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Processo nº 83/2025
(Autos de recurso jurisdicional)
   





ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. “A”, (“甲”), e “B”, (“乙”), sociedades comerciais melhor identificadas nos autos, instauraram no Tribunal de Segunda Instância o presente procedimento cautelar de suspensão de eficácia do acto praticado pelo CHEFE DO EXECUTIVO que adjudicou ao “Consórcio” formado pelas sociedades “D”, (“丁”), “E”, (“戊”), e “F”, (“己”), o contrato de prestação de “Serviços de Operação e Manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau e da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau”; (cfr., fls. 2 a 25 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Oportunamente, por Acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 07.11.2024, (Proc. n.° 743/2024/A) – e por se entender que a pretendida suspensão do aludido acto administrativo causava “grave lesão do interesse público” – decidiu-se indeferir o pedido deduzido; (cfr., fls. 354 a 355-v).

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Inconformadas, as requerentes – “A” e “B” – recorreram para este Tribunal de Última Instância, alegando para, a final, pedir a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que suspenda o referido acto administrativo de adjudicação atrás já identificado; (cfr., fls. 364 a 399).

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Por Acórdão desta Instância decidiu-se anular o Acórdão recorrido para que o Tribunal de Segunda Instância procedesse à “ampliação da matéria de facto” com nova decisão sobre a pretensão pelas recorrentes apresentada”; (cfr., Ac. de 20.02.2025, Proc. n.° 2/2025, a fls. 578 a 588).

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Na sequência do assim deliberado, em 24.04.2025, proferiu o Tribunal de Segunda Instância novo Acórdão onde, novamente, indeferiu o pedido das referidas requerentes; (cfr., fls. 650 a 662).

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Do assim decidido, e ainda inconformadas, trazem as ditas requerentes o presente recurso que, após adequada tramitação processual, se passa a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. No Acórdão agora recorrido deu o Tribunal de Segunda Instância como “provada” a seguinte matéria de facto:

“1. Em 14 de Maio de 2010, foi celebrado o contrato de prestação de serviços de “Operação e Manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau” entre a RAEM e o Consórcio G1, pelo prazo de 10 anos, com início a 1 de Julho de 2009 e termo a 30 de Junho de 2019. O Consórcio G1 é formado pelas seguintes sociedades: H (辛), I, A1 (甲一) e B (乙). (fls. 26 a 35v dos autos)
2. Por decisão do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 2 de Julho de 2009, a H (辛), a I, a A1 (甲一) e a B (乙), foram autorizadas para subadjudicar os serviços de operação e manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau à J (癸). (fls. 36 dos autos)
3. A entidade requerida decidiu autorizar a dispensa dos procedimentos de concurso público e de consulta escrita e procedeu ao ajuste directo com o Consórcio G. Em 4 de Junho de 2019, foi celebrado o contrato de prestação de serviços de “Operação e Manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau” entre a RAEM e o Consórcio G, pelo prazo de 45 meses, com início a 1 de Julho de 2019 e termo a 31 de Março de 2023. O Consórcio G é formado pelas seguintes sociedades seguintes: H (辛), A (甲), I (SUCURSAL DE MACAU) e B (乙). (fls. 37 a 48v dos autos)
4. Em 3 de Dezembro de 2010, foi celebrado o contrato de prestação dos serviços de “Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau” entre a RAEM e o consórcio formado pelas J e A1, pelo prazo de 3 anos, com início a 16 de Maio de 2010 e termo a 15 de Maio de 2013. O Consórcio formado pelas J e A1 é formado pelas J e A1. O aludido contrato foi renovado, respectivamente, pelo período de 10 meses em 4 de Outubro de 2013 (de 16 de Maio de 2013 a 15 de Março de 2014), pelo período de 8 meses em 25 de Julho de 2014 (de 16 de Março de 2014 a 15 de Novembro de 2014), pelo período de 9 meses em 31 de Dezembro de 2014 (de 16 de Novembro de 2014 a 15 de Agosto de 2015), pelo período de 4 meses em 13 de Novembro de 2015 (de 16 de Agosto de 2015 a 15 de Dezembro de 2015), pelo período de 1 ano em 11 de Maio de 2016 (de 16 de Dezembro de 2015 a 15 de Dezembro de 2016) e pelo período de 1 ano em 2 de Maio de 2017 (de 16 de Dezembro de 2016 a 15 de Dezembro de 2017). (fls. 49 a 143v dos autos)
5. Em 17 de Maio de 2018, foi celebrado o contrato de prestação dos serviços de “Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau” entre a RAEM e o consórcio formado pelas J e A1, por pelo prazo de 2 anos, com início a 16 de Dezembro de 2017 e termo a 15 de Dezembro de 2019. O consórcio formado pelas J e A1 é formado pelas J e A1. O aludido contrato foi renovado, respectivamente, pelo período de 28,5 meses em 23 de Abril de 2020 (de 16 de Dezembro de 2019 a 30 de Abril de 2022) e pelo período de 9 meses em 11 de Agosto de 2022 (de 1 de Maio de 2022 a 31 de Janeiro de 2023). (fls. 144 a 197v dos autos)
6. A entidade requerida decidiu autorizar a dispensa dos procedimentos de concurso público e de consulta escrita e procedeu ao ajuste directo com o Consórcio G. Em 27 de Abril de 2023, foi celebrado o contrato de prestação de serviços de “Operação e Manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau, da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau e das Instalações de Tratamento de Resíduos Alimentares” entre a RAEM e o Consórcio G, pelo prazo de 22 meses, com início a 1 de Fevereiro de 2023 e termo a 30 de Novembro de 2024. O Consórcio G é formado pelas sociedades seguintes: H (辛), I (SUCURSAL DE MACAU), B (乙) e A (甲). (fls. 198 a 222 dos autos)
7. Conforme o registo comercial (fls. 288 a 299 dos autos), os sócios da J (癸) (doravante designada por J) são: H (辛), I, A1 (甲一) e B (乙).
8. Tendo em conta que o prazo de validade do contrato referido em 6 estava quase a terminar, a Administração decidiu realizar o concurso público.
9. As Requerentes, a A e a B, e a interveniente provocada, C formaram um consórcio e concorreram ao concurso público para a prestação de serviços de “Operação e Manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau e da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau”.
10. Em 31 de Julho de 2024, a entidade requerida proferiu despacho, adjudicando o aludido projecto ao contra-interessado, “D - E - F, em consórcio” (formado pelas D, E e F).
11. Até 20 de Fevereiro de 2024, a J tinha 197 empregados ou assalariados. (fls. 245 dos autos)
12. O objecto da J é a prestação dos serviços de operação e manutenção da Central de Incineração de Resíduo Sólidos, no âmbito dos contratos referidos em 1 e 6, e os seus recursos humanos e capacidades operacionais foram estruturados para esse fim.
13. Com a celebração de um novo contrato com o Consórcio Adjudicatário e o começo da respectiva execução, a J deixará de poder prestar os seus serviços no âmbito do contrato referido em 6.
14. A J possui pessoal e equipamento próprios suficientes para assegurar a continuação da prestação dos serviços de operação e manutenção das instalações respectivas.
15. A J não é parte no actual contrato de “Prestação de serviços de operação e manutenção da Central de Incineração de Resíduo Sólidos de Macau, da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigoso de Macau e das Instalações de Tratamento de Resíduos Alimentares”, referido em 6.
16. A J não é concorrente ao concurso público que originou o acto de adjudicação que agora se pretende suspender.
17. O actual contrato de “Prestação de serviços de operação e manutenção da Central de Incineração de Resíduo Sólidos de Macau, da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigoso de Macau e das Instalações de Tratamento de Resíduos Alimentares” terminou em 30 de Novembro de 2024.
18. A adjudicação posta em crise destina-se a contratar um novo adjudicatário para tratar adequadamente os resíduos domésticos que entram diariamente na Central de Incineração de Resíduos Sólios e dos resíduos, como pneus usados, resíduos sólidos e líquidos perigosos, carcaças de animais como cães e cavalos, resíduos do matadouro e resíduos hospitalares, entre outros resíduos especiais e perigosos, que entram na Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos.
19. Estes resíduos domésticos são provenientes das actividades quotidianas dos residentes de Macau, dos sectores comercial e industrial, etc., enquanto os resíduos acima referidos podem ser contagiosos ou perigosos.
20. Para além da Central de Incineração de Resíduo Sólidos e da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigoso não existem em Macau outras instalações que tratem adequadamente estes resíduos.
21. A eventual paralisação da Central de Incineração de Resíduo Sólidos e da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigoso – sem a contratação, na pendência do recurso contencioso, a título temporário, de um terceiro a tratar aqueles resíduos – vai obrigar a que aqueles resíduos tenham de ser depositados em local determinado para esse fim, sem nenhum tratamento.
22. De acordo com o ponto 9.1.1 do “Caderno de Encargos” do concurso, “o adjudicatário obriga-se a contratar (100%) todos os trabalhadores residentes de Macau, actualmente empregados na Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau e na Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau, e, no início do contrato de prestação de serviços de “Operação e Manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau e da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau”, manter os seus postos de trabalho originais caso esses trabalhadores manifestem a sua vontade de permanecer, sem estabelecer qualquer período experimental”. (fls. 333 a 336 dos autos)
23. Por ofício datado de 19 de Agosto de 2024, a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA) notificou a decisão de adjudicação ao A – B – C, em Consórcio (fls. 273 dos autos)
24. Em 23 de Agosto de 2024, por requerimento a fls. 274 a 276 dos autos, o concorrente, A – B – C, em Consórcio, através do seu advogado, pediu à entidade requerida a passagem de certidão que contém o conteúdo mencionado no artigo 70.º do Código do Procedimento Administrativo, nos termos do artigo 27.º, n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso, e peticionou a declaração da suspensão da contagem do prazo do recurso contencioso até à passagem da referida certidão.
25. Por ofício datado de 19 de Agosto de 2024, a DSPA procedeu à notificação ao referido escritório de advogado, referindo que a cópia do documento requerido já estava pronta, podendo dirigir-se à DSPA para a levantar dentro do horário de expediente. (fls. 287 dos autos)”; (cfr., fls. 651-v a 655 e 4 a 7 do Apenso).

Do direito

3. Como resulta do que atrás se deixou relatado, vem as identificadas requerentes do pedido de suspensão de eficácia recorrer do Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que, com o veredicto agora recorrido, o indeferiu.

Na parte que agora interessa, assim ponderou o Tribunal de Segunda Instância para chegar a sua decisão de indeferimento do pedido em questão:

“Cumpre apreciar se o pedido das Requerentes preenche os requisitos da suspensão de eficácia.
O artigo 120.º do Código de Processo Administrativo Contencioso prevê:
“A eficácia de actos administrativos pode ser suspensa quando os actos:
a) Tenham conteúdo positivo;
b) Tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.”
Aliás, os n.ºs 1 e 4 do artigo 121.º Código de Processo Administrativo Contencioso consagram:
“1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. …
3. …
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. …”
Dos preceitos legais acima referidos, a concessão da suspensão de eficácia do acto administrativo depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos1:
- O acto administrativo objecto do pedido de suspensão de eficácia tem conteúdo positivo (ou tem conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente);
- A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
- A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto;
- Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
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- Conteúdo positivo do acto
O acórdão a fls. 354 a 355v dos autos julgou que o acto administrativo em causa tem conteúdo positivo.
O Tribunal de Última Instância deu a sua concordância com isso (fls. 583v dos autos).
Assim sendo, no presente procedimento cautelar, a aludida questão torna-se definitiva.
*
- Existência ou não do prejuízo de difícil reparação
Outro requisito da suspensão de eficácia do acto administrativo é que a execução imediata do acto administrativo causa prejuízo de difícil reparação para o requerente.
Quanto a isso, o requerente não pode alegar, de forma vaga e genérica, a verificação deste requisito, mas sim deve alegar factos concretos para a ponderação do tribunal.
O Tribunal de Última Instância refere expressamente: “O requisito do prejuízo de difícil reparação pressupõe a alegação de factos concretos donde resulte o mencionado prejuízo, não bastando a alegações de considerações genéricas e conclusivas que não permitam ao tribunal apurar se aquele requisito se verifica.”2
Analisando o requerimento inicial, os fundamentos suscitados pelas Requerentes podem ser resumidos nos termos seguintes:
- 1. A procedência do recurso contencioso ainda não pode recuperar a estrutura empresarial das Requerentes já modificada. Uma vez executado o acto administrativo em causa por parte da Administração, com a consequente celebração do contrato com novo adjudicatário e a sua execução, será desintegrada a estrutura operacional estabelecida pelas Requerentes para a execução do contrato original, o que implica a cessação dos contratos de mais de cem empregados e a liquidação e encerramento da J.
- 2. O efeito principal que as Requerentes pretendem alcançar é obter a adjudicação e executar o referido contrato enquanto a indemnização pecuniária não basta para substituir os direitos que as Requerentes pretendem adquirir;
- 3. A execução do acto administrativo em apreço leva a que as Requerentes não possam ganhar a experiência e “know-how” através da execução do contrato e a imagem que pode ser adquirida através da prestação dos respectivos serviços no mercado.
Tal como salienta o Tribunal de Última Instância: “Mesmo que o interessado sofra danos com a execução de um acto administrativo, se lograr obter a anulação do acto no respectivo processo, pode, em execução de sentença, ser indemnizado dos prejuízos sofridos. E se esta via não for suficiente pode, ainda, intentar acção de indemnização para ressarcimento dos prejuízos. Por isso, só se os prejuízos forem de difícil reparação, isto é, que não possam ser satisfeitos com a utilização dos falados meios processuais, é que a lei admite a suspensão da eficácia do acto.”3
Seguindo a jurisprudência do TUI acima citada, este Tribunal entende que o prejuízo mencionado no aludido ponto 2 não pode ser considerado como prejuízo de difícil reparação.
No que diz respeito ao ponto 1 acima referido, merece notar que tal como revela o ponto 6 dos factos provados, no contrato celebrado em 27 de Abril de 2023, a parte prestadora de serviços é um consórcio formado pelas 4 sociedades seguintes: “H”, “I”, “B” e “A”.
A sociedade comercial J também é formada pelas aludidas 4 sócias.
Porém, o consórcio das Requerentes é formado apenas por 3 sociedades: “B”, “A” e “C”, não incluindo a “H” e a “I”.
No procedimento cautelar em apreço, o que as Requerentes não justificaram detalhadamente é que mesmo que o actual consórcio por si formado (não incluindo a “H” e a “I” que são as sócias da J) ganhe a adjudicação, porquê é que o consórcio ainda pode continuar a controlar a sociedade comercial J e através da qual presta serviços no enquadramento do novo contrato.
Ainda que não se discute esta questão, uma vez julgado procedente o recurso contencioso interposto pelas Requerentes, isto não impede a Administração de anular a sua decisão de concessão de adjudicação ao contra-interessado e mesmo o contrato ora em execução, e passar a celebrar novo contrato com o consórcio formado pelas Requerentes, para que o referido consórcio volte a proceder à operação no prazo de validade previsto no contrato. Uma vez ocorrida esta situação hipotética, tal como o que actualmente o contra-interessado tem que fazer no início da sua operação, as Requerentes poderão criar outra empresa com natureza semelhante à J para que essa preste os respectivos serviços.
Pelas razões acima expostas, este Tribunal não concorda com as alegações das Requerentes, isto é, “a procedência do recurso contencioso ainda não pode recuperar a estrutura empresarial das Requerentes já modificada” ou “a obrigação de liquidar e encerrar a J” constitui o prejuízo de difícil de reparação para as Requerentes.
Uma vez julgado procedente o recurso contencioso e finalmente concedida a adjudicação às Requerentes, o recrutamento de novo pessoal e a criação de outra empresa semelhante à J por parte das Requerentes causarão, porventura, custas ou despesas adicionais para as Requerentes, em comparação com que actualmente as Recorrentes tentam manter a existência da J, porém, não restam dúvidas de que as respectivas custas ou despesas adicionais podem ser pecuniariamente quantificadas para efeitos de compensação às Recorrentes, pelo que, não podem ser consideradas como prejuízo de difícil reparação.
Ainda é que referir que, tal como aponta o Acórdão do TUI nos autos de recurso n.º 59/2019, de 3 de Julho de 2019, “o requerente da suspensão da eficácia de acto administrativo não pode vir a defender os interesses de um terceiro, atento o disposto no artigo 33.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), pelo que tais prejuízos não relevam como integradores do requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do mesmo Código.” Mesmo que meramente se supõe que a execução do acto administrativo em apreço causará o despedimento dos seus empregados, os interessados dos referidos empregados e os da própria J e das próprias Requerentes devem ser ponderados separadamente, não podendo ser confundidos. Tal como acima referido, as custas ou despesas decorrentes da criação de uma outra empresa semelhante à J não podem ser consideradas como prejuízo de difícil reparação das Requerentes. Quanto aos interesses dos empregados, as Requerentes não têm legitimidade substantiva para os defender em nome deles. De qualquer maneira, tal como previsto no ponto 9.1.1 do “Caderno de Encargos” do concurso, “o adjudicatário obriga-se a contratar (100%) todos os trabalhadores residentes de Macau, actualmente empregados na Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau e na Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau, e, no início do contrato de prestação de serviços de “Operação e Manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau e da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau”, manter os seus postos de trabalho originais caso esses trabalhadores manifestem a sua vontade de permanecer, sem estabelecer qualquer período experimental.” Com base nesta cláusula, a não suspensão de eficácia do acto administrativo em apreço também não leva ao desemprego dos empregados por despedimento.
As Requerentes alegam ainda que a execução do acto administrativo em causa leva a que as Requerentes não possam ganhar a experiência e “know-how” através da execução do contrato e a imagem que pode ser adquirida no mercado através da prestação dos respectivos serviços.
Face a isso, tal como acima referido, o consórcio formado pelas Requerentes e o consórcio que está a prestar os serviços são formados por empresas diferentes. Assim sendo, mesmo que se supõe que o consórcio adjudicatário seja o consórcio formado pelas Requerentes, isto não equivale a que o original consórcio que está a prestar os serviços ganha a adjudicação.
Com efeito, quando os serviços sejam prestados pela empresa adjudicatária (nomeadamente os serviços com tempo limitado, como a construção de um edifício, o qual já foi construído durante a pendência do recurso contencioso), óbvio é que qualquer uma das empresas concorrentes não selecionadas não pode obter a experiência e “know-how” através da execução do contrato e a imagem que pode ser adquirida através da prestação dos respectivos serviços no mercado.
Mesmo que sejam ponderados a experiência, “know-how” e a imagem que pode ser adquirida através da prestação dos respectivos serviços no mercado invocados pelas Recorrentes, as Requerentes ainda não conseguiram convencer o Tribunal de que existe o prejuízo de difícil reparação por si alegado.
O consórcio formado pelas Requerentes não ganhou a adjudicação, a sua consequência necessária é a impossibilidade da participação na operação do referido projecto. Isto não é apenas a consequência do consórcio formado pelas Requerentes, como também a de outros consórcios que não ganharam a adjudicação. A não ser que existam fundamentos mais concretos e convincentes para suportar que a impossibilidade da sua participação na operação do projecto pode causar prejuízos concretos e materiais, é impossível provar que existe o invocado prejuízo de difícil reparação.
Caso não seja assim, qualquer adjudicatária (sic) que não ganha o concurso pode invocar a existência do prejuízo de difícil reparação com fundamento na impossibilidade de adquirir a devida experiência, “know-how” e reputação por impossibilidade da sua participação na operação do projecto.
Neste sentido, não são poucas as teses com valor de referência em Direito Comparado, cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de Portugal no processo n.º 0551/02, de 8 de Maio de 2002:
“Ademais, e em rigor, a falta de eleição da proposta do concorrente vencido não é, por si só, um prejuízo autêntico, mas antes um antecedente necessário do dano a sofrer – pois, e como melhor veremos «infra», o prejuízo de quem não ganhe o concurso relaciona-se propriamente com a perda das vantagens ligadas à execução do contrato.
Portanto, é absolutamente certa a irrelevância, na presente providência, do dano que consistiria em a requerente, segundo os próprios termos do acto de adjudicação, não haver ganho o concurso em causa.
Outro dano que poderia dizer-se típico de situações como a presente é o inerente à imediata celebração do contrato e à sua ulterior execução. Não há dúvida de que esses desenvolvimentos do acto de adjudicação dificultam, e por vezes impedem, que, obtida a supressão contenciosa daquele acto, o concorrente que recorreu venha a ganhar efectivamente o concurso mediante a prolação de um novo acto de adjudicação que elegesse a sua proposta. A outorga do contrato e o seu cumprimento pelas respectivas partes constituem a mais nítida expressão da eficácia do acto de adjudicação; e, assim sendo, pode dizer-se que a prolação desse acto, ordenando-se à produção desses efeitos, cria sempre o risco de gerar uma situação irreversível e, portanto, atentatória do interesse do requerente da suspensão em vir a ser escolhido como adjudicatário.
«In casu», a requerente arrimou-se exclusivamente a este interesse, pois afirmou pretender fundar o seu pedido unicamente no legítimo desejo de retirar, do provimento do recurso contencioso, a utilidade de poder vir ainda a ser a co-contratante.
Contudo, o risco de a celebração do contrato e a sua execução virem a impedir a reversibilidade da escolha produzida pelo acto impugnado é, como já dissemos, um risco que qualquer acto de adjudicação tipicamente envolve. A afecção que esse risco cause àquele interesse existe em todos os casos do género, apenas podendo variar de magnitude consoante a maior ou menor duração previsível do contrato de execução continuada.
Sublinhemos a conclusão a que chegámos – a de que, em todos os pedidos de suspensão da eficácia de um acto de adjudicação, o requerente pretende evitar a celebração do contrato e a sua subsequente execução para assim salvaguardar o seu interesse em poder vir a ser eleito como adjudicatário. É que aquela conclusão mostrar-se-á fecunda na tarefa de determinar os prejuízos e as simétricas vantagens relevantes nesta espécie de providências cautelares.
O que é típico, normal ou próprio de uma categoria não permite distinções intracategóricas, e antes constitui um predicado susceptível de ser abstraído de tudo o que nessa categoria se inclui. Ora, afirmar-se que o interesse relevante para se obter o deferimento de pedidos de suspensão como o dos autos é o que acima enunciámos – e que reconduzimos a um risco inerente a todos os actos de adjudicação – equivaleria a dizer-se que o interesse dos requerentes destas providências estaria determinado «a priori», já que em nenhum desses processos ele poderia faltar. Mas, se assim fosse, a mera qualidade abstracta de vencido no concurso exprimiria suficientemente o interesse do requerente da suspensão da eficácia do acto de adjudicação, isto é, essa simples qualidade revelaria os danos que ele pretendia neutralizar e as vantagens que ele almejava obter.
Ora, esta tese, que corresponde à posição enunciada pela requerente da presente providência, não merece acolhimento, por várias razões.
Antes do mais, assinale-se que, se o interesse a invocar por qualquer requerente da suspensão da eficácia de um acto de adjudicação fosse apenas o interesse abstracto em ver a adjudicação reapreciada, seria de esperar que a lei o tivesse dito «expressis verbis» – pois as situações abstractas costumam ter a sua sede própria nas previsões legais. De todo o modo, ante a natureza típica e constante desse interesse nos processos do género, não faria sentido que o art. 5º, n.º 4, do DL n.º 134/98, previsse o cotejo dos interesses privado e público. Dada a presença necessária daquele interesse em qualquer requerente da suspensão, apenas teria de se ver se o interesse público afectado pela suspensão pretendida era daqueles que consentem um retardamento na sua satisfação; e, desta maneira, só estaríamos a avaliar se o interesse público consentia uma dilação, e não a cotejá-lo com o proveito a obter pelo requerente da providência.
É falacioso pensar-se que os interesses materialmente relevantes em meios processuais como o presente se resumem à possibilidade de novamente se discutir no procedimento quem deverá ser o adjudicatário. Os interesses do requerente da providência coincidem com os fins que ele ultimamente persegue; ora, esses fins derradeiros não se limitam à simples reapreciação da adjudicação, mas consistem em ele lograr vencimento no concurso para vir a contratar efectivamente – e, após, retirar os proveitos correspondentes à sua qualidade de contratante, que foram a autêntica causa final da manifestação da vontade de concorrer. Consequentemente, os interesses que poderão ser afectados pela imediata execução do acto são, verdadeiramente, os que seriam satisfeitos com a vitória no concurso. As vantagens que o requerente da suspensão quer garantir ao vir a juízo são as que resultarão de ele ser admitido a contratar; e a intenção de, mediante a suspensão e o recurso, forçar a Administração a emitir um novo acto de adjudicação não passa de um meio ao serviço daquele fim – o fim de evitar os prejuízos inerentes à perda das aludidas vantagens.
Deste modo, vê-se que o interesse a invocar pelo requerente da suspensão não pode resumir-se à mera possibilidade de ele voltar a lutar pela adjudicação. Até porque este simples interesse apenas funda a legitimidade processual de quem vem a juízo (cfr. Marcello Caetano, O Interesse como Condição de Legitimidade no Recurso Directo de Anulação, «in» Estudos de Direito Administrativo, 1974, pág. 239), não podendo confundir-se o interesse atendível para aquele efeito formal com os interesses materiais «susceptíveis de serem lesados» – os quais devem ser ponderados «in concreto» pelo tribunal e comparados com o grau da lesão que o interesse público sofreria com a suspensão da eficácia do acto (cfr. o art. 5º, n.º 4, do DL n.º 134/98).”
Por outro lado, uma vez julgado procedente o recurso contencioso interposto pelas Requerentes, isto não impede a Administração de anular a sua decisão de adjudicação ao contra-interessado, passando a celebrar um novo contrato com o consórcio formado pelas Requerentes, para que tal consórcio proceda à operação (é de referir que o tratamento de lixos é um serviço indispensável para a população, sendo que a prestação desse serviço não é de uma só vez ou com tempo limitado). Nesta situação, as Requerentes poderão adquirir a experiência, “know-how” e a reputação através da execução do referido contrato.
Pelos fundamentos acima expostos, não se verifica o preenchimento deste requisito.
*
- Grave lesão do interesse público
As Requerentes entendem que a suspensão de eficácia do acto administrativo em apreço não causa grave lesão do interesse público.
Tal como refere o acórdão a fls. 354 a 355v dos autos, “para a sociedade, os serviços de tratamento de lixos e resíduos especiais e perigosos é muito importante e imparável, e se for suspensa a eficácia do respectivo acto administrativo, deixarão de funcionar a Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau e a Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau, o que implica a acumulação contínua do lixo doméstico e dos resíduos especiais e perigosos, causa problemas de poluição ambiental e de higiene, e determina grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo referido acto, resultando num prejuízo muito superior ao alegado pelas requerentes”4
No seu requerimento inicial, as Requerentes citaram os artigos 5.º, n.º 1, 7.º, n.º 1, alínea b), 7.º, n.º 2, alíneas a) e b) e 8.º, n.ºs 1 e 4 do Decreto-Lei n.º 122/84/M para tentar provar: mesmo que seja suspensa a eficácia do acto administrativo em causa, a Administração ainda pode, por adjudicação directa nos termos dos dispostos legais acima referidos, deixar o consórcio que está a prestar os serviços ou outro terceiro continuar a prestar os serviços durante a pendência do recurso contencioso, o que poderá assegurar que não causará grave lesão do interesse público quando seja suspensa a eficácia do acto administrativo em apreço.
Este Tribunal não concorda com este entendimento.
De facto, ao suscitar esses fundamentos, as Requerentes fazem as coisas às avessas. Tal como apontou o contra-interessado (ponto 97 da contestação), exactamente por a suspensão de eficácia do acto recorrido causar grave lesão do interesse público, a Administração praticou adicionalmente o acto de adjudicação directa, com vista a garantir a necessidade de não lesar o interesse público.
Porém, não se pode dizer o contrário de que a suspensão de eficácia do acto recorrido não acarreta grave lesão do interesse público desde que a Administração pratique adicionalmente o acto de adjudicação directa.
No caso em apreço, já que a Administração escolheu o adjudicatário mais adequado mediante o processo de concurso público (o referido acto administrativo presume-se legal e válido durante a pendência do recurso contencioso), o acto de celebração de contrato entre a Administração e o melhor adjudicatário escolhido mediante o processo de concurso público para que este preste os respectivos serviços, pode realizar mais eficazmente o interesse público, em comparação com o acto de celebração de outro contrato a título provisório com outrem por ajuste directo.
Pelas razões acima expostas, não se verifica este requisito.
*
- Não há fortes indícios de ilegalidade do recurso contencioso
Diferentemente do que alega o contra-interessado, não resultam dos autos fortes indícios de ilegalidade do recurso contencioso.
No presente procedimento cautelar, como se vê neste momento, depois de receber a notificação da decisão de adjudicação, as Requerentes pediram à Administração que lhe fornecesse informações adicionais e esta forneceu-lhas.
Neste momento, este Tribunal não verifica fortes fundamentos que bastam para revelar que o prazo para interposição de recurso contencioso não pode ser prorrogado ao abrigo do artigo 27.º, n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Não resultando, dos autos, fortes indícios de ilegalidade do recurso contencioso interposto pelas Requerentes, este Tribunal entende que está preenchido este requisito.
*
A providência cautelar da suspensão de eficácia requerida pelas Requerentes não preenche os requisitos legais previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 121.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, pelo que, deve ser indeferida, sem necessidade de apreciar a existência ou não das situações previstas no artigo 121.º, n.º 4 do mesmo Código.
***
V. Decisão
(…)”; (cfr., fls. 655-v a 662 e 7-v a 13 do Apenso).

Insurgindo-se contra o assim decidido, e nas conclusões do presente recurso, dizem as recorrentes o que segue:

“A. O douto Acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 24 de Abril de 2025 indeferiu o pedido de suspensão por considerar não preenchidos tanto o requisito do artigo 121º, n.º 1, al. a) do CPAC como o do artigo 121º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma – a saber, (1) o não preenchimento de prejuízo de difícil reparação causado pela imediata execução do acto recorrido, e ainda (2) a verificação de que a suspensão do acto recorrido determina grave lesão ao interesse público devido à paralisação forçada do funcionamento das instalações.
B. Salvo o devido respeito, andou mal o douto Tribunal a quo na apreciação feita, padecendo a decisão recorrida do vício de erro de julgamento de direito (e, subsidiariamente, de insuficiência da matéria de facto) no que respeita à apreciação do preenchimento dos requisitos do artigo 121º, n.º 1, al. a) e b) do CPAC.
Senão vejamos:

I) DOS REQUISITOS DE SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
C. Na senda do disposto no 121º, n.º 1 do CPAC, o propósito da providência de suspensão de eficácia do acto é o de assegurar “o efeito útil” da sentença do recurso contencioso, salvaguardando, através da paralisação dos efeitos do acto recorrido, a eficácia da sentença que no futuro vier anular o mesmo acto.
D. Assim, a avaliação sobre a verificação (ou não) dos requisitos estabelecidos no artigo 121º, n.º 1 do CPAC para o decretamento de suspensão tem de atender a tal desiderato, obrigando o julgador a ponderar casuisticamente os interesses dos particulares e os interesses públicos à luz dos princípios da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efectiva, por forma a determinar se a suspensão é medida adequada para estabelecer uma relação equilibrada entre os interesses em conflito e assegurar o efeito útil do meio processual destinado à tutela jurisdicional efectiva (tutela cautelar).
E. Salvo o devido respeito, o douto Acórdão recorrido considerou não verificados os primeiros dois requisitos do artigo 121º, n.º 1 do CPAC sem a devida fundamentação de facto ou de direito, tão-somente apenas em considerações abstractas e sem cuidar da referida ponderação entre os interesses em conflito à luz dos princípios de proporcionalidade e de tutela jurisdicional efectiva.
F. Ao arrepio do douto Acórdão do TUI, e novamente com o devido respeito, entendem as Recorrentes que o Tribunal a quo também não chegou a apurar a “factualidade” que lhe incumbia apurar, de modo a sustentar ou alterar a sua posição inicial quanto à verificação (ou não) do requisito do artigo 121º, n.º 1 al. b) do CPAC, mas antes se limitou a proceder à ampliação dos “fundamentos” para o indeferimento do pedido de suspensão, sem cuidar de verificar a realidade dos factos.

II) DO PREENCHIMENTO DO REQUISITO DO ARTIGO 121º, N.º 1, AL. A) DO CPAC
a) Do previsível prejuízo de difícil reparação
G. O requisito da suspensão ínsito no artigo 121º, n.º 1, al. a) do CPAC integra dois conceitos indeterminados importantes, a saber, o prejuízo de difícil reparação (ou seja, prejuízo de avaliação pecuniária imprecisa, imperfeita ou duvidosa e, portanto, dificilmente indemnizável) o qual deverá ser previsivelmente causado pelo acto cuja suspensão se requer (bastando, pois, em sede de procedimento cautelar, a verificação de uma forte aparência, de um mero padrão de probabilidade de causalidade).
H. As Recorrentes demonstraram em sede de petição, de forma fundamentada e sustentada, que o principal prejuízo de difícil reparação in casu decorre inelutavelmente dos previsíveis prejuízos (ou, pelo menos, sérias dificuldades) resultantes da execução do acto de adjudicação, na reconstituição da estrutura empresarial existente para a operação futura das instalações (CIRSM e ETRPM), caso venha a ser julgado procedente o recurso contencioso e lhes seja adjudicado o Contrato.
I. No mesmo Requerimento, as Recorrentes alegaram expressamente que a operação das instalações pela J enquanto empresa estruturada e operacional, já constituída e com larga experiência de operação em Macau de cerca de 15 anos faz parte da proposta apresentada pelas Recorrentes, pelo que tal proposta é completamente distinta e diferenciada das propostas das restantes concorrentes, possuindo como mais-valia precisamente a possibilidade de dar continuidade à prestação dos serviços por intermédio de uma entidade já existente, que congrega os recursos materiais, financeiros, técnicos e humanos das Recorrentes para prestar os serviços, e que possui larga experiência de operação em Macau.
J. Tendo a J por objecto exclusivo a prestação dos referidos serviços de tratamento de resíduos, e atendendo ainda ao carácter de exclusividade dos serviços públicos em causa, não havendo outras instalações para a celebração de um novo contrato com o Consórcio Adjudicatário implicaria necessariamente a imediata cessação da sua actividade comercial, a sua saída imediata das instalações de CIRSM e ETRPM e a dissolução de todas as suas relações jurídicas e posições comerciais, designadamente através da cessação das relações laborais (em particular com os trabalhadores não residentes que constituem a maioria dos seus recurso humanos e relativamente aos quais não existe qualquer obrigação de contratação pelo adjudicatário), a dissolução das suas relações com fornecedores, a alienação dos respectivos activos tangíveis e o desaparecimento dos seus activos intangíveis, com a inevitável liquidação e encerramento da sociedade, o que foi comprovado à saciedade pelas Recorrentes e dado como provado pelo Tribunal a quo (Vide pontos 1 a 6, 11 a 14 e 20 dos factos assentes).
K. Ainda que o recurso contencioso seja julgado procedente a final, o desaparecimento de facto e de direito da empresa operada pelas Recorrentes por intermediário da J, agravado pelo eventual prolongamento e demora do recurso contencioso, configura uma situação evidente de prejuízo grave para as Recorrentes, constituindo ainda um prejuízo manifestamente de muito difícil (senão mesmo impossível) reparação pela impossibilidade de reconstituição de situação anteriormente existente devido à extinção da empresa operada pelo intermediário J e à dificuldade da sua avaliação pecuniária com a necessária exactidão.
L. Pelo exposto, deverá ser julgado verificado o requisito do artigo 121º, n.º 1, al. a) do CPAC para decretamento da suspensão de eficácia, o que desde já se requer.

b) Do erro de julgamento do Tribunal recorrido
M. O douto Tribunal a quo entendeu que o alegado pelas Recorrentes não constitui prejuízo de difícil de reparação previsto no artigo 121º, n.º 1 do CPAC, pelas razões apresentadas no artigo 36º das presentes alegações de recurso.

- Da Relação entre as Recorrentes e a J
N. É mister recordar que o Tribunal a quo deu como provado que as Recorrentes formaram, com as suas sociedades-mães, o consórcio que prestou serviços de operação e manutenção da CIRSM e ETRPM desde 1 de Julho de 2009 e 16 de Maio de 2010, respectivamente, até 30 de Novembro de 2024 (e continuando até à presente data) e que, para atingir tal desiderato, as Recorrentes agregaram os seus recursos materiais, financeiros e humanos que prestam materialmente os referidos serviços na J .
O. Nos termos da Proposta das Recorrentes, os serviços de operação e manutenção objecto do Contrato seriam prestados por intermédio da J, com as participações sociais dos membros do Consórcio aí indicadas (cfr. artigo 43º supra), pelo que não se compreende as dúvidas do douto Tribunal a quo – a função da J enquanto empresa agregadora dos meios técnicos, financeiros e humanos das Recorrentes para a prestação dos serviços encontra-se indubitavelmente assente nos factos sub judice, e a proposta de prestação dos serviços sob o Concurso através da J (e, bem assim, o controlo desta) encontram-se detalhados no respectivo plano de serviços.
P. Assim, e ao contrário do que entende o Tribunal a quo, torna-se evidente e incontestável que o controlo da J pelo consórcio formado pelas Recorrentes, para efeitos da prestação dos serviços de operação e manutenção das instalações em causa, não está – nem poderá estar nunca – posto em questão.

- Da verificação dos prejuízos causados na esfera das Recorrentes
Q. É também de salientar que, diferentemente do entendimento do Tribunal recorrido, todos os prejuízos causados afectam directamente os interesses do consórcio formado pelas Recorrentes, precisamente porque o dano da dissolução da J – uma empresa já existente, diferente de uma sociedade recentemente constituída, e que congrega todos os meios técnicos, financeiros e humanos cultivado pelas Recorrentes ao longo de mais de 15 anos de serviços – reflecte-se directamente na sua esfera, na medida em deixam de dispor da estrutura empresarial pela qual as Recorrentes se propuseram cumprir o Contrato.
R. Ora, o que releva para a presente análise é, outrossim, o prejuízo sofrido pelas Recorrentes, porquanto a sua estrutura empresarial, organização de meios e know-how técnico encontra-se corporizada na J e o desaparecimento desta implica o desaparecimento dos meios que as Recorrentes dispõem e propuseram para cumprir o contrato a que concorreram.
S. Ou seja, os previsíveis prejuízos sofridos na sequência da execução imediata do acto de adjudicação reflectem-se directamente na sua esfera jurídica pela lesão do instrumento ou meio apresentado para cumprimento do contrato, sendo ainda prejuízos de difícil – ou mesmo impossível – reparação.

- Do prejuízo grave e de difícil (ou impossível) reparação
T. Por outro lado, conquanto a execução imediata da adjudicação e a ausência de suspensão constituam causa adequada e directa da liquidação e encerramento da J, o Tribunal a quo defende que a J é substituível por uma sociedade nova a constituir pelas Recorrentes com a contratação dos novos trabalhadores e aquisição de novas experiências e know-how no futuro, não constituindo assim um prejuízo de difícil reparação – tal olvida o facto de as Recorrentes terem prestado serviços de operação e manutenção das instalações de incineração por intermédio da J ao longo de cerca de 15 anos e em exclusivo, não existindo outras instalações sem ser as CIRSM e ETREPM que tratem resíduos em Macau.
U. O douto Tribunal a quo parece levar a cabo uma análise puramente formalista e parcelar dos elementos da J, ignorando, por um lado, os efeitos da sua dissolução na esfera das Recorrentes e determinando, por outro lado, que seria possível contratar de novo os trabalhadores dispensados e reconstituir a mesma estrutura empresarial e que, em todo o caso, o interesse de terceiros (como seja o dos referidos trabalhadores) não se confunde com os interesses da J e, por conseguinte, os interesses das Recorrentes.
V. Ora, conquanto seja possível replicar a estrutura societária da J em caso de encerramento desta, já não é possível reconstituir (uma vez extinta) uma estrutura empresarial e operacional equivalente, ou ainda o know-how e sinergia que apenas a experiência de trabalho em equipa durante vários anos pode conferir, pelo que o tratamento pelo Tribunal Recorrido das questões de (fácil) reconstituição da empresa, irrelevância de cessação das relações com os trabalhadores e de aquisição de experiências em separado constitui um verdadeiro erro de julgamento.
W. No fundo, a decisão do Tribunal recorrido entende a estrutura empresarial como um mero agregado de bens, passível de desmantelamento e reconstituição ao “toque de um botão”, o que simplesmente não corresponde à realidade dos factos e conflitua com o entendimento pacífico do TUI , pois que, na eventualidade de procedência a final do recurso contencioso, e após o começo da execução do novo contrato com o Consórcio Adjudicatário, já não será possível destruir o trabalho que até então vier a ser realizado pelo Consórcio Adjudicatário ou proceder-se à devolução dos bens ou serviços por este prestados à RAEM em sede de execução do Contrato, como por outro lado, não será possível reconstituir a estrutura empresarial do consórcio formado pelas Recorrentes e a sua capacidade operacional.
X. Sublinhe-se, quanto aos trabalhadores, que a obrigação de contratação dos trabalhadores em função nos termos do Caderno de Encargos diz apenas respeito aos 76 trabalhadores residentes de Macau, excluindo assim os 121 trabalhadores não residentes, os quais incluem trabalhadores qualificados e experientes, em equipa e sob uma organização sinergética e eficaz, e que com toda a probabilidade terão de abandonar a RAEM e procurar outros empregos, sem qualquer garantia de poder regressar.
Y. Diferentemente do que entende o Tribunal a quo, estas dificuldades de contratação de trabalhadores com o mesmo perfil em termos de experiência, valências e capacidades técnicas para formar uma empresa equivalente à da J não são passíveis de avaliação económica, pois que a reconstituição dessa estrutura empresarial, uma vez desmantelada, meses ou até anos depois do começo da execução, não pode deixar de ser considerada como impossível, ou pelo menos, muito difícil, conforme bem defende a jurisprudência do TUI .
Z. Destarte, o Tribunal Recorrido incorreu em erro na apreciação dos pressupostos de facto relativamente à composição dos trabalhadores da J, bem como na interpretação da cláusula 9.1.1 do Caderno de Encargos, conduzindo a conclusões desfasadas da realidade e inaplicáveis ao caso concreto.
AA. Mesmo admitindo a hipótese do novo adjudicatário integrar todos os trabalhadores da J, tal resultaria no esvaziamento completo da mão-de-obra da J, tornando-a assim imediatamente impossibilitada de exercer qualquer actividade comercial e contribuindo fatalmente para o encerramento da empresa e da sociedade pela extinção do seu objecto nos termos do artigo 315º do Código Comercial.
BB. Tendo em conta a exclusividade dos serviços públicos em causa e a unicidade do objecto social da J, é inquestionável que a execução imediata do acto de adjudicação resultará necessariamente na desocupação das instalações CIRSM e ETREPM pela J, no esvaziamento completo do seu quadro de pessoal, na cessação definitiva da sua actividade e, consequentemente, na liquidação da empresa e encerramento da sociedade J.
CC. Em todo o caso, sendo a J a corporização dos meios produtivos, organizativos, financeiros e técnicos das Recorrentes, bem como o meio proposto para a execução do Contrato, o prejuízo das Recorrentes decorrente da extinção desta não se limita ao esvaziamento da sua mão-de-obra, mas abrange ainda a perda das relações comerciais com fornecedores, consultores e outros terceiros, a dissipação do seu crédito e bom nome junto da banca, dos seus fornecedores e de terceiros em geral, os custos de liquidação, com a inevitável venda de activos por valor residual, indemnização aos trabalhadores despedidos, os custos irrecuperáveis de constituição de uma empresa, designadamente os esforços de recrutamento, de reorganização, de formação de pessoal, de reaquisição de bens e serviços, de procurement, de administração, etc., a disrupção do funcionamento da empresa e a perda das sinergias inerentes ao seu funcionamento, e (caso o recurso das Recorrentes leve vencimento) o custo de reconstituição da organização, do know how, da rede de relações comerciais.
DD. Ao indeferir o pedido de suspensão sem considerar, no seu todo, os riscos e factos alegados devidamente pelas Recorrentes no Requerimento inicial e exaustivamente apontados supra e, bem assim, ao erradamente considerar que as Recorrentes não alegaram determinado tipo de prejuízo que, segundo ele, constituiria prejuízo irreparável ou de difícil reparação, a decisão do douto Tribunal a quo está ferida de erro de julgamento ao não considerar plenamente preenchido o requisito legal previsto no artigo 121º, n.º 1, al. a) do CPAC, o qual deverá ser suprido pelo Tribunal ad quem, determinando-se a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que defira a providência cautelar requerida pelas Recorrentes, o que se requer.

c) Da insuficiência da matéria de facto
EE. Ainda por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que a decisão a quo encontra-se ferida do vício de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão que inviabiliza a decisão de direito, importando a baixa dos autos para o Tribunal Recorrido ampliar a matéria de facto e julgar novamente a causa.
FF. Em primeiro lugar, o douto Tribunal a quo considerou assente o número total de trabalhadores da J (197) sem especificar nem apurar quantos seriam trabalhadores residentes (76 à data de 12 de Abril de 2024) e trabalhadores não residentes quando, por outra banda, deu como provada a existência da obrigação de contratação de todos os trabalhadores “residentes de Macau” pelo adjudicatário por força da cláusula 9.1.1 do Caderno de Encargos.
GG. Ora, sem o apuramento da verdadeira composição dos trabalhadores da J, não poderia o Tribunal concluir como fez pela inexistência da situação de despedimento ou cessação das relações laborais de todos os trabalhadores da CIRSM e ETREPM, sob pena de desconsiderar a realidade dos factos, na medida em que a execução do acto de adjudicação causará a cessação das relações laborais de centenas de trabalhadores não residentes com a J.
HH. Destarte, estão em causa os interesses dos trabalhadores, os interesses da J (o esvaziamento completo da mão de obra) e, consequentemente, os interesses do consórcio formado pelas Recorrentes (sendo a J o instrumento ou ferramenta apresentada para a prestação dos serviços), porquanto a perda de mais de 60% de trabalhadores, muitos dos quais fazem parte da equipa de gestão e são engenheiros com alta especialização, experiência e conhecimentos técnicos dificilmente substituíveis, causaria danos irreparáveis às Recorrentes.
II. Em conclusão, o apuramento da composição dos trabalhadores da J constitui um elemento essencial para a determinação da verificação do previsível prejuízo de difícil reparação, nos termos expostos no presente recurso, pelo que, sem conceder quanto ao que se antecede, se deverá proceder à ampliação da matéria de facto nos termos do artigo 650º do CPC.
JJ. Por outro lado, o Tribunal Recorrido não apurou, para a apreciação do preenchimento do requisito do artigo 120º, n.º 1, al. a) do CPAC, se existe (ou não) uma dependência funcional e operacional do consórcio formado pelas Recorrentes na J para a execução do Contrato, cfr. a proposta apresentada pelo consórcio das Recorrentes que demonstra a intenção de manter a J enquanto vector para o fornecimento dos serviços e mantendo a continuidade e estabilidade do funcionamento das instalações.
KK. Tendo todos os contratos de prestação de serviços de operação e manutenção de CIRSM e ETREPM em que as Recorrentes, separada ou conjuntamente, foram partes, sido materialmente executados pela J e os consórcios formados pelas Recorrentes assegurado o respectivo fornecimento dos serviços sempre através da J (cfr. factos assentes 1 a 6, 12, 14 e 15 da douta decisão a quo), o papel crucial desempenhado pela J enquanto agregação de meios para a prestação dos serviços pelas Recorrentes ao longo da tempo, bem como para o novo consórcio formado pelas Recorrentes, deveria ter sido devidamente apurado e atendido pelo Tribunal Recorrido para efeito de decretamento da presente providência
LL. Pelo exposto, deverá o douto Tribunal ad quem mandar baixar a causa para o Tribunal recorrido ampliar a matéria de facto e julgar novamente a causa nos termos do artigo 650º do CPC, o que respeitosamente se requer, a título subsidiário.
MM. Caso assim não se entenda, desde já se requer seja a insuficiência da matéria de facto suprida pelo Tribunal ad quem ao abrigo do artigo 649º, n.º 2 do CPC, com base na Proposta das Recorrentes e no documento de Esclarecimentos Prestados no Âmbito do Recurso, os quais fazem prova plena dos factos que neles são atestados ao abrigo dos artigos 356º, n.º 2 e 365º do CC.

III) DO PREENCHIMENTO DO REQUISITO DO ARTIGO 121º, N.º 1, AL. B) DO CPAC
a) Da grave lesão ao interesse público concretamente prosseguido pelo acto
NN. Na apreciação do requisito do artigo 121º, n.º 1, al. b) do CPAC, a doutrina e a jurisprudência têm entendido pacificamente que este é um requisito negativo para efeito do decretamento da suspensão, sujeito à prova por parte da entidade pública, que pressupõe que os interesses particulares só devem ser sacrificados ao interesse público na medida estritamente necessária para a realização deste, e que o impedimento da suspensão só pode ser justificado por uma “grave” lesão causada pela paralisação dos efeitos do acto recorrido ao interesse público “concretamente” prosseguido.
OO. In casu, o interesse que as Recorrentes pretendem salvaguardar é um interesse inerente da capacidade operacional do consórcio por estas formado para o Concurso, a qual será gravemente posta em causa pela imediata execução do acto de adjudicação nos termos já explanados supra, pelo que a prevenção do prejuízo das Recorrentes e o acautelar o efeito útil do recurso contencioso só pode ser conseguido com a suspensão da eficácia do acto.
PP. Ao arrepio do ónus de prova que lhe cabia, a Entidade Recorrida alegou a “grave lesão” ao interesse público pela paralisação da CIRSM e ETREPM (cfr. artigo 35º da Contestação da Entidade Recorrida) sem apresentar qualquer facto para demonstrar em que termos (i) a paralisação dos efeitos da adjudicação traduz a paralisação das referidas instalações, (ii) os resíduos têm de ser depositados em local desadequado e onde será esse local, ou (iii) os resíduos depositados ficarão sem tratamento.
QQ. Pelo contrário, a efectiva suspensão dos efeitos do acto recorrido não conduziu, de forma nenhuma, à paralisação das instalações em causa, porquanto existe um contrato celebrado por ajuste directo com o actual consórcio formado pelas Recorrentes (submetido oportunamente ao Tribunal a quo), de modo a dar continuidade na prestação dos serviços e assegurar o funcionamento das instalações em causa, logrando provar que existia uma solução alternativa (efectivamente adoptada pela própria Entidade Recorrida) para evitar a paralisação do funcionamento das referidas instalações com a suspensão de eficácia (cfr. ponto 21 da matéria de facto assente).
RR. Nestes termos, é inequívoco que os interesses defendidos pelas Recorrentes não só não devem ser sacrificados perante um interesse público abstracto cuja suposta lesão não se encontra minimamente fundamentada na base factual sub judice e, igualmente, não devem ser sacrificados quando, em todo o caso, este sacrifício não é a medida necessária para a realização do referido interesse público.
SS. Sem prejuízo do supra exposto, o fim público prosseguido pela Adjudicação não é conduzir à execução célere de um qualquer contrato, mas sim conduzir à execução de um contrato que sirva da melhor maneira o interesse público – atendendo aos vários vícios de que padece o acto recorrido (cfr. demonstrado à saciedade nos autos principais), a lesão grave do interesse público concretamente prosseguido pela Adjudicação resultará, pelo contrário, da continuação da sua execução.
TT. Pelo exposto, e uma vez que da suspensão da eficácia da Adjudicação não resulta, sob prisma algum, grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto – podendo, antes, a referida suspensão ora requerida contribuir para evitar essa lesão, pelas razões apontadas – o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao não considerar plenamente preenchido o requisito legal previsto no artigo 121º, n.º 1 b) do CPAC, quando deveria ter decretado a providência requerida, o que se requer.

b) Do erro de julgamento do Tribunal Recorrido
UU. Ao arrepio do doutamente decidido pelo TUI (que anulou o acórdão de 7 de Novembro de 2024 por clara insuficiência da matéria de facto que permitisse concluir pela existência de grave lesão ao interesse público com a suspensão), o Tribunal a quo limitou-se agora a transcrever no ponto 21 da matéria de facto assente constante do acórdão recorrido o alegado pela Entidade Recorrida no artigo 35º da sua Contestação, sem procurar determinar, com base factual clara, objectiva e concreta, a lesão “grave” ao interesse público “concretamente” prosseguido.
VV. Por outro lado, a decisão a quo reconhece que assiste à Entidade Recorrida a possibilidade de lançar mão de meios alternativos para evitar tal paralisação, pelo que a lesão grave ao interesse público dada como comprovada pelo Tribunal a quo continua a ser uma lesão “abstracta” e “subjectiva” que se traduz numa eventual “possibilidade” de falta de tratamento dos resíduos.
WW. Ora, se a lei exige o preenchimento de um requisito suportado por base factual, o julgador não pode pura e simplesmente apreciar o mesmo no plano abstracto, sob pena de violar a disposição legal suprarreferida, prejudicando assim de modo inadmissível os interesses subjacentes à tutela jurisidicional efectiva e cautelar.
XX. Acresce que a factualidade hodierna e de conhecimento geral desmente tal conclusão – até à presente data, o tratamento de resíduos continua a ser realizado, as instalações continuam a funcionar, os serviços são prestados pelo mesmo consórcio (i.e. o anterior adjudicatário, com experiência local de mais de 15 anos), os interesses públicos “concretamente” prosseguidos pelo acto recorrido encontram-se devida e visivelmente acautelados.
YY. Por outro lado, não existe presentemente qualquer urgência concreta na modernização das instalações públicas, pelo que a conclusão do Tribunal a quo de que a suspensão determine uma “grave” lesão iminente, impossível ou difícil de evitar, ao interesse público “concretamente” prosseguido pela Entidade Adjudicante com a adjudicação conflitua directamente com os factos notórios e de conhecimento geral.
ZZ. Não tendo o acórdão recorrido acrescentado nada de novo quanto à matéria de facto para “concretizar” a “grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto” (cfr. doutamente decidido pelo TUI), é mister concluir que tal lesão não existe efectivamente e, por conseguinte, que no caso em apreço, a execução imediata do acto recorrido implicaria que o sacrifício do interesse das Recorrentes excede manifesta e desproporcionadamente as exigências (concretas) da realização do interesse público prosseguido por aquele acto, sobretudo quando existe solução alternativa para o acautelar, pelo que a suspensão deve ser decretada, o que, desde já, como afinal, se requer.
AAA. Ainda, e salvo o devido respeito, andou mal o Tribunal Recorrido ao considerar que a execução da adjudicação na sequência do Concurso deveria prevalecer sobre a contratação de terceiro por ajuste directo, de modo a prosseguir de forma mais eficiente o interesse público, uma vez que (a) não cabe ao Tribunal substituir-se à Administração quanto a uma decisão administrativa de natureza discricionária (ao abrigo dos artigos 5º, 7º e 8º do Decreto-Lei n.º 122/84/M), e (b) não é lícito o Tribunal Recorrido concluir em abstracto que o concurso é sempre o mecanismo de contratação que melhor prossegue o interesse público sem atender à situação em concreto – ao arrepio, aliás, do operado in casu pela Entidade Recorrida.
BBB. Deste modo, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, o facto de a Administração poder recorrer ao ajuste directo para contratação pública nos termos do Decreto-Lei n.º 122/84/M per si só não representa automaticamente a existência da grave lesão ao interesse público, nem dispensa a Administração do ónus de alegar e provar, em concreto, a existência de uma lesão grave causada pela paralisação da eficácia do acto recorrido ao interesse público para efeito de não decretamento de suspensão.
CCC. Por fim, (a) não tendo a Entidade Recorrida cumprido o seu ónus de prova quanto à grave lesão ao interesse público, (b) verificando-se que o sacrifício ao interesse particular das Recorrentes excede as exigências (concretas) da realização do interesse público, e sobretudo (c) a não suspensão não sendo a medida necessária para a realização do referido interesse público, também aqui o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao não considerar preenchido o requisito do artigo 121º, n.º 1 al. b) do CPAC, sendo mister concluir pelo preenchimento do referido requisito, decretando-se a providência requerida, o que, desde já, como afinal se requer”; (cfr., as “novas conclusões”, a fls. 827 a 843).

Quid iuris?

Cremos que não se pode reconhecer razão às ora recorrentes, pois que, também em nossa opinião, não se pode dar como – efectivamente – verificado o seu alegado “prejuízo de difícil reparação”, mostrando-se-nos de subscrever integralmente e aqui adoptar as considerações pelos Exmos. Juízes do Tribunal de Segunda Instância tecidas a propósito da questão para efeitos da decisão que se nos afigura de proferir.

Seja como for, não se deixa de dizer o que segue.

Vejamos.

De forma firme e pacífica tem-se entendido que se o requerente da suspensão de eficácia de acto administrativo não conseguir “provar”, com elementos concretos e bastantes, o seu invocado “prejuízo de difícil reparação”, necessário é o indeferimento da sua pretensão, por não se encontrar reunido, o requisito exigido na “alínea a)” do n.° 1 do art.° 121° do C.P.A.C., (atrás transcrito).

Por sua vez, e como cremos ser igualmente sabido, só existe “prejuízo de difícil reparação” quando a avaliação dos “danos” e a sua “reparação”, (ainda que não sendo de todo em todo impossíveis), podem tornar-se “muito difíceis”, sendo de se considerar “prejuízo de difícil reparação” a privação de rendimentos geradora de uma “situação de carência quase absoluta” e de “impossibilidade de satisfação das necessidades básicas e elementares”, (ao requerente cabendo, como se referiu, o “ónus” de alegar e provar, com elementos “objectivos” e “concretos”, a verificação do “prejuízo de difícil reparação” causado pelo acto administrativo cuja suspensão de eficácia requer).

Sobre esta matéria e idêntica questão já se pronunciou também este Tribunal de Última Instância, considerando, nomeadamente, que:

“I – No procedimento cautelar de suspensão de eficácia de actos administrativos, para que a pretensão seja concedida, é necessário verificar-se o requisito do prejuízo de difícil reparação para o requerente, causado pela execução do acto, salvo no caso de acto com a natureza de sanção disciplinar.
II – Assim, desde que não se verifique tal requisito, está o tribunal dispensado de examinar a verificação dos outros requisitos.
III – Existe prejuízo de difícil reparação naquelas situações em que a avaliação dos danos e a sua reparação, não sendo de todo em todo impossíveis, podem tornar-se muito difíceis.
IV – Trata-se de prejuízo difícil reparação o consistente na privação de rendimentos geradora de uma situação de carência quase absoluta e de impossibilidade de satisfação das necessidades básicas e elementares”, (cfr., v.g., o Ac. de 25.04.2001, Proc. n° 6/2001, e, no mesmo sentido, os Acs. de 14.05.2010, Proc. n.° 15/2010, de 16.05.2018, Procs. n°s 21/2018 e 38/2018, de 15.07.2015, Proc. n.° 28/2015, de 27.09.2018, Proc. n.° 69/2018, de 30.07.2019, Proc. n.° 71/2019, de 04.10.2019, Proc. n.° 90/2019, de 30.10.2019, Proc. n.° 99/2019, de 26.02.2020, Proc. n.° 136/2019 e de 13.01.2021, Proc. n.° 212/2020, de 27.05.2022, Proc. n.° 41/2022-I, de 27.07.2022, Proc. n.° 70/2022-I, de 29.07.2024, Procs. n°s 82/2024 e 85/2024, assim como de 13.12.2024, Proc. n.° 127/2024-I).

E, sobre esta mesma “matéria” e “questão” que agora nos ocupa, vale ainda a pena recordar o seguinte excerto do comentário por Cândido de Pinho efectuado:

“8 – (…)
Com o advérbio- previsivelmente, está o legislador a alertar que o interessado invoque e prove uma situação de facto de onde se extraia com muita probabilidade a ocorrência dos danos. Quer isto dizer, que o requisito em apreço não se basta com uma alegação vaga, superficial, mais ou menos conclusiva dos danos. Também não é suficiente invocar ou reproduzir as palavras da lei. É preciso expor e especificar muito bem a situação factual concreta, de modo a que fique bem claro que, sem a suspensão, a esfera jurídica do interessado ou dos que ele defende, ficará muito provavelmente lesada. É que, neste capítulo, a alínea demonstra perfeitamente que não estamos perante um quadro de presunção “iuris tantum” acerca da existência do prejuízo.
Depois, é preciso ainda que os efeitos danosos sejam de tal modo severos que se tomem de difícil reparação. É evidente que este é um conceito indeterminado. Mas até por assim ser, mais cuidado deve o requerente elaborar e expor um quadro fáctico bem fundamentado, capaz de convencer o tribunal de que o recurso contencioso bem sucedido seguido da execução do julgado dificilmente será apto a reparar os prejuízos sofridos, a ponto de repor integralmente a situação actual hipotética. Portanto, deverá ser neste requisito que o recorrente deve depositar a sua máxima atenção.
E claro que a prova aqui não tem que ser cabal, perfeita e exaustiva, como aquela que se faz geralmente numa acção; em vez disso, é perfunctória, característica e própria de uma providência cautelar, de processado urgente. Isso, contudo, não desobriga o interessado de narrar circunstanciadamente os factos, expor muito bem a sua situação jurídico/material pretérita e actual, bem como os danos advenientes e futuros que sejam causa do acto suspendendo. O referido conceito indeterminado deve ser, portanto, densificado o máximo que puder ser através de factos que sejam verosímeis e demonstráveis, sem prejuízo daqueles que, por muito evidentes, tenham a natureza de notórios (art. 250°, n°2 do CC e 434°, do CPC).
(…)
12 – Deve ter-se em conta que os danos a invocar e provar são os danos que devem resultar do acto através de um juízo assente na lógica e na consequência pura. Quer dizer, segundo um padrão objectivo, os prejuízos hão-de decorrer da execução do acto, de tal modo que é pressuposta a verificação de uma relação de causa-efeito entre o acto e a sua execução. Desta feita, entende-se que ficam fora da previsão da alínea os prejuízos hipotéticos, eventuais e conjecturais.
13 – E os danos morais serão de considerar na figura?
Qualquer decisão ablativa, qualquer acto decorrente de uma Administração dita “agressiva”, até mesmo qualquer indeferimento pode provocar aborrecimentos, dores de cabeça, arrelias, mal-estar; é natural, é próprio da reacção do ser humano perante uma adversidade. E pode ser ainda uma “perda de face”, uma indignidade perante a sociedade em geral ou perante um grupo (profissional, social, lúdico, desportivo, etc.) no qual o interessado se encontre incluído, uma humilhação, a vergonha profunda, um forte desgosto, etc.
Também não repugna admitir que a demolição da casa, que sempre serviu de moradia do requerente e da sua família mais próxima e directa e que, portanto, neles criou uma ligação afectiva, ou a separação de uma mãe do seu filho menor de terna idade, que dos seus cuidados e amparo precisa, haverá de gerar danos desse tipo.
Todavia, independentemente da verificação de danos morais, o que releva para a caracterização do requisito será intensidade deles. E isso, só casuisticamente pode ser analisado. Portanto, o que podemos dizer é que os danos morais não estão necessariamente afastados da previsão da norma em apreço; devemos, por outro lado, entender que só devem ser atendidos aqueles que, pela sua gravidade, intensidade e objectividade, mereçam a tutela do direito. Assim o proclama o art. 489° do Código Civil”; (in “Notas e Comentários ao C.P.A.C.”, Vol. II, pág.
214 e segs., e, no mesmo sentido, V. Lima e A. Dantas in, “C.P.A.C. Anotado”, pág. 347 e segs.).

In casu, e não obstante o – muito – que alegam as ora recorrentes, sem esforço se mostra de concluir que o pelas mesmas considerado como “seu prejuízo irreparável” não se verifica, pois que, como das suas próprias e atrás transcritas “conclusões” se constata, socorrem-se, (essencialmente), de alegados prejuízos de uma “outra entidade” – no caso, a “J” – para, num esforço de “colagem” a esta, tentar converter e transformar os (eventuais) prejuízos desta em próprios e seus.

Em suma, é a “situação” dos presentes autos muito próxima, ou mesmo (quase) idêntica, a uma outra sobre a qual também se ocupou este Tribunal de Última Instância – que, por coincidência, ocorreu também em sede de um “concurso público para modernização, operação e manutenção da estação de tratamento de águas residuais de Macau” – e onde se considerou o que segue (e que vale aqui a pena recordar):

“2.2 Prejuízo de difícil reparação causado pela execução do acto
A recorrente continua a sustentar que o acto suspendendo é idóneo para produzir prejuízos de difícil reparação directamente na sua esfera jurídica com a sua exclusão do concurso, os lucros cessantes directos, a liquidação da K, sua subsidiária e o despedimento colectivo dos trabalhadores da recorrente afectos à ETAR Macau.

Ora, no presente concurso público internacional para modernização, operação e manutenção da estação de tratamento de águas residuais da península de Macau, a L, ora recorrente, foi admitida como concorrente neste procedimento de concurso na fase de análise da documentação, mas excluída na fase de verificação e admissão das propostas. Por acto do Chefe do Executivo suspendendo, foi indeferido o respectivo recurso hierárquico e mantida a decisão inicial.
A recorrente é a sócia maioritária da K, actual operadora concessionária da Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) da Península de Macau, que lhe forneceu todo o processo tecnológico e os 29 trabalhadores destacados à operação da Estação de tratamento.

É verdade que a recorrente passou a ser sócia maioritária da K a partir de Maio de 2007, segundo os registos comerciais desta.
No presente procedimento do concurso, a actual operadora K não é concorrente. Assim, pode-se dar por certo que a K não poderá continuar com a operação e manutenção da ETAR da Península de Macau no termo do respectivo contrato de adjudicação. Os prejuízos decorrentes da cessação das operações da ETAR e até de eventual liquidação da empresa serão suportados pela K que só indirectamente se reflecte na recorrente na qualidade da sua sócia.
Assim, estes prejuízos não podem ser considerados próprios da recorrente, de difícil reparação ou não.

Situação semelhante é em relação aos 29 trabalhadores técnicos contratados pela recorrente mas afectos aos serviços da actual operadora K, cuja impossibilidade de continuar a exercer funções na K não resulta directamente da exclusão da recorrente do concurso, determinada pelo acto suspendendo, mas sim do termo do referido contrato de adjudicação da K.
De qualquer modo, a consequência do eventual despedimento destes trabalhadores não será tão penosa por estar prevista no caderno de encargos do processo do concurso a obrigação do novo adjudicatário, como primeira prioridade, de recrutar os trabalhadores que actualmente prestam serviço na ETAR da Península de Macau, especialmente os que sejam residentes permanentes de Macau, caso existam posições vagas na sua estrutura de pessoal.

A recorrente alega ainda os prejuízos resultados de lucros cessantes por impossibilidade de continuar a obter por meio da sua participação na K em valor não inferior a MOP$25.000.000,00.
Ora, tais prejuízos ou lucros, para além de não ser de difícil reparação, não podem dar por certo com segurança, simplesmente porque nada garante que a recorrente será a vencedora do concurso, sem olvidar que a sua “subsidiária” K já não participou neste concurso, assim sem qualquer expectativa de gerar mais lucros para a sócia recorrente após o termo do actual contrato de adjudicação”, concluindo-se, seguidamente que, “Uma vez que da execução do acto suspendendo não causa directamente prejuízos de difícil reparação para a recorrente, o presente recurso jurisdicional não merece provimento”; (cfr., v.g., o Ac. de 25.05.2011, Proc. n.° 14/2011).

Com efeito, e como se mostra claro e evidente, os “prejuízos de difícil reparação” para os efeitos ora em causa são apenas aqueles que, com toda a probabilidade, resultam como “consequência directa, imediata e necessária” da execução do acto administrativo cuja execução é requerida.

Exige-se, assim, uma “relação de causalidade adequada” entre a execução do acto e os prejuízos de difícil reparação daí decorrentes, (irrelevantes sendo os “prejuízos indirectos” ou “mediatos” e ou meramente “aleatórios” ou “conjunturais”); (neste sentido, vd., v.g., o Ac. deste T.U.I. de 03.07.2019, Proc. n.° 59/2019, também citado no Acórdão ora recorrido).

E, no caso, cremos ser – exactamente – o que sucede.

Na verdade, e como de forma clara (e mais concisa) resulta da matéria de facto dada como “provada”, importa pois atentar que, os contratos celebrados até 31.03.2023 para os serviços de operação e manutenção da Central de Incineração foram outorgados com o consórcio “G”, e que em 27.04.2023, este mesmo consórcio outorgou um outro contrato para a prestação dos serviços de “Operação e manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau, da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau e das Instalações de Tratamento de Resíduos Alimentares” que vigorou até 30.11.2024.

Porém, e como de forma igualmente clara resulta da factualidade dada como provada, importa não perder de vista que este mesmo consórcio “G” é constituído por 4 sociedades: a (1ª) “H”, a (2ª) “I (Sucursal de Macau)”, a (3ª) “A”, e a (4ª) “B”, (sendo estas últimas 2 as ora recorrentes), não se podendo também olvidar que, a “J” – que se encontra formalmente registada como “Pessoa Colectiva”; cfr., fls. 357 e segs. do processo principal a que tivemos acesso – não obstante ter como “sócios” as mesmas 4 sociedades que constituem o atrás referido consórcio “G”, é uma sociedade comercial, ou melhor, um “agrupamento de interesse económico”, (cfr., at. 489° do C. Comercial de Macau), que não deixa de constituir uma “pessoa colectiva”, “autónoma”, “distinta” e “independente”, e que, aliás, não foi parte no aludido contrato de prestação de serviços de operação e manutenção da Central de Incineração de Resíduos Sólidos de Macau, da Estação de Tratamento de Resíduos Especiais e Perigosos de Macau e das Instalações de Tratamento de Resíduos Alimentares, (em 27.04.2023 celebrado com o consórcio “G”, e que vigorou até 30.11.2024), nem tão pouco se apresentou ao “concurso público” a que respeita o “acto de adjudicação” cuja suspensão de eficácia as ora recorrentes pretendem.

Dest’arte, impõe-se pois concluir que as ditas recorrentes, que com a “C” constituíram um outro – e novo – “consórcio” para efeitos de admissão ao dito concurso público, constituem também, enquanto tal, uma “pessoa colectiva distinta” e, necessariamente, autónoma e independente da aludida “J”, sem esforço se mostrando de constatar desta forma que os alegados “prejuízos” agora invocados (como seus), são, como atrás se deixou adiantado, prejuízos que apenas a esta (“J”) dizem respeito; (neste mesmo sentido, veja-se o douto Parecer do Ministério Público junto aos presentes autos, cfr., fls. 858-v, onde, entre o demais, salienta que “é irrefutável é que a J é sociedade autónoma em relação às três componentes do “Consórcio Requerente” supramencionado, pese embora as sociedades “A” e “B” sejam sócias dela”, observando ainda que “é aplicável ao caso sub judice a jurisprudência autorizada e consolidada que vem asseverando – cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º56/2011, n.º86/2016 e n.º59/2019 –: O requerente da suspensão da eficácia de acto administrativo não pode vir a defender os interesses de um terceiro, atento o disposto no artigo 33.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), pelo que tais prejuízos não relevam como integradores do requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do mesmo Código”).

Aliás, basta até ver que as próprias recorrentes, (e ainda que implicitamente), também reconhecem que, em bom rigor, são pessoas colectivas “distintas” (e que não se confundem), pois que não deixam de afirmar que quando submeteram a sua proposta a concurso, declararam, expressamente, que no caso de “o consórcio constituído pela A-B-C vencer o concurso e obtida a autorização prévia da RAEM, este consórcio está disposto a subcontratar os serviços da "J"”; (sub. nosso).

Ora, é sabido que atenta a evolução natural das coisas e tendo em conta os princípios da “liberdade de associação” e da “liberdade contratual”, possível é a celebração de vários tipos de acordos pelos quais as suas partes se vinculam a prosseguir um “fim comum” e a “cooperar para a sua realização” – cfr., o atrás citado art. 489° do C. Comercial, nos termos do qual “Dois ou mais empresários comerciais podem, sem prejuízo da sua personalidade jurídica, constituir entre si um agrupamento de interesse económico, a fim de facilitar ou desenvolver a sua actividade económica ou melhorar ou aumentar os resultados da mesma” – sendo disso exemplo típico em direito empresarial e das sociedades as “joint ventures”; (cfr., v.g., Ana F. N. Martins de Sousa in, “O Contrato de Joint Venture”, podendo-se também, no que toca ao “consórcio” nos presentes autos referido, cfr., o art. 528° do C. Comercial, onde se prescreve que “Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou colectivas, que exercem uma actividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa actividade ou efectuar certa contribuição com o fim de prosseguir qualquer dos objectos referidos no artigo seguinte”).

E, nesta conformidade, em face do que da factualidade provada resulta, e tal como se referiu no atrás citado Acórdão deste Tribunal de Última Instância de 25.05.2011, (Proc. n.° 14/2011), “Sendo pessoas colectivas diferentes, os prejuízos causados pela execução do acto administrativo a uma não podem ser imputados pura e simplesmente a outra, mesmo com posição social dominante sobre aquela, com o fim de justificar a suspensão de eficácia do acto”.

Aqui chegados, cremos pois que à vista está a necessária solução para a presente lide recursória, pois que, com excepção dos pelas ora recorrentes alegados prejuízos da referida “J”, os restantes, como de forma assertiva e esclarecida se deixou consignado no Acórdão agora recorrido, ou não se podem considerar como tal, sendo antes aspectos próprios e típicos de qualquer actividade comercial, ou, quando muito, ainda que se possam considerar “prejuízos”, não tem certamente a “qualidade” e “intensidade” exigida para se considerar de “difícil reparação”.

E, sendo, como se viu, os “requisitos” em questão do art. 121° do C.P.A.C. de “verificação cumulativa”, imperativa é a confirmação do decidido.

Uma derradeira nota.

A final, e ainda que subsidiariamente, dizem também as ora recorrentes que o Acórdão recorrido padece de “insuficiência da matéria de facto”, pedindo a baixa do processo ao Tribunal de Segunda Instância para o seu suprimento.

Ora, temos para nós que o assim “peticionado” é manifestamente improcedente e “raia a má fé”!

–– O número concreto de “trabalhadores não residentes”, nem sequer foi pelas recorrentes oportunamente alegado, sendo assim, e desde já, “matéria nova”, pelo que, para além de não ser relevante por dizer respeito à “J”, de forma alguma poderia justificar o imputado “vício” e consequente devolução dos autos ao Tribunal de Segunda Instância para pronúncia.

–– Por sua vez, quanto à consideração que o “o Tribunal Recorrido não apurou, para a apreciação do preenchimento do requisito do artigo 120º, n.º 1, al. a) do CPAC, se existe (ou não) uma dependência funcional e operacional do consórcio formado pelas Recorrentes na J para a execução do Contrato, cfr. a proposta apresentada pelo consórcio das Recorrentes que demonstra a intenção de manter a J enquanto vector para o fornecimento dos serviços e mantendo a continuidade e estabilidade do funcionamento das instalações”, (cfr., concl. JJ), afigura-se-nos que se apresenta como mais uma “manobra” da atrás já referida “colagem”, (assim como uma tentativa para se prolongar o “status quo”), o que, como é deveras evidente, não se mostra de reconhecer qualquer mérito.

Dest’arte, e em face do que se deixou explicitado, resta deliberar como segue.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos que se deixaram expendidos, em conferência, acordam negar provimento ao presente recurso.

Custas pelas recorrentes com a taxa de justiça que se fixa em 15 UCs.

Registe e notifique.

Macau, aos 18 de Julho de 2025


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Song Man Lei
Choi Mou Pan

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Mai Man Ieng

1 Acórdão do TUI nos autos de recurso n.º 33/2009, de 4 de Novembro de 2009; Acórdão do TSI nos autos de recurso n.º 799/2011, de 15 de Dezembro de 2011.
2Acórdãos do TUI nos processos n.ºs 33/2009, de 4 de Novembro de 2009 e 69/2018, de 27 de Setembro de 2018, e Acórdão do TSI no processo n.º 569/2011/A, de 20 de Outubro de 2011.
3Acórdão do TUI no processo n.º 43/2011, de 21 de Setembro de 2011.
4 Quanto à comparabilidade, cfr. Acórdãos do TSI no processo n.º 513/2024/A, de 7 de Novembro de 2024 e no processo n.º 702/2011/A, de 24 de Novembro de 2011.
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