Processo nº 387/2024
(Autos de Recurso Jurisdicional em Matéria Administrativa)
Data: 10 de Julho de 2025
Recorrente: Presidente do Instituto de Habitação
Recorrida: A
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I. RELATÓRIO
A, com os demais sinais dos autos,
veio instaurar recurso contencioso contra, o Despacho de 21 de Janeiro de 2022 do Presidente do Instituto de Habitação que aderindo aos fundamentos constantes da Proposta nº 0074/DHP/DFHP/2022, concordou com o cancelamento dos elementos de registo da Recorrente e de B como residentes na barraca n.º 22-12-09-007-001, além de desconsiderar o pedido de fazer constar do inventário da referida barraca C e D, pedindo a anulação do acto recorrido.
Foi proferida sentença a julgar procedente o recurso contencioso interposto, com a anulação dos dois actos recorridos.
Não se conformando com a decisão proferida veio a Entidade Recorrida e agora Recorrente recorrer da mesma, apresentando as seguintes conclusões:
1. Por sentença de 29 de Fevereiro de 2024 (constante das fls. 160 a 167 dos autos), o Juiz do Tribunal a quo reconheceu que os dois actos recorridos padeceram do vício de ilegalidade, pelo que julgou procedente o recurso contencioso, anulando os actos recorridos. Inconformada com a referida sentença do Tribunal a quo, a depoente pede a sua anulação.
2. Os dois actos recorridos foram praticados pela depoente no seu despacho de 21 de Janeiro de 2022, proferido na Proposta n.º 0074/DHP/DFHP/2022: o 1º é o acto administrativo de cancelar os elementos de registo da recorrente contenciosa como residente na barraca n.º 22-12-09-007-001; e o 2º é o acto administrativo de não admitir o pedido de fazer constar do inventário da barraca C e D.
3. Quanto ao 1º acto recorrido, a sentença recorrida julgou que a respectiva decisão padeceu do vício de errada interpretação da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, mas a depoente não está de acordo.
4. No entendimento do Tribunal a quo, a recorrente contenciosa só preenche o pressuposto para cancelamento dos elementos de registo de residentes em edificações informais recenseados, isto é, “possuam ou mantenham outra habitação em condições de utilização como residência permanente”, quando ainda se encontre nessa situação no momento da prática do acto recorrido.
5. Porém, entende a depoente que a aludida norma não pode ser interpretada, unilateralmente, como se limita a “possuir habitação no presente momento”, sendo ainda necessário atender à intenção e ao objectivo legislativos.
6. Tal como entendeu o digno Magistrado do MP no parecer emitido a fls. 161 e v dos autos, na interpretação da lei, não se pode apagar completamente os outros elementos de interpretação que não sejam o literal.
7. Ao abrigo do disposto no art.º 8.º, n.º 1 do Código Civil, a interpretação da lei compreende três elementos interpretativos: “a unidade do sistema jurídico”, “as circunstâncias em que a lei foi elaborada” e “as condições específicas do tempo em que é aplicada”.
8. Para procurar o espírito legislativo da referida norma, pode-se tomar como referência os cinco elementos da interpretação elencados pelo Prof. JOÃO CASTRO MENDES na sua obra «Introdução ao Estudo do Direito»: elemento literal, elemento lógico, elemento sistemático, elemento histórico e elementos complementares. O elemento sistemático corresponde à “unidade do sistema jurídico” mencionada no n.º 1 do art.º 8.º do Código Civil, e o elemento histórico às “circunstâncias em que a lei foi elaborada”.
9. Vejamos primeiro o elemento histórico. Segundo o Prof. JOÃO CASTRO MENDES, o elemento histórico pode abranger os trabalhos preparatórios, o preâmbulo ou relatório dos decretos-leis e decretos, ou o conjunto de circunstâncias da sociedade que justificam o aparecimento da lei, com o conteúdo que tem, ou seja as “circunstâncias em que a lei foi elaborada”.
10. Do preâmbulo do DL n.º 6/93/M decorre que, este diploma tem por objectivo a eliminação das edificações informais e a erradicação das barracas, sendo apenas provisória a medida que permite aos residentes que não tenham suficiente capacidade económica continuar a residir nas barracas.
11. Por outro lado, na história, as barracas foram construídas para satisfazer a necessidade indispensável de habitação dos residentes pobres, no entanto, com o desenvolvimento social, o Governo pretendeu demolir gradualmente todas as barracas. Ao mesmo tempo, é necessário garantir que os residentes nas barracas tenham habitação, razão pela qual dispõe-se no Capítulo IV do supracitado DL que, nas operações de desocupação executadas pela Administração, é preciso providenciar o realojamento dos agregados familiares em situação económica carenciada e que observem as condições de acesso a habitação social nos termos da legislação aplicável.
12. Vejamos a seguir outro elemento: o sistemático. O elemento sistemático refere-se às normas contíguas à norma interpretada, ao conjunto das quais se chama o contexto da norma, e outras não contíguas a que se chamam lugares paralelos. Veja-se, a este propósito, o art.º 9.º, n.º 4 o art.º 25.º do DL n.º 6/93/M. Dessas normas decorre que, as considerações da “unidade do sistema jurídico” são sempre alcançar o objectivo de eliminação das edificações informais e erradicação das barracas, com garantia da necessidade fundamental de habitação dos seus residentes.
13. Em síntese, a recorrente contenciosa e o seu cônjuge já se tornaram compradores da casa de habitação no mercado privado, tendo, obviamente, capacidade económica suficiente para resolver, por si próprios, o problema de habitação, pelo que não se verifica a necessidade de a recorrente contenciosa ou os seus familiares continuarem a residir na barraca!
14. Por isso, quando já está verificado o requisito previsto na primeira parte da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, ou seja que a recorrente contenciosa “possua outra habitação em condições de utilização como residência permanente”, não há necessidade de investigar se a recorrente contenciosa reúne o requisito na última parte, ou seja se “mantenha outra habitação em condições de utilização como residência permanente”.
15. Aqui chegados, o acto administrativo da depoente, de cancelar os elementos de registo da recorrente contenciosa na barraca n.º 22-12-09-007-001, não interpretou erradamente a al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, pelo que não padeceu do vício de ilegalidade, e deve ser mantido.
16. Por outro lado, no que concerne ao 2º acto recorrido, entendeu a recorrente contenciosa que, a decisão da depoente de não admitir o seu pedido de fazer constar do inventário da barraca os dois filhos dela, violou o disposto no n.º 4 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, e o Tribunal a quo concordou que esse acto administrativo interpretou erradamente a lei e devia ser anulado. Mas a depoente não está de acordo.
17. No entendimento do Tribunal a quo, entre o pedido da recorrente contenciosa de fazer constar do inventário da barraca os seus filhos C e D e a decisão de cancelamento dos elementos de registo da recorrente contenciosa na barraca, não existe a relação de dependência, e durante a pendência do 1º acto recorrido, a recorrente contenciosa não deixava de ser residente em barraca recenseada.
18. Porém, na verdade, a actualização dos elementos de residentes, prevista no n.º 4 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, é feita com base na existência dos elementos de registo de residentes recenseados. Se o pressuposto do recenseamento deixe de existir, não há necessidade de alterar os elementos!
19. Antes da apresentação, pela recorrente contenciosa, do pedido de actualização dos elementos de residentes, a depoente já tinha informações suficientes para mostrar que a recorrente contenciosa possuía outra habitação em condições de utilização como residência permanente, pelo que não tinha outra alternativa senão cancelar os seus elementos de registo de residente na edificação informal onde se encontrava recenseada.
20. Tal como entendeu o Tribunal a quo: “estando preenchido o respectivo pressuposto legal, a Administração não tem outra alternativa senão cancelar o registo no inventário”, e o Magistrado do MP também emitiu parecer considerando o acto recorrido como acto vinculado. Pelo que, como tem sido entendido na jurisprudência anterior, quando a Administração exerça um “poder vinculado”, a audiência do interessado degrada-se em “formalidade não essencial”
21. Nesta conformidade, o procedimento de audiência, instaurado pela depoente em 18 de Junho de 2021, para o cancelamento dos elementos de registo da recorrente contenciosa, já se degrada, de facto, em formalidade não essencial, pelo que antes de requerer a actualização dos elementos de residentes na barraca, a recorrente contenciosa já foi juridicamente considerada como não residindo na barraca, e a depoente só podia cancelar os elementos de registo da recorrente contenciosa na edificação informal onde se encontrava recenseada, razão pela qual não deve ser admitido o pedido da recorrente contenciosa de acrescentar os dois filhos no agregado familiar residente na barraca.
22. Por fim, como entendeu o digno Magistrado do MP no seu parecer, deve ainda considerar se reúne ou não o requisito consagrado no n.º 1 do art.º 9.º do DL n.º 6/93/M, isto é, “residindo, a título permanente, em edificação informal inventariada”.
23. No caso sub judice, depois de ter sido instaurado, pela depoente, o procedimento de audiência com que se pretendeu cancelar os seus elementos de registo de residente, a recorrente contenciosa nunca forneceu qualquer elemento para provar que os dois filhos dela realmente residiam, a título permanente, na respectiva barraca. Em contrário, como atrás já se referiu, pelo menos a partir de 2000, a recorrente contenciosa e o cônjuge já possuíam fracção privada com finalidade habitacional, e obviamente, os dois filhos deles não necessitavam de continuar a residir na barraca.
24. Por isso, a 2ª decisão da depoente observou completamente o disposto no n.º 4 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, não incorreu em errada interpretação, e deve ser mantida.
25. Pelo exposto, deve ser anulada a sentença do Tribunal a quo que, com fundamento na interpretação e aplicação errada do art.º 10.º, n.º 2, al. c) e n.º 4 do DL n.º 6/93/M, reconheceu a ilegalidade do acto recorrido e julgou procedente o recurso da recorrente contenciosa.
Contra-alegando veio a Recorrida apresentar as seguintes conclusões:
a) O presente recurso vem interposto da sentença de 29 de Fevereiro de 2024 proferida pelo Tribunal Administrativo (adiante designado por “Tribunal a quo”), que julgou procedente o recurso da recorrente contenciosa (ou seja “recorrida” no presente recurso) e anulou os dois actos administrativos praticados pelo Presidente do IH (ou seja “recorrente” no presente recurso).
b) Salvo o devido respeito, a recorrida não concorda com as pretensões deduzidas no presente recurso, entendendo que deve ser mantida a decisão do Tribunal a quo, com os seguintes dois fundamentos:
Do acto administrativo da recorrente que cancelou os elementos de registo de residência na barraca n.º 22-12-09-007-001 da recorrida
c) Nos termos do art.º 10.º, n.º 2, al. c) do DL n.º 6/93/M, de 15 de Fevereiro: “Artigo 10.º (Actualização do recenseamento de residentes) 2. São cancelados os elementos de registo daqueles que deixem de residir na edificação informal onde se encontravam recenseados, considerando-se para o efeito: c) A confirmação, por parte do IHM, de que possuam ou mantenham outra habitação em condições de utilização como residência permanente;”
d) Dito por outra palavra, a Administração só pode cancelar os elementos de registo de um residente em edificação informal, definido pelo referido diploma, quando o respectivo residente “possua ou mantenha” outro prédio em condições de utilização como residência permanente.
e) Do sentido literal da referida alínea, sobretudo do tempo verbal usado pelo legislador na versão portuguesa – “possuam ou mantenham” – resulta que, a al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M não se aplica à situação em que os residentes possuíam no passado outro prédio para fins habitacionais, mas só se aplica às situações em que os residentes actualmente possuem ou mantêm outro prédio com finalidade habitacional.
f) O aludido diploma visa definir um critério para confirmar se os residentes em edificações informais já deixem de residir nelas, na medida em que os respectivos indivíduos que satisfaçam o critério já não têm necessidade de residir em edificações informais, devendo a Administração cancelar o registo de residente deles nos termos legais; a respectiva norma não visa punir os residentes em edificações informais por terem possuído outro prédio por um curto tempo no passado.
g) Como entendeu o Tribunal a quo: (negrito e sublinhado nossos)
“…A questão-chave reside em saber se a respectiva situação de facto pode ou não pode ser integrada na previsão da referida norma, ou seja, se a decisão recorrida aplicou correctamente a lei.
Sobre esta questão, respeitamos opiniões diferentes, mas, como referiu a recorrente contenciosa, dispõe-se na respectiva norma que, o cancelamento dos elementos de registo daqueles que residam na edificação informal onde se encontravam recenseados pressupõe a confirmação de que os residentes “possuam ou mantenham outra habitação em condições de utilização como residência permanente”. Afigura-se-nos que, para um acto administrativo com conteúdo positivo, o momento decisivo para determinar se se verificar o seu pressuposto deve ser o da prática do acto. Nesse momento, o que interessa é a situação jurídica (se possui ou não o respectivo prédio) ou a situação de facto (se de facto mantém ou não outra habitação para satisfazer a necessidade de residência) em que se encontra a residente na barraca em relação a outra habitação em condições de utilização como residência, e não importa se a residente possuiu prédio no passado. Se assim não for, o legislador deveria, pelo menos, exprimir-se em termos claros – por exemplo, a expressão adoptada no n.º 8 do art.º 14.º da Lei da habitação económica, alterada pela Lei n.º 13/2020 – “o candidato e os elementos do seu agregado familiar não podem ser ou ter sido, nos 10 anos anteriores à data da apresentação da candidatura e até à data de celebração do contrato-promessa de compra e venda…”
h) Em todas as outras leis referentes à habitação pública da RAEM, o legislador tem disposições expressas semelhantes, ou seja, são explícitas as normas sobre se o interessado ter possuído imóvel com finalidade habitacional, os anos fixados para o efeito, e se o ter adquirido por motivo de sucessão, etc., incluindo a al. 1) do n.º 8 do art.º 7.º da Lei n.º 17/2003 - «Regime jurídica da habitação intermédia», e a al. 1) do n.º 1 do art.º 8.º da Lei n.º 17/2019 - «Regime jurídico da habitação social»:
Al. 1) do n.º 8 do art.º 7.º da Lei n.º 17/2003 - «Regime jurídica da habitação intermédia»
O candidato e os elementos do seu agregado familiar não podem, nos 10 anos anteriores à data da apresentação da candidatura e até à data de celebração do contrato-promessa de compra e venda, ser ou ter sido:
1) Promitentes-compradores, co-promitentes-compradores, proprietários ou comproprietários de prédio urbano ou de fracção autónoma com finalidade habitacional, ou de terreno na RAEM, independentemente da quota-parte que possuam, salvo quando a aquisição do imóvel se deu por motivo de sucessão;
Al. 1) do n.º 1 do art.º 8.º da Lei n.º 17/2019 - «Regime jurídico da habitação social»
Nenhum elemento do agregado familiar ou o seu cônjuge se pode candidatar, quando se encontrar em qualquer uma das seguintes situações:
1) Ser ou ter sido concessionário de terreno de domínio privado, proprietário, comproprietário, promitente-comprador ou co-promitente-comprador de prédio urbano, fracção autónoma ou terreno, na RAEM, independentemente da forma de aquisição ou da quota-parte que possua, nos cinco anos anteriores à data da apresentação do boletim de candidatura e até à data da assinatura do contrato de arrendamento com o IH;
i) No entanto, atenta a expressão utilizada na al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, não se dispõe que os residentes terem possuído ou mantido outra habitação em condições de utilização como residência permanente.
j) Ao abrigo do disposto no art.º 8.º, n.º 2 do Código Civil, a interpretação da lei tem de partir da letra da lei, e considerar como o pensamento legislativo o que tenha, na letra da lei, um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
k) E, logicamente, se o legislador tivesse a intenção de cancelar o recenseamento dos residentes em barracas por “terem possuído” habitação com finalidade habitacional, não teria utilizado a palavra “mantenham”.
l) Por isso, independentemente de se a recorrida ter transmitido ou não outro prédio com finalidade habitacional após a instauração do procedimento de audiência, não será afectado ou alterado o facto de ela não possuir qualquer outra habitação no momento da prática do acto recorrido.
m) A par disso, a recorrente também tem reiterado que, a interpretação extensiva da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M visa determinar a desnecessidade de residir em barracas daqueles que já tenham suficiente capacidade económica e possuam bem imóvel para fins habitacionais.
n) Com base no entendimento da recorrente, inferimos o seguinte: se, para resolver, de modo mais justo, equitativo e razoável, o problema de habitação dos residentes em barracas e alcançar o objectivo final de eliminação de edificações informais, deve ser alargada a aplicabilidade do respectivo preceito – aos residentes que, embora não possuam qualquer prédio em condições de utilização como residência, têm obviamente capacidade económica para o adquirir?
o) É certo que, atento o preâmbulo do DL n.º 6/93/M, este diploma tem por objectivo a eliminação das edificações informais, conferindo, ao mesmo tempo, aos respectivos utilizadores e seus agregados familiares que não tenham suficiente capacidade económica para recorrer ao mercado habitacional o acesso a um alojamento condigno.
p) Mas, no mesmo Decreto-Lei não se encontra qualquer norma que versa sobre a situação económica dos residentes em barracas. A recorrida concorda com o entendimento perspicaz do Tribunal a quo, cuja interpretação está conforme ao disposto no art.º 8.º do Código Civil: (negrito e sublinhado nossos)
“…é também necessário atender às necessidades fundamentais de habitação dos residentes nas barracas, razão pela qual o respectivo preceito legal apenas conserva o direito de habitação dos utilizadores de barracas inventariadas que, juridicamente, não possuam qualquer prédio (ou seja, “possuam” outra habitação em condições de utilização como residência permanente), e de facto não sejam titulares de prédios com finalidade habitacional (ou seja, “mantenham” outra habitação em condições de utilização como residência permanente). Daí que, o diploma em causa já exclui, em grande dimensão, a qualidade de residir em edificações informais de um número relativamente grande de utilizadores. Não há necessidade de alargar o âmbito de aplicação do referido preceito, até estendê-lo a outras situações não abrangidas mas reveladoras da capacidade económica do utilizador – por exemplo, embora não tenha qualquer prédio em condições de utilização como residência, tem, obviamente capacidade económica para o adquirir.
Por isso, a circunstância de possuir um outro prédio, mencionada na al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, limita-se à titularidade até ao momento da prática do acto de cancelamento do registo, sendo isso uma interpretação fiel do sentido literal do texto, e não contrária ao objectivo legislativo.”
q) Daí que, o sentido do texto da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M é o literal, não devendo ser extensivamente interpretado.
r) Por outro lado, a Lei n.º 17/2019 - «Regime jurídica da habitação social» também visa resolver os encargos habitacionais dos residentes de todas as classes sociais, e no seu art.º 23.º, o legislador prevê expressamente a situação em que a capacidade económica do arrendatário ultrapassa o limite máximo fixado por despacho do Chefe do Executivo.
s) Semelhantes são a Lei n.º 10/2011 - «Lei da habitação económica», alterada pela Lei n.º 13/2020, e a Lei n.º 17/2023 - «Regime jurídica da habitação intermédia», integrantes da política de habitação da RAEM, cuja intenção legislativa também consiste em resolver os problemas habitacionais dos residentes que realmente tenham a necessidade correspondente.
t) Mas a lei estipula expressamente que, para avaliar a situação económica do candidato e do seu agregado familiar, só é calculada a média do rendimento obtido nos 12 meses anteriores à data da publicação do anúncio no Boletim Oficial, sem considerar se o candidato terá capacidade económica para adquirir prédio no futuro, e muito menos, se o candidato e o seu agregado familiar podem resolver, por si próprios, o problema habitacional.
u) Por isso, partindo duma interpretação sistemática de todos os regimes jurídicos que integram a política da habitação, e duma interpretação literal do texto, o que interessa à al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M não é “se o residente já tem capacidade económica para possuir prédio”.
v) Em fim, a recorrida quer apontar que, ao abrigo do disposto no art.º 4.º, n.º 1, al. 1) da Lei n.º 1/1999 - «Lei de Reunificação», o preâmbulo da legislação previamente vigente em Macau não é ressalvado, não fazendo parte integrante da legislação da RAEM.
Do acto administrativo que não admitiu o pedido de fazer constar do inventário da barraca C e D
w) Salvo o devido respeito, a recorrida não concorda com o entendimento consignado pela recorrente nas suas alegações, porque a recorrente confundiu o procedimento administrativo de audiência com o acto administrativo de decidir.
x) É de notar que, o princípio da participação – um dos princípios gerais que vigoram no procedimento administrativo, exige que os órgãos da Administração Pública devam assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito, designadamente através da respectiva audiência, nos termos do CPA.
y) Para levar a efeito o referido princípio, os artigos 93.º a 98.º do CPA estabelecem o regime de audiência, cujo objectivo já foi explicitado de forma relativamente aprofundada quer pela doutrina, quer pela jurisprudência de Macau1, ou, em suma, permitir ao interessado participar no respectivo procedimento, pronunciar-se para efeitos de referência da Administração, e evitar que a Administração profira uma decisão inesperada.
z) E nos termos do art.º 110.º do CPA, consideram-se actos administrativos as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta. Ao mesmo tempo, o art.º 11.º do CPA dispõe que os órgãos administrativos têm o dever de decisão.
aa) Daí que, a instauração do procedimento de audiência não representa uma decisão tomada pela Administração, e só produz efeitos jurídicos em relação ao interessado depois de ser praticado o acto administrativo pela Administração.
bb) Embora tenha sido instaurado contra a recorrida o procedimento de audiência escrita mediante o despacho de 18 de Junho de 2021, proferido pela entidade recorrida na Proposta n.º 0669/DHP/DFHP/2021, a recorrida ainda era residente legalmente recenseada na barraca antes do acto administrativo em causa, ou seja, antes da decisão final tomada pela recorrente no dia 21 de Janeiro de 2022.
cc) Tal como entendeu o digno Magistrado do MP no seu parecer: (negrito e sublinhado nossos)
“no que concerne à eficácia do acto administrativo, vigora o princípio de não retroactividade, que visa assegurar os princípios da legalidade e da segurança jurídica. Com base nisso, inclinamos a entender que, o disposto na al. c) do n.º 1 do art.º 118.º do CPA limita-se apenas aos actos administrativos a que a lei atribui expressamente eficácia retroactiva.
Por isso, o acto recorrido só produz efeito futuro, ou seja, a decisão que cancelou os elementos de registo da recorrente e fez com que ela perdesse a qualidade de utilizador da barraca só começou a produzir efeitos a partir do momento em que foi tomada. Dito por outra palavra, entre o cancelamento dos elementos de registo da recorrente contenciosa, e o tratamento do seu pedido de acrescentar os dois filhos ao agregado familiar recenseado, não há essencialmente uma relação de prejudicialidade ou de dependência, não tendo a entidade recorrida razão justificada para recusar o tratamento do respectivo pedido da recorrente referente aos dois filhos. A respectiva decisão violou o princípio da decisão previsto pelo art.º 10.º, n.º 4 do DL n.º 6/93/M e pelo art.º 11.º, n.º 1 do CPA.”
dd) E entendeu o Tribunal a quo que: (negrito e sublinhado nossos)
“A este propósito, apresenta-se acertada a opinião do MP: entre o 2º acto recorrido e o 1º acto recorrido não existe a relação de dependência.
…
Durante a pendência do procedimento do 1º acto recorrido, a recorrente contenciosa não deixava de ser residente em barraca recenseada, e estava qualificada, como residente recenseada, para comunicar os factos pessoais importantes ao IH, com a expectativa de completar o registo da alteração da composição do agregado familiar.
De qualquer modo, o registo da alteração da composição do agregado familiar não precisa de aguardar a conclusão do procedimento de cancelamento do registo, estando o IH em condições de decidir sobre a matéria requerida. Pelo que, o 2º acto recorrido interpretou erradamente o n.º 4 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, e deve ser anulado.”
ee) Na ausência da relação de prejudicialidade ou de dependência entre os dois actos administrativos, reiteramos que, antes da decisão de cancelamento dos elementos de registo da recorrida, tomada pela recorrente, a recorrida ainda era residente legalmente recenseada na barraca em causa.
ff) Ao abrigo do disposto no art.º 10.º, n.º 4 do DL n.º 6/93/M, quando ocorra facto de “nascimento” de “residentes recenseados”, já constitui facto aceite para o aumento da composição do agregado familiar, e a lei apenas atribui aos residentes o encargo de apresentar à Administração as respectivas certidões comprovativas.
gg) A par disso, entendeu a sentença recorrida que: (negrito e sublinhado nossos)
“Nos termos do art.º 10.º, n.º 4 do DL n.º 6/93/M, “O casamento de residentes recenseados, o nascimento ou a adopção são factos aceites para a alteração da composição do agregado familiar, sendo averbados no recenseamento, após apresentação junto do IH das respectivas certidões comprovativas.” Esta norma permite expressamente aos residentes recenseados comunicar os factos de casamento, nascimento ou adopção, após junção das certidões comprovativas, ao IH para registar a alteração da composição do agregado familiar.”
hh) No dia 15 de Outubro de 2018, a recorrida, em plena observância do referido disposto legal, apresentou ao IH, pela primeira vez, os bilhetes de identidade dos dois filhos e outros documentos, para comprovar o facto de nascimento e solicitar o registo.
ii) Importa salientar que, a recorrida requereu, pela primeira vez, que fossem acrescentados os nomes dos seus filhos ao recenseamento em 15 de Outubro de 2018, data em que o IH ainda não instaurou qualquer procedimento de exclusão, e a recorrida ainda não celebrou com o cônjuge a escritura de partilha.
jj) E o IH nunca tinha qualquer impresso próprio para o recenseamento de novos residentes em barracas, e segundo a norma jurídica acima referida, quando ocorra o facto de nascimento, basta que se apresente o pedido.
kk) E das fls. 78 dos autos consta um documento que serviu de fundamento para o primeiro registo da recorrida e do seu agregado familiar como residentes na barraca envolvida, no qual não se vê o nome “Boletim de registo”, mas sim o “Questionário para famílias residentes em habitação informal”, e que tinha a mesma natureza do questionário preenchido na operação de recenseamento realizada no ano de 2018.
ll) Mesmo que se entenda que durante a operação de recenseamento de 2018, não foram registados os dois filhos C e D na lista dos elementos do agregado familiar, a recorrida já requereu, no dia 6 de Julho de 2021, ao IH a actualização do recenseamento de residentes, devendo considerar-se que os dois filhos foram acrescentados ao inventário da barraca.
mm) Após ter sintetizado o texto completo do DL n.º 6/93/M, não se encontra a menção de que o indivíduo contra quem tenha sido instaurado procedimento de audiência para a exclusão perde a legitimidade ou o direito de requerer a actualização do recenseamento de residentes.
nn) Pelo exposto, tendo em consideração que, a recorrida ainda era residente legalmente recenseada na barraca antes do acto administrativo praticado pela recorrente, que decidiu não admitir o pedido da recorrida de fazer constar do recenseamento de residentes da barraca os filhos C e D, e conforme o disposto no n.º 4 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, quando ocorra facto de “nascimento” de “residentes recenseados”, já constitui facto aceite para o aumento da composição do agregado familiar.
Foram os autos ao Ilustre Magistrado do Ministério Público o qual emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se a decisão recorrida.
Foram colhidos os vistos.
Cumpre, assim, apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
a) Dos Factos
Na decisão recorrida foi dada por assente a seguinte factualidade:
- De acordo com o inventário das barracas de 1991, realizado pelo IH, a recorrente contenciosa A era membro do agregado familiar que residiu na barraca n.º 22-12-09-007-001, situada na XXX, sendo também elementos do agregado o pai E, a mãe F e o irmão mais novo B (vide as fls. 74 a 77 do P.A.).
- Nos anos 2004 e 2005, nasceram sucessivamente os dois filhos da recorrente contenciosa, C e D (vide as fls. 41 a 43 dos autos)
- Em 19 de Março de 2015, a mãe da recorrente contenciosa, F, enviou carta à entidade recorrida consultando assuntos relativos à sucessão da herança, por o marido E ter falecido no dia 23 de Novembro de 2014 (vide as fls. 70 a 71 do P.A.).
- Por razão da morte do membro do agregado familiar, E, em 23 de Novembro de 2014, a entidade recorrida cancelou os elementos de registo dele no dia 23 de Abril de 2015, nos termos do art.º 10.º, n.º 2 do DL n.º 6/93/M (vide as fls. 66 a 68 do P.A.).
- Em 25 de Março de 2019, a recorrente contenciosa adquiriu, mediante partilha do património por convenção pós-nupcial, o prédio privado sito na Taipa, XXX, e procedeu ao registo, sendo a aquisição inscrita sob o n.º XXX (vide as fls. 24 e v do P.A.).
- Depois, no dia 30 de Junho de 2021, através da escritura pública celebrada, a recorrente contenciosa alienou o referido prédio ao seu cônjuge (vide as fls. 37 a 39 e v dos autos).
- Em 18 de Junho de 2021, o IH pretendeu cancelar os elementos de registo da recorrente contenciosa e de B na barraca n.º 22-12-09-007-001 conforme o disposto na al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, e procedeu à audiência escrita para o efeito (vide as fls. 49 a 50 do P.A.).
- No mesmo dia, a entidade recorrida afixou o edital no endereço acima referido, notificando-os para apresentar contestação, por escrito, no prazo de 10 dias a contar da data da notificação (vide as fls. 51 e v do P. A.).
- Em 1 de Julho de 2021, a recorrente contenciosa e B apresentaram à entidade recorrida a explicação escrita (vide as fls. 27 a 30 do P.A.).
- Em 6 de Julho de 2021, a recorrente contenciosa apresentou à entidade recorrida o requerimento pedindo que os seus filhos, C e D, fossem registados como residentes na supracitada barraca (vide as fls. 16 do P.A.).
- Em 21 de Janeiro de 2022, a entidade recorrida proferiu o despacho de “concordo” na Proposta n.º 0074/DHP/DFHP/2022, apontando que, segundo os dados da Direcção dos Serviços de Finanças e da Conservatória do Registo Predial, tanto a recorrente contenciosa como B já registaram a compra de prédios privados, pelo que decidiu, ao abrigo do disposto no art.º 10.º, n.º 2, al. c) do DL n.º 6/93/M, cancelar os elementos de registo da recorrente contenciosa e de B na barraca n.º 22-12-09-007-001. Ao mesmo tempo, por ainda estar em curso o procedimento de exclusão, não é de considerar o pedido de fazer constar do inventário da referida barraca C e D, apresentado pela recorrente contenciosa (vide as fls. 1 a 2 e v do P. A.).
- No mesmo dia, a entidade recorrida afixou edital no endereço acima referido, comunicando a sua decisão à recorrente contenciosa e B (vide as fls. 5 e v do P.A.).
- Em 25 de Janeiro de 2022, através dos ofícios n.º 2201190030/DFHP e n.º 2201190032/DFHP, a entidade recorrida notificou a referida decisão à recorrente contenciosa e B (vide as fls. 3 a 4 e v do P. A.).
- Em 23 de Fevereiro de 2022, a recorrente interpôs o presente recurso contencioso da supracitada decisão.
b) Do Direito
É do seguinte teor a decisão recorrida:
«In casu, o acto recorrido foi praticado conforme o disposto no art.º 10.º, n.º 2 do DL n.º 6/93/M - «Estabelece medidas conducentes à contenção e erradicação das edificações informais, ou barracas», de 15 de Fevereiro.
Como se refere no art.º 1.º do mesmo DL, este estabeleceu as medidas conducentes à contenção e erradicação das edificações informais, ou barracas, existentes no Território na altura. O cadastro das edificações informais e o respectivo recenseamento constituem trabalhos preparatórios necessários para a implementação das medidas. Nos termos do art.º 5.º do mesmo DL, qualquer edificação informal não licenciada, construída após a entrada em vigor do diploma, será demolida.
O cadastro das edificações informais é constituído pelo levantamento e registo das informações de identificação, incluindo localização no terreno, dimensões aproximadas e configuração externa, fotografias mostrando a configuração exterior da edificação, descrição genérica das técnicas construtivas utilizadas e dos materiais empregues, finalidade de utilização, identidade e residência dos possuidores e utilizadores, composição do agregado familiar residente e indicação do respectivo representante, referências aos antecedentes da edificação, nomeadamente, data de construção, justificação da construção, eventuais autorizações e licenças ou compromissos assumidos pela Administração (vide o art.º 7.º, n.º 1). Cabe ao IH realizar o recenseamento daqueles que tenham sido identificados como residindo, a título permanente, em edificação informal inventariada, por zonas e mediante o registo dos elementos deles (vide o art.º 9.º, n.º 1 e n.º 2). Depois, compete ao IH manter actualizado o recenseamento dos residentes em edificações informais e proceder ao averbamento no recenseamento das alterações. Salvo no casos de alteração da composição do agregado familiar, são cancelados os elementos de registo daqueles que, segundo reconhece o IH, deixem de residir na edificação informal onde se encontravam recenseados (vide os art.ºs 10.º e 11.º).
Embora não seja explicitada nos artigos, a intenção legislativa não deixa de ser evidente – o cadastro das edificações informais e o recenseamento, realizados pela Administração, têm como objectivo conter a proliferação de edificações informais e controlá-las com eficácia, para que nas eventuais operações de desocupação ou demolição subsequentes, a Administração tome em consideração os dados registados, para fundamentação das operações a adoptar (vide, por exemplo, o art.º 23.º). Não são considerados para efeito de realojamento ou qualquer outro procedimento a adoptar pelo IH os residentes cujo registo do recenseamento tenha sido cancelado (vide a al. b) do n.º 1 do art.º 27.º).
No caso dos autos, com base nos dados registados no inventário das barracas de 1991, o IH apurou que a recorrente contenciosa e o seu irmão mais novo B, originalmente registados como membros do agregado familiar residente na respectiva edificação informal, já compraram e possuíam prédios privados, razão pela qual considerou que eles deixaram de residir na referida edificação, e em consequência, cancelou os elementos de registo deles, nos termos do art.º 10.º, n.º 2, al. c) do DL n.º 6/93/M. É este o primeiro acto administrativo contenciosamente recorrido.
Importa notar que, embora o acto recorrido cancelasse também o registo de residente na edificação informal envolvida de B, irmão mais novo da recorrente contenciosa, esta limitou-se, concreta e expressamente na petição de recurso, a impugnar a decisão na parte relativa ao cancelamento do seu registo. Por isso, cumpre apreciar apenas a legalidade desta parte da decisão administrativa.
Segundo a pretensão da recorrente contenciosa, a decisão recorrida incorreu em erro nos pressupostos de facto, porque, ao contrário do que nela se reconheceu, a recorrente não comprou o prédio privado no dia 20 de Março de 2019, sendo que tal prédio só foi transferido para o nome da recorrente por motivo da modificação do regime de bens do casamento, mediante acordo de partilha do património entre cônjuges. Posteriormente, no dia 30 de Junho de 2021, através da celebração de escritura de compra e venda, o referido prédio foi alienado de novo ao cônjuge da recorrente. Em simultâneo, o acto recorrido aplicou erradamente a lei, na medida em que a menção de “possuam ou mantenham outro prédio destinado à habitação” na al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, não abrange a situação em que, aquando da tomada da decisão recorrida, a residente já tinha transferido para outrem o prédio que possuía.
Do ponto de vista da entidade recorrida, é um facto inquestionável que a recorrente contenciosa, na qualidade de residente na edificação informal inventariada, possuiu um outro prédio destinado à habitação, cuja disposição posterior não tem sentido nenhum, e não impede a verificação do pressuposto de facto necessário para tomar a decisão.
Em primeiro lugar, o certo é que o respectivo prédio privado não foi comprado pela recorrente em 20 de Março de 2019, mas sim adquirido em 25 de Março mediante acordo pós-nupcial de partilha dos bens, no entanto, a descrição inexacta desse facto no acto recorrido não prejudica a verificação do seu pressuposto, ou seja, a recorrente adquiriu, sem dúvida, o respectivo prédio privado. A par disso, a entidade recorrida não ignorou o facto de que, posteriormente, no dia 30 de Junho de 2021, a recorrente alienou de novo o mesmo prédio através da escritura de compra e venda, só que o considerou insuficiente para ilidir o facto de a recorrente possuir prédio privado no período compreendido entre 20 de Março de 2019 e 30 de Junho de 2021. De qualquer modo, está satisfeito o pressuposto previsto na al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M.
Obviamente, in casu, não há desconformidade entre a realidade e o facto do qual partiu o órgão administrativo para praticar o respectivo acto administrativo, não se verificando, assim, o vício de erro nos pressupostos de facto (a propósito do erro nos pressupostos de facto, vide, por exemplo, o Acórdão do TUI, de 23 de Julho de 2021, no Processo n.º 85/2021). A questão-chave reside em saber se a respectiva situação de facto pode ou não pode ser integrada na previsão da referida norma, ou seja, se a decisão recorrida aplicou correctamente a lei.
Sobre esta questão, respeitamos opiniões diferentes, mas, como referiu a recorrente contenciosa, dispõe-se na respectiva norma que, o cancelamento dos elementos de registo daqueles que residam na edificação informal onde se encontravam recenseados pressupõe a confirmação de que os residentes “possuam ou mantenham outra habitação em condições de utilização como residência permanente”. Afigura-se-nos que, para um acto administrativo com conteúdo positivo, o momento decisivo para determinar se se verificar o seu pressuposto deve ser o da prática do acto. Nesse momento, o que interessa é a situação jurídica (se possui ou não o respectivo prédio) ou a situação de facto (se de facto mantém ou não outra habitação para satisfazer a necessidade de residência) em que se encontra a residente na barraca em relação a outra habitação em condições de utilização como residência, e não importa se a residente possuiu prédio no passado. Se assim não for, o legislador deveria, pelo menos, exprimir-se em termos claros – por exemplo, a expressão adoptada no n.º 8 do art.º 14.º da Lei da habitação económica, alterada pela Lei n.º 13/2020 – “o candidato e os elementos do seu agregado familiar não podem ser ou ter sido, nos 10 anos anteriores à data da apresentação da candidatura e até à data de celebração do contrato-promessa de compra e venda…” (sublinhado nosso).
Por outro lado, como apontou a entidade recorrida, o legislador estabeleceu o regime de supervisão e reforçou o cadastro e recenseamento das edificações informais, com o objectivo de reprimir a sua proliferação. Mas, ao mesmo tempo, é também necessário atender às necessidades fundamentais de habitação dos residentes nas barracas, razão pela qual o respectivo preceito legal apenas conserva o direito de habitação dos utilizadores de barracas inventariadas que, juridicamente, não possuam qualquer prédio (ou seja, “possuam” outra habitação em condições de utilização como residência permanente), e de facto não sejam titulares de prédios com finalidade habitacional (ou seja, “mantenham” outra habitação em condições de utilização como residência permanente). Daí que, o diploma em causa já exclui, em grande dimensão, a qualidade de residir em edificações informais de um número relativamente grande de utilizadores. Não há necessidade de alargar o âmbito de aplicação do referido preceito, até estendê-lo a outras situações não abrangidas mas reveladoras da capacidade económica do utilizador – por exemplo, embora não tenha qualquer prédio em condições de utilização como residência, tem, obviamente capacidade económica para o adquirir.
Por isso, a circunstância de possuir um outro prédio, mencionada na al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, limita-se à titularidade até ao momento da prática do acto de cancelamento do registo, sendo isso uma interpretação fiel do sentido literal do texto, e não contrária ao objectivo legislativo.
Na verdade, como se indicou no parecer do MP, se se considerar que o utilizador da barraca já resolveu, por si próprio, o problema de habitação, não será necessária a manutenção do seu registo original na barraca. Seguindo esse entendimento, deve a decisão da Administração não só ponderar se a interessada tem, juridicamente, o direito de propriedade sobre o respectivo prédio, como também verificar se está satisfeita a última parte da norma – se de facto ter mantido outro prédio para residir, ainda que actualmente não o possua. Mas, como atrás já se referiu, com base na nossa interpretação do acto administrativo, apesar de a entidade recorrida ter citado como fundamento, de forma indiscriminada, o texto integral da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do respectivo DL – que os residentes possuam ou mantenham outra habitação em condições de utilização como residência permanente, na verdade, da fundamentação do seu acto decorre que o mesmo assentou apenas na primeira parte da respectiva alínea, quer dizer, foi cancelado o registo da interessada apenas com base na descoberta do outro prédio possuído por ela, sem considerar se a interessada realmente mantinha outro prédio para satisfazer a necessidade de residência, pelo que não efectuou qualquer investigação nesse sentido para apurar o respectivo facto.
Como se sabe, no recurso contencioso, o tribunal só pode apreciar a legalidade do acto da Administração com base nos fundamentos de facto e de direito da decisão, expostos na fundamentação do acto administrativo. Em regra, não é permitida a fundamentação sucessiva ou a posteriori, nem é viável qualquer modificação ou suprimento através da acção.
Aqui chegados, afigura-se-nos que, devido à errada interpretação do âmbito de aplicação da respectiva norma jurídica, o 1º acto da entidade recorrida padeceu do vício de ilegalidade, e deve ser anulado.
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Mas é obviamente improcedente o vício de violação dos princípios da proporcionalidade e da boa fé, imputado pela recorrente contenciosa ao acto recorrido. Segundo o que alegou a recorrente na petição de recurso, ela só concluiu as formalidades legais da aquisição do prédio depois de o funcionário do IH ter-lhe dito que o seu direito sobre a barraca não seria afectado após a transferência de nome do prédio, e o actual cancelamento do registo de residente em barracas viola a confiança depositada pela recorrente no parecer do IH.
Primeiro, como vimos no parecer do MP, estando preenchido o respectivo pressuposto legal, a Administração não tem outra alternativa senão cancelar o registo no inventário. Quando a Administração esteja vinculada a praticar determinada actividade administrativa, não são aplicáveis os vícios próprios de actos discricionários, como a violação de princípios gerais do Direito Administrativo (vide, por exemplo, o Acórdão do TUI, de 15 de Março de 2023, no Processo n.º 107/2022), incluindo o da boa fé.
Segundo, ao abrigo do disposto no art.º 9.º, n.º 2 do CPA, a Administração Pública é responsável pelas informações prestadas por escrito aos particulares, mas o parecer não escrito, do funcionário do IH, não tem qualquer força vinculativa, e não basta para constituir a base da confiança da interessada.
Improcede, obviamente, o recurso nesta parte.
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O 2º acto atacado no recurso contencioso consiste na desconsideração do pedido da recorrente por parte da entidade recorrida, que decidiu recusar o registo dos dois filhos da recorrente, C e D, como residentes na barraca envolvida.
A recorrente imputou à referida decisão a violação de lei, entendendo que o seu pedido foi apresentado antes do procedimento administrativo de cancelamento do registo de residente, e conforme o disposto no n.º 4 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, deveria ser considerado como facto aceite para acrescentar novos membros do agregado familiar e deferido.
Em bom rigor, a entidade recorrida não tomou uma decisão substancial sobre o aludido pedido da recorrente. Conforme indicado no despacho constante das fls. 117v a 118 dos autos, da fundamentação do seu acto resulta que – “Não se admite o pedido da recorrente contenciosa de fazer constar do inventário da supracitada barraca os seus filhos C e D, porque perante o facto de A possuir prédio privado, o IH já instaurou procedimento de audiência para o cancelamento dos elementos de registo, e por ainda estar em curso o procedimento de exclusão, não é de considerar o supracitado pedido”. Dito por outra palavra, a entidade recorrida já reconheceu a existência da relação de dependência entre os dois actos, pelo que absteve-se de decidir sobre o respectivo pedido.
A este propósito, apresenta-se acertada a opinião do MP: entre o 2º acto recorrido e o 1º acto recorrido não existe a relação de dependência.
Nos termos do art.º 10.º, n.º 4 do DL n.º 6/93/M, “O casamento de residentes recenseados, o nascimento ou a adopção são factos aceites para a alteração da composição do agregado familiar, sendo averbados no recenseamento, após apresentação junto do IH das respectivas certidões comprovativas.” Esta norma permite expressamente aos residentes recenseados comunicar os factos de casamento, nascimento ou adopção, após junção das certidões comprovativas, ao IH para registar a alteração da composição do agregado familiar.
Durante a pendência do procedimento do 1º acto recorrido, a recorrente contenciosa não deixava de ser residente em barraca recenseada, e estava qualificada, como residente recenseada, para comunicar os factos pessoais importantes ao IH, com a expectativa de completar o registo da alteração da composição do agregado familiar.
De qualquer modo, o registo da alteração da composição do agregado familiar não precisa de aguardar a conclusão do procedimento de cancelamento do registo, estando o IH em condições de decidir sobre a matéria requerida. Pelo que, o 2º acto recorrido interpretou erradamente o n.º 4 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, e deve ser anulado.».
Foi do seguinte teor o Douto Parecer do Ministério Público:
«Inconformado com a decisão que anulou “os dois actos recorridos”, tomada pelo MM.º Juiz do Tribunal Administrativo na sua sentença constante das fls. 160-167v dos autos, vem o Presidente do Instituto de Habitação interpor o presente recurso, imputando à sentença recorrida a errada interpretação e aplicação do art.º 10.º, n.º 2, al. c) e n.º 4 do DL n.º 6/93/M.
Da sentença recorrida resulta inequivocamente que “os dois actos recorridos”, anulados pelo Juiz do TA, foram praticados no despacho de 21 de Janeiro de 2022, exarado pelo Presidente do IH na Proposta n.º 0074/DHP/DFHP/2022: o 1º é o cancelamento do “registo de residente” da recorrente contenciosa na barraca n.º 22-12-09-007-001; e o 2º é o indeferimento do pedido dela de fazer constar do inventário da referida barraca C e D (filhos da recorrente contenciosa).
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1. Da anulação do 1º acto recorrido
Segundo a sentença recorrida, o Juiz do TA anulou o 1º acto recorrido por entender que o Presidente do IH interpretou erradamente o âmbito de aplicação da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, dizendo que: Na verdade, como se indicou no parecer do MP, se se considerar que o utilizador da barraca já resolveu, por si próprio, o problema de habitação, não será necessária a manutenção do seu registo original na barraca. Seguindo esse entendimento, deve a decisão da Administração não só ponderar se a interessada tem, juridicamente, o direito de propriedade sobre o respectivo prédio, como também verificar se está satisfeita a última parte da norma – se de facto ter mantido outro prédio para residir, ainda que actualmente não o possua. Mas, como atrás já se referiu, com base na nossa interpretação do acto administrativo, apesar de a entidade recorrida ter citado como fundamento, de forma indiscriminada, o texto integral da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do respectivo DL – que os residentes possuam ou mantenham outra habitação em condições de utilização como residência permanente, na verdade, da fundamentação do seu acto decorre que o mesmo assentou apenas na primeira parte da respectiva alínea, quer dizer, foi cancelado o registo da interessada apenas com base na descoberta do outro prédio possuído por ela, sem considerar se a interessada realmente mantinha outro prédio para satisfazer a necessidade de residência, pelo que não efectuou qualquer investigação nesse sentido para apurar o respectivo facto.
1.1. O Presidente do IH não concordou com a posição assumida pelo Juiz do TA, pelo que é de apurar o alcance da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, na qual se dispõe que: São cancelados os elementos de registo daqueles que deixem de residir na edificação informal onde se encontravam recenseados, considerando-se para o efeito: … c) A confirmação, por parte do IHM, de que possuam ou mantenham outra habitação em condições de utilização como residência permanente …
É óbvio que o legislador fixou na al. c) dois requisitos: por um lado, os residentes na barraca possuíam ou mantinham (na altura) uma outra habitação (para além da barraca); e por outro, a habitação possuída ou mantida podia ser utilizada como residência permanente. É de salientar que, esses dois requisitos são não só indispensáveis, mas também cumulativos – dito por outra palavra, são de verificação cumulativa, e não pode faltar qualquer um deles.
Quanto ao termo de “confirmação” utilizado na al. c), acolhemos o seguinte entendimento do digno Magistrado: não pode ser interpretado como “reiterar” e “manter” a decisão anterior, e aqui, o termo comporta, com precisão, o sentido de “constatar”, ou seja “constatar” se (no caso concreto) estão cumulativamente verificados os dois requisitos atrás mencionados. Isso implica, de forma evidente e necessária, que: sobre o IH recaem o ónus de prova, bem como os respectivos deveres de investigação e de obtenção de provas, para evitar o erro nos pressupostos de facto.
1.2. Tal como referiu o Juiz do TA, a doutrina e a jurisprudência no domínio do Direito Administrativo têm entendido que: o fundamento de acto administrativo expresso tem como limite a base factual e as razões de direito manifestadas na “fundamentação do próprio acto”; o que não houver sido expresso ou manifestado na fundamentação – mesmo que se mostrasse ter sido objecto de ponderação do autor do acto – não constitui fundamento do acto administrativo. (Cfr. por exemplo, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, J. Pacheco de Amorim: Código do Procedimento Administrativo Comentado, Almedina, 2ª edição, p. 600-601)
No caso dos autos, o Presidente do IH apenas proferiu o despacho de “Concordo” na Proposta n.º 0074/DHP/DFHP/2022 em 21 de Janeiro de 2022 (vide as fls. 25 dos autos). Ao abrigo do disposto no art.º 115.º, n.º 1 do CPA, a fundamentação do referido despacho é feita por remissão, pelo que a Proposta n.º 0074/DHP/DFHP/2022 constitui parte integrante do despacho.
Da Proposta n.º 0074/DHP/DFHP/2022 resulta os seguintes factos directamente relacionados com a recorrente contenciosa (vide as fls. 25v dos autos): segundo os dados da Direcção dos Serviços de Finanças e da Conservatória do Registo Predial, no dia 20 de Março de 2019, a recorrente contenciosa procedeu ao registo da compra do prédio privado sito na Taipa, XXX (descrita na CRP sob o n.º XXX).
Não se vê qualquer investigação efectuada pelo IH para apurar se a fracção comprada por ela, sita na Taipa, XXX, estava “em condições de utilização como residência permanente”. A lógica seguida pelo IH é a seguinte (sublinhado nosso): 10. …, o que A e B alegaram não pode ilidir o referido facto apurado de eles possuírem prédios privados, e eles não apresentaram demais esclarecimentos ou qualquer documento comprovativo de não residirem nos prédios possuídos por eles, razão pela qual não deve ser admitida a explicação escrita apresentada, e com base nos fundamentos de direito e análise acima expostos, devem ser cancelados os elementos de registo na referida barraca de A e B. Não se admite o pedido do A de fazer constar do inventário da supracitada barraca os seus filhos C e D, porque perante o facto de A possuir prédio privado, o IH já instaurou procedimento de audiência para o cancelamento dos elementos de registo, e por ainda estar em curso o procedimento de exclusão, não é de considerar o supracitado pedido.
Pela análise acima exposta, inclinamos a entender que: o IH não constatou se o prédio comprado pela recorrente contenciosa (fracção sita na Taipa, XXX) podia ser utilizado como residência permanente, e interpretou erradamente o respectivo ónus de prova; não merece censura a decisão do Juiz a quo, que reconheceu a errada interpretação, pelo Presidente do IH, do âmbito de aplicação da al. c) do n.º 2 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M, e anulou o 1º acto recorrido, improcedendo, assim, o recurso do Presidente do IH nesta parte.
Com uma interpretação acertada dos fundamentos que levaram o Juiz a quo a anular o 1º acto recorrido, pode-se confirmar que: não obstante a improcedência do recurso interposto pelo Presidente do IH, isso não significa que nunca pode ser cancelado o registo de A (recorrente contenciosa); se o IH (no futuro) vier a constatar que o prédio comprado por ela (fracção sita na Taipa, XXX) pode ser utilizado como residência permanente, não só pode, mas também tem de cancelar o “registo de residente” dela na barraca n.º 22-12-09-007-001.
*
2. Da anulação do 2º acto recorrido
Indicou-se no ponto 10 da Proposta n.º 0074/DHP/DFHP/2022 que: Não se admite o pedido do A de fazer constar do inventário da supracitada barraca os seus filhos C e D, porque perante o facto de A possuir prédio privado, o IH já instaurou procedimento de audiência para o cancelamento dos elementos de registo, e por ainda estar em curso o procedimento de exclusão, não é de considerar o supracitado pedido.
Nos termos do art.º 10.º, n.º 4 do DL n.º 6/93/M: O casamento de residentes recenseados, o nascimento ou a adopção são factos aceites para a alteração da composição do agregado familiar, sendo averbados no recenseamento, após apresentação junto do IHM das respectivas certidões comprovativas. Obviamente, a inscrição de descendentes naturais ou cíveis pressupõe que o pai, a mãe, os pais ou o adoptante sejam residentes já recenseados (na barraca) – eles (o pai, a mãe, os pais, o adoptante) tenham de apresentar o pedido e entregar prova. Dito por outra palavra, o registo de descendentes depende da qualidade de “residente na barraca” dos (respectivos) ascendentes já recenseados.
Seguindo essa linha de raciocínio, inclinamos a entender que: o cancelamento do registo de A (recorrente contenciosa) constitui motivo suficiente para não admitir ou indeferir o supracitado pedido formulado por ela; e conforme a razão, a pendência do procedimento administrativo de cancelamento do seu registo de residente na barraca também pode ser justa causa para adiar a consideração do seu pedido; pelo que não se apresenta correcto o argumento do Juiz a quo de “entre o 2º acto recorrido e o 1º acto recorrido não existe a relação de dependência”.
Atento o texto do n.º 4, entendemos que: trata-se de uma norma imperativa, que não confere (ao Presidente do IH) poder discricionário ou margem de juízo; dito por outra palavra, quando os residentes na barraca apresentem o pedido e as certidões comprovativas de nascimento ou adopção, o Presidente do IH obriga-se a admitir o pedido e autorizar a inscrição.
Nos termos acima analisados e voltando ao caso dos autos, afigura-se-nos que: por a anulação do 1º acto recorrido – cancelamento do registo de A (na qualidade de “residente na barraca”) – ter eficácia retroactiva, ela ainda tinha a qualidade de “residente na barraca” no momento da prática do 2º acto recorrido, pelo que o 2º acto recorrido violou, efectivamente, o n.º 4 do art.º 10.º do DL n.º 6/93/M.
***
Pelo exposto, propõe-se ao MM.º Juiz que julgue integralmente improcedente o recurso interposto pelo Presidente do IH, mantendo-se a sentença proferida pelo Juiz do TA.».
Concordando integralmente com os fundamentos constantes da Douta Sentença em 1ª Instância, aos quais nada mais temos a acrescentar, para eles remetendo nos termos do nº 5 do artº 631º do CPC, “ex vi” nº 1 do artº 149º do CPAC, impõe-se negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
III. DECISÃO
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância em negar provimento ao recurso.
Sem custas por delas estar isenta a Recorrente.
Registe e Notifique.
RAEM, 10 de Julho de 2025
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)
Seng Ioi Man
(1º Adjunto)
Fong Man Chong
(2º Adjunto)
Mai Man Ieng
(Procurador-Adjunto)
1 Vide os Acórdãos do TSI, n.º 843/2012, de 21 de Novembro de 2013, e n.º 2/2013, de 8 de Maio de 2014.
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387/2024 ADM 41