Processo nº 735/2024
(Autos de Recurso Jurisdicional em Matéria Administrativa)
Data do Acórdão: 20 de Fevereiro de 2025
ASSUNTO:
- Caducidade do direito à concessão de terreno por falta de aproveitamento no prazo.
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 735/2024
(Autos de Recurso Jurisdicional em Matéria Administrativa)
Data: 20 de Fevereiro de 2025
Recorrente: A
Recorrida: Região Administrativa Especial de Macau
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
A, com os demais sinais dos autos,
veio instaurar acção para efectivação de responsabilidade civil extracontratual contra,
Região Administrativa Especial de Macau, também, com os demais sinais dos autos,
pedindo que seja a acção julgada procedente e a Ré condenada no pagamento da indemnização no montante de MOP329.830.000,00, acrescida de juros a taxa legal, contados a partir do dia seguinte da prolação da sentença.
Proferida sentença, foi julgada improcedente a acção intentada pela Autora, com a absolvição da Ré dos pedidos formulados.
Não se conformando com a decisão proferida veio a Autora recorrer da mesma, apresentando as seguintes conclusões:
1. Inconformada com o teor da decisão do Tribunal a quo que rejeitou a responsabilidade civil extracontratual invocada pela Recorrente, veio a Recorrente interpor o presente recurso.
2. Salvo o devido respeito pela opinião do Juiz do Tribunal a quo, a Recorrente não concorda com a seguinte parte da exposição dos motivos de direito, constante de fls. 9 a 14 dos autos, considerando que a decisão recorrida padece do vício de erro na interpretação e aplicação do artigo 166.º da Lei n.º 6/80/M.
3. Segundo o teor da decisão recorrida acima exposto, no entendimento do Tribunal a quo, a absolvição dos pedidos formulados pela Recorrente fundamenta-se essencialmente em:
a) A falta do aproveitamento do terreno pela concessionária no prazo fixado (o prazo expirou em 11 de Maio de 1996) desencadeou a caducidade da concessão, sendo esta uma decisão irreversível. Enfim, o Tribunal de Segunda Instância e o Tribunal de Última Instância negaram provimento ao recurso contencioso interposto pela Recorrente com a manutenção da decisão originária. Uma vez que a Recorrente não logrou a anulação da decisão administrativa em apreço, mesmo que não haja outros actos administrativos ilícitos invocados (como a demora ou a falta da resposta aos pedidos de alteração da finalidade do terreno concedido, e a falta da decisão sobre a alteração do plano urbanístico global para a zona de Pac On), é difícil a obtenção do lucro previsto, impossibilitando o pedido de indemnização pelo lucro cessante previsto.
b) Nos termos do artigo 166.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2 da Lei n.º 6/80/M (Lei antiga), a Administração pode declarar imediatamente a caducidade da concessão, quando o concessionário não tenha concluído o aproveitamento do terreno no prazo contratual, por razões imputáveis ao mesmo.
c) A actuação alegadamente ilícita da Administração não lesou nenhum direito subjectivo da Recorrente, nomeadamente, o direito de aproveitar o terreno concedido, uma vez que, a partir de 11 de Maio de 1996, a Recorrente deixou de ser titular do direito subjectivo de aproveitar o terreno em causa.
d) O concessionário que não tivesse concluído o aproveitamento no prazo fixado, e mesmo assim estava ainda interessado em prosseguir com a execução da concessão, deveria requerer a prorrogação do prazo ou a concessão de um novo prazo de aproveitamento antes da respectiva expiração, ficando o deferimento desse requerimento dependente da demonstração de que o incumprimento do prazo contratual por motivo que lhe não era imputável.
e) In casu, pelas cláusulas contratuais, a Recorrente ficou sujeita ao dever de concluir o aproveitamento no prazo prorrogado de 24 meses até 11 de Maio de 1996. Sucede porém que no termo desse prazo, o aproveitamento não se mostrava sequer iniciado. E apesar da resposta ao ofício n.º 181/6038.2/SOLDEP/96, mediante a qual a Recorrente informou que o atraso do projecto se devia às dificuldades existentes no domínio da actividade imobiliária e só em 7 de Agosto de 2003, já 7 anos depois do fim daquele prazo, é que a Recorrente requereu ao Director da Direcção dos Serviços de Solos e Construção Urbana (sic) a prorrogação do prazo de aproveitamento por mais 24 meses.
f) Face ao quadro normativo da anterior Lei de Terras, a partir de 11 de Maio de 1996, a Recorrente deixou de ter o direito de aproveitamento do terreno que lhe resultava do contrato de concessão. Por sua vez, todos os factos ilícitos decorrentes da Administração que integram a causa de pedir, são irrelevantes para sustentar a pretensão da Recorrente, porque apenas começaram a verificar-se posterior à data do requerimento (7 de Agosto de 2003), sendo portanto insusceptíveis de lesar o direito que se extinguiu antes.
4. Salvo o devido respeito pela opinião do Tribunal a quo, a Recorrente não concorda com os supracitados fundamentos adoptados pelo Tribunal a quo na absolvição dos pedidos pela mesma formulados, visto que:
5. Do 1º fundamento da decisão recorrida que indeferiu os pedidos da Recorrente, de acordo com a decisão recorrida, a falta do aproveitamento do terreno pela Recorrente no prazo fixado (o prazo expirou em 11 de Maio de 1996) desencadeou a caducidade da concessão, sendo esta uma decisão irreversível. Uma vez que a Recorrente não logrou a anulação da decisão administrativa em apreço, mesmo que não haja outros actos administrativos ilícitos invocados (como a demora ou a falta da resposta aos pedidos de alteração da finalidade do terreno concedido, e a falta da decisão sobre a alteração do plano urbanístico global para a zona de Pac On), é difícil a obtenção do lucro previsto, impossibilitando o pedido de indemnização pelo lucro cessante previsto.
6. Antes de tudo, a Recorrente necessita de afirmar que a caducidade da concessão do terreno em causa não desencadeia necessariamente a perda, por parte da Recorrente, do direito de reclamar indemnização por responsabilidade civil extracontratual à Região Administrativa Especial de Macau, em virtude dos actos administrativos ilícitos praticados pela Administração (como a demora ou a falta da resposta aos pedidos de alteração da finalidade do terreno concedido, e a falta da decisão sobre a alteração do plano urbanístico global para a zona de Pac On).
7. É de salientar, de acordo com os conteúdos dos Acórdãos dos Tribunais Colectivos dos Tribunal de Segunda Instância e Tribunal de Última Instância, sob os n.ºs 434/2015 e 62/2017, respectivamente, foi declarada a caducidade da concessão do terreno em apreço, por motivo imputável à própria recorrente, no que respeita ao incumprimento de obrigação de aproveitamento do terreno, dentro do prazo fixado no contrato, baseando nisso, declara-se a caducidade da concessão do terreno.
8. O acórdão que visa a declaração de caducidade da concessão do terreno em apreço, indicava apenas que “o motivo imputável à própria recorrente no que respeita ao incumprimento de obrigação de aproveitamento do terreno, dentro do prazo fixado no contrato”, mas, não excluiu a probabilidade que para além do motivo da própria recorrente, teria outros motivos que causaram à recorrente que não conseguisse cumprir a obrigação do aproveitamento do terreno, dentro do prazo fixado no contrato, por exemplo, o indicado na p.i. sobre uma série de acto administrativo ilícito praticados pela Administração (o atraso ou a falta da resposta quanto ao pedido de alteração da finalidade do terreno em causa, bem como nunca houve uma decisão do planeamento geral da zona Pac On).
9. Temos que saber, a caducidade da concessão provinha do não cumprimento de obrigações surgidas do contrato da concessão, isto é, o resultado do incumprimento do contrato; enquanto a responsabilidade civil extracontratual provinha de Administração desta região e outras pessoas colectivas públicas em relação às condutas ilícitas culposas praticadas pelos seus órgãos ou pessoal administrativo, durante as suas prestações de funções.
10. Por isso, é impossível de ser misturada entre as responsabilidades contratual e extracontratual, muito menos, para a recorrente ter de assumir a consequência do incumprimento do contrato, exclui-se a sua probabilidade em insistir a responsabilidade de Administração, nos termos legais; eram independentes entre eles dois, mas, ambos, podem ser, simultaneamente, existentes.
11. Segundo o conteúdo da cláusula 2.ª do contrato da concessão do terreno em causa, o prazo de arrendamento do terreno em apreço era de 25 anos, contados a partir da data de celebração da escritura pública do contrato, o respectivo prazo de arrendamento pode ser sucessivamente renovado até aos 19 de Dezembro de 2049, conforme as legislação e condições estipuladas entre as partes, ser.
12. Ora caso, tendo a recorrente intentada acção de indemnização de responsabilidade civil extracontratual contra a Região Administrativa Especial de Macau, em antes do findo o prazo da concessão do terreno (isto é, 26 de Outubro de 2013), devido a uma série de actos administrativos negativos praticados pela Administração, nomeadamente, o atraso ou a falta da resposta do pedido de alteração da finalidade do terreno concedido, bem como nunca houve uma decisão sobre a alteração do planeamento geral da zona de Pac On.
13. O acórdão recorrido apontava que a recorrente não concluiu o aproveitamento do terreno em causa, dentro do prazo autorizado para o devido efeito (isto é, antes de 11 de Maio de 1996), fazendo com que caducasse a concessão e não conseguisse pedir a indemnização da perda dos interesses previstos, é de frisar, que foi declarada a caducidade da concessão o terreno em causa nos termos dos artigos 104.º, n.º 3 e 166.º da Lei n.º 10/2013, por remissão da alínea 3) do artigo 215.º da mesma lei.
14. A Lei n.º 10/2013 entrou em vigor em 01 de Março de 2014, e é aplicável ao terreno em apreço, por base nas disposições finais e transitórias às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, nos termos do artigo 215.º da aludida lei.
15. Antes do aparecimento ou da entrada em vigor da Lei n.º 10/2013, é impossível a recorrente que preveja a existência da aludida lei, ademais, é impossível que ela preveja que a não conclusão do aproveitamento do terreno, dentro do prazo autorizado para o devido efeito sirva como fundamento de caducidade da concessão provisória.
16. De facto, antes do aparecimento ou da entrada em vigor da Lei n.º 10/2013, a lei aplicável ao terreno em apreço era a Lei n.º 6/80/M, e no artigo 166.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 da dita lei se estipulou sobre a caducidade da concessão provisória.
17. Conforme a análise ao artigo 166.º, n.º 1, alínea a) da Lei n.º 6/80/M, a Administração pode declarar a caducidade da concessão provisória perante duas situações, primeira, a concessionária com falta do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais, segunda, ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo do pagamento da multa agravada previsto no n.º 3 do artigo 105.º.
18. Atendendo que na cláusula 13.ª do contrato da concessão não foi estipulada que seja declarada a caducidade da concessão provisória sempre que a concessionária não aproveitar o terreno nos prazos e termos contratuais, pelo que sempre que a concessionária exceda o indicado no artigo 105.º, n.º 3 da Lei n.º 6/80/M, isto é, não efectuar decorrido o prazo do pagamento da multa agravada, assim, é que a Administração pode declarar a caducidade da concessão provisória.
19. De facto, antes de o terreno em apreço ter sido declarado caducado pelo Chefe do Executivo, nos termos da Lei n.º 10/2013, não tendo a Administração notificada à recorrente sobre a multa agravada, nos termos do artigo 105.º, n.º 3 da Lei n.º 6/80/M, por isso, mesmo que a recorrente não tivesse concluído o aproveitamento do terreno em causa em antes de 11 de Maio de 1996, mas, dado que a Administração não tinha aplicado multa contra a recorrente devido a respectiva conduta, ela era impossível de ser prevista que a Administração iria declarar a caducidade da concessão provisória do terreno em causa, depois de 11 de Maio de 1996.
20. Perante as supras situações, questionamos que antes do aparecimento ou da entrada em vigor da Lei n.º 10/2013, mesmo que a recorrente não tinha concluído o aproveitamento do terreno em causa, antes de 11 de Maio de 1996, como seria possível a recorrente prever-se que em 17 anos depois apareceria uma lei que fundamente a caducidade da concessão provisória na não conclusão do aproveitamento do terreno, dentro do prazo autorizado para o devido efeito?
21. Nos termos do artigo 11.º do Código Civil, antes do aparecimento ou da entrada em vigor da Lei n.º 10/2013, a lei aplicável ao terreno em apreço era a Lei n.º 6/80/M.
22. Portanto, como era possível o acórdão recorrido em aplicar a Lei n.º 10/2013 que só entrou em vigor em 01 de Março de 2014, presumindo que a recorrente, após 11 de Maio de 1996, soubesse que o terreno devido a não aproveitamento, dentro do prazo, seja declarada a caducidade da sua concessão, em 19 anos depois (em 30 de Maio de 2015 – data do despacho de declaração da caducidade da concessão do terreno do Chefe do Executivo)?
23. Para além disso, mesmo que a caducidade do terreno em causa, deu conforme ao fundamento de a recorrente não ter concluído o aproveitamento do terreno, antes de 11 de Maio de 1996, mas, tem que saber que a Lei n.º 10/2013 não atribuiu à caducidade os efeitos retroactivos, ou seja, a data de caducidade da concessão provisória do terreno em apreço era no dia 30 de Maio de 2015 e não no dia 11 de Maio de 1996.
24. Ademais, de acordo com o contrato da concessão do terreno em causa, o prazo da concessão provisória do tal terreno terminou em 26 de Outubro de 2013, aliás, foi estipulado que o prazo de arrendamento pode ser sucessivamente renovado até aos 19 de Dezembro de 2049, conforme a legislação e as condições estipuladas entre as partes.
25. Assim sendo, a recorrente mantendo como concessionária do terreno em apreço, antes da declaração da caducidade da concessão do aludido terreno, que na qualidade de concessionária tem o poder do exercício de todos os direitos constantes do contrato da concessão, mesmo que tivesse chegado ao termo do prazo de aproveitamento do terreno em causa, em 11 de Maio de 1996.
26. Ou seja, o acto de a recorrente ter apresentado o requerimento à Administração, antes da declaração de caducidade da concessão provisória, cumprindo do exercício legal dos seus direitos atribuídos pelo contrato da concessão, enquanto a Administração tem também a obrigação de responder ao requerimento da recorrente.
27. Pelo que o acórdão recorrido não deve indeferir o pedido de indemnização da responsabilidade civil extracontratual da recorrente, com base no motivo da caducidade da concessão do terreno em causa declarada em 30 de Maio de 2015.
28. Relativamente aos fundamentos do indeferimento dos pontos b. e c. da recorrente, lavrados no acórdão recorrido, indicava o mesmo acórdão que nos termos do artigo 166.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 da Lei n.º 6/80/M (lei antiga), sempre imputável à concessionária e que não consiga concluir o aproveitamento, dentro do prazo fixado no contrato, a Administração pode declarar, imediatamente, a caducidade da concessão, bem como a Administração com a sua actuação alegadamente ilícita, nem sequer lesou qualquer direito subjectivo da recorrente, nomeadamente, o seu direito de aproveitar o terreno concedido, porque desde 11 de Maio de 1996, a recorrente deixou de ser titular do direito subjectivo de aproveitar o terreno.
29. Como acima referido, globalizando os termos do artigo 166.º, n.º 1, alínea a) da Lei n.º 6/80/M e da cláusula 13.ª do contrato, dado que não foi estipulada que seja declarada a caducidade da concessão provisória sempre que a concessionária não aproveitar o terreno nos prazos e termos contratuais, pelo que sempre que a concessionária exceda o indicado no artigo 105.º, n.º 3 da Lei n.º 6/80/M, isto é, não efectuar decorrido o prazo do pagamento da multa agravada, assim, é que a Administração pode declarar a caducidade da concessão provisória.
30. De facto, antes de o terreno em apreço ter sido declarado caducado pelo Chefe do Executivo, nos termos da Lei n.º 10/2013, não tendo a Administração notificada à recorrente sobre a multa agravada, nos termos do artigo 105.º, n.º 3 da Lei n.º 6/80/M, por isso, mesmo que a recorrente não tivesse concluído o aproveitamento do terreno em causa em antes de 11 de Maio de 1996, mas, dado que a Administração não tinha aplicado multa contra a recorrente devido a respectiva conduta, ela era impossível de ser prevista que a Administração iria declarar a caducidade da concessão provisória do terreno em causa, depois de 11 de Maio de 1996.
31. É impossível de não frisar, que a caducidade da concessão provisória do terreno em apreço, foi declarada pelo Chefe do Executivo, em 30 de Maio de 2015, conforme a Lei n.º 10/2013, e não de acordo com as respectivas normas da Lei n.º 6/80/M.
32. Mesmo que a caducidade do terreno em causa, deu conforme ao fundamento de a recorrente não ter concluído o aproveitamento do terreno, antes de 11 de Maio de 1996, mas, tem que a Lei n.º 10/2013 não atribuiu à caducidade os efeitos retroactivos, ou seja, a data de caducidade da concessão provisória do terreno em apreço era no dia 30 de Maio de 2015 e não no dia 11 de Maio de 1996.
33. Pelo que a recorrente mantendo como concessionária do terreno em apreço, antes da declaração da caducidade da concessão do aludido terreno, que na qualidade de concessionária tem o poder do exercício de todos os direitos constantes do contrato da concessão, ou até tem o direito de, após o termo do prazo da concessão provisória do terreno em causa, negociar com a Administração sobre a renovação sucessiva do prazo da concessão provisória até aos 19 de Dezembro de 2049, mesmo que tivesse chegado ao termo do prazo de aproveitamento do o terreno em causa, em 11 de Maio de 1996.
34. Relativamente aos fundamentos do indeferimento dos pontos d. e e. da recorrente, lavrados no acórdão recorrido, indicava o mesmo acórdão que caso a concessionária não conseguir aproveitar o terreno dentro do prazo fixado, mas, mantendo com vontade de continuar a execução da concessão, deve requer-se a prorrogação antes do termo do respectivo prazo, ou a obtenção do novo prazo de aproveitamento, e a recorrente tem a obrigação de concluir o aproveitamento do terreno antes de 11 de Maio de 1996, só que antes do findo deste prazo, não tendo sido iniciado o aludido aproveitamento. Apesar da resposta ao Ofício n.º 181/6038.2/S0LDEP/96, mediante a qual a recorrente apenas informou que o atraso do projecto se deve às dificuldades existentes no domínio da actividade imobiliária e só em 7 de Agosto de 2003, já 7 anos depois do fim daquele prazo, é que a recorrente requereu ao Director da Direcção dos Serviços de Solos e Construção Urbana a prorrogação do prazo de aproveitamento por mais 24 meses.
35. Como acima referido, nos termos da antiga Lei de terras (Lei n.º 6/80/M), depois do findo do prazo de aproveitamento do terreno em apreço não causaria, obviamente, a caducidade da concessão provisória, a respectiva caducidade já pode ser declarada pela Administração quando não são for paga a multa aplicada à recorrente, e antes de a Administração exercer a declaração de caducidade da concessão provisória do terreno em causa, a respectiva concessão provisória mantinha a sua eficácia, aliás, o prazo da concessão provisória do tal terreno terminou em 26 de Outubro de 2013, sempre que se reúnam os requisitos para a aludida concessão provisória, ser sucessivamente renovado até 19 de Dezembro de 2049.
36. Portanto, mesmo que a recorrente não tivesse concluído o aproveitamento do terreno em causa antes de 11 de Maio de 1996, bem como antes de a Administração ter sido declarada a caducidade da concessão provisória do aludido terreno, nada impede à recorrente, que na qualidade de concessionária do terreno em apreço a justificar à Administração sobre a razão de não conclusão do aproveitamento, bem como apresentar outros requerimentos, sempre que esses forem apresentados antes do findo do prazo da concessão (26 de Outubro de 2013)
37. Os factos confirmados nos Acórdãos dos Tribunais Colectivos dos Tribunal de Segunda Instância e Tribunal de Última Instância, sob os n.ºs 434/2015 e 62/2017, respectivamente, bem como os factos comprováveis nos documentos anexados na p.i. apresentada, designadamente, o acto de não haver resposta pela parte da Administração e as opiniões não unânimes entre os serviços relacionados, são os motivos que causaram a declaração de caducidade do contrato de concessão do terreno em causa à recorrente, e são actos praticados unilateralmente pela Administração. A alteração da política do planeamento da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, pela parte da Administração, era o motivo principal que causou à recorrente a impossibilidade do aproveitamento do terreno em causas, antes do findo do prazo do contrato da concessão.
38. Para além disso, atendendo que o Governo de Macau ter divulgado ao público sobre o novo planeamento da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, durante o período da concessão provisória do terreno em apreço, assim, é justificável por que razão a recorrente não ter optado, imediatamente, a realização da finalidade industrial no terreno; depois, em 17 de Maio de 2011, no momento em que a recorrente pretendia construir uma construção com finalidade industrial, conforme o inicial contrato da concessão alterado e requerer a planta de alinhamento oficial, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes que através do Ofíc. n.º 00544/DPU/2011, comunicava à Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro (DSCC), salientando que por o seu Departamento de Planeamento Urbanístico por ter iniciado o trabalho de estudo do projecto de reformulação da zona industrial de Pac On, da Taipa, assim, antes de terminar e divulgar ao público o aludido plano do trabalho de estudo, o lote em causa não seja favorável para o desenvolvimento de acordo com as condições iniciais, a fim de evitar qualquer influência à realização do projecto de reformulação, bem como qualquer impedimento criado ao novo projecto após a reformulação. Pelo que o aludido serviço não emitiria a planta de alinhamento oficial do terreno em causa, só depois de o plano de projecto de reformulação da zona industrial de Pac On, da Taipa for terminado e divulgado ao público, assim, a dita sociedade pode requer-se a nova planta de alinhamento oficial do aludido lote, a fim de realizar a construção e o desenvolvimento do respectivo lote. Por esta razão, a DSCC da Administração se recusou o pedido de emissão da planta de alinhamento oficial à recorrente. Temos que saber, a planta de alinhamento oficial é um documento necessário e obrigatório na sua detenção para antes do desenvolvimento do terreno visado neste caso, e na altura em que a Administração recusou a emissão do respectivo documento, em 2011, fazendo com que a recorrente não existisse, objectivamente, condições para o desenvolvimento do terreno em causa.
39. É de salientar, segundo o n.º 3 do Relatório 095/DSODEP/2010, da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, isto é, o conteúdo sobre o critério de aplicação para a classificação dos autos de terrenos não aproveitados, donde a alínea 2) refere que as situações “devido a alteração das condições do planeamento urbanístico/não efectivação do novo planeamento urbanístico, fazendo com que não conseguisse cumprir o aproveitamento do terreno nos termos do contrato inicial”, são casos inimputáveis integralmente aos concessionários.
40. Dado que a não conclusão do aproveitamento do terreno concedido à recorrente, dentro do prazo fixado no contrato, foi causada pela demasiada demora de aprovação do novo planeamento da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, pelo que o atraso do aproveitamento do terreno em causa é inimputável integralmente à recorrente.
41. É de acrescentar, pelo menos desde após a Administração ter divulgado, publicamente, a pretensão da política do novo planeamento da finalidade da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, dado que o terreno em causa estava mesmo localizado na zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, pelo que a finalidade do terreno lavrada no contrato da concessão do terreno em causa já não seja adequada para a política do necessário desenvolvimento da Região Administrativa Especial de Macau, assim, a partir deste momento a recorrente era impossível dar conforme à finalidade estipulada no inicial contrato da concessão para o desenvolvimento do respectivo terreno, portanto, o facto de não aproveitamento de ora terreno ocorreu pelo menos a partir deste momento, pois, é inimputável integralmente à recorrente.
42. A Administração perante o requerimento apresentado pela recorrente, em 2008, não deu um planeamento certo, nem uma resposta em relação à zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, a Administração não cumpriu totalmente a sua responsabilidade e obrigação na qualidade de entidade concedente do contrato da concessão do terreno, além disso, devido a uma série de informações de desenvolvimento do terreno, emitida pela Administração, perturbou-se também a recorrente na decisão do cumprimento de contrato e trâmites dos requerimentos, aliás, não tendo ouvido e notificado à contraparte (recorrente) do contrato quanto à alteração facultativa unilateral do plano de desenvolvimento do aludido terreno, ao mesmo tempo, teve recusado por várias vezes os pedidos apresentados pela recorrente, sem qualquer justificação ou orientação detalhadas, causando à recorrente sem saber o que fazer, com perdas de dinheiro, tempo e oportunidade de desenvolvimento do terreno, deve a Administração assumir esta responsabilidade que não se pode subtrair.
43. A Administração devido as diversas questões incertas, causando o facto de não conseguir planear novamente a zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, o que não deve ser imputado à recorrente, acto este também não deve causar à recorrente o prejuízo desnecessário, designadamente, a declaração de caducidade da concessão provisória do terreno em causa.
44. É de salientar, caso a Administração, depois de divulgar o novo planeamento da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, conseguisse atempadamente, concluir já o plano de projecto e divulgá-lo ao público, a recorrente tem ainda tempo suficiente para concluir o aproveitamento do terreno concedido, antes do findo do prazo (isto é, 27 de Outubro de 2013) do aproveitamento da concessão do terreno.
45. Por outro lado, temos que saber, perante a demasiada demora na divulgação pública do plano de novo projecto da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, tendo a recorrente já com mais de dois anos atrás, antes do findo do prazo de aproveitamento do terreno concedido, ou seja, 17 de Julho de 2011, requerido à Administração o plano de estudo preliminar do desenvolvimento do terreno de acordo com a finalidade industrial inicial, mas, a Administração respondeu que o aludido lote não era favorável para o desenvolvimento de acordo com as condições iniciais, solicitando à recorrente que aguarde a nova divulgação pública sobre o novo projecto.
46. Se a Administração admitisse o estudo preliminar apresentado pela recorrente, em 17 de Julho de 2017 e que defira a mesma dar conforme a finalidade industrial inicial para o desenvolvimento do terreno concedido, assim, antes do findo do prazo de aproveitamento do terreno concedido, a recorrente teria um tempo não inferior a 2 anos para o desenvolvimento do respectivo terreno; segundo o cálculo efectuado pelo pessoal de elaboração do aludido estudo preliminar, um tempo de 2 anos seria suficiente para a recorrente construir uma construção referido no estudo preliminar.
47. Por outras palavras, a Administração na resolução do terreno visado neste caso deve junto da recorrente atingir um método de resolução justo e adequado, ao mesmo tempo, de acordo com o princípio geral do procedimento administrativo, arranjar um plano de resolução viável, e não declarar, directamente, a caducidade da concessão do terreno, sob a forma imprevista da recorrente.
48. Pelo que a recorrente não era a única culpada no atraso do aproveitamento do terreno em apreço, a Administração também tem a sua responsabilidade. Como acima analisado, devido às opiniões não unânimes da Administração e ao seu acto de demora, etc., por exemplo, demorou, demasiadamente, na decisão do projecto de reformulação da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, bem com a não emissão atempada da planta de alinhamento oficial, conforme a solicitada pela recorrente, fazendo com que a recorrente não conseguisse iniciar o aproveitamento do terreno em tempo oportuno, portanto, a Administração deve também ser como parte responsabilizadora.
49. Depois de a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes ter emitido o Ofíc. n.º 842/6038.05/DSODEP/2012, para o efeito de comunicação de audiência, o aludido serviço não admitiu o fundamento alegado pela recorrente na audiência escrita, acto este violou, claramente, o disposto no n.º 3, alínea 2) (isto é, no atraso do aproveitamento do terreno em causa é inimputável, integralmente, à recorrente) do Relatório 095/DSODEP/2010.
50. Não podemos deixar de salientar de novo, caso a Administração tivesse tratado, atempadamente, o pedido de alteração da finalidade do terreno, apresentado pela recorrente, em 2008 ou deferido o plano de estudo preliminar, apresentado pela recorrente, em 17 de Julho de 2011, cujo efeito é permitir a recorrente desenvolver o terreno em causa, a recorrente conseguiria concluir o aproveitamento do aludido terreno, antes do findo do prazo (ou seja, 27 de Outubro de 2013) da concessão do terreno de 25 anos.
51. De facto, depois do findo do prazo de aproveitamento do terreno em causa, não tendo a Administração avisado à recorrente de que após o findo do prazo de aproveitamento do aludido terreno, seria declarada a caducidade da concessão provisória do mesmo terreno, pelo contrário, tendo a Administração aceitado sempre os requerimentos da recorrente e realizado reuniões com a mesma; ademais, antes da nova Lei de terras (Lei n.º 10/2013) entrar em vigor, também não houve caso que tinha sido declarada a caducidade da concessão provisória do terreno, pelo que o acto da Administração, fazendo com que a recorrente produzisse uma expectativa legítima de que poderia continuar a ser autorizado o aproveitamento do terreno em causa.
52. A recorrente não entende por que razão a Administração por um lado, divulgava ao público sobre a política do novo planeamento da finalidade da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, ao mesmo tempo, também através dos ofícios comunicava à recorrente que por a demarcação da localização do terreno concedido estar em fase do novo planeamento, não sugere que seja desenvolvido o respectivo terreno de acordo com a finalidade da concessão inicial, por isso, é impossível emitir à recorrente a planta de alinhamento oficial do terreno em questão, por outro lado, numa situação imprevista da recorrente, notificou-a da decisão da pretensão de declaração de caducidade da concessão do terreno em causa, devido a não conclusão do aproveitamento dentro do prazo da concessão.
53. A Administração sempre perante os actos e requerimentos da recorrente, tem obrigação de fornecer à recorrente ou ao público uma orientação certa, é impossível solicitar à recorrente com uma aguarda eterna da divulgação pública e efectivação do novo planeamento da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, sucedendo a recorrente com perda de oportunidade de aproveitamento e desenvolvimento do terreno visado neste caso.
54. Desde 2006, a Administração através de uma série de acto administrativo de divulgação pública, fazendo com que a recorrente acreditasse e aparecesse uma expectativa legítima de que o seria alterada a finalidade do lote concedido para habitação e comércio, devido ao planeamento de alteração do respectivo lote pelo governo, por exemplo, os actos administrativos de a recorrente ter pagado o prémio, a Administração ter divulgado publicamente a política do novo planeamento da finalidade da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, a Administração ter manifestado sempre com atitude de nem sim, nem não ao requerimento de alteração da finalidade do terreno, apresentado pela recorrente, a decisão de Administração ter aceitado a alteração da finalidade do terreno da zona A da zona de aterro para resíduos de Pac On, da Taipa, a Administração ter recusado a emissão da planta de alinhamento oficial e não ter declarada a caducidade das concessões dos terrenos análogos ao terreno visado neste caso.
55. Não podemos deixar de salientar que na sequência do requerimento T-4084, isto é, o requerimento de alteração da finalidade do terreno em causa, apresentado pela recorrente à Administração, em 09 de Junho de 2008, a Administração até não concluiu o requerimento requerido pela recorrente e instaurado o procedimento administrativo de alteração do aproveitamento do terreno, ou seja, não deu conforme nos termos do artigo 121.º da Lei de terras, que o requerimento de alteração da finalidade do terreno em causa seja submetido ao Chefe do Executivo para a decisão.
56. Para além disso, pelo menos antes de 31 de Maio de 2011, a Administração nunca aplicou a sanção administrativa contra a recorrente, por a mesma não ter concluída o aproveitamento, dentro do prazo, do terreno concedido.
57. O acto de a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes não ter concretas justificações e orientações, por várias vezes, na sequência dos indeferimentos aos requerimentos, fazendo com que a recorrente sem soubesse o que fazer, com perdas de dinheiro, tempo e oportunidade de desenvolvimento do terreno.
58. A aludida série de actos praticados pela Administração, fazendo com que a recorrente criasse uma expectativa legítima em que a Administração constava com efeito de alteração da finalidade do terreno e continuação da concessão à recorrente para o desenvolvimento do terreno em causa, mas, a Administração sem aviso prévio praticou um acto administrativo, totalmente, contrário à sua maneira praticada habitualmente, isto é, declarar a caducidade da concessão provisória do terreno em apreço.
59. Na sequência de a Administração não respondeu perante a recorrente quanto ao conteúdo constante do seu requerimento sobre a situação do terreno em causa ou por não se conseguir determinar ainda os directrizes do planeamento do aludido terreno, causando a caducidade do prazo da concessão do contrato, tudo isso, foi criado por motivos inimputáveis à recorrente, a Administração deve assumir as consequências jurídicas desfavoráveis causadas por esses actos à recorrente.
60. Pelo exposto, a Administração, através duma série de acto administrativo enganou a recorrente, fazendo com que a mesma produzisse uma expectativa legítima quanto ao seu aproveitamento do terreno concedido, os respectivos actos administrativos violaram os princípios gerais em que a Administração devia cumprir, pelo que tais actos administrativos são ilícitos, a Região Administrativa Especial de Macau deve assumir a responsabilidade civil pelos danos causados à recorrente, por a Administração ter praticado uma série de actos ilícitos acima referidos.
61. Relativamente aos fundamentos do indeferimento do ponto 6 da recorrente, lavrados no acórdão recorrido indicava o mesmo acórdão que de acordo com o disposto do então Lei de terras, que a partir de 11 de Maio de 1996, a recorrente perdeu o direito de aproveitamento do terreno, originado do contrato da concessão. Todos os actos ilícitos praticados pela Administração que foram referidas na causa de pedir, não têm nada a ver com pedido da recorrente, porque esses actos foram ocorridos após o requerimento de 07 de Agosto de 2003, por isso, é impossível lesar os direitos anteriormente extinto.
62. É de reiterar, a caducidade da concessão provisória do terreno em causa, cujo fundamento foi baseado na Lei n.º 10/2013 e não a Lei n.º 6/80/M, seja como for, a recorrente não conseguiu concluir o aproveitamento do terreno em causa antes de 11 de Maio de 1996, mas, antes do findo do prazo da concessão provisória (isto é, 26 de Outubro de 2013) do aludido terreno, a recorrente era ainda concessionária deste terreno visado, porque antes do findo do prazo da concessão provisória do terreno em causa, ainda não tinha sido declarada a caducidade da concessão provisória de ora terreno, pelo que pode ainda a recorrente antes de 26 de Outubro de 2013, na qualidade de concessionária do terreno em apreço, requer à Administração a alteração e prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno.
63. Caso a Administração não tivesse declarado a caducidade do terreno com base no fundamento de findo do prazo de aproveitamento do terreno, em tempo oportuno, assim, o direito do aproveitamento do terreno da recorrente não seria extinto por mera razão de não ter aproveitado o terreno em causa, dentro do prazo para o devido efeito.
64. Pelo que existe nexo de causalidade directo entre todos os actos ilícitos da Administração referidas na causa de pedir e os pedidos da recorrente.
65. Pelo exposto, enferma parte do acórdão do vício de erros nas interpretação e aplicação do artigo 166.º da Lei n.º 6/80/M.
Contra-alegando veio a Ré e agora Recorrida RAEM apresentar as seguintes conclusões:
1. Tanto conforme a Lei n.º 6/80/M ou a Lei n.º 10/2013, ambos os contratos da concessão, são dirigidos pela Região Administrativa Especial de Macau quanto à sua finalidade da concessão do terreno, bem como o conteúdo concreto da construção que seja construída lá, o que caiba a concessionária assumir a obrigação do aproveitamento do terreno constante do contrato administrativo.
2. O contrato da concessão do terreno dispunha com dois tipos de prazos, um era o prazo de arrendamento, no máximo de 25 anos, onde a concessionária que na qualidade de arrendatária detinha o terreno concedido e pagando, periodicamente, à Região Administrativa Especial de Macau o foro, o outro era o prazo de aproveitamento, a concessionária tinha que aproveitar, obrigatoriamente, dentro do prazo de aproveitamento, as finalidade e obrigação de cumprimento do procedimento de aproveitamento do terreno, de acordo com o estipulado no contrato da concessão do terreno; a concessionária que não conseguiria ainda concluir a sua obrigação do aproveitamento, dentro dos inicial e renovado prazo de aproveitamento, deixa de ter o direito resultante do contrato da concessão do terreno, nos termos do artigo 1.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 51/83/M, ou seja, deixa de ter o direito de superfície estipulado por aludido contrato da concessão do terreno; salvo concedida a autorização do novo prazo de aproveitamento, senão, a concessionária só podia continuar com a detenção do terreno concedido por mera qualidade de arrendatária, no remanescente prazo de arrendamento.
3. O montante de indemnização pedido pela Recorrente era sem dúvida que deu conforme ao valor de lucro da construção por construir no aproveitamento do terreno, depois de ser revisto o inicial contrato da concessão do terreno, do Despacho n.º 43/SATOP/94; segundo os factos provados, mesmo que a Recorrente obtivesse a autorização da Administração para a prorrogação do seu aproveitamento até aos 11 de Maio de 1996, não tendo a Recorrente cumprido a obrigação do aproveitamento do terreno, isto é, depois da aludida data, a Recorrente jamais com o poder de construção de um prédio industrial de seis pisos consignado no aludido título de direito estipulado.
4. Como o apontado no acórdão recorrido, tendo a Administração baseado no motivo de não conclusão do aproveitamento do terreno em causa, imputável à Recorrente, foi declarada a caducidade do contrato da concessão do terreno, a dita decisão foi confirmada por tribunais superiores quanto à sua legalidade e validade, nos respectivos procedimentos processuais decorridos, isto é, por a Recorrente não ter cumprido a obrigação do aproveitamento do terreno (matéria contratual), ou entendível por não ter exercido o aludido direito do aproveitamento do terreno (matéria extracontratual), surgiu a inconformidade do dito direito consignado no título, a construção de um prédio industrial de seis pisos, pois, manifestando com uma culpa total causada pela própria Recorrente, pelo que todos os prejuízos nela causados sejam assumidos pela própria Recorrente.
5. Em consequente, dado que não houve uma nova disposição do prazo de aproveitamento, a Recorrente mantinha-se a mera qualidade de arrendatária na detenção do terreno em causa, no remanescente prazo de arrendamento, assim, a Administração com a sua actuação alegadamente ilícita e inadequada, queixada pela Recorrente na p.i, é notória nem sequer visava qualquer do seu direito já perdido de construção do aludido prédio industrial, e o mais claro é que não há qualquer nexo de causalidade com os prejuízos invocados.
6. Por outras palavras, conforme o descrito na p.i., a ilicitude e o nexo de causalidade dependentes para a sustentação de indemnização da responsabilidade civil extracontratual, invocada pela Recorrente, ambos não reúnem, obviamente, os requisitos, e é claro que não há necessidade de efectuar outras diligências de provas, ou seja, é, notoriamente, improcedente o pedido de acção apresentado pela Recorrente; assim, não havendo qualquer vício de violação de lei no despacho saneador da sentença do Tribunal a quo, que julgou improcedente da acção intentada pela Recorrente, nos termos do artigo 429.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, pelo que deve manter-se a decisão.
Foram colhidos os vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
a) Dos Factos
Na decisão recorrida foi dada por assente a seguinte factualidade:
- A Autora A, é uma sociedade comercial registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º 3013(SO), que se dedica ao negócio de fabrico e comercialização de pavimentos, revestimentos e outros produtos cerâmicos, bem como de fomento imobiliário (conforme o doc. 1 junto da petição inicial a fls. 55 a 66 dos autos).
- A Autora foi titular de uma concessão por arrendamento de um terreno, com a área de 7,000 m2, designado por lote “D”, situado na zona de Pac-On, na ilha da Taipa, destinado à instalação de uma fábrica de pavimentos e revestimentos cerâmicos de barro vermelho (conforme o doc. 2 junto da petição inicial a fls. 67 a 70 dos autos).
- A dita concessão por arrendamento foi autorizada, com dispensa de hasta pública, pelo Despacho n.º 88/SAOPH/88, publicado no Boletim Oficial de Macau, n.º 43, 2.º Suplemento, de 27/10/1988 (idem).
- Fixou-se, no referido contrato de concessão, a cláusula segunda – Prazo do arrendamento, com o seguinte teor:
“1. O arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da escritura pública do presente contrato.
2. O prazo do arrendamento, fixado no número anterior, poderá, nos termos da legislação aplicável e mediante condições a acordar, ser sucessivamente renovado até 19 de Dezembro de 2049.” (ibidem)
- E a cláusula terceira – Aproveitamento e finalidade do terreno, tem o seguinte teor:
“O terreno será aproveitado com a construção de um edifício térreo com mezanine, afectado à indústria de fabrico de pavimentos e revestimentos cerâmicos, a explorar directamente pelo segundo outorgante.” (ibid.)
- E além disso, a cláusula quinta – Prazo de aproveitamento, tem o seguinte teor:
“1. O aproveitamento do terreno deverá operar-se no prazo global de 18 meses, contados a partir da publicação no Boletim Oficial do despacho que autoriza o presente contrato.
2. Sem prejuízo do estipulado no número anterior, o segundo outorgante deverá, relativamente à apresentação dos projectos, observar os seguintes prazos:
a) 30 (trinta) dias, contados da data da publicação do despacho mencionado no número anterior, para a elaboração e apresentação do anteprojecto de obra (projecto de arquitectura);
b) 45 (quarenta e cinco) dias, contados da data da notificação da aprovação do anteprojecto de obra, para a apresentação e elaboração do projecto de obra (projecto de fundações, estruturas, águas, esgotos, electricidade e instalações especiais);
c) 45 (quarenta e cinco) dias, contados da data da notificação da aprovação do projecto da obra, para o início das obras.
3. Para efeitos do cumprimento dos prazos referidos no número anterior, os projectos só se considerarão efectivamente apresentados, quando completa e devidamente instruídos com todos os elementos.
4. Para efeitos da contagem do prazo referido no n.º 1 desta cláusula, entender-se-á que, para a apreciação de cada um dos projectos referidos no n.º 2, os Serviços competentes observarão um prazo de 60 (sessenta) dias.
5. Caso os Serviços competentes não se pronunciem no prazo fixado no número anterior, o segundo outorgante poderá dar início à obra projectada 30 (trinta) dias após comunicação por escrito à DSOPT, sujeitando, todavia, o projecto a tudo o que se encontra disposto no RGCU ou quaisquer outras disposições aplicáveis e ficando sujeito a todas as penalidades previstas naquele RGCU, com excepção da falta de licença. Todavia, a falta de resolução, relativamente ao anteprojecto de obra, não dispensa o segundo outorgante da apresentação do respectivo projecto de obra.” (ibid.)
- Por carta enviada ao então governador de Macau em 29/11/1989, a Autora requereu a construção do maior número de pisos com finalidade industrial destinados a serem comercializados (cfr. doc. n.º 1 junto da contestação de fls. 298 a 311 dos autos).
- Em 02/02/1991 a Autora formalizou o referido pedido para a alteração da volumetria do edifício de 1 piso para 6 pisos ao então Governador, pedindo a revisão da concessão do terreno (idem).
- Por despacho do então Secretário-adjunto para os Transportes e Obras Públicas n.º 43/SATOP/94, publicado no Boletim Oficial n.º 19, II Série, de 11/5/1994, foi deferido o pedido formulado pela Autora com a autorização da modificação do aproveitamento do contrato (cfr. doc. n.º 4 junto da petição inicial de fls. 73 a 75 dos autos).
- Como tal, a cláusula terceira - Aproveitamento e finalidade do terreno - do contrato passou a ter o seguinte teor:
“1. O terreno é aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 6 (seis) pisos, ficando o rés-do-chão afectado à indústria de fabrico de pavimentos e revestimentos cerâmicos, a explorar directamente pelo segundo outorgante.
2. O edifício, referido no número anterior, é afectado às seguintes finalidades de utilização:
Indústria (para uso próprio): parte do rés-do-chão, com a área de 6 334 m2;
Indústria (para venda): do 1.º ao 5.º piso, com área de 34 488 m2;
Estacionamento: parte do rés-do-chão, com a área de 542 m2.” (idem).
- Além disso, por força da revisão introduzida pelo referido Despacho,
“O prazo de aproveitamento de 18 (dezoito) meses, estabelecido na cláusula quinta do contrato de concessão, a que se refere o Despacho n.º 88/SAOPH/88, publicado no 2.º suplemento ao Boletim Oficial n.º 43/88, de 27 de Outubro, é prorrogado por mais 24 (vinte e quatro) meses, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial do despacho que titula a presente revisão.”, conforme se prevê no artigo terceiro do Despacho.
- A Autora apresentou em 11/05/1994, sob o registo n.º T-2576, um projecto de arquitectura, o qual não chegou a ser aprovado pela DSSOPT que, através do ofício n.º 4855/DURDEP/2003, de 02/09/1994, a informou de que deveria dar cumprimento às exigências ali mencionadas (cfr. o doc. 5 junto da petição inicial de fls. 76 a 111 dos autos).
- Em 19/10/1994, a Autora solicitou ao director da DSSOPT a autorização do pagamento do prémio em várias prestações, devido à sua situação temporária de falta de liquidez pela recessão económica verificada em Macau (cfr. doc. n.º 6 junto da petição inicial de fls. 113 a 114 dos autos).
- Não tendo ainda verificado o início do aproveitamento do terreno, o director da DSSOPT solicitou informações à Autora através do ofício n.º 181/6038.2/SOLDEP/96 de 15/03/1996 (cfr. doc. n.º 3 junto da contestação de fls. 317 dos autos).
- Em resposta do ofício n.º 181/6038.2/SOLDEP/96, a Autora informou que o atraso do projecto deve-se às dificuldades existentes no domínio da actividade imobiliária (cfr. doc. 8 junto da petição inicial de fls. 116).
- Em 7/8/2003, por requerimento registado com a entrada n.º T-3092, a Autora requereu ao director da DSSOPT a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno por mais 24 meses, devido aos prejuízos provocados pela grave crise do mercado imobiliário (cfr. doc. n.º 9 junto da petição inicial de fls. 119 a 120v e 131 dos autos).
- Em 9/6/2008, por requerimento registado com a entrada n.º T-4084, a Autora requereu ao director da DSSOPT a alteração da finalidade do terreno, com um pedido de aprovação do estudo prévio de arquitectura da obra para construção de um edifício com 59 pisos (cfr. doc. n.º 16 junto da petição inicial de fls. 121 e 130 e verso dos autos).
- Por decisão de concordância do director da DSSOPT datada de 29/07/2008, sobre a informação n.º 343/DPU/2008 de 28/07/2008, foi considerado que o estudo prévio apresentado pela Autora não era passível de aprovação por não satisfazer as condições estabelecidas pelo Despacho n.º 43/SATOP/94 nem os requisitos estabelecidos na Planta de Alinhamento Oficial (PAO) emitida em 2006 (cfr. doc. n.º 18 junto da petição inicial de fls. 135 e verso dos autos).
- Por ofício n.º 393/6038.04/DSODEP/2011 datado de 31/05/2011, a DSSOPT solicitou à Autora para apresentar toda a informação a fim de esclarecer a situação de incumprimento quanto à finalidade e aproveitamento do terreno, sob pena de ser desencadeado o processo de declaração de caducidade ou de rescisão do contrato de concessão do terreno caso não haver resposta ou as justificações do não cumprimento do contrato não forem aceites. (cfr. doc. n.º 24 junto da petição inicial de fls. 146 a 147 dos autos).
- Por Despacho do Chefe do Executivo, de 30/3/2015, tornado público pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 34/2015, publicado no Suplemento do Boletim Oficial n.º 14, II Série, de 8/4/2015, foi declarada a caducidade da concessão do terreno, com o seguinte teor:
“Considerando que a sociedade «A», com sede em Macau, na XXX, r/c, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º 3 013 (SO) a folhas 144 do livro C8, é titular do direito resultante da concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 7 000m2, situado na ilha da Taipa, no aterro de Pac-On, lote «D», descrito na Conservatória do Registo Predial, adiante designada por CRP, sob o n.º 22 139 a folhas 118 do livro B111A, destinado à construção de um edifício industrial, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 6 pisos, ficando uma parte do rés-do-chão afectada à indústria de fabrico de pavimentos e revestimentos cerâmicos, a explorar directamente pela concessionária.
Considerando que a sobredita concessionária não cumpriu com a obrigação de realizar o aproveitamento do terreno no prazo estipulado no artigo terceiro do contrato de concessão, titulado pelo Despacho n.º 88/SAOPH/88, publicado no 2.º Suplemento do Boletim Oficial de Macau n.º 43, de 27 de Outubro de 1988, revisto pelo contrato titulado pelo Despacho n.º 43/SATOP/94, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 19, II Série, de 11 de Maio de 1994.
Considerando que as razões justificativas expostas pela concessionária na resposta à audiência escrita não lograram alterar o sentido da decisão de declarar a caducidade da concessão por falta de realização do aproveitamento do terreno nas condições contratualmente definidas imputável à concessionária, estando portanto preenchidos os pressupostos previstos na alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º, por força do artigo 215.º, ambos da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras).
Considerando que o prazo de arrendamento da concessão de 25 anos terminou em 26 de Outubro de 2013 e a concessão era ainda nessa data provisória pelo que não pode a mesma ser renovada porque não preenche os requisitos essenciais referidos no n.º 1 do artigo 49.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras).
Assim,
Usando da faculdade conferida pelo artigo 64.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau e nos termos do artigo 167.º e do artigo 215.º, ambos da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), o Secretário para os Transportes e Obras Públicas manda:
1. Tornar público que por despacho do Chefe do Executivo, de 30 de Março de 2015, exarado sobre o seu parecer de 17 de Março de 2015, que concordou com o proposto no processo n.º 53/2013 da Comissão de Terras, pelas razões nele indicadas, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 7 000 m2, situado na ilha da Taipa, no aterro de Pac On, lote «D», descrito na CRP sob o n.º 22 139 a folhas 118 do livro B111A, ao abrigo da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras).
2. Em consequência da caducidade referida no número anterior, as benfeitorias por qualquer forma incorporadas no terreno revertem, livres de quaisquer ónus ou encargos, para a Região Administrativa Especial de Macau, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária, destinando-se o terreno a integrar o domínio privado do Estado.
3. Do acto de declaração de caducidade cabe recurso contencioso para o Tribunal de Segunda Instância, no prazo de 30 dias, contado a partir da publicação do presente despacho, nos termos da subalínea (1) da alínea 8) do artigo 36.º da Lei n.º 9/1999, republicada integralmente pelo Despacho do Chefe do Executivo n.º 265/2004, e da alínea a) do n.º 2 do artigo 25.º e da alínea b) do n.º 2 do artigo 26.º, ambos do Código do Processo Administrativo Contencioso, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 110/99/M, de 13 de Dezembro.
4. A concessionária pode ainda reclamar para o autor do acto, Chefe do Executivo, no prazo de 15 dias, nos termos do n.º 1 do artigo 148.º e do artigo 149.º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M, de 11 de Outubro.
5. O processo da Comissão de Terras pode ser consultado pelos representantes da concessionária na Divisão de Apoio Técnico da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, sita em Macau, na Estrada de D. Maria II, n.º 33, 16.º andar, durante as horas de expediente, podendo ser requeridas certidão, reprodução ou declaração autenticada dos respectivos documentos, mediante o pagamento das importâncias que forem devidas, nos termos do artigo 64.º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M, de 11 de Outubro.
6. O presente despacho entra imediatamente em vigor.
31 de Março de 2015.
O Secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo Arrais do Rosário.”
(conforme o doc. 33 junto da petição inicial a fls. 165 a 166 dos autos).
- Dessa decisão recorreu a Autora para o Tribunal de Segunda Instância, que veio a julgar improcedente o recurso interposto, por Acórdão n.º 434/2015, de 25/5/2017 (cfr. doc. n.º 4 junto da contestação de fls. 318 a 428 dos autos).
- Seguidamente, por Acórdão do Tribunal de Última Instância n.º 62/2017, de 31/1/2019 foi negado provimento ao recurso interposto do referido Acórdão do TSI (cfr. doc. n.º 5 junto da contestação de fls. 432 a 562v dos autos).
- Em 25/1/2022, a Autora intentou a presente acção no Tribunal Administrativo.
b) Do Direito
É do seguinte teor a decisão recorrida:
«A presente acção indemnizatória encontra-se estruturada com base no instituto da responsabilidade extracontratual da entidade pública (RAEM e as demais pessoas colectivas públicas) pelo facto ilícito emergente no domínio dos actos de gestão pública, conforme regulado pelo DL n.º 28/91/M, de 22 de Abril.
Segundo o que se alegou na petição inicial, o direito de indemnização que invocou à luz do seu enquadramento jurídico, decorreu da lesão do seu direito de aproveitar o terreno concedido, em consequência do conjunto de actuações ou omissões por parte da Administração - especialmente com a demora ou a falta da resposta aos pedidos sucessivamente formulados sobre alteração da finalidade de concessão, e com a alteração do plano urbanístico global para a zona de Pac On - que tinham tornado impossível a conclusão do aproveitamento dentro do prazo para tal definido e que redundavam na declaração da caducidade da concessão assim como na perda de todos os direitos que dela emergem. Concluiu formulando, com base nesta causa de pedir exposta, o pedido de ressarcimento que abrange o montante de lucros cessantes no valor de MOP 329,830,000.00 que se esperava com a conclusão do aproveitamento do terreno nos termos previstos no contrato e a consequente comercialização do edifício nele construído (conforme se salienta nos artigos 231.º a 237.º da petição inicial).
Salvo melhor opinião, entendemos que pela matéria de facto alegada e assente com base nos elementos apurados, a Autora não tem direito à indemnização nos termos invocados na petição inicial.
Vejamos em que assenta este entendimento.
Desde logo, não parece ser possível contornar, para sustentar a pretensão indemnizatória formulada, a existência de um acto administrativo praticado mediante o Despacho do Chefe do Executivo proferido em 30/3/2015, em que foi declarada a caducidade da concessão, por falta do cumprimento da obrigação de aproveitar o terreno no prazo definido no contrato de concessão, inicialmente titulado pelo Despacho n.º 88/SAOPH/88, revisto pelo contrato titulado pelo Despacho n.º 43/SATOP/94, ao abrigo da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), sendo que a falta da realização de aproveitamento do terreno era imputável à concessionária, segundo definido nesse acto.
De mesma forma, nem seria possível ignorar que da referida decisão do Chefe do Executivo se interpôs o recurso contencioso que foi julgado improcedente com a manutenção do acto recorrido, conforme resulta do teor dos acórdãos do Tribunal de Segunda Instância n.º 434/2015, de 25/5/2017, e do Tribunal de Última Instância n.º 62/2017, de 31/1/2019.
Com isto quer dizer que a definição da situação jurídica externa, introduzida pelo acto administrativo caraterizado como uma estatuição autoritária da Administração segundo a noção dada pelo artigo 110.º do CPA se torna jamais discutível na ordem jurídica (A propósito da concepção do acto administrativo, veja-se Mário Aroso de Almeida, Teoria Geral do Direito Administrativo, O Novo Regime do Código do Procedimento Administrativo, e além disso, o Acórdão do Tribunal de Última Instância n.º 28/2022, de 29/3/2023).
Mais especificando, teremos de aceitar nesta conformidade que a extinção do contrato com declaração da caducidade da concessão se encontra fundada, de modo irreversível, na verificação do pressuposto do incumprimento culposo por parte do concessionário do dever de aproveitar o terreno no prazo fixado para o efeito – isto é, no prazo de 18 meses, inicialmente estabelecido no contrato de concessão titulado pelo Despacho n.º 88/SAOPH/88, posteriormente prorrogado por mais 24 meses, contados a partir de 11/5/1994, data de publicação no Boletim Oficial do despacho n.º 43/SATOP/94 que titulava a revisão da concessão, o que tinha terminado em 11/5/1996.
Nesta medida, uma vez que a Autora não logrou obter a anulação do referido acto praticado, a hipótese de ressarcimento do lucro cessante nunca se colocaria. A referida ressarcibilidade depende, em nosso entender, apenas da demonstração de que sem a actuação administrativa ilícita ela teria, no plano hipotético, o direito de construir com a conclusão do aproveitamento do terreno no prazo de concessão, à luz da directriz plasmada no artigo 556.º do Código Civil de Macau. Contudo, como é evidente, tal demonstração não podia ser feita no caso dos autos.
Recapitulando, segundo os termos definidos no acto administrativo, ocorreu o incumprimento da obrigação do concessionário de aproveitar o terreno concedido no prazo fixado até à data de 11/5/1996, evento esse obrigou a Administração a declarar a caducidade da concessão provisória, na vigência da Lei n.º 10/2013, ao abrigo da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º, devido a “Não conclusão do aproveitamento ou reaproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais”, norma que se aplica às concessões provisórias anteriores à entrada em vigor dessa Lei, por força do artigo 215.º, alínea 3), quando “tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário”.
Assim, face à existência desse acto administrativo que não tenha sido removido por via contenciosa da ordem jurídica, seria difícil concluir que se não houvesse toda a outra apontada actuação administrativa que se reputa ilícita e consubstanciada como causa de pedir (como sucede com a alegada demora ou a falta da resposta aos pedidos sucessivamente formulados sobre alteração da finalidade de concessão, e a permanente indecisão sobre a alteração do plano urbanístico global para a zona de Pac On), a Autora teria auferido os proveitos esperados com a conclusão do aproveitamento nos termos previstos no contrato de concessão, sendo certo que a única actuação que defina a situação jurídica do interessada enquanto concessionária foi aquela decisão tomada e que por força dessa decisão, esta, no plano hipotético, nunca teria a possibilidade de aproveitar o terreno até concluir o aproveitamento.
Certo é que ao contrário do que ocorreu no caso dos autos, tal actuação ablativa por iniciativa da Administração da Ré podia ter lugar num momento mais cedo, ou seja logo após o fim do respectivo prazo sem que seja antes requerida a prorrogação deste – com base no disposto no artigo 166.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 da Lei antiga - Lei n.º 6/80/M de 5 de Julho, se se concluir pela falta do aproveitamento do terreno no prazo contratual, imputável à concessionária.
Neste ponto, temos por certo que a decisão administrativa, na falta da determinação do prazo para o efeito, deve ser tomada dentro do prazo razoável por modo a assegurar a respectiva celeridade, a economia e eficiência, segundo o previsto no artigo 12.º do Código do Procedimento Administrativo. Importa, porém, que a Administração apenas errou na escolha do momento da decisão, tal erro ainda que seja ostensivo, nunca gera a responsabilidade civil nos termos configurados pela Autora, por modo a conferir-lhe o direito de indemnização pela perda dos lucros cessantes peticionados.
Até aqui chegado, a pretensão indemnizatória da Autora não merece procedência.
Diríamos ainda que numa outra perspectiva, a Administração da Ré com a sua actuação alegadamente ilícita, nem sequer lesou qualquer direito subjectivo da Autora, nomeadamente, o seu direito de aproveitar o terreno concedido, uma vez que a partir de 11/5/1996, a Autora deixou de ser titular do direito subjectivo de aproveitar o terreno nos termos previstos no contrato.
O conteúdo do direito que resultava para o concessionário de concessão por arrendamento de terrenos encontra-se definido por força do artigo 1.º do DL n.º 51/83/M, de 26 de Dezembro, nos termos do qual “O direito resultante da concessão por arrendamento ou subarrendamento de terrenos urbanos ou de interesse urbano abrange poderes de construção ou transformação, para os fins e com os limites consignados no respectivo título constitutivo, entendendo-se que as construções efectuadas se mantêm na propriedade do concessionário ou subconcessionário até expirar o prazo do arrendamento ou subarrendamento ou enquanto este não for rescindido; expirado o prazo ou operada a rescisão aplica-se o regime de benfeitorias consignado na Lei de Terras.”. (sublinhado nosso)
Ainda por força da referida norma, o exercício do direito de constituir resultante da concessão estava vinculado ao fim e sujeito aos limites consignados no respectivo título constitutivo. Interessa para o caso dos autos o limite temporal consignado no contrato de concessão, isto é o prazo fixado para o aproveitamento do terreno concedido. Quanto a isto, não obstante da falta da disposição expressa na Lei antiga – Lei n.º 6/80/M para a situação específica de não conclusão do aproveitamento no prazo fixado, a norma do artigo 166.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 dessa Lei previu a hipótese de avançar com a declaração da caducidade da concessão, em virtude da falta da aproveitamento do terreno no prazo contratual, por razões imputáveis ao concessionário.
Daí, o concessionário que não tivesse concluído o aproveitamento no prazo fixado, e mesmo assim estava ainda interessado em prosseguir com a execução da concessão, deveria requerer a prorrogação do prazo ou a concessão de um novo prazo de aproveitamento antes da respectiva expiração, fincado o deferimento desse requerimento dependente da demonstração de que o incumprimento do prazo contratual por motivo que lhe não era imputável. Sem a emissão de um acto administrativo favorável de que depende a definição jurídica do concessionário, este nunca adquiria o direito de aproveitar o terreno para além do limite temporal inicialmente fixado no contrato.
Voltamos à situação que nos ocupa, por efeito da cláusula contratual inicialmente estabelecida e depois revista, a Autora ficou sujeita ao dever de efectivar o aproveitamento no prazo prorrogado de 24 meses até 11/5/1996, como já vimos. Sucede porém que no termo desse prazo, o aproveitamento não se mostrava sequer iniciado. E apesar da resposta ao ofício n.º 181/6038.2/SOLDEP/96, mediante a qual a Autora apenas informou que o atraso do projecto se deve às dificuldades existentes no domínio da actividade imobiliária e só em 7/8/2003, já 7 anos depois do fim daquele prazo, é que se lembrou de requerer ao director da DSSOPT a prorrogação do prazo de aproveitamento por mais 24 meses.
Não podem existir dúvidas, face ao quadro normativo da anterior Lei de Terras, de que a partir da data de 11/5/1996, a Autora deixava de ter na sua esfera jurídica o direito de aproveitamento do terreno que lhe resultava do contrato de concessão celebrado. Por sua vez, todos os factos ilícitos decorrentes da Administração da Ré que integram a causa de pedir, irrelevantes para sustentar a pretensão da Autora, porque apenas começaram a verificar-se posteriormente desde a data do requerimento de 7/8/2003, sendo portanto insusceptíveis de lesar o direito que se extinguiu antes.
Eis uma razão acrescida para que a acção seja julgada improcedente.
Nesses termos ditos, só resta decidir.».
Nada mais havendo a acrescentar aos fundamentos da decisão recorrida, para os quais remetemos e aderimos integralmente nos termos do nº 5 do artº 631º do CPC, os quais por sua vez já respondem a toda a argumentação usada nas alegações e conclusões de recurso, impõe-se negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, negando-se provimento ao recurso mantém-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Registe e Notifique.
RAEM, 20 de Fevereiro de 2025
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)
Seng Ioi Man
(1º Adjunto)
Fong Man Chong
(2º Adjunto)
735/2024 ADM 1