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Processo nº 513/2024
(Reclamação para a conferência)

Data: 24 de Janeiro de 2025
Requerentes/Recorrentes: A e Outras
Requerido/Recorrido: Chefe do Executivo
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  A,
  B有限公司, e
  C, Limitada,
  que conjuntamente com a D Lda. (D有限公司), constituíram o Consórcio A - B – C, Limitada - D合作經營, com os demais sinais dos autos,
  vieram reclamar para a conferência do despacho de fls. 337 a 339 que indeferiu a realização das diligências do requerimento de prova das alíneas B) e C) da p.i.
  Para tanto alega a Reclamante:
  - As Recorrentes/Reclamantes arrolaram apenas duas testemunhas para provar todos os factos constantes da p.i., pelo que, não havendo excesso do número de testemunhas entende a Reclamante que nada tinha de especificar,
  - Quanto à cooperação judiciária veio agora invocar que havia de ter sido convidada a corrigir as deficiências nos termos do artº 51º do CPAC vindo agora indicar no artº 14º da sua reclamação os departamentos da China Continental a quem queria que fossem solicitadas as informações em causa.
  
  Pelas contra-interessadas E, LIMITADA, F有限公司 e G有限公司 (que formam F-G-E, LIMITADA EM CONSÓRCIO), foi deduzida oposição pugnando pela manutenção do despacho reclamado.
  
  Tendo vista dos autos pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público foi emitido o seguinte parecer:
  «Visto.
  As Recorrentes apresentaram reclamação para a conferência do Tribunal de Segunda Instância, da decisão proferida pelo Excelentíssimo Senhor Relator a fls. 337 a 339 sobre o requerimento de prova que as mesmas apresentaram.
  Não têm razão, parece-nos.
  A nosso modesto ver, a douta decisão reclamada, fez uma impecável aplicação da lei, não sendo, por isso, merecedora de qualquer reparo.
  É, pois, parecer do Ministério Público, salvo melhor opinião, o de que a presente reclamação para a conferência deve ser indeferida.».
  
  Foram dispensados os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
  É do seguinte teor o despacho reclamado:
  «Notificadas as partes para os efeitos do artº 64º e para indicarem a que factos pretendem que as testemunhas sejam ouvidas nos termos da al. c) do nº 1 do artº 43º do CPAC vieram as Recorrentes reiterar o que haviam requerido em A), B) e C) do seu requerimento inicial.
  Em A) oferecem os documentos constantes dos autos;
  Em B) repetem o rol de testemunhas sem indicarem os factos a que as querem ouvir como haviam sido notificadas para fazer.
  Em C) pedem para ao abrigo da cooperação judicial para “pedir aos serviços competentes do Interior da China (sobretudo às direcções dos serviços sobre o ambiente ecológico de cada província correspondente) para apresentar respostas escritas em relação aos assuntos que elencam” e “pedir ao Departamento de Segurança Pública do Interior da China solicitar resposta escritas por parte dos serviços de cada província/cidade para a administração de ordem publica relacionados com os selos sobre os seguintes selos em causa contidos na documentação apresentada pela entidade vencedora, para verificar se se trata de selos falsificados/fabricados por particulares” que a seguir elenca.
  Vejamos então.
  Quanto às testemunhas arroladas, nos termos da alínea c) do nº 1 do artº 43º do CPAC, no rol tem de ser indicado os factos sobre que cada testemunha deve depor.
  Notificadas as Recorrentes para o fazerem, nada disseram.
  Assim vai indeferida a audição das testemunhas arroladas.
  Dispõe o artº 18º do Acordo sobre os pedidos mútuos de citação ou notificação de actos judiciais e de produção de provas em matéria civil e comercial entre os tribunais do Interior da China e os da Região Administrativa Especial de Macau publicado por ordem do Aviso do Chefe do Executivo n.º 39/2001:
Artigo 18.º
  Entre as provas a produzir a rogo do outro tribunal incluem-se, além de outras, a inquirição das partes, das testemunhas e dos peritos, bem como a realização de perícias e inspecções judiciais, e a produção de outras provas relacionadas com actos processuais.

  As diligências probatórias requeridas não são inquirição de partes, testemunhas nem peritos, bem como, também não são a realização de perícias ou inspecções judiciais.
  Podemos aceitar que as diligências de prova requeridas coubessem na última frase do citado artº 18º como sendo outras diligências de prova. Contudo haveriam de ter de ser requeridas a um outro tribunal uma vez que a cooperação judicial em matéria de produção de provas ocorre entre tribunais e não directamente entre um tribunal de Macau e as diversas entidades da China Continental.
  Por falta de jurisdição não pode este tribunal exigir de uma entidade pertencente a um estado estrangeiro que preste informações.
  Logo, dado que o que se requer visa entidades governamentais de outra jurisdição, tanto seria o bastante para ser indeferido o requerido.
  Mas ainda que o pudesse fazer ou que se admitisse a hipótese de deprecar a um Tribunal da China Continental a realização dessa diligência, haveria de ser indicado de que entidade é que se pretende obter a informação.
  Ora, as recorrentes não identificam a quem deve ser pedida a informação, pelo que, impossível se torna deprecar a realização desta diligência.
  Em C) II as Recorrentes pedem que se oficie ao Departamento indicado a informação que indica para saber “se se trata de selos falsificados”.
  Cabe às Recorrentes saber se são verdadeiros os factos que invocam como constitutivos do direito que se arrogam.
  No entanto o que invoca no artº 42º da p.i. é que aparentemente são falsificados os selos/carimbos e os factos indicados quantos aos demais nada têm a ver com a falsidade de carimbos.
  Ao Tribunal cabe admitir diligências de prova sobre os factos que se invocam, mas não lhe cabe ir diligenciar no sentido de saber se “hipotecticamente” existem ou não os factos que eventualmente se possam invocar.
  Antes de invocar o facto cabe à recorrente saber se ele é verdadeiro.
  Destarte, não sendo aqui expressamente suscitado o incidente de falsidade daqueles carimbos, para além da ambiguidade da identificação da entidade a quem pedir a informação, vai indeferido o requerido.
  Termos em que, pelos fundamentos expostos vai indeferido o requerimento de prova das alíneas B) e C) da p.i. sem prejuízo da prova que possa resultar dos elementos constantes do processo administrativo e dos documentos juntos com a p.i.».
  
  Reza o artº 51º do CPAC o seguinte:
Artigo 51.º
(Despacho de aperfeiçoamento)
  1. Quando a petição ou a sua instrução enfermem de deficiências ou irregularidades formais, o recorrente é notificado para as suprir ou corrigir em prazo fixado pelo juiz ou relator.
  2. Quando o recorrente supra ou corrija as deficiências ou irregularidades, o recurso considera-se interposto na data da entrega da primeira petição.
  3. Quando, tendo sido convidado a suprir a omissão, o recorrente que tenha requerido prova testemunhal não apresente o rol de testemunhas ou não indique os factos sobre que devem depor, fica impedido de fazer tal prova.
  4. Com excepção do disposto no número anterior, a falta de suprimento ou correcção das deficiências ou irregularidades apontadas em despacho não reclamado para a conferência, ou por esta confirmado, implica a rejeição do recurso.
  
  Quanto à alínea B) do Requerimento probatório.
  
  Salvo melhor opinião o que resulte do nº 3 do citado artº 51º é que o requerente da prova testemunhal tem de indicar os factos a que as testemunhas vão depor.
  A referência genéria para “demonstrar toda a matéria de facto na petição” não pode de modo algum ser entendida como indicação dos factos, considerando que a p.i. tem 170 artigos sem considerar as conclusões, não estando dividida por matéria de facto e de direito, sendo que de acordo com o princípio dispositivo é à parte que cabe indicar os factos a que pretende sejam ouvidas as testemunhas e não ao tribunal selecionar entre tudo quanto se alega o que são factos e quais os passíveis de prova testemunhal, sendo certo que a inquirição cabe ao juiz mediante os factos selecionados previamente pela parte e sem prejuízo do disposto no nº 3 do artº 65º do CPAC.
  Neste sentido veja-se Código de Processo Administrativo Contencioso Anotado, Viriato Lima e Álvaro Dantas, anotação nº 5 ao artº 51º, pág. 193:
  «5. O n.º 3 do artigo sob anotação refere-se às situações em que o recorrente tenha requerido a produção de prova testemunhal e não apresente rol de testemunhas ou não indique os factos sobre os quais as testemunhas que arrolou devam depor. Nesses casos, a falta de suprimento da omissão apontada, não obstante o convite feito pelo juiz ou relator, tem como consequência que aquele fique impedido de produzir tal prova, sem que obste, no entanto, ao prosseguimento do recurso.».
  Em igual sentido sendo de se interpretar o preceito na única maneira possível de ser exigível a especificação dos factos veja-se também José Cândido de Pinho em Notas e Comentários ao Código de Processo Administrativo Contencioso, Vol. I, anotação nº 7 ao artº 51º, pág. 396/397:
  «7 - O nº3 parte do princípio de que o recorrente requereu a produção de prova testemunhal na petição, sem que, contudo, tivesse desde logo, como era sua obrigação, apresentado o respectivo rol de testemunhas. Ou, apesar de ter feito essa apresentação, sem ter especificado quais os factos da petição a que cada uma deveria depor (cfr. 42º, nº1, al. g), h), art. 43º, nº1, al. c), supra). O juiz deverá, perante essa omissão, notifica o recorrente fixando-lhe um prazo para a suprir. Se, mesmo assim, o recorrente não apresentar o rol no prazo concedido ou não indicar os factos a que cada testemunha deve depor, ficará impedido de fazer esse tipo de prova.
  Pode ser esta uma solução demasiadamente rígida? Nem por isso. O tribunal deve dar sempre a oportunidade de o recorrente emendar a mão aos lapsos, erros e omissões. O espírito de cooperação justifica essa atitude. Mas, se o próprio recorrente não corresponde ao convite do tribunal, haverá que interpretar o silêncio como, ou não querendo efetivamente fazer a prova, e estaremos aí perante uma dedução perfeitamente plausível, ou desconsiderando a atenção que o tribunal lhe dedicou, numa atitude que pode ser entendida como sobranceria ou desrespeito. Seja como for que se possa interpretar um tal silêncio, a verdade é que o legislador confere efeitos preclusivos irremediáveis: o recorrente deixará de fazer prova testemunhal. Esta proibição é imposta a todos e nem a boa vontade do juiz permite ultrapassar a determinação legal.».
  
  Notificados para indicarem a que factos pretendiam que as testemunhas fossem ouvidas as Reclamantes silenciaram, pelo que, não sendo passível de interpretação de que a indicação “para demonstrar toda a matéria de facto da petição” constitua uma indicação dos factos a ouvir, quando nem sequer a matéria de facto está individualizada na p.i., impõe-se manter o despacho reclamado nesta parte.
  
  Quanto à alínea C) do Requerimento probatório.
  
  Ao contrário do que acontece com a omissão da indicação das testemunhas ou da especificação dos factos a que devem ser ouvidas nada mais se refere no artº 51º quando ao aperfeiçoamento do requerimento de prova.
  O artº 64º permite que as partes venham alterar o seu requerimento de prova.
  No despacho de fls. 323 a 327 era também ordenada a notificação das partes para os efeitos do artº 64º do CPAC, notificação essa que foi feita juntando-se cópia do despacho – cf. fls. 329 -.
  Ora se havia insuficiência no seu requerimento de prova cabia à parte tê-lo alterado/corrigido nesse momento o que não fez.
  Tão certo é que não indicou a que entidades o pedido havia de ser dirigido o que vieram as Reclamantes agora fazê-lo, mas extemporaneamente.
  Por outro lado, como também se diz no despacho reclamado as diligências requeridas não visam fazer prova dos factos que as Recorrentes entendem ser verdadeiros, mas antes, “fazer a posteriori do concurso uma verificação se os elementos fornecidos pela entidade a quem foi adjudicado o contrato eram verdadeiros” o que manifestamente não está no objecto do processo.
  Ora, como já se referiu no despacho reclamado ao Tribunal cabe admitir diligências de prova sobre factos invocados e não diligências para saber se as suspeitas de quem Recorre são ou não verdadeiras.
  Cabia às Recorrentes previamente à instauração da acção saber se o que suspeita é verdade e indicar o concreto meio de prova, o que não fez.
  Finalmente, também não se indica que factos concretos da petição inicial pretende provar com tal diligência, pelo que, pelas mesmas razões com base nas quais já foi indeferida a prova testemunhal, também esta não poderia ser deferida por se desconhecer a que factos em concreto se dirige.
  
  Destarte, pelos fundamentos expostos e os constantes do despacho reclamado, entendemos ser de indeferir a reclamação.
  
  Termos em que, pelos fundamentos expostos, indeferindo a reclamação apresentada, mantém-se o despacho recorrido nos seus precisos termos.
  
  Custas pelo incidente a cargo das Reclamantes fixando-se a taxa de justiça em 4 UC´s – artº 87º e 88º do RCT -.
  
  Notifique.
  
  RAEM, 24 de Janeiro de 2025
  
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)

Seng Ioi Man
(1o Juiz-Adjunto)

Fong Man Chong
(2o Juiz-Adjunto)

Álvaro António Mangas Abreu Dantas
(Delegado Coordenador)

  

513/2024 RECL P/CONF 6