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Processo n.º 165/2025
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Relator: Fong Man Chong
Data : 13 de Março de 2025

Assuntos:

- Acto de liquidação de imposto complementar passível de suspensão da sua eficácia

SUMÁRIO:

I – O acto que, no âmbito do procedimento tendente à liquidação do imposto complementar de rendimentos, fixa o respectivo rendimento colectável, é um acto que introduz uma alteração na ordem jurídica, na medida em que a situação do contribuinte, na sequência da prática desse acto, é diferente daquela que se verificava antes dessa prática, constituindo, por isso, um acto positivo e como tal é susceptível, em abstracto, de ser objecto de suspensão da sua eficácia.

II – Uma vez que a Recorrente não logrou demonstrar, nem sequer sumária ou perfunctoriamente, como é próprio dos juízos próprios da tutela cautelar, que a efectivação da liquidação do imposto complementar com a constituição da obrigação de proceder ao seu pagamento é susceptível de ter implicações na sua situação financeira que comprometam a sobrevivência da própria empresa de que é proprietária com as indesejáveis implicações daí decorrentes (v. g. para os seus trabalhadores e para os seus credores) (por exemplo, não alegou e de modo minimamente substanciado, qual a sua concreta actividade, qual o volume da sua facturação num período temporal relevante, qual o número dos seus trabalhadores, qual o seu volume do seu cash-flow, qual a expressão do seu património mobiliário e imobiliário, incluindo aplicações financeiras, etc), o que demonstra que a Recorrente não desincumbiu do ónus que sobre ela recaía de concretizar e demonstrar sumariamente os prejuízos tidos como prováveis e difíceis de reparação nos termos exigidos pela alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC, eis a razão bastante para indeferir o pedido da suspensão da eficácia do acto de liquidação em causa.


O Relator,

_______________
Fong Man Chong







Processo n.º 165/2025
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Data : 13 de Março de 2025

Recorrente : A Limitada (A有限公司)

Recorrida : Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos da Direcção dos Serviços de Finanças (財政局所得補充稅複評委員會)

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    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I - RELATÓRIO
A Limitada (A有限公司), devidamente identificada nos autos, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, datada de 22/01/2025, veio, em 11/02/2025, recorrer jurisdicionalmente para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 156 a 178, tendo formulado as seguintes conclusões:
- O presente recurso jurisdicional é tempestivo;
- Ficou e está assente que a Recorrente foi notificada da fixação do rendimento do imposto complementar de rendimentos;
- Na sequência da notificação da deliberação de fixação de rendimentos foi, de igual modo, notificada para liquidar o remaneceste no valor de MOP$5,061,891.00, acrescido de juros até ao dia 02 de Janeiro de 2025;
- Que nessa data, ao invés de proceder a liquidação exigida, requereu a suspensão de eficácia do acto de liquidação em causa;
- Milita a favor da mesma o facto de ter liquidado a quantia de MOP$1,123,580.00, baseado na declaração por si apresentada;
- A Entidade Recorrida, intoduziu, com a fixação do prazo de 2 de Janeiro de 2025 para a liquidação do imposto devido, modificação na ordem jurídica susceptível de execução;
- E, como tal, o referido acto CONSTITUI ACTO ADMINISTRATIVO DE CONTEÚDO POSITIVO, nos termos e para os efeitos do artigo 120º do CPAC, e;
- A suspensão da eficácia dos actos administrativos constitui um procedimento cautelar, por ser uma medida destinada a prevenir os perigos do natural curso de qualquer acção.
NESTES TERMOS, deverá a decisão do Tribunal Administrativo, de fls. 122 a 129; ser revogada e, consequentemente, decretar em conformidade a suspensão de eficácia do acto administrativo em causa, nos termos do disposto nos artigos 120.º e seguintes do CPAC.
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A Recorrida, Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos da Direcção dos Serviços de Finanças (財政局所得補充稅複評委員會), veio, 20/02/2025, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 187 a 193, tendo alegado o seguinte:
1. É entendimento pacífico, como se lê na sentença recorrida, que é o acto de liquidação, como decisão final do procedimento tributário, que "afecta imediatamente a esfera patrimonial do contribuinte, fixando a posição final da administração tributária perante este (...) pelo que, em regra, será apenas ele o acto lesivo e contenciosamente impugnável."
2. Ou seja, é do acto de liquidação, e não do acto de fixação da matéria colectável, que deriva para o contribuinte a obrigação fiscal.
3. O acto de fixação limita-se a formar a base quantitativa daquele acto final, sem impor qualquer obrigação ou limitação ao contribuinte, pelo que, ao contrário do acto de liquidação, é insusceptível de sustentar qualquer espécie de execução.
4. Pelo que, como se lê e bem na sentença recorrida, não servindo o acto de fixação de título executivo, "mal se compreende o recurso ao procedimento cautelar de suspensão de eficácia para impedir a sua execução tornando-se forçoso concluir pela sua insusceptibilidade de suspensão de eficácia em face da interpretação conjugada dos art.ºs 136.º, 140.º do CPA e 120.º,121.º, n.º 1, al) a) do CPAC."
5. Ou seja, a decisão da entidade recorrida que manteve o rendimento colectável fixado à aqui recorrente, por não ter introduzido modificações na ordem jurídica susceptíveis de execução, não constitui acto administrativo de conteúdo positivo (ou negativo com vertente positiva) para os efeitos do art.º 120.º do CPAC, sendo pois insusceptível de suspensão de eficácia pelo meio processual usado pela recorrente.
6. Por outro lado, deve improceder também o pedido da recorrente por falta de verificação cumulativa dos requisitos da suspensão de eficácia, conforme o disposto no artigo 121.º do CPAC.
7. Com efeito, é ponto assente na doutrina e na jurisprudência que nos autos, como o presente, de pedido de suspensão de eficácia de um acto administrativo, cabe ao requerente provar estarem preenchidas as circunstâncias de facto e de direito que justificam o procedimento cautelar requerido.
8. Requisitos e pressupostos que constam, essencialmente, do que vem disposto nos artigos 120º e 121º do CPAC, maxime do nº 1 do seu artigo 121º, sendo também uniforme o entendimento doutrinal e jurisprudencial de que, não só cabe à requerente do pedido da suspensão de eficácia o ónus da prova que sustenta o seu pedido, como são cumulativos os requisitos enunciados nesta última disposição - v., por todos, o Acordão do Tribunal de Última Instância, Processo nº 6/2001).
9. Sendo cumulativos tais requisitos e encontrando-se do lado do peticionante o ónus da sua prova, à entidade recorrida basta demonstrar a inexistência de um único destes requisitos para que seja declarada improcedente a presente providência: coincidentemente, é enfatizando o requisito da alínea a) do nº 1 do artigo 121º do CPAC que a recorrente pretende sustentar a sua pretensão e a entidade recorrida demonstrar que, precisamente por faltar esse requisito, a sua pretensão não pode proceder.
10. Cabe, desde logo, salientar que o fundado receio há-de corresponder a uma prova, a cargo da Recorrente, de que tais consequências são suficientes prováveis para que se possa considerar justificada a cautela que é solicitada.
11. Ou seja, por lei, só será concedida - a suspensão de eficácia dos actos administrativos - quando por base de circunstâncias concretas (pois, em caso algum possa decidir com base em critérios abstractos) se verifiquem cumulativamente os requisitos legais para o efeito.
12. O que, na nossa opinião e da sentença recorrida, não foi possível demonstrar pela Recorrente (e que constitui seu ónus) no seu requerimento, incluindo os demais documentos que se juntou.
13. A alínea a) do nº 1 do artigo 121º do CPAC determina que a suspensão de eficácia do acto administrativo é concedida pelo Tribunal quando "a execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso".
14. Está estabelecido que o que seja "prejuízo de difícil reparação" é determinado face às circunstâncias concretas de cada caso. Mas, tradicionalmente, considera-se de difícil reparação o prejuízo insusceptível de avaliação patrimonial. Que é, exactamente, a situação oposta à que é objecto da presente providência, uma vez que o que pretende o recorrente é a suspensão de acto administrativo que o obriga ao pagamento de uma quantia certa e determinada - o montante do imposto em falta.
15. Para além do já mencionado Acórdão do Tribunal de Última Instância proferido no Proc. 6/2001, veja-se o que a este respeito indica o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 21/2/2001, no Proc. nº 190/01/A: mesmo com alguma liberalização de conceitos, é liquido dizer-se que, em regra, o prejuízo susceptível de avaliação económica é, de per se, sempre susceptível de reparação, donde resulta que, em princípio, qualquer custo fiscal, como o presente, que haja que ser discutido entre Administração e contribuinte é sempre susceptível de ser reparado.
16. É sabido que a Administração, não só persiste em excedentes orçamentais anuais recorrentes, como ainda tem constituídas reservas financeiras que lhe permitiriam, fosse esse o caso, satisfazer créditos indemnizatórios como o que resultaria para a contribuinte, no caso improvável de o Tribunal a favorecer na acção principal, durante muitos anos, pelo que é virtualmente isenta de risco a possibilidade de o prejuízo resultante de qualquer deficiente interpretação da lei fiscal por parte da Administração Fiscal não ser integralmente satisfeito.
17. A natureza monetária do custo fiscal contestado pela recorrente e a invejável situação financeira da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) são elementos concretos que desde logo - e no seguimento do entendimento da doutrina e da jurisprudência assinalada - excluiria a presente acção do âmbito de aplicação da alínea a) do nº 1 do artigo 121º do CPAC, posto que o denominado "prejuízo" será sempre susceptível de fácil reparação.
18. Ainda que assim, no caso "sub judice", não se entendesse - hipótese que sem conceder e só por mera cautela se admite - caberia à recorrente demonstrar, o que não fez, como diz e bem a sentença recorrida, que o prejuízo que se verificará na sua situação em concreto seria de tal modo que a normal e imediata execução do acto acarretaria consequências irreversíveis, no sentido em que a reparação posterior através de indemnização ou outra forma de ressarcimento dos interesses que fossem afectados já não se pudesse concretizar na altura em que fosse dirimida a questão jurídica principal que o opõe à Administração Fiscal.
19. Como se lê na douta sentença "as simples alusões aos rendimentos dos últimos anos e ao montante de imposto devido não permitem ao Tribunal avaliar objectivamente a insustentabilidade do comércio exercido pela Requerente."
20. Continuando, mesmo que se colocasse a situação futura de uma sentença de provimento relativamente aos autos de recurso contencioso que corre termos naquele Tribunal, bem pode afirmar-se, em nosso entender, que em caso algum pode tal sentença vir a ser inútil.
21. Pois, sublinhe-se que está previsto no ordenamento jurídico da RAEM o Regime geral da anulação e restituições das contribuições e impostos (Decreto-lei n.º 16/85/M, de 2 de Março), precisamente para os casos em que venham a revelar-se como tendo sido indevidamente cobradas e daí se opera a restituição.
22. Isto é, caso seja determinado, posteriormente, por decisão do Tribunal competente, a anulação total ou parcial de colectas de impostos, será restituído o montante indevidamente cobrado à ora Recorrente.
23. Sendo assim - não havendo razões para recear que a hipotética sentença de provimento venha a ser inútil, resultante do decurso do tempo e da execução do acto administrativo - afigura-se-nos que os requisitos previstos na lei não estão preenchidos.
24. Reitera-se, deste modo, que a utilidade da sentença é na mesma assegurada após decorrer o tempo necessário para fazer a Justiça, pelo que não é justificado nem compreensivo a cautela que agora é solicitada pela Recorrente.
25. No que concerne à grave lesão do interesse público prosseguido pelo acto - cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC - que a recorrente alega não ser afectado pela sua suspensão, sempre se dirá que a suspensão de qualquer acto administrativo lesa, em princípio, o interesse público. O que importa apurar em concreto é se tal lesão é grave.
26. A falta de pagamento do imposto devido, pelo ora recorrente, colocará em causa o princípio da igualdade – cfr. artigo 5.º do CPA - e lesa gravemente o interesse público prosseguido pela Administração face a contribuintes que exercem as mesmas actividades económicas e que honestamente e em devido tempo pagaram o imposto devido.
27. Acresce que a capacidade financeira do recorrente é demonstrada pela manutenção da sua actividade desde a prática dos actos cuja execução agora pretende ver suspensa, sendo manifesto que o facto de a Administração ficar a aguardar pela decisão judicial causará prejuízos à mesma, bem como aos restantes contribuintes, que optaram pelo cumprimento das suas obrigações fiscais, ainda que recorrendo à via contenciosa, o que lhes é facultado como garantia.
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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o douto parecer constante de fls. 205 a 208 dos autos, pugnando pelo improvimento do presente recurso jurisdicional.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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    III – FACTOS
São os seguintes elementos considerados assentes pelo TA, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
1. Em 15/08/2022, a Requerente apresentou a declaração do Imposto Complementar de Rendimentos – Grupo “A”, modelo M/1, para efeitos de fixação do imposto complementar de rendimentos referente ao exercício de 2021 (fls. 127 a 135 do P.A.).
2. Nessa declaração, a Requerente consignou que teve lucro tributável o resultado do exercício no valor de MOP$9.963.160,00 (fls. 132 do P.A.).
3. Em 16/08/2022, com base na declaração da Requerente, o Director dos Serviços de Finanças procedeu à liquidação do imposto, determinando a colecta no valor de MOP$1.123.580,00 (fls. 126 do P.A.).
4. Em 01/02/2024, com base nos elementos complementares solicitados à Requerente, a Administração Fiscal fixou o rendimento colectável no valor de MOP$52.132.932,00 (fls. 124 a 125v do P.A.).
5. Em 29/04/2024, o Director dos Serviços de Finanças procedeu à liquidação do imposto, determinando a colecta no valor de MOP$6.183.952,00 (fls. 124 do P.A.).
6. Em 29/04/2024, foi emitida a notificação de fixação de rendimento do imposto complementar de rendimentos, modelo M/5 (fls. 123 do P.A.).
7. Em 31/05/2024, a Requerente apresentou a reclamação contra o acto de fixação (fls. 28 a 29v do P.A.).
8. Em 19/09/2024, a Comissão de Revisão proferiu deliberação sobre a reclamação, mantendo no valor de MOP$52.132.932,00 o rendimento colectável fixado à Requerente para o exercício de 2021 (fls. 26 do P.A.).
9. Em 04/10/2024, foi emitida a notificação à Requerente da deliberação da Comissão de Revisão (fls. 25 do P.A.).
10. Em 12/11/2024, a Requerente interpôs recurso contencioso da deliberação da Comissão de Revisão (fls. 2 do Proc. n.º TA-24-3220-CFL).
11. Em 02/01/2025, a Requerente instaurou o presente procedimento cautelar (fls. 2 dos presentes autos).
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    IV - FUNDAMENTOS
Como o presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, importa ver o que este decidiu. Este proferiu a douta decisão com base nos seguintes argumentos:
     
I. Relatório
A LIMITADA (A有限公司), doravante designada por Requerente, melhor identificada nos autos, vem, com os fundamentos a fls. 2 a 23 dos autos, requerer a suspensão de eficácia da deliberação de 19/09/2024 da COMISSÃO DE REVISÃO DO IMPOSTO COMPLEMENTAR DE RENDIMENTOS DA DIRECÇÃO DOS SERVIÇOS DE FINANÇAS, doravante designada por Entidade Requerida, que, indeferindo a reclamação apresentada pela Requerente, manteve em MOP$52.132.932,00 o seu rendimento colectável referente ao exercício de 2021.
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Contestando, a fls. 110 a 116 dos autos, a Entidade Requerida defendeu ser negado provimento ao requerido.
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A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer, a fls. 118 a 121 dos autos, pugnando pelo indeferimento do pedido da Requerente, nos termos abaixo transcritos:
“檢察院,茲根據《行政訴訟法典》第129條第2款規定,發表意見如下:
聲請人A有限公司(A LIMITADA)針對被聲請實體財政局所得補充稅複評委員會於2024年09月19日作出駁回聲請人提出之申駁並維持評稅委員會作出的2021年度所得補充稅可課稅收益評定的決議(以下簡稱:“被聲請中止行為”),提起效力中止的保全措施。
經適當傳喚被聲請實體,其答辯中指出本案保全措施不符合《行政訴訟法典》第121條規定之要件。
首先,作為效力中止的保存措施的標的 – 聲請中止效力的行政行為,《行政訴訟法典》第120條規定兩種:一為具有積極內容;二為行為有消極內容,但亦有部分積極內容,而中止效力僅限於有積極內容的部分。所謂具有積極內容的行政行為,是指行為針對在作出該行為之前已存在的法律秩序作出改變,換言之,行為的效力導致私人先前已存在的權利義務範圍及法律秩序發生變化;這相對於純粹消極行為的情況:在此情況下,行為本身不會對已存在的法律狀況產生任何影響,包括創設新內容、變更或消滅。然而,即使面對消極行為,但倘若當中存在積極內容的部份,仍可針對該積極內容中止該行為的效力,這正是上述第二種情況,即二級積極效果(efeitos secundários positivos)的行政行為:消極行為當中包括了導致私人權利義務範圍發生改變的法律效果。
正如Dr. José Cândido de Pinho指出:“Acto positivo é todo aquele que altera a ordem jurídica existente no momento em que é praticado. Introduz modificações na ordem jurídica e nas posições jurídicas substantivas dos interessados em relação ao que antes dele (acto objecto do pedido) acontecia. ...O vocábulo “positivos” tem aqui um sentido mais vasto, de modo a cobrir qualquer invasão daquela esfera, tanto favorável, como negativamente. Quer dizer, também os actos desfavoráveis ao requerente são considerados actos positivos na acepção que aqui está em caus, na medida em que alteram um status anterior. Portanto, desde que o acto seja total ou parcialmente ablativo relativamente a uma situação anteriormente existente, desde que haja uma perda ou diminuição da posição jurídica substantiva do interessado requerente, esta5remos também perante um acto positivo como condição de acesso ao uso do meio de suspensão de eficácia.1”。
可見,只要是有關行政行為的內容導致當事人的權利義務狀況與先前者有改變,即為積極行為作為效力中止程序的標的,以使有關行為的“改變”效果予以中止,而不論行為本身是否具可執行性2。
在本案中,聲請中止效力的行政行為是對聲請人於2021年度的所得補充稅可課稅收益作出的評定,儘管有關評定行為並非立即使聲請人承擔支付稅款的後果,而需經過隨後的結算及徵收程序,然而,毫無疑問地,被聲請行為本身並非單純地按照法律直接規定的效果下作出確認性宣示,而是稅務當局作出評定的法律效果,並基於該評定續後作出相應的稅款結算。為此,被聲請中止之行為在法律上及事實上均對聲請人產生影響 – 可課稅收益的增加而變更了先前原有的(按先前已評定的課稅收益而支付稅款)法律及事實狀況。被針對的行政行為是一項積極行為,使聲請人的權利義務範圍存在變更,根據《行政訴訟法典》第120條b)項規定,可構成中止效力保存措施的標的。
《行政訴訟法典》第121條第1款規定必須同時符合下列要件才批准上述的保全措施:
a. 預料執行有關行為,將對聲請人或其在司法上訴中所維護的利益造成難以彌補的損失;
b. 中止行政行為之效力不會嚴重侵害該行為在具體情況下所謀求的公共利益;以及
c. 卷宗內無強烈跡象顯示司法上訴屬違法。
關於上述a項所規定的要件,其理由與保存措施本身的目的密切關係:結合《行政訴訟法典》第2條及第174條之規定,效力中止的保存措施目的是避免私人因日後提起的或現待決的司法上訴訴訟程序的拖延,導致即使獲得勝訴仍無法獲得執行判決應有的有用效果。為此,作為效力中止的保存措施的成立要件,首先必須符合的是可預料聲請人日後即使獲得勝訴,其在司法上訴中所維護的權利或法律保護的利益仍不能透過判決的執行而回復或難以回復。
本案中,聲請人主張倘按照被聲請中止行為的評定而支付有關稅款下,導致聲請人產生具有的財政限制,並面臨清算及解散聲請人公司,因此造成難以彌補損害。
除給予應有尊重及更好立場外,我們認為,聲請人所主張的所謂“損失”並不符合上述第121條a)項規定者。首先,聲請人純粹抽象及概括地指出其財務限制及面臨將倒閉的狀況,並無陳述具體事實指出其經營狀況、企業規模、其本身的財政狀況,包括收入來源及倘有的債務狀況、資金流轉以及該評稅決議如何及在哪一程度上對聲請人影響等等,再者,按照一般經驗法則及常理,商業企業的運作並不一定需要正資產大於負資產,而是正常的資金流動以準時履行第三人的債務或經營成本,誠然,聲請人並未具體陳述及證明該等事實。對於聲請人提交數年所得補充稅申報資料,充其量只能證明相聲請人於相應年度申報的企業收益及虧損狀況,無法證明其所主張的“財政限制”、甚至乎將可能倒閉的結論。
即使存在經濟損失,例如需透過借貸融資以支付將來的稅款而承擔利息開支,然而,難以確信該等損失是難以彌補。正如終審法院2001年4月25日第6/2001號合議庭裁判所指,只有當剝奪收益造成沉重的債務負擔、或產生幾乎絕對的困厄和不能滿足起碼和基本需要的狀況下,才視為難以彌補的經濟損失。
為此,我們認為,本案中不存在聲請人在日後的司法上訴中所維護的權利或法律保護的利益將遭受難以彌補的損失,不符合《行政訴訟法典》第121條第1款a)項的要件,無需分析其他要件是否成立。
基於此,我們意見認為本案保全措施理據不成立,建議不批准本案所請求的效力中止的保全措施。”
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II. Pressupostos processuais
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias, e detêm legitimidade ad causam.
O processo é o próprio.
Inexistem nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III. Fundamentação
I) Dos Factos
Com base nos elementos constantes do processo de que são apensos os presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão da causa:
(...)
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II) Do Direito
Face aos factos apurados, cumpre apreciar e decidir.
Ao abrigo do disposto nos art.ºs 136.º, n.º 2 e 140.º do CPA, o acto administrativo goza do privilégio de execução prévia, no sentido de que o cumprimento das obrigações e o respeito pelas limitações dele derivadas podem ser impostos coercivamente pela Administração sem recurso prévio aos tribunais, sendo inadmissíveis embargos em relação à sua execução coerciva, sem prejuízo do disposto na lei em matéria de suspensão da eficácia dos actos.
Reconhece-se, assim, a autotutela executiva da Administração quanto aos actos administrativos que implicam execução, i.e., de que resultam deveres ou limitações para particulares, cuja imposição coerciva deverá fazer-se pelos meios estabelecidos em lei, mormente, pelas formas previstas nos art.ºs 142.º a 144.º do CPA.
Fala-se, pois, do acto administrativo como título executivo, visto que constitui “um acto que sustenta, por si só, a execução do comando ou medida nela contida sem necessidade de prévia declaração judicial da sua conformidade jurídica” (Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª ed., Almedina, 1998, p. 699).
Importa realçar que nem todos os actos administrativos detêm a referida função tituladora, tal como nem todos os actos jurisdicionais podem servir de base à execução. Veja-se, a este respeito, o art.º 677.º, al. a) do CPC, que só atribui força executiva às sentenças condenatórias.
Não sendo admitidos embargos, a única maneira de impedir a execução coerciva dos actos administrativos consiste na suspensão da sua eficácia (art.º 140.º do CPA in fine).
Nesta perspectiva, o meio processual da suspensão de eficácia de actos administrativos, regulado pelos art.ºs 120.º e seguintes do CPAC, e revestido de natureza cautelar, tem por objectivo obviar a que a Administração execute o respectivo acto administrativo, impondo por sua própria autoridade e força a observância das obrigações ou limites estabelecidos no acto (cfr. Ac. do TUI, de 13/01/2021, proc. n.º 212/2020, e Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, ob. cit., pp. 709 a 711).
A função visada por esta providência cautelar – de impedir a execução dos actos administrativos que, como é lógico, implicam execução – revela-se também pela disposição da al. a) do n.º 1 do art.º 121.º do CPAC, segundo a qual a suspensão de eficácia dos actos apenas é concedida quando “a execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso” (sublinhado nosso).
É sob este prisma que se deve interpretar a condição da susceptibilidade de suspensão de eficácia a que se reporta o art.º 120.º do CPAC. No fundo, ao reservar o uso deste meio processual à reacção contra uma modificação introduzida na ordem jurídica por um acto de conteúdo positivo (ou de conteúdo negativo, mas com vertente positiva), o legislador configurou-o como instrumento de impedir a execução dos actos administrativos que imponham obrigações ou limitações a particulares. Serão estes actos, reputados como títulos executivos, susceptíveis de ser objecto do dito procedimento cautelar.
In casu, vem a Requerente pedir a suspensão da eficácia da deliberação da Entidade Requerida que, em sede de reclamação, manteve o rendimento colectável fixado à Requerente para o exercício de 2021.
Salvo o devido respeito, não se afigura susceptível de suspensão de eficácia o acto de fixação/manutenção do rendimento colectável.
É certo que a decisão de avaliação da matéria colectável, como é o caso sub judice, define uma situação jurídica no âmbito das relações inter-subjectivas e assume, por comando legal especial (no caso vertente, por força do art.º 80.º, n.º 2 do Regulamento do Imposto Complementar de Rendimentos), a natureza de acto destacável para efeitos de impugnação contenciosa, justificada pela evidente relação de prejudicialidade entre tal decisão interlocutória e a decisão final de liquidação (cfr. a nível da jurisprudência comparada, Ac. do STA, de 06/07/2011, proc. n.º 422/11).
Porém, não se pode olvidar que do que se trata é de um acto preparatório inserido no procedimento tributário tendente à liquidação do tributo. Se a liquidação consiste na “aplicação da taxa do imposto à matéria colectável já determinada, culminando com a determinação da quantia que se tem de entregar ao Estado”, é indiscutível que o acto de fixação da matéria colectável serve de pressuposto ao acto de liquidação, na medida em que visam criar as condições necessárias para que a resolução final seja adoptada. É esta a eficácia, e a única utilidade, de um acto de fixação da matéria colectável conexionado com a liquidação de determinado tributo (cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, vol. I, 6ª ed., Área Editora, 2011, pp. 470 a 473 e 501, Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo III, Dom Quixote, 2007, p. 96).
Entende-se, de forma pacífica, que é o acto de liquidação, como decisão final do procedimento tributário, que “afecta imediatamente a esfera patrimonial do contribuinte, fixando a posição final da administração tributária perante este, definindo os seus directos ou deveres, pelo que, em regra, será apenas ele o acto lesivo e contenciosamente impugnável” (cfr. Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., pp. 467 e 468).
Constata-se, desta maneira, que é do acto de liquidação, e não do acto de fixação da matéria colectável, que deriva para o contribuinte a obrigação fiscal, cujo incumprimento no prazo fixado dará lugar à cobrança coerciva mediante execução fiscal (art.º 142.º, n.º 1 do CPA). Ou seja, o acto administrativo que serve de título executivo e, como tal, pode e deve ser executado é a liquidação.
O acto de fixação da matéria colectável, por sua vez, limita-se a formar a base quantitativa daquele acto final, sem impor qualquer obrigação ou limitação ao contribuinte, daí a impossibilidade de sustentar qualquer espécie de execução. Não servindo o acto de título executivo, mal se compreende o recurso ao procedimento cautelar de suspensão de eficácia para impedir a sua execução. Torna-se, por isso, forçoso concluir pela sua insusceptibilidade de suspensão de eficácia em face da interpretação conjugada dos art.ºs 136.º, 140.º do CPA e 120.º, 121.º, n.º 1, al. a) do CPAC.
Admitindo embora que tal acto preparatório inova no seio do ordenamento jurídico na medida em que define uma situação jurídica que não existia, mas nem por isso se deve qualificá-lo como acto de conteúdo positivo (ou de conteúdo negativo, mas com vertente positiva) para os efeitos do art.º 120.º do CPAC. Aliás, toda a eficácia jurídica é, por natureza, inovadora, no sentido de que acrescenta algo ao mundo jurídico preexistente (cfr. Mário Aroso de Almeida, Teoria Geral do Direito Administrativo, 4ª ed., Almedina, 2017, pp. 202 e 206). O que importa ter presente é que a inovação por ele introduzida reside numa mera quantificação que, sem o acto consequente de liquidação, em nada afectaria a esfera jurídica do contribuinte. Por si mesmo, não se introduzem na ordem jurídica modificações susceptíveis de execução.
Por fim, merece referência que a disposição do art.º 44.º, n.º 3 do RICR – nos termos do qual “a impugnação da fixação do rendimento colectável tem efeito suspensivo” – não dá azo à susceptibilidade de suspensão de eficácia do acto ora em apreço, já que, salvo melhor opinião, aquilo que se suspende com a apresentação da reclamação não é a eficácia do próprio acto de fixação do rendimento colectável, mas sim o andamento do procedimento tributário. Com isso pretende-se que, até ser decidida pela Comissão de Revisão a impugnação graciosa da fixação, não prossiga o procedimento com a prática do acto de liquidação que tenha por suporte o rendimento colectável fixado.3 Quanto à impugnação contenciosa da decisão proferida pela Comissão de Revisão, chama-se atenção para o art.º 85.º do RICR, que prevê com clareza que “o recurso contencioso tem efeito meramente devolutivo”.
Resumindo e concluindo, a decisão da Entidade Requerida que manteve o rendimento colectável fixado à Requerente para o exercício de 2021, por não ter introduzido modificações na ordem jurídica susceptíveis de execução, não constitui acto administrativo de conteúdo positivo (ou de conteúdo negativo mas com vertente positiva) para os efeitos do art.º 120.º do CPAC, daí ser insusceptível de suspensão de eficácia pelo meio processual em exame.
*
Sem prejuízo do acima expendido, sempre improcede o pedido da Requerente por falta de verificação cumulativa dos requisitos da suspensão de eficácia.
À luz do n.º 1 do art.º 121.º do CPAC:
“1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.”
A jurisprudência tem reiterado que os requisitos contemplados nas diversas alíneas supracitadas são de verificação cumulativa, bastando a não verificação de um deles para que a providência não seja decretada, salvo nas situações previstas nos n.ºs 2, 3 e 4 do citado artigo.
O requisito indicado na al. a) reporta-se ao prejuízo de difícil reparação, causado pela execução do acto administrativo.
Conforme asseverado pelo Venerando TUI “o dano susceptível de quantificação pecuniária pode ser considerado, em certas situações, de difícil reparação para o requerente, sendo de considerar ainda como tal os casos em que a avaliação dos danos e a sua reparação, não sendo de todo em todo impossíveis, podiam tornar-se muito difíceis, os prejuízos decorrentes de actos que determinem a cessação do exercício da indústria, comércio ou actividades profissionais livres bem como consistentes na privação de rendimentos geradora de uma situação de carência quase absoluta e de impossibilidade de satisfação das necessidades básicas e elementares.
Mesmo que o interessado sofra danos com a execução de um acto administrativo, se lograr obter a anulação do acto no respectivo processo, pode, em execução de sentença, ser indemnizado dos prejuízos sofridos. E se esta via não for suficiente pode, ainda, intentar acção de indemnização para ressarcimento dos prejuízos. Por isso, só se os prejuízos forem de difícil reparação, isto é, que não possam ser satisfeitos com a utilização dos falados meios processuais, é que a lei admite a suspensão da eficácia do acto.” (cfr. entre outros, Ac. do TUI, de 22/02/2023, proc. n.º 9/2023)
Tem-se entendido também que “cabe ao requerente o ónus de alegar e provar os factos integradores do conceito de prejuízo de difícil reparação, fazendo-o por forma concreta e especificada, através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objectivos, não bastando alegar a existência de prejuízos, não ficando tal ónus cumprido com a mera utilização de expressões vagas e genéricas irredutíveis a factos a apreciar objectivamente”. (cfr. entre outros, Ac. do TUI, de 30/07/2019, proc. n.º 71/2019)
No caso vertente, alegou a Requerente que o pagamento do imposto alegadamente devido constrangerá significativamente a sua liquidez financeira, comprometerá seriamente a continuidade da sua actividade comercial e, além disso, afectará negativamente a diversificação económica que se deseja em Macau.
Se bem que a cessação do exercício do comércio possa eventualmente fundar a suspensão pretendida, a sua demonstração não se basta com alegações genéricas e vagas como as feitas pela Requerente. As simples alusões aos rendimentos dos últimos anos e ao montante do imposto devido não permitem ao Tribunal avaliar objectivamente a insustentabilidade do comércio exercido pela Requerente.
Ademais, um prejuízo quantificável que, no caso de proceder o recurso contencioso interposto pela Requerente, será ressarcido com a execução da sentença, não se mostra irreparável ou de difícil reparação. Só o seria se a Requerente não pudesse obter a reparação daquele o prejuízo através do recurso contencioso de anulação ou de outros meios processuais como seja a acção de indemnização.
Relativamente à influência negativa sobre a diversificação económica da Região, não se trata, como é evidente, de um prejuízo sofrido pela própria Requerente.
Na ausência de prejuízo de difícil reparação, há que indeferir o pedido da Requerente.
***
IV. Decisão
Face ao exposto, indefere-se o pedido de suspensão de eficácia deduzido pela Requerente A LIMITADA (A有限公司).
*
Custas pela Requerente, com taxa de justiça fixada em 5 UC.
*
Registe e notifique.
*
Quid Juris?
Relativamente às questões suscitadas neste recurso, o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI teceu as seguintes doutas considerações:
“(...)
1.
A Limitada, sociedade comercial melhor identificada nos autos, requereu a suspensão de eficácia do acto praticado pela Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos da Direcção dos Serviços de Finanças que manteve a de fixação do seu rendimento colectável referente ao ano de 2021 em MOP$52.132.932,00.
Por douta sentença proferida pela Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo e que se encontra a fls. 122 a 129 dos presentes autos, foi indeferido o pedido de suspensão de eficácia.
Inconformada com o assim decidido, veio a Requerente interpor o presente recurso jurisdicional perante o Tribunal de Segunda Instância, pedindo a revogação da sentença.
2.
(i)
Da leitura da douta decisão recorrida resulta que o indeferimento do pedido de suspensão de eficácia assentou, no essencial, em dois fundamentos:
(i.1) por um lado, a Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo considerou que citamos, «a decisão da Entidade Requerida que manteve o rendimento colectável fixado à Requerente para o exercício de 2021, por não ter introduzido modificações na ordem jurídica susceptíveis de execução, não constitui acto administrativo de conteúdo positivo (…) para os efeitos do artigo 120.º do CPAC, daí ser insusceptível de suspensão de eficácia pelo meio processual em exame»;
(i.2) por outro lado, subsidiariamente, a Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo considerou que não foi demonstrada a existência de prejuízo de difícil reparação e, portanto, o requisito para o decretamento da providência a que alude o artigo 121.º, n.º 1, alínea a) do CPAC.
Vejamos.
(ii)
Quanto ao primeiro dos indicados fundamentos da douta decisão recorrida, com todo o respeito, não nos parece de acompanhar. Em apertada síntese, pelo seguinte.
De acordo com o disposto no artigo 22.º do CPAC, o recurso contencioso não tem, em regra, efeito suspensivo da eficácia do acto administrativo recorrido. No entanto, porque a execução desse acto pode implicar lesão grave e dificilmente reparável para o particular, a lei faculta-lhe um meio processual de natureza cautelar que é, justamente, o procedimento de suspensão de eficácia de actos administrativos.
Segundo se preceitua na norma do artigo 120.º do CPAC, a eficácia de actos administrativos pode ser suspensa quando os actos tenham conteúdo positivo ou, tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente. Trata-se, é bom de ver, de uma exigência que resulta natureza das coisas. Na verdade, a suspensão da eficácia é uma providência de natureza conservatória, que visa paralisar os efeitos inovatórios que determinado acto visa introduzir na ordem jurídica, no sentido de que a situação se mantenha como estava antes de o acto ter sido praticado. Por isso, a suspensão de eficácia só faz sentido em relação a actos de conteúdo positivo, ou seja, actos que introduzem uma modificação juridicamente relevante na ordem jurídica pré-existente, não, portanto, em relação a acto de conteúdo negativo, na exacta medida em que estes deixam intocada aquela situação: como estava assim ficou. É por isso que a suspensão da eficácia serve para proteger cautelar os interesses de quem, no recurso contencioso, visa obter uma sentença de anulação ou de declaração de nulidade de um acto administrativo de conteúdo positivo (assim, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA/CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Coimbra, 2022, p. 969).
Ora, o acto que, no âmbito do procedimento tendente à liquidação do imposto complementar de rendimentos, fixa o respectivo rendimento colectável, é, a nosso modesto ver, um acto que introduz uma alteração na ordem jurídica, na medida em que a situação do contribuinte, na sequência da prática desse acto é diferente daquela que se verificava antes dessa prática, constituindo, por isso, um acto positivo. Sendo assim, esse acto é susceptível, em abstracto, de ver a sua eficácia suspensa. Na verdade, na formulação que se colhe na jurisprudência portuguesa, sempre que o acto tenha provocado uma modificação de uma determinada situação de facto ou de direito em relação ao Requerente, objecto do pedido de suspensão de eficácia (assim, acórdão do STA de 24.04.2022, processo n.º 0330/02 apud VIRIATO LIMA/ÁLVARO DANTAS, Código de Processo Administrativo Contencioso Anotado, RAEM, 2015, p. 341).
Não nos parece, com todo o respeito, que o procedimento da suspensão de eficácia tenha o seu campo de aplicação limitado aos chamados actos impositivos aos particulares de deveres de entrega de coisa, de prestação de facto ou de pagamento de quantia, cuja inobservância pode desencadear a respectiva execução coerciva por parte da Administração. Basta pensar no exemplo do acto de adjudicação de um contrato administrativo. Como é manifesto o acto de adjudicação não é um acto impositivo. Trata-se, no entanto, de um acto que introduz, de forma inovadora, uma modificação na ordem jurídica que pode ser paralisada através de um pedido de suspensão de eficácia, impedindo, precisamente a sua execução por parte da Administração, isto é a concretização, no plano do direito ou dos factos da definição jurídica autoritária contida em determinado acto administrativo, no caso da adjudicação, corresponde à celebração do contrato adjudicado (neste sentido, VIRIATO LIMA/ÁLVARO DANTAS, Código…, p. 341 e, na jurisprudência, o acórdão do TUI de 27.09.2018, processo n.º 69/2018). Da mesma forma, em relação aos actos que indeferem pedidos de renovação da autorização de residência cuja suspensão de eficácia tem sido unanimemente aceite pelos nossos Tribunais (veja-se na jurisprudência comparada o interessante caso em que foi admitida a suspensão de eficácia do acto de inscrição de um prédio na matriz predial que, manifestamente, não é um acto impositivo de deveres ou obrigações: cfr. ac. do STA de 27.11.2013, processo n.º 1725/13, disponível online)
O ponto essencial é, parece-nos, este. O que releva no pedido de suspensão de eficácia é sua aptidão para conservar a situação como estava antes da prática do acto de modo a evitar que os seus efeitos se concretizem, é dizer, se executem. Assim, podemos dizer serem, em geral, susceptíveis de execução de eficácia todos os actos, cujos efeitos, se a regra contida no artigo 22.º fosse a contrária, seriam paralisados pela mera interposição de recurso contencioso que os tivesse por objecto. Isto, pela simples razão de que o procedimento de suspensão de eficácia só encontra justificação no facto de o recurso contencioso não ter, em regra, efeito suspensivo.
Ora, se estamos a ver bem, a suspensão da eficácia do acto que fixa a matéria colectável, sobretudo quando está em causa uma correcção em desfavor do contribuinte, visa, justamente, conservar a situação anterior a essa fixação, impedindo que, no pressuposto da eficácia desta, a Administração, neste sentido, a execute, praticando o acto de liquidação do imposto complementar com base nessa fixação, podendo até dizer-se que a abstenção por parte da Administração da liquidação do imposto, é materialmente equivalente à suspensão da eficácia própria liquidação quando esta se mostre efectuada (que isto é indiscutivelmente assim, quer dizer, que o de fixação da matéria colectável é, por natureza, susceptível de suspensão de eficácia é o que se colhe no direito português, por exemplo, da norma do artigo 89.º-A, n.º 7 da Lei Geral Tributária onde se prevê que da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante desse artigo cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo. Como é bom de ver este efeito suspensivo do recurso tem justamente o alcance de uma suspensão de eficácia do acto, pois que o que dele resulta é que, enquanto o recurso judicial estiver pendente os efeitos da fixação da matéria colectável ficam suspensos ou paralisados, não podendo a Administração concretizar a liquidação do imposto com base nessa fixação, ou seja, não podendo a Administração dar execução, neste sentido).
Trata-se, pois, em nosso modesto entendimento, de um acto positivo e, portanto, susceptível, em abstracto, de ver a sua eficácia suspensa (de resto, , com todo o respeito e admitindo que possamos estar em erro, quer-nos parecer que a proposta interpretativa restritiva contida na douta sentença recorrida em relação ao sentido e alcance da referência aos actos positivos constante da norma do artigo 120.º do CPAC e a implicação decisória de indeferimento da pretensão da Recorrente que dela foi extraída, tem, a nosso modesto ver e por razões que nos afiguram evidentes e que por isso não desenvolveremos, por referência a situações de que aquela que se encontra em litígio constitui exemplo, um efeito que, à luz do princípio da tutela jurisdicional efectiva contido no artigo 2.º do CPAC na dimensão cautelar, surge como indesejável, tendo em conta que, como a prática demonstra, em regra, os contribuintes, atacam contenciosamente o acto prejudicial ou destacável de fixação do rendimento colectável e não o acto final do procedimento, a liquidação do imposto, justamente porque as razões da sua discordância se dirigem contra aquele e não contra este, sendo que, obtendo a anulação do acto destacável daí resultará, como se sabe, a queda do acto de liquidação, enquanto acto consequente de um acto anulado).
(iii)
Quanto ao segundo fundamento da douta decisão recorrida, cremos que que é indiscutível o seu acerto.
Na verdade, a Recorrente não logrou demonstrar, sequer sumária ou perfunctoriamente, como é próprio dos juízos próprios da tutela cautelar, que a efectivação da liquidação do imposto complementar com a constituição da obrigação de proceder ao seu pagamento é susceptível de ter implicações na sua situação financeira que comprometam a sobrevivência da própria empresa de que é proprietária com as indesejáveis implicações daí decorrentes (v. g. para os seus trabalhadores e para os seus credores).
A Recorrente poupou-se a um esforço de concretização mínima na alegação do que considera ser o prejuízo irreparável que alega poder resultar da execução do acto, ou seja, da liquidação do imposto. Na verdade, a Recorrente não alegou por exemplo, e de modo minimamente substanciado, qual a sua concreta actividade, qual o volume da sua facturação num período temporal relevante, qual o número dos seus trabalhadores, qual o seu volume do seu cash-flow, qual a expressão do seu património mobiliário e imobiliário, incluindo aplicações financeiras, etc. Significa isto, como é patente, que a Recorrente não desincumbiu do ónus que sobre ela recaía de concretizar e demonstrar sumariamente os prejuízos tidos como prováveis e difíceis de reparação pelo que não se encontra preenchido o requisito a que alude a alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC.
Daí que, neste ponto, a douta sentença recorrida, neste ponto, não mereça qualquer reparo e deva, por isso, ser confirmada.
3.
Face ao exposto, salvo melhor opinião, parece ao Ministério Público que deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional.”
*
Quid Juris?
Concordamos com o douto parecer acima transcrito da autoria do Digno. Magistrado do MP junto deste TSI, que procedeu à análise de todas as questões levantadas e analisadas na sentença recorrida (que aceita a segunda parte de fundamentação da decisão, discordando da 1ª parte da argumentação), ao qual integralmente aderimos, sufragando a solução nela adoptada, limitamo-nos a sublinhar ainda os seguintes aspectos:
1) – O ponto essencial consiste no facto de a Recorrente não apresentar provas bastantes sobre o prejuízo que sofra e que seja de difícil reparação. É de frisar-se que o tipo de prejuízo invocado pela Requerente se concentra essencialmente no aspecto económico que, à luz da doutrina dominante, é quase sempre reparável se o recurso contencioso contra a decisão em causa vier a ser julgado procedente. Ou seja, não está demonstrado devidamente que o prejuízo sofrido pela Requerente é desproporcional e superior àqueles que da suspensão adviriam para o interesse público.
2) – Nesta óptica, como não se verifica o requisito exigido pelo artigo 121º/1-a) do CPAC, entendemos que a decisão recorrida não padece dos vícios imputados pela Recorrente, e nestes termos, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 (à excepção da parte discordada acima referida) do CPC, ex vi do preceituado no artigo 1º do CPAC, é de negar provimento ao presente recurso jurisdicional e manter a decisão recorrida (no sentido de indeferir o pedido de suspensão da eficácia da deliberação em causa).
*
Síntese conclusiva:
I – O acto que, no âmbito do procedimento tendente à liquidação do imposto complementar de rendimentos, fixa o respectivo rendimento colectável, é um acto que introduz uma alteração na ordem jurídica, na medida em que a situação do contribuinte, na sequência da prática desse acto, é diferente daquela que se verificava antes dessa prática, constituindo, por isso, um acto positivo e como tal é susceptível, em abstracto, de ser objecto de suspensão da sua eficácia.
II – Uma vez que a Recorrente não logrou demonstrar, nem sequer sumária ou perfunctoriamente, como é próprio dos juízos próprios da tutela cautelar, que a efectivação da liquidação do imposto complementar com a constituição da obrigação de proceder ao seu pagamento é susceptível de ter implicações na sua situação financeira que comprometam a sobrevivência da própria empresa de que é proprietária com as indesejáveis implicações daí decorrentes (v. g. para os seus trabalhadores e para os seus credores) (por exemplo, não alegou e de modo minimamente substanciado, qual a sua concreta actividade, qual o volume da sua facturação num período temporal relevante, qual o número dos seus trabalhadores, qual o seu volume do seu cash-flow, qual a expressão do seu património mobiliário e imobiliário, incluindo aplicações financeiras, etc), o que demonstra que a Recorrente não desincumbiu do ónus que sobre ela recaía de concretizar e demonstrar sumariamente os prejuízos tidos como prováveis e difíceis de reparação nos termos exigidos pela alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC, eis a razão bastante para indeferir o pedido da suspensão da eficácia do acto de liquidação em causa.
*
Tudo visto, resta decidir.
* * *
    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida do TA.
*
Custas pela Recorrente que se fixam em 6 UCs.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 13 de Março de 2025.
Fong Man Chong
(Relator)
Tong Hio Fong
(1º Juiz-Adjunto)
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(2º Juiz-Adjunto)
Mai Man Ieng
                 (Procurador-Adjunto do Ministério Público)
1 José Cândido de Pinho, NOTAS E COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO CONTENCIOSO VOLUME II, 第190至191頁。
2 在我們看來,對於一些行為的效力立即已產生且無需隨後的執行行為,例如廢止准照、解除社會房屋租賃合同、又或不予續期有關准照權利等,由於有關法律效果是源於該等行為而產生,又或即使直接源於法律規定的效果(參見中級法院2016年06月08日第179/2016/A號合議庭裁判的觀點),即使具有宣告性質的行政行為亦不應排除作為效力中止的標的。
3 Preceito semelhante encontra-se estabelecido no art.º 91.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária portuguesa, que deixa claro que o pedido de revisão da matéria tributável tem efeito suspensivo da liquidação do tributo, implicando que em causa está a suspensão do procedimento tributário, em vez da eficácia do próprio acto de fixação da matéria tributável. Acerca da ratio legis, cfr. Ac. do TCAS, de 24/05/2011, proc. n.º 04315/10 e, na doutrina, Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., p. 473.
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