nº 1 alínea a) ex vi artigo 9º, nº 1 alínea c) do RJPI.

  Notificadas a DSEDT e a parte contrária das alegações de recurso veio a DSEDT oferecer o merecimento dos autos.
  
  Foram colhidos os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO

a) Factos
  
  Da sentença sob recurso consta a seguinte factualidade:
A. Em 23 de Fevereiro de 2010, a recorrente A Inc., requereu, junto da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico, o pedido de registo da marca n.º N/47839, com o logotipo , para fornecer os produtos da classe 34 incluindo: Cigarros; tabaco; produtos de tabaco; isqueiros; fósforos; artigos para fumadores.
B. Em 28 de Março de 2007, a recorrente A Inc., requereu, junto da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico, o pedido de registo da marca n.º N/27940, com o logotipo , para fornecer os produtos da classe 34 incluindo: Cigarros, tabaco; produtos derivados do tabaco, artigos para fumadores, isqueiros, fósforos.
C. Em 28 de Março de 2007, a recorrente A Inc., requereu, junto da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico, o pedido de registo da marca n.º N/27941, com o logotipo , para fornecer os produtos da classe 34 incluindo: Cigarros, tabaco; produtos derivados do tabaco, artigos para fumadores, isqueiros, fósforos.
D. Em 18 de Janeiro de 2013, a recorrente A Inc., requereu, junto da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico, o pedido de registo da marca n.º N/72357, com o logotipo , para fornecer os produtos da classe 34 incluindo: Cigarros; tabaco; produtos derivados do tabaco; isqueiros; fósforos; artigos para fumadores.
E. Em 29 de Julho de 2013, a recorrente A Inc., requereu, junto da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico, o pedido de registo da marca n.º N/77515, com o logotipo para fornecer os produtos da classe 34 incluindo: Cigarros; tabaco; produtos derivados do tabaco; isqueiros; fósforos; artigos para fumadores.
F. Através dos despachos exarados em 13/9/2010, de 3/9/2007, de 3/9/2007, de 12/6/2014 e 12/6/2014 pela chefe do Departamento da Propriedade Intelectual, foram autorizados os pedidos de registo das supracitadas marcas.
G. Por outro lado, também se confirmou que a contraparte B有限公司 em 23 de Abril de 2018 tinha requerido o registo da marca n.º N/137154, com o logotipo seguinte: , para fornecer os produtos da classe 34 incluindo: Tabaco, charutos, cigarros contendo sucedâneos do tabaco não para uso medicinal, cigarros, cigarrilhas, ervas de tabaco, cigarros eletrónicos, líquidos de reposição de nicotina para cigarros eletrónicos, caixa de charutos, caixa de cigarros.
H. O supracitado pedido foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau, n.º 25, II Série, de 20 de Junho de 2018.
I. Em 20 de Agosto de 2018, a recorrente apresentou reclamação contra o pedido de registo da contraparte.
J. Por despacho da chefe do Departamento da Propriedade Intelectual, datado de 23 de Junho de 2020, foi autorizado o pedido de registo da supracitada marca com prazo de validade até 23 de Junho de 2027.
K. O supracitado despacho foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau, n.º 29, II Série, de 15 de Julho de 2020.
L. Constituída em 1902 como uma joint venture entre a Imperial Tobacco Company, do Reino Unido, e a American Tobacco Company, dos Estados Unidos da América, a recorrente, hoje com mais de 100 anos de história, é actualmente, a segunda maior produtora de tabaco a nível mundial, sendo as suas marcas apreciadas por milhões de consumidores em todo o mundo.
M. A recorrente alargou a sua actividade a outros países para além do Reino Unido e dos Estados Unidos da América, nomeadamente a países da África, Ásia, América Latina e Europa.
N. Em 2011, a recorrente deteve 13% do mercado de tabaco em todo o mundo.
O. Em 2012, o lucro de vendas da recorrente foi de £5,412 milhões.
P. A recorrente é uma empresa líder na venda de tabaco a nível mundial, sendo que um em cada 8 adultos opta pelo tabaco da recorrente.
Q. A marca “LUCKY STRIKE” da recorrente foi originalmente desenvolvida pela empresa “R.A. Patterson” em 1871, tendo sido introduzida inicialmente no mercado como tabaco de mastigar.
R. O seu nome foi inspirado pela “febre do ouro” que assolou essa era: apenas 4 em 1000 garimpeiros tinham a sorte de encontrar ouro, o que era frequentemente referido como uma “lucky strike”.
S. Os produtos “LUCKY STRIKE” da recorrente começaram a ser vendidos no mercado de Macau na década de 1950, tanto no mercado Duty Free como no mercado doméstico.
T. No que diz respeito ao mercado Duty Free em Macau, as vendas dos anos 2011, 2012 e 2013 foram de 4,8 milhões, 2,9 milhões e 1,8 milhões de unidades de tabaco, respectivamente.
U. Em Macau, a recorrente despende cerca de $10,000.00 USD por ano em Marketing, tendo, inclusivamente, em Janeiro 2013 gasto cerca de $70,000.00 USD com as alterações às embalagens de tabaco em cumprimento das normas legais.
V. Os produtos da recorrente são vendidos e publicitados mundialmente em várias plataformas, nomeadamente através da internet, de anúncios publicitários, de revistas e de jornais, acessíveis aos residentes de Macau.
W. As marcas “LUCKY STRIKE” da recorrente estão registadas em várias jurisdições em todo o mundo, incluindo em Macau, na China e em Hong Kong, sendo conhecidas dos consumidores, produtores e comerciantes do ramo.

b) Do Direito
  
  É do seguinte teor a decisão recorrida:
  «Nos autos, o que está em causa é saber se o logotipo que actualmente a contraparte requereu para ser registado é uma imitação das seguintes marcas detidas pela recorrente (são respectivamente N/47839, N/27940, N/27941, N/72357 e N/77515)
  
  Nos termos do artigo 214.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 97/99/M de 13 de Dezembro (Regime Jurídico da Propriedade Industrial), o registo de marca é recusado quando: a) .….. b) A marca constitua, no todo em parte essencial, reprodução, imitação ou tradução de outra notoriamente conhecida em Macau, se for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se, ou que esses produtos possam estabelecer ligação com o proprietário da marca notória; c) A marca, ainda que destinada a produtos ou serviços sem afinidade, constitua reprodução, imitação ou tradução de uma marca anterior que goze de prestígio em Macau, e sempre que a utilização da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca ou possa prejudicá-los.
  Segundo a al. b) do n.º 2 do artigo 214.º do Decreto-Lei citado, o pedido de registo também é recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha “reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada”.
  O artigo 215.º do mesmo Decreto-Lei define especificamente a reprodução ou imitação de marca:
  “1. A marca registada considera-se reproduzida ou imitada, no todo ou em parte, por outra, quando, cumulativamente:
  a) A marca registada tiver prioridade;
  b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
  c) Tenham tal semelhança gráfica, nominativa, figurativa ou fonética com outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
  2. Considera-se reprodução ou imitação parcial de marca, a utilização de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada, ou somente do aspecto exterior do pacote ou invólucro com as respectivas cores e disposição de dizeres, medalhas e recompensas, de modo que pessoas analfabetas os não possam distinguir de outras adoptadas por possuidor de marcas legitimamente utilizadas.”
  Da norma acima citada podem ser extraídos os elementos essenciais que constituam, ao mesmo tempo, a imitação de marca alheia:
1. A marca que foi imitada tem prioridade;
2. Os produtos e serviços fornecidos pela marca registanda e pela marca anteriormente registada são iguais ou semelhantes; e
3. O desenho, denominação, figura ou pronúncia da marca a registar é semelhante ao da marca registada, o que pode causar facilmente mal-entendimento e confusões entre os consumidores, ou cria um risco de associação com a marca já registada.
  Neste caso, as marcas N/47839, N/27940, N/27941, N/72357 e N/77515, que são possuídas pela recorrente A Inc., já tinham sido registadas em Macau antes da contraparte apresentar o requerimento de registo de marca à Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico, portanto, não há dúvidas de que o requisito indicado no n.º 1 está satisfeito.
  No que diz respeito ao requisito indicado no n.º 2 - se os produtos e serviços fornecidos pela marca cujo registo é pretendido pela contraparte são iguais ou semelhantes aos das marcas já registadas.
  Em primeiro lugar, há de apontar que a marca da contraparte cujo registo foi concedido é para fornecer os produtos na classe 34, tais como tabaco, charutos, cigarros contendo sucedâneos do tabaco não para uso medicinal, cigarros, cigarrilhas, ervas para fumar, cigarros eletrónicos, líquidos de reposição de nicotina para cigarros eletrónicos, caixa de charutos, caixa de cigarros.
  E as marcas N/47839, N/27940, N/27941, N/72357e N/77515 possuídas pela recorrente também fornecem os produtos da classe 34, incluindo: cigarros, tabaco, produtos de tabaco, produtos derivados do tabaco, isqueiros, fósforos e artigos para fumadores, etc.
  Tendo-se comparado as marcas das duas partes, é fácil de notar que as ditas marcas se destinam a fornecer produtos iguais ou semelhantes, assim sendo, também está preenchido o segundo requisito.
  Relativamente ao terceiro requisito, na óptica da recorrente, a marca da contraparte cujo registo foi concedido e as marcas possuídas pela recorrente geram facilmente confusão dos consumidores, fazendo com que a maioria destes pensem que as duas são a mesma marca.
  Importa referir que para determinar se existe reprodução ou imitação entre marcas, deve analisar-se as marcas inteiras e não apenas um dos seus elementos constitutivos. Este critério é amplamente aceite pela doutrina1 e jurisprudência2.
  In casu, a marca cujo registo foi requerido pela contraparte é constituída pelos caracteres chineses “祥雲” e seu significado em inglês “LUCKY CLOUDS” sobre um fundo em círculo.
  A marca N/47839 possuída pela recorrente é composta simplesmente por um círculo sem qualquer palavra.
  E as marcas N/27940, N/27941, N/72357e N/77515 da recorrente são constituídas pela expressão em inglês “LUCKY STRIKE” sob um fundo em círculo e mais outras palavras em inglês.
  Devido a que a marca da contraparte não é composta simplesmente por “LUCKY CLOUDS”, mas sim pelos caracteres chineses “祥雲” e palavras inglesas “LUCKY CLOUDS” juntamente com um círculo preto, e as palavras “LUCKY CLOUDS” escritas em fonte relativamente maior são colocadas no centro da marca, sendo mais distintas.
  O Juízo entende que, geralmente, o consumidor geral fica mais impressionado com as palavras nas marcas do que com as figuras, portanto, as palavras “祥雲, LUCKY CLOUDS” são mais destacadas do que a figura. E as palavras “祥雲” também são mais marcantes do que a expressão em inglês “LUCKY CLOUDS”, os dois constituem em conjunto a parte destacada e importante da marca.
  Atendendo a que a marca que a contraparte pretende registar e as marcas possuídas pela recorrente são diferentes em termos de palavra, pronúncia e figura, podemos dizer que existem grandes diferenças entre as marcas de ambas as partes, sobretudo entre todas as marcas registadas a favor da recorrente, nenhuma delas é composta por caracteres chineses.
  Francamente, quanto à questão de causar ou não confusão aos consumidores é uma questão relativamente subjectiva, pessoas diferentes podem ter opiniões distintas sobre uma determinada marca. Porém, no caso vertente, embora haja uma certa semelhança na aparência entre a marca registanda e as marcas da recorrente (palavra em inglês “Lucky”), tenta-se ver do ponto de vista do consumidor geral, o Juízo entende que a semelhança entre as duas marcas não é tão óbvia que possa causar confusão, porquanto a parte marcante da marca registanda é os caracteres chineses “祥雲” e as palavras inglesas “Lucky Clouds”. “祥雲” é a antiga crença chinesa, segundo a qual as nuvens coloridas no céu são um símbolo auspicioso, pelo que são chamadas de “nuvens auspiciosas” que significam nuvens da sorte. Por outro lado, as palavras inglesas “LUCKY STRIKE” nas marcas da recorrente significam em chinês “幸運一擊 (um golpe de sorte)”. Daí verifica-se que “祥雲” ou “Lucky Clouds” e “LUCKY STRIKE” são completamente diferentes quer na escrita, quer na pronúncia, quer no significado. Por conseguinte, pode determinar-se que as marcas da recorrente e a marca da contraparte não são semelhantes em termos de desenho, denominação, figura ou pronúncia.
  Como mostra Ferrer Correia3 “… as marcas mistas e as marcas complexas deverão ser consideradas globalmente, como sinais distintivos de natureza unitária, mas incidindo a averiguação da novidade sobre o elemento ou elementos prevalentes – sobre os elementos que se afigurem mais idóneos a perdurar na memória do público (não deverão tomar-se em linha de conta, portanto, os elementos que desempenhem função acessória, de mero pormenor). Uma marca mista ou complexa não será nova quando o seu núcleo se confunda com marca mais antiga …”
  Relembra Carlos Olavo4 que, da constatação de que a comparação das marcas não é simultânea, mas sucessiva, decorrem os seguintes corolários, “Se dois sinais são comparados um perante o outro, são as diferenças que ressaltam.
  Mas quando dois sinais são vistos sucessivamente, é a memória do primeiro que existe quando o segundo aparece, pelo que, nesse momento, apenas as semelhanças ressaltam”.
  Por conseguinte, neste caso, o método da nossa análise não deve ser o de procurar diferenças e discrepâncias entre as duas marcas; pelo contrário, uma vez que os consumidores não conseguem frequentemente efectuar uma comparação imediata entre duas marcas ao mesmo tempo, é mais importante considerar as semelhanças na impressão que as duas marcas causam no consumidor médio.
  Analisando sinteticamente as marcas pedidas pela contraparte e a marca detida pela recorrente, embora as marcas de partes utilizassem alguns dos mesmos elementos constitutivos, após a consideração sintética das marcas de ambas as partes, o Tribunal considerou que a marca a registar não induza manifestamente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com a marca anteriormente registada, o qual não satisfaz os requisitos do artigo 215.º, n.º 1, alínea c), do Regime Jurídico da Propriedade Industrial e, por conseguinte, não deve ser definida como uma reproduzção ou imitação de uma marca registada.
  Afigura-se-nos, quer se trate de uma imitação de uma marca geral, quer se trate de uma imitação de uma marca notória, todas elas dependem do risco de induzir facilmente em erro ou confusão o consumidor ou de compreender o risco uma associação com a marca registada. Segundo o que precede, afigura-se-nos que a existência de tal risco não pode ser provada no caso em apreço.
  Quanto à questão de saber se a marca da recorrente é uma marca de prestígio, esta é relevante na medida em que pode afectar a aplicação do artigo 214.º, n.º 1, alínea c), do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, segundo o qual, “A marca, ainda que destinada a produtos ou serviços sem afinidade, constitua reprodução, imitação ou tradução de uma marca anterior que goze de prestígio em Macau, e sempre que a utilização da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca ou possa prejudicá-los.”
  Como assinala Luís Gonçalves, uma marca de prestígio deve satisfazer os dois requisitos seguintes ao mesmo tempo:
  “1º gozar de excepcional notoriedade;
  2º gozar de excepcional atracção e-ou satisfação junto dos consumidores.
  O primeiro requisito significa que a marca deva ser, espontânea, imediata e generalizadamente conhecida do grande-público consumidor5, e não apenas dos correspondentes meios interessados, como o sinal distintivo de uma determinada espécie de produtos ou serviços.
  (…)
  O segundo requisito referido significa que a marca deva contar ou com um elevado valor simbólico-evocativo junto do público consumidor, não obstante não seja de grande consumo, ou com um elevado grau de satisfação junto do grande público consumidor(…)”6
  Por um lado, não podemos concluir, com base nos factos provados, que pelo menos dois terços dos consumidores do mercado do tabaco em Macau conhecem a marca detida pela recorrente; e, por outro lado, não existe matéria de facto suficiente para sustentar a conclusão de que a marca da recorrente tem uma atração distintiva e um amplo reconhecimento entre os consumidores do mercado do tabaco em Macau, por conseguinte, afigura-se-nos a marca da recorrente ainda não atingiu o estatuto de marca de prestígio.
  No entanto, mesmo que, na hipótese, a marca da recorrente seja legalmente uma marca de prestígio, como já foi referido anteriormente, uma vez que existem diferenças significativas de escrita, de pronúncia, de significado e de aparência entre a marca pedida pela contraparte e a marca actualmente detida pela recorrente, é difícil considerar objectivamente que, com o registo da marca a registar, a contraparte pode obter uma clientela, atráves da marca detida pela recorrente, ou prejudicar o prestígio da marca da recorrente.
  Tendo em conta o que precede, a marca a registar não preenche os motivos de recusa de registo de uma marca previstos no artigo 214.º, n.º 1, alíneas b) e c), e no artigo 215.º, n.º 1, do Regime Jurídico da Propriedade Industrial.
*
  No que diz respeito à concorrência desleal, o artigo 9.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial prevê que a concorrência desleal com intenção subjectiva, ou a existência objectiva da possibilidade de constituição de concorrência desleal, mesmo que não haja intenção subjectiva, são motivos de recusa de concessão de um direito de propriedade industrial.
  Quanto ao pedido de registo de uma marca, essa prática de concorrência desleal pode incluir afirmações enganosas, jactanciosas ou depreciativas para outros concorrentes. Por exemplo, incluir palavras na composição de uma marca para induzir os consumidores num erro que os leva a pensar que o seu produto ou serviço tem um determinado estatuto reconhecido a nível nacional ou uma utilidade ou função óbvia.
  Por outro lado, este tipo de acto de concorrência desleal pode também resultar da intenção do requerente do registo da marca de confundir os seus próprios produtos ou serviços com os dos seus concorrentes no sector, ou de permitir a marca a registar de uma forma que objectivamente pode levar à confusão entre os produtos ou serviços dos diferentes empresários comerciais, mas é importante analisar se, através do respectivo acto, é suficientemente susceptível de levar a desvio da clientela7.
  Salvo o devido respeito, é evidente que a alegada concorrência desleal não pode ser reconhecida no caso em apreço, uma vez que não foi comprovado que a marca a registar é uma imitação da marca da recorrente.
  Pelo exposto, uma vez que a marca a registar não constitui uma reprodução ou imitação de marca prevista no artigo 214.º, n.º 2, alíneas b) e c), e no artigo 215.º, n.º 1, do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, devem ser julgados improcedentes os fundamentos de recurso da recorrente, mantendo-se a concessão do registo da marca n.º N/137154.».
  
  Das conclusões de recurso nada mais se acrescenta para além do que já se havia feito em sede de recurso da decisão da DSEDT continuando a sustentar-se a semelhança/imitação das marcas.
  Uma das marcas registadas da Recorrente é um círculo cuja capacidade distintiva é bastante reduzida sendo uma figura geométrica que pode ser usada por qualquer outro.
  Mas ainda assim o desenho do círculo que constitui uma das marcas da Recorrente em nada se assemelha ao desenho do círculo da marca registanda.
  As demais marcas da Recorrente sendo constituídas por um círculo com dizeres, nem os dizeres, nem a apresentação gráfica, nem as cores, nem a fonética se equiparam à da marca registanda.
  Estando em causa imitação das marcas da Recorrente, considerando a diferença fonética, a diferença gráfica, a diferença de significados entre os nomes utilizados, para além de ambas serem constituídas por um círculo e terem uma das palavras em Inglês comum mas que se trata de um vocábulo de uso geral – Lucky – entendemos que do conjunto da composição que consistem as marcas registadas da Recorrente e a marca a registar não resulta que haja imitação.
  Pelo que, sem necessidade de outras considerações, acompanhando a Douta decisão recorrida a cujos fundamentos nada mais há a acrescentar e para os quais remetemos e aderimos integralmente nos termos do nº 5 do artº 631º do CPC, impõe-se negar provimento ao recurso, mantendo aquela - a decisão recorrida -.

III. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, negando-se provimento ao recurso mantém-se a decisão recorrida.
  
  Custas a cargo da Recorrente.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 16 de Janeiro de 2025
  Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
  (Relator)
  Seng Ioi Man
  (1° Juiz-Adjunto)
  Fong Man Chong
  (2° Juiz-Adjunto)
1 «DIREITO DE MARCAS» LUÍS M. COUTO GONÇALVE, 2ª Ed., p. 137.
2 Cfr. os acórdãos proferidos nos processos n.ºs 436/2011 e 842/2012 do TSI.
3 Ferrer Correia, 《Lições de Direito Comercial》, Universidade de Coimbra, Volume I, 1973, p. 331 e 332.
4 Carlos Olavo, 《Propriedade Industrial》, Volume I, 《Sinais Distintivos do Comércio, Concorrência Desleal》, Coimbra, Almedina, 2.ª edição, 2005, p.101 e 102.
5 Numa percentage que consideramos não deve ser inferior a uma maioria qualificada de 75%, ou, pelo menos, de dois terços dos consumidores do mercado em referência.
6 Luis M. Couto Gonçalves,《Direito de Marcas》, Almedina, 2.ª Edicção, 2003, pp.155 e 156.
7 Vide o acórdão do TSI, proc. n.º 927/2017.
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695/2024 CÍVEL 1