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Processo nº 104/2025
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data do Acórdão: 27 de Março de 2025

ASSUNTO:
- Falência
- Caducidade do direito de requerer a falência


____________________
Rui Pereira Ribeiro












Processo nº 104/2025
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 27 de Março de 2025
Recorrente: A, Limitada
Recorridos: B1有限公司 e outros
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  B1有限公司,B2有限公司,B3有限公司,B4有限公司,B5有限公司,B6有限公司,B7有限公司,B8有限公司,B9有限公司,B10有限公司,B11有限公司,B12有限公司,B13有限公司,B14有限公司,B15有限公司,B16有限公司,B17有限公司,B18有限公司,B19有限公司,B20有限公司,B21有限公司,B22有限公司,B23有限公司,B24有限公司,B25有限公司,B26有限公司,B27有限公司,B28有限公司,B29有限公司,B30有限公司,B31有限公司,B32有限公司,B33有限公司,B34有限公司,B35有限公司 e B36有限公司, todos, com os demais sinais dos autos,
  Vieram requerer a falência de
  A, Limitada, também, com os demais sinais dos autos.
  Decretada a falência pela Falida foi deduzida oposição por meio de embargos à falência os quais vieram a ser julgados improcedentes.
  Inconformada com a decisão que julgou a oposição por meio de embargos à falência improcedente, vem a Falida recorrer daquela decisão, apresentando as seguintes conclusões de recurso:
  Padece do vício da nulidade por omissão de pronúncia
* Verificam-se pelo menos até 31 de Dezembro de 2021 o vencimento das dívidas da recorrente, em relação às recorridas, e a “impossibilidade de cumprimento pontual por parte da devedora, revelada com base no montante das dívidas incumpridas e as circunstâncias do incumprimento”
* É violado o princípio da extinção ou prescrição do direito de praticar o acto processual pelo decurso do prazo peremptório
* Extingue-se pelo decurso do prazo peremptório o direito ao conhecimento oficioso do processo especial de declaração da falência
1. Em 6 de Junho de 2024, as recorridas apresentaram ao Tribunal a quo o requerimento do processo especial de declaração da falência relativamente à recorrente, no qual indicaram nos pontos 3 a 21 que as recorridas têm um crédito no montante de MOP$5.083.742,20 em relação à recorrente, a fim de comprovar que as recorridas são credoras da mesma (cfr. as fls. 167 a 169v. do proc. n.º CV2-24-0002-CFI);
2. O referido montante do crédito fundamenta-se na sentença de reconhecimento do acordo transaccional de 6 de Setembro de 2021 do 2º Juízo Cível do TJB sobre o processo declarativo n.º CV2-19-0114-CAO, proposto pelas recorridas, a sentença foi transitada em julgado em 20 de Setembro de 2021 (vide as fls. 167 a 169v. do proc. n.º CV2-24-0002-CFI);
3. Segundo o acordo transaccional supracitado:
“Após a conciliação, as autoras (representadas pela sua assistente C) e a ré (representada pelo Dr. Advogado D, mandatário judicial com poderes especiais) chegaram ao seguinte acordo:
1. O presente acordo só tem como objecto o que pretende efectivar na petição inicial em causa, ou seja, as rendas não pagas do período de 1 de Março de 2018 a 18 de Setembro de 2018, a indemnização dos danos e os juros legais;
2. O presente acordo concerne ao período diferente daquele correspondente às rendas em dívida envolvidas no proc. n.º CV2-19-0057-CPE e não exerce qualquer influência ao acordo transaccional fixado no aludido processo;
3. A ré comprometeu-se a pagar às autoras, de uma vez só, até 31 de Dezembro de 2021, uma quantia de MOP$3.000.000,00;
4. A ré concordou em pagar a E有限公司, dentro de 30 dias (contados de hoje), em substituição da F LIMITADA, uma quantia de MOP$500.000,00, a título de devido pagamento pela última estipulado no contrato n.º A AD-15031601 (vide o contrato juntado pelas partes aos autos), bem como emitir às autoras no mesmo prazo o documento comprovativo da realização do pagamento a E有限公司, sob pena de efectuar indemnização às autoras no valor de MOP$500.000,00;
5. As cláusulas 3ª e 4ª do presente acordo levam à satisfação de todos os pedidos da petição inicial em causa;
6. Todas as custas pela ré.”
4. No ponto 13 do requerimento do processo especial de declaração da falência, as recorridas afirmaram que a recorrente nunca cumpriu a obrigação de prestação na relação obrigacional estabelecida pelo referido acordo transaccional;
5. Deste modo, tendo como título executivo a aludida sentença de reconhecimento do acordo transaccional pelo Tribunal, as recorridas intentou em 12 de Janeiro de 2022 a acção executiva n.º CV2-19-0114-CAO-A contra a recorrente (vide a fl. 6 do proc. n.º CV2-24-0002-CFI);
6. Na referida acção executiva, a recorrente já pagou às recorridas um montante de MOP$336.491,78, ainda estando em dívida uma quantia de MOP$2.663.508,22 (vide as fls. 6 e 170 a 171 do proc. n.º CV2-24-0002-CFI);
7. Em 2019, as recorridas apresentaram a petição inicial para intentar a acção de despejo n.º CV2-19-0057-CPE contra a recorrente e M,
8. Em 2 de Abril de 2020, por sentença da acção de despejo n.º CV2-19-0057-CPE, o 2º Juízo Cível do TJB reconheceu o acordo transaccional estabelecido na audiência entre a recorrente e as recorridas, a sentença já foi transitada em julgado (vide as fls. 6 e 172 a 173v. do proc. n.º CV2-24-0002-CFI);
9. Segundo a supracitada sentença de reconhecimento do acordo transaccional:
“---Após a conciliação, as partes chegaram ao seguinte acordo: --------
---1. A 1ª ré comprometeu-se a desocupar e restituir às autoras até 31 de Maio de 2020 os 36 imóveis em causa livres e devolutos de pessoas e coisas, no estado no momento em que foram efectivamente entregues à 1ª ré e conforme estipulado nos art.ºs 10.º e 11.º do contrato de arrendamento. ------------------------------------------------------------------
---2. As 1ª e 2ª rés devem pagar solidariamente às autoras, em prestações, as seguintes 5 quantias, que integram as rendas vencidas e vincendas, indemnização, juros de mora e despesas de condomínio emergentes dos apartamentos e lugares de estacionamento em causa, que as autoras demandam às rés, o incumprimento de qualquer prestação resulta no vencimento da totalidade: ------------------------
---Pagamento duma quantia de HKD$900.000,00 até 15/04/2020; -----
---Pagamento duma quantia de HKD$450.000,00 até 05/05/2020; -----
---Pagamento duma quantia de HKD$2.660.000,00 até 30/06/2020; ---
---Pagamento duma quantia de HKD$2.660.000,00 até 30/09/2020; ---
---Pagamento duma quantia de HKD$2.660.000,00 até 31/12/2020; ---
---3. As autoras comprometeram-se a, após recebida a última prestação, devolver à 1ª ré dentro de 7 dias a renda a tútulo de caução, no valor de HKD$450.000,00. --------------------------------------------------------------
---4. As partes acordaram que as duas rés suportam as custas processuais e renunciaram às custas da parte e procuradoria (sic.). -----
***
---Em seguida, o Juiz proferiu a seguinte sentença: -----------------------
---Chegando a acordo os representantes das partes com legitimidade e sendo o objecto da causa disponível pela lei de Macau, ora o Tribunal reconhece por sentença o referido acordo estabelecido entre as partes.-
---Custas pelas rés segundo o acordo. ---------------------------------------
---Notifique e registe. ----------------------------------------------------------
---A sentença foi imediatamente informada a todos os indivíduos presentes, que declararam cientes do seu teor. ----------------------------"
(vide as fls. 172 a 173v. do proc. n.º CV2-24-0002-CFI);
10. As recorridas declararam que a recorrente não cumpriu o acordo transaccional supracitado, portanto, as dívidas remanescentes devem ser consideradas vencidas, tendo em conta tal circunstância, revela-se a impossibilidade de pagamento pontual das dívidas;
11. Em 2 de Fevereiro de 2022, as recorridas intentaram contra a 1ª ré, ora recorrente, e a 2ª ré M a acção executiva n.º CV2-10-0057-CPE-A, tendo como título executivo a referida sentença;
12. Resulta das fls. 174 frente e verso dos presentes autos que a quantia pedida pelas recorridas na qualidade de exequentes da acção acima mencionada se cifra em MOP$ 5.661.102,37; o bem penhorado, em MOP$3.094.720,02, enquanto a quantia já paga, em MOP$3.059.366,02;
13. A julgar pelos créditos que as recorridas detinham sobre a recorrente, pode-se ter a certeza de que, para dizer o mínimo, em 31/12/2020 a recorrente já se encontrava em falta de cumprimento pontual dos acima referidos créditos, se não ainda mais cedo!
14. No caso em apreço, só em 06/06/2024 é que as recorridas chegaram a intentar o processo especial de declaração da falência n.º CV2-24-0002-CFI contra a recorrente; aliás, em 31/12/2020, se não ainda mais cedo, já estava dado como certo que a recorrente se encontrava em falta de cumprimento pontual de todos os créditos acima referidos que as recorridas detinham sobre a recorrente, porque se trata todas de obrigações a termo;
15. Lê-se o seguinte a fls. 8 da sentença de falência constante das fls. 276 a 286v dos autos de falência n.º CV2-24-0002-CFI proferida pelo douto Tribunal a quo em 16/07/2024:
«As requerentes pedem que seja declarada a falência da requerida, pois entendem que se encontra na situação prevista pelo art.º 1082.º, alíneas a) e d) do CPC.
Quanto às dívidas que a requerida contraiu, está provado que de acordo com as decisões já transitadas em julgado n.º CV2-19-0114-CAO e n.º CV2-19-0057-CPE, as requerentes detêm dois créditos sobre a requerida, cujo capital totaliza MOP$ 3.000.000,00 e HK$ 9.330.000,00, respectivamente. Mesmo com o trânsito em julgado das decisões, a requerida, no entanto, nunca chegou a pagar as quantias prometidas às requerentes no prazo fixado no pacto de reconciliação. Ainda que as requerentes tenham, mais tarde, instaurado acção executiva contra a requerida, só foram parcialmente reembolsadas, mais precisamente: no processo n.º CV2-19-0114-CAO-A as requerentes cobraram MOP$ 336.491,78 e no processo n.º CV2-19-0057-CPE-A as requerentes cobraram MOP$ 3.059.366,02.
Além disso, fica apurado que a requerida tem outras dívidas não liquidadas exequendas nos processos do TJB n.º LB1-22-0013-LCT e n.º CV1-20-0031-CAO-A.»
16. As recorridas até citaram a reportagem datada de 04/06/2021 intitulada “Atraso no pagamento de salário pela A, Limitada revela lacunas jurídicas Ex-empregados: chefia sumiu”, publicada no ALL ABOUT MACAU, imprensa independente, que era sobre os salários que a recorrente devia aos empregados (vd. fls. 175 e verso do processo n.º CV2-24-0002-CFI);
17. No caso da sentença da falência a fls. 276 a 286v do processo de falência n.º CV2-24-0002-CFI proferida pelo douto tribunal a quo em 16/07/2024, assim como no da sentença de indeferimento de reclamação a fls. 78 a 80v do processo de n.º CV2-24-0002-CFI-H proferida em 24/09/2024 com que se sustentou a declaração da falência está verificado o previsto pelo art.º 1082.º, alínea a) do CPC, pois “pelo montante ou pelas circunstâncias do incumprimento das obrigações, revela que” a recorrente, enquanto empresária comercial, “se encontra impossibilitado de cumprir pontualmente as suas obrigações”; assim sendo, com base nas obrigações referentes às recorridas e indicadas nos factos provados R e S da base instrutória, devia-se obrigatoriamente declarar o estado legal de falência em que se encontrava a recorrente; (sic – N. da T.)
18. Segundo o entendimento do Prof. Dr. Alberto dos Reis de Portugal, o prazo peremptório estabelece o período dentro do qual se deve praticar o acto, sob pena de não poder mais praticá-lo; a título exemplificativo: o oferecimento da contestação depois do decurso do prazo dos 30 dias para tal; o prazo peremptório tem por função estabelecer o prazo dentro do qual a parte pode praticar o acto processual; decorrido o prazo, fica extinto o direito de praticar / executar o acto processual; dá-se o prazo à luz do princípio de que o decurso do prazo peremptório extingue ou preclude o direito a praticar o acto respectivo.
19. Segundo entende o ilustre Mm.º Juiz aposentado do TUI da RAEM, findo o prazo peremptório, extingue-se o direito do agente a praticar / executar o acto. O tribunal obriga-se a ordenar oficiosamente a rejeição da prática de todo e qualquer acto processual fora do prazo peremptório por causa da extemporaneidade – incluindo mas não só: quando detecte que um documento entrou fora do prazo, a secretaria pode rejeitá-lo, aliás, nem deve juntar ao processo o papel.
20. Segundo os académicos acima mencionados e nos termos do art.º 95.º, n.º 1 e n.º 3 e do art.º 115.º, n.º 1 do CPC, o período de dois anos previsto pelo art.º 1083.º, n.º 1 do CPC é prazo processual e peremptório, porque está já disposto que no caso de instauração do processo especial de declaração da falência, o acto processual de propositura de acção pelas partes deve ser feito dentro do prazo de dois anos a partir do dia da verificação, por parte das requerentes, de que a requerida / falida “se encontrava impossibilitada de cumprir pontualmente as suas obrigações pelo montante ou pelas circunstâncias do incumprimento das obrigações por parte da devedora” – ou seja, de 31/12/2021 ou ainda mais cedo; senão extingue-se o direito das recorridas a praticar o acto processual, e os dois anos servem como o prazo peremptório tal prazo previsto pelo CPC que é uma lei processual; (sic – N. da T.)
21. No presente caso, em 31/12/2021 pelo menos, pois se não ainda mais cedo, é que as recorridas já tinham conhecimento de que acerca dos créditos que detinham sobre a recorrente, nas dívidas derivadas do incumprimento das obrigações por parte da recorrente transparecia que a recorrente não conseguiria cumprir as obrigações pontualmente / acatando o prazo dentro do qual cumprir as obrigações (sic – N. da T.) e já instauraram várias acções na tentativa de resolver o problema; portanto, as recorridas deviam ter intentado o processo de falência / processo especial de declaração da falência n.º CV2-24-0002-CFI contra a recorrente pelo menos no período que vai de 01/01/2022 a de 01/01/2024 – ou seja, de 2 anos; só que se deu a prescrição do direito processual de parte dada a intempestividade da instauração do processo especial de declaração da falência em 06/06/2024 pelas recorridas contra a recorrente (nos termos do art.º 1082.º, alínea a) e do art.º 1083.º do CPC);
22. Nos termos do art.º 1083.º, n.º 1 do CPC que remete para o art.º 1082.º, alínea a), do art.º 372.º, n.º 1 que remete para o art.º 412.º, n.º 2, do art.º 413.º e do art.º 414.º, constitui excepção dilatória a prescrição do direito processual de parte dada a intempestividade da instauração do processo especial de declaração da falência em 06/06/2024 pelas recorridas contra a recorrente por causa do decurso do prazo de 2 anos que se conta a partir de 31/12/2021 ou antes, porque a extinção pela ineptidão do acto processual obsta ao conhecimento do mérito da causa, pelo que justamente é de conhecimento oficioso; (sic – N. da T.)
23. Salvo o devido respeito e dada a existência de um melhor entendimento sobre a questão, nem na sentença da falência a fls. 276 a 286v do processo de falência n.º CV2-24-0002-CFI proferida pelo douto tribunal a quo em 16/07/2024, nem na sentença de indeferimento de reclamação a fls. 78 a 80v do processo de n.º CV2-24-0002-CFI-H proferida em 24/09/2024 com que se sustentou a declaração da falência se conheceu oficiosamente da excepção dilatória, por causa da prescrição do direito processual de parte dada a intempestividade da instauração do processo especial de declaração da falência em 06/06/2024 pelas recorridas contra a recorrente por causa do decurso do prazo de 2 anos que se conta a partir de 31/12/2021 ou antes, pelo que enfermam do vício de nulidade da sentença por omissão de pronúncia (nos termos do art.º 571.º, n.º 1, alínea d) do CPC);
  Pelos Recorridos não foram apresentadas contra-alegações de recurso.
  
  Foram colhidos os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO

a) Factos
  
  A sentença que decretou a falência deu como provada a seguinte factualidade:
A. As requerentes são companhias limitadas constituídas em Macau, todas exercendo a actividade do investimento em imóveis. (vide as fls. 11 a 154v.) (resposta ao art.º 1.º do requerimento)
B. A requerida é uma companhia limitada constituída em Macau, exercendo as actividades de radiodifusão televisiva por satélite e outras actividades complementares associadas, tais como gravação de áudio e vídeo, aluguer e venda de equipamentos de ajustamento audiovisual, edição e comercialização de publicações relacionadas com radiodifusão sem fios e promoção de ligações e desenvolvimentos das suas actividades, comercialização do patrocínio de programas, como anúncios comerciais, e arrendamento de estúdios exteriores; serviços técnicos para gestão e operação de empresas de televisão por satélite. (vide as fls. 155 a 161v.) (resposta ao art.º 2.º do requerimento)
C. Em 14 de Novembro de 2014, as requerentes, representadas pela G Limitada, e a requerida A, LIMITADA celebraram o «contrato de arrendamento de imóveis (escritórios)», que tem como objecto 16 fracções para escritórios e 20 lugares de estacionamento de veículos. (vide as fls. 162 a 164) (resposta ao art.º 3.º do requerimento)
D. Findo o prazo do referido contrato de arrendamento, nenhum outorgante propôs cessação unilateral, portanto, foi renovado até 31 de Dezembro de 2018. (resposta ao art.º 5.º do requerimento)
E. Em 31 de Julho de 2018, a G Limitada, em representação das requerentes, celebrou com a requerida, em relação ao contrato de arrendamento, um “contrato de cessação de arrendamento dos escritórios”. (vide as fls. 165 a 166) (resposta ao art.º 6.º do requerimento)
F. Os outorgantes acordaram que, o contrato de arrendamento se revogaria o mais tarde em 31 de Dezembro de 2018, se as requerentes e a requerida não convencionassem uma data fixa, o contrato seria considerado revogado em 31 de Dezembro de 2018. (resposta ao art.º 7.º do requerimento)
G. Para efectivar o pagamento das rendas em dívida, correspondentes ao período de 1 de Março de 2018 a 18 de Setembro de 2018, as requerentes intentaram uma acção declarativa contra a requerida perante o TJB (proc. n.º CV2-19-0114-CAO). (vide as fls. 167 a 168) (resposta ao art.º 9.º do requerimento)
H. Em 6 de Setembro de 2021, a respeito da acção aludida, as requerentes e a requerida chegaram ao seguinte acordo transacional:
“1. O presente acordo só tem como objecto o que pretende efectivar na petição inicial em causa, ou seja, as rendas não pagas do período de 1 de Março de 2018 a 18 de Setembro de 2018, a indemnização dos danos e os juros legais;
2. O presente acordo concerne ao período diferente daquele correspondente às rendas em dívida envolvidas no proc. n.º CV2-19-0057-CPE e não exerce qualquer influência ao acordo transaccional fixado no aludido processo;
3. A ré comprometeu-se a pagar às autoras, de uma vez só, até 31 de Dezembro de 2021, uma quantia de MOP$3.000.000,00;
4. A ré concordou em pagar a E有限公司, dentro de 30 dias (contados de hoje), em substituição da F LIMITADA, uma quantia de MOP$500.000,00, a título de devido pagamento pela última estipulado no contrato n.º A AD-15031601 (vide o contrato juntado pelas partes aos autos), bem como emitir às autoras no mesmo prazo o documento comprovativo da realização do pagamento a E有限公司, sob pena de efectuar indemnização às autoras no valor de MOP$500.000,00;
5. As cláusulas 3ª e 4ª do presente acordo levam à satisfação de todos os pedidos da petição inicial em causa;
6. Todas as custas pela ré.” (vide as fls. 169 e 169v.) (resposta ao art.º 10.º do requerimento)
I. Por sentença proferida no mesmo dia, o Juiz titular confirmou a validade do acordo transaccional entre as requerentes e a requerida, e condenou as requerentes e a requerida a cumprir as obrigações compreendidas no acordo. (resposta ao art.º 11º do requerimento)
J. A referida sentença já foi transitada em julgado no dia 20 de Setembro de 2021. (vide as fls. 168) (resposta ao art.º 12º do requerimento)
K. Porém, a requerida não pagou as dívidas às requerentes conforme o supracitado acordo transacional. (resposta ao art.º 13º do requerimento)
L. Pelo que, as requerentes intentaram contra a requerida a acção de execução que correu termos sob o n.º CV2-19-0114-CAO-A, pedindo a execução da quantia de MOP$3.000.000,00 (vide as fls. 170 a 171). (resposta ao art.º 14º do requerimento)
M. Até 23 de Maio de 2024, no âmbito do referido processo de execução, foi pago às requerentes um montante de MOP$336.491,78. (resposta ao art.º 15º do requerimento)
N. Por outro lado, as requerentes intentaram contra a requerida e H a acção de despejo que correu termos sob o n.º CV2-19-0057-CPE, solicitando o pagamento das rendas contadas desde 19 de Setembro de 2018 (vide as fls. 172 e v). (resposta ao art.º 16º do requerimento)
O. Em 20 de Abril de 2020, as requerentes, a requerida e H chegaram ao seguinte acordo:
“1. A 1ª ré comprometeu-se a desocupar e restituir às autoras até 31 de Maio de 2020 os 36 imóveis em causa livres e devolutos de pessoas e coisas, no estado no momento em que foram efectivamente entregues à 1ª ré e conforme estipulado nos art.ºs 10.º e 11.º do contrato de arrendamento.
2. As 1ª e 2ª rés devem pagar solidariamente às autoras, em prestações, as seguintes 5 quantias, que integram as rendas vencidas e vincendas, indemnização, juros de mora e despesas de condomínio emergentes dos apartamentos e lugares de estacionamento em causa, que as autoras demandam às rés, o incumprimento de qualquer prestação resulta no vencimento da totalidade:
- Pagamento duma quantia de HKD$900.000,00 até 15/04/2020;
- Pagamento duma quantia de HKD$450.000,00 até 05/05/2020;
- Pagamento duma quantia de HKD$2.660.000,00 até 30/06/2020;
- Pagamento duma quantia de HKD$2.660.000,00 até 30/09/2020;
- Pagamento duma quantia de HKD$2.660.000,00 até 31/12/2020;
3. As autoras comprometeram-se a, após recebida a última prestação, devolver à 1ª ré dentro de 7 dias a renda a tútulo de caução, no valor de HKD$450.000,00.
4. As partes acordaram que as duas rés suportam as custas processuais e renunciaram às custas da parte e procuradoria.” (vide as fls. 173 e v) (resposta ao art.º 17º do requerimento)
P. Por serem apenas parcialmente pagas as referidas quantias, as requerentes intentaram contra a requerida e H a acção que correu termos sob o n.º CV2-19-0057-CPE-A, pedindo a execução das quantias em dívida, no valor de MOP$5.479.600,00, e dos juros de mora, no valor de MOP$181.502,37 (foi posteriormente indeferido o pedido relativo aos juros) (vide as fls. 174 e v). (resposta ao art.º 19º do requerimento)
Q. Até 20 de Maio de 2024, no âmbito do referido processo de execução, foi pago às requerentes um montante de MOP$3.059.366,02. (resposta ao art.º 20º do requerimento)
R. Verifica-se, no processo n.º LB1-22-0013-LCT do TJB, que a requerida tem crédito ilíquido de valor não apurado. (resposta ao art.º 22º do requerimento)
S. A requerida também é executada no processo n.º CV1-20-0031-CAO-A, no qual a exequente – I Ltd. – pediu a execução dum capital no valor de MOP$1.072.143,50. (vide as fls. 270 e v) (resposta ao art.º 23º do requerimento)
T. No processo n.º CV2-19-0114-CAO-A, a requerida, eventualmente, tem em seu poder os seguintes bens penhorados:
1. Um automóvel ligeiro, de matrícula ML-XX-XX e de marca XXX, cujo valor ainda não foi avaliado; e
2. Uma quota no valor de MOP$99.000,00 da J Limitada (registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º XXX(SO), com capital social XXXX). (vide as fls. 170 a 171) (resposta ao art.º 25º do requerimento)
U. Em 10 de Fevereiro de 2022, foi concedido à requerida, pela Fundação Macau, um financiamento no valor de MOP$1.800.000,00 (vide as fls. 178). (resposta ao art.º 30º do requerimento)
  
  Na decisão da oposição por embargos à falência foram dados por provados os seguintes factos:
A. Por sentença de 16 de Julho de 2024, foi declarada a falência da A LIMITADA, com sede em Macau, no Caminho da Telesat, XXXX, Coloane, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º XXX(SO) (vide as fls. 276 a 280v dos autos principais, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
B. A supracitada sentença foi publicada, por extracto, no Boletim Oficial n.º 30, II Série, de 24 de Julho de 2024.

b) Do Direito

  Vem a Recorrente e declarada falida invocar haver já decorrido o prazo previsto no nº 1 do artº 1083º do CPC.
  Não sendo fácil a distinção entre as figuras da prescrição, caducidade e não uso1, poderíamos resumir que a prescrição quando extintiva pode ser causa de extinção de direitos, ou da aquisição de direitos se for aquisitiva – vg. Usucapião -, enquanto a caducidade versa sobre o exercício de direitos, aplicando-se o não uso apenas a alguns direitos reais.
  Pelo que, não se confundem estes dois conceitos, sem prejuízo de por vezes serem incorrectamente usados.
  Pese embora o que a Recorrente discorre a respeito da qualificação do prazo em causa – entre dilatório e peremptório o que não se aplica uma vez que esta classificação é inerente à prática de actos processuais - trata-se aqui de um prazo de caducidade uma vez que respeita ao exercício do direito de requerer a falência.
  Da conjugação do artº 1083º com o artº 1082º do CPC o que resulta é que a falência deve ser requerida no prazo de dois anos depois de se verificar a “falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele que o devedor se encontra impossibilitado de cumprir pontualmente as suas obrigações”.
  Não se trata de um qualquer incumprimento das obrigações. Não é por faltar ao pagamento das suas obrigações que se conclui imediatamente que o devedor se encontra em situação de falência.
  Não foi por a aqui Recorrente deixar de pagar as rendas e os salários dos seus trabalhadores que se conclui que está verificada a condição da al. a) do artº 1083º do CPC.
  Há data foram feitos acordos que era admissível que a Recorrente/Falida viesse a honrar desconhecendo-se ainda que esta não tinha património, nem crédito nem outros meios de as honrar.
  Dos valores em dívida nos processos executivos ainda foi possível obter o pagamento parcial.
  Só na pendências dos processos executivos é que se veio a verificar que a ora Recorrente e Falida não tinha meios nem património para solver o seu passivo.
  Destarte, só nessa data é que, usando a terminologia do artº 1083º “se prova” o facto da alínea a) deste preceito.
  O processo de falência foi instaurado em 2024 e como resulta da factualidade até 2024 foi possível obter o pagamento parcial das dívidas exequendas.
  Destarte, não se mostra demonstrado que há mais de dois anos antes da data em que a falência foi requerida que a Recorrente/Falida se encontra impossibilitada de cumprir pontualmente os seus compromissos, uma vez que, ainda que parcialmente os foi cumprindo ate 2024.
  Assim sendo, não ocorre a caducidade do direito de requerer a falência, impondo-se negar provimento ao recurso.
  
III. DECISÃO

  Termos em que, pelos fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso mantendo a decisão recorrida.
  
  Custas a cargo da Recorrente.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 27 de Março de 2025


Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)
Seng Ioi Man
(1º Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong
(2º Juiz-Adjunto)
1 Veja-se a propósito Fernando Augusto Cunha de Sá, Modos de extinção das Obrigações, em Estudos Em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, Vol. I, pág. 241.
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104/2025 CÍVEL 1