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Processo nº 101/2025
(Litígios relativos a infiltrações de água em edifícios)

Data do Acórdão: 26 de Junho de 2025

ASSUNTO:
- Infiltrações de água
- Prova



____________________
Rui Pereira Ribeiro











Processo nº 101/2025
(Litígios relativos a infiltrações de água em edifícios)

Data: 26 de Junho de 2025
Recorrentes: (A)
Recorrida: (B)
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

  (A), com os demais sinais dos autos,
  veio interpor recurso de sentença da arbitragem necessária de litígios relativos a infiltrações de água em edifícios, em que a agora Recorrente era Demandante,
  sendo Demandada,
  (B), também com os demais sinais dos autos.
  
  Foi proferida decisão arbitral nos seguintes termos:
1. Suprir, pela presente decisão arbitral, o consentimento da proprietária da fracção C do 2º andar, sita em Macau, na Estrada de …, Edf. XX (fracção “C2”, descrita na CRP sob o n.º ...), para entrar na “fracção C2” para efeitos de reparação das infiltrações de água.
2. A demandada tem de dar o seu consentimento, no prazo de cumprimento voluntário de 20 dias, para realização das seguintes inspecções na fracção sita em Macau, na Estrada ..., Edf. XX, 2º andar C (fracção “C2”, descrita na CRP sob o n.º ...):
“1) Melhorar a capacidade de impermeabilização da banheira, do pavimento e das paredes circundantes na casa de banho da fracção C do 2º andar.
2) Após a conclusão da medida 1), se for necessário, reparar os corpos e as juntas dos tubos de escoamento de água na casa de banho da fracção C do 2º andar, incluindo substituí-los até à intersecção com tubos verticais exteriores.”
3. Se a demandada não realize as supracitadas inspecções das infiltrações de água no prazo acima referido, pode a demandante solicitar que uma entidade qualificada, na qualidade de parte inspectora, entre na fracção autónoma da demandada, sita em Macau, na Estrada ..., Edf. XX, 2º andar C (fracção “C2”, descrita na CRP sob o n.º ...), para efeitos da realização das respectivas inspecções, a partir do dia seguinte ao termo do prazo de cumprimento voluntário, nos dias que não sejam feriados, de segunda-feira a sábado, das 09h00 às 19h00, até ao fim dos trabalhos de inspecção.
4. Julgar procedente o pedido da demandante, na parte relativa à indemnização pela reparação da sua fracção no valor de MOP$5.000,00 (cinco mil patacas).
5. As despesas da arbitragem (incluindo despesas administrativas do Centro da Arbitragem, despesas do árbitro, e outras despesas acordadas entre as partes, tais como despesas dos relatórios periciais) são repartidas entre a demandante e a demandada na proporção do decaimento.
6. Indeferir os restantes pedidos da demandante.
  
  Não se conformando com aquela decisão veio a Demandante interpor recurso apresentando as seguintes conclusões e pedidos:
1) A decisão arbitral proferida pelo douto Árbitro a 24/11/2024 diz que não está confirmada a causalidade entre as infiltrações da fracção 2.º andar C da recorrida e a danificação das vigas de betão, do tecto da cozinha e do tecto do corredor da fracção 1.º andar C da recorrente, porque segundo o relatório de detecção, a parte afectada e que havia que reparar era a casa de banho; não fazendo parte, portanto, da indemnização fixada na decisão que a recorrida deve pagar.
2) Custa à recorrente concordar com isso, salvo o devido respeito. A seu ver, o douto tribunal arbitral errou na apreciação de provas, o que motivou uma conclusão de facto errónea, o que, por sua vez, determinou a falha na aplicação da lei.
· Facto provado n.º 6
3) Resulta da decisão recorrida que o que subjaz à convicção sobre o facto provado n.º 6 do tribunal arbitral estão o depoimento da testemunha ouvido durante a audiência, as fotos submetidas por ambas as partes e o relatório da detecção conduzida em 2011. (fls. 8 da decisão recorrida)
4) No relatório da detecção de 2011 constante a fls. 160 a 161 dos autos anexos não se encontra, porém, registado quanto diz o facto provado n.º 6.
5) De resto, conforme mostra o documento a fls. 162 dos autos anexos, a DSSCU urgiu, numa carta dirigida a todos os proprietários, verificação e reparação do Edf. XX devido ao problema de infiltrações da fracção da recorrente, a fim de pôr cobro ao problema de fuga de água. Foram em seguida substituídos os esgotos verticais públicos que deitavam água.
6) A foto 9 (fls. 172 dos autos anexos) que acompanhava a explicação suplementar submetida pela recorrente a 12/09/2024 demonstra que em 10/03/2023 já estava colocada tinta para fachadas no exterior do edifício, por obra da recorrente; nota-se bem a diferença de cores sobretudo no lado esquerdo, que apresentava cores distintas na parte de cima e de baixo. Da foto 14 (fls. 177 dos autos anexos) que faz parte da mesma explicação suplementar resulta também que estava aplicada tinta para fachadas na parede exterior da fracção da recorrente. Isso demonstra que demonstram que o exterior foi já efectivamente reparado e mantido, para dizer o mínimo, pela recorrente.
7) A relativa decrepitude do edifício, portanto, não quer dizer necessariamente que a falta de inspecções, reparações e manutenções regulares do exterior do edifício.
8) A testemunha, nem senhorio nem inquilino, não conheceria o edifício melhor que a recorrente, que possui lá uma fracção. Dada a contraditoriedade das provas, bem se poderia supor que o seu depoimento é menos demonstrativo.
9) As provas documentais acima referidas bem demonstram que se realizaram inspecções, reparações e manutenções ao edifício em causa logo desde o início e que ainda o fazem. A convicção do douto tribunal arbitral contraria a matéria probatória nos autos.
10) Logo, dada a contraditoriedade entre a convicção do tribunal arbitral em torno do facto n.º 6 e as demais provas presentes no processo, sendo infundada a convicção, é de considerar o facto não provado.
· Facto não provado n.º 2
11) Da decisão recorrida resulta que a convicção do douto tribunal arbitral sobre o não provado do conteúdo aqui em discussão se fundamenta na “possível multiplicidade dos factores conducentes a infiltrações de água verificadas no edifício” e “na exclusividade da área afectada que era a casa de banho, segundo o relatório de detecção”. (fls. 8 e 13 da decisão recorrida)
12) Deixem-nos apontar, com todo o devido respeito, que se nos afigura errado o juízo. O douto tribunal arbitral omitiu apreciar os factos, dado que a decisão não se coaduna com as demais provas presentes nos autos, para além de erros na apreciação da matéria probatória do processo.
➢ Não provada a multiplicidade dos factores conducentes a infiltrações de água verificadas no edifício, a qual é, aliás, improvável
13) É de frisar, antes de tudo, que não está provada “a multiplicidade dos factores conducentes a infiltrações de água verificadas no edifício”.
14) O douto tribunal arbitral, porém, fundamentou a decisão em factos não provados, i.e., na “multiplicidade dos factores conducentes a infiltrações de água verificadas no edifício”, excluindo assim a sala de estar, a cozinha e o corredor da fracção da recorrente do âmbito de influência das infiltrações da casa da recorrida. Tal convicção é obviamente privada de fundamento de facto. Não foi atendido o art.º 562.º, n.º 2 do CPC, aplicável subsidiariamente em virtude do art.º 23.º, n.º 2 da Lei n.º 9/2023 – Regime da arbitragem necessária de litígios relativos a infiltrações de água em edifícios.
15) Seja como for, de acordo com as provas constantes dos autos, não se pode considerar provada “a multiplicidade dos factores conducentes a infiltrações de água verificadas no edifício”. É porque para além da causa de infiltrações determinada pela perda de impermeabilização do cabine de duche e do pavimento da casa de banho do 2.º andar “C” pertencente à recorrida, não há outras provas documentais nos autos capazes de indiciar outras causas de infiltrações no edifício em discussão.
16) De facto, na audiência, a testemunha só indicou que não se excluiu a possibilidade de provocação das infiltrações por chuvas penetrantes na parede exterior, mas não confirmou com certeza que as infiltrações na fracção da recorrente resultaram da penetração das chuvas na parede exterior, nem exceptuou a causa provável dos danos da fracção C do 1º andar da recorrente pelas infiltrações da fracção C do 2º andar da recorrida.
17) Ao contrário, verifica-se que, como dito no acórdão recorrido, o teste revelou a presença do corante que penetrara na secção da parede exterior do 1º andar contígua às casas de banho da recorrente e da recorrida, e o corante saiu da parede exterior (aproximada à canalização de drenagem da casa de banho) (sic.);
18) Portanto, chegaram à conclusão de: a perda da impermeabilidade do cabine de duche, do pavimento e das paredes circundantes da casa de banho do 2.º andar “C”, e / ou aberturas na canalização e fissuras em juntas dos tubos de drenagem da casa de banho do 2.º andar “C”, o que provocou as infiltrações da fracção C do 1º andar da recorrente.
19) Na verdade, de acordo com a foto 15, juntada ao esclarecimento suplementar entregue em 12 de Setembro de 2024 pela recorrente (constante da fls. 178 dos autos), a canalização de drenagem e as juntas em que se realizou o teste do corante, incluindo as secções da parede exterior correspondentes às salas de estar e casas de banho das duas fracções, situam-se abaixo da parte protrusa da fracção C do 3º andar, sendo por esta cobertas e não abertas a céu, portanto, não deixa de ser difícil que as chuvas penetrem na parede exterior.
20) Conforme o relatório de detecção n.º L0407-01/DEF/11 (proc. n.º 279/CITIA/2011) de 18 de Julho de 2011 do LECM, constante das fls. 160 a 161 dos autos, não se descobriu dano na parede exterior do Edifício, nem se reconheceu a perda da sua impermeabilidade.
21) Também importa assinalar que, de acordo com o relatório de detecção n.º 913/NII/2023 de 23 de Maio de 2023 do LECM, constante das fls. 92 a 94 dos autos, só se aconselhou o melhoramento da impermeabilidade do cabine de duche, do pavimento e das paredes circundantes da casa de banho do 2.º andar “C”, não se aponta melhoramento da impermeabilidade da parede interior ou exterior da fracção, tampouco da parede exterior do Edifício.
22) Salvo o devido respeito, a recorrente entende que o Tribunal arbitral cometeu erro na apreciação do aludido relatório e acabou por chegar a conclusão incorrecta, na verdade, nos autos não há qualquer prova de outra causa das infiltrações.
A área afectada na fracção C do 1.º andar limita-se à casa de banho, segundo o relatório de detecção (sic.)
23) Salvo o devido respeito por opinião diversa, conforme o relatório de detecção n.º 913/NII/2023 de 23 de Maio de 2023 do LECM, constante das fls. 92 a 94 dos autos, não se revela que a área afectada na fracção C do 1.º andar da recorrente que requer reparação limita-se à casa de banho.
24) De facto, segundo esse relatório de detecção, o pessoal, ou seja, testemunha (D), entrou na fracção C do 1º andar da recorrente e realizou a detecção a olho, descobriu que o tecto e as paredes da sala de estar tinham manchas de água e com queda do revestimento, o pavimento tinha manchas de água, o tecto da casa de banho tinha manchas de água e com queda do revestimento, juntando fotos como prova.
25) Embora o pessoal não tenha marcado expressamente no projecto do relatório a área que considerou afectada pelas infiltrações, muito óbvio é que nunca afirme no relatório que a área afectada na fracção C do 1.º andar pelas infiltrações da fracção C do 2º andar e que requer reparação limita-se à casa de banho, nem exclua da área afectada o texto e as paredes da sala de estar dessa fracção.
26) Todavia, o Tribunal arbitral considerou que a área afectada se limita à casa de banho, sem fazer qualquer justificação no acórdão recorrido, violando evidentemente a disposição do art.º 12.º n.º 5 da Lei n.º 9/2023 (Regime da arbitragem necessária de litígios relativos a infiltrações de água em edifícios).
27) Por outro lado, segundo os factos provados, devido à falha de impermeabilização do cabine de duche, do pavimento e das paredes circundantes da casa de banho da fracção C do 2º andar da recorrida, a água penetrou, resultando nas infiltrações da fracção C do 1º andar da recorrente, que se situa no piso inferior. (art.ºs 2.º e 3.º dos factos provados)
28) Em harmonia com as regras de experiência comum, se o volume de água penetrante seja pequeno, permanece no próprio lugar, no entanto, se o volume se torne grande em virtude de acumulação de água, estende-se para as fendas ao lado, sendo característica de água.
29) Na audiência, a testemunha (D) também indicou que, “a água corre para baixo e penetra em fenda”.
30) Do resultado do teste do corante permite-se saber que, há uma distância notória entre a origem de água do cabine de duche e do pavimento da casa de banho da fracção C do 2º andar da recorrida e a parede exterior da sua casa de banho, daí que não foi reduzido o volume de água penetrante da fracção C do 2º andar da recorrida.
31) Seja o que for, dando assente que há água penetrante na fracção C do 2º andar da recorrida, necessariamente urge responder onde foi a água penetrante? Obviamente não desapareceu sem causa!
32) Cabe lembrar que, a água penetrante não corre numa única direcção como num tubo, antes propaga-se para todos os lados, pelo que, a água penetrante na fracção C do 2º andar da recorrida obviamente não saiu integralmente das fendas da parede exterior contígua da casa de banho da fracção C do 2º andar.
33) Obviamente, dado que “a água corre para baixo e penetra em fenda”, só se apresenta razoável a resposta de que a água penetrante na cada de banho da fracção C do 2º andar da recorrida só correu para baixo, ou seja, para o tecto da fracção C do 1º andar da recorrente, propagando-se, do tecto às vigas, até para o pavimento.
34) Não se olvide que, segundo o art.º 4.º dos factos provados – “as casas de banho e salas de estar das fracções da demandante e da demandada ficam contíguas à parede exterior em que se registou a presença do corante”, daí que, a água penetrante da casa de banho da fracção C do 2º andar da recorrida absolutamente propagava-se e penetrava para o corredor, o tecto da sala de estar e as paredes da fracção C do 1º andar da recorrente.
35) Na verdade, de acordo com as fotos 7 e 8 juntadas ao esclarecimento suplementar entregue pela recorrente em 12 de Setembro de 2024 (constantes das fls. 170 a 171 dos autos), a área ora afectada pelas infiltrações na fracção C do 1º andar da recorrente era intacta e sem prejuízo em 25 de Junho de 2013, porém, devido às infiltrações, agora já se apresentam manifestamente mofo e dano na parede sob influências das infiltrações de cima a baixo.
36) E mais, de acordo com as fotos 10 e 21 juntadas ao esclarecimento suplementar entregue pela recorrente em 12 de Setembro de 2024 (constantes das fls. 173 a 184 dos autos), mostra-se que a corrente penetrante da fracção C do 2º andar da recorrida se passeava do tecto da casa de banho pela viga que liga com a sala de estar, estendendo-se para o tecto da última e as paredes vizinhas.
37) Da foto 11 juntada ao esclarecimento suplementar entregue pela recorrente em 12 de Setembro de 2024 (constantes da fls. 174 dos autos), também se demonstra que a corrente penetrante da fracção C do 2º andar da recorrida se passeava do tecto da casa de banho pela viga que liga com a sala de estar, estendendo-se para o tecto da última, até pingando gotas.
38) Dos art.ºs 2.º a 4.º dos factos provados e as provas documentais referidas resulta que, absolutamente não se limita à casa de banho a área afectada na fracção C do 1º andar da recorrente pelas infiltrações do cabine de duche e do pavimento da casa de banho da fracção C do 2º andar da recorrida;
39) Deste modo, não se verificando outra origem de infiltração e não se excluindo as influências das infiltrações da fracção C do 2º andar da recorrida para a fracção C do 1º andar da recorrente, as referidas provas documentais afiguram-se suficientes para comprovar adequadamente que essas influências tiveram lugar no corredor, sala de estar e cozinha da fracção da recorrente, no entanto, o juízo do Tribunal arbitral está desconforme às provas dos autos e com omissão desses factos, portanto, o art.º 2.º dos factos não provados deve ser dado provado.
40) Face ao exposto, deve ser julgado procedente a impugnação da recorrente sobre o art.º 6.º dos factos provados e o art.º 2.º dos não provados, por conseguinte, em virtude do reconhecimento do último, deve ser condenada a recorrida a pagar uma indemnização pelos danos da esta de estar, corredor e cozinha da fracção C do 1º andar da recorrente, ao abrigo dos art.ºs 477.º n.º 1, 550.º, 556.º, 557.º, e 558.º, n.º 1 do Código Civil.
Pelo exposto e nos demais de direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, pede-se que:
1. Seja julgada procedente a impugnação da recorrente sobre o juízo dos factos, dando não provado o art.º 6.º da factualidade assente e provado o art.º 2.º da não assente, por conseguinte
2. Seja concedido provimento a todos os pedidos da recorrente, condenando a recorrida a pagar uma indemnização pelos danos da esta de estar, corredor e cozinha da fracção C do 1º andar da recorrente, ao abrigo dos art.ºs 477.º n.º 1, 550.º, 556.º, 557.º, e 558.º, n.º 1 do Código Civil, e
3. Seja condenada a recorrida a pagar as custas da arbitragem e as custas processuais do presente recurso.

  Pela Demandada não foram apresentadas contra-alegações.
  
  Foram colhidos os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO
  
a) Factos

  Da decisão recorrida consta a seguinte factualidade:
1. Em Março de 2023, a demandante constatou manchas de humidade e revestimento descascado no tecto da casa de banho do seu domicílio (doravante “imóvel da demandante”), que ficava na fracção 1.º andar “C” do EDF. XX, Estrada de ..., Macau.
2. Em Março de 2023, a demandante comunicou o Centro de Interserviços para Tratamento de Infiltrações de Água nos Edifícios (caso n.º 369/CITIA/2023) do Instituto de Habitação (IH). Segue-se a conclusão dos testes de corante realizados pelo IH em 09/05/2023 no imóvel da demandante, no da demandada e no do vizinho de cima do 3.º andar C: «O indivíduo do 1.º andar C, que presenciou o teste, explicou que gotejava quando a vizinha de cima usava água; que a água saía da parede exterior do edifício. O teste revelou a presença do corante verde que penetrara na parede exterior (secção correspondente ao 1.º andar), o que indica a perda da impermeabilidade do cabine de duche, do pavimento e das paredes circundantes da casa de banho do 2.º andar “C” (e / ou) aberturas na canalização e fissuras em juntas dos tubos de drenagem da casa de banho do 2.º andar “C”.»
3. Propunha-se, aliás, o seguinte no relatório:
«1) Melhorar-se a impermeabilidade do cabine de duche, do pavimento e das paredes circundantes da casa de banho do 2.º andar “C”.
2) Finalizado 1), concertar-se a canalização e as juntas dos tubos de drenagem da casa de banho do 2.º andar “C”, se necessário.
3) Finalizados 1) e 2), aconselha-se inspecção autónoma, antes de contactarem entidades competentes para testes, se for o caso.»
4. O relatório de teste e a planta do edifício mostram que no caso dos imóveis da demandante e da demandada, o corante apareceu nas paredes exteriores perto da casa de banho e da sala de estar, (sic – N. da T.)
5. A substituição de peças danificadas na canalização e nas juntas dos tubos de drenagem da casa de banho do imóvel da demandada tinha que chegar até ao ponto onde se uniam os tubos verticais expostos, que não deixava de pertencer ao ramal do imóvel da demandada.
6. O prédio em causa está em uso desde 1981, i.e., há cerca de 43 anos. Não se inspecionam, reparam ou mantêm regularmente nem as suas paredes exteriores nem as instalações comuns.

b) Do Direito

  De acordo com o disposto no nº 3 do artº 589º do CPC o objecto do recurso limita-se pelas conclusões da alegação, pelo que, cabe, agora, apreciar as situações suscitadas.
  
  Da impugnação do facto provado nº 6 e do facto não provado nº 2.
  
  Diz o facto provado nº 6 o seguinte:
  “O prédio em causa está em uso desde 1981, i.e., há cerca de 43 anos. Não se inspecionam, reparam ou mantêm regularmente nem as suas paredes exteriores nem as instalações comuns.”
  
  A convicção do Tribunal Arbitral resultou do seguinte:
  «V. Provas
  5.1 Provas documentais:
  Os documentos e provas documentais apresentados pelas partes integram principalmente:
1. Relatório de detecção das infiltrações de água na Fracção C do 1º andar do Edf. XX da Estrada de ..., emitido em 23 de Maio de 2023 pelo Laboratório de Engenharia Civil de Macau,
2. Discriminação dos preços propostos das obras na Fracção da demandante, apresentada em 12 de Maio de 2024 pela X – Companhia de Construção e Engenharia, Limitada,
3. Carta de 18 de Maio de 2024, enviada pela demandante à demandada, e a foto comprovativa do registo de correios,
4. Fotos da Fracção C do 1º andar do Edf. XX da Estrada de ...,
5. Declaração do bem próprio da demandada (B) na qualidade de proprietária, prestada em 16 de Setembro de 2024,
6. Procuração celebrada em 9 de Outubro de 2024 pela demandada (B) para constituir (C),
7. Fotos da Fracção C do 2º andar do Edf. XX da Estrada de ...,
8. Proposta de preços para as obras de reparação, apresentada em 19 de Agosto de 2024 pela Empresa Y, Limitada, constituída pela demandada, e
9. Fotos das paredes exteriores na parte do 1º andar do Edf. XX da Estrada de ....
  5.2 Testemunhas:
  A demandante e a demandada não apresentaram o rol de testemunhas, o Tribunal arbitral solicitou a presença na audiência de (D), técnico do LECM.
  (…)
  Tendo em conta a análise profissional contida no relatório do teste conduzido no imóvel da demandante redigido pelo técnico encarregue do teste, bem como a explicação dada sobre a conclusão tirada ao fim do teste, para além do parecer técnico, todos contemplados durante a audiência, no qual se destacava a presença de corante verde que penetrara na parede exterior (secção correspondente ao 1.º andar), a planta da fracção C do edifício e as fotos correspondentes, que se juntam para efeitos de análise, demonstram que o corante verde aparecera na parede exterior (secção correspondente ao 1.º andar) que circundava as casas de banho da demandante e da demandada. Se bem que as calhas expostas, que fazem parte da canalização comum, desçam do alto do edifício, o facto é que as caleiras distam bastante da superfície da parede exterior (situação patenteada nas fotos que acompanham o relatório de teste). O técnico apontava durante o teste, pelo que constara, que notara a penetração do corante verde na parede exterior (onde ficava instalado o tubo de drenagem da casa de banho adjacente) e que a água não pingava das calhas expostas junto da parede exterior, pois tinham a superfície seca. Assim se tirou a conclusão que se encontra no relatório de teste. Só que, como as testemunhas informaram durante a audiência, o edifício já estava bastante caduco. As fotos constantes dos autos que foram submetidas pela demandante e pela demandada e o relatório do teste conduzido em 2011 (caso n.º 279/CITIA/2011) evidenciam que a fuga de água detectado no edifício se devia a vários motivos. No relatório aconselhava-se aperfeiçoar a impermeabilidade das paredes exteriores do edifício, para além dos consertos que se requeriam a canalização e as juntas dos tubos de drenagem da casa de banho da demandada.
  A demandada replicou ter reparado a sua casa de banho em Agosto de 2024, conforme o relatório de teste, uma vez notificada do processo. Ter-se-lhe-iam substituído os tubos de abastecimento e de drenagem, impermeabilizado o sistema. Só que a demandante não apresentou senão umas fotos, sem ter aduzido peças probantes de reparações / relatórios de teste que fossem, particularmente no que toca à existência ou não de fissuras nas juntas dos tubos de drenagem da sua casa de banho antes do conserto por onde a água saísse, que ilidissem a conclusão do relatório de teste (sic – N. da T.). Admissíveis são, portanto, os relatórios de teste submetidos pela demandante, sobretudo o de detecção das infiltrações de água datado de 23/05/2023 do Laboratório de Engenharia Civil de Macau (LECM) referente à fracção 1.º andar “C” do EDF. XX, Estrada de ..., Macau.
  O tribunal arbitral apurou a factualidade acima exposta com base nas alegações da demandante e da demandada, que se encontram no “Requerimento de Arbitragem Necessária” e na “Resposta ao Requerimento de Arbitragem Necessária”, respectivamente, para além dos relatórios de teste constantes dos autos, atendendo ao mesmo tempo às provas documentais e testemunhais aduzidas por ambas as partes.
*
  Factos não provados (não assentes):
1. A demandante alega ter constatado em Março de 2023 no seu domicílio (doravante “imóvel da demandante”), que ficava na fracção 1.º andar “C” do EDF. XX, Estrada de ..., Macau, manchas de humidade e revestimento descascado no tecto e nas paredes da sala de estar, além do chão molhado.
2. Com o passar do tempo, o imóvel da demandante degradou-se drasticamente por causa de infiltrações do imóvel da demandada. Foram aparecendo manchas de humidade nos lintéis de betão, no tecto da cozinha e do corredor. A água pingava constantemente. O reboco soltava-se, desfarelava-se e deitava pó. As verguinhas foram-se enferrujando e deteriorando.
*
  Fundamentos subjacentes à convicção do tribunal arbitral:
  O tribunal arbitral apurou a factualidade acima referida, tendo percorrido as provas documentais constantes do processo, os testemunhos produzidos durante a audiência, a planta dos imóveis da demandante e da demandada, as fotos tiradas no local e as alegações do técnico que conduzira o teste nos imóveis em causa.».
  
  Vejamos então.
  
  Pese embora na decisão recorrida a dado passo se aluda a prova testemunhal dando a ideia de terem sido ouvidas testemunhas, o que resulta da acta da audiência de julgamento a fls. 380, tal como da sentença recorrida, é que apenas foi ouvido o Técnico do LECM (D).
  Como também resulta da fundamentação da decisão recorrida quanto à matéria de facto, a convicção do Tribunal Arbitral no que concerne à causa das infiltrações e áreas afectadas pelas infiltrações provocadas pela fracção da Demandada, resulta:
  - Primeiro do Relatório do LECM – a fls. 7 a 9 e repetido várias vezes ao longo dos autos de processo arbitral – do qual resultaria que na sequência do teste feito com pó verde foi encontrada água verde na parede exterior da casa de banho (e do edifício) o que demonstra que viria da canalização de esgoto da casa de banho da fracção da demandada;
  - Segundo as declarações prestadas em audiência de julgamento pelo Técnico (D) autor daquele relatório, bem como, das fotografias juntas aos autos, resulta o elevado estado de degradação do edifício e a necessidade de impermeabilização das paredes exteriores do prédio.
  
  A Demandante insiste nas suas alegações de recurso que a infiltração proveniente da casa de banho do andar superior – o da demandada – é também responsável pelas avarias existentes nas outras partes da sua casa – sala e corredor – aduzindo que já teria pintado a parede exterior ao nível do primeiro andar, pelo que nunca tal poderia ser por causa da falta de impermeabilização destas.
  Falece a argumentação da Recorrente por uma razão lógica que resulta do princípio da gravidade. Qualquer infiltração de água que haja nas paredes exteriores o seu efeito irá aparecer na parte interior da parede e nas partes inferiores da zona da infiltração. Das fotografias juntas resulta que a Demandante se queixa de infiltrações no tecto da sala, as quais a existirem só podem vir de um elemento que lhe esteja superior, sendo perfeitamente admissível que resulte da falta de impermeabilização das paredes exteriores ao nível dos andares superiores. Pelo que, certo é que a pintura da fachada exterior do primeiro andar – o da Demandante – não pode evitar a infiltração de humidade/água que provenha das secções das paredes que lhe estão acima.
  Por outro lado, a água verde que provinha da infiltração provocada pelo andar superior não apareceu nos tectos interiores da casa, nomeadamente na sala, mas apenas na parede exterior da casa de banho, o que sem prova em contrário que cientificamente demonstre o contrário, obriga a concluir que humidade existente no tecto da sala não provém da avaria na canalização do esgoto da casa de banho superior.
  Por fim, das fotos juntas pela Demandante da sua sala a secção da parede da janela já está para lá da parede exterior da casa de banho fazendo com esta um ângulo de 90 graus como resulta da análise da planta – e também para lá da parede interior que divide a casa de banho da sala -.
  Destarte, a argumentação da Recorrente resulta apenas da sua interpretação da situação sem estar ancorada em qualquer elemento técnico ou de facto que tenha suporte na prova produzida, pelo que erro algum se encontra na decisão do Tribunal Arbitral seja quanto a dar como provado o facto nº 6, seja como a dar como não provado o facto nº 2.
  
  Assim sendo, impõe-se decidir em conformidade mantendo a decisão recorrida.
  
III. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos nega-se provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida nos seus precisos termos.
  
  Custas a cargo da Recorrente.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 26 de Junho de 2025
  Rui Pereira Ribeiro (Relator)
  Seng Ioi Man (Primeiro Juiz-Adjunto)
  Fong Man Chong (Segundo Juiz-Adjunto)


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