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Processo nº 90/2024
(Autos de recurso jurisdicional)
   





ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A (甲), com os restantes sinais dos autos, recorreu contenciosamente para o Tribunal de Segunda Instância do despacho do CHEFE DO EXECUTIVO de 31.12.2022 que lhe indeferiu o pedido de autorização de residência temporária na R.A.E.M.; (cfr., fls. 2 a 10 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Oportunamente, por Acórdão de 11.04.2024, (Proc. n.° 152/2023), foi o recurso julgado procedente, anulando-se o acto administrativo recorrido; (cfr., fls. 53 a 64-v).

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Em tempo, a entidade administrativa recorreu do assim decidido, motivando para, a final, e em conclusões, dizer o que segue:

“I. É natural e inevitável que os pressupostos de facto de um acto administrativo não correspondam exactamente à realidade factual tal como ela se configura no preciso momento da decisão;
II. Os pressupostos de facto de qualquer acto administrativo são aqueles que correspondem à prova que consta no processo (quod non est in actis non est in mundo);
III. No processo instrutor do requerimento de A, que foi enviado ao CE para decisão em 15.01.2021, não constavam, nem podiam constar, documentos que ela veio a apresentar mais tarde para provar factos supervenientes (maxime o seu doutoramento);
IV. O requerimento de A foi decidido pelo CE de acordo com aquilo que foi provado durante a instrução do respectivo procedimento;
V. O RA 3/2005 atribui a diferentes entidades (rectius pessoas colectivas) a competência para a instrução dos procedimentos e a competência para a respectiva decisão;
VI. Finda a instrução do processo e enviado este ao CE para decisão, esgota-se a competência instrutória do IPIM;
VII. Portanto, uma vez enviado o processo ao CE, o IPIM não pode determinar a re-abertura do procedimento de cada vez que o interessado venha apresentar um novo documento;
VIII. Na instrução de um procedimento administrativo não podem ser considerados, logicamente, factos que ainda não tenham ocorrido;
IX. Os pressupostos de facto do acto administrativo são formalmente fixados no momento do encerramento da instrução;
X. A apresentação de documentos ao IPIM após o envio do processo ao CE não é susceptível de produzir erro nos pressupostos de facto da decisão daquele órgão”; (cfr., fls. 73 a 79).

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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer opinando no sentido da improcedência do recurso.

Tem este Parecer o teor seguinte:

“No recurso jurisdicional em apreciação, o Exmo. Senhor Chefe do Executivo requereu a revogação do Acórdão pelo qual o douto TSI julgou procedente o recurso contencioso, alegando conclusivamente que a apresentação do documento ao IPIM após o envio do processo ao Chefe do Executivo não é susceptível de produzir erro nos pressupostos de facto da decisão anulada pelo supramencionado Acórdão.
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Antes de mais, merece ênfase que a recorrente contenciosa apresentou em 08/08/2017 o pedido da autorização de residência temporária (cfr. doc. de fls.57 a 63 do P.A.), por isso, esse pedido fica regido pelo Regulamento Administrativo n.º3/2005 na sua redacção original.
Note-se que a alínea 3) do art.7.º deste Regulamento elenca a “área profissional dos quadros dirigentes e técnicos especializados” como um dos aspectos relevantes para se apreciar os pedidos de residência temporária. Por sua vez, a alínea 3) do n.º1 do seu art.9.º exige aos interessados a apresentação da prova de formação académica, qualificação e experiência profissional do técnico especializado ou quadro dirigente.
Nestes termos, mantemos a nossa modesta opinião, no sentido de que a obtenção do doutoramento em linguística-português pela recorrente contenciosa em 05/05/2021 é relevante para os efeitos pretendidos por ela e merece consideração e valoração pelo órgão competente.
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No caso sub judice, é sem margem para dúvida de que a recorrente contenciosa apresentou o documento comprovativo do doutoramento ao IPIM em 11/05/2021 que fica cronologicamente posterior a 13/01/2021 data em que o IPIM concluiu a Proposta n.º0210/2017.
Com base no sobredito facto, o Exmo. Senhor Chefe do Executivo formulou, além de outras, as seguintes conclusões: VI. Finda a instrução do processo e enviado este ao CE para decisão, esgota-se a competência instrutória do IPIM; VII. Portanto, uma vez enviado o processo ao CE, o IPIM não pode determinar a reabertura do procedimento de cada vez que o interessado venha apresentar um novo documento; …… IX. Os pressupostos de facto do acto administrativo são formalmente fixados no momento do encerramento da instrução.
Com todo o respeito pelo melhor entendimento em sentido diferente, não podemos acompanhar a posição supra aludida, afigurando-se-nos que o IPIM podia e devia submeter o supramencionado doutoramento à consideração superior do Exmo. Senhor Chefe do Executivo.
Note-se que as formalidades da fase de instrução do procedimento administrativo tem a função de dar a conhecer, tão exactamente quanto possível, os diversos factos (e normas) e interesses de que a decisão depende ou com que ela mexe e de permitir a sua ponderação relativa, pelo que a instrução nos procedimentos administrativos se rege pelo princípio da verdade real (Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim: Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª edição, p.413, sublinha nossa).
E importa realçar que sendo uma fase de procedimento administrativo, a instrução compreende toda uma série de actos e diligências destinados a apurar o quadro fáctico real, em função do qual há-de vir a ser proferida a decisão final, e com uma recolha o mais exaustiva possível, o órgão competente ficará na posse de todos os elementos úteis e necessários à valoração dos interesses que no procedimento se cruzam e, por consequente, melhor habilitado a mais acertada decisão (Lino Ribeiro, José Cândido do Pinho: Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado, p.458).
Em esteira dessas prudentes doutrinas, somos levados a inferir que desviam a ratio subjacente da instrução as três conclusões atrás transcritas, sobretudo, a conclusão IX, dado que a qual conota que a instrução do IPIM pode previamente delimitar e até determinar a decisão a tomar por Chefe do Executivo, por isso, incorre no excesso. Do seu lado, a conclusão VII implica que se confunde, intencionalmente ou não, a reabertura do procedimento com a informação complementar.
Para além do que ficou exposto acima, convém apontar que o alegante do presente recurso jurisdicional não indicar nenhum preceito legal para abonar as supramencionadas três conclusões e, por outra banda, não se divisa que o Regulamento Administrativo n.º3/2005 estabeleça prazo peremptório para os requerentes da autorização de residência, no sentido de que eles, fora deste prazo, não podem apresentar documentos mirados a instruir ao correspondente requerimento da autorização de residência.
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Por todo o expendido acima, propendemos pelo não provimento do presente recurso jurisdicional”; (cfr., fls. 89 a 90-v).

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Nada parecendo obstar, passa-se a conhecer do recurso.

Fundamentação

Dos factos

2. Pelo Tribunal de Segunda Instância vem indicada como “provada” a seguinte matéria de facto:

“A recorrente apresentou o pedido de autorização de residência temporária junto do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), em 8 de Agosto de 2017, com o fundamento de ter o estatuto de técnico especializado.
Em 17 de Janeiro de 2018, o IPIM escreveu à recorrente convidando-a para uma audiência escrita.
Os funcionários do IPIM elaboraram, em 13 de Janeiro de 2021, a Proposta n.º 0210/2017, cujo teor se transcreve a seguir (para mais pormenores, consultar fls. 51 a 54 do Processo Administrativo):
“I. Fundamento do pedido Regulamento Administrativo n.º 3/2005”
1. Data do pedido 08/08/2017
Categoria do pedido de ART Técnico especializado
2. É a seguinte a identificação da interessada
N.º
Nome
Relação
Documento
Doc. N.º
Validade até
1
A
(甲)
Requerente
Passaporte chinês
XXXXX
23/12/2030



Bilhete de identidade de estrangeiro da Gâmbia
XXXXX
N/A



Título de identificação de trabalhador não residente
XXXXX
15/08/2018
Em 5 de Janeiro de 2021, a requerente apresentou o seu novo passaporte chinês (n.º XXXXX) em substituição do seu anterior passaporte como base do pedido (vide fls. 107 a 109).
II. Documentos comprovativos da relação de emprego, ou seja, de que se encontra contratada por empregador local (vide documentos de fls. 69)
Entidade empregadora: [Universidade(1)]
Cargo: Assistente convidada - Centro Pedagógico e Científico da Língua Portuguesa
Salário base mensal: XXX patacas
Prazo da contratação: Começou a exercer o cargo em 15 de Dezembro de 2016, com contrato válido até 15 de Agosto de 2018.
III. Pareceres emitidos por entidades competentes para a supervisão ou creditação no domínio profissional em causa
(1) Por Despacho n.º 120-I/GM/97, o CPSP declarou que os documentos de identificação acima referidos, apresentados pela interessada, satisfazem os requisitos de residência desta Região (vide documentos de fls. 81 a 84).
(2) De acordo com o parecer da Direcção dos Serviços do Ensino Superior, a requerente satisfaz as qualificações previstas na Lei n.º 10/2017 (Regime do ensino superior) relativas ao pessoal docente do ensino superior (vide documentos de fls. 86 a 87).
IV. Ramo de actividade - Profissão e cargo (vide documentos de fls. 69)
A requerente encontra-se contratada por uma instituição de ensino superior para exercer trabalho educativo. O sector de actividade e a profissão em causa não estão incluídos na lista anual dos sectores industriais para a introdução prioritária de talentos qualificados, mas pertencem ao sector dos serviços sociais públicos.
V. Qualificações/licenças profissionais
A requerente não apresentou documentos comprovativos de que possui as qualificações profissionais pertinentes nem licenças de trabalho relacionadas com o seu cargo actual.
VI. Experiência profissional (vide documentos de fls. 43-47, 69 e 86-87)
A requerente apresentou documentos comprovativos da sua experiência profissional como assistente e tutora durante os seus estudos de mestrado e doutoramento. No entanto, tendo em conta que se trata de trabalhos informais e a tempo parcial, apenas podem servir de referência. De acordo com os documentos apresentados pela requerente para comprovar o seu emprego actual, apenas tem menos de um ano de experiência de trabalho no ensino e investigação da língua portuguesa até 7 de Agosto de 2017; segundo os dados da Direcção dos Serviços do Ensino Superior, no ano lectivo de 2018/2019, havia 131 docentes a leccionar cursos relacionados com a “língua portuguesa” nas instituições de ensino superior de Macau, dos quais 101 eram docentes a tempo inteiro e 30 eram docentes a tempo parcial. Isto mostra que Macau acumulou uma certa quantidade de recursos humanos e não há falta de candidatos a empregos da mesma natureza que o da requerente.
VII. Habilitações académicas (vide documentos de fls. 21 e 26 a 31)
A requerente é titular do grau de licenciado em Literatura Portuguesa e do grau de mestre em Língua e Cultura Portuguesa - Linguística Aplicada e Literatura. Após verificação dos documentos pertinentes, os referidos diplomas foram atribuídos por instituições de ensino superior reconhecidas pelos Governos da República Popular da China e da RAEM, respectivamente, e essas áreas de especialização relacionam-se com o seu cargo actual. De acordo com a informação online sobre candidatos a emprego disponível no sítio electrónico do Departamento de Emprego da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, há 3 candidatos a emprego com habilitações académicas relacionadas com o emprego actual da requerente; segundo a informação do Gabinete de Apoio ao Ensino Superior (actualmente Direcção dos Serviços do Ensino Superior), há 363 licenciados em língua e literatura no ano lectivo de 2015/2016. Macau acumulou uma certa quantidade de recursos humanos e não há falta de candidatos a emprego e diplomados com habilitações académicas semelhantes às da requerente.
VIII. Situação actual de emprego (vide documentos de fls. 69)
A requerente está empregada no [Universidade(1)] como “Assistente convidada – Centro Pedagógico e Científico da Língua Portuguesa”. De acordo com os documentos apresentados pela requerente, compete-lhe fazer trabalhos pedagógicos, realizar investigação académica no âmbito das funções do Instituto, participar nos trabalhos de administração do Instituto e prestar serviços à comunidade; e, sob a orientação de um professor, executar, desenvolver e realizar actividades e programas de investigação de natureza pedagógica, bem como prestar auxílio na formação de docentes estagiários e na investigação de metodologias pedagógicas e de competências de apoio. Trata-se de um trabalho a nível profissional e técnico auxiliar, sem funções de gestão e orientação. O vencimento base é de XXX patacas. De acordo com as estatísticas da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos relativas ao 3.º trimestre de 2020, o salário mediano dos profissionais não residentes no sector da educação era de 40.000,00 patacas, sendo o salário de base da requerente superior (sic) ao nível mediano do sector.
IX. Outros factores a ter em conta (vide documento de fls. 59 e 60)
A requerente tem 30 anos de idade e apresentou o “Certificado de Nível Intermédio (B2) e B2+) (sic)” emitido pela Universidade de Coimbra, comprovativo de que domina ou utiliza outra língua oficial de Macau para além da sua língua materna. No entanto, não apresentou nenhum documento comprovativo de que foi reconhecida como quadro altamente qualificado noutra região ou país.
X. Realizações pessoais e necessidades em Macau (vide documentos de fls. 62 a 68)
A requerente dedica-se ao ensino da língua portuguesa. Os cursos e formações na área em causa são ministrados por instituições de ensino superior de Macau ou no mercado local. Embora a requerente tenha apresentado documentos comprovativos da sua participação em vários seminários relacionados com a língua portuguesa e da publicação de artigos, não apresentou os resultados de investigação académica pertinentes para que o IPIM pudesse analisar a sua capacidade de investigação científica. Além disso, os documentos apresentados pela requerente não provam que tenha recebido prémios relacionados com o seu emprego actual, que tenha sido entrevistada, que tenha obtido patentes para a sua investigação ou que possua as competências necessárias para exercer uma profissão num sector de introdução prioritária.
XI. Procedimento de audiência
Dado que as condições da requerente não eram suficientes para demonstrar que é uma pessoa de particular interesse para Macau, o que prejudicava o seu pedido de autorização de residência temporária, foi efectuada uma audiência escrita (vide documentos de fls. 94 a 96). A requerente apresentou uma resposta escrita (vide documentos de fls. 97 a 104), cujos pontos principais são os seguintes:
(1) Segundo a requerente, é actualmente assistente convidada do Centro Pedagógico e Científico da Língua Portuguesa da [Universidade(1)], e doutoranda no Departamento de Língua Portuguesa da Faculdade de Letras da [Universidade(2)].
(2) Segundo a requerente, embora o número de licenciados em língua portuguesa tenha vindo a aumentar nos últimos anos, a oferta continua a ser inferior à procura, o que demonstra que a escassez de talentos bilingues chineses e portugueses dificilmente poderá ser atenuada a curto prazo, e que Macau precisa ainda de acelerar a formação de profissionais relevantes para satisfazer a procura do mercado.
(3) A requerente afirma que, desde o seu ingresso na [Universidade(1)], colabora na formação de professores de língua portuguesa de Macau e do Interior da China e na publicação de livros académicos no âmbito da pedagogia da língua portuguesa, e é responsável por traduções e interpretações chinês-português, também viajou a Portugal em nome do Instituto para participar em conferências académicas.
(4) A requerente pede ao IPIM o deferimento do seu pedido de autorização de residência temporária, apresentando o parecer do Reitor da [Universidade(1)], a carta de confirmação da candidatura a doutoramento da [Universidade(2)] e o seu curriculum vitae actualizado.
As supramencionadas respostas da requerente são analisadas do seguinte modo:
(1) Tendo em conta que o pressuposto da autorização de residência temporária exigido no Regulamento Administrativo n.º 3/2005 é que o requerente deve apresentar-se de particular interesse para a RAEM, não é de considerar que todos os trabalhadores não residentes autorizados a trabalhar em Macau possuam tal interesse e possam obter a autorização de residência temporária;
(2) Durante a audiência, a requerente apresentou o parecer do então Reitor da [Universidade(1)], B, no qual se afirma que a requerente possui capacidades pessoais excepcionais e é um excelente talento bilingue chinês-português de que o Centro Pedagógico e Científico da Língua Portuguesa da [Universidade(1)] necessita urgentemente. O IPIM já tomou em consideração esta carta de referência;
(3) Apesar de a requerente ser titular do grau de licenciado em Literatura Portuguesa e do grau de mestre em Língua e Cultura Portuguesa - Linguística Aplicada e Literatura, e ter colaborado na formação de professores de língua portuguesa de Macau e do Interior da China e na publicação de livros académicos no âmbito da pedagogia da língua portuguesa, ter sido responsável por traduções e interpretações chinês-português, e ter viajado a Portugal em nome do seu Instituto para participar em conferências académicas – factos já considerados e analisados pelo IPIM – importa salientar que, até 31 de Janeiro de 2018, a requerente só tem mais de um ano de experiência de trabalho no domínio do ensino da língua portuguesa, da tradução chinês-português e da investigação de projectos. De acordo com os dados das Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, Direcção dos Serviços do Ensino Superior e Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, Macau acumulou uma reserva de recursos humanos e não há falta de profissionais e estudantes diplomados com habilitações académicas e experiência profissional pertinentes, pelo que não se vislumbra que a requerente se apresente de particular interesse para Macau.
(4) Além disso, considerando que as instituições de ensino superior de Macau também oferecem disciplinas de natureza relacionadas com a profissão da requerente, existe no mercado oferta de substituição. Embora a requerente tenha apresentado a carta de confirmação da sua candidatura a doutoramento da [Universidade(2)], ainda não concluiu a sua tese de doutoramento nem obteve o grau de doutor, e não há falta de quadros habilitados com grau de doutor em Macau;
(5) Com base no que precede, a requerente não se apresenta de particular interesse para Macau.
XII. Proposta
Após investigação e análise, verifica-se que a requerente é titular do grau de licenciado em Literatura Portuguesa e do grau de mestre em Língua e Cultura Portuguesa - Linguística Aplicada e Literatura, e tem pelo menos um ano de experiência profissional a tempo inteiro no domínio do ensino da língua portuguesa, da tradução chinês-português e da investigação de projectos. Está actualmente empregada como “Assistente convidada – Centro Pedagógico e Científico da Língua Portuguesa” numa instituição de ensino superior de Macau. Embora a requerente trabalhe no sector dos serviços sociais públicos, após análise das suas funções, verifica-se que apenas exerce trabalhos a nível profissional e técnico auxiliar, sem funções de gestão e orientação. Dos documentos apresentados pela requerente não resulta que esta possua quaisquer qualificações profissionais relacionadas com o seu actual posto de trabalho, ou que tenha sido reconhecida como quadro altamente qualificado noutras regiões ou países, nem resulta que esta tenha recebido quaisquer prémios relacionados com o seu emprego actual, tenha sido entrevistada, tenha obtido quaisquer patentes para a sua investigação ou possua quaisquer competências relacionadas com as profissões constantes da lista dos sectores industriais para a introdução prioritária. Acresce que, Macau acumulou uma reserva de recursos humanos e não há falta de candidatos a emprego e diplomados com habilitações académicas e experiência profissional pertinentes. De resto, concluída a audiência, a requerente não logrou apresentar prova de que é de particular interesse para Macau.
De acordo com o artigo 1.º, al. 3) do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, a concessão da autorização de residência temporária pressupõe que o requerente se apresenta de particular interesse para a RAEM. Tendo em conta o sector de actividade em que a requerente exerce a profissão, a sua experiência profissional, as suas qualificações profissionais e habilitações académicas, a situação profissional actual, as realizações pessoais e a procura em Macau, entre outros factores, atendendo também aos dados da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, Direcção dos Serviços do Ensino Superior e Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, verifica-se que já existe em Macau um certo número de docentes do ensino superior na mesma área. Ou seja, Macau acumulou uma reserva de recursos humanos, e não faltam profissionais, candidatos a emprego e diplomados com qualificações académicas e experiência profissional pertinentes ou com empregos da mesma natureza de trabalho que o da requerente.
Face ao exposto, a requerente pediu ao IPIM a autorização de residência temporária na qualidade de técnico especializado nos termos da al. 3) do artigo 1.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, instruindo o seu pedido com documentos que cumprem os respectivos requisitos do artigo 9.º do referido RA. No entanto, da análise supra efectuada, verifica-se que o pedido da requerente não preenche os critérios de apreciação previstos nos artigos 1.º e 7.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, pelo que se propõe ao Chefe do Executivo que indefira o pedido de autorização de residência temporária da interessada supra referida nos termos do disposto na al. 3) do artigo 1.º e nos artigos 6.º e 7.º do mesmo diploma.
Submete-se à apreciação e despacho superior.”

Por carta datada de 11 de Maio de 2021, a recorrente apresentou ao IPIM comprovativo das suas habilitações académicas actualizadas para comprovar que lhe foi atribuído o grau de Doutor em Filosofia (Linguística - Português).
O Chefe do Executivo exarou o seguinte despacho em 31 de Dezembro de 2022 (vide fls. 49 do processo administrativo para mais pormenores):
“Concordo com o proposto e indefiro o pedido de autorização de residência temporária da seguinte interessada.
- A - Requerente”

Inconformada com a decisão supra referida, a recorrente interpôs o presente recurso contencioso em 6 de Março de 2023”; (cfr., fls. 56-v a 59 e 7-v a 10-v do Apenso).

Do direito

3. Vem a entidade administrativa recorrer do Acórdão pelo Tribunal de Segunda Instância prolatado que concedeu provimento ao anterior recurso contencioso pela agora recorrida aí interposto.

Esta a reflexão pelo Tribunal de Segunda Instância efectuada no seu Acórdão objecto do presente recurso:

“O Procurador-Adjunto do Ministério Público pronunciou-se sobre este recurso do modo seguinte:
“A recorrente solicitou a anulação do despacho exarado na Proposta n.º 0210/2017 (doc. de fls. 34 a 39 dos autos), no qual o Exmo. Senhor Chefe do Executivo declarou concisa e categoricamente: Concordo com o proposto e indefiro o pedido de autorização de residência temporária da seguinte interessada.
Nos termos da disposição no n.º 1 do art. 115.º do CPA, a frase “Concordo com o proposto” implica que o Exmo. Senhor Chefe do Executivo, no despacho em escrutínio, acolhe a Proposta n.º 0210/2017, designadamente o seu ponto 12 (XII. Proposta) que apontou (sublinhas nossas):
Após investigação e análise, verifica-se que a requerente é titular do grau de licenciado em Literatura Portuguesa e do grau de mestre em Língua e Cultura Portuguesa - Linguística Aplicada e Literatura, e tem pelo menos um ano de experiência profissional a tempo inteiro no domínio do ensino da língua portuguesa, da tradução chinês-português e da investigação de projectos. Está actualmente empregada como “Assistente convidada – Centro Pedagógico e Científico da Língua Portuguesa” numa instituição de ensino superior de Macau. Embora a requerente pertença ao sector dos serviços sociais públicos, após análise das suas funções, verifica-se que apenas exerce trabalhos a nível profissional e técnico auxiliar, sem funções de gestão e orientação. Dos documentos apresentados pela requerente não resulta que esta possua quaisquer qualificações profissionais relacionadas com o seu actual posto de trabalho, ou que tenha sido reconhecida como um quadro de destaque noutras regiões ou países, nem resulta que este tenha recebido quaisquer prémios relacionados com o seu emprego actual, tenha sido entrevistada, tenha obtido quaisquer patentes para a sua investigação ou possua quaisquer competências relacionadas com as profissões constantes da lista dos sectores industriais para a introdução prioritária. Acresce que, Macau acumulou uma reserva de recursos humanos e não há falta de candidatos a emprego e diplomados com habilitações académicas e experiência profissional pertinentes. De resto, concluída a audiência, a requerente não logrou apresentar prova de que é de particular interesse para Macau.
De acordo com o artigo 1.º, al. 3) do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, a concessão da autorização de residência temporária pressupõe que o requerente se apresenta de particular interesse para a RAEM. Tendo em conta o sector de actividade em que a requerente exerce a profissão, a sua experiência profissional, as suas qualificações profissionais e habilitações académicas, a situação profissional actual, as realizações pessoais e a procura em Macau, entre outros factores, atendendo também aos dados da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, Direcção dos Serviços do Ensino Superior e Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, verifica-se que já existe em Macau um certo número de docentes do ensino superior na mesma área. Ou seja, Macau acumulou uma reserva de recursos humanos, e não faltam profissionais, candidatos a emprego e diplomados com qualificações académicas e experiência profissional pertinentes ou com empregos da mesma natureza de trabalho que o da requerente.
Face ao exposto, a requerente pediu ao IPIM a autorização de residência temporária na qualidade de técnico especializado nos termos da al. 3) do artigo 1.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, instruindo o seu pedido com documentos que cumprem os respectivos requisitos do artigo 9.º do referido RA. No entanto, da análise supra efectuada, verifica-se que o pedido da requerente não preenche os critérios de apreciação previstos nos artigos 1.º e 7.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, pelo que se propõe ao Chefe do Executivo que indefira o pedido de autorização de residência temporária da interessada supra referida nos termos do disposto na al. 3) do artigo 1.º e nos artigos 6.º e 7.º do mesmo diploma.
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1. Da omissão de apreciação bem como da violação dos princípios da boa fé e da eficiência
Para sustentar o seu pedido da anulação, a recorrente invocou, em primeiro lugar, que “O exercício do poder discricionário por parte da entidade recorrida deve abranger todo o processo do pedido, no entanto, a entidade recorrente omitiu apreciação e decisão em relação à actualização da situação da recorrente durante o processo do pedido, pelo que incorreu em erro notório no exercício do poder discricionário, violando assim os princípios da boa fé e da eficiência e o âmbito de apreciação previsto no artigo 7.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, devendo, logo, (a decisão) ser anulada por padecer do vício de anulabilidade previsto no artigo 124.º do Código do Procedimento Administrativo.” (conclusão 19 da petição)
1.1. Na nossa óptica, é praticamente consensual o entendimento jurisprudencial e doutrinal, segundo o qual o erro nos pressupostos de facto se traduz em os factos que a entidade administrativa teve como base dum determinado acto administrativo não corresponderem à realidade, por serem inexistentes, errados, não demonstrados ou inexactos.
Importa ter presente que de acordo com a douta jurisprudência (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º 106/2019), o erro sobre os pressupostos também se pode colher da ignorância ou da desconsideração dos factos realmente existentes, mas apenas se úteis e relevantes à decisão.
No caso sub judice, sucede que depois do acabamento da Proposta n.º 0210/2017 ocorrido em 13/01/2021 e antes do despacho objecto deste recurso, a recorrente apresentou, em 12/05/2021 e 02/12/2021 respectivamente, dois requerimentos (cfr. docs. de fls. 38 a 48 e 15 a 33 do P.A.), e em 12/05/2021 entregou o diploma literário de doutoramento (cfr. docs. de fls. 34 a 36 do P.A.).
Na nossa modesta opinião, a obtenção do doutoramento pela recorrente em 05/05/2021 é factor relevante à luz do disposto da alínea 2) do art. 7.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 e para efeitos de apreciar acertadamente o requerimento da autorização de residência apresentado em 08/08/2017 por ela (cfr. docs. de fls. 57 a 63 do P.A.).
Sendo assim, e de acordo com o princípio da colaboração previsto no art. 9.º do CPA, afigura-se-nos que o IPIM podia e devia, por via de informação ou proposta complementar, submeter o referido doutoramento à consideração superior do Exmo. Senhor Chefe do Executivo.
Porém, o art. 20.º da contestação afirmou (sublinha nossa): Os factos em que o acto impugnado se baseou foram aqueles que estavam provados no procedimento administrativo no momento em que a instrução foi finalizada, não podendo ser dada relevância à alteração superveniente desses pressupostos.
Ora, esse art. 20.º torna irrefutável que o IPIM reconheceu não ter submetido o supramencionado doutoramento ao Exmo. Senhor Chefe do Executivo, por isso é natural e seguro que tal doutoramento não chegou a ser apreciado e avaliado pelo Exmo. Senhor Chefe do Executivo.
Com todo e elevado respeito pelo melhor entendimento em sentido diferente, afigura-se-nos que o despacho in questio enferma do erro nos pressupostos de facto, por indevidamente desconsiderar o facto de que a recorrente obteve em 05/05/2021 o doutoramento.
1.2. Ora, a boa doutrina inculca concisamente (Lino Ribeiro, José Cândido de Pinho: Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado, pp. 112): O princípio da boa fé significa que ao valorar os comportamentos a lei impõe sempre que se avalie da correcção e probidade dos intervenientes em dada situação ou relação tutelada pelo direito. Importa acentuar que o conceito de boa fé é passível de dois distintos significados: um, objectivo, em que a boa fé aparece erigida como norma de conduta, constante da própria previsão normativa; outra, subjectiva, em que a boa fé se traduz na consciência ou convicção de se ter um comportamento conforme o direito. Num caso, princípio da boa fé, no outro, estado ou situação de boa fé.
Na medida em que o art.8.º do CPA de Macau reproduz literalmente o art. 6.º-A do CPA de Portugal, extraímos que pode ser chamada à colação, a título do direito comparado, a jurisprudência mais autorizada, no sentido de que na densificação do princípio de boa fé relevam sobretudo dois subprincípios concretizadores – o da tutela da confiança e o da primazia da materialidade subjacente, contemplados nas alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 6.º-A (a título exemplificativo, cfr. Acórdão do STA no Processo n.º 0589/11), correspondentes às alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 8.º atrás referido.
Bem, o princípio da primazia da materialidade subjacente exprime a ideia de que o direito procura a obtenção de resultados efectivos, não se satisfazendo com comportamentos que, embora formalmente correspondam a tais objectivos, falhem em atingi-los substancialmente. Este princípio proíbe, por exemplo, o exercício de posições jurídicas de modo desequilibrado ou o aproveitamento de uma ilegalidade cometida, pelo próprio prevaricador, de modo a prejudicar outrem.
Por seu turno, o princípio da tutela da confiança visa salvaguardar os sujeitos jurídicos contra actuações injustificadamente imprevisíveis daqueles com quem se relacionem, e pressupõe a verificação de diversas circunstâncias, a saber: 1ª- uma actuação de um sujeito de direito que crie a confiança, quer na manutenção duma situação jurídica, quer na adopção de outra conduta; 2ª- uma situação de confiança justificada do destinatário da actuação de outrem, ou seja, uma convicção por parte do destinatário da actuação em causa, na determinação do sujeito jurídico que a adoptou quanto à sua actuação subsequente, bem como a presença de elementos susceptíveis de legitimar tal convicção, não só em abstracto mas em concreto; 3ª- a efectivação de um investimento de confiança que podem não ter tradução patrimonial, na base da situação de confiança; 4ª- o nexo de causalidade entre a actuação geradora de confiança e a situação de confiança, por um lado, e entre a situação de confiança e o investimento de confiança, por outro; 5ª- a frustração da confiança por parte do sujeito que a criou. Estes pressupostos devem ser encarados de modo global: a não verificação de um deles será em princípio relevante, mas pode ser superada pela maior intensidade de outro ou por outras circunstâncias pertinentes (por exemplo, em certos casos, o decurso de grandes lapsos temporais).
No vertente caso, a petição inicial patenteia concludentemente que a recorrente não alegou nenhum facto concreto capaz de mostrar que a Administração criasse na recorrente a esperança e confiança justificadas no sentido do deferimento do seu requerimento da autorização de residência apresentado em 08/08/2017. Daí decorre naturalmente que não pode deixar de naufragar a arrogada violação do princípio da boa fé.
1.3. Repare-se que os veredictos prolatados pelo Venerando TUI nos seus Processos n.º 54/2011 e n.º 29/2014 vem sufragando a prudente doutrina que preconiza (Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim: Código do Procedimento Administrativo Comentado, Almedina 2ª edição, p. 131): o princípio da desburocratização e da eficiência é um dos “princípios dos quais, naturalmente, os interessados não tiram mais do que uma protecção jurídica reflexa no procedimento, tendo maior valia programática, do que sancionabilidade jurídica, enquanto princípios procedimentais.”
Convém acrescentar que de acordo com a jurisprudência pacífica dos doutos TSI e TUI, o incumprimento do dever da decisão e o excesso dos prazos legais não dotados do efeito da prescrição ou da caducidade não invalidam o correspondente acto administrativo, podendo dar luz a acto administrativo tácito contemplado nos arts. 101.º e 102.º do CPA.
Tudo isto leva-nos a colher que a demora – reconhecida no art. 11.º da contestação – do procedimento conducente ao despacho em questão é inócua, não determinando a invalidade do mesmo.
*
2. Do invocado erro manifesto no exercício do poder discricionário
Nos arts. 34.º a 65.º da petição, a recorrente criticou os fundamentos alegados nos pontos 4 a 10 da Proposta n.º 0210/2017, concluindo que “XXXV. Face ao exposto, a entidade recorrida incorreu em erros manifestos ao apreciar o sector de actividade em que a recorrente está, a procura da respectiva profissão em Macau, a remuneração profissional da recorrente e as suas realizações pessoais, os quais a levou a proferir a decisão de indeferimento do pedido de autorização de residência temporária da recorrente, logo, o acto administrativo está viciado por erro notório no exercício do poder discricionário da Administração, …”
Bem, colhemos tranquilamente que o P.A. constata a exactidão do juízo de “não apresentou nenhum documento comprovativo de que foi reconhecida como quadro altamente qualificado noutra região ou país” e de “Além disso, os documentos apresentados pela requerente não provam que tenha recebido prémios relacionados com o seu emprego actual, que tenha sido entrevistada, que tenha obtido patentes para a sua investigação ou que possua as competências necessárias para exercer uma profissão num sector de prioridade” (cfr. pontos 9 e 10 da Proposta n.º 0210/2017), e cabe à recorrente o respectivo ónus de prova.
De outro lado, afigura-se-nos a entender que não apresentam total desrazoabilidade ou erro manifesto os ajuizamentos de prognose da Administração, no sentido de que “Macau acumulou uma reserva de recursos humanos e não há falta de candidatos a empregos da mesma natureza que o da requerente” e “Macau acumulou uma certa quantidade de recursos humanos e não há falta de candidatos a emprego e diplomados com habilitações académicas semelhantes às da requerente.” (cfr. pontos 6 e 7 da Proposta atrás aludida)
Na nossa modesta opinião, o que é discutível no caso sub judice é que a profissão da recorrente – docente universitário – foi enquadrada pela Administração no grupo de “sector dos serviços sociais públicos”. Com efeito, parece-nos que segundo o entendimento vulgar e generalizado, a docência universitária e a investigação académica integram-se na classe de profissão liberal e distinguem-se do chamado “sector dos serviços sociais públicos”.
No entanto, e salvo merecido respeito, inclinamos a opinar que o insuficiente rigor do enquadramento dado pela Administração à profissão da recorrente é inócuo e irrelevante, na medida em que, a nosso ver, não se descortina que tal enquadramento padeça de total desrazoabilidade, de grosseira injustiça ou de discriminatória aplicação contra a recorrente.
Tudo isto conduz-nos a extrair que não verifica o arguido o erro manifesto no exercício do poder discricionário, pese embora – como se referiu atrás – a indevida desconsideração do sobredito doutoramento da recorrente germine um erro nos pressupostos de facto.
***
Por todo o expendido acima, propendemos pela procedência do presente recurso contencioso.”

Tal como se refere no acórdão do TUI, processo n.º 21/2004, “…o Magistrado do Ministério Público, no recurso contencioso de anulação, não é parte. Assim, não há norma que impeça o juiz de fundamentar decisão aderindo a texto do Ministério Público...”
O Procurador-Adjunto do MP emitiu pareceres exaustivos e perspicazes sobre todas as questões levantadas neste recurso contencioso, que foram integralmente admitidos por este Tribunal Colectivo. Estes pareceres constituem uma base suficiente para a resolução do presente recurso contencioso.
Além disso, tal como salientado pelo Douto Procurador-Adjunto, os funcionários do IPIM elaboraram a Proposta n.º 0210/2017 em 13 de Janeiro de 2021, mas a entidade recorrida só exarou o despacho recorrido cerca de dois anos depois (31 de Dezembro de 2022), período durante o qual a recorrente apresentou à Administração comprovativos das suas habilitações académicas actualizadas para provar que lhe tinha sido atribuído o grau de Doutor em Filosofia, mas do despacho recorrido não resulta que o referido facto tenha sido tido em conta pelas autoridades.
Na verdade, mesmo que a recorrente possua o referido grau de doutoramento, isso não significa necessariamente que lhe tenha de ser concedida a autorização de residência temporária. No entanto, enquanto órgão que exerce o poder discricionário, a entidade recorrida deve ter pleno conhecimento das circunstâncias relevantes e abrangentes da recorrente antes de estar em condições de analisar e apreciar, com exactidão, o seu pedido. Por conseguinte, a omissão de consideração de algumas das circunstâncias importantes da recorrente afectaria o juízo correto da Administração, constituindo assim um erro nos pressupostos de facto.
No caso em apreço, a recorrente requereu a autorização de residência temporária com fundamento em ter o estatuto de técnico especializado, sendo as habilitações académicas dela um dos factores importantes a considerar pelas autoridades. Na ausência de análise dessas habilitações académicas, a decisão da Administração padece de erro nos pressupostos de facto.
Nestes termos, acorda-se em julgar procedente o recurso contencioso”; (cfr., fls. 59 a 64 e 10-v a 14 do Apenso).

Aqui chegados, e atentas as “razões” que levaram o Tribunal de Segunda Instância a decidir nos termos que decidiu, “quid iuris”?

Pois bem, como se deixou transcrito, a decisão agora recorrida acolheu (integralmente) as considerações pelo Ministério Público tecidas no seu douto Parecer junto aos autos onde se assacou àquela a “falta de ponderação do – entretanto obtido grau de – doutoramento da recorrente”, concluindo também que “Na ausência de análise dessas habilitações académicas, a decisão da Administração padece de erro nos pressupostos de facto”.

Porém, e ressalvado o muito respeito devido por melhor opinião, outro nos parece ser o nosso entendimento, afigurando-se-nos que o Acórdão recorrido não se pode manter.

Vejamos.

Abordando a matéria do vício de “erro nos pressupostos de facto”, teve já este Tribunal de Última Instância oportunidade de considerar o que segue:

“Como é sabido, o “recurso contencioso”, é o meio (processual) próprio para obter o reconhecimento judicial da existência de (todos os) vícios que possam inquinar um acto administrativo lesivo, e, assim, obter a sua anulação contenciosa; (cfr., art. 21° do C.P.A.C.).
Por sua vez, no âmbito da temática dos “vícios do acto administrativo”, tem-se entendido, que estes se identificam com os (tradicionais vícios) de “usurpação de poder”, “incompetência”, “vício de forma”, “desvio de poder” e “violação de lei”.
O conceito de “violação de lei”, não abarca toda e qualquer violação da lei: com efeito, por definição, qualquer vício do acto administrativo implica uma violação da lei (no sentido amplo de “bloco de legalidade”).
Há um critério positivo e um critério negativo de identificação do vício de violação de lei.
O conteúdo essencial do vício de violação de lei respeita às ilegalidades objectivas materiais dos actos administrativos: o vício de violação de lei é, assim, aquele em que incorrem os actos administrativos que desrespeitem requisitos de legalidade relativos aos pressupostos de facto, ao objecto e ao conteúdo.
O vício de violação de lei é também doutrinalmente empregue para garantir o caracter fechado da teoria dos vícios do acto administrativo.
Nestes termos, padecem de “violação de lei” os actos administrativos (ilegais) cuja ilegalidade não se possa reconduzir a qualquer dos outros vícios, tendo, portanto, este vício, “carácter residual”.
Constituindo o “erro nos seus pressupostos” um dos vícios de violação de lei que conduzem à anulação do acto administrativo, e competindo ao recorrente alegar e provar no recurso os factos integrativos do erro, cabe ao Tribunal, face a todos elementos legalmente admissíveis de que dispõe, formular um juízo sobre a conformidade com a realidade dos pressupostos de facto que a Administração teve em conta aquando da prolação do acto impugnado.
O “erro nos pressupostos de facto” constitui assim uma das causas de invalidade do acto administrativo, consubstanciando um vício de violação de lei que configura uma ilegalidade de natureza material, pois é a própria substância do acto administrativo que contraria a lei.
Tal vício consiste na divergência entre os pressupostos de que o autor do acto partiu para prolatar a decisão administrativa final e a sua efectiva verificação na situação em concreto, resultando do facto de se terem considerado na decisão administrativa factos não provados ou desconformes com a realidade.
Assim, se o pressuposto (factual) de que o acto recorrido partiu, não se mostra verificado, o mesmo encontra-se inquinado com o vício de “violação de lei” por “erro nos pressupostos de facto”.
Adequado é desta forma dizer-se que:
- o «erro sobre os pressupostos de facto», traduz-se na divergência entre os factos que a entidade administrativa teve em conta para decidir como decidiu, e a sua real ocorrência; e que,
- o «erro nos pressupostos de direito», traduz-se na inadequação do regime jurídico e normas jurídicas aplicadas pela entidade administrativa à base factual convocada”; (cfr., v.g., os Acs. de 31.07.2020, Proc. n.° 67/2020, de 23.07.2021, Proc. n.° 71/2021, de 24.09.2021, Proc. n.° 109/2021, de 28.01.2022, Proc. n.° 137/2021, e de 04.11.2022, Proc. n.° 93/2022, podendo-se sobre esta matéria ver também o Ac. do S.T.J. de Portugal de 21.12.2021, Proc. n.° 11/21).

In casu, e como se deixou relatado, o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância entendeu que o referido “erro” existia porque na decisão administrativa aí em questão não se teve em consideração os “factos” constantes de um (novo) documento pela então recorrente, ora recorrida, apresentado, e que dava conta de um seu entretanto obtido grau académico de doutoramento.

Contudo, não se pode sufragar o assim considerado e entendido.

Como sabido cremos ser, o “procedimento administrativo” – tradicionalmente, e, essencialmente até aos anos de 1980 designado de “processo administrativo gracioso”; constituindo exemplos significativos da utilização desta “expressão”, entre outros: Marcello Caetano in, “Manual de Direito Administrativo”, 2ª ed., Coimbra, pág. 1289 e segs., Osvaldo Gomes in, “Fundamentação do Acto Administrativo”, 2ª ed., Coimbra, 1981, pág. 10 e segs., e Rui Machete in, “Contribuições para o Estudo das Relações entre o Processo Administrativo Gracioso e Contencioso”, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.° 25, 1969, pág. 7 e segs. – traduz-se no “modo de proceder da Administração nas suas relações com os cidadãos”.

Trata-se, no fundo, de uma sucessão ordenada de actos e formalidades estrutural e funcionalmente distintos com vista à produção de um determinado resultado, (ou modificação jurídico-administrativa), que se manifesta numa “decisão final” que pode ser, um “acto”, “regulamento” ou “contrato administrativo”; (cfr., art. 1°, n.° 1 do C.P.A., podendo-se também ver, v.g., Sérvulo Correia in, “Noções de Direito Administrativo”, Vol. I, pág. 382, e Jean Rivero in, “Direito Administrativo”, 181, 1982, pág. 297).

O “processo administrativo (gracioso)” – diversamente do “contencioso”, que apenas contempla questões de “legalidade” – corresponde, fundamentalmente, a uma determinada forma de actuação dos órgãos da Administração, que se caracteriza pela observância de determinadas formalidades que ao mesmo tempo constituem o suporte da formação de uma decisão, (que se pretende e espera, justa, útil e oportuna), constituindo também a garantia de defesa contra a arbitrariedade e precipitação das resoluções administrativas.

Com efeito, as decisões – ou actos – de natureza administrativa não surgem “do nada”, derivando de um “processo decisório” que deve ser, e é, efectivamente, formalizado por intermédio de actos e formalidades que se sucedem no tempo e que visam a edição de um “acto final”, sendo pois o “mecanismo” – considerado com um encadeamento necessário, dinâmico e ordenado de eventos – por intermédio do qual o poder administrativo se manifesta, integrando, (processualmente), as fases da sua “instauração”, “instrução”, “relatório” e “decisão”; (cfr., Parte III, “Capítulo V” do C.P.A., dedicado à “Marcha do Processo”, e onde nos art°s 76° e segs. se regulam as aludidas fases).

In casu, e como se viu, (e assim “provado” igualmente se encontra), tudo começou com o “pedido de autorização de residência na R.A.E.M.” pela agora recorrida apresentado no Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau em 08.08.2017, e que, dando assim início ao “procedimento administrativo” para a sua apreciação e decisão, correu termos no dito Instituto, onde, após a observância do contraditório, (com a “audiência escrita” da então requerente em 17.01.2018), se elaborou, (em 13.01.2021), o “Parecer final”, ou seja, a Proposta n.° 0210/2017, na qual se veio a concluir que: “(…) o pedido da requerente não preenche os critérios de apreciação previstos nos artigos 1.º e 7.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, pelo que se propõe ao Chefe do Executivo que indefira o pedido de autorização de residência temporária da interessada supra referida nos termos do disposto na al. 3) do artigo 1.º e nos artigos 6.º e 7.º do mesmo diploma”, e que, submetida à apreciação do Órgão Decisor mereceu despacho concordante datado de 31.12.2022.

Sucede que após a referida Proposta n.° 0210/2017, e antes da decisão administrativa final com a mesma concordante, em 11.05.2021 “apresentou a recorrente ao IPIM comprovativo das suas habilitações académicas actualizadas para comprovar que lhe foi atribuído o grau de Doutor em Filosofia (Linguística - Português)”, sendo, exactamente, estas ditas – novas – “habilitações académicas” que, por não terem sido objecto de consideração na aludida decisão final sobre o seu pedido de autorização de residência que, na opinião do Ministério Público e do Colectivo de Juízes do Tribunal de Segunda Instância, justificou o entendimento no sentido de ter a Administração incorrido no aludido vício de “erro nos pressupostos de facto”.

Contudo, e como se deixou dito, tal não se nos apresenta como a mais adequada solução que em face do regime jurídico vigente regula a actividade administrativa.

Compreende-se o ponto de vista que levou à decisão a que se chegou no Acórdão recorrido do Tribunal de Segunda Instância, e que, em apertada síntese, se pode resumir no entendimento de que o acto administrativo emitido a final de um procedimento administrativo deve “assentar na realidade factual como ela se configura no exacto momento da sua prática”.

Todavia, temos para nós que o mesmo implica um certo “excesso” que, (em bom rigor), muito dificilmente se apresenta praticável, com as nefastas consequências para o que se deseja constituir o bom funcionamento da máquina administrativa e do interesse público.

Como sobre este aspecto nota a entidade recorrida, “A realidade muda constantemente, pelo que frequentemente os factos existentes no momento da decisão são já diversos dos que existiam no momento do encerramento da instrução. (…).
Além disso, a Administração Pública, em sentido amplo, é uma organização piramidal complexa, constituída por vários níveis, de hierarquia e de tutela, e até por diversas pessoas jurídicas, sendo que, em regra, a entidade que procede à instrução e a entidade que toma a decisão são diferentes. No caso específico dos procedimentos emergentes do RA 3/2005 a instrução e a decisão estão até a cargo de diferentes pessoas colectivas de direito público. Efectivamente, a instrução é feita pelo IPIM, que é um instituto público, mas a decisão é tomada pelo agora recorrente, que é um órgão de outra pessoa colectiva (a RAEM). E em cada uma destas pessoas colectivas o procedimento administrativo passa por diversos degraus hierárquicos.
Sendo esta a inescapável natureza das coisas, a jurisprudência do tribunal a quo vem criar instabilidade e incerteza nos procedimentos administrativos resultantes do RA 3/2005, na medida em que parece obrigar à reabertura da instrução de cada vez que o particular venha, como frequentemente acontece, entregar ao IPIM elementos de prova de factos novos – mesmo quando o procedimento já não se encontre em fase de instrução pelo IPIM.
Ora, os pressupostos de facto de qualquer acto administrativo são ditados pelo que consta no processo no momento da decisão – e os documentos entregues por A em 11.05.2021, em 28.05.2021 e em 02.12.2021 não constavam, nem podiam constar, no processo que estava perante o CE para efeitos decisão. E não constavam porque a instrução desse processo já tinha sido encerrada e o mesmo já não estava no domínio da entidade instrutora (IPIM).
Como poderia então a entidade decisora (CE) ter levado em conta os factos novos provados pelos documentos entregues ao IPIM após o encerramento da instrução? (…)”; (cfr., fls. 76 a 77).

Ora, (compreendendo-se o ponto de vista defendido no Acórdão recorrido), cremos porém que mais adequadas são as considerações que se deixaram transcritas.

Dúvidas não há que de acordo com o “princípio da decisão”, “Os órgãos administrativos têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados pelos particulares, e nomeadamente: a) Sobre os assuntos que lhes disserem directamente respeito; b) Sobre quaisquer petições, representações, queixas, reclamações ou recursos formulados em defesa da legalidade ou do interesse geral”; (cfr., art. 11°, n.° 1, al. a) e b) do C.P.A.).

Não se olvida, igualmente, que o “procedimento administrativo” tem uma tramitação menos rigorosa que o “processo penal”, ou “processo civil”, e mesmo o “processo administrativo contencioso”, sendo aquela mais “flexível”, pois que é (nomeadamente), enquadrado pelo “princípio da desburocratização e da eficiência” – segundo o qual “A Administração Pública deve ser estruturada e funcionar de modo a aproximar os serviços das populações e de forma não burocratizada, a fim de assegurar a celeridade, a economia e a eficiência das suas decisões”, (cfr., art. 12° do C.P.A.) – assim como pelo “princípio da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos residentes”; (cfr., art. 4°, e podendo-se, v.g., ver também Paulo Cardinal, no seu artigo “O Procedimento Administrativo e a Codificação”, “O Direito”, 1990, onde nota que no procedimento administrativo “não está pois em causa, a regulação da obtenção de uma sentença, não está em causa ainda, pelo menos de uma forma directa e imediata, a resolução, por um terceiro, de um conflito entre duas partes, não estamos perante uma lide processual.
Estamos assim, face a duas realidades, que são objectivamente diferentes, e são desenvolvidas em sedes diferentes, uma na Administração, a outra no Tribunal”).

Da mesma forma, não se nega que de nada vale pretender-se uma Administração “moderna”, com a melhoria das relações entre Administração e administrados, se não se pugnar por um modo de agir com uma maior “procura do consenso”, “flexibilização”, efectiva “participação dos particulares”, com uma clara e adequada “fundamentação das decisões”, (e, como no Prefácio do “C.P.A. Anotado e Comentado” de Lino Ribeiro e José C. Pinho também observou o então Secretário-Adjunto para a Administração, Educação e Juventude, Jorge A. H. Rangel, uma Administração “aberta, dialogante e participada”).

Porém, sob pena de uma total “desarrumação processual”, (ou até mesmo, de uma “anarquia processual”), impõe-se observar uma certa “disciplina” e “estabilidade processual”, com “momentos” e “prazos” (próprios) na tramitação (ao longo) do procedimento.

Doutra forma, seria caso de se dizer que – “tudo valia”, e que – o processo podia estar sempre e constantemente a “voltar atrás” para a prática de “novos actos” ou “formalidades”, “informações” ou “pareceres”, (e, por aí fora…, quiçá, sem nunca se chegar ao fim), havendo então a necessidade de, antes de se tomar qualquer posição ou de se adoptar qualquer solução, se dever, previamente, indagar se, entretanto, algo de novo ocorreu…

Ora, como cremos que se apresenta bastante evidente, tal “situação” não seria desejável nem razoável, não sendo, pois, possível ou admissível.

Dir-se-á que, desta forma, se acolhe um desajustado rigor formalista, em prejuízo da sempre pretendida “verdade material” e da referida “participação dos particulares” no processo para uma efectiva defesa dos seus interesses e pretensões.

Todavia, cremos não ser o caso.

Como em tudo na vida, tem de haver “limites”…

Importa ter presente que, como legalmente exigido é, no seu “requerimento inicial” (formulado por escrito) deve o particular incluir uma “exposição dos factos em que se baseia o pedido”, (cfr., art. 76°, n.° 1, al. c) do C.P.A.), que previsto está um “prazo geral para a conclusão do procedimento”; (cfr., art. 61° do dito C.P.A.), manifesto se apresentando também que, ainda que sem as “amarras” (formalistas) nomeadamente do direito processual civil em matéria de “alteração da causa de pedir”, (cfr., art. 217° do C.P.C.M.), inviável seria admitir-se uma total (e imprevisível) possibilidade de constantemente, e a todo o tempo, poder o interessado introduzir elementos novos no processo, com ou sem alterações ou mudanças relativamente ao que antes tinha dito, à vista de todos estando o “resultado” a que tal situação certamente conduziria…

Na situação dos presentes autos, teve a ora recorrida a plena faculdade de, no seu “pedido inicial”, expor, (da forma que lhe pareceu mais favorável), os “factos” que entendeu relevantes para a obtenção de uma decisão positiva sobre a sua pretensão, e, no exercício do seu direito ao contraditório, (em sede da audiência escrita), teve nova oportunidade de esclarecer (ou mesmo de complementar) tudo o que entendesse ou que lhe pudesse ser conveniente, adequado não sendo assim de se considerar que se incorreu em “défice de instrução”, e (ou consequente) “erro nos pressupostos de facto” por, após elaborado já se encontrar o (posterior) relatório final, em sede da fase decisória, se não ter considerado um “facto” que, no momento da decisão, nem sequer constava de todo o processado.

Não se quer com isto dizer que de louvar deva ser a postura de inércia e de nada se fazer perante a apresentação por um particular de um novo documento após finda a fase da instrução do processo, (devendo-se, no mínimo, informar de tal situação).

Porém, e seja como for, tal “aspecto”, não nos parece que possa constituir matéria que deva ser, agora e nesta sede, objecto de apreciação (judicial) relativamente à “legalidade” da decisão administrativa proferida.

Essencial é pois aqui reter que, finda a “instrução do processo”, teve a ora recorrida ampla e total oportunidade de manifestar a sua opinião sobre todo o processado, (assim como o provável sentido da decisão final a proferir), e era precisamente neste – ou melhor, até este – momento que poderia trazer ao processo qualquer outro elemento que entendesse favorável a sua situação e pretensão.

Doutra forma, estar-se-ia como que a converter um pedido de autorização de residência com base nas “qualidades técnico-profissionais” pela requerente na altura já possuídas, num pedido de autorização de residência para “formação académica”, no caso, de um doutoramento.

Nesta conformidade, considerando-se que na decisão administrativa em questão se ponderou tudo o que pela ora recorrida oportuna e tempestivamente alegado foi na sua petição inicial, assim como na audiência escrita – e sem prejuízo de à mesma caber a decisão sobre um novo pedido com fundamento no seu entretanto obtido grau académico de doutoramento – imperativa é a revogação do decidido pelo Tribunal de Segunda Instância.

Decisão

4. Em face do exposto, em conferência, acordam conceder provimento ao recurso, revogando-se o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância.

Custas em ambas as Instâncias pela ora recorrida, com taxa de justiça que se fixa em 12 UCs.

Registe e notifique.

Macau, aos 14 de Fevereiro de 2025


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Ho Wai Neng
Song Man Lei

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Mai Man Ieng

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