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 ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. Relatório
Inconformada com o acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância que negar provimento aos recursos (interlocutório e final) por si interpostos, recorreu A para o Tribunal de Última Instância, pedindo a revogação do acórdão.
Por acórdão proferido em 10 de Novembro de 2021, este Tribunal de Última Instância decidiu negar provimento ao recurso.
Vem agora A requerer a aclaração desse acórdão (fls. 899 a 903 dos autos).
Devidamente notificado, emitiu o recorrido B a pronúncia constante de fls. 906 e 908 dos autos, no sentido de ser julgado improcedente o pedido de aclaração.

2. Fundamentos
Chamando à colação o segmento contido no terceiro parágrafo da folha 42 do acórdão ora aclarando, alega a aclarante que «suscita-se carecido de aclaração, por absoluta e intransponível obscuridade e ambiguidade:
- com base em que efectivos e concretos fundamentos de facto e de direito claros e inequívocos se afirma e sustenta que “tudo leva a concluir” pela manutenção da relação de trabalho entre a recorrente ora aclarante e o recorrido.»
Ora, na fls. 42 do acórdão constata-se não só o segmento indicado pela aclarante mas também outros elementos que se mostram úteis para a compreensão da decisão, pelo que passamos a transcrever:
«Por outro lado, cremos que anda a recorrente em manifesto equívoco ao alegar que “nenhum dos factos alegados na petição inicial pelo recorrido reveste o cariz de verdadeira matéria de facto apta a gerar um juízo de valoração jus-laboral que, …, permitia concluir quanto à eventual existência de um vínculo de tipo laboral, com subordinação e hierarquia”.
Na realidade, constata-se na petição inicial que o Autor ora recorrido alegou vários factos respeitantes à celebração dos contratos de trabalho entre ele e a recorrente, em que foram convencionadas as condições laborais (artigos 2 a 8, 24 a 36), juntando os respectivos documentos comprovativos (doc. n.ºs 2, 3, 14 e 15).
Mesmo admitindo a natureza conclusiva ou de juízo de valor do primeiro facto alegado pelo Autor e também elencado na matéria de facto assente, designadamente por conter a expressão “o Autor esteve ao serviço da Ré, trabalhando sob as ordens, instruções e fiscalização daquela”, pelo que se deve ter como não escrito nos termos do n.º 4 do art.º 549.º do CPC, é de salientar a irrelevância, para a decisão da causa, da inclusão desse facto na matéria de facto, face aos restantes factos considerados provados, nomeadamente a celebração dos contratos de trabalho, as condições laborais, o pagamento das quantia pela recorrente ao recorrido a vários títulos, etc., tudo leva a concluir pela manutenção da relação de trabalho entre ambos durante o período de 1 de Agosto de 2007 a 22 de Abril de 2020.»
É este último parágrafo o segmento indicado pela aclarante no seu pedido.
Na óptica da aclarante, a designação gráfica de “contrato de trabalho” aposta num determinado documento contratual não permite, por si só e sem mais, a subsunção no tipo contratual laboral.
Por outro lado, chama-se à colação a figura de contrato de prestação de serviços.
Ora, salvo o devido respeito, não se nos afigura que assiste razão à aclarante.
Com se sabe, nos termos do al. a) do art.º 572.º do CPC, aplicável por força do art.º 652.º, ambos do Código de Processo Civil, “pode qualquer das partes requerer no tribunal que proferiu a sentença o esclarecimento de algum obscuridade ou ambiguidade que ela contenha”.
É evidente que a apresentação de esclarecimento ou aclaração visa suprir obscuridade ou ambiguidade eventualmente verificada na sentença.
Daí que o pedido de esclarecimento da sentença se destina apenas a aclarar a obscuridade ou ambiguidade do conteúdo do texto da sentença, de modo a permitir conhecer o seu real sentido.
Qualquer objectivo estranho à referida finalidade não pode ser alcançado com este pedido, não podendo o pedido de esclarecimento ou aclaração ser utilizado para o tribunal pronunciar-se sobre a consequência da sua decisão ou a sua repercussão no plano jurídico1, ou ainda para outros fins.
É de salientar desde logo que, com a invocação de “contrato de prestação de serviços”, a aclarante veio a apresentar “novos” argumentos que nunca tinha alegado antes, sendo certo que não foi submetida à discussão e à apreciação do tribunal a questão respeitante à qualificação jurídica da relação existente entre as partes.
Na realidade, tal como decorre claramente do consignado acima transcrito do acórdão aclarante, tendo o Autor alegado na petição inicial os factos respeitantes à celebração dos contratos de trabalho entre ele e a recorrente ora aclarante bem como juntado os respectivos documentos comprovativos, e face aos restantes factos considerados provados nos autos, nomeadamente a celebração dos contratos de trabalho, as condições laborais, o pagamento das quantia pela recorrente ora aclarante ao Autor recorrido a vários títulos, etc., este TUI conclui pela manutenção da relação de trabalho entre ambos, mesmo desconsiderando o facto (irrelevante) alegado pelo Autor e também elencado na matéria de facto assente, que contém a expressão “o Autor esteve ao serviço da Ré, trabalhando sob as ordens, instruções e fiscalização daquela”.
Afigura-se-nos muito claro o sentido do acórdão, não havendo qualquer obscuridade ou ambiguidade alegada pela aclarante que careça da aclaração por si requerida.
O que se evidencia no pedido de aclaração é a discordância da aclarante da qualificação jurídica operada pelo tribunal sobre a relação existente entre ela e o Autor recorrido, o que fica fora do âmbito da presente aclaração.
Não estando em causa qualquer falta de clareza do acórdão, é de indeferir o pedido de aclaração.

3. Decisão
Face ao exposto, acordam em indeferir o pedido de aclaração.
Custas pela aclarante, com a taxa de justiça que se fixa em 7 UC.

10 de Dezembro de 2021
                Juízes: Song Man Lei (Relatora)
José Maria Dias Azedo
Sam Hou Fai

1 Cfr. Ac. do TUI, de 9 de Julho de 2010, Proc. n.º 15/2010.
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Processo n.º 132/2021-I