Processo nº 823/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data do Acórdão: 13 de Março de 2025
ASSUNTO:
- Marcas
- Caducidade
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Rui Pereira Ribeiro
Processo nº 823/2024
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 13 de Março de 2025
Recorrente: A
Recorridas: Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico e
B有限公司(parte contrária)
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
A, com os demais sinais dos autos,
veio interpor recurso judicial da decisão do Chefe da Divisão de Registo de Marcas da Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico que declarou a caducidade da marca N/XX3, invocando que foi devido às limitações decorrentes da Pandemia provocada pelo Covid-19 que não pôde usar a marca em causa, pedindo que seja revogado o respectivo despacho e mantido o registo da marca em causa.
Cumprindo o disposto no artº 278º do RJPI veio a DSEDT a remeter ao tribunal o processo administrativo referente ao pedido de registo de marca a que se reportam os autos.
Foi citada a parte contrária B有限公司, tendo silenciado.
Pelo Tribunal recorrido foi proferida sentença negando provimento ao recurso judicial interposto.
Não se conformando com a sentença proferida veio a Recorrente interpor recurso daquela decisão apresentando as seguintes conclusões:
A. Como se demonstrou isupfra, a Recorrente discorda do entendimento do Tribunal a quo e da DSEDT, uma vez que preenche os requisitos legais que obstam à declaração do presente pedido de caducidade, nos termos do artigo 231.º, n.º 1, al. b) do RJPI
B. O n.º 1 do artigo 231.º do RJPI estabelece que “1. O registo de marca caduca: a) Nos casos previstos no n.º 1 do artigo 51.º; b) Pela falta de utilização séria durante 3 anos consecutivos, salvo justo motivo; c) Se sofrer alteração que prejudique a sua identidade.”.
C. “O titular da marca tem de ser diligente no sentido de fazer face aos riscos normais que podem afectar o uso do seu direito de marca. Tem de ultrapassar aquelas situações que o empresário (titular da marca) médio seria capaz de ultrapassar, de forma que só aquelas situações imprevisíveis ou que o titular do registo não possa controlar poderão justificar a falta de uso da sua marca. Por outro lado, a atitude do titular da marca também deverá ser apreciada quando o motivo para o não uso deixar de existir, no sentido de colocar a sua marca logo que possível no mercado, uma vez que, quando o motivo justificativo cessa, “ressurge a obrigação de uso” da marca.” [citando Luís Couto Gonçalves]
D. O como decidiu o Tribunal a quo que, “o justo motivo para o não uso da marca depende da ocorrência de circunstâncias independentes da vontade do titular, como são os casos de força maior (guerras, catástrofes, naturais, etc), ou de medidas de autoridade públicas proibindo a produção ou a comercialização dos respectivos produtos”.
E. O justo motivo terá de ser excepcional e apreciado tendo em conta as circunstâncias do caso concreto de forma restritiva.
F. É um facto notório que as limitações provocadas pela pandemia introduzidas no final de 2019 / início de 2020 inviabilizaram qualquer deslocação entre os territórios de Macau e outras jurisdições, a qual se tornou possível apenas a partir do final de Fevereiro-Março de 2023.
G. Essas limitações inevitavelmente provocarem uma significativa diminuição em termos de movimento de pessoas e a procura de produtos e servições não essenciais à combate da pandemia.
H. Perante nesta cenário, em que encerraram inúmeras empresas e foram despedidas milhares de pessoas, é razoável concluir que todas e quaisquer empresários comerciais tiveram de reavaliar todos os aspectos da sua actividades comerciais em Macau, incluindo o foco e mecanismos de actuação, até as campanhas e projectos em curso.
I. Sendo incompreensível a posição, que consta da sentença recorrida, segundo a qual a pandemia de Covid 19 constitui um justo motivo, por si, mas a Recorrente teria ainda que demonstrar um nexo de causalidade (!?!)...
J. Estamos em crer que esta ambiguidade de critérios (a pandemia de Covid 19 é justo motivo mas...não é justo motivo neste caso) esvazia o conceito de justo motivo
K. Também não fazendo sentido afirmar que a Recorrente podia ter retomado a comercialização logo após a pandemia, quando o pedido de cancelamento foi submetido em Março de 2023 e a pandemia acabou em Dezembro de 2022 (menos de três meses antes...). A lei tem que ser objecto de interpretação razoável e não draconiana.
L. O período de três anos é pensado para situações normais. Para situações abnormais, o legislador prevê a possibilidade de justo motivo como excepção à caducidade do registo da marca por não-uso.
M. Apesar de sabermos agora que a pandemia perdurou por três anos, à época não existia uma previsão clara do levantamento das limitações impostas à comunidade e à fronteira, facto que aumentou a dificuldade em tomar decisões comerciais.
N. Por outro lado e salvo o devido respeito, o Tribunal a quo devia ter tomado em consideração uma série de actos praticados pela Recorrente, sem tirar conclusões separadas para cada um dos acontecimentos.
O. Conforme exposto na Resposta apresentada à DSEDT, a Reclamante iniciou a sua operação em Macau desde 1996, promovendo o registo de diversas marcas e em diversas Classes.
P. Os produtos da Recorrente com a marca N/XX3 podem ser encontrados em diversas superfícies comerciais em Macau, com o rótulo e imagem que consta na Resposta à DSEDT.
Q. A Recorrente negociou com um importador a distribuição dos seus produtos para Hong Kong e Macau, incluindo os produtos “C” na Classe 30, e resolveu nomear a empresa D Ltd., com sede em Unit XX, XX/F, XX Building, no. XX XX Road, XX, XX, Hong Kong por um período de 5 anos, de 2019 a 2024 (Doc. 6 junto à Resposta à DSEDT).
R. No âmbito do acordo, a Recorrente forneceu ao distribuidor um lote de produtos para serem comercializados em Macau, com um volume total de mais 8,5 toneladas, do qual constam várias caixas de café instantâneo sob a marca “” (conforme Doc. 1 a guia de transporte n.º OOLU8894475820 datada de 29 de Julho de 2023 junto às alegações de recurso).
S. Os produtos relativos à marca N/XX3 da Recorrente supraditos foram vendidos ao distribuidor E LIMITED, com o n.º de Registo 2XXX1 (SO) e sede na Avenida XX, nºs XX, Edifício XX, Bloco XX, XXº andar XX, em Macau (conforme nota de encomenda n.º 65XXX91 também junta como Doc. 2 nas alegações de recurso.
T. Dúvidas não restam tanto do justo motivo durante esses três anos como também, fora do mesmo, da utilização efectiva (i.e., séria) em Macau dos produtos da marca N/XX3 “” Classe 30, conforme o n.º 5 e n.º 1 c) do artigo 232.º, RJPI.
U. Considerando a celebração do acordo e a importação dos produtos sob a marca N/XX3 (i.e., uso efectivo e sério), mitigado pela incerteza, dificuldade e obstáculo provocado pela pandemia, deve fica provado que a Recorrente tem o uso efectivo da marca (mitigado pelo justo impedimento em comparação com situações normais).
Notificadas a DSEDT e a parte contrária das alegações de recurso veio a DSEDT oferecer o merecimento dos autos.
Foram colhidos os vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
a) Factos
Da sentença sob recurso consta a seguinte factualidade:
A) Em 19 de Abril de 1996, a recorrente constituiu advogado para apresentar à então Direcção dos Serviços de Economia o pedido de registo de marca nº N/XX3, na classe de serviços 30.
B) O referido pedido foi publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 23, II Série, de 5 de Junho de 1996, e o registo foi concedido por despacho de 19 de Setembro de 1996, tendo o respectivo anúncio sido publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 45, II Série, de 6 de Novembro de 1996. Posteriormente, pediu-se renovação em 2003, 2010 e 2016, respectivamente, com a marca válida até 19 de Abril de 2024 (cfr. fls. 34 a 39 dos autos).
C) Em 6 de Março de 2023, a B, Limitada (B有限公司), através do seu mandatário, apresentou um requerimento à DSEDT, afirmando que a recorrente não tinha feito uma utilização séria da marca registada N/XX3 nos últimos 3 anos, e pedindo a declaração de caducidade do registo da marca em causa (vide fls. 40 a 43 dos autos).
D) Em 7 de Março de 2023, a DSEDT, por ofício n.º 60538/2023/DPI/DRM, notificou a recorrente do referido pedido de declaração de caducidade, e de que podia responder ao respectivo pedido de declaração de caducidade no prazo de 2 meses a contar da recepção do ofício (cfr. fls. 43v dos autos).
E) O pedido de declaração de caducidade foi publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2023.
F) Em 7 de Julho de 2023, a recorrente apresentou a resposta através do mandatário judicial (vd. fls. 50v a 61 dos autos).
G) Em 19 de Julho de 2023, a entidade recorrida concordou com o teor do Relatório n.º 376/DPI/DRM/2023 e nele proferiu despacho de recusa do pedido da marca N/XX3 (cfr. fls. 24 a 26v dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
H) O referido despacho de recusa de registo foi publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º 33, II Série, de 16 de Agosto de 2023 (vd. fls. 61v dos autos).
I) Em 18 de Setembro de 2023, a recorrente interpôs o presente recurso contencioso para este Tribunal (vd. fls. 2 dos autos).
b) Do Direito
É do seguinte teor a decisão recorrida:
«Na petição inicial, a recorrente salienta principalmente que a entidade recorrida, por um lado, reconheceu que a pandemia corona vírus tinha provocado restrições muito significativas ao funcionamento e desenvolvimento da recorrente, mas, por outro lado, reconheceu erradamente que a pandemia corona vírus não constituiu nexo de casualidade directa com o uso da marca em Macau; afirma que a pandemia corona vírus perdurou durante três anos, tendo restringido a entrada e saída entre Hong Kong e Macau, bem como impediu a implementação do plano de negócio; somente a partir de 2023, depois do cancelamento das restrições de entrada e saída, é que pôde retomar o acordo com os distribuidores e começar a enviar as mercadorias aos distribuidores da presente região para serem vendidas em Macau, tendo também actuado activamente na procura de parceiros de negócio a fim de poder vender as mercadorias dessa marca nesta região, portanto entende que a pandemia corona vírus pertence a caso de força maior, constituindo justa causa para que a sua marca não seja declarada a caducidade (vide artigo 231.º, n.º 1, alínea c), do Regime Jurídico da Propriedade Industrial).
O artigo 231.º, nº 1 do “Regime Jurídico da Propriedade Industrial” indica: “1. O registo de marca caduca: a) Nos casos previstos no n.º 1 do artigo 51.º; b) Pela falta de utilização séria durante 3 anos consecutivos, salvo justo motivo; c) Se sofrer alteração que prejudique a sua identidade.”
Uma vez que o “Regime Jurídico da Propriedade Industrial” não prevê a interrupção ou suspensão da caducidade previsto no artigo 231.º, n.º 1, alínea b), pelo que, de acordo com o disposto no artigo 320.º do Código Civil, o referido prazo não pode ser suspenso nem interrompido.
O artigo 232.º do mesmo regime jurídico quanto à utilização séria da marca dispõe o seguinte:
“Artigo 232.º
(Utilização séria da marca)
1. É considerada utilização séria da marca:
a) A utilização da marca tal como está registada ou que dela não difira senão em elementos que não alterem o seu carácter distintivo, nos termos do presente diploma, feita pelo titular do registo ou por seu licenciado devidamente inscrito;
b) A utilização da marca, tal como definida na alínea anterior, para produtos ou serviços destinados apenas a exportação;
c) A utilização da marca por um terceiro, desde que sob o controlo do titular e para efeitos da manutenção do registo.
2. A utilização séria da marca de associação afere-se por aqueles que dela fazem uso com o consentimento do titular.
3. A utilização séria da marca de certificação afere-se pelas pessoas habilitadas para dela fazerem uso.
4. O início ou reinício da utilização séria nos 3 meses imediatamente anteriores à apresentação de um pedido de caducidade, contados a partir do fim do período ininterrupto de 3 anos de não utilização, não é tomado em consideração se as diligências para o início ou reinício da utilização só ocorrerem depois do titular tomar conhecimento de que pode vir a ser requerido esse pedido de caducidade.
5. Cumpre ao titular do registo ou a seu licenciado, se o houver, provar a utilização da marca, sem o que esta se presume não utilizada.”
Do disposto no artigo 231.º, n.º 1, alínea b) do “Regime Jurídico da Propriedade Industrial” acima referido, podemos saber que quando o titular do registo (ou pessoa com a sua autorização) deixa de utilizar seriamente a marca registada durante três anos consecutivos implica a caducidade do registo, e o artigo 232.º do mesmo regime jurídico estipula definições pertinentes sobre o que é considerado utilização séria, e salienta no n.º 4 que se o titular do registo não utilizar a marca durante três anos consecutivos sem motivo justo, mas se iniciar ou reiniciar a utilização séria nos 3 meses imediatamente anteriores à apresentação de um pedido de caducidade, pode também evitar a caducidade do registo da marca; entretanto, não é tomado em consideração se as diligências para o início ou reinício da utilização só ocorrerem depois do titular tomar conhecimento de que pode vir a ser requerido esse pedido de caducidade.
Assim sendo, para evitar a declaração da caducidade da marca registada, o titular do registo deve assumir o ónus de provar que a marca foi utilizada e que não existe situação de falta de utilização séria durante 3 anos consecutivos (vide Artigo 232.º, n.º 3 e 5), em vez de provar que a marca registada tinha sido utilizada seriamente durante três anos consecutivos para evitar a declaração da caducidade, caso contrário, os legisladores também não estipulariam, ao mesmo tempo, que se houver motivo justo pela falta de utilização séria da marca durante 3 anos consecutivos, pode também através do início ou reinício da utilização evitar a declaração da caducidade.
Neste caso, das declarações constantes na petição inicial e resposta ao teor, verifica-se que a recorrente não negou que durante a pandemia corona vírus (conforme declarado pelo recorrente que desde o final de 2019/início de 2020 até Fevereiro ou Março de 2023), não foram efectivamente distribuídos os produtos com a marca envolvida para distribuição em Macau. A recorrente considera que isto pertence “justo motivo” da falta de utilização séria da marca durante três anos consecutivos, no entanto, a entidade recorrida não acompanha com este ponto de vista e apresentou a análise seguinte:
“...A respondente afirmou que a pandemia corona vírus foi um factor de força maior que provocou restrições muito significativas ao funcionamento e desenvolvimento da sua empresa. Conforme disposto no artigo 231.º, n.º 1, alínea b) do "Regime Jurídico da Propriedade Industrial", o registo de marca caduca pela falta de utilização séria durante 3 anos consecutivos. De facto, a respondente não forneceu, em qualquer momento antes e depois da pandemia, documentos para provar a utilização séria da respectiva marca em Macau. Além disso, para que a pandemia corona vírus constitua força maior, necessita de existir nexo de casualidade directa entre a pandemia e a utilização da marca em Macau. A pandemia podia eventualmente ter causado restrições ao funcionamento e desenvolvimento da empresa, mas não constituiu directamente um obstáculo à utilização da marca pela empresa em Macau. Sendo assim, não constitui nexo de casualidade directa entre a pandemia corona vírus e a utilização da marca pela respondente em Macau, posto isto a respondente não deve usar a pandemia corona vírus como justo motivo para não utilizar a marca.”
(Vide ponto 27 do Relatório n.º 376/DPI/DRM/2023)
Resulta do exposto que a entidade recorrida considera essencialmente que carecem dados concretos sobre a utilização da marca envolvida pela recorrente em Macau antes da pandemia corona vírus, bem como a pandemia corona vírus não constituiu um obstáculo à utilização dessa marca em Macau, por conseguinte, não permite determinar a existência de nexo de casualidade directa entre a pandemia corona vírus e a não utilização da marca envolvida, sendo assim não constitui justo motivo para não utilizar a respectiva marca.
Com absoluto respeito por melhor opinião sobre a mesma questão, o presente tribunal concorda que a análise acima feita pela entidade recorrida é correcta, pois não existem as contradições e os erros alegados pela recorrente.
Sendo certo que a pandemia corona vírus restringiu a entrada e saída de Macau e das regiões vizinhas, mas as actividades comerciais, embora limitadas, não eram absolutamente proibidas. Como todos sabemos, entre Fevereiro de 2020 e o início de 2023, as actividades comerciais em Macau foram, em certa medida, afectadas devido à pandemia corona vírus, contudo não estavam completamente paralisadas, embora a importação e a exportação das mercadorias tinham sido complicadas e demoradas do que antes, mas mantinham, a fim de garantir que a sociedade possa continuar a funcionar. Assim sendo, a pandemia corona vírus fez com que a recorrente tivesse de ajustar a decisão dos negócios, designadamente, não conseguiu implementar efectivamente o plano de negócios, bem como só depois de cancelar todas as restrições de entrada e saída é que poderia replanear e retomar as vendas dos produtos transportados para Macau, isto é obviamente uma consideração comercial puramente subjectiva da recorrente, não podendo assim considerar que a pandemia corona vírus constituiu um obstáculo objectivo que impediu a recorrente de utilizar a marca.
Tal como o entendimento perspicaz do acórdão do venerado TSI n.º 39/2014 (22 de Maio de 2014):
“...Por outro lado, só constitui motivo justo para o não uso aquele motivo que não tenha permitido a uma pessoa normal, diligente e devidamente informada e cuidadosa cumprir as obrigações que impendem sobre ela.
Existe justo motivo quando o não uso não provém da vontade do titular do registo, nem lhe é imputável a título de mera culpa. Dito de outra forma, o justo motivo para o não uso da marca depende da ocorrência de circunstâncias independentes da vontade do titular, como são os casos de força maior (guerras, catástrofes naturais, etc.), ou de medidas de autoridades públicas proibindo a produção ou a comercialização dos respectivos produtos."
Por outro lado, o presente tribunal não concorda que através da simples assinatura de um acordo de cooperação comercial possa ser considerada como preenchimento da iniciativa de utilização séria de uma marca.
Tendo em conta que a parte contrária apresentou, em 6 de Março de 2023, pedido à Direcção dos Serviços de Economia e Desenvolvimento Tecnológico para declarar a caducidade do registo da marca em causa, e não tendo a recorrente conseguido provar com sucesso que durante o período de três anos antes da apresentação deste pedido, chegou pessoalmente ou através de pessoa por si autorizada ter utilizado a marca, bem como na falta de motivo justo, pelo que nos termos dos artigos 231.º, n.º 1, alínea b) e 232º, nºs 3 e 5 do “Regime Jurídico da Propriedade Industrial”, este tribunal julga improcedente a fundamentação do recurso contencioso interposto e mantém-se a decisão de declaração da caducidade do registo da marca nº: N/XX3.».
Nas suas alegações e conclusões de recurso a Recorrente continua a insistir na contradição existente nas decisões recorridas por se considerar a Pandemia um motivo justo mas a Recorrente ter de demonstrar o nexo de causalidade entre o não uso da marca e a Pandemia.
Salvo melhor opinião não assiste razão à Recorrente como facilmente decorre da leitura das decisões recorridas.
Aceita-se nas decisões recorridas que da Pandemia possam ter decorrido limitações e dificuldades para o exercício da actividade comercial, no entanto a Pandemia que afectou o planeta desde meados de 2020 a final de 2022 não é desculpa para tudo pelo simples facto de ter existido.
Como também resulta das decisões recorridas, e ali é dito, as actividades comerciais continuaram a acontecer em Macau. Acrescentariamos que se é certo que a maioria das actividades que dependem do turismo foram afectadas pela falta de clientes dada a limitação imposta de circulação de pessoas, o mesmo não aconteceu com outras actividades que visam a satisfação das necessidades da população e que continuaram a funcionar com base no mercado interno.
A marca em causa destina-se a comercializar produtos de café, cacau, chá, leite artificial, misturas destas bebidas, etc..
Durante a pandemia a população de Macau continuou a consumir estes produtos na mesma medida em que o fazia antes, tendo até de se limitar a adquirir os que fossem aqui comercializados dada a impossibilidade prática de se deslocar às regiões vizinhas para adquirir outros.
Devido à Pandemia a Recorrente deixou de poder importar para Macau os seus produtos por impossibilidade de circulação de mercadorias? Nada diz nem nada prova.
Durante a Pandemia os sujeitos que antes importavam os produtos da Recorrente deixaram de os adquirir porque não tinham mercados para eles? Nada diz nem nada prova.
Pela Pandemia as entidades que comercializavam os produtos da Recorrente tiveram de cessar a sua actividade comercial e por força disso os produtos da Recorrente deixaram de ser comercializados? Nada diz nem nada prova.
A Recorrente antes da Pandemia tinha um volume de negócios dos seus produtos em Macau que durante a Pandemia cessou? Nada diz nem nada prova.
É isto que resulta das decisões recorridas.
A Recorrente nem sequer alega nem demonstra que antes da Pandemia fizesse uso da marca nos termos em que a lei o exige.
Para que a Pandemia possa ser um motivo justificativo do impedimento de uso da marca é necessário que antes acontecesse alguma coisa que por causa dela deixou de acontecer.
Pese embora a Pandemia tenha afectado em muito o comércio mundial também não é desculpa, nem pode ser, para todos os males. Não basta invocar que a Pandemia aconteceu, é preciso saber o que é que ela afectou, o que é que por causa dela deixou de acontecer mas que antes acontecia, o que é que era e deixou de ser, o que é que mudou.
Este exercício por banda da Recorrente que, como sobejamente já se disse era ónus da Recorrente invocar e demonstrar, não se fez.
Nada tendo demonstrado a Recorrente quanto à utilização da marca nos termos do nº 5 do artº 232º do RJPI presume-se que aquela não é utilizada.
Destarte, as falhas que a Recorrente aponta às decisões recorridas são inexistentes e não procedem.
Pelo que, sem necessidade de outras considerações, acompanhando a decisão recorrida para cujos fundamentos remetemos e aos quais aderimos integralmente nos termos do nº 5 do artº 631º do CPC, impõe-se negar provimento ao recurso, mantendo aquela - a decisão recorrida -.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, negando-se provimento ao recurso mantém-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Registe e Notifique.
RAEM, 13 de Março de 2025
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)
Seng Ioi Man
(1o Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong
(2o Juiz-Adjunto)
823/2024 CÍVEL 1