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Processo nº 400/2024
(Reclamação para a conferência)

Data: 19 de Junho de 2025
Recorrente: A
Recorrido: B
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  C, que foi mandatária nestes autos de A, e actualmente nomeada como defensora da mesma ao abrigo do apoio judiciário, com os demais sinais dos autos, notificada do despacho a fls. 366 a 370 veio reclamar para a Conferência do indicado despacho com a seguintes conclusões e pedidos:
1. Depois de ter sido recebida a decisão de manutenção do divórcio do Tribunal Judicial de Base, proferida pelo Venerando Juiz, em 17 de Outubro de 2024, tendo a própria signatária comunicada à Ré/Recorrente;
2. Atendendo que a parte de direito do presente procedimento de acção, constava ainda lugar ao recurso, a Ré/Recorrente, manifestava disposta a intentar ao Tribunal de Última Instância o recurso;
3. A Ré/Recorrente nunca efectuou o pagamento de honorário à própria signatária, para o efeito de acompanhamento de instauração do procedimento de recurso à terceira instância (quanto ao critério de honorário entre a própria signatária e a Ré/Recorrente, seja cobrado por cada instância);
4. Além disso, baseando na situação económica e no estado pessoal da Ré/Recorrente, a mesma pretendia requer o apoio judiciário, bem como pedir a designação de advogado oficioso, pelo que a Ré/Recorrente apresentou à Comissão de Apoio Judiciário o requerimento de apoio judiciário, em 30 e 31 de Outubro de 2024;
5. A fim de garantir que não seja provocada por qualquer influência à Ré/Recorrente e ao procedimento, ambos do presente caso, mesmo que ainda não tinha recebido o aludido honorário, a própria signatária apresentou na mesma ao Tribunal de Segunda Instância o requerimento de recurso da Ré/Recorrente, em 05 de Novembro de 2024;
6. No requerimento acima referido, dado que houve “lapso na escrita”, onde se lê “Mandatária oficiosa”, deve ler-se “Mandatária constituída”, a própria signatária, vem, pedir imensa desculpa ao Venerando Juiz e que peça o v./entendimento, pela dúvida causada por este “lapso na escrita”;
7. Posteriormente, tendo a própria signatária recebida a carta, emitida pelo Tribunal de Segunda Instância, em 04 de Dezembro de 2024, donde incluindo os conteúdos, constantes de fls. 342 e verso, o requerimento da Ré/Recorrente, constante de fls. 334 e 335;
8. Segundo o conteúdo do envio para visto, constante de fls. 342 dos autos, podemos ver sobre a resposta dada pela Comissão de Apoio Judiciário ao Tribunal na altura, a Comissão prevê-se que seja decidida o requerimento de apoio judiciário da Ré/Recorrente nos meados de Janeiro de 2025, assim, para garantir o interesse da Ré/Recorrente, a própria signatária ainda não tinha apresentado, imediatamente, a desistência da constituição para a acção;
9. Até aos 20 de Janeiro de 2025, a Ré/Recorrente foi saber junto da Comissão de Apoio Judiciário, tendo o funcionário da dita Comissão salientado que o respectivo requerimento ainda não teve decisão, enquanto a Ré/Recorrente confirmou perante própria signatária na altura, que ela pretende da vontade em manter o requerimento de apoio judiciário;
10. Dado que a própria signatária ainda não tinha recebido qualquer honorário da Ré/Recorrente para o efeito de procedimento de recurso da terceira instância, porquanto a motivação do recurso visa-se um trabalho material, pelo que a própria signatária decide a desistência da constituição designada pela Ré/Recorrente para a acção, e apresentando ao Tribunal o requerimento de desistência da constituição;
11. Depois, em 04 de Fevereiro de 2025, no momento em que a própria signatária estava a concluir o arquivamento do presente caso, constatou-se, ocasionalmente, que na desistência da constituição entre a própria signatária e a Ré/Recorrente, constava uns lugares incertos, pelo que para os efeitos do dever de zelo, bem como do interesse da Ré/Recorrente, a própria signatária efectuou, logo, no dia 04 de Fevereiro de 2025, as alegações adicionais, pois, desejando que proceda a respectiva rectificação;
12. A razão de alegações adicionais efectuadas pela própria signatária, é para evitar as futuras impugnações surgidas, provavelmente, pelas diferentes interpretações existentes na sequência do cálculo do prazo de motivação do recurso;
13. As alegações adicionais efectuadas pela própria signatária, em 04 de Fevereiro de 2025, foram baseadas no mero cumprimento do dever de zelo de rectificação das incertezas, e não tinha praticado por base de qualquer objectivo de má-fé;
14. Para além, a Ré/Recorrente não tinha conhecimento sobre os conteúdos de alegações adicionais e alegações, apresentadas pela própria signatária, em 04 de Fevereiro de 2025, pelo que não existe a situação de demora do trânsito em julgado por má-fe.
Nesta conformidade, vem, requer ao Tribunal Colectivo que profira uma nova decisão, na sequência do despacho, constante de fls. 366 a 370, dos presentes autos, anulando as decisões dos pontos 1, 3 e 4 do despacho reclamado.

Foram colhidos os vistos.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
  
Dizemos no despacho objecto desta reclamação o seguinte:
«Fls. 346 e 351:
Compulsados os autos verifica-se que:
  - Em 17.10.2024 foi proferido Acórdão a julgar o recurso improcedente mantendo a decisão recorrida que havia decretado o divórcio entre a Recorrente e o Recorrido.
  - Foram notificados os mandatários do Acórdão por carta expedidas em 21.10.2024.
  - Em 01.11.2024 a Recorrente (e antes Ré) juntou no TJB documento de onde consta que em 30.10.2024 requereu apoio judiciário na modalidade de isenção de preparos e custas – cf. fls. 333/334 -.
  - A folhas 335 dos autos consta um documento que terá vindo com aqueles outros em que a Recorrente (e antes Ré) pede à Comissão de Apoio Judiciário doravante CAJ que a sua advogada constituída nestes autos seja nomeada sua patrona no âmbito do apoio judiciário.
  - A folhas 336 a CAJ pediu informação aos autos se a decisão já havia transitado em julgado e se o Advogado constituído havia renunciado ao mandato, tendo sido ordenado que se informasse em conformidade – cf. fls. 336, 339 e 341 -.
  - A fls. 337/338 foi interposto recurso da decisão pela Recorrente o qual foi admitido por despacho de fls. 339.
  - Por despacho de fls. 342 que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais foi ordenada notificação do despacho de admissão de recurso o que aconteceu com carta expedidas no dia 04.12.2024 – cf. fls. 342 a 345 -.
  - O prazo para apresentar alegações terminaria no dia 22.01.2025.
  - No dia 20.01.2025 a mandatária constituída pela Recorrente vem em requerimento assinado por si e pela Recorrente renunciar ao mandato – cf. fls. 346 -.
  - Em 04.02.2025 a mandatária que renunciou ao mandato vem juntar aos autos um requerimento a pedir que se considere que o prazo para alegar se interrompeu em 10.12.2024 com base nos fundamentos que entendeu invocar – cf. fls. 351 -.
  - A fls. 356/358 a Recorrente vem juntar uma carta aos autos a dizer sumariamente que quer continuar casada com o Recorrido (e antes Autor) e a fls. 361/363 o Recorrido vem pedir que a decisão do divórcio se torne definitiva o mais rápido possível.
  Cumpre apreciar e decidir.
  Como resulta dos autos, nos requerimentos apresentados pela Recorrente junto do CAJ não se pedia o apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e pagamento de patrocínio judiciário, sem prejuízo de no dia a seguir se juntar junto do CAJ um outro requerimento a pedir para nomear a Advogada que já estava constituída nos autos.
  Em data posterior à apresentação dos requerimentos pela Recorrente junto do CAJ vem a ser interposto (no último dia do prazo) recurso da decisão proferida nestes autos pela mandatária até então constituída nos autos sem que houvesse sido junta renúncia alguma ao patrocínio, razão pela qual se entendeu estar a mesma no exercício de poderes forenses para exercer o mandato e admitir o recurso.
  Admitido o recurso, no seguimento da conclusão de 03.12.2024 é proferido o despacho de fls. 342 – supra dado por reproduzido – onde se ordena a notificação imediata do despacho de admissão de recurso uma vez que não foi junta aos autos qualquer renúncia ou revogação do mandato.
  Na sequência daquele despacho e no antepenúltimo dia do prazo (o qual já havia beneficiado da interrupção decorrente das férias judiciais de Natal), isto é, em 20.01.2025, em requerimento conjunto assinado pela Mandatária constituída nos autos e pela Recorrente vem a ser junto aos autos requerimento de renúncia ao mandato pela Advogada.
  Contudo, em 04.02.2025 a Advogada que havia sido constituída mandatária da Ré/Recorrente e que havia renunciado ao mandato vem juntar requerimento aos autos a pedir que se considere que o prazo para alegar se interrompeu na data que entendeu.
  Ora bem, com tal prolífera junção de requerimentos de uma Advogada que ainda constituída com procuração nos autos já a parte/cliente pede que seja nomeada defensora, que sem ter renunciado nem sido nomeada defensora vem interpor recurso nos autos alegando ser defensora oficiosa, para depois e quando o prazo para alegações já está quase no termo vir juntar aos autos requerimento assinado por si e pela sua cliente a renunciar ao mandato e semana volvidas após a renúncia sem que nada mais haja acontecido vem juntar aos autos requerimento a sustentar e a pedir que se defina a data em que o prazo para alegar se interrompeu.
  A surpresa pasma-nos!
  Era mandatária constituída ou era para ser nomeada ao abrigo do apoio judiciário?
  Pediu-se apoio judiciário em que modalidade?
  Nada se pede nem se diz quanto à modalidade de nomeação de patrono e pagamento de patrocínio judiciário mas quer-se que o advogado constituído nos autos seja nomeado ou pago pelo apoio judiciário?
  Se era suposto que quando se pede o apoio judiciário também se queria a modalidade de nomeação de patrono e pagamento de patrocínio judiciário a que título vem a advogada que havia sido constituída interpor recurso?
  Renúncia-se ao mandato em requerimento assinado por mandante e advogado para se tornar efectiva a renúncia de imediato nos termos do nº 2 do artº 81º do CPC e semanas depois vem o mesmo advogado apresentar requerimento nos autos?
  Renunciou ou não renunciou?
  Salvo melhor opinião toda esta actuação não tem outro objectivo que não seja protelar os autos, adiando que a decisão se torne definitiva, face a duas decisões a decretar o divórcio que não se quer aceitar.
  Como se ainda não fosse bastante, a Ré e Recorrente e que não quer o divórcio tem 50 anos de idade e completamente a despropósito vem aos autos dizer que quer continuar casada, provocando que o Autor e Recorrido com 78 anos venha aos autos pedir que o processo chegue ao fim depressa, e com razão, seja lá qual venha a ser a decisão final.
  Perante tal maneira de agir não podemos deixar de concluir que, independentemente da Ré/Recorrente ter no decurso do processo (porque antes não o havia pedido) passado a necessitar de apoio judiciário, toda a forma de actuar supra descrita é manifestamente reprovável tendo como único objectivo protelar o trânsito em julgado da decisão.
  Actuação essa que face ao descrito é manifestamente intencional e desejada o que se confirma quanto ao sujeito processual (Ré/Recorrente) por no meio da confusão vir pedir que se mantenha o casamento, pelo que, se dúvidas houvesse ficávamos com a certeza, e uma advogada que constituída pratica actos no processo para depois dar a entender que afinal já não era constituída mas oficiosa sem que nunca haja sido nomeada, para depois renunciar e a seguir voltar a praticar actos!
  Assim sendo, impõe-se concluir que a Ré/Recorrente por si e pelos actos conscientemente praticados pela sua mandatária litigou dolosamente com má-fé nos termos do nº 1 e 2 alínea d) do artº 81º do CPC.
  Destarte, deve a Ré/Recorrente ser condenada a final numa multa entre 2 e 100 UC´s – artº 101º nº 2 do RCT – e ser dado cumprimento ao disposto no artº 388º do CPC quanto à mandatária.
  Não fosse ainda bastante, os processos judiciais não são uma caixa de correio para onde as partes escrevem a despropósito e sem fundamento legal, razão aliás, pela qual em processos desta natureza e em sede de recurso têm de estar representados por mandatário judicial.
  O requerimento da Ré/Recorrente a fls. 356/360 é completamente despropositado e sem fundamento legal, pelo que, se ordena seja desentranhado e devolvido à parte com custas pelo incidente a seu cargo a fixar nos termos do artº 15º e 17º nº 2 do RCT.
  De igual modo carece de fundamento o requerimento apresentado pelo Autor/Recorrido contudo a junção deste foi provocada pela confusão que se gerou nos autos causada pela parte contrária, pelo que, sendo ordenado também o seu desentranhamento e devolução à parte não vai condenado em custas pelo incidente.
  Por fim, quanto ao requerimento a fls. 351 apresentado em 04.02.2025 pela mandatária que renunciou ao mandato, uma vez que não tem poderes forenses – renunciou ao mandato e não há outro titulo pelo qual haja sido nomeada – por falta de legitimidade da requerente nada há a apreciar, apenas não se ordenando que seja desentranhado para que fique documentado nos autos o anómalo da situação criada, mas anotando-se no mesmo que por este despacho se decide que não pode ser apreciado por o requerente não ter legitimidade ou interesse para agir nestes autos.
  Por este incidente deve o Advogado que o apresentou ser condenado em custas pelo incidente nos termos do artº 15º e 17º nº 2 do RCT.
  Termos em que pelos fundamentos expostos:
  1. Vai a Ré/Recorrente condenada como litigante de má-fé na multa igual a 10 UC´s.
  2. Desentranhe os requerimentos de fls. 356 a 363 e devolva às partes respectivas com custas pelo incidente a cargo da Ré/Recorrente fixando-se a taxa de justiça em 4UC´s.
  3. Não nos pronunciamos sobre o requerimento de fls. 351 devendo ser anotado no mesmo que não é objecto de pronuncia por força deste despacho, sendo a Advogada que o apresentou condenada em custas pelo incidente fixando-se a taxa de justiça em 4UC´s.
  4. Cumpra o disposto no artº 388º do CPC relativamente à antes mandatária da Ré/Recorrente.
  5. Comunique ao CAJ com cópia deste despacho, solicitando que:
  - Informe se foi pedido o apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e pagamento de patrocínio judiciário;
  - Se pronuncie com a brevidade possível sobre o pedido de apoio judiciário que haja sido formulado independentemente da modalidade em que o foi.
  Notifique.».
  
  Os argumentos usados pela Ilustre Advogada Reclamante em nada justificam o seu procedimento enquanto Mandatária e Ex-mandatária (agora defensora ao abrigo do apoio judiciário) da Recorrente, sendo certo que dos Advogados enquanto representam as partes e exercem o seu mister se espera que seja usada de competência e se limitem a praticar os actos adequados de acordo com as regras de processo.
  
  Destarte, nada se trazendo de novo aos autos mantém-se o despacho reclamado.
  
III. DECISÃO
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julgando-se improcedente a reclamação apresentada, mantém-se o despacho de fls. 366 a 370 nos seus precisos termos.
  
  Custas a cargo da Reclamante fixando-se a taxa de justiça em 4 UC´s.
  
  Notifique.
  
  RAEM, 19 de Junho de 2025

(Relator) Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro

(Primeiro Juiz-Adjunto) Seng Ioi Man

(Segundo Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong


400/2024 RECL P/CONF 6