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Processo n.º 66/2025
(Autos de recurso em matéria cível)

Relator: Fong Man Chong
Data: 09 de Abril de 2025

ASSUNTOS:

- Função do sinal no contrato-promessa de compra e venda e consequência de impossibilidade de cumprimento definitivo de prestação prometida

SUMÁRIO:

I - A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC), qualificação esta que determina o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CCM).
II - A qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais.
III - A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CCM). Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Numa situação em que, tal como se detecta no caso dos autos, se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis (porque se usam expressões diversas, tais como “contrato-promessa de compra e venda” “prometer comprar e “prometida venda”, “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”), a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 228º do CCM).
IV – O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico, sendo nesta perspectiva, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial. Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes. Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
V - No caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CCM que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”. Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CCM).
VI - O artigo 801º/-1 do CCM manda que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”, normativo este que rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento.
VII - Por regra, a indemnização fundada no incumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido. Nesta óptica, o regime de restituição do sinal em dobro em matéria de contrato-promessa pode classificar-se como um regime especial.

O Relator,

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Fong Man Chong









Processo nº 66/2025
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 09 de Abril de 2025

Recorrente : - A, Limitada (A有限公司)

Recorridos : - B
- C

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   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    A, Limitada (A有限公司), Recorrente, devidamente identificada nos autos, discordando da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, datada de 22/07/2024, veio, em 09/09/2024, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 2007 a 2031, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. Constitui objecto do presente Recurso a, aliás, douta sentença do Tribunal Judicial de Base, que julgou parcialmente procedente a presente acção e condenou a Recorrente no pagamento de uma indemnização à Recorrida, no montante global de HKD$2.985.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 9,75% ao ano, a contar desde a data da citação da Recorrente e até integral pagamento.
     2. Ocorreu uma impossibilidade jurídica superveniente e definitiva do cumprimento do contrato em discussão nos presentes autos mas tal impossibilidade não é imputável à Recorrente.
     3. Com efeito, ficou provada praticamente toda a matéria alegada pela Recorrente susceptível de estabelecer que não conseguiu aproveitar o terreno dentro do prazo contratado e, assim, dar cumprimento ao contrato em apreço, por razões imputáveis aos Serviços da RAEM.
     4. Uma tal actuação da DSSOPT e da DSPA era imprevisível.
     5. Desde logo, não era previsível que a DSSOPT permanecesse inerte e sem emitir qualquer decisão relativamente ao plano de consulta e ao projecto parcial de arquitectura, apresentados pela Recorrente em Abril e Maio de 2008.
     6. Não era previsível que após a apresentação do projecto global de arquitectura em Outubro de 2009, a DSSOPT emitisse uma Planta de Alinhamento Oficial em Fevereiro de 2010, donde constava um novo condicionamento urbanístico atinente à observância de uma distância mínima entre cada torre que inviabilizaria o projecto apresentado e que não estava previsto na lei, nem tinha sido anteriormente exigido em Macau.
     7. Não era previsível que após a aprovação do projecto de arquitectura do empreendimento "D", comunicada à Recorrente em 07/01/2011, a DSSOPT fizesse depender a emissão da licença de construção, da apresentação e aprovação de um Relatório ambiental pela DSPA.
     8. Essa falta de previsibilidade resulta da circunstância de, naquela época (2010-2011) nunca tal exigência ter ocorrido anteriormente a nenhum promotor imobiliário.
     9. E ainda da circunstância de, ao tempo, não existir norma legal ou regulamentar aprovada e em vigor que exigisse esse Relatório Ambiental ou que sugerisse, sequer, que conteúdo pudesse vir a ter de conter.
     10. Muito menos era de esperar que, como se provou, a DSSOPT e a DSPA demorassem quase 3 anos a aprovar esse Relatório num procedimento moroso e ao sabor dos improvisos desses serviços.
     11. Não se pode pretender que uma Administração Pública que está sujeita ao princípio da legalidade (artigo 3.º do CPA), ao princípio da protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes (artigo 4.º do CPA), ao princípio da justiça e da imparcialidade (artigo 7.º do CPA) e aos princípios da boa fé e da colaboração (artigos 8.º e 9.º do CPA) deve entender-se genericamente como uma pessoa que actua de forma a violar os seus deveres contratuais com os sujeitos com que se relaciona. E que a Recorrente deveria assim ter presumido vir a suceder.
     12. Os Serviços da Administração foram apresentando sucessivas e novas condições ao longo de quase 3 anos, à medida que as anteriores iam sendo cumpridas pela Recorrente, o que era manifestamente imprevisível, mesmo para um bom pai de família.
     13. D'outro passo, a actuação da RAEM sempre seria inultrapassável.
     14. Efectivamente, os serviços da RAEM não emitiriam a licença de construção sem que fosse apresentado o Estudo Ambiental, rectius, sem que fossem apresentadas todas as versões do Estudo Ambiental que foi exigindo ao longo de cerca de 3 anos.
     15. A única forma de a Recorrente procurar ultrapassar estas exigências era a de avançar para a via contenciosa, através do recurso contencioso de anulação destinado a anular os actos administrativos praticados pelos serviços da RAEM, por vício de violação de lei.
     16. Bem se vê que a DSSOPT e a DSPA não actuaram como parte do contrato de concessão mas sim como Administração pública, como puissance publique, sob as mesmas vestes com que actuam relativamente a qualquer privado.
     17. Ou seja, em resumo, ao contrário do que se sugere na douta sentença recorrida, afigura-se que se está, efectivamente, em sede de "facto do príncipe".
     18. Quanto ao risco, compreende-se, por exemplo, que a crise económica, a retracção do mercado financeiro, taxas de juros, salários, etc., possam ser considerados riscos com que os promotores imobiliários devem contar e assumir, mas não já, a situação dos autos que provocou uma provada paralisação de cerca de 5 anos do prazo de aproveitamento do terreno.
     19. Por outro lado, os Recorridos sabiam necessariamente que o contrato em discussão estava umbilicalmente ligado ao cumprimento do contrato de concessão do terreno e que, naturalmente, as vicissitudes deste se repercutiam necessariamente naquele.
     20. As datas dos termos das concessões são públicas, constando do Registo Predial.
     21. Um dos princípios fundamentais do Registo Predial é o Princípio da Publicidade consagrado no artigo 1º do Código do Registo Predial de Macau e dele decorre que a ninguém é lícito invocar o desconhecimento da situação jurídica de qualquer imóvel, quando constante de registo público, que é de livre acesso.
     22. Os Recorridos também sabiam perfeitamente que a fracção transaccionada ia ser construída no futuro, ou seja, que tinham adquirido um bem que não existia à data do contrato que celebrou.
     23. E a Recorrente não faltou a deveres de informação que fossem devidos, nem prestou informação falsa ou sonegou informação que, de acordo com ditames de boa fé, estivesse vinculada a transmitir.
     24. Pelo que em boa verdade não foi a Recorrente que trouxe os Recorridos para a esfera de risco do contrato em causa. Foram eles que quiseram nela entrar.
     25. Quanto à qualificação do contrato, o que se revela mais plausível e consentâneo com a aplicação das regras plasmadas entre os artigos 228º e 230º do CC é que se trata de um contrato de reserva ou de um contrato de compra e venda de um bem futuro.
     26. A respeito da letra do contrato, refira-se que as partes podem usar terminologia jurídica e fazer qualificações, mas esse aspecto não é vinculativo para o intérprete-aplicador.
     27. Relativamente à redacção do contrato em apreço, logo na sua cláusula 5ª, as partes acordaram numa redacção que excluiu propositadamente a utilização da expressão “訂” referente ao conceito de "sinal" (com o sentido de penalização), em prol da expressão "訂金", correspondente ao conceito de "depósito" (que não tem sentido penalizador).
     28. Deste modo, as partes estão a manifestar a sua vontade em afastar a qualificação de sinal aos pagamentos efectuados por conta do contrato em causa.
     29. A cláusula 22ª não indicia que as partes celebraram uma promessa de compra e venda em vez de uma compra e venda de um bem futuro ou um contrato de reserva.
     30. Em contrário do que se considerou na douta sentença recorrida, a previsão da cláusula 9ª de um consentimento para a cessão também não permite reconduzir o contrato base a um contrato-promessa.
     31. É esta a solução preconizada no artigo 418º do CC pela simples razão de que em contratos com prestações recíprocas, como é o caso, a Recorrente tem o dever de entregar o imóvel objecto do contrato, mas o adquirente tem o dever de pagar um preço e, no caso vertente, de pagar o preço em prestações distintas e sucessivas.
     32. Quanto à circunstância de poder eventualmente inferir-se de alguns dos segmentos do clausulado a necessidade de celebração de um segundo contrato, esta é, nos termos do artigo 866º do Código Civil (CC), uma formalidade absolutamente essencial, quer para o contrato-promessa, quer para o contrato de reserva, quer para o contrato de compra e venda imediata de um bem futuro.
     33. Por seu turno, as suas cláusulas 10ª a 12ª são previsões que raramente ou nunca são reguladas no contrato-promessa, mas sim no contrato de compra e venda.
     34. Também os textos preliminares e circundantes constantes dos autos conectados com o contrato em questão apontam para outra qualificação que não a do contrato-promessa.
     35. Designadamente, saliente-se que os recibos de pagamento mencionam tratar-se da liquidação de um preço e, nunca, de um sinal, e que o contrato contém uma planta da fracção adquirida em anexo, típico de uma compra de imóvel em projecto.
     36. Relativamente ao elemento histórico subjacente ao contrato em causa, há a destacar que o contrato foi celebrado antes da publicação da Lei nº 7/2013, a qual foi elaborada em resposta a um vazio legal que disciplinasse estes casos, o que permite vincar a sua especificidade em relação às figuras existentes a esse tempo na ordem jurídica de Macau, incluindo a figura do contrato-promessa tipificada no Código Civil.
     37. Como afirma João vicente Monteiro na sua mais recente obra, Código do Registo Predial de Macau Anotado, pág. 299, "Estes 'contratos-promessa' têm sido tradicionalmente utilizados para formalizar verdadeiros contratos de compra e venda sobre as fracções autónomas em construção".
     38. Relativamente ao elemento teleológico, o fim do negócio tido em mente pelas partes é o seguinte: para a parte compradora, um imóvel a ser construído fica reservado contra o pagamento de uma certa quantia, por inteiro ou dividida em prestações; para a parte vendedora é receber do adquirente um determinado preço pela fracção autónoma que vai construír e lhe vai entregar.
     39. Se o beneficiário desistir perde essa quantia a favor da outra parte; quando não, o contrato mantém-se. Em contrapartida, o vendedor deixa de poder dispor da fracção autónoma não podendo celebrar nenhum outro contrato com terceiros que tenha por objecto essa fracção autónoma.
     40. Assim, pela interpretação do clausulado, pelos textos conectados como contrato, pelo elemento histórico e pelo elemento teleológico, afigura-se que o contrato em discussão não é um típico contrato-promessa mas um contrato de reserva ou um contrato de compra e venda imediata de um bem futuro, tal como defende Menezes Cordeiro no douto Parecer Jurídico ora junto.
     41. Subsidiariamente, mesmo que se entenda que o contrato em discussão nos presentes autos se trata de um contrato-promessa típico, a verdade é que as quantias que a Recorrente recebeu enquanto pagamentos de uma parte do preço da fracção a construir que foi vendida, configura um cumprimento antecipado do contrato prometido tendo em vista a satisfação de obrigação futura, previsto no artigo 434 º do Código Civil, como o comprovam os recibos de pagamento de fls. 31 a 34 dos autos.
     42. Relativamente à indemnização a arbitrar, uma vez que a impossibilidade superveniente não é imputável à Recorrente, tem aplicação o disposto no artigo 779º/1 do CC: "A obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor."
     43. As consequências são as do artigo 784º/1 do CC: o interessado na aquisição fica desobrigado da contraprestação e pode exigir a restituição do valor que entregou ao alienante, em singelo, nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa, conforme o estipulado nos artigos 467º e 473º/1 do CC.
     44. Deste modo, salvo melhor opinião, na perspectiva da Recorrente, o quantum final da indemnização a arbitrar cifra-se em HKD1.492.500,00 e respectivos juros de mora.
     45. Se por hipótese se considerar que os contratos em apreço se tratam de típicos contratos-promessa, seria manifestamente excessiva a condenação da Recorrente no pagamento do dobro das quantias que recebeu, devendo antes arbitrar-se uma compensação com base em critérios de Equidade, nos termos dos artigos 436º/5 e 801º do CC.
     46. A douta sentença recorrida não tomou em consideração todas as circunstâncias susceptíveis de influir em tal decisão, nomeadamente, os benefícios que os Recorridos obtiveram tendo por fonte o incumprimento contratual, devido a factos praticados por terceiro, gerador da indemnização a cargo da Recorrente.
     47. Com efeito, tendo sido dado por provado que os Recorridos vão receber uma fracção autónoma de tipologia, área e preço equivalentes ao da fracção que constitue o objecto do contrato aqui em causa, cujo valor de mercado será bastante superior ao valor inicialmente pago por eles e que existe um nexo de causalidade entre esta situação e o dano efectivo que os Recorridos terão sofrido em função do incumprimento contratual imputado à Recorrente, não pode deixar de se tomar em conta este factor no juízo a proferir quanto ao deferimento ou não do pedido subsidiário formulado pela Recorrente.
     48. A possibilidade de os Recorridos usufruirem tal benefício foi concedida pela RAEM por via legislativa, com a publicação de legislação específica visando este segundo remédio para o incumprimento contratual imputado à Recorrente, nomeadamente, através da Lei nº 8/2019 conjugada com o Despacho do Chefe do Executivo nº 89/2019.
     49. E, ainda, o mesmo terceiro, a RAEM, procedeu por via legislativa à devolução da totalidade do imposto de selo anteriormente pago pelos Recorridos por conta dos dois contratos em discussão.
     50. Pelo que, em consequência, é facto incontornável que o dano efectivo dos Recorridos já foi por esta via significativamente mitigado.
     51. Uma indemnização em dobro do valor recebido pela Recorrente é manifestamente excessivo porque conduz a uma sentença "cega" a todos estes Factos, sem dúvida indispensáveis a uma boa decisão.
     52. E só através de uma solução por equidade se pode ponderar estes Factos na decisão final.
     53. Só assim se poderá, portanto, alcançar uma decisão que não seja excessivamente penalizadora para a Recorrente mas que vá além da mera restituição, compensando, de alguma forma, os Recorridos.
     54. Acresce que provado está que a Recorrente celebrou mais de 3 milhares de contratos idênticos aos dos presentes autos, os quais não foi possível cumprir pelas mesmas razões e circunstâncias, pelo que existe uma impossibilidade de cumprimento global que deve seguramente receber, por questões de equidade, tratamento diferenciado.
     55. Ponderando-se em todos estes factos, uma decisão prudente e equilibrada seria que, por equidade, se fixasse o quantum indemnizatório num montante não superior a HKD2.000.000,00.
     56. Ressalvado diverso entendimento, a douta decisão recorrida incorre na violação do artigo 556º do Código de Processo Civil e dos artigos 228º, 229º, 230º, 435º, 436º, 467º, 473º/1, 784º/1 e 801º do Código Civil.
     Nestes termos e nos mais de direito aplicável, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente Recurso ser julgado procedente, com as legais consequências, assim se fazendo, serenamente, Justiça.
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    B e C, com os sinais identificativos nos autos, ofereceu a resposta constante de fls. 2113 a 2126, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. 針對本案判決,上訴人提出了上訴,主要分為以下部份:A.不可歸責於上訴人之不履行;B.合同定性;以及C.賠償金額。
     2. 在尊重上訴人見解的前提下,被上訴人認為原審法院所作出之判決正確,因此並不能同意上訴人之見解。
     A. 關於不可歸責於上訴人之不履行
     3. 首先,上訴人認為,其不履行合同的原因係因為行政當局(第三人)不可預視且不可避免之行為;上訴人亦主張,由於本案屬絕對將來物之買賣合同,因此,根據《民法典》第870條規定,上訴人僅有義務按照所訂定之內容或訂立合同當時之具體情況而採取必要措施;上訴人同樣認為其沒有對被上訴人隱瞞或提供虛假資訊,因為其從未想過不能履行合同的情況。根據合同自由原則,被上訴人既然自己選擇與上訴人簽署合同,有關風險係被上人自行選擇。
     4. 另外,上訴人認為有關通知義務僅存在於合同前責任,而根據被上訴判決中的已證事實,並無任何已證事實足以認定上訴人違反了合同前責任。
     5. 然而,針對上訴人是否存在過錯方面,被上訴人完全同意原審法院之理解。
     6. 除此之外,針對上訴人一再重覆行政當局之過錯的問題,正如被上訴人一如既往的主張,是上訴人未能在租賃期內完成利用,導致沒能重新獲行政當局批給「P」地段,這就是上訴人未能將涉案單位出售予被上訴人的直接原因。因此,上訴人不能履行合約的原因,完全是可預見,且可避免的。
     7. 而且,需要強調的是,行政當局並非涉案合同的任一主體,在履行合同的過程中,被上訴人不可能知悉行政當局的行為。
     8. 參考葡萄牙最高法院2012年5月29日在第3987/07.9TBAVR.C1.S1號合議庭裁判中的見解,便能得知只有第三人存有權利濫用之情況下,即極端情況下,合同才對第三人產生效力。而本案中,未能證實行政當局存有權利濫用之情況。
     9. 再者,在372/19-RA、352/19-RA及359/19-RA號案中,數百名D預約買受人曾針對特區提出賠償請求,當中行政法院裁定該等預約買受人的理據不成立,因為特區並未對其有任何過錯,更未存在權利濫用之情況。
     10. 反過來說,如果預約買受人未能因為行政當局之行為獲得任何賠償,上訴人卻能以行政當局之行為來免於歸責,這對被上訴人來說,實屬不公,亦違反了合同的相對性原則。因此,上訴人所主張的不可歸責於其之不能履行,係明顯不能成立的。
     11. 至於上訴人認為被上訴人在簽署涉案合同時,已經知悉並係自願承擔相關風險,且告知義務僅為合同前責任,除了必要的尊重外,被上訴人完全不能認同。
     12. 首先,上訴人係發展商,只有其與行政當局進行接洽,因此,到底行政當局在履行中是否有遲延,預計到底何時才能建好涉案物業,這屬於上訴人才能知悉的事宜,但在與被上訴人接洽的過程中,上訴人從未披露有關風險。
     13. 上訴人在2011年1月7日已知悉,有關工程計劃係要在其主張從未出現過之環評報告通過後才能發出施工准照。上訴人在清楚知悉以上風險,卻仍在經過接近2年時間仍未通過環評報告、且未知道何時會獲得通過該報告時,在2012年12月11日,與被上訴人簽署涉案合同(見已證事實第13條)。
     14. 根據善良家父的標準,在以上事實前提下,上訴人在簽署涉案合同時,係有能力預見不獲得批給續期而無法「交樓」予被上訴人—但上訴人卻在行政當局並沒確保批給會予以續期時,仍與被上訴人簽署涉案合同。
     15. 再者,根據已證事實第12條,上訴人在2013年10月24日獲得工程准照,倘如上訴人所主張僅需要3年時間便能完成涉案樓宇,即無可能在批給期限內(2015年12月25日)完成涉案樓宇,那麼為何仍然在2013年12月11日後,仍繼續向被上訴人收取了定金HKD746,250.00?(見起訴狀文件11至13,卷宗第75至80頁),在收取上述樓款前為何不告知被上訴人相關事實?
     16. 由始可見,無論係簽署合同前抑或履行合同的過程中,上訴人均為過份自信地認為即使沒有任何法律依據之情況下,仍可獲得租賃批給續期或延期,又或重新獲得行政當局批給“P”地段,也無履行其告知義務。這明顯不符合一個作為多年經驗的且符合善良家父標準的發展商所為。
     17. 除此之外,告知義務來自於善意原則,因此無論是合同前抑或履行合同的過程中均需要遵守(見《民法典》第219條以及第752條第2款)。本案中,正正是無論合同前以及合同過程中,上訴人均未遵守有關告知義務,亦未遵守以善良家父為標準的行為守則。
     18. 基於此,原審法院在認同上訴人在履行合同中有過錯這一部份正確無誤,應維持原審法院之判決。
     B. 合同定性方面
     19. 上訴人認為,雖然從庭審中未能得悉當事人簽署涉案合同時的真實意願,但考慮到(I)合同文字上;(II)在協商過程中以及相關(文件上)的文字;(III)歷史上;(IV)目的上的要素,因此涉案合同應為「預留合同」或「將來物的買賣合同」;
     20. 作為補充,上訴人主張,即使涉案合同為一預約買賣合同,被上訴人所支付的樓款,對應《民法典》第434條所指的提前履行,所以有關不履行所支付的賠償僅應為已付之樓款而非樓款之雙倍。
     21. 被上訴人對以上見解表示尊重,但被上訴人認為並無道理。
     22. 首先,根據《民法典》第404條第1款規定,預約買賣合同的特點,係基於預約合同承諾簽署特定合同,而在不動產交易中,預約買賣合同的目的,係為了將來以同樣的條件簽署買賣公證書。
     23. 而本案中,不論文字上、在協商過程中以及相關(文件上)的文字、歷史上以及目的上,不同於上訴人的見解,被上訴人認為均充分顯示涉案合同為一份預約買賣合同。
     24. 已證事實第13條至第17條已證明,上訴人承諾出售涉案單位予被上訴人;而為着獲得承諾出售的單位,被上訴人以分期付款方式,合共向上訴人支付了HKD1,492,500.00。
     25. 在合同的文字上,根據卷宗內第64頁至第68頁之涉案合同,標題上為《D樓宇買賣預約合約》,合同第1條再次重覆:「甲方...承諾出售予乙方...甲、乙雙方同意訂立及遵守買賣預約合同如下..」,合同第5條則將《民法典》第436條第2款中預約買賣合同之「沒收」定金之機制加入至合同內容中;合同第15條明確規定,被上訴人有義務在收到上訴人通知後七天內前往上訴人之辦事處簽署買賣公證書;而在合同第9條以及第22條,分別可見,被上訴人在簽署買賣公證書前仍受制於上訴人—無論對於其合同地位之移轉,抑或對於大廈外部與內部之外觀裝修,均取決於甲方(即真正業權人)作出決定。
     26. 以上各種表述,均可以見到即使在簽署涉案合同後,被上訴人仍未取得所有人的權利,且有義務與上訴人簽署買賣公證書—由此可見原審法院將涉案合同定性為預約買賣合同正確無誤。
     27. 至於上訴人所主張涉案合同第10條以及第12條為買賣將來物合同才會有的條款,然而,如果涉案合同為一買賣將來物之合同,即按照上訴人所主張,被上訴人在簽署涉案合同一刻已經為涉案單位之所有人,—那麼,為何仍要就這些「水、電錶」費用以及管理費用進行規管,並作為預約買賣合同的義務的一部份要求被上訴人支付相關費用?
     28. 再者,雖然上訴人主張其所發出的收據中所寫的文字為「訂金(depósito)」而非「定金」,但相信作為一般受意人,在澳門的市場交易中,均為未區分這兩個表述,即使係現樓預約買賣,均習慣以「落訂」或「落大訂」作為定金的表述。更何況,無論有關字眼上表述為哪一個也好,根據《民法典》第435條規定,均推定為定金。
     29. 另外,需要知道的是,涉案合同係由上訴人所準備,以上合同上的文字,均為上訴人所草擬。因此,實在是難以理解上訴人一方面主張在歷史上樓花法生效前法律並未有就買賣在建樓宇的形式進行規管、卻又一方面準備《D樓宇買賣預約合約》(而非《D樓宇買賣合同》)予被上訴人簽署,而最後卻主張有關合同並非預約買賣合同而是所謂的「預留合同」或「將來物的買賣合同」。
     30. 還須強調的是,卷宗第56頁顯示在樓花法生效之後被上訴人係以第7/2013號法律第10條第3款作出登記—即被上訴人所主張登記的依據為預約買受人名義以及預約買賣合同,而這一依據係獲作為第三方的物業登記局所確認。
     31. 因此,無論係文字上、背景上、歷史上以及目的上,均只能得出涉案合同為受《民法典》第404條、第435條以及第436條所規管之預約買賣合同。
     32. 而法律上,無論係「將來物之買賣合同」,抑或「預留合同」,均明顯不適用於本案中。
     33. 「將來物之買賣合同」受買賣合同的規定所約束,在司法上以及學說上均認為,簽署「將來物之買賣合同」後無須另外再簽署其它合同,因為其物權在簽署將來物之買賣合同的時候已獲得轉讓,只是相關移轉基於將來物未存在而暫時被中止。由於將來物為一不動產,因此,根據同一法典第866條,需要採用公證書成立,否則根據第212條,為無效的合同。
     34. 如上訴人有意與被上訴人簽署將來物的買賣合同,作為經驗豐富的發展商,顯然而見會選擇公證書而非準備一「無效」的合同去約束被上訴人。
     35. 而就上訴人所主張的「預留合同」,參考里斯本中級法院於第25178/20.3T8LSB.L1-7號案之見解,亦能知悉「預留合同」屬於簽署在協商初期,即雙方的意願以及條件仍未確認時所簽署的合同,通常早於預約買賣合同所簽署。
     36. 然而在涉案合同中,明顯雙方已經明確承諾作出涉案單位之交易,樓宇之價格、支付方式以及交付已作出了相應規管,明顯已遠超「預留合同」所規管之範籌。
     37. 綜上,上訴人為着規避定金制度的適用而將同一份合同定性為兩種大相逕庭之合同之理據,係明顯不成立的。
     38. 因此,就原審法院將合同定性為預約買賣合同一部份應予維持。
     39. 至於上訴人作為補充,倘涉案合同為預約買賣合同,其所主張被上訴人所支付的款項為《民法典》第434條所指的提前履行亦無道理。
     40. 因為同一法典第435條已規定被上訴人享有有關法律推定,故應由上訴人根據同一法典第337條推翻推定,即證明被上訴人所支付的HKD1,492,500.00均非為定金。
     41. 根據已證事實第62條,已經能夠證明被上訴人及上訴人根本沒有排除上述金額的定金性質。而在本上訴理由陳述中,上訴人並沒有根據《民事訴訟法典》第599條第1款就上述事實的認定提出爭執。因此,在沒有任何已證事實支撐上訴人單方面之說辭下,上訴人這一部份理據之上訴理由應同樣視為不成立。
     C. 關於賠償金額
     42. 上訴人認為,根據上述見解,應按照不當得利的制度,向被上訴人返還其曾支付的款項。作為補充,上訴人認為本案的賠償金額明顯過高,應適用衡平原則,並將上訴人需向被上訴人支付的總賠償金額縮減至不超過HKD2,000,000.00。
     43. 被上訴人同樣不認同上訴人上述主張。
     44. 在本案中,既然已經證實了上訴人與被上訴人之間存在《D樓宇買賣預約合約》之合同關係,也證實了基於上訴人之過錯不履行而無法簽署買賣公證書,因此,無論如何也不應適用不當得利的規定。
     45. 再次重申,根據已證事實第62條,上訴人及被上訴人從未排除HKD1,492,500.00的定金性質。因此,應維持適用案中根據《民法典》第434條的規定,認定HKD1,492,500.00的款項具有定金性質,並根據同一法典第436條第2款,判處上訴人向被上訴人支付雙倍定金之賠償之決定。
     46. 至於上訴人主張適用衡平原則,僅需向被上訴人歸還不超過合共HKD2,000,000.00的款項部分,被上訴人亦認為是毫無道理。
     47. 被上訴人在此完全認同原審法院認為本案並不屬於賠償金額明顯過高的情況,因此不應適用衡平原則。而同樣作為補充的是,被上訴人認為可參考中級法院在2020年06月18日編號第320/2020的裁判書之見解。
     48. 需知道的是,本案中,上訴人為取得涉案單位,的確向被上訴人支付了HKD1,492,500.00的定金(已證事實第16條及第17條)。在被上訴人需要向上訴人支付雙倍定金作為違約金的情況下,有關金額其實僅為HKD2,985,000.00。
     49. 再者,本案中的定金金額符合一般的不動產預約買賣合同中所需支付的定金金額。所以,即使被上訴人因為無法履行合約而需要支付雙倍定金,金額對於其亦沒有明顯過多。
     50. 根據上引中級法院見解,雖然法院可以依法將違約金金額降低,但同時須注意的是,在案中的賠償額與一般交易無異的情況下,不應隨意減少違約金,否則便會令到違約金的機制形成虛設,毫無用處。
     51. 需要再次重申的是,根據第8/2019號法律第3條規定,置換房並無補償性質,被上訴人僅僅是因為上訴人的原因獲得購買的資格,而不是因為上訴人而被批准以無償方式取得有關單位。況且,直至現今,置換房都仍未建造完畢,被上訴人亦無法得知何時完工。
     52. 被上訴人從2013年起支付了HKD1,492,500.00元後,已經無法取得涉案單位,而現在為了取得一個未知建造質量、將來價值的單位,更需要額外再支付一筆樓款。十年前,被上訴人仍有能力取得貸款,有能力支付首期;事隔十年,上訴人仍未對被上訴人作出過任何賠償,而所有貸款條件已經不相同,最後被上訴人是否仍有能力購入置換房,一切均為未知之數。
     53. 這種情況下,一個可以購入置換房單位的機會,怎能談得上是對被上訴人的補償。
     54. 綜上,上訴人這一部份的理據應同樣不成立,應維持原審法院作出的裁判。
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    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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  III – FACTOS ASSENTES:
    A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
     1. A Ré, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis, sob o número XX SO, é uma sociedade por quotas, constituída em Macau, no dia 8 de Fevereiro de 1977, cujo objecto é a exploração do comércio de importação e exportação, da actividade de agente comercial e de transportes, da indústria de vestuário, fiação, tecelagem e malhas, tinturaria e impressão, do fabrico de bordados e, ainda, da actividade de fomento predial e construção e reparação de edifícios.
     2. A Ré, sendo uma sociedade que tem muitos anos de experiência no desenvolvimento imobiliário, desenvolveu vários complexos habitacionais, tais como Edifício XX, XX e XX.
     3. Por Despacho n.º 160/SATOP/90, publicado no 2.º Suplemento ao n.º 52 do Boletim Oficial, de 26 de Dezembro de 1990, alterado pelo Despacho nº 107/SATOP/91, publicado no BO, nº 26, de 1 Julho de 1991, foi concedido à Ré o terreno, a resgatar ao mar, com a área de 60,782m2, constituído pelo Lote “O”, para fins habitacionais, Lote “S” para fins habitacionais e Lote “Pa” para fins industriais, sitos na zona de novos aterros da XX na península de Macau, dando-se o teor do despacho por aqui integralmente reproduzidos.
     4. O prazo de concessão do terreno referido no facto assente C) expirou em 25 de Dezembro de 2015, a contar da data da publicação do despacho de concessão (ou seja, 26 de Dezembro de 1990).
     5. Por Despacho n.º 123/SATOP/93, publicado na II Série do Boletim Oficial n.º 35, de 1 de Setembro de 1993, e nos termos que já tinham sido previstos no Despacho n.º 160/SATOP/90, foi à Ré concedida a parcela de terreno designada por “Pb” destinada a ser anexada à parcela “Pa”, constituindo um lote único com a área global de 67.536m2 designado por “P” e destinava-se a viabilizar o projecto de instalação de um “complexo industrial”, dando-se o teor do despacho por aqui integralmente reproduzidos.
     6. Em 2004, a Ré apresentou à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) um estudo prévio, pretendendo alterar a finalidade do lote “P” de indústria para comércio e habitação.
     7. O aludido estudo prévio da alteração da finalidade do lote “P” foi considerado, no dia 21 de Janeiro de 2005, passível de aprovação, constituindo condição para a revisão do contrato.
     8. Por Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, publicado no Boletim Oficial da RAEM, n.º 9, II Série, de 01 de Março de 2006, foi acordada a alteração da finalidade e do reaproveitamento do lote «P», passando de fins industriais para fins comerciais e habitacionais para a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com 5 pisos, sobre o qual assentariam 18 torres com 47 pisos, e afectado às seguintes finalidades e áreas brutas de construção (dando-se o teor do despacho aqui por integralmente reproduzido):
     - Habitação: 599.730 m2;
     - Comércio: 100.000 m2;
     - Estacionamento: 116.400 m2;
     - Área livre: 50.600 m2.
     9. Não obstante a total alteração do aproveitamento do lote “P”, o prazo de concessão de 25 anos estipulado na cláusula 2ª, n.° 1, do contrato de concessão manteve-se inalterado.
     10. O prazo de aproveitamento foi de 96 meses contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial da RAEM do despacho que titulasse a referida revisão.
     11. Pelo menos desde 7 de Janeiro de 2011, a Ré começou a promover a venda das fracções autónomas do Edifício “D”
     12. Em 24 de Outubro de 2013, a Ré requereu junto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) a licença para as obras de fundação, que foi emitida em 2 de Janeiro de 2014, com prazo de validade até 28 de Fevereiro de 2014 (cfr. documento a fls. 870 do autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
     13. Em 11 de Dezembro de 2012, a Ré celebrou com o Autor um contrato denominado “Contrato-Promessa de Compra e Venda de D”, que incidia sobre a fracção autónoma H (adiante designada por “H40”), para habitação, do 40.º andar, do bloco XX, do edifício em construção “D” no “Lote P”, S/N, situado em Macau, na XX (cfr. documento constante a fls. 63 a 68 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
     14. O preço para a compra e venda da referida fracção autónoma era de HKD4.975.000,00, equivalentes a MOP5.124.250,00.
     15. Em função da cláusula 3ª do contrato, o Autor efectuou, segundo a forma abaixo referida, o pagamento do preço do imóvel à Ré:
     * O montante de HKD497.500,00, aquando da celebração do aludido contrato;
     * O montante de HKD248.750,00, antes de 15 de Junho de 2013;
     * O montante de HKD248.750,00, antes de 15 de Dezembro de 2013;
     * O montante de HKD248.750,00, antes de 15 de Junho de 2014;
     * O montante de HKD248.750,00, antes de 15 de Dezembro de 2014;
     * O valor total do remanescente de HKD3.482.500,00 no prazo de 7 dias a contar da emissão da licença (licença de ocupação) pela DSSOPT.
     16. O autor pagou à Ré HKD497.500,00 aquando da celebração do contrato mencionado no facto provado M).
     17. Em seguida, O autor pagou por quatro vezes, um valor total de HKD995.000,00 à Ré.
     18. Conforme a cláusula 5ª do contrato mencionado no facto provado M), tinham os Autores a obrigação de efectuar os pagamentos dentro dos prazos estipulados, implicando um eventual atraso o incumprimento ao contrato e desistência do sinal, tendo, assim, a Ré o direito de fazer seu todo o dinheiro pago pelos Autores, bem como de reaver, de forma gratuita, a fracção que os Autores tinham prometido adquirir, para revenda a terceiros.
     19. Segundo a cláusula 10ª do contrato mencionado no facto provado M), a Ré prometeu entregar a fracção aos Autores no prazo de 1200 dias úteis de sol (ou seja, excluídos domingos, feriados e dias de chuva), contados a partir da conclusão do primeiro piso para habitação das obras de superestrutura.
     20. Em 15 de Janeiro de 2014, a Ré formulou o pedido urgente de prorrogação do prazo de aproveitamento de 72 meses junto da DSSOPT (documento junto a fls. 871 a 876, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
     21. A Ré repetiu o mesmo pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento em 30 de Janeiro de 2014 (documento junto a fls. 877 a 880, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
     22. No decorrer da execução da obra, a Ré requereu, no dia 4 de Junho de 2014, junto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes a prorrogação do prazo de aproveitamento do lote “P”, bem como a emissão da licença de obras até 25 de Dezembro de 2015, referindo na carta que durante a apreciação e aprovação do projecto de arquitectura, continuou a receber diversos pareceres dos serviços públicos, entre as quais várias diziam respeito a critérios e exigências adicionais, o que fez com que tenham sido demorado oito anos desde o despacho que alterou a finalidade até à obtenção oficial da licença das obras, tendo ainda prometido solenemente no requerimento que iria assumir todas as consequências depois da realização das obras (cfr. fls. 885 a 886 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
     23. A Ré repetiu o requerimento de prorrogação do prazo de aproveitamento em 2 de Julho de 2014 (documento junto a fls. 888 a 890, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
     24. No dia 10 de Julho de 2014, o então Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu o seguinte parecer sobre o aludido requerimento datado de 4 de Junho de 2014:
     “Governo da Região Administrativa Especial de Macau
     Gabinete do Secretário para os Transportes e Obras Públicas
     Parecer
     Proc. n.° 18/2014 – a A, Limitada, pediu prorrogar o prazo de aproveitamento dum terreno concedido por arrendamento, situado na península de Macau, nos NATAP, constituído pelos lotes designados por “O”, “P”, “S” e “V”, com área total de 105.437 m2, cujo contrato de concessão é titulado por despacho n.° 160/SATOP/90, modificado por despacho n.° 123/SATOP/93, despacho n.° 123/SATOP/99, despachos n.° 19/2006 e n.° 30/2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas.
     Como não se observou o prazo de aproveitamento do lote “P”, propõe-se considerar a situação real do lote “P”, nomeadamente o teor da carta da concessionária, para tomar a decisão final.
     Ficou prescrito o prazo de aproveitamento do terreno referido em 28 de Fevereiro deste ano, ficará prescrito o prazo de arrendamento em 25 de Dezembro do próximo ano (2015).
     A Sociedade concessionária declara que aceita a eventual multa de prorrogação, realça e compromete-se que “vai assumir todas as consequências depois da construção”.
     Analisado o parecer da Comissão de Terras e ponderando os 17° a 21° pontos desse parecer e a carta da concessionária constante do 24° ponto, nomeadamente o teor do ponto 24.4, concordo, em princípio, com os pontos 14.2 e 14.3 da informação n.° 090/DSODEP/2014 da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, isto é, prorrogar o prazo de aproveitamento até 25 de Dezembro de 2015 e aplicar a multa no montante de MOP$180.000,00, pressupondo que a Sociedade concessionária aceite previamente por escrito as seguintes condições, para garantir interesses públicos:
     1. Se não for completado o aproveitamento antes da prescrição de arrendamento, mesmo estando preenchidos os requisitos previstos do art.° 5.° da Lei n.° 7/2013 (Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção), a Sociedade concessionária não vai pedir autorização prévia para fazer negócios jurídicos de promessa de transmissão ou oneração de edifícios em construção no lote P, nem vai realizar esses negócios jurídicos, excepto a eventual obtenção legal da nova concessão desse terreno;
     2. Se não mais lhe for concedido o terreno, a Sociedade concessionária não pode pedir à RAEM qualquer indemnização ou compensação.
     À consideração do Exmo. Sr. Chefe do Executivo.
     10 de Julho de 2014
     Secretário para os Transportes e Obras Públicas
     Ass.
      vide o original
     E”
     25. No dia 15 de Julho de 2014, o Chefe do Executivo lançou o seguinte despacho sobre o parecer supracitado: “Concordo”.
     26. No dia 29 de Julho de 2014, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes enviou à ré um ofício, n.° 572/954.06/DSODEP/2014, com o seguinte teor:
     “……
     Assunto: sobre o pedido de prorrogação do prazo do aproveitamento de terreno, de um terreno concedido por arrendamento, situado na zona de Novos Aterros da Areia Preta (NATAP) Macau, com uma superfície total de 105.437 m2, constituído por quatro lotes designados por “O”, “P”, “S” e “V”, cujo contrato de concessão foi regulado pelo Despacho n.° 160/SATOP/90, e revisto pelo Despacho n.° 123/SATOP/93, pelo Despacho n.° 123/SATOP/99, pelo Despacho n.° 19/2006 e pelo Despacho n.° 30/2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas
     1.Nos termos da cláusula n.° 2 do contrato de concessão de terreno revisto pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.° 19/2006, o prazo de aproveitamento do terreno já ficou caduco aos 28 de Fevereiro de 2014; no entanto, nos termos do art.° 2.° do Despacho n.° 160/SATOP/90, o prazo de arrendamento do terreno vai acabar aos 25 de Dezembro de 2015.
     2.Como o atraso do aproveitamento do terreno é imputável à vossa empresa, e tendo em conta que esta não é a primeira vez que a vossa empresa requer prorrogar o aproveitamento de terreno, e visto que já concordou aceitar a forma de punição para o atraso prevista no contrato; para o efeito, nos termos do Despacho proferido pelo Chefe do Executivo aos 15 de Julho de 2014, autoriza-se prorrogar o prazo de aproveitamento do terreno até 25 de Dezembro de 2015, e aplica-se a multa no valor de MOP$180.000,00 (cento e oitenta mil patacas). Mas para garantir os interesses públicos, a empresa concessionária obriga-se previamente a prometer por escrito aceitar as seguintes condições:
     2.1. Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5.° da Lei n.° 7/2013, Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção, a concessionária não vai pedir autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no lote “P" ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;
     2.2. Se no futuro o terreno não for concedido de novo nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.
     3.Nestes termos, avisa-se a vossa empresa para entregar a promessa escrita acima mencionada, para ser transferida à Comissão de Terras para acompanhar, a fim de emitir a guia do pagamento da multa.”
     27. A ré aceitou o pagamento da referida multa de MOP$180.000,00 e comunicou, no dia 4 de Agosto de 2014, ao Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes o seguinte:
     “……
     Assunto: sobre o pedido de prorrogação do prazo do aproveitamento de terreno, de um terreno concedido por arrendamento, situado na zona de XX (NATAP) Macau, com uma superfície de 68.001 m2, designado por Lote “P”, cujo contrato de concessão foi regulado pelo Despacho n.° 160/SATOP/90, e revisto pelo Despacho n.° 123/SATOP/93, pelo Despacho n.° 123/SATOP/99, pelo Despacho n.° 19/2006 e pelo Despacho n.° 30/2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas
     A A, LIMITADA (o nome em inglês: A LIMITED, doravante designada simplesmente por “concessionária”), com a sede de pessoa colectiva na Avenida do XX, Lote “P”, Edifício “I”, Macau, a concessionária do terreno em título, em resposta ao pedido no ofício n.° 572/954.06/DSODEP/2014 emitido pela DSSOPT aos 29 de Julho do ano corrente, declara aceitar a multa no valor de MOP$180.000,00, condenada segundo o despacho proferido aos 15 de Julho de 2014, declara mais aceitar as seguintes condições:
     1. Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5.° da Lei n.° 7/2013, Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção, a concessionária não vai pedir autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no Lote “P" ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;
     2. Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.
     A, Limitada
     G, H
     Aos 4 de Agosto de 2014”
     28. No dia 27 de Novembro de 2015, a Ré apresentou ao Chefe do Executivo um pedido de prorrogação dos prazos de aproveitamento e de concessão por período não inferior a 60 meses, contados a partir de 26 de Dezembro de 2015.
     29. No dia 30 de Novembro de 2015, o Chefe do Executivo indeferiu o aludido pedido de prorrogação com fundamento de a Lei n.° 10/2013 impedir a renovação de concessões provisórias, não podendo, por isso, ser autorizada a prorrogação do prazo de aproveitamento.
     30. No dia 29 de Janeiro de 2016, foi publicado, na II Série do Boletim Oficial da RAEM, o Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.° 6/2016, que tornou público o seguinte: “Por despacho do Chefe do Executivo, de 26 de Janeiro de 2016, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 68.001 m2, situado na península de Macau, nos NATAP, designado por lote «P», a que se refere o Processo n.° 2/2016 da Comissão de Terras, pelo decurso do seu prazo, nos termos e fundamentos do parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 22 de Janeiro de 2016, os quais fazem parte integrante do referido despacho” (dando-se o teor do despacho aqui por integralmente reproduzido).
     31. Contra o despacho que declarou a caducidade da concessão do lote “P”, a Ré interpôs recurso contencioso junto do Tribunal de Segunda Instância (Processo n.°: 179/2016).
     32. No dia 19 de Outubro de 2017, o Tribunal de Segunda Instância proferiu o acórdão que julgou improcedente o recurso contencioso interposto pela ré, mantendo-se o despacho que declarou a caducidade da concessão do lote “P”.
     33. A Ré recorreu junto do Tribunal de Última Instância contra o referido acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância (Processo n.°: 7/2018).
     34. No dia 23 de Maio de 2018, o Tribunal de Última Instância proferiu o acórdão que negou provimento ao recurso interposto pela Ré (Processo n.°: 7/2018).
     35. Tanto o Tribunal de Segunda Instância, como o Tribunal de Última Instância, entendem fundar-se a declaração da caducidade da concessão do lote “P”, em caducidade preclusiva, a qual depende do facto objectivo de ter decorrido o prazo do contrato de concessão e não ter a Ré apresentado a licença de utilização de imóvel.
     36. A partir da data da declaração, pelo Chefe do Executivo, da caducidade da concessão do lote “P”, a Ré deixou de desenvolver qualquer obra no respectivo terreno, no âmbito da construção do Edifício “D” e da fracção autónoma “H40”, ora em discussão.
     37. Em 29 de Abril de 2008, a Ré apresentou o Plano de Consulta (documentos juntos a fls. 211 a 239, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
     38. Em 6 de Maio de 2008, a Ré apresentou o projecto parcial de arquitectura (documentos juntos a fls. 240 a 248, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
     39. Após o pedido de emissão de nova PAO formulado em 14 de Agosto de 2009, em 23 de Fevereiro de 2010, a DSSOPT emitiu nova PAO (documento junto a fls. 269, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
     40. A Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental – DSPA levou 1 mês para emitir o parecer sobre o 1.º relatório de impacto ambiental, de 21 de Junho de 2011.
     41. O parecer emitido pela DSPA sobre 1.º relatório de impacto ambiental, de 21 de Junho de 2011, sem qualquer alteração, foi notificado à Ré, em 4 de Outubro de 2011 pela DSSOPT (ofício com referência n.º 11599/DURDEP/2011, documento junto a fls. 345 a 348, que aqui se dão por integralmente reproduzido).
     42. No parecer emitido em 21 de Junho de 2011 pela DSPA, a DSPA exigiu uma avaliação do impacto sobre o empreendimento das potenciais fontes de poluição nas áreas adjacentes, tais como o parque de estacionamento a sul do Projecto e a ETAR (Estação de Tratamento de Águas Residuais).
     43. O 2.º Relatório foi apresentado pela Ré em 19 de Abril de 2012 (T-4242/2012) (documentos junto a fls. 357 a 411, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
     44. Em 31 de Agosto de 2012, a Ré apresentou o 3.º Relatório de Avaliação de Impacto Ambiental (documentos junto a fls. 444 a 522, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
     45. A DSPA entregou à DSSOPT, em 16 de Outubro de 2012, o seu Parecer sobre o 3.º Relatório (documentos junto a fls. 525 a 527, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
     46. O Parecer emitido pela DSPA em 16 de Outubro de 2012 foi notificado à Ré em 28 de Dezembro de 2012.
     47. No ofício datado de 28 de Dezembro de 2012, o Departamento de Planeamento Urbanístico da DSSOPT (“DPU”) exigiu que no estudo sobre a circulação de ar, incluísse uma “Simulação Informática”.
     48. Em 15 de Março de 2013, a Ré apresentou o 4.º Relatório de Avaliação de Impacto Ambiental (T-3953-2013, documentos junto a fls. 529 a 633, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
     49. Em 3 de Maio de 2013, a DSPA emitiu o seu 4.º Parecer para a DSSOPT, sobre o 4.º Relatório apresentado pela Ré (documentos junto a fls. 634 a 637, que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
     50. No parecer emitido pela DSPA em 3 de Maio de 2013, a DSPA exigiu ainda uma avaliação do impacto em termos de ruído que o trânsito rodoviário dos Novos Aterros urbanos e a Ilha Artificial da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau pudesse causar para o empreendimento.
     51. Em 15 de Outubro de 2013, a DSSOPT notificou a Ré informando que tinham sido aceites os relatórios de circulação de ar e de impacto ambiental (documentos junto a fls. 836 a 847, que aqui se dão por integralmente reproduzido).
     52. O prazo para a apreciação dos projectos constante da cláusula 5.º, n.º 7 do contrato de concessão inicial, titulado pelo Despacho n.º 160/SATOP/90, é de 60 dias.
     53. Segundo a cláusula 5.ª do despacho n.° 160/SATOP/90, modificado pelo despacho n.° 123/SATOP/93: “Caso os Serviços competentes não se pronunciem no prazo fixado no número anterior, o segundo outorgante poderá dar início à obra projectada trinta dias após comunicação por escrito, à DSSOPT, sujeitando, todavia, o projecto a tudo o que se encontra disposto no RGCU ou quaisquer outras disposições aplicáveis e ficando sujeito a todas as penalidades previstas naquele Regulamento Geral da Construção Urbana, com excepção do estabelecida para a falta de licença. Todavia, a falta de resolução, relativamente ao anteprojecto de obra, não dispensa o segundo outorgante da apresentação do respectivo projecto de obra.”
     54. A data do termo do prazo de concessão e aproveitamento do lote P era pública por constar do Registo Predial.
     55. O lote “P”, situado em Macau, na zona nordeste da XX, seria desocupado pelo governo e, após a recuperação do terreno, as autoridades iriam proceder, de acordo com a Lei do Planeamento Urbanístico, ao seu planeamento. Acrescentou que, atenta a localização do terreno, o governo propunha aproveitá-lo para o uso de habitação, comércio, instalações públicas e sociais.(Q 1.º)
     56. A razão directa pela qual a Ré não foi capaz de vender a fracção autónoma “H40” referida no facto assente M) e no contrato foi por não ter sido renovado o prazo de arrendamento do contrato de concessão do terreno, respeitante ao Lote “P”, e por não ter sido concessionado novamente pelas autoridades competentes o Lote “P” à Ré. (Q 2.º)
     57. A razão pela qual não foi efectuada a renovação do prazo de arrendamento do contrato de concessão do terreno, respeitante ao Lote “P”, deveu-se ao facto de a Ré não haver concluído o aproveitamento dentro do prazo de arrendamento, convertendo a concessão provisória em definitiva. (Q 3.º)
     58. Na altura em que foi concedido por arrendamento o lote “P” e autorizada a alteração de finalidade, a Ré tinha perfeito conhecimento de que o prazo de arrendamento do respectivo terreno iria prescrever em 25 de Dezembro de 2015. (Q 4.º)
     59. Quando a Ré celebrou com os Autores o contrato mencionado no facto provado M), já tinha conhecimento de que o prazo de arrendamento do respectivo terreno iria prescrever em 25 de Dezembro de 2015. (Q 5.º)
     60. A Ré sabia perfeitamente que a renovação só se aplicava aos terrenos em concessão definitiva. (Q 6.º)
     61. A Ré estava convicto de que, mesmo que não tivesse sido ainda convertida em concessão definitiva até ao termo do prazo da concessão provisória do Lote “P”, poderia efectuar a renovação ou prorrogação, ou obter novamente a concessão do Lote “P” por parte das autoridades competentes. (Q 7.º)
     62. Quanto ao valor de HKD1.492.500,00 os autores pagaram à ré, os Autores e a Ré nunca acordaram que esse valor não revestisse o carácter de sinal, nem excluíram essa sua natureza. (Q 8.º)
     63. A Ré como uma promotora com vários anos de experiência no desenvolvimento imobiliário em Macau tinha muita capacidade financeira. (Q 9.º)
     64. Contribuíram, decisivamente, para a aceitação do prazo de aproveitamento previsto no Despacho n.º 19/2006 vários factores, nomeadamente: (Q 10.º)
     a) As Plantas de Alinhamento Oficiais (PAOs) referentes ao Lote ”P”, emitidas em 2004 e 2005, com clara definição das condições urbanísticas, sem imposição de afastamento mínimo entre as torres do empreendimento, permitindo, dentro deste quadro, ao particular conceber o projecto de acordo com a sua perspectiva de investimento;
     b) A habitual invariabilidade das condições urbanísticas ao longo da execução do contrato de concessão;
     c) A apresentação pela Ré do Estudo Prévio em 10 de Setembro de 2004, complementado em 15 de Dezembro de 2004, sem imposição de afastamento mínimo entre as torres do empreendimento, que serviu de base para o cálculo do prémio devido pela revisão do contrato de concessão;
     d) Ter sido aprovado o Estudo Prévio em 21 de Janeiro de 2005, por ofício n.º 747/DURDEP/2005, sem imposição de afastamento mínimo entre as torres do empreendimento, e emitidos os pareceres técnicos de todas as entidades que, por lei, são chamadas a pronunciar-se de acordo com as suas áreas funcionais;
     e) Ser expectável para a Ré, de acordo com a sua vasta experiência no desenvolvimento de projectos imobiliários em Macau, poder concluir a empreitada em questão muito antes do fim do prazo da concessão, havendo, inclusive, reserva de prazo para introduzir melhorias no plano de aproveitamento do terreno e inerente alteração do estudo prévio;
     f) Não haver indícios de funcionamento anormal e impeditivo de uma actuação célere, adequada e proporcional dos serviços da Administração Pública, em conformidade com os parâmetros constantes do Código Procedimento Administrativo e do Regulamento Geral de Construção Urbana (“RGCU”).
     g) A existência de uma cláusula no contrato de concessão de 1990, que se manteve em vigor, consagrando o princípio da colaboração dos serviços da Administração Pública no respeitante ao prazo de pronúncia para os projectos que lhes fossem submetidos para aprovação: ou seja, conforme a cláusula 5.ª, n.º 7, a Administração dispunha de um prazo de 60 dias para aceitar ou rejeitar os pedidos da Ré;
     h) A convicção, tal como em casos anteriores, da existência de necessária cooperação da Administração no cumprimento de prazos, a fim de viabilizar a conclusão do empreendimento projectado em tempo útil.
     65. Após a revisão contratual de 2006, tendo em conta a experiência em outros projectos, a Ré submeteu à apreciação da DSSOPT um novo Plano de Consulta (vulgo “Estudo Prévio de Alteração”), com proposta de nova distribuição da localização das torres, reduzindo-as de 18 para 16 torres, assim como a diminuição da altura destas, na condição de construção de dois pisos em cave, mantendo-se, contudo, a mesma área bruta de construção e respectiva alocação nas suas diferentes finalidades. (Q 11.º)
     66. Em 2007, a Ré pediu e obteve uma terceira PAO, emitida em 11 de Maio de 2007 (fls. 210). (Q 12.º)
     67. Decorrido o prazo de 60 dias, a DSSOPT não comunicou à Ré o resultado da sua apreciação aos projectos apresentados em 6 de Maio de 2008. (Q 13.º)
     68. 14.A Ré solicitou, em 14 de Agosto de 2009, a emissão de uma PAO actualizada. (Q 14.º)
     69. Passados os 60 dias de prazo e de novo sem qualquer resposta da DSSOPT, a Ré, gerindo o prazo de aproveitamento do terreno, não aguardou pela nova Planta de Alinhamento Oficial e submeteu o referido projecto global de arquitectura, para efeitos de aprovação, em 22 de Outubro de 2009 (T-7191/2009, documento junto a fls. 255 a 268, que aqui se dão por integralmente reproduzido). (Q 15.º)
     70. Os projectos de 29 de Abril de 2008 e de 6 de Maio de 2008 foram apreciados pelos serviços internos da DSSOPT, até à data da apresentação do projecto global em 22 de Outubro de 2009. (Q 15.ºA)
     71. A PAO emitida em 23 de Fevereiro de 2010 introduziu um novo elemento, não presente nas PAO’s anteriores, no contrato de concessão, “sugerindo” à Ré a alteração do projecto de 22 de Outubro de 2009, com introdução de novo “layout” das torres, para obedecer à distância mínima de afastamento de 1/6 da altura da torre mais alta. (Q 16.º)
     72. Em 9 de Abril de 2010, através do ofício n.º 4427/DURDEP/2010, (fls. 270 a 273, que aqui se dão por integralmente reproduzido), a DSSOPT incluiu esta nova condicionante no ponto 6 deste ofício, o qual continha em anexo a inovadora PAO de 23 de Fevereiro de 2010. (Q 17.º)
     73. O cumprimento da exigência de contemplação de um afastamento mínimo entre as torres não inferior a 1/6 da altura da torre mais alta alteraria de modo significativo, se não por completo, o modelo construtivo preconizado pela Ré no Estudo Prévio de 2004, sem o afastamento mínimo de 1/6 da altura da torre mais alta, e estava implícito nos seus planos de investimento com a revisão do contrato de concessão em 2006, o afastamento entre torres se tratou de uma sugestão e não de uma exigência. (Q 18.º)
     74. A exigência de contemplação de um afastamento mínimo entre as torres não inferior a 1/6 da altura da torre mais alta constituiria uma inutilização de parte do tempo já despendido na concepção e elaboração do plano global de arquitectura, para além de implicar ainda a necessidade de despender mais tempo com a redefinição do empreendimento, o que não estava dentro dos prazos preconizados pela Ré para a melhor gestão dos prazos de aproveitamento do terreno. (Q 19.º)
     75. O acatamento da sugestão de afastamento mínimo entre torres correspondente a 1/6 da altura da torre mais alta implicava relocalização (layout) das torres projectadas e tinha o sério risco de, se se pretendesse manter as vistas das torres para o mar e uma concepção harmoniosa de vistas internas entre as torres, implicar uma diminuição de áreas de construção e a redução do número de torres. (Q 20.º)
     76. Em resposta, em 3 de Junho de 2010, a Ré incorporou neste projecto de 22 de Outubro de 2009 as exigências obrigatórias da DSSOPT e não acolheu o número 6 do ofício de 9 de Abril de 2010 que constituía mera sugestão da DSSOPT no sentido de contemplar o referido afastamento mínimo entre as torres equivalente a 1/6 da altura da torre mais alta (T-5291- documento junto a fls. 280 a 284, que aqui se dão por integralmente reproduzido). (Q 21.º)
     77. Em 30 de Dezembro de 2010, a DSSOPT aprovou o projecto de arquitectura que tinha sido apresentado pela Ré, em 22 de Outubro de 2009 (ofício n.º 318/DURDEP/2011, de 7 de Janeiro de 2011), com as alterações técnicas de pormenor introduzidas em 3 de Junho de 2010, sem o sugerido afastamento mínimo de 1/6 (documento junto a fls. 285 a 287, que aqui se dá por integralmente reproduzido). (Q 22.º)
     78. O projecto de arquitectura, finalmente aprovado em 30 de Dezembro de 2010, notificado à Ré por ofício de 7 de Janeiro de 2011, contemplava, outrossim, as soluções anteriormente preconizadas nas PAOs de 23 de Dezembro de 2004, 23 de Fevereiro de 2005 e 11 de Maio de 2007, emitidas em harmonia com o estudo prévio e o contrato de concessão na versão revista em 2006. (Q 23.º)
     79. No Ofício de 7 de Janeiro de 2011 a Administração prescindiu da necessidade de um afastamento entre as torres equivalente a 1/6 da torre mais alta. (Q 24.º)
     80. Desde a data de aprovação do projecto, comunicada em 7 de Janeiro de 2011, até ao termo do prazo de aproveitamento ou do prazo de concessão do terreno, dispunha a Ré de tempo suficiente para concluir todo o empreendimento. (Q 25.ºA)
     81. A DSSOPT, apesar de ter aprovado o projecto de arquitectura, não autorizou a emissão imediata da licença de obras, incluindo a licença para implantação de alicerces e fundações no terreno, até que fossem aprovados o relatório de circulação de ar e o relatório de impacto ambiental do empreendimento. (Q 26.º)
     82. A exigência de aprovação do relatório de circulação de ar e do relatório de impacto ambiental do empreendimento não está prevista no contrato de concessão do lote P. (Q 27.º)
     83. A exigência de apresentação dos relatórios de circulação de ar e de impacto ambiental nunca antes tinham sido efectuada em Macau. (Q 27.ºA)
     84. Em 11 de Maio de 2011, a Ré apresentou os exigidos relatórios (1.º relatório) (T-5205/2011) – relativamente às questões mencionadas pela DSSOPT no seu ofício de 7 de Janeiro de 2011: “fluxo do ar, efeito biombo, ilhas de calor e expansão de poluentes”, conforme pedido no referido ponto 19 do Ofício de 7 de Janeiro de 2011 (documento junto a fls. 288 a 344, que aqui se dão por integralmente reproduzido). (Q 28.º)
     85. A DSPA, com a anuência da DSSOPT, introduziu várias novas exigências no parecer emitido sobre 1.º relatório de impacto ambiental do empreendimento, ampliando significativamente o âmbito dos estudos inicialmente exigidos pela DSSOPT, designadamente: (Q 29.º)
     - A observância das “Guidelines” da DSPA, emitidas na altura, para a preparação de relatórios, as quais, porém, eram imprecisas e vagas, sem indicação concreta dos métodos de avaliação (qualitativa ou quantitativa, por exemplo);
     - A obtenção do parecer da Autoridade de Aviação Civil sobre a altura do empreendimento;
     - O impacto ambiental ao longo da fase de construção;
     - Impacto sonoro;
     - Qualidade do ar;
     - Qualidade das águas;
     - Resíduos sólidos;
     - Contaminação do solo;
     - Impacto visual e paisagístico durante a fase de operação (uma vez concluído o empreendimento);
     - Acrescentar mais receptores sensíveis e num raio de medição mais alargado;
     - Análise da colisão das aves contra os edifícios (documentos junto a fls. 346 a 348, que aqui se dão por integralmente reproduzido).
     86. O Estudo de Impacto Ambiental e o relatório sobre a circulação do ar não mereceriam parecer favorável nem aprovação sem a Ré dar cumprimento a tais exigências e, consequentemente, nenhuma licença seria emitida, não se podendo dar início ao aproveitamento. (Q 29.ºA)
     87. Na apreciação deste 2.º Relatório, a DSPA voltou a apresentar novas exigências (cfr. ofício de 24 de Maio de 2012, n.º 1586/054/DAMA/DPAA/2012), cujo teor foi objecto de discussão entre a Ré, a DSSOPT e a DSPA, em 25 Julho de 2012, tais como: (Q 30.º)
     - o projecto localiza-se nas proximidades da ETAR e do centro de tratamento de resíduos sólidos, pelo que tanto a disposição das fracções como das zonas públicas se devem ajustar por forma a garantir que é respeitada uma distância suficiente a evitar impacto negativo sobre os residentes, decorrente da mesma proximidade; sugere-se que as medidas de mitigação do ruído de trânsito sejam avaliadas de acordo com o método quantitativo, não bastando o método qualitativo; o projecto localiza-se perto de uma zona de passagem de voo e alimentação de aves, pelo que se sugere estudar o respectivo impacto ambiental;
     - estudo detalhado no âmbito do plano de construção para avaliar o impacto ambiental e nos edifícios vizinhos e devem ser produzidos regulamentos considerando medidas de emergência (preparação do plano de gestão ambiental do local).
     88. No parecer emitido pela DSPA em 16 de Outubro de 2012, a DSPA voltou a formular novas exigências, designadamente a avaliação do impacto das poeiras resultantes dos trabalhos de construção (partículas em suspensão), maior distância entre as torres do lote P e a ETAR, sem no entanto especificar qual a distância aconselhável que devia ser observada (documento junto a fls. 525 a 527, que aqui se dão por integralmente reproduzido). (Q 31.º)
     89. A exigência do estudo de “simulação informática” não está prevista no contrato de concessão do lote P. (Q 32.º)
     90. A exigência do estudo de “simulação informática” não está mencionada no ofício de 7 de Janeiro de 2011. (Q 33.º)
     91. A Ré foi obrigada a recorrer a serviços especializados de consultoria sedeados na Austrália, para a realização da “simulação informática” de circulação do fluxo de ar. (Q 34.º)
     92. O relatório de circulação de ar foi entregue pela Ré em 11 de Maio de 2011. (Q 35.º)
     93. A DSSOPT remeteu relatório de circulação de ar para a DSPA e esta, conforme ofício de 10 de Outubro de 2012, declarou-se, ano e meio depois, incompetente para o apreciar, sugerindo ser a DSSOPT a entidade com melhores condições para proceder à respectiva análise e aprovação. (Q 36.º)
     94. No parecer emitido pela DSPA em 3 de Maio de 2013, a DSPA voltou a apresentar novas exigências, desta feita em relação à avaliação quantitativa, em complemento da avaliação em método qualitativo já efectuada e entregue, dos odores provenientes da ETAR, de modo que se tornasse mais esclarecido o impacto que o mau cheiro pudesse acusar para o empreendimento e a avaliação da distância entre as torres do empreendimento e a ETAR. (Q 36.ºA)
     95. A DSPA exigiu uma avaliação quantitativa dos odores da ETAR, mas não disponibilizou os respectivos dados oficiais, os quais só foram entregues depois, socorrendo-se a Ré de dados fornecidos pelo seu arquitecto. (Q 37.º)
     96. À medida que a Ré ia satisfazendo as exigências adicionais, logo surgiam novas exigências, que obrigavam à apresentação de novo estudo e assim indefinidamente, além do atraso na apreciação do relatório sobre a circulação de ar. (Q 38.º)
     97. Em 28 de Junho de 2013, a Ré apresentou o 5.º Relatório de Avaliação de Impacto Ambiental, sem os dados oficiais solicitados sobre os odores da ETAR (documento junto a fls. 638 a 721, que aqui se dão por integralmente reproduzido). (Q 39.º)
     98. Tendo em vista evitar maiores demoras, a Ré pediu uma reunião conjuntamente com a DSSOPT e a DSPA, para, em contacto directo, tentar imprimir maior celeridade ao procedimento de apreciação deste 5.º Relatório. (Q 40.º)
     99. Foi na reunião de 26 de Julho de 2013 que os dados oficiais sobre odores da ETAR foram entregues à Ré. (Q 41.º)
     100. Em 7 de Agosto de 2013, a Ré apresentou o 6.º Relatório de Avaliação de Impacto Ambiental, contemplando a versão final do impacto sobre os odores da ETAR (documento junto a fls. 723 a 835, que aqui se dá por integralmente reproduzidos). (Q 42.º)
     101. O projecto da Ré apresentado em 22 de Outubro de 2009, com as alterações técnicas de pormenor de 3 de Junho de 2010, não sofreu quaisquer alterações de relevo. (Q 43.º)
     102. No ofício de 15 de Outubro de 2013 (alínea ww. dos Factos Assentes) acaba por simplesmente recomendar que se cumpram as recomendações do Parecer de 29 de Agosto de 2013 da DSPA, o qual apenas propõe genericamente que sejam adoptados os métodos adequados à implementação de “medidas de mitigação e a gestão ambiental, como as sugestões de monitorização constantes do relatório de avaliação ambiental sejam devidamente iniciadas e executadas” (ponto 1) e que se assegure o cumprimento da legislação ambiental durante a execução das obras (ponto 2). (Q 43.ºA)
     103. Após a emissão da licença de obra, a Ré deu de imediato início aos respectivos trabalhos. (Q 44.º)
     104. - A ré apresentou à DSSOPT um projecto parcial de arquitctura em 6/5/2008 e a DSSOPT não emitiu qualquer pronúncia sobre ele.
     - Em 22/10/2009, a ré apresentou outro projecto de arquitectura que substituiu o apresentado em 6/5/2008 e a ré apreciou-o tendo, em 09/04/2010 com exigências e sugestões.
     - A ré respondeu em 3/6/2010 acatando as exigências, mas não a sugestão de afastamento entre as torres projectadas correspondente, no mínimo, a 1/6 da altura da torre mais alta.
     -A DSSOPT aprovou este projecto e notificou a ré em 7/1/2011 para apresentar o relatório de estudos de impacto ambiental que teria a construção do empreendimento em matéria de fluxo de ar, efeito biombo, ilhas de calor e expansão de poluentes.
     - A ré realizou o estudo e apresentou o respectivo relatório em 11/5/2011;
     - Depois, a DSSOPT pediu mais estudos da mesma natureza (impacto ambiental) até que aprovou o relatório respectivo em 15/10/2013.
     - A ré pediu a emissão de licença de obras em 24/10/2013.
     - A licença de obras foi emitida em 02/01/2014. (Q 45.º e 46.º)
     105. À Ré bastariam 3 a 4 anos para concluir a construção de todo o empreendimento imobiliário “D” e entregar aos Autores a fracção autónoma. (Q 47.º)
     106. Em casos de inimputabilidade do concessionário, a política da RAEM era a de atribuir, por ajuste directo, “nova concessão”, após negociações sobre os respectivos termos e condições (vide os casos dos terrenos da Concórdia e do complexo Jardins Lisboa). (Q 48.º)
     107. Após a emissão de licença de obra, com base na convicção de vir a deferir à Ré um pedido de prorrogação dos prazos de aproveitamento do Lote P e da concessão, a Ré celebrou milhares de contratos após a aprovação do projecto de arquitectura em 30 de Dezembro de 2010, investiu avultadas verbas na preparação dos projectos da obra (arquitectura, fundações e especialidades), bem como realizou e densificou os Estudos de Impacto Ambiental sucessivamente solicitados pela RAEM, custeou e executou as obras das fundações do edifício durante o último ano dos prazos de aproveitamento e de concessão. (Q 49.º)
     108. Foi com base nas aprovações administrativas que a Ré avançou com os seus investimentos. (Q 50.º)
     109. A Ré utilizou o período de prorrogação, entre Agosto de 2014 e Dezembro de 2015, para construir e concluir todo o trabalho de fundações. (Q 51.º)
     110. A Ré construir e concluir todo o trabalho de fundações, entre Agosto de 2014 e Dezembro de 2015, porque tinha legítimas expectativas de que haeria um procedimento administrativo para, nos termos legais, abrir cambinho à Ré para uma nova concessão sobre o mesmo terreno, a fim de concluir o aproveitamento e, deste modo, cumprir os cerca de 3.000 contratos assinados com milhares de compradores do empreendimento “D”. (Q 51.ºA)
     111. A Ré foi obrigada a aceitar o pagamento da multa para em contrapartida obter a prorrogação de prazo de aproveitamento até 25 de Dezembro de 2015. (Q 53.º)
     112. Os Autores candidataram-se à aquisição de uma fracção autónoma ao abrigo da Lei n° 8/2019, de 12 de Abril, por via do Despacho do Chefe do Executivo 89/2019, de 30 de Maio. (Q 55.º)
     113. Tal fracção é de tipologia, área e preço equivalentes ao das fracções que constituem o objecto do contrato aqui em causa. (Q 56.º)
     114. Actualmente, o valor da fracção a ser adquirida pelos Autores será bastante superior ao valor inicialmente pago pelos Autores. (Q 57.º)
     115. As exigências feitas pela DSPA, que foi fazendo a propósito dos relatórios de circulação de ar e de relatório de impacto ambiental não constavam do contrato de concessão. (Q 57.ºB)
     116. A Ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou a renovação de concessão para a data posterior de 24/12/2015 porque os serviços da RAEM: (Q 30.º)
i. Emitiram licença de obras de fundação em 2/1/2014;
ii. Prorrogaram o prazo de aproveitamento em 29/7/2014;
iii. Já anteriormente haviam concessionado novamente o mesmo terreno por ajuste direto ao mesmo concessionário em casos em que o terreno concessionado não tinha sido aproveitado no respectivo do prazo de aproveitamento.
* * *
IV – FUNDAMENTAÇÃO
    Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este afirmou na sua douta decisão:

     I – RELATÓRIO.
     B e sua esposa C, casados segundo o regime da participação nos adquiridos, ambos de nacionalidade chinesa, com outros elementos de identificação nos autos, intentaram a presente acção declarativa que segue termos sob a forma ordinária de processo comum contra a Ré, A Limitada (A有限公司), registada na CRCBM sob o n.º XX(SO).
     
     Alegando que, como promitente-comprador e com entrega de sinal, o autor celebrou com a ré, como promitente-vendedora, um contrato-promessa de compra e venda de uma fracção autónoma de um prédio urbano que a ré se propunha construir num terreno concessionado pela RAEM; e alegando ainda que já cessou a concessão sem que a ré tivesse construído, incumprindo e já não podendo cumprir a promessa por razões que lhe são imputáveis, uma vez que, não diligenciou no sentido de concluir a construção dentro do prazo da concessão,
     Pedem os autores que:
     1. Seja declarado resolvido o referido contrato-promessa;
     2. Seja a ré condenada a pagar-lhes a quantia de HKD2.985.000,00, correspondente ao dobro da quantia que recebeu a título de sinal;
     3. Seja a ré condenada a pagar os juros de mora à taxa legal das obrigações de natureza comercial, contados sobre a quantia em que for condenada, desde a data da publicação no Boletim Oficial da RAEM declaração de caducidade da concessão (29/01/2016) até integral pagamento.
     4. Para o caso de se entender que a falta de cumprimento não é imputável à ré ou em virtude da alteração das circunstâncias, pedem a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de HKD1.492.500,00 acrescida de juros de mora à taxa legal das obrigações de natureza comercial, a contar de 29/01/2016 até integral pagamento.
     
     Contestou a Ré, aceitando a existência do contrato-promessa1 invocado pelos autores e alegando que, caso não consiga construir e entregar a fracção autónoma prometida vender, essa impossibilidade não lhe deve ser imputada a si porquanto deve ser imputada à RAEM, a qual, durante o decurso do respectivo procedimento administrativo para aprovação do projecto de arquitectura e para emissão da licença de obras, fez exigências de alteração do projecto de arquitectura que não podia ter feito, fez indevidamente exigências de realização de estudos do impacto ambiental do mesmo projecto e, além disso, não cumpriu os prazos estabelecidos no contrato de concessão e demorou demasiado a apreciar os pedidos da ré para prorrogação do prazo de aproveitamento da concessão, o que levou a que a ré não pudesse iniciar a construção mais cedo e não tivesse conseguido concluí-la antes de caducar a referida concessão2.
     Para o caso de se concluir que ocorre impossibilidade da prestação e que esta é imputável à ré, veio esta, também na contestação, defender que os autores não têm direito a indemnização calculada pelo valor do sinal prestado, porquanto foi acordado que as quantias pagas à ré não constituíam sinal.
     Também na contestação que apresentou, disse a ré que, caso se conclua pela impossibilidade imputável e pela existência de sinal, deve a indemnização determinada pelo valor deste ser reduzida segundo juízos de equidade.
     Por fim, disse a ré que os eventuais juros de mora devem contar-se apenas desde a data da citação e não devem ter o acréscimo dos juros comerciais (2%).
     
     Na réplica que apresentaram, os autores, com excepção do que respeita ao início da mora e à taxa de juro moratório, impugnaram todas as teses da contestação, quer quanto à imputabilidade a terceiro da causa da impossibilidade da prestação, quer quanto à inexistência de sinal e à intervenção da equidade na fixação do montante da indemnização.
     
     Foi proferido despacho saneador e de selecção da matéria de facto relevante para a decisão a fls. 1112 a 1125.
     
     Procedeu-se a julgamento, foi decidida a matéria de facto contravertida e foram apresentadas doutas alegações de Direito pelos autores e pela ré. De tais alegações sobressai que os autores consideram que a relação contratual em litígio consubstancia um contrato-promessa e retiram do respectivo regime jurídico a solução de Direito do presente pleito e sobressai ainda que a ré já não rejeita que a sua prestação se tornou impossível mas considera que a referida relação contratual se trata de um contrato atípico contrato atípico “de reserva” ou um contrato de compra e venda de coisa futura e só para efeitos de análise admite que possa ser qualificada de contrato-promessa.
     *
     II – SANEAMENTO.
     A instância mantém-se válida e regular, como decidido no despacho saneador e nada obsta ao conhecimento do mérito.
     *
     III – QUESTÕES A DECIDIR.
     Tendo em conta o relatório que antecede, designadamente:
     - Que a principal pretensão dos autores é serem indemnizados/restituídos em consequência dos danos que sofreram por a ré não ter cumprido, por impossibilidade superveniente, a prestação a que se vinculou por contrato;
     - O facto de os autores e ré estarem de acordo que existe a relação contratual invocada pelos autores e que a prestação a cargo da ré se tornou impossível por causa superveniente;
     - O facto de a essência da principal divergência entre as partes ser a imputabilidade à ré ou a terceiro da causa da impossibilidade superveniente da prestação da ré e a existência ou inexistência de sinal;
     As principais questões a decidir gravitam à volta de:
     1- Imputação à ré ou a terceiro da causa superveniente da impossibilidade da prestação a cargo da ré.
1.1 - Caso se conclua que a causa da impossibilidade superveniente da prestação a cargo da ré deve ser imputada a terceiro, importa apurar as consequências jurídicas de tal imputação, designadamente:
1.1.1 - Quanto à extinção da obrigação da ré decorrente do contrato que celebrou com o 1º autor;
1.1.2 Quanto a eventual criação na esfera jurídica da ré de uma outra obrigação de restituir aos autores o que recebeu do 1º autor;
1.2 - Caso se conclua que a causa da impossibilidade superveniente da prestação a cargo da ré deve ser imputada à própria ré, importa então apurar as consequências da referida impossibilidade superveniente da prestação decorrente de causa imputável à ré, designadamente:
1.2.1 – Direito dos autores de resolverem o contrato;
1.2.2 – Criação na esfera jurídica da ré de uma obrigação de restituir aos autores o que recebeu do 1º autor.
1.2.3 - Obrigação da ré indemnizar os autores.
1.2.3.1 - Caso se conclua que a ré tem obrigação de indemnizar os autores, caberá apurar o montante da indemnização e a ocorrência de mora no cumprimento desta obrigação de indemnizar, para isso é necessário averiguar se foi acordado e prestado sinal;
1.2.3.1.1 - Caso se conclua pela existência de sinal, caberá ainda decidir se a indemnização deve ser calculada com base no “regime-regra” do sinal ou se deve ser reduzida segundo juízos de equidade para montante inferior ao valor do sinal prestado.
1.2.3.1.2 Caso se conclua pela inexistência de sinal, caberá determinar qual o valor da indemnização na ausência de sinal.
1.2.3.1.3 – Caso se conclua pela ocorrência de mora no cumprimento da obrigação de indemnizar é ainda necessário apurar as consequências desta a nível indemnizatório, designadamente quanto ao início da mora e quanto à taxa dos juros moratórios.
     *
     IV – FUNDAMENTAÇÃO.
     A) – Motivação de facto.
     Estão provados os seguintes factos:
     (...)
     
     B) – Motivação de Direito.
 1 – Da impossibilidade superveniente da prestação.
     Neste momento da discussão já não são necessárias especiais considerações para concluir que a prestação da ré se tornou impossível. Seja qual for a prestação devida: celebrar o contrato prometido de compra e venda de uma fracção autónoma de prédio urbano ou apenas construir e entregar a referida fracção. Com efeito, por um lado, a ré já não questiona nas suas alegações de Direito a referida impossibilidade como questionou na contestação. Acresce que, não tendo a ré meios jurídicos conhecidos nos autos que lhe permitam construir a mencionada fracção, não se vê como negar as características relevantes da impossibilidade superveniente da prestação: ojectiva, absoluta e definitiva3. Com efeito, sem que ocorram circunstâncias de todo imprevisíveis presentemente, a ré, apesar de ser uma sociedade comercial e poder existir durante muito tempo, não tem possibilidade jurídica de construir ou adquirir a fracção autónoma em causa4. Trata-se de uma impossibilidade jurídica da prestação, não de uma impossibilidade física ou naturalística, pois a construção da mencionada fracção está acessível à ré pelos conhecimentos técnicos existentes, mas não lhe está permitida por causa da sua situação jurídica actual e previsível num futuro ponderável5. Na verdade, resulta dos autos que a ré não tem qualquer direito sobre o terreno onde se iria situar a planeada construção.
     
     Conclui-se assim que se tornou impossível após a celebração do contrato a prestação que a ré acordou com o 1º autor.
     
     Resta, pois, apurar as consequências da impossibilidade da prestação.
     
     1.
     1.1 – Dos efeitos da impossibilidade da prestação.
     1.1.1 – Em geral.
     Se a prestação acordada é originariamente impossível, a obrigação não nasce porque o contrato é nulo e, por isso, não gera a obrigação de prestar nem o dever de cumprir (art. 395º, nº 1 do CC).
     Se a prestação acordada é originariamente possível (aquando da celebração do respectivo negócio jurídico), mas posteriormente deixa de o ser, a obrigação extingue-se, não pode ser cumprida e o devedor deixa de ter o dever de a prestar (arts. 779º e 790º do CC).
     Se a impossibilidade superveniente ocorre por razões não imputáveis ao devedor, mas imputáveis a terceiro, ao credor ou a ninguém (caso fortuito ou de força maior), fica o devedor exonerado perante o credor. Se, porém, o credor cumpriu perante o devedor a sua eventual contraprestação e a causa da impossibilidade não imputável ao devedor também não lhe é imputável a si, credor, então este, credor, tem direito a que lhe seja restituído o que prestou, mas segundo as regras do enriquecimento sem causa. É esta a tese da ré, escorada no art. 784º do CC. Com efeito, entende que a impossibilidade da prestação não lhe é imputável a si nem ao credor, mas a terceiro, a RAEM.
     Se a prestação se tornou impossível por causa imputável ao devedor, a obrigação extingue-se, não pode ser cumprida e o devedor deixa de ter o dever de a prestar, como se disse atrás. Porém, o devedor poderá ver nascer na sua esfera jurídica outra obrigação, a obrigação de indemnizar o credor pelos prejuízos sofridos em consequência da mencionada impossibilidade superveniente, devendo o devedor indemnizar o credor como se faltasse culposamente ao cumprimento devido (art. 790º, nº 1 do CC).
     Para apurar os efeitos da impossibilidade da prestação torna-se, pois, necessário decidir se a causa da impossibilidade da prestação é imputável à ré devedora ou à RAEM, terceiro em relação à prestação.
     Vejamos.
     
     1.1.2 – Interposta questão – efeitos em relação à 2ª autora.
     A segunda autora não celebrou qualquer contrato com a ré, mas é casada em regime de participação nos adquiridos com o 1º autor, o qual celebrou com a ré o contrato cujo incumprimento por impossibilidade da prestação da ré aqui se discute.
     Tem a autora consorte o direito de resolver o contrato onde não é parte e o direito de ser ressarcido dos danos que sofreu em consequência do incumprimento do referido contrato? Não tem.
     Em caso de impossibilidade da prestação do devedor por causa que lhe seja imputável cabe apenas do credor daquela prestação o direito de resolver o contrato bilateral, assim como só o mesmo credor tem o direito de ser restituído no caso de ter realizado alguma prestação (art. 790º, nº 2 do CC). No mesmo caso de impossibilidade superveniente da prestação por causa imputável ao devedor, este responde apenas perante o seu credor e apenas pelos danos por este sofridos (art. 790º, nº 1 e art. 787º do CC). Ora, só o 1º autor era credor da prestação que se tornou impossível, pelo que a segunda autora, não sendo credora de tal prestação não vê nascer na sua esfera jurídica o direito de resolver o contrato celebrado por terceiros nem o direito de ser indemnizada pelos danos que lhe causou o incumprimento.
     Situações há em que os contratos podem ter eficácia de protecção de terceiros e que estes, no caso de sofrerem danos decorrentes do incumprimento, poderão ter direito de ser ressarcidos tendo a correspectiva responsabilidade um título que se pode aproximar da responsabilidade contratual. Pode pensar-se, por exemplo no caso de um bombeiro que em serviço sofre queimaduras por defeito do seu equipamento de combate a incêndios que foi contratualmente fornecido à sua corporação com defeito de fabrico. Não é, porém, o caso dos autos, onde não se vislumbra qualquer eficácia de protecção de terceiros no contrato celebrado pela ré.
     
     Improcede, pois, a pretensão da segunda autora.
     
     1.1.3 – Da imputação da causa da impossibilidade da prestação.
     Este tribunal já decidiu esta questão em diversos litígios semelhantes ao que se discute nos presentes autos. As partes, designadamente os seus ilustres mandatários conhecem a fundamentação da referida decisão deste tribunal, razão por que, não se tendo encontrado ainda razões para alterar o sendido da decisão, não advém redução das garantias processuais das partes se aqui não se reproduzir exaustivamente aquela fundamentação.
     Em síntese:
     A imputação é a atribuição a uma pessoa dos efeitos jurídicos de um facto. No caso presente está em causa a atribuição à ré do dever de indemnizar o autor (efeito jurídico) por ter ocorrido a impossibilidade da prestação (facto jurídico).
     A causa da impossibilidade jurídica da prestação da ré foi o facto de não ter construído a facção acordada com o autor no prazo de que a ré dispunha nos termos do contrato de concessão, o que causou a caducidade da concessão e a impossibilidade jurídica de construir e entregar.
     A imputação à ré da causa da impossibilidade da sua prestação depende da sua culpa em relação a essa causa.
     A culpa é um juízo de censura dirigido a uma pessoa por ter tido um comportamento diverso daquele que deveria ter tido, ou seja, por ter tido um comportamento ilícito ou contrário ao Direito em vez de ter tido um comportamento lícito. In casu está em causa um ilícito contratual, o incumprimento de uma obrigação contraída por via contratual.
     Este juízo de culpa pressupõe capacidade de motivação e liberdade de decisão do agente (que não se questiona em relação à ré) e, em matéria de responsabilidade civil , estrutura-se numa comparação entre o comportamento que o agente teve e aquele que, no seu lugar, teria um bom pai de família, o qual é uma pessoa que, entre o mais, se esforça por não cair em situações que o impeçam de honrar aquilo a que se comprometeu por via contratual e que, para isso, designadamente, pondera bem as possibilidades de cumprir antes de se comprometer e não se compromete quando há um não despresível grau de probabilidade de não conseguir cumprir.
     A ré, quando se comprometeu com o autor a cumprir (11/12/2012), precisava de três a quatro anos para preparar a sua prestação (art. 105º da contestação) e já não dispunha desse tempo até ao fim do prazo de aproveitamento da concessão (28/2/2014) nem só dispunha de 3 anos e 14 dias até ao fim do prazo da concessão (25/12/2015)6. Além disso, necessitava da cooperação dos serviços públicos da RAEM, que vinham cooperando com atraso não desprezível em relação aos prazos legais e contratuais, não relevando aqui as razões desse atraso, quer respeitem a acumulação imprevisível de serviço, que respeitem a falhas de organização ou outras falhas.
     Neste contexto, um bom pai de família, no lugar da ré, não se vincularia a construir e entregar como a ré se vinculou ou, então, obtinha a adesão da sua contraparte contratual à possibilidade de sobrevir a impossibilidade de cumprir. A ré distanciou-se claramente do comportamento que no seu lugar teria um bom pai de família. A ré é juridicamente censurável em termos de culpa por ter ocorrido a impossibilidade da sua prestação.
     Este tribunal só pode decidir por razões jurídicas. Se, por mero exemplo, a actuação da ré foi meritória, justificada ou compreensível em termos gestão empresarial não cabe aqui avaliar nem releva em sede de juízo de culpa cível em matéria de responsabilidade civil. O risco empresarial não é o risco jurídico. Este tem a ver com os direitos e deveres jurídicos, nomeadamente de quem celebra contratos e, designadamente, do âmbito da autonomia privada e do dever de agir de boa fé. Aquele outro risco é aqui alheio.
     Em conclusão, a causa da impossibilidade da prestação é, crê-se que sem sombra de dúvida, juridicamente imputável à ré a título de culpa.
     
 2. – Da resolução contratual.
     No que respeita ao direito à resolução do contrato e às suas consequências de restituição retroactiva do que foi prestado, não se vê como negar. É a lei evidente (arts. 790º, nº 2, 426º a 428º e 282º do CC) e nem as partes questionam.
     Procede, pois, esta pretensão do autor e deve ser declarado resolvido o contrato, como peticionado.
     
     3. – Da indemnização dos danos decorrentes da impossibilidade superveniente da prestação por causa imputável ao devedor.
     3.1 Da existência de obrigação de indemnizar.
     Estando decidido que houve incumprimento culposo da ré, rectius, impossibilidade da prestação por causa imputável à ré, basta que haja danos na esfera jurídica do 1º autor com nexo de causalidade com o referido incumprimento para que surja na esfera jurídica da ré a obrigação de indemnizar (arts. 787º, 790º e 557º do CC).
     Tendo-se provado que o autor pagou à ré para receber dela um imóvel e que nada recebeu é forçoso concluir que o 1º autor sofreu danos decorrentes do incumprimento da ré, pois que pagou para adquirir e nada adquiriu.
     Assim, não são necessárias outras considerações para se concluir que existe na esfera jurídica da ré a obrigação de indemnizar 1º autor, sendo a controvérsia essencialmente respeitante ao valor da indemnização.
     
     3.2 Do montante da indemnização
     Os autores pretendem ser indemnizados pelo dobro do sinal prestado.
     Por seu lado, a ré entende que, havendo lugar a indemnização, esta deve ser fixada, por razões de equidade, em metade do “sinal” prestado porquanto a sua culpa, caso se conclua que existe, é diminuta e que os danos do autor estão atenuados por poder receber do Governo da RAEM uma fracção idêntica à “prometida” e por preço também idêntico.
     
     O princípio geral em matéria de responsabilidade civil é que devem ser indemnizados todos os prejuízos efectivamente sofridos pelo credor em consequência do incumprimento do devedor (arts. 787º - “prejuízo que causa ao credor”, 556º - “reconstituir a situação que existiria” e 557º - “danos que o lesado … não teria se não fosse a lesão” - do CC.).
     
     No entanto, se for constituído sinal é o valor deste que, em princípio, determina o valor da indemnização, o valor que terá a obrigação de indemnizar originada pelo incumprimento culposo. É o que dispõe o art. 436º do CC.
     É, pois, necessário apurar se foi constituído sinal, entendendo os autores que foi e a ré que não foi.
     
     3.2.1 Da existência de sinal
     Da qualificação do contrato.
     Como antes se referiu, os autores entendem que o contrato em discussão nos presentes autos deve ser qualificado como contrato-promessa, ao passo que a ré entende nas suas alegações de Direito que deve ser qualificado como contrato de compra e venda de bem futuro.
     A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC).
     A qualificação dos contratos pertence à lei e não às partes7. É uma operação muito relevante, pois vai determinar o regime jurídico aplicável à relação contratual8. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CC).
     Pois bem, a qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular9. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais, podendo concluir-se que o contrato concreto se reconduz a um tipo, a nenhum ou a mais que um, sendo neste caso um contrato misto ou uma união de contratos.
     A nosso ver, deve atender-se de forma mais relevante às prestações características acordadas pelos contraentes, quer para qualificar o contrato, quer para se lhe determinar o regime quando se conclua que o contrato celebrado se trata de um contrato misto por agregar elementos de mais do que um tipo contratual10.
     Faltando no contrato celebrado um elemento essencial de um contrato tipificado na lei, o acordo das partes não pode qualificar-se segundo tal tipo contratual.
     Pois bem, então afinal a operação de qualificação do contrato redunda em duas operações: saber que prestação característica quiseram as partes e, depois, subsumi-la à prestação característica de um tipo contratual, de mais que um ou de nenhum.
     
     A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CC).
     
     Este tribunal também já decidiu esta questão em diversos litígios semelhantes ao que se discute nos presentes autos, conhecendo as partes, designadamente os seus ilustres mandatários, a fundamentação da referida decisão, razão por que, não se tendo encontrado ainda razões para alterar o sendido da decisão, também não advém redução das garantias processuais das partes se aqui não se reproduzir exaustivamente aquela fundamentação.
     A razão decisiva para o tribunal concluir que a vontade das partes não foi de mera reserva ou encomenda de um bem futuro é que o autor foi pagando prestações do preço e não apenas uma comissão de reserva. Crê-se que é incontornável que um declaratário normal não considera que a vontade das partes foi de mera reserva de lugar para aquisição em face do facto de terem sido colocadas perante a escolha de pagar todo o preço ou apenas uma parte e perante o pagamento de várias e sucessivas “comissões de reserva”. Reserva, terá havido no pagamento dos primeiros HKD200.000,00, mas com a formalização do contrato em discussão e com os pagamentos seguintes, nenhum declaratário normal considerará que as partes se quiseram manter em situação de mera reserva.
      A razão decisiva para o tribunal concluir que a vontade das partes não foi de compra e venda de um bem futuro, contrato que seria formalmente inválido, é que no contrato que celebraram não consideraram o autor como titular de um direito real, oponível erga omnes, mas consideraram-no na situação de alguém que necessitava do consentimento da ré e de lhe pagar para exercer o direito que adquiriu por via contratual, se esse exercício passasse pela transmissão para terceiros.
     Crê-se também que é incontornável que um declaratário normal não considera que a vontade das partes foi de tornar o autor dono ou proprietário, mas de torná-lo mero titular de um direito a ultimar uma qualquer relação contratual com a ré, o que é, precisamente a prestação característica do contrato-promessa.
     
     Em conclusão, dir-se-á que o sentido com que deve valer juridicamente a declaração negocial quanto às prestações acordadas só é reconduzível ao tipo contratual de contrato-promessa.
     
     Da convenção de sinal.
     O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico11. Numa certa perspectiva, é, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial.
     Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes.
     Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes12.
     Se os autores pretendem ser indemnizados segundo o regime do sinal, cabe-lhes, nos termos do art. 335º, nº 1 do CC, alegar e provar, entre o mais, os factos demonstrativos de ter sido estipulada a existência de sinal.
     Porém, no caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CC que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
     Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CC). No caso dos autos, provou-se que o autor entregou à ré, promitente-vendedora, determinada quantia em dinheiro no âmbito do contrato promessa que ambas celebraram. Provou-se o facto base da presunção, pelo que está presumido que as partes quiseram atribuir carácter de sinal. Cabe, pois à ré, interessada em ilidir a presunção, a alegação e a prova do facto contrário ao facto presumido, isto é, cabe-lhe provar que as partes acordaram que a quantia entregue não tinha carácter de sinal. A ré não conseguiu fazer a prova dessa vontade negocial contrária à presunção legal (resposta negativa dada ao quesito 52º, 52ºA e 54º da base instrutória). Tem a ré de ver esta questão decidida em sentido contrário à sua pretensão.
     Mas dir-se-á ainda que do contrato-promessa sub judice resulta que as partes quiseram que as quantias pagas pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor sejam consideradas sinal. Com efeito, na cláusula 5ª do contrato referido em c) dos factos provados diz-se que a falta de pagamento das prestações do preço acordado implica a perda da quantia já paga. Trata-se do regime supletivo do sinal, pelo que parece clara a vontade das partes no sentido de terem pretendido constituir sinal.
     Mas, em caso de dúvida sobre o sentido que atribuiria o “declaratário normal”, deve, para se apurar o sentido com que a vontade declarada das partes deve valer, ponderar-se a medida em que o princípio do equilíbrio das prestações intervém na fixação do valor da vontade negocial declarada quando se desconhece a vontade real.
     Se é certo que não é determinante para qualificar o acordo das partes o facto de as partes terem denominado como contrato-promessa aquele acordo que celebraram, é igualmente certo que não é determinante para fixar o sentido com que deve valer a declaração negocial o facto de terem denominado de depósito a quantia monetária entregue pelo autor à ré em cumprimento do acordo que celebraram.
     Se a vontade real dos contraentes é conhecida pelo declaratário, é ela que deve vincular os declarantes (nº 2 do art. 228º do CC). Se essa vontade real não é conhecida, é a vontade declarada que vai determinar quais os vínculos contratuais que as partes devem cumprir. Para saber em que sentido a vontade declarada vincula é necessário interpretá-la, ou seja, avaliá-la intelectivamente para lhe apreender o sentido vinculador.
     Há, pois, que atender ao princípio do equilíbrio das prestações, o qual diz que, em caso de dúvida, o sentido da declaração é o mais equilibrado nos negócios onerosos, como é o dos autos.
     Ora, se em caso de incumprimento do autor a ré é indemnizada em “X”, qual será a vontade negocial que deve valer em caso de incumprimento da ré? Deve pagar apenas se se enriqueceu e só na medida do seu enriquecimento? Ou deve também ter uma pena e pagar o mesmo que o autor ou outra quantia, mas uma pena? Parece que o princípio do equilíbrio das prestações impõe que, em caso de dúvida, se conclua que as partes estabeleceram penas para ambas e que quiseram que a quantia entregue pelo autor fosse a medida da pena de ambas em caso de incumprimento definitivo.
     As partes não estipularam que em caso de incumprimento dos autores a ré podia recorrer à acção de execução específica, nem à acção de condenação, nem à resolução do contrato com restituição do que foi prestado e indemnização dos danos efectivos. Estipularam o regime do sinal segundo o qual, em caso de incumprimento daquele que o prestou, aquele que o recebeu fica com ele para si sem direito a outra indemnização excepto se sofrer danos manifestamente superiores.
     Na dúvida, o princípio do equilíbrio das prestações “manda” que se atribua valor à declaração negocial das partes no sentido de ter sido estipulado sinal.
     
     Assim, mesmo que não se qualifique o contrato como contrato-promessa, há-de a quantia entregue ser qualificada de sinal de acordo com o sentido com que deve valer juridicamente a declaração negocial das partes.
     
     Portanto, mesmo sem a presunção legal referida, sempre a vontade das partes deve ser interpretada no sentido de terem convencionado sinal.
     
     Conclui-se, pois, que foi acordado sinal no caso em apreço.
     
     O montante da indemnização predeterminado pelo valor do sinal e a sua redução por juízos de equidade.
     “Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado” (art. 436º, nº 2 do CC).
     Está demonstrado que a ré não cumpriu definitivamente a sua promessa de venda.
     Está também demonstrado que a ré recebeu sinal.
     Foi já decidido atrás que a causa do incumprimento não é imputável a terceiro e que é imputável à ré a título de culpa. E também já atrás foi decidido que o incumprimento culposo da ré confere ao 1º autor o direito de resolver o contrato-promessa.
     Deve, pois a ré restituir o que recebeu para cumprir a promessa de venda que não cumpriu, uma vez que, como efeito da resolução do contrato, sempre terá que devolver o que lhe foi prestado (arts. 282º e 427º do CC). Mas terá ainda de pagar ao 1º autor um montante igual ao do sinal que recebeu?
     Vejamos.
     Dispõe o nº 4 do art. 436º do CC que “na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
     E dispõe o art. 801º, nº 1 do CC, aplicável por força do disposto no nº 5 do art. 436º do mesmo CC, que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”.
     
     Portanto, o valor da indemnização por incumprimento do contrato, rectius, por impossibilidade culposa da prestação, deve, em princípio, corresponder ao valor do sinal prestado. Porém, o referido valor da indemnização pode ser:
     - Aumentado para o valor do dano efectivamente sofrido pelo credor se este dano for consideravelmente superior ao valor do sinal13;
     - Reduzido para montante equitativo não inferior ao valor do dano efectivo se a penalização resultante do sinal for manifestamente excessiva em relação ao mesmo dano efectivo14.
     
     O ónus da prova.
     O legislador ao permitir às partes fixarem por convenção as consequências do incumprimento acabou por criar uma distribuição do ónus da prova em que só tem que provar o dano relevante o contraente que pretende que a indemnização por incumprimento se fixe em valor diferente do predeterminado. Assim, o credor que pretende que o valor da indemnização seja superior ao predeterminado tem de provar que sofreu um dano consideravelmente superior ao sinal. Por sua vez, o devedor que pretende que a indemnização seja de valor inferior ao predeterminado tem que demonstrar que a pena é manifestamente excessiva em relação ao dano.
     No presente caso, cabe à ré alegar e provar os factos de onde se possa concluir que o valor do sinal é manifestamente excessivo para ressarcir o dano efectivo do autor e para sancionar a culpa pelo incumprimento.
     
     Mas a ré disse que a sua culpa é reduzida e que os autores vão receber uma fracção autónoma de um imóvel idêntica à que a ré lhe entregaria e por preço também idêntico.
     
     Da redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado.
     “A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…” (art. 801º, nº 1 do CC).
     Este normativo rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações15, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento16.
     O legislador, perante um dano efectivo superior ao sinal, preferiu o dano efectivo, mas perante um dano efectivo inferior ao sinal já não escolheu o dano efectivo, mas a redução equitativa do valor determinado pelo sinal. Claramente, pretende-se que a indemnização ainda tenha função punitiva, conatural à cláusula penal e supletiva do sinal confirmatório e pretende-se também que a indemnização não se fique meramente pela função ressarcitória que é a essência da obrigação de indemnizar que tem por fonte a responsabilidade civil. O limite equitativo não deve, pois, ser inferior ao dano efectivo e deve ainda deixar que o sinal cumpra a sua função punitiva, embora não com a severidade castigadora pretendida pelas partes ou resultante da norma supletivamente estabelecida pelo legislador.
     Vejamos então.
     A equidade serve de critério para decidir se a indemnização deve ser reduzida e, em caso de se concluir que há lugar à redução, serve ainda de medida dessa redução.
     Cabe, pois, aferir se a pena convencional determinada pelo sinal é manifestamente excessiva em relação aos danos efectivos que o 1º autor sofreu. O dano efectivo é o limite mínimo da redução equitativa, como ficou dito.
     Como se disse atrás, o devedor que pretende que a indemnização seja de valor inferior ao predeterminado pelo valor do sinal tem que demonstrar que a pena é manifestamente excessiva em relação ao dano.
     No presente caso, cabe à ré alegar e provar os factos de onde se possa concluir que o valor do sinal é manifestamente excessivo para ressarcir o dano efectivo do 1º autor e para sancionar a culpa pelo incumprimento.
     No que tange ao dano efectivo os factos provados revelam apenas a candidatura deferida do autor à aquisição de uma fracção autónoma em condições idênticas às que acordara com a ré no âmbito de um programa governamental que beneficia o 1º autor devido ao facto de a prestação da ré se ter tornado impossível.
     A redução equitativa da indemnização requer a certeza de que a indemnização determinada pelo valor do sinal é manifestamente excessiva em relação ao dano efectivo.
     O 1º autor está privado há vários anos (mais de 11) da quantia que pagou e está privado há cerca de 8 anos da fracção autónoma que em Dezembro de 2012 pretendia adquirir dali a “1200 dias de sol”, não se sabendo quando irá adquirir outra fracção autónoma no âmbito do referido programa governamental, pelo que não está minimamente deponstrado que o dano efectivo do 1º autor é consideravelmente inferior ao valor do sinal, razão por que não pode haver redução do valor da indemnização por recurso à equidade. Com efeito, desconhece-se quanto a fracção podia proporcionar ao autor ou, para seguir o raciocínio do Venerado TSI no seu douto Acórdão nº 22/2024 de 9de Maio de 2024, acessível em www.court.gov.mo, quanto lhe podia proporcionar a quantia que pagou à ré.
     Não está, pois, demonstrado nos autos que o valor do sinal é manifestamente excessivo em relação ao valor dos danos efectivamente sofridos pelo 1º autor, razão por que não há lugar à pretendida redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal.
     Conclui-se, pois, que procede a pretensão do 1º autor de ser indemnizada em montante igual ao sinal prestado e improcede a pretensão da ré de ver reduzida a indemnização segundo juízos de equidade.
     
     4. – Dos pedidos subsidiários.
     Em consequência do que fica dito, está prejudicada a apreciação dos pedidos subsidiários que pressupõem que se considere que não foi acordado sinal e que o incumprimento não é imputável à ré.
     
     5. Da mora na obrigação de indemnizar.
     5.1 Do início da mora.
     Os autores pediram a condenação da ré em indemnização moratória. Para o caso de a ré ser condenada a pagar o sinal em dobro, pediram que a indemnização moratória se consubstanciasse no pagamento de juros de mora contados à taxa legal para as obrigações de natureza comercial (11,75%), desde a publicação do Despacho do Chefe do Executivo que declarou a caducidade da concessão do terreno onde a ré iria construir a fracção autónoma a entregar ao autor até integral pagamento.
     A indemnização moratória pressupõe a mora do devedor e esta só ocorre quanto às obrigações puras e líquidas, como é a da ré, no momento da interpelação (art. 794º, nºs 1 do CC).
     A citação tem valor de interpelação (art. 794º, nº 1 do CC e art. 565º, nº 3 do CPC).
     A mora ocorreu, pois, com a citação.
     
     5.2 A taxa de juro moratório.
     A indemnização moratória relativa às obrigações pecuniárias corresponde aos juros legais a contar do dia da constituição em mora, salvo excepções aqui inaplicáveis (art. 795º do CC).
     Nos termos do art. 569º, nº 2 do Código Comercial só em relação aos créditos de natureza comercial acresce a sobretaxa de 2% sobre os juros legais, não sendo aplicável ao crédito do autor nem às obrigações de que sejam titulares passivos os comerciantes ou as empresas comerciais se o titular activo não for comerciante.
     A indemnização moratória deve corresponder aos juros legais contados desde a citação sem acréscimo da sobretaxa aplicável aos créditos de natureza comercial.
     
     V – DECISÃO.
     Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, declara-se resolvido o contrato celebrado entre as partes e condena-se a ré a pagar ao autor B a quantia de HKD2.985.000,00 (dois milhões, novecentos e oitenta e cinco mil dólares de Hong Kong), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da citação da ré até integral pagamento.
     Custas a cargo de autores e ré na proporção do respectivo decaimento.
     Registe e notifique.
*
    Quid Juris?
    Este caso é um dos mais simples: o Autor, promitente-comprador celebrou com a Ré o contrato-promessa que tem por objecto o imóvel identificado nos autos, tendo pago parte do preço sem pagar o remanescente nem chegou a contrair empréstimos bancários.
    Veio agora o Autor a pedir a restituição em dobro do sinal pago.
    Terá o Autor fundamentos legais para o fazer?
    Tal como temos vindo a sublinhar que cada caso é um caso, não obstante existirem vários processos em que se discutem as questões idênticas ou semelhantes.
    Ora, dada a identicidade ou semelhança da matéria discutida neste tipo de processos, as considerações por nós tecidas noutros processos valem, mutatis mudantis, para o caso, obviamente com as devidas adaptações, nomeadamente no processo nº 813/2024, com o acórdão proferido em 13/3/2025, em que ficou consignado o seguinte entendimento:
    
     “(…)
    1) – Nos exercício das funções jurisidicionais, é do conhecimento deste TSI que são basicamente as seguintes situações que dão origem aos litígios em que se discutem as mesmas matérias:
    a) – O promitente-comprador mantém a sua posição contratual até à data em que foi proposta acção contra a Ré, sem que tivesse transmitido a sua posição contratual para terceiro;
    b) – O promitente-comprador chegou a ceder a sua posição de promitente-comprador para um terceiro, por um preço superior ao fixado no primeiro contrato-promessa, e é este terceiro, actual titular da posição do contrato-promessa que veio a propor a acção contra a Ré, pedindo que esta lhe pagasse o sinal dobro à luz do preço mais alto (ou seja, existe diferença ao nível do preço, o preço fixado no primeiro contrato-promessa e o preço mais alto posteriormente fixado no segundo (ou posteriores) contrato-promessa;
    c) – O promitente-comprador chegou a celebrar vários contratos-promessa com a Ré, prometendo adquirir várias fracções autónomas (depois, chegou a transmitir alguns contratos-promessa para terceiros e mantém alguns para si próprio).
    2) – Todas as hipóteses acima apontadas trazem várias questões para discutir, uma delas consiste em saber se é legítimo e justo que o promitente-comprador venha a receber o sinal em dobro independentemente das particularidades do caso em discussão.
    3) – No caso, não é supérfluo realçar que o caso em análise tem a sua particularidade, já que, ao contrário daquilo que se verifica em situações normais, em que a promitente-vendedor não quer cumprir de livre vontade e por iniciativa própria o acordado. No caso não foi isto que sucedeu, a Ré quis cumprir, só que por decisão do Governo da RAEM, a Ré não pude cumprir. Ou seja, a sua “culpa”(se podemos utilizar esta palavra) não é acentuada nem “indesculpável”, o que deve relevar para ponderar e fixar as sanções contratuais!
     (…)”.

    Aqui, merece igualmente destacar um outro ponto: o raciocínio do Tribunal a quo aponta, parece-nos, para a ideia de que toda a culpa de incumprimento se concentra na parte da Ré/Recorrente, mas tal como se refere anteriormente por nós, não é líquida esta argumentação, já que a Ré fazia e tentava fazer tudo para que pudesse cumprir os compromissos assumidos perante o Governo da RAEM, apesar que o resultado final não vir a ser “satisfatório” a todos os níveis. Mas os comportamentos assumidos pela Ré demonstram que não existe “dolo” de incumprimento por parte dela, quanto muito, negligência ou utilizando uma linguagem diferente, um “ risco de investimento” que a Ré há-de assumir, daí a sua quota-parte de responsabilidade, circunstâncias estas que devem ser valoradas na fixação das indemnizações que cabem no caso em análise. Aliás, o Tribunal recorrido na fundamentação da decisão dos factos afirmou: “A convicção do tribunal formou-se na análise crítica da globalidade da prova testemunhal e documental produzida, ponderada nos termos antes referidos e que podem ser explicitados sinteticamente como segue.
    É uma evidência que a ré tinha vontade firme de concluir o empreendimento “D”, o que resulta da consideração dos esforços e dispêndios que fez, incontestáveis e incontestados nos autos, incluindo por via judicial.”
*
    Conforme o quadro factual fixado pelo Tribunal recorrido, existem vários factos que são claros para demonstrar que a Ré não actuou com “dolo” no cumprimento dos acordos quer perante o Governo enquanto concedente quer perante as partes dos contratos-promessa, a saber:
    “(…)
     - A DSSOPT aprovou o projecto sem o sugerido afastamento entre torres e em 7/1/2011 notificou a ré dessa aprovação e notificou-a ainda para apresentar o relatório de estudo de impacto ambiental que teria a construção do edifício em matéria de fluxo de ar, efeito biombo, ilhas de calor e expansão de poluentes e referindo à ré que não lhe seria emitida licença de obras sem que o referido relatório fosse apresentado e aprovado;
     - Em 11/5/2011, a ré apresentou à DSSOPT um relatório do estudo de impacto ambiental requerido;
     - Posteriormente, a DSSOPT em coordenação com a DSPA exigiu à ré a apresentação de outros relatórios de estudos de impacto ambiental incidentes sobre outros aspectos ambientais diferentes daqueles que havia mencionado e a ré apresentou-os até que, em 15/10/2013, foi aprovado o último relatório apresentado;
     Em 24/10/2013, a ré requereu à DSSOPT a emissão de licença de obras que foi emitida em 2/1/2014.
     - Se a DSSOPT tivesse dado resposta em 60 dias apreciando o projecto parcial de arquitectura apresentado pela ré em 06/05/2008, a que não respondeu;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando o projecto global de arquitectura apresentado pela ré em 22/10/2009, a que respondeu em 9/4/2010;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando a alteração apresentada ao referido projecto global em 3/6/2010, a que respondeu em 7/1/2011 e
     - Se a DSSOPT, quando em 7/1/2011 exigiu pela primeira vez a realização de estudos de impacto ambiental, tivesse exigido à ré todos os estudos da mesma natureza que lhe exigiu mais tarde.
    
    “(…)”
     1. A Ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou dada uma nova concessão do mesmo terreno para data posterior a 24/12/2015 porque os serviços da RAEM criaram tais expectativas, nomeadamente:
a. Ao emitirem licença de obras para as fundação em 02/1/2014, um mês antes do terreno do prazo de aproveitamento;
b. Ao Prorrogarem o prazo de aproveitamento em 29/7/2014 até 25/12/2015, sabendo que tal não seria possível;
c. Já anteriormente haviam concessionado novamente o mesmo terreno ao mesmo concessionário em casos em que o terreno concessionado não tinha sido aproveitado no dentro do respectivo prazo. (Q 9.º)
    (…)”.
    Tudo isto demonstra claramente que a Ré não actuou com dolo para desrespeitar as obrigações decorrentes dos contratos-promessa, pelo contrário, os factos assentes acima transcritos podem constituir alteração superveniente das circunstâncias nos termos do artigo 431º do CCM (a Autora chegou também alegar esta matéria conforme o teor do artigo 138º a 139º da PI), já que se tratam de factos imprevisíveis e que ocorreram posteriormente ao momento da celebração dos acordos em análise.
*
    Com as devidas adaptações, o disposto no artigo 784º/2 do CCM pode ser chamado para fundamentar a decisão em análise, já que tal normativo dispõe:
    
(Contratos bilaterais)
    1. Quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa.
    2. Se a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor, não fica este desobrigado da contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com a exoneração, o valor do benefício é descontado na contraprestação.
    Em regra, a restituição do sinal não representa uma injustiça flagrante ou ofende o sentido de justiça material, é de aceitar como correcta a solução legalmente consagrada: restituição do sinal em dobro por quem não cumpre o acordo celebrado nos termos do disposto no artigo 801º do CCM.
*
    1) - Agora, relativamente ao dano excedente, quando não pode ser calculado ao certo, à luz da doutrina dominante, e no caso da sua impossibilidade, recorre-se ao juízo de equidade.
    A propósito deste ponto, escreveu-se:
    “De harmonia com a lei substantiva, sempre que não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (art.º 566.º, n.º 3, do Código Civil). Considerada a possibilidade processual de uma condenação ilíquida, coloca-se o problema da articulação de uma e outra norma (artº 609.º, n.º 2, do CPC). A articulação deve ser feita do modo seguinte: se ainda for possível fixar no incidente de liquidação a quantidade da condenação, aplica-se a norma processual da condenação genérica; no caso inverso, o dano será equitativamente julgado5. Equidade – como justiça do caso concreto – que, porém, sob pena de um julgamento puramente arbitrário ou atrabiliário, não prescinde de um suporte de facto, por mínimo ou reduzido que seja6, nem serve para alijar por inteiro, o não cumprimento, seja pelo credor da obrigação de indemnização quantitativamente indeterminada do ónus da prova do valor do dano a que está indiscutivelmente adstrito, seja pelo devedor de igual ónus que o vulnera no tocante a qualquer facto extintivo daquela mesma obrigação (art.º 342.º, n.ºs 1 e 2, e 346.º, n.º 1, in fine, do Código Civil, e 414.º do CPC).”17

    2) – Pergunta-se, como é que se deve resolver este tipo de questões? A propósito desta matéria, citemos aqui a posição dominante vigente em Portugal, em nome do Direito Comparado (Cfr. ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 9/10/2012) sobre a matéria em discussão (uma situação semelhante):
“Acontece porém que nos situamos no âmbito da resolução do contrato. O autor optou pela resolução do contrato.
A resolução do contrato “consiste na destruição da relação contratual, validamente constituída, operada por um acto posterior de vontade de um dos contraentes, que pretende fazer regressar as partes à situação em que elas se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado” [14].
Entre as partes e na falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade do negócio jurídico, nos termos do art.º 433º do Código Civil. Por isso tem efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes.
Ao pretender indemnização por lucros cessantes, o A. está a pedir a reparação do interesse contratual positivo, ou seja, o ressarcimento do prejuízo que não sofreria se a cessão de exploração tivesse sido inteiramente cumprida pela R. O que resultaria para o credor do cumprimento curial do contrato, abrangendo, portanto, não só o equivalente da prestação, mas também a cobertura pecuniária (a reparação) dos prejuízos restantes provenientes da inexecução, "de modo a colocar-se o credor na situação em que estaria se a obrigação tivesse sido cumprida".
Como é sabido, “a nulidade impede a produção de efeitos e a anulação faz cessar a produção de efeitos jurídicos” [15].
Em caso de resolução contratual, a posição clássica e largamente dominante, é a de que a tutela se resume ao interesse contratual negativo, ou seja, ao prejuízo que o credor não teria se o contrato não tivesse sido celebrado [16]. Tal entendimento tem sido seguido maioritariamente na jurisprudência. [17]
Com base nesta doutrina, não é aceitável a compatibilidade de cumulação entre a resolução do contrato e a indemnização correspondente ao (interesse contratual positivo, sobretudo com fundamento nos argumentos retirados do efeito retroactivo da resolução e da incoerência da posição do credor, ao pretender, depois de ter optado por extinguir o contrato pela solução, basear-se nele para obter uma indemnização, correspondente ao interesse no seu cumprimento.
Por isso e conclui no citado acórdão de 24.1.2012 que, “por regra, a indemnização fundada no não cumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido”.
Nada no caso justifica que nos afastemos da regra geral em razão dos interesses em discussão, o que se justifica apenas em casos excepcionais, como também tem sido entendido na jurisprudência. [18]
Por conseguinte, improcede o pedido de indemnização do A. relativo a lucros cessantes.”

    O raciocínio vale, mutantis mudantis, para o caso dos autos, sendo certo que o artigo 436º do CCM (que tem uma redacção diferente da do CC de 1966 vigente em Portugal), consagra:
(Sinal)
    1. Quando haja sinal, a coisa entregue deve ser imputada na prestação devida, ou restituída quando a imputação não for possível.
    2. Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado.
    3. A parte que não tenha dado causa ao incumprimento poderá, em alternativa, requerer a execução específica do contrato, quando esse poder lhe seja atribuído nos termos gerais.
    4. Na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
    5. É igualmente aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 801.º
    Depois, o artigo 801º do CCM manda:
(Redução equitativa da pena)
    1. A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em contrário.
    2. É admitida a redução nas mesmas circunstâncias, se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida.
    
    A propósito dos nº 4 e 5 do artigo 436º do CCM, anotou-se:
    “15. No estudo global que se faça do problema, chega-se à conclusão que o nº 4 vem reforçar a ideia transversal consagrada no Código a respeito da natureza confirmatória do sinal (o próprio Menezes Leitão acaba por admitir que o nº 4 não tem natureza penitencial, em ob. cit., pág. 246). Ou seja, para lá da perda do sinal pelo tradens ou da devolução em dobro do sinal pelo accipiens, ainda pode haver lugar, salvo estipulação em contrário, a indemnização pelo dano excedente. Foi uma opção do legislador de Macau, que podia ter aproveitado a ocasião para ser mais generosa. Com efeito, não passou da criação dessa possibilidade indemnizatória pelo dano excedente, sem a estender a outra qualquer indemnização (nomeadamente, por danos não patrimoniais), tendo em conta que na parte final do nº 4 afirmou expressamente a impossibilidade de alargamento da extensão indemnizatória (habitualmente, alguns autores defendem que, sem limitação, pode haver a indemnização por perdas e danos no caso de sinal confirmatório).
     Pior é, apesar de tudo, a situação do parente próximo preceito português, pois nele se preceitua que "Na ausência de estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não cumprimento".
     De qualquer maneira, há mesmo aí quem sustente que, para além dessa indemnização pelo não cumprimento, possa haver uma ou mais indemnizações fundadas noutras causas, como, por exemplo, nos casos de terem sido feitas benfeitorias na coisa (Ana Prata, Código ... cit., pág. 568).
     16. O nº 5 manda aplicar, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 801º. Não é bem claro o propósio da disposição legal: se apenas se aplica aos casos em que os contraentes estabelecem no contrato uma indemnização para o caso de incumprimento por arrependimento (arras ou sinal penitencial), ou se também aplicação no caso de sinal confirmatório-penal.
     E se a resposta for no sentido de apenas cobrir a segunda hipótese de sinal confirmatório, ainda fica por saber se a redução por equidade (art. 801º) abrange somente as situações em que há dano excedente (nº 4), calculando-se aí a indemnização segundo critérios equitativos, ou se também atinge o dobro do sinal por incumprimento do accipiens.
     Por um lado, poderia parecer que a melhor solução seria, efectivamente, a que permite a aplicação do regime de redução no caso de incumprimento de contrato em que o sinal tem a função de arra confirmatória. Na verdade, se o sinal tiver o sentido penitencial, isso se deve ao facto de as partes, de livre vontade e por consenso, terem estabelecido os próprios limites indemnizatórios, não fazendo sentido que o tribunal os possa baixar apenas porque o devedor lho tenha pedido.
     Por outro lado, é de crer que a redução também não possa incidir sobre o dobro do sinal, porque isso seria contrariar a solução da lei (nº 2).
     Nesta óptica, pareceria ficar assim a remissão para o art. 801º circunscrita às situações em tiver que haver indemnização pelo dano excedente. Este dano pode ser, realmente, elevado, se tivermos em conta as diferenças de preços em mercados (por exemplo, imobiliários) que frequentemente se pautam por regras pouco saudáveis de especulação. Tendo em conta que o dano pode ser realmente avultado, a intervenção do juiz pode eventualmente justificar-se, se bem que a redução também pode funcionar como um prémio ao devedor.
    Não temos, enfim, a certeza sobre o alcance da norma.
     Mas, se fizermos a conjugação dos artigos 436º, 801º (e o ambiemte da sua sistematização) e 820º, nº 2, (neste caso, para o contrato-promessa) talvez seja possível, afinal de contas, considerar que a remissão apenas faça sentido nos casos em que as partes contratantes tenham estipulado, por penitência, uma indemnização com caracter de pena no contrato para a hipótese de não cumprimento por arrependimento. A jurisprudência dirá o que for de justiça sobre o assunto. (Cfr. Código Civil de Macau, Anotado e Comentado, João Gil de Oliveira e José Cândido de Pinho, CFJJ, 2020, Vol. VI, pág. 506 e 507).
    Efectivamente pode existir alguma dúvida na interpretação e aplicação das normas em causa.
    Mas não é pela primeira vez que este TSI é chamado para se pronunciar sobre o conceito de danos ou prejuízos excedentes, o mesmo conceito encontra-se consagrado no artigo 1027º do CCM em matéria locatária que dispõe:
     
(Indemnização pelo atraso na restituição da coisa)
    1. Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida.
    2. Logo, porém, que o locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro; à mora do locatário não é aplicável a sanção prevista no artigo 333.º
    3. Fica salvo o direito do locador à indemnização dos prejuízos excedentes, se os houver.
    A propósito deste conceito, ficou consagrado o seguinte entendimento no Proc. nº 646/2017, com o acórdão proferido em 26/07/2018:
     
    “I - A Ré deve pagar a quantia equivalente ao dobro da renda que se praticava, como justa indemnização específica pela não restituição do imóvel, embora de natureza contratual, por continuar a usar a coisa, em prejuízo das locadoras, correspondente à renda que estava a ser praticada e que se traduz no valor de uso do imóvel.
    II – Em relação à indemnização pelos prejuízos excedentes, uma vez verificados, a título de lucros cessantes, ela tem por fundamento o efectivo prejuízo causado, que pode já não se medir pelo valor da renda, não obstante ser o mesmo o respectivo facto gerador, mesmo que o montante dos danos causados às locadoras seja inferior ou equivalente ao quantitativo da renda, hipótese em que ao credor basta a indemnização contemplada pelo artigo 1027º/2 do CC.
    III - A solução correcta só poderá ser conseguida mediante interpretação sistemática, lógica e teleológica da norma do artigo 1027º/3 do CCM. Não resta dúvida que, quer a sanção prevista no nº 2, quer no nº 3 do artigo citado, visa “forçar” o inquilino a devolver o locado ao senhorio com o mais cedo possível, sob pena de estar sujeito a sanções pesadas até que o locado seja devolvido a quem de direito.
    IV - Por esta via, a leitura mais consentânea com a ratio legis da norma do artigo 1027º/3 do CCM é a de que a indemnização da mora entra em linha de consideração para efeitos da fixação da indemnização por prejuízo excedente, sob pena de se duplamente “sancionar” o inquilino!”
     
    Não há razões bastantes para não seguirmos o entendimento acima referido, já que está em causa uma matéria de natureza idêntica: para além de pagar o dobro, pode pedir-se indemnização por danos excedentes, mas estes têm de estar devidamente demonstrados e comprovados, não bastam alegações abstractas ou provas indirectas.
    “(…)”.
    Voltando ao caso em análise, sublinhe-se aqui, é de verificar-se que a norma do nº 4 do artigo 436º é mais exigente do que a norma do artigo 1027º (que regula a matéria de locação), pois aquela norma fala de “dano consideravelmente superior’! O que exige provas mais rígidas e persuasivas!
*
    Aqui, é de recordar-se que no processo nº 220/2024 fica também consignado o seguinte entendimento:
    “從上述轉錄的內容可見,原審法院已詳細論證了第一被告的不履行責任,我們認同有關見解,故基於訴訟經濟原則及根據《民事訴訟法典》第631條第5款之規定,引用上述見解和依據,裁定這部分的上訴理由不成立。
    事實上,本院在涉及“D”事件的案件中已多次強調(見中級法院在卷宗編號1142/2019、1145/2019、1150/2019及1192/2019內作出的裁判),澳門特別行政區僅和土地承批人,即本案之第一被告,建立了法律關係;一切因應承批土地所作出的行為,均是針對土地承批人/第一被告而作出。因此,即使假設該等行為損害了土地承批人/第一被告的權益,例如無法如期利用土地而導致其需向預約買受人作出賠償,也只能是土地承批人/第一被告在履行其賠償義務後再向澳門特別行政區追討賠償,而非預約買受人可直接向澳門特別行政區追討因土地承批人/第一被告違反與其簽定的預約買賣合同的賠償責任。
    只有在澳門特別行政區濫用權利,行為特別惡劣的情況下其才需負上相關賠償責任,然而本案並不存在該等情況。
    4. 就賠償金額方面:
    第一被告認為基於合同不履行非其責任,故只應按不當得利規則(《民法典》第784條第1款之規定)作出返還。
    此外,亦認為即使假設其在相關的合同不履行存有過錯,雙倍的定金賠償是明顯過高,應根據衡平原則作出縮減。
    我們在前述部分已認定第一被告需對合同的不履行負上責任,故不能適用《民法典》第784條第1款之規定,按不當得利規則作出返還。
    就賠償金額方面,根據《民法典》第3條的規定,法院在下列任一情況下可按衡平原則處理案件:
    a) 法律規定容許者;
    b) 當事人有合意,且有關之法律關係非為不可處分者;
    c) 當事人按適用於仲裁條款之規定,預先約定採用衡平原則者。
    《民法典》第436條第5款明確容許經適當配合後適用第801條之規定,即容許法院當認為賠償金額過高時按衡平原則減少違約賠償金額。
    為此,我們需考慮原告們的實際損失是多少,即其共付出了多少金錢以取得相關的合同地位來決定是否適用衡平原則作出縮減。
    在本個案中,原告們向原預約買受人支付了港幣2,356,000.00元(900,000+1,456,000)以取得相關的預約買受人合同地位。
    倘按平均年利率3.5%計算8年(2012-2019年)的利息,可獲得港幣659,680.00元的利息,即共有港幣3,015,680.00元。
    原告們可獲得雙倍定金的賠償是港幣2,292,000.00元(1,146,000 x 2),並不高於前述的金額。
    由此可見,原審法院不以衡平原則對賠償金額作出縮減是正確的,應予以維持。”
    3) – Voltando ao caso dos autos, uma leitura possível: ao contrário que se pretende defender, temos por certo que as quantias pagas pelos Autores à Ré a título de sinal, se fossem depositadas nas instituições bancárias, certamente eles receberão juros, facto este que temos por certo que os Autores deixaram de poder os receber, razão pela qual a Ré deve indemnizá-los por esta via.
(…)
    4) - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas, que se distingue do puro julgamento jurídico por apresentar menos preocupações sistemáticas e maiores empirismo e intuição. Portanto, a equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto (Cfr. António Menezes Cordeiro, “A decisão segundo a equidade”, in o Direito, Ano 122, 1990, Abril-Junho, pág. 272, e Manuel Carneiro da Frada, “A equidade (ou justiça com coração): a propósito da decisão arbitral segundo a equidade, in Revista da Ordem dos Advogados, 2012, Ano 72, Vol. I, pág. 143, e os Acs. do STJ de 31.01.2012 (875/05) e 07.10.2010 (3515/03). Ou seja, no caso, deve existir factos assentes no sentido de que os Autores tivessem a possibilidade de vender, pelo menos, pelos valores por ele alegados e comprovados (ex. mediante contratos-promessa de compra e venda celebrados) a uma terceira pessoa concreta, o que não se encontra devidamente demonstrado por factualidade assente.
    5) (…)”.
*
    Relativamente ao pedido do Autor, o Tribunal a quo teceu as seguintes considerações:
    “(…)
     Da redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado.
     “A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…” (art. 801º, nº 1 do CC).
     Este normativo rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações18, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento19.
     O legislador, perante um dano efectivo superior ao sinal, preferiu o dano efectivo, mas perante um dano efectivo inferior ao sinal já não escolheu o dano efectivo, mas a redução equitativa do valor determinado pelo sinal. Claramente, pretende-se que a indemnização ainda tenha função punitiva, conatural à cláusula penal e supletiva do sinal confirmatório e pretende-se também que a indemnização não se fique meramente pela função ressarcitória que é a essência da obrigação de indemnizar que tem por fonte a responsabilidade civil. O limite equitativo não deve, pois, ser inferior ao dano efectivo e deve ainda deixar que o sinal cumpra a sua função punitiva, embora não com a severidade castigadora pretendida pelas partes ou resultante da norma supletivamente estabelecida pelo legislador.
     Vejamos então.
     A equidade serve de critério para decidir se a indemnização deve ser reduzida e, em caso de se concluir que há lugar à redução, serve ainda de medida dessa redução.
     Cabe, pois, aferir se a pena convencional determinada pelo sinal é manifestamente excessiva em relação aos danos efectivos que o 1º autor sofreu. O dano efectivo é o limite mínimo da redução equitativa, como ficou dito.
     Como se disse atrás, o devedor que pretende que a indemnização seja de valor inferior ao predeterminado pelo valor do sinal tem que demonstrar que a pena é manifestamente excessiva em relação ao dano.
     No presente caso, cabe à ré alegar e provar os factos de onde se possa concluir que o valor do sinal é manifestamente excessivo para ressarcir o dano efectivo do 1º autor e para sancionar a culpa pelo incumprimento.
     No que tange ao dano efectivo os factos provados revelam apenas a candidatura deferida do autor à aquisição de uma fracção autónoma em condições idênticas às que acordara com a ré no âmbito de um programa governamental que beneficia o 1º autor devido ao facto de a prestação da ré se ter tornado impossível.
     A redução equitativa da indemnização requer a certeza de que a indemnização determinada pelo valor do sinal é manifestamente excessiva em relação ao dano efectivo.
     O 1º autor está privado há vários anos (mais de 11) da quantia que pagou e está privado há cerca de 8 anos da fracção autónoma que em Dezembro de 2012 pretendia adquirir dali a “1200 dias de sol”, não se sabendo quando irá adquirir outra fracção autónoma no âmbito do referido programa governamental, pelo que não está minimamente deponstrado que o dano efectivo do 1º autor é consideravelmente inferior ao valor do sinal, razão por que não pode haver redução do valor da indemnização por recurso à equidade. Com efeito, desconhece-se quanto a fracção podia proporcionar ao autor ou, para seguir o raciocínio do Venerado TSI no seu douto Acórdão nº 22/2024 de 9de Maio de 2024, acessível em www.court.gov.mo, quanto lhe podia proporcionar a quantia que pagou à ré.
    Neste ponto ressalva-se o seguinte:
    Na sequência de argumentação acima por nós tecida, por força do acordo à luz do qual a Ré gozava de 1200 dias úteis para cumprir as obrigações contratuais, os juros calculados não devem reportar-se ao período de 11 anos, mas sim, 7 ou 8 anos ao máximo, pelo que o o valor da indemnização equitativa do interesse contratual positivo não deve ser inferior a HKD$1,096,480,00 (3.916.000,00 x 3,5% x 8).
     
    Eis um valor que pode servir de referência.
    Depois, o Tribunal a quo continua a afirmar:
     “(…)
     “Não está, pois, demonstrado nos autos que o valor do sinal é manifestamente excessivo em relação ao valor dos danos efectivamente sofridos pelo 1º autor, razão por que não há lugar à pretendida redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal.
     Conclui-se, pois, que procede a pretensão do 1º autor de ser indemnizada em montante igual ao sinal prestado e improcede a pretensão da ré de ver reduzida a indemnização segundo juízos de equidade.”
     
    Assim, a decisão do Tribunal a quo não se mostra desproporcional ou inadequada ou ilegal, e como tal é de a manter.
    Quanto ao demais, é de verificar-se que nesta parte, todas as questões levantadas pelas partes já foram objecto de reflexões e decisões por parte do Tribunal recorrido, nesta sede de recurso concluímos, em face da argumentação acima transcrita, que o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis, tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de manter a decisão recorrida.
*
    Face ao exposto, é de negar provimento ao recurso interposto pela Ré, mantendo-se a decisão recorrida.
*
    Síntese conclusiva:
    I - A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC), qualificação esta que determina o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CCM).
    II - A qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais.
    III - A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CCM). Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Numa situação em que, tal como se detecta no caso dos autos, se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis (porque se usam expressões diversas, tais como “contrato-promessa de compra e venda” “prometer comprar e “prometida venda”, “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”), a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 228º do CCM).
    IV – O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico, sendo nesta perspectiva, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial. Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes. Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
    V - No caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CCM que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”. Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CCM).
    VI - O artigo 801º/-1 do CCM manda que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”, normativo este que rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento.
    VII - Por regra, a indemnização fundada no incumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido. Nesta óptica, o regime de restituição do sinal em dobro em matéria de contrato-promessa pode classificar-se como um regime especial.
*
    Tudo visto e analisado, resta decidir.
* * *
V ‒ DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
*
    Custas pela Recorrente.
*
    Registe e Notifique.
*
RAEM, 09 de Abril de 2025.

Fong Man Chong
(Relator)

Tong Hio Fong
(1o Juiz-Adjunto)

Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(2o Juiz-Adjunto)
1 Nas suas doutas alegações de Direito a ré defende tratar-se de contrato de reserva ou de compra e venda de coisa futura e não de contrato-promessa de compra e venda.
2 Nas alegações de Direito a ré já não questiona a impossibilidade do cumprimento da sua prestação contratual.
3 Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume II, 11ª edição, pgs. 117.
4 “… o não cumprimento definitivo, que é o resultado de uma impossibilidade definitiva de cumprir, não tem de derivar de uma impossibilidade absoluta de cumprir, no sentido de não poder em caso algum desaparecer. … A impossibilidade da prestação considera-se definitiva não apenas quando toda a probabilidade da sua remoção está excluída, mas também quando ela só pode ser removida mediante circunstâncias especiais que não são de esperar de antemão. … Isto é o mesmo que dizer que também é definitiva a impossibilidade que só possa cessar por um facto extraordinário com que não seja legítimo contar” - Vaz Serra, RLJ, Ano 100º (1967 – 1968), p. 254.
5 Meneses Cordeiro, Tratado de Direito Civil, volume IX, 2ª edição, p. 324.
6 Contrariamente ao que afirma a ré nas suas muito doutas alegações sobre o aspecto jurídico da causa (fls. 1956 verso), não se interpreta o nº 3 do art. 105º da Lei de Terras vigente em 28 de Fevereiro de 2014 (Lei nº 6/80/M, de 5 de Julho) no sentido de ser obrigatória nessa data a prorrogação do prazo de aproveitamento da concessão até ao termo do prazo da concessão no caso de o concessionário pagar multa. Com efeito, como também resulta do art. 166º da mesma lei, a referida “multa automática” aplica-se nos casos de omissão no contrato de concessão de estipulação de prazos e de consequências para a sua inobservância, o que não ocorre no caso dos autos, e destina-se directamente ao processo de aproveitamento e não ao prazo da sua conclusão.
7 “Este é o processo de qualificação próprio da doutrina dos elementos do contrato: a verificação da existência no contrato de todos os elementos essenciais do tipo determina a qualificação… Na doutrina tipológica, a qualificação não constitui um processo de subsunção a um conceito, mas de correspondência do contrato ao um tipo” – Pedro Pais de Vasconcelos, Contratos Atrípicos, 2ª edição, p. 166.
8 “A qualificação de um certo contrato como deste ou daquele tipo tem consequências determinantes no que respeita à vigência da disciplina que constitui o modelo regulativo do tipo. Como direito injuntivo e como direito dispositivo, o modelo regulativo do tipo dá sempre um contributo importantíssimo para a disciplina do contrato julgado típico” - Pedro Pais de Vasconcelos, op. cit., loc. cit.
9 “Tratar-se-á … de questão de interpretação das declarações de vontade das partes, a resolver segundo a … doutrina da impressão do destinatário…” Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 11ª edição, p. 24.
10 “…haveria, nos contratos mistos, que descobrir qual o elemento típico relevante. A regulamentação global seria a própria desse elemento” – Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 1º Volume, 1987, p. 427.
11 Um elemento natural ou típico do conteúdo do contrato-promessa para Manuel Trigo, Lições de Direito das Obrigações, p. 144. Um acto jurídico real quoad constitutionem, podendo constituir uma cláusula acessória de um negócio jurídico para Nuno Manuel Pinto Oliveira, Ensaio Sobre o Sinal, págs. 10 e 11.
12 Acórdão do Venerando TSI de 04/04/2019, proferido no processo nº 327/2017, Relator: Dr. Fong Man Chong, acessível em www.court.gov.mo e João Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 11ª edição, p. 94.
13 “…a indemnização pelo dano excedente constituiria a indemnização pelo dano efectivo …” - Professor Manuel Trigo, Uma Uma Mudança de Paradigma: A Indemnização pelo Dano Excedente, em Especial nos Casos de Perda do Sinal ou de Pagamento do Dobro Deste e a Jurisprudência Recente (estudo em homenagem a João Calvão da Silva), Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, Ano XXV, nº 49, 2021, p. 151.
14 Assim, também Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, 1990, p. 730. E, do mesmo autor, “A Cláusula Penal no Ordenamento Jurídico de Macau”, Um Diálogo Consistente, Olhares Recentes Sobre Temas do Direito Português e de Macau, 2016, Vol. I, Edição da Fundação Rui Cunha, pgs. 38 e 39 – “Ora, qual será o critério que deve pautar a actuação do juiz, quer para decidir se pode reduzir a pena, quer para determinar, simultaneamente, em caso afirmativo, a medida dessa redução?
Naturalmente que a diferença entre o valor do prejuízo efectivo e o montante da pena é, desde logo, o primeiro factor, de cariz objectivo, a considerar”.
15  Art. 436º, nº 5 do CC: “É igualmente aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 801.º”
16 Nuno Manuel Pinto Oliveira, Ensaio Sobre o Sinal, fala em sinal confirmatório-penitencial.
17 Ac do STJ, Proc. 3292/20.5TBLRA/C1.S1., de 11/02/2025.
18  Art. 436º, nº 5 do CC: “É igualmente aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 801.º”
19 Nuno Manuel Pinto Oliveira, Ensaio Sobre o Sinal, fala em sinal confirmatório-penitencial.
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