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Processo n.º 781/2024
(Autos de recurso jurisdicional)

Data: 17/Julho/2025

Recorrentes:
- (A), (B), (C), (D), (E), (F), (G) e (H) (autores)

Recorrida:
- Região Administrativa Especial de Macau (ré)

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
(A), (B), (C), (D), (E), (F), (G) e (H), melhor identificados nos autos (doravante designados por “autores” ou “recorrentes”), intentaram junto do Tribunal Administrativo acção sobre contratos administrativos contra a Região Administrativa Especial de Macau (doravante designada por “ré” ou “recorrida”).
Por decisão do Tribunal Administrativo, foi julgada improcedente a acção e, consequentemente, foi a ré absolvida dos pedidos.
Inconformados, recorreram os autores jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formularam as seguintes conclusões:
     “1. Nos termos do artigo 556º, n.º 2 do Código de Processo Civil, a matéria de facto deve especificar os factos provados e os não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para formar a convicção do julgador.
     2. Porque está prevista esta, diligência em momento prévio ao da sentença é que o artigo 562º, n.º 2 do Código de Processo Civil se basta com a indicação dos factos provados relativamente aos quais haverá de fazer-se a subsunção jurídica.
     3. Nos termos do artigo 571º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto que justificam a decisão. E, nos termos da respectiva alínea d), é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
     4. O Tribunal a quo não identificou factos não provados nem justificou a sua não indicação, e tais factos são essenciais ao bom julgamento da causa, pelo que a sentença recorrida é nula.
     5. Nos termos do artigo 429º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, o Tribunal só pode conhecer o mérito da causa são o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação dos pedidos ou de excepção peremptória.
     6. Sucede que há matéria de facto que se mantém controvertida quanto ao julgamento realizado, pelo que o Tribunal a quo não podia ter proferido saneador-sentença, antes devendo ter prosseguido para a fase seguinte.
     7. Assim o impõe, igualmente, a referência feita no artigo 430º, n.º 1 do Código de Processo Civil à selecção “da matéria de facto relevante, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito”: quando haja várias soluções plausíveis de direito e matéria de facto controvertida, o Juiz deve fazer prosseguir os autos para a fase de instrução.
     8. Efectivamente, um dos pressupostos da aplicação do artigo 429º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil é o de não existirem outras soluções plausíveis a carecer indagação rectius instrução, sendo este o resultado da interpretação sistemática deste inciso com o disposto no artigo 430º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
     9. Ao proferir saneador-sentença, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, com violação do disposto nos artigos 429º, n.º 1, alínea b), n.º 3 e 430º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
     10. Com assento em documentos integrados no processo e atendendo à posição assumida pela RAEM na contestação, era forçoso que se desse como provada a factualidade referida no ponto 90º desta peça.
     11. Nos termos do artigo 629º, n.º 4 do Código de Processo Civil, quando seja deficiente o julgamento da matéria de facto ou indispensável a ampliação da matéria de facto, o Tribunal de Segunda Instância anula a decisão proferida na primeira instância.
     12. Outra da matéria alegada na petição inicial e que ainda não se encontra provada nesta fase consta do processo administrativo instrutor, a que a Recorrente teve acesso no processo de recurso contencioso de anulação da decisão do Chefe do Executivo de declarar a caducidade da concessão, devidamente identificado nos Factos Provados.
     13. A demais matéria de facto alegada na petição inicial deve ser objecto de requerimento probatório.
     14. Nos termos dos artigos 430º e 431º do Código de Processo Civil, só após o Tribunal decidir qual a matéria assente e qual a matéria controvertida é que as partes são notificadas para requererem as provas.
     15. Em face de todo o referido, bem se vê que há matéria alegada na petição inicial que deveria ter sido julgada provada, dentro das várias soluções plausíveis de direito, e não o foi, assim o impondo o disposto no artigo 562º, n.º 3 do Código de Processo Civil.
     16. E havia matéria controvertida a carecer da parte do Tribunal a quo a sua identificação concreta, nos termos do artigo 430º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, o posterior requerimento de prova, nos termos do artigo 431º, n.º 1 do Código de Processo Civil, e a ulterior instrução, nos termos dos artigos 433º e ss do Código de Processo Civil.
     17. Ao assim não ter procedido, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto provada, em violação do disposto no artigo 562º, n.º 3 do Código de Processo Civil e, ao não identificar a matéria controvertida, em erro de julgamento com violação do disposto nos artigos artigo 430º, n.º 1, alínea b), 431º, n.º 1 e 433º e ss do Código de Processo Civil.
     18. Impõe-se a modificação da decisão de facto, nos termos do artigo 629º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil, quanto aos factos referidos no ponto 90 desta peça e a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo para que proceda à selecção da matéria de facto e ulteriores passos processualmente previstos quanto à matéria de facto controvertida ainda carecida de prova, nos termos do artigo 629º, n.º 4 do Código de Processo Civil, com vista à ampliação da decisão sobre a matéria de facto.
     19. O artigo 1864º do Código Civil de Macau assegura a transmissibilidade dos direitos patrimoniais, incluindo para prosseguir com acções de indemnização já iniciadas pelo falecido ou para propor novas acções baseadas em direitos do de cujus.
     20. Mesmo que a concessão não seja automaticamente transferida aos herdeiros com o falecimento do concessionário, esses herdeiros possuem legitimidade para exigir uma indemnização, independentemente da execução do contrato. Esse direito indemnizatório, surgido pela inexecução do contrato, é um direito distinto e autónomo que é transmitido aos herdeiros com a morte do titular, protegendo o seu património e garantindo a possibilidade de prosseguir ou iniciar acções de indemnização.
     21. O Tribunal a quo, partindo da premissa correcta de que os herdeiros sucedem no direito à indemnização do concessionário falecido, conforme a regra da transmissibilidade dos direitos patrimoniais, concluiu, erroneamente, que os recorrentes não discutiam responsabilidade contratual.
     22. Surpreendentemente, o Tribunal a quo defendeu que dada a configuração da causa de pedir e do pedido a questão em litígio não se referia à responsabilidade contratual, mas sim a uma suposta “situação de impossibilidade inalterada”, justificando o pedido de indemnização apenas com base na extinção do contrato, veja-se.
     23. Porém, não deve ser a matéria que aqui está em discussão – não foi nesse pressuposto que os Autores tencionavam estruturar a causa de pedir e o pedido que definem o presente litígio, não obstante da referência, na sua petição inicial, a todo o acontecimento que antecedeu a morte do concessionário – para eles, não basta que os comportamentos activos ou omissivos da contraparte que se verificavam anteriormente ao falecimento do concessionário, o que mais interessa, na tese deles, seria a permanência de uma situação de impossibilidade inalterada de modo a tornar-se definitiva face a data do termo do prazo contratual ou ainda mais tarde â da prática do acto da declaração da caducidade da concessão, e só assim justificaria o arbitramento da indemnização com inclusão do montante de lucros cessantes que só se esperaria com a conclusão hipotética do aproveitamento.
     24. Ao contrário do que diz o Tribunal a quo, a causa de pedir e o pedido de responsabilidade contratual foram estruturados pelos recorrentes com base em factos concretos que demonstram a existência de um contrato, a violação de deveres contratuais pela Administração, conforme o quadro normativo aplicável.
     25. Esses factos, devidamente integrados nas normas jurídicas pertinentes, comprovam a existência de um contrato, a sua violação, e o nexo de causalidade entre essa violação e os danos sofridos.
     26. A causa de pedir foi configurada com factos jurídicos concretos, dentro da relação contratual vigente até à morte do concessionário, e o pedido foi formulado com base nesses factos, devidamente delimitados pelas normas jurídicas aplicáveis.
     27. São justamente esse complexo de factos jurídicos ocorridos durante a vigência do contrato, até o falecimento do concessionário, que constituí o cerne da causa de pedir sobre responsabilidade contratual e que o tribunal deu como provados.
     28. Em síntese:
     a. 16 de Novembro de 1989: (I) recebeu a concessão de um terreno de 3.409m2 na Rua dos Currais, Macau, por meio do Despacho n.º 129/SAOPH/89, para a construção de um edifício de 13 pisos destinado a fins comerciais e de apoio a oficinas de automóveis.
     b. (I) pagou integralmente o prémio acordado de MOP8.128.000,00.
     c. 14 de Setembro de 1992: A DSSOPT informou (I) que o projecto de arquitectura submetido em 13 de Junho de 1990 foi considerado passível de aprovação, condicionado à eliminação do posto de abastecimento de combustível.
     d. 1993: Devido a alterações na Planta Oficial de Alinhamento, (I) submeteu um projecto rectificado de arquitectura. Em 27 de Outubro de 1993, a DSSOPT considerou o projecto passível de aprovação, permitindo modificações na área de construção e no uso do rés-do-chão.
     e. Em 10/12/1998 a Administração, através do Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica, recomendou reavaliar a construção do edifício devido a questões ambientais, económicas e de segurança, sugerindo que a relocalização das oficinas automóveis não era mais desejável na área.
     f. 9 de Outubro de 2000 e 29 de Maio de 2001: (I) solicitou a devolução do prémio pago, devido à impossibilidade de construir o edifício conforme o contrato de concessão.
     g. 9 de Novembro de 2001: A administração recusou o pedido de restituição do prémio e propôs alterar a finalidade da concessão de “Indústria” para “Habitação”, emitindo uma nova Planta de Alinhamento Oficial.
     h. 18 de Janeiro de 2002: A DSSOPT solicitou que o concessionário cedesse temporariamente o terreno à Administração para a instalação de um terminal provisório de autocarros, suspendendo os direitos de concessão por dois anos.
     i. 7 de Outubro de 2002: O terreno foi entregue à Administração conforme acordo entre as partes.
     j. Fevereiro de 2003: Foi criado um parque de estacionamento no local, destinado a veículos pesados de transporte público, por despacho do Chefe do Executivo.
     k. Junho e Julho de 2004: Após o término do período de dois anos, o concessionário solicitou a devolução do terreno, sem sucesso.
     29. E dando como provado os factos mencionados no conclusão anterior, demonstra que o Tribunal a quo compreendeu cabalmente a petição inicial, compreendeu qual a fonte do crédito invocado, qual a causa de pedir e o pedido dos recorrentes, caso contrário, não tinha 1) feito a menção bem explicita e fundamentada que a causa de pedir não era a responsabilidade contratual mas a surpreendente “situação de impossibilidade inalterada”, 2) considerado provados a maioria dos factos relevantes, devidamente integrados nas normas jurídicas aplicáveis, demonstrando a existência de um contrato, a violação dos deveres contratuais e o nexo de causalidade entre essa violação e os danos sofridos.
     30. Ou seja, a estrutura de causalidade entre a causa de pedir e o pedido, tal como delineada pelos autores na petição inicial e no conjunto dos seus articulados, foi suficientemente clara e coerente para permitir ao Tribunal a quo uma compreensão plena e inequívoca.
     31. Factos esses que foram suficientes para demonstrar a existência de um contrato, a violação dos deveres contratuais pela Administração, e o nexo de causalidade entre essa violação e os danos sofridos pelos recorrentes.
     32. A tese insólita do Tribunal a quo sobre a “situação de impossibilidade inalterada” incorre num grave erro de análise.
     33. Esta “impossibilidade inalterada” resulta directamente de um conjunto de acções e omissões do concedente, começando pela decisão de relocalizar o projecto sem respeitar a cláusula original de utilização do terreno, passando pela não devolução do premio apesar da alteração nunca concretizada da finalidade da concessão, até à cedência temporária do terreno, que nunca foi devolvido. Tais fatos configuram um claro incumprimento contratual por parte da Administração.
     34. Assim, a tese defendida pelo Tribunal a quo, “impossibilidade inalterada”, na verdade, é fruto da violação dos deveres contratuais fundamentais por parte do concedente, especialmente os relacionados ao uso e aproveitamento do terreno pelo concessionário.
     35. O contrato de concessão celebrado, impunha ao concedente obrigações claras e vinculativas, entre as quais se destaca o dever de permitir o uso e aproveitamento do terreno concedido segundo as cláusulas contratuais acordadas.
     36. Este dever é central na execução e na economia do contrato, pois sem a possibilidade de utilização do terreno, a concessionário fica impossibilitada de cumprir as suas obrigações contratuais conforme as finalidades estipuladas na concessão.
     37. Quando essa “impossibilidade inalterada” surgiu, foi o concedente quem tinha plena competência para solucioná-la.
     38. Era, portanto, obrigação do concedente praticar os actos necessários para cumprir essas obrigações.
     39. Ao não tomar as medidas necessárias para remover essa “impossibilidade inalterada”, o concedente falhou no cumprimento das suas obrigações principais, incorrendo em incumprimento contratual.
     40. A manutenção dessa “impossibilidade inalterada”, conforme referida pelo Tribunal a quo, especialmente quando persiste até à morte do concessionário, configura um incumprimento definitivo.
     41. Além disso, o concedente tinha o dever de abster-se de qualquer acto que pudesse impedir o aproveitamento do terreno pelo concessionário. Qualquer acção ou omissão que perpetue a impossibilidade de uso do terreno representa uma violação deste dever.
     42. Assim, a “impossibilidade inalterada” não é apenas um estado passivo; ela é consequência directa da violação das obrigações contratuais pelo concedente.
     43. Quando essa impossibilidade se torna definitiva, impedindo a execução do contrato até à morte do concessionário, estamos perante uma violação dos deveres contratuais, que legitima a reparação por parte do concessionário pelos danos causados por tal incumprimento.
     44. Em face de todo o referido, é manifesto que a imputação de danos ao concedente/RAEM é tributária da relação contratual, consubstanciando uma responsabilidade contratual.
     45. E que na fase em que foi proferida a sentença recorrida, esta era, claramente, uma das soluções plausíveis de Direito.
     46. Ao assim não ter entendido, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, com violação do disposto nos artigos 394º, n.º 1, alínea a), parte final do Código de Processo Civil, 752º, n.º 2 do Código Civil e artigos 8º e 173º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo.
     47. A argumentação do Tribunal a quo sobre os lucros cessantes assenta na tese de “situação de impossibilidade inalterada” o que representa um erro de julgamento.
     48. Qualquer direito indemnizatório só pode ser consolidado quando o dano que o fundamenta está efectivamente confirmado.
     49. Enquanto o dano for meramente hipotético não existe lesado que possa reclamar uma obrigação indemnizatória.
     50. Enquanto não houve decisão sobre o pedido de transmissão mortis causa ou declaração de caducidade, os herdeiros mantinham a possibilidade real de obter a modificação subjectiva da posição contratual.
     51. Consequentemente, não se pode falar em existência de um dano real na esfera jurídica dos herdeiros até à declaração de caducidade.
     52. O dano só se concretizou com a declaração de caducidade, momento em que surgiu a obrigação de indemnizar.
     53. É esta a base do pedido de lucros cessantes, e não qualquer hipótese ou suposição infundada por parte dos herdeiros.
     54. Outra questão relevante é determinar se os herdeiros têm ou não direito a esses lucros cessantes, tendo em conta a responsabilidade contratual à luz do contrato original de 1989 ou de um possível acordo de revisão contratual em 1999/2005.
     55. Contudo, essa matéria é controvertida e de mérito, exigindo uma análise específica.
     56. Devido à sua natureza controvertida, o Tribunal a quo deveria, ao abrigo os artigos 430º e 431º do Código de Processo Civil, ter notificado as partes para requererem provas ou alterarem os requerimentos probatórios após a decisão sobre a matéria assente e controvertida.
     57. Parte da matéria alegada na petição inicial, especialmente a relacionada com o mérito dos lucros cessantes, deveria ter sido incluída no questionário para ser objecto de requerimento probatório, mas não foi.
      58. Ao não proceder dessa forma, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, em violação do artigo 562º, n.º 3 do Código de Processo Civil, e ao não identificar a matéria controvertida, violou os artigos 430º, n.º 1, alínea b), 431º, n.º 1 e 433º e seguintes do Código de Processo Civil.
     59. Com o devido respeito, impõe-se a revogação da sentença proferida.
     60. Requer-se a modificação da decisão de facto, conforme o artigo 629º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil e a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo para que proceda à selecção da matéria de facto e tome as medidas processuais necessárias relativamente à matéria de facto controvertida ainda carecida de prova, conforme o artigo 629º, n.º 4 do Código de Processo Civil, com vista à ampliação da decisão sobre a matéria de facto.
     61. A argumentação do Tribunal a quo, presente na alínea 3, pág. 19 e seguintes da sentença, acerca da “pretensão indemnizatória formulada sobre os restantes danos patrimoniais invocados nos artigos 132º a 151º da petição inicial” revela um erro de julgamento ao afirmar que esses prejuízos não são indemnizáveis no âmbito da responsabilidade civil, delitual ou contratual.
     62. A questão da “situação de impossibilidade inalterada” invocada pelo Tribunal a quo na configuração da acção foi abordada anteriormente e reforça-se aqui a crítica à sua adopção.
     63. O Tribunal a quo incorre em contradição ao afirmar que a manutenção da “situação de impossibilidade inalterada” não é relevante para a pretensão indemnizatória, ignorando os fatos que demonstram o contrário.
     64. O Tribunal a quo sugere, de forma errónea, que os herdeiros tinham interesse na manutenção dessa situação para fundamentar um pedido de indemnização, desprezando a relevância dos fatos ocorridos após a morte do concessionário.
     65. É incorrecto afirmar que os herdeiros precisariam esperar pela extinção do contrato para requerer a indemnização, pois o artigo 1864º do Código Civil de Macau assegura a transmissibilidade dos direitos patrimoniais, incluindo o direito à indemnização, aos herdeiros do falecido. Os herdeiros, portanto, adquiriram legitimidade para prosseguir com acções de indemnização já iniciadas ou propor novas acções baseadas nos direitos do falecido.
     66. O Tribunal a quo, ao desconsiderar os fatos documentados, demonstra parcialidade ao afirmar que a Administração não foi responsável pelo prolongamento da situação de incerteza entre a morte do concessionário e a declaração de caducidade.
     67. Durante esse período, os herdeiros realizaram inúmeras diligências para obter a autorização da transmissão mortis causa, sem sucesso, devido a Administração, que decidiu integrar o terreno no Plano Conceptual de Intervenção Urbanística da Zona do Posto Fronteiriço das Portas do Cerco e Envolvente, sem resolver a questão da transmissão, o que configura um confisco disfarçado.
     68. Prova disso foi que a Administração reconheceu, em 7 de Julho de 2014, a necessidade de autorizar a transmissão mortis causa e negociar a resolução do contrato de concessão, incluindo a restituição do prémio e dos juros devidos, mas ao invés de cumprir suas obrigações, arrastou o processo por mais de uma década até a declaração de caducidade.
     59. Fica evidente que a Administração prolongou deliberadamente o processo para evitar a compensação devida aos herdeiros, demonstrando um claro, interesse em reter o terreno sem pagar a devida indemnização.
     70. Contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, a Administração foi a parte que teve interesse no arrastamento do procedimento de decisão da transmissão mortis causa, e não os herdeiros.
     71. O Tribunal a quo errou ao afirmar que o concessionário, no momento de seu falecimento, não tinha direito a qualquer indemnização, ignorando o incumprimento definitivo do contrato original pela Administração.
     72. O incumprimento definitivo do contrato não decorre da falta de tempo para o aproveitamento do terreno, mas sim da relocalização do projecto, decidida unilateralmente pela Administração, o que impossibilitou a execução do objecto do contrato.
     73. A decisão da Administração de relocalizar o projecto, sem devolver o prémio, constitui um incumprimento fundamental do contrato, evidenciando a responsabilidade da Administração.
     74. A localização específica do terreno concedido era uma condição essencial para o concessionário ao celebrar o contrato, e a sua alteração unilateral pela Administração impossibilitou a realização do objecto contratual.
     75. A modificação da localização do projecto por parte da Administração, sem qualquer culpa do concessionário, caracteriza um incumprimento definitivo das obrigações contratuais.
     76. Diante da impossibilidade de realizar o objecto do contrato devido à relocalização imposta, o concessionário tinha o direito de exigir a devolução integral do prémio pago e a indemnização pelos prejuízos sofridos.
     77. Além do incumprimento contratual, a suspensão dos direitos de concessão e a cessão temporária do terreno à Administração evidenciam uma interferência directa na execução do contrato.
     78. Em 18 de Janeiro de 2002, a Administração solicitou ao concessionário a cessão temporária do terreno, suspendendo os seus direitos de concessão por dois anos, o que interferiu na execução do contrato.
     79. Após o término dos dois anos, a Administração não devolveu o terreno, prolongando a impossibilidade do concessionário de executar o contrato, o que agravou ainda mais a situação de incumprimento.
     80. A retenção injustificada do terreno pela Administração após o fim do prazo acordado reforça a responsabilidade da Administração pelos prejuízos sofridos pelo concessionário até o seu falecimento.
     81. Em face de todo o exposto, é evidente que a Administração foi responsável pelo incumprimento contratual e deve ser responsabilizada pelos danos causados, conforme previsto no artigo 787º do Código Civil.
     82. Em face de todo o referido, é manifesto que a imputação de danos ao concedente/RAEM é tributária da relação contratual, consubstanciando uma responsabilidade contratual.
     83. E que na fase em que foi proferida a sentença recorrida, esta era, claramente, uma das soluções plausíveis de Direito.
     84. Ao assim não ter entendido, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento com violação do disposto nos artigos 394º, n.º 1, alínea a), parte final, do Código de Processo Civil, 752º, n.º 2 do Código Civil e artigos 8º e 173º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo.
     85. Sobre as pretensões indemnizatórias dos autores, referidas no ponto 2 da sentença, pág. 19 e seguintes, a, mesma inclui não apenas o adquirido por sucessão, mas também o direito próprio deles, decorrente da inércia da administração em decidir sobre os requerimentos de transmissão mortis causa desde 9/8/2006.
     86. A pretensão indemnizatória dos recorrentes foi formulada de maneira autónoma e subsidiária, não de forma cumulativa ao pedido principal.
     87. A formação de um indeferimento tácito, conforme argumentado pelo Tribunal a quo, não equivale a um indeferimento material. Em vez disso, essa figura jurídica destina-se a permitir ao particular o acesso à via contenciosa sem que, necessariamente, se tenha operado uma decisão substancial contrária aos seus interesses.
     88. A Administração tinha a obrigação legal de decidir sobre a transmissão mortis causa, conforme disposto no artigo 11º do CPA. O facto de não o ter feito durante aproximadamente 10 anos representa uma inércia significativa, que não pode ser ignorada, como aparentemente fez o Tribunal a quo.
     89. Ao contrário do que foi decidido, os recorrentes alegaram prejuízos decorrentes da inércia da Administração, sendo esta matéria própria para julgamento, não devendo ter sido sumariamente descartada sem a devida análise dos factos e provas.
     90. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao proferir uma decisão em saneador-sentença, quando ainda existia matéria de facto controvertida que deveria ter sido apreciada na fase de instrução, que impõem a necessidade de decisão sobre o mérito apenas quando os factos estejam todos provados ou sejam irrelevantes para as diferentes soluções jurídicas plausíveis violou os artigos 429º, n.º 1, alínea b), n.º 3 e 430º, n.º 1 do Código de Processo Civil, comprometendo o direito dos recorrentes a um julgamento justo e completo.
     91. Relativamente ao Factum Principis conforme alínea 5) da sentença, a partir da página 22, a pretensão indemnizatória foi solicitada autonomamente e subsidiariamente, e não de forma cumulativa ao pedido principal.
     92. O tribunal argumenta que a invocação do facto do príncipe não sustenta o pedido indemnizatório, particularmente no que concerne aos lucros cessantes. No entanto, essa interpretação não é considerada válida pelos recorrentes.
     93. O Tribunal a quo dá como provado o facto que fundamenta os lucros cessantes, o DL n.º 24/95 de 9 de Junho que aprovou o Regulamento de Segurança Contra incêndio, mas daí não retira as devidas e legais consequências.
     94. Veja-se que o Governador de Macau, que aprovou a concessão, é também o órgão que aprovou o regulamento que limitou os direitos do concessionário.
     95. A Administração reconheceu a necessidade de reequilíbrio financeiro e tentou alterar a finalidade da concessão, mas não conseguiu, por sua culpa, alterar essa finalidade.
     96. A Administração permaneceu vinculada ao contrato original de 1989 e ao dever de reequilíbrio financeiro.
     97. Dado como provado o facto que fundamentou o fait du prince, os lucros cessantes deveriam ter sido incluídos na matéria controvertida.
     98. Nos termos dos artigos 430º e 431º do CPC, as partes deveriam ter sido notificadas para requerer provas sobre a matéria controvertida, o que não ocorreu.
     99. Parte da matéria sobre os lucros cessantes alegada na petição inicial foi ignorada e não foi levada ao questionário para requerimento probatório.
     100. O Tribunal a quo incorreu em erro ao não identificar correctamente a matéria controvertida, violando o artigo 430º e seguintes do CPC. Devido a esse erro de julgamento, deve-se revogar a sentença proferida.
     101. A decisão de facto deve ser modificada, conforme o artigo 629º, n.º 1, alínea a) do CPC. Deve-se ordenar a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo para que se proceda à selecção da matéria de facto e às provas necessárias, nos termos do artigo 629º, n.º 4 do CPC.
     102. No que toca ao enriquecimento sem causa, embora o título não tenha sido invalidado, o certo é que, também não foi executado por culpa exclusiva da Administração até à morte do concessionário.
     103. A Administração agiu de maneira a impedir a execução do contrato de concessão, primeiro ao relocalizar o projecto de forma unilateral, depois ao não proceder com as alterações contratuais necessárias, e finalmente ao não devolver o terreno ao concessionário após a suspensão temporária dos direitos de concessão.
     104. A Administração, ao impedir o aproveitamento do terreno, manteve-se na posse do prémio pago sem proporcionar a contraprestação contratual devida. Isso configura uma situação de enriquecimento sem causa, conforme o artigo 467º do Código Civil, que deve ser sanada com a devolução das quantias pagas pela recorrente.
     105. O princípio jurídico do enriquecimento sem causa sustenta que a RAEM não pode, legalmente, manter as quantias pagas pelo concessionário quando esta não teve a oportunidade de aproveitar o terreno. A retenção dessas quantias pela RAEM é ilícita, dado que o contrato não foi executado devido a ações da própria Administração.
     106. Requer-se a revogação da sentença recorrida, com o reconhecimento de que houve enriquecimento sem causa por parte da RAEM e a restituição das quantias pagas pela recorrente a título de prémio e outras obrigações, nos termos do artigo 467º do Código Civil.
     107. Caso a indemnização não seja deferida, deve-se ao menos aplicar a restituição por enriquecimento sem causa, com base nas falhas e omissões da Administração que impediram o cumprimento do contrato de concessão.
     108. Essas conclusões consolidam o argumento de que a recorrente foi prejudicada pela inércia e decisões unilaterais da Administração, que configuram um enriquecimento sem causa, o que torna a restituição de valores uma questão de justiça e equidade.
     Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o douto suprimento de V. Exa., deve o presente recurso jurisdicional ser julgado procedente, por provado e, sem consequência:
     a) Ser anulada a sentença recorrida;
     Assim não se entendendo,
     b) Ser revogada a sentença proferida, procedendo-se à modificação da decisão de facto provada, nos termos do artigo 629º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil, quanto aos factos referidos no ponto 90º desta peça;
     c) Ser ordenada a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo para que proceda à selecção da matéria de facto e ulteriores passos processualmente previstos quanto à matéria de facto controvertida ainda carecida de prova, nos termos do artigo 629º, n.º 4 do Código de Processo Civil, com vista à ampliação da decisão sobre a matéria de facto face às várias soluções plausíveis em direito;
     d) ser revogada a sentença recorrida no que respeita à indeminização por responsabilidade contratual da titularidade do de cujus, adquirida pelos herdeiros por via da sucessão hereditária, assim se fazendo justiça!”
*
Ao recurso respondeu a recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões alegatórias:
“1. 針對各上訴人在上訴理由陳述提出的質疑,我們完全認同及信服原審法院在被上訴判決就有關問題作出的精闢見解和決定,並以此為基礎,逐一回覆上訴人提出的各項上訴理由。
     - 關於判決無効
     2. 各上訴人認為被上訴判決沒有列出不獲證實的事實及沒有相關事實不獲證實的說明理由,主張被上訴判決存在《民事訴訟法典》第571條第1款b項及d項規定的判決無效;然而不能忽略的是,被上訴判決是一項清理-判決批示,原審法院是由於按照起訴狀描述的事實,顯示各上訴人不具備彼等主張的要求損害賠償的權利,以及彼等主張的損失屬不可補償,即上訴人提出的訴訟請求實屬明顯不能成立。
     3. 儘管清理-判決批示的某些決定具備與判決一樣的效力,但無論從結構角度及目的角度,皆不能將兩者在事實事宜之認定及說明方面的形式要求完全等同。
     4. 一方面,沒有條文規定將《民事訴訟法典》第556條第2款的形式要求適用於清理-判決批示;另一方面,對事實事宜之裁判乃是經過事實事宜之篩選、審判聽證及對事實事宜之辯論之後的產物,並作為適用法律處理案件之實體問題的基礎,則有需要讓訴訟雙方瞭解所有獲證及不獲證事實及相關說明理由,從而判斷其提出的一個或多個訴訟請求在不同解決方法之下成立的可行性,亦便利於之後提出事實爭執尋找理據。
     5. 清理-判決批示旨在審理訴訟上之無效、延訴抗辯、永久抗辦及可立即審理之實體問題,其依據之事實主要以文件書證及訴訟雙方明示或默示之承認作認定,且其餘事實明顯對解決案件的方法沒有重要性,即在這種情況下,“não faz sentido elaborar a correspondente base instrutória e submeter os factos controvertidos a julgamento pela singela razão de que, de acordo com o disposto no art. 646º, nº 4 (即澳門《民事訴訟法典》第549條第4款), jamais o tribunal poderá responder a tal matéria.”(António Santos Abrantes Geraldes, TEMAS DA REFORMA DO PROCESSO CIVIL, Vol. II, 2ª edição, ALMEDINA, p. 135)
     6. 著名的 António Santos Abrantes Geraldes 就清理-判決批示的結構提出以下觀點: “Afigura-se-nos lógico que o juiz resolva prioritariamente as excepções dilatórias e as nulidades, só depois passando à decisão de mérito, embora, depois de um breve relatório, deva enunciar as questões que se suscitam, pela ordem por que irão ser decididas, e discriminar os factos que serão ponderados. O que não tem que existir, em nosso entender, é o respeito integral pela norma do art. 659º (即澳門《民事訴訟法典》第562條) que determina a estrutura da sentença.” (Ob. cit., p. 139 a 140)
     7. 上述精關及實在之見解應予肯定,即清理-判決批示無須列出不獲證事實及相關說明理由,亦即上訴人指責被上訴判決存在之所謂不足,並非清理-判決批示所必需之要素,不構成《民事訴訟法典》第571條第1款b項及d項所規定導致判決無效的原因。
     - 關於審判錯誤 -《民事訴訟法典》第429條第1款b項
     8. 各上訴人認為被上訴判決沒有認定第24/95/M號法令核准的《防火安全規章》的生效,以及行政當局臨時借用涉案土地的情節妨礙原承批人(I)執行土地批給合同,並導致不能獲得任何經濟利益的事實,主張有關情節有待調查,並可作為支持其主張的合同民事責任的訴因,則認為仍存在另一可予接受之解決方法,使被上訴判決違反《民事訴訟法典》第429條第1款b項及第430條第1款的規定。
     9. 首先,被上訴判決認定了《防火安全規章》的生效及行政當局臨時借用涉案土地的情節,並且十分清楚及詳盡地分析及指出,各上訴人主張的客觀事實,包括上述兩項情節,即便獲得證實,亦明顯不足以支持認為原承批人及各上訴人有可能具備在起訴狀主張的、無論是依據合同民事責任、非合同民事責任、情事變更或「王子行為」等機制而請求賠償的權利,亦即起訴狀主張的全部客觀事實皆明顯不足以支持各上訴人主張實現的法律效果。
     10. 再者,依據客觀資料,是由於原承批人一直沒有履行清遷涉案土地上的非法佔用的義務,直至1992年11月15日利用期屆滿之日仍然沒有完成土地利用,即原承批人違反了合同義務且其後亦因未符合行政當局的要求而未獲延長利用期,導致涉案土地一直沒有被利用,有關狀況的維持與在之後才生效的《防火安全規章》無關;到了2002年,原承批人自願向行政當局借出涉案土地,及後行政當局與原承批人商討涉案土地之事宜時,是原承批人堅持要求行政當局替其履行上述清遷義務而一直拒絕接收涉案土地;易言之,上述兩項情節根本明顯不可能構成行政當局妨礙原承批人利用涉案土地的事實。
     11. 申言之,被上訴判決已就相關重要的客觀事實作出充分的認定,亦對相關重要的法律問題作出精湛的分析,穩妥地判定出有關事實明顯不足以支持各上訴人提出的任何一項賠償請求,不存在各上訴人主張的違法瑕疵。
     - 關於審判錯誤 - 事實事宜不足
     12. 各上訴人認為應認定其列於第90點載於起訴狀的事實獲得證實,主張被上訴判決違反《民事訴訟法典》第562條第3款及第430條第1款b項等規定,要求根據《民事訴訟法典》第629條第1款a 項變更原審法院就事實事宜所作之裁判,以及根據第629條第4款擴大審判範圍並發回原審法院進行事實事宜之篩選及後續程序。
     13. 對於違反《民事訴訟法典》第562條第3款及第430條第1款b項等規定的主張,各上訴人實質上是重複了上述兩項上訴理由;一方面,被上訴判決是一項清理-判決批示,不適用《民事訴訟法典》第562條當中關於列出不獲證事實及相關說明理由;另一方面,被上訴判決穩妥地判定出各上訴人不具備彼等主張的要求損害賠償的權利,以及彼等主張的損失屬不可補償,即各上訴人提出的訴訟請求實屬明顯不能成立,沒有進行事實事宜之篩選的必要,亦沒有違反《民事訴訟法典》第430條第1款b項及其餘相關的規定。
     14. 對於適用《民事訴訟法典》第629條第1款a項的主張,各上訴人在上訴陳述書狀第90點列出的載於起訴狀的各項事實描述,基本上皆夾雜各上訴人對相關情節的個人主觀理解,又或僅屬各上訴人的個人主觀判斷、結論性陳述或法律理解,被上訴人在答辯狀已對有關內容作出明確爭執,且明顯不能通過卷宗所載文件資料予以證實,則明顯不能適用《民事訴於法典》第629條第1款a項的規定。
     15. 對於適用《民事訴訟法典》第629條第4款的主張,各上訴人並未明確指出到底哪些事實對解決案件具有重要性而需要上級法院擴大審判範圍,僅空泛地聲稱第90點列出的事實有重要性及簡略地重複起訴狀的請求項目,但無清楚說明到底被上訴判決的決定有何不足,哪些事實涉及甚麼可予接受之解決方法並足以支持哪項請求,從而需要作出調查及認定,即未對適用《民事訴訟法典》第629條第4款的規定清楚指明標的,僅要求上級法院依職權為之。
     16. 尊敬的 Viriato Lima 在講解《民事訴於法典》第629條關於撒銷裁判及擴大審判範圍時指出: “Parece que o TSI só o deve fazer se a matéria do quesito ou da base instrutória for essencial para o julgamento da causa, mas não se o facto for irrelevante. A repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, podendo, no entanto, o tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão.” (Ob. cit., p. 704 a 705)
     17. 一方面,各上訴人沒有清楚說明,認定或查證有關事實到底可以給予案件任何不同的可予接受之解決方法,從而可以得出任何不同的決定結果;另一方面,被上訴判決已透徹地指出,本案的關鍵之處在於無論是原承批人還是各上訴人,皆不具備起訴狀主張的要求損害賠償的權利,以及各上訴人主張的損失皆屬不可補償;即查證起訴狀描述的其他情節屬明顯不具重要性,亦不足以撼動被上訴判決的精關見解,改為使各上訴人具備相關權利,即不存在適用《民事訴訟法典》第629條第4款的空間。
     - 關於審判錯誤 - 各上訴人主張的請求賠償權利
     18. 各上訴人在此部分重複了起訴狀描述的內容及夾雜個人見解,主張被上訴判決存在多項審判錯誤,概而言之,是不同意被上訴判決對彼等不具備相關請求賠償的權利的判斷而提出不同的法律理解。
     19. 對於第一項審判錯誤,被上訴判決已清楚闡釋了有關問題:由於各上訴人沒有繼承涉案土地批給合同的承批人地位,彼等可主張的賠償取決於原承批人於去世之時可有之權利,但各上訴人在起訴狀中儘管有描述原承批人在生時與行政當局之間就涉案土地發生的事實,但並非以此為訴因支持彼等提出的合同民事責任的賠償請求;而且上述事實發生之時距離涉案土地批給合同原定完結之日相距甚遠,遑論足以構成導致合同無法履行的理由,當時亦無其他法律依據足以結束涉案土地批給合同,即相關事實不可能構成妨礙合同履行及請求退還已支付的土地溢價金的依據。
     20. 更何況,《防火安全規章》是在1992年11月15日之後,亦即在涉案土地批給合同的利用期屆滿之日之後才生效的,原承批人之前一直沒有履行清遷義務,更沒有按照合同規定完成土地利用,原承批人已經違反了合同義務,其後亦因未符合行政當局的要求而未獲延長利用期,即原承批人當時已一直處於不能利用涉案土地的狀態,因為在利用期屆滿之後,土地承批人已不具備利用土地的權利,亦即無論是上述關於《防火安全規章》還是臨時借用涉案土地的情節,對於各上訴人主張要求賠償的發展費用和喪失利益,皆屬空話。
     21. 對於第二項審判錯誤,按照客觀事實及資料,原承批人在原利用期屆滿之日,未有按照批給合同規定的土地用途及利用程序履行土地利用義務,期間還要求修改土地用途,其後亦因未符合行政當局的要求而未獲延長利用期,導致涉案土地一直處於未被利用的狀態,後來行政當局借用涉案土地,原承批人又因要求行政當局替其履行清遷義務而拒絕接收回涉案土地,即涉案土地未獲完成利用皆因原承批人違反合同義務及過錯行為所致。
     22. 更為重要的是,正如被上訴判決指出,考慮到各上訴人主張的上述事實與涉案土地批給合同原定完結之日相距甚遠,亦無其他法律依據足以結束涉案土地批給合同,即有關事實根本不足以支持各上訴人具備提出相關合同民事責任的賠償請求的權利。
     23. 對於第三項審判錯誤,即關於喪失之利益,我們完全認同被上訴判決的精湛說理;一方面,各上訴人從未獲批准繼承涉案土地批給合同的承批人地位,即從未具備利用涉案土地的權利,更遑論可以主張任何完成土地利用後可能獲得的利益,另一方面,涉案土地批給合同的原利用期早於1992年11月15日屆滿,而原承批人既未完成土地利用程序亦未具備法定條件開展任何興建工程,亦就已不具備利用土地的權利而不能主張任何可獲得的利益。
     24. 被上訴判決已指出,倘若死因移轉的申請不獲批准,如同各上訴人一樣情況的繼承人,應按照第6/80/M號法律舊《土地法》第156條第3款或第10/2013號法律新《土地法》第157條第3款的規定要求相關補償,但這並非各上訴人要求的內容,即各上訴人要求的喪失利益的賠償請求明顯欠缺法律依據。
     25. 第四項審判錯誤,各上訴人除了再強調發生在原承批人去世之前的事實,重申認為是有關事實妨礙原承批人完成利用土地及行政當局違反合同義務,還主張原承批人去世之後的事實,認為行政當局拖延處理死因移轉的申請妨礙各上訴人利用土地及逃避向各上訴人支付賠償。
     26. 對於前者,僅重申我們已表明的上述立場及認同被上訴判決對有關問題的判定;至於後者,我們完全認同被上訴判決的理解,行政當局沒有義務必須批准死因移轉的申請,各上訴人亦從未獲涉案土地批給合同的承批人地位,則更無所謂行政當局拖延處理申請導致各上訴人所有損失的可能,更何況,各上訴人可依據第 6/80/M號法律舊《土地法》第156條第3款或第10/2013號法律新《土地法》第157條第3款的規定,以不獲批准死因移轉的申請的繼承人身份要求相關補償,但各上訴人沒有如此為之。
     27. 第五項審判錯誤,是關於行政當局處理死因移轉的申請的問題;我們毫無疑問地認同被上訴判決的高見,即就算行政當局在處理有關問題方面存在不足,但行政當局沒有義務批准死因移轉的申請,且各上訴人從未獲有關權利,遑論行政當局的行為可導致各上訴人任何喪失的利益,亦正如被上訴判決所指,有關情況既明顯不產生任何喪失的利益,與各上訴人主張的任何損失也沒有因果關係。
     - 關於審判錯誤 -「王子行為」(facto do príncipe)及不當得利
     28. 按照起訴狀,各上訴人以「王子行為」為理由要求賠償造成之損失及喪失之利益;然而,所謂「王子行為」,是指由於客觀上出現情事變更,導致行政合同的私人合同方的最初預期利潤和需要承擔的成本費用出現變化,而在此情況下,公共合同方以高權之地位要求私人合同方仍需履行合同,但需為着上述變化給予私人合同方適當補償的機制。
     29. 正如被上訴判決精關地指出,「王子行為」或其延伸的財政平衡機制,明顯不可能作為各上訴人要求被上訴人賠償彼等主張的造成之損失及喪失之利益的法律依據,即各上訴人以此為依據提出的相關賠償請求明顯不能接納。
     30. 更何況,回復財政平衡的前提是私人合同方有在合同標的改變後作出實際履行合同的行為,因為回復財政平衡不但涉及利潤也涉及成本費用,兩者皆可由於情事變更而出現同向或背向的增減,客觀上倘若私人合同方在之後沒有實際履行合同,無可能將原合同標的與之後的標的作出比較而得出是否真有回復財政平衡的需要;在本案中,原承批人沒有完成土地利用,合同標的亦從未改變,亦就根本不具備客觀條件要求回復財政平衡,各上訴人更不可能以回復財政平衡為由要求任何涉及造成之損失及喪失之利益的賠償。
     31. 關於不當得利的問題,各上訴人以原承批人支付土地溢價金之後發生的事實質疑行政當局沒有理由維持擁有土地溢價金;然而,不當得利是否成立,在於債權人作出導致其有所損失的給付之時,該給付的作出是否具備合理原因,而並非之後發生的事實;就正如被上訴判決指出,原承批人支付溢價金仍基於涉案土地批給合同的條款,且合同未被具追溯效力的決定撤銷,即不可能將行政當局收取的土地溢價金視為不當得利。
     - 最後部分
     32. 對於各上訴人質疑被上訴判決的最後部分內容,被上訴判決已清楚表達有關立場,即基於已詳盡分析各上訴人不具備起訴狀主張的要求損害賠償的權利,以及各上訴人主張的損失皆屬不可補償,從而無需處理被上訴人主張的抗辯理由,實無任何違法之虞。
     綜上所述,請求判處上訴不成立及維持被上訴判決的有關內容。
     最後,請求尊敬的中級法院作出一如既往的公正裁判!”
*
Corridos os vistos, cumpre decidir.
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II) FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
Os ora Autores são herdeiros de (I) que faleceu em 11/5/2006.
(I) foi titular de uma concessão por arrendamento de um terreno, com a área de 3,409m2, composto por três parcelas de terreno a serem anexadas e aproveitadas conjuntamente, situado na Rua dos Currais, destinado à construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 13 pisos afectos às finalidades comercial, industrial e estacionamento.
A dita concessão por arrendamento foi autorizada, com dispensa de hasta pública, pelo Despacho n.º 129/SAOPH/89, publicado no suplemento do Boletim Oficial de Macau, n.º 46, de 16/11/1989 (cfr. doc. n.º 1 junto da petição inicial, a fls. 112 a 116 dos autos).
Fixou-se, no referido despacho, a cláusula segunda – Prazo do arrendamento, com o seguinte teor:
“1. O arrendamento é válido pelo prazo de 25 (vinte e cinco) anos, contados a partir da data da outorga da escritura pública do presente contrato.
2. O prazo do arrendamento fixado no número anterior poderá, nos termos da legislação aplicável e mediante condições a acordar, ser sucessivamente renovado até 19 de Dezembro de 2049.” (idem).
E a cláusula terceira – Aproveitamento e finalidade do terreno, tem o seguinte teor:
“1. O terreno será aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 13 (treze) pisos, que serão afectos à comercialização e apoio oficinal do parque automóvel.
2. O edifício, referido no número anterior, será afectado às seguintes finalidades de utilização:
Comercial: 1.º piso (cerca de 701m2);
Industrial: 1.º piso ao 13.º (cerca de 38 367m2);
Estacionamento: 1.º piso e 4.º (cerca de 1 560m2).” (ibid.)
E além disso, a cláusula quinta – Prazo de aproveitamento, tem o seguinte teor:
“1. O aproveitamento do terreno deverá operar-se no prazo global de 36 (trinta e seis) meses, contados a partir da publicação no Boletim Oficial do despacho que autoriza o presente contrato.
2. Sem prejuízo do estipulado no número anterior, o segundo outorgante deverá, relativamente à apresentação dos projectos, observar os seguintes prazos:
a) 60 (sessenta) dias, contados da data da publicação do despacho mencionado no número anterior, para a elaboração e apresentação do anteprojecto de obra (projecto de arquitectura);
b) 90 (noventa) dias, contados da data da notificação da aprovação do anteprojecto de obra, para apresentação e elaboração do projecto de obra (projecto de fundações, estruturas, águas, esgotos, electricidade e instalações especiais);
c) 45 (quarenta e cinco) dias, contados da data da notificação da aprovação do projecto da obra, para o início das obras.
3. Para efeitos do cumprimento dos prazos referidos no número anterior, os projectos só se considerarão efectivamente apresentados, quando completa a devidamente instruídos com todos os elementos.
4. Para efeitos da contagem do prazo referido no n.º 1 desta cláusula, entender-se-á que, para a apreciação de cada um dos projectos referidos no n.º 2, os Serviços competentes observarão um prazo de 60 (sessenta) dias.
5. Caso os Serviços competentes não se pronunciem no prazo fixado no número anterior, o segundo outorgante poderá dar início à obra projectada 30 (trinta) dias, após comunicação, por escrito, à DSOPT, sujeitando, todavia, o projecto a tudo o que se encontra disposto no RGCU ou quaisquer outras disposições aplicáveis e ficando sujeito a todas as penalidades previstas naquele RGCU, com excepção da falta de licença. Todavia, a falta de resolução, relativamente ao anteprojecto de obra, não dispensa o segundo outorgante da apresentação do respectivo projecto de obra.” (ibid.).
Mais se estabeleceu a cláusula sexta – Encargos Especiais, com o seguinte teor:
“Constituem encargos especiais a suportar exclusivamente pelo segundo outorgante a desocupação do terreno e remoção do mesmo de todas as construções e materiais aí existentes.” (ibid.).
Além disso, a cláusula décima – Prémio do contrato, tem o seguinte teor:
“O segundo outorgante pagará ao primeiro outorgante, a título de prémio do contrato, o montante de $ 8 128 000,00 (oito milhões, cento e vinte e oito mil) patacas, que será pago da seguinte forma:
a) $1 328 000,00 (um milhão, trezentas e vinte e oito mil) patacas, 30 (trinta) dias, após a publicitação no Boletim Oficial do despacho que autoriza o presente contrato;
b) O remanescente, $6 800 000,00 (seis milhões e oitocentas mil) patacas, que vencerá juros à taxa anual de 5%, será pago em seis prestações semestrais iguais de capital e juros, no montante de $ 1 234 540,00 (um milhão, duzentas e trinta e quatro mil, quinhentas e quarenta) patacas, cada uma, vencendo-se a primeira 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir da data do pagamento referido na alínea anterior.”.
O concessionário pagou integralmente o prémio acordado na referida cláusula no valor de MOP8,128,000.00.
Por carta datada de 05/07/1990, o concessionário reiterou à então Direcção dos Serviços de Programação e Coordenação de Empreendimentos (DSPCE) sua intenção de instalar um posto de abastecimento de combustível, dada a finalidade do edifício ser de oficina de automóveis (cfr. doc. n.º 4 junto da petição inicial de fls. 119 dos autos).
Seguidamente em 13/6/1990, apresentou à então Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transporte (DSSOPT) o projecto de arquitectura para a construção de um posto de abastecimento de combustível no rés-do-chão, como serviço de apoio integrado no projecto complexo industrial, com n.º T-3374 (conforme o doc. junto a fls. 1207 a 1221 dos autos).
Por ofício n.º 6656/DEUDEP/90 de 05/12/1990, a DSSOPT respondeu que a instalação de posto de abastecimento de combustíveis não pode ser autorizada sem antes a Administração definir os locais a utilizar para o efeito (cfr. doc. n.º 7 junto da petição inicial de fls. 131 dos autos).
Mais tarde, o concessionário dirigiu uma carta ao então Governador de Macau, datada de 9/12/1991, solicitando a alteração da finalidade para a habitação e comércio, fundamentando-se com a dificuldade de obter suporte legal e apoio para o projecto por parte do Leal Senado e Direcção dos Serviços de Economia (cfr. doc. n.º 11 junto da petição inicial de fls. 135 a 138 dos autos).
A então Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transporte (DSSOPT) por ofício n.º 0570/795.1/SOLDEP/92, datado de 21/7/1992, informou o concessionário que o seu pedido foi indeferido por despacho do então Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas (SATOP) (cfr. doc. n.º 14 junto da petição inicial de fls. 141 dos autos).
E por ofício Por ofício n.º 4616/DEUDEP/92 de 14/9/1992, o concessionário foi informado que por despacho do SATOP de 26/8/1992, o seu projecto de arquitectura (n.º T-3374) foi considerado passível de aprovação, condicionado a cumprir os pareceres do Leal Senado, CEM e Corpo dos Bombeiros (C.B.), bem como eliminar o posto de abastecimento de combustíveis (cfr. doc. n.º 18 junto da petição inicial de fls. 147 dos autos).
Posteriormente, foi publicado o DL n.º 24/95/M, de 9 de Junho (Regulamento de Segurança contra Incêndio).
Por força do n.º 5.9. do artigo 5.º do referido DL, a indústria classificada como de Riscos Ordinários do 2.º Grupo (RO2), deve ser instalada em edifício cuja altura é até 20,5m de altura ou 7.º piso.
A actividade que o concessionário pretendeu desenvolver no edifício em causa enquadra-se em “garagens e oficinas de assistência a veículos, a qual, de acordo com a lista “B” do anexo IV ao RSCI, está classificada como de RO2 (conforme o doc. junto a fls. 174 dos autos).
Em 10/12/1998, foi proferido pelo Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica, o despacho com o seguinte teor:
“Despacho
Informe-se o Gabinete do Sr. SATOP de que, devido à evolução da malha urbana, e sob o ponto de vista ambiental, parece justificável reponderar a construção de um edifício naquela zona com a finalidade inicialmente autorizada. Assim, os pareceres da DSE, com os quais concordei, basearam-se fundamentalmente no interesse do projecto na perspectiva de possível relocalização de uma multiplicidade de oficinas automóveis espalhadas pela cidade de Macau.
Actualmente essa relocalização para a área urbana em causa já não assume a melhoria visada e desejável, por colidir com a zona envolvente entretanto objecto de recentes desenvolvimentos. Assim, melhor seria retomar o projecto noutra do Território (por exemplo, Pac On).
Concluindo, e não obstante dever ser imputável ao promotor do projecto os atrasos que conduziram à situação presente, afigura-se hoje defensível a eventual alteração de finalidade, com pagamento adicional do correspondente prémio, já que também daí advirão proveitos financeiros para o Território, que deverão ser tidos em conta face à recente queda de receitas do OGT.” (conforme o doc. junto a fls. 914 dos autos).
Tendo em vista a impossibilidade da execução do projecto segundo definido nos termos do contrato de concessão, em virtude da alteração das circunstâncias introduzida pela entrada em vigor do referido DL n.º 24/95/M, o concessionário solicitou, por carta dirigida ao Chefe do Executivo da RAEM, de 9/10/2000, a devolução do prémio pago de MOP8,128,000.00, e reiterou o pedido por carta datada de 29/5/2001 (conforme os docs. juntos a fls. 179 a 185 dos autos).
Tal pedido não foi aceite pela Administração que lhe propôs a alteração da finalidade da concessão de “indústria” para “habitação”, e com a subsequente emissão da planta de alinhamento oficial em 9/11/2001 (conforme os docs. juntos a fls. 186 a 193).
Em 18/1/2002, foi acordado entre o concessionário e a Administração que o terreno concedido fosse entregue a esta, a título provisório, para a instalação do Terminal Provisório de Autocarros e Depósito de Materiais e Construção, por um período de 2 anos (conforme o doc. junto a fls. 194 dos autos).
A entrega do terreno foi feita em 7/10/2002, tendo sido lavrado o respectivo auto (conforme o doc. junto a fls. 196 dos autos).
Na sequência disso, foi proferido o Despacho do Chefe do Executivo n.º 24/2003, publicado em 4/2/2003, com a criação de um parque de estacionamento situado junto à Praça das Portas do Cerco e Rua dos Currais, doravante designado por Terminal das Portas do Cerco, com a área de 5.468m2, o qual se destina à instalação do Terminal Provisório de Autocarros e ao uso exclusivo de veículos pesados de transporte público de passageiros (conforme o doc. junto a fls. 197 dos autos).
No entanto, no termo do referido prazo de 2 anos, não foi o terreno devolvido ao concessionário, tendo a Administração o propósito de continuar a utilizar o mesmo até 31/12/2004 (conforme o doc. junto a fls. 922 dos autos).
Por carta dirigida ao Director dos Serviços de Obras Públicas e Transportes de Macau, datada de 27/7/2004, o concessionário insistiu que o terreno lhe fosse devolvido, de forma livre de quaisquer ocupações (conforme o doc. junto a fls. 923 dos autos).
Em 11/5/2006, o concessionário faleceu.
Em 9/8/2006, a Autora (A) , em representação dos herdeiros que aquele deixou, requereu à DSSOPT a autorização para a transmissão mortis causa dos direitos resultantes da concessão de terreno (conforme o doc. junto a fls. 220 a 221 dos autos).
Não tendo obtido qualquer resposta, a Autora (A), em 4/5/2007, dirigiu a carta ao Chefe do Executivo, requerendo que se autorizasse a transmissão da posição de concessionário do falecido (I) para os seus herdeiros (conforme o doc. junto a fls. 224 a 226 dos autos).
Seguidamente, em 22/5/2007, apresentou mais um requerimento dirigido ao Chefe do Executivo, com a junção dos documentos relativos ao processo de inventário facultativo, cujos termos correram com o processo n.º CV1-07-0030-CIV (conforme o doc. junto a fls. 227 a 233 dos autos).
Em 11/5/2009, foi proferida no referido processo judicial a sentença homologatória da partilha sobre o direito resultante da concessão por arrendamento, com a adjudicação aos herdeiros em comum e nos respectivos quinhões (conforme o doc. junto a fls. 311 a 315 dos autos).
A referida sentença transitou em julgado em 25/5/2009.
No entanto, apesar das sucessivas insistências dos herdeiros, não foi decidido sobre o requerimento de transmissão mortis causa até 15/11/2014, no fim do prazo previsto para o contrato de concessão (conforme docs. juntos a fls. 244 a 344 dos autos).
Por Despacho do Chefe do Executivo, de 24/6/2016, tornado público pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 59/2016, publicado no Boletim Oficial n.º 2, II Série, de 11/1/2017, foi declarada a caducidade da concessão do terreno, com o seguinte teor:
“Pelo despacho n.º 129/SATOP/89, publicado no Suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 46, de 16 de Novembro de 1989, foi titulada a concessão, por arrendamento e com dispensa de concurso público, do terreno com a área de 3 409m2, situado na península de Macau, na Rua dos Currais, a favor de (I).
A concessão foi registada na Conservatória do Registo Predial, adiante designada por CRP, ficando o terreno descrito sob o n.º … a fls. … do livro … e o direito resultante da concessão inscrito a favor de (I), falecido em 2006, sob o n.º … a fls. … do livro ….
De acordo com o estipulado na cláusula segunda do contrato de concessão, o arrendamento do terreno é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da respectiva escritura pública. Porém, não tendo sido celebrada a escritura do contrato, por força do disposto no n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 8/91/M, de 29 de Julho, a mencionada concessão passou a ser titulada pelo sobredito Despacho n.º 129/SATOP/89, passando o prazo de arrendamento a contar-se da data da sua publicação.
Segundo o estabelecido na cláusula terceira do mesmo contrato, o terreno seria aproveitado com a construção de um edifício de 13 pisos, em regime de propriedade horizontal, afectos à comercialização e apoio oficinal do parque de automóvel.
O prazo de arrendamento do aludido terreno expirou em 15 de Novembro de 2014 e este não se mostrava aproveitado.
De acordo com o disposto no artigo 44.º e no n.º 1 do artigo 47.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), aplicável por força do preceituado no artigo 215.º desta lei, a concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório, por prazo que não pode exceder 25 anos e só se converte em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente.
As concessões provisórias não podem ser renovadas nos termos do n.º 1 do artigo 48.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras).
Neste contexto, dado que a concessão em causa não se tornou definitiva, é verificada a sua caducidade pelo decurso do prazo.
Assim,
Usando da faculdade conferida pelo artigo 64.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas manda:
1. Tornar público que por despacho do Chefe do Executivo, de 24 de Junho de 2016, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 3 409 m2, situado na península de Macau, na Rua dos Currais, descrito na CRP sob o n.º … a fls. … do livro …, a que se refere o Processo n.º 11/2016 da Comissão de Terras, pelo decurso do seu prazo, nos termos e fundamentos do parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 3 de Março de 2016, os quais fazem parte integrante do referido despacho.
2. Em consequência da caducidade referida no número anterior, as benfeitorias por qualquer forma incorporadas no terreno revertem, livre de quaisquer ónus ou encargos, para a Região Administrativa Especial de Macau, sem direito a qualquer indemnização por parte dos interessados, destinando-se o terreno a integrar o domínio privado do Estado.
3. Do acto de declaração de caducidade cabe recurso contencioso para o Tribunal de Segunda Instância, no prazo de 30 dias, contados a partir da sua notificação, nos termos da subalínea (1) da alínea 8) do artigo 36.º da Lei n.º 9/1999, republicada integralmente pelo Despacho do Chefe do Executivo n.º 265/2004, e da alínea a) do n.º 2 do artigo 25.º e da alínea b) do n.º 2 do artigo 26.º, ambos do Código do Processo Administrativo Contencioso, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 110/99/M, de 13 de Dezembro.
4. Podem ainda os interessados reclamar para o autor do acto, Chefe do Executivo, no prazo de 15 dias, nos termos do n.º 1 do artigo 148.º e do artigo 149.º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M, de 11 de Outubro.
5. O processo da Comissão de Terras pode ser consultado pelos interessados na Divisão de Apoio Técnico da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, sita em Macau, na Estrada de …, n.º …, 18.º andar, durante as horas de expediente, podendo ser requeridas certidão, reprodução ou declaração autenticada dos respectivos documentos, mediante o pagamento das importâncias que forem devidas, nos termos do artigo 64.º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M, de 11 de Outubro.
6. O presente despacho entra imediatamente em vigor.
30 de Dezembro de 2016.
O Secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo Arrais do Rosário.”
Dessa decisão recorreram os Autores para o Tribunal de Segunda Instância, que veio a julgar improcedente o recurso interposto, por Acórdão n.º 243/2017, de 21/3/2019.
Seguidamente, por Acórdão do Tribunal de Última Instância n.º 72/2019, de 30/7/2019, foi negado provimento ao recurso interposto do referido Acórdão do TSI.
Em 4/7/2017, a DSSOPT mediante o ofício n.º 488/795.03/DSO/2017, enviado aos Autores, em que se pronunciou pela desnecessidade de decidir sobre os requerimentos pendentes (conforme o doc. junto a fls. 814 a 815 dos autos).
Pelo despacho proferido em 31/7/2017, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas ordenou o despejo dos herdeiros do concessionário do terreno concedido.
Do referido despacho foi interposto o recurso contencioso pelos Autores.
O acto do Secretário foi mantido pelo Acórdão do Tribunal de Segunda Instância n.º 865/2017, de 28/11/2019 que posteriormente foi confirmado no recurso jurisdicional da decisão, pelo Acórdão do Tribunal de Última Instância n.º 47/2020, de 26/6/2020.
Em 3/2/2020, os Autores intentaram a presente acção no Tribunal Administrativo.
*
Vejamos as questões suscitadas pelos recorrentes.
Da suposta falta de especificação de factos não provados e da falta de fundamentação (da matéria de facto)
Alegam os recorrentes que a sentença recorrida não elenca os factos não provados, nem fundamenta a matéria de facto, o que, segundo eles, infringe o disposto no artigo 556.º, n.º 2 do CPC. Consequentemente, alegam que a sentença é nula, uma vez que o juiz não especificou os fundamentos de facto que justificassem a decisão, nem se pronunciou sobre questões que deveria apreciar, ao abrigo do artigo 571.º, n.º 1, alíneas b) e d) do CPC.
Na nossa perspectiva, e sem embargo de melhor opinião, não se vislumbra a invocada nulidade.
O artigo 556.º, n.º 2 do CPC estabelece que “A matéria de facto é decidida por meio de acórdão ou despacho, se o julgamento incumbir a juiz singular; a decisão proferida declara quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador”. Contudo, entendemos que esta disposição não se aplica ao presente caso, uma vez que, considerando a fase processual em que se encontram os autos, deve ser aplicado o n.º 1 do artigo 429.º, que estabelece: “Realizada a tentativa de conciliação ou, se ela não tiver tido lugar, logo que findem os articulados ou tenha decorrido o prazo a que se referem os n.os 2 e 3 do artigo 427.º, o juiz profere no prazo de 20 dias, e sendo caso disso, despacho destinado a: a) Conhecer das excepções dilatórias e nulidades processuais que tenham sido suscitadas pelas partes, ou que, face aos elementos constantes dos autos, deva apreciar oficiosamente; b) Conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do pedido ou dos pedidos deduzidos ou de alguma excepção peremptória.”
No caso em apreço, a sentença proferida pelo juiz do tribunal recorrido é uma saneador-sentença, ou seja, ainda não foi elaborada a selecção dos factos assentes nem da matéria controvertida, e, por conseguinte, não houve lugar à produção de prova destinada à demonstração dos factos controvertidos.
É evidente que, na hipótese de haver lugar a selecção dos factos assentes e da matéria controvertida, o legislador exige que o juiz especifique quais os factos que, após a produção da prova, considera provados e não provados. Esta especificação é importante, pois permite às partes compreenderem quais as provas que o juiz utilizou na apreciação dos factos controvertidos, para que, em caso de recurso, o tribunal superior possa sindicar se a matéria de facto foi decidida em conformidade com a prova apresentada.
Mas na presente situação, a circunstância é distinta, uma vez que não houve selecção da matéria controvertida.
O legislador permite que o juiz, logo na fase de saneamento, conheça do mérito da causa ou de alguma excepção peremptória, se entender que não há necessidade de produção de mais provas. Ou seja, mesmo que toda a matéria alegada pelas partes esteja provada, o resultado seria o mesmo. Neste caso, não faz sentido prosseguir os autos até final, sob pena de se praticarem actos inúteis.
Como observa Viriato Lima, “o juiz deve conhecer do pedido ou de excepções peremptórias se a actividade instrutória posterior for irrelevante para a decisão final, se não a puder modificar.”1
E é por isso que o legislador não exige a indicação dos factos não provados, porque não há necessidade. Os que não foram elencados podem ser factos jurídicos, conclusivos ou irrelevantes.
E não se diga que, ao não terem sido indicados os factos não provados, as partes interessadas estejam impossibilitadas de reagir contra a matéria de facto. Na verdade, se entenderem que o juiz deixou de considerar algum facto que não seja conclusivo ou que seja pertinente, qualquer das partes podem sempre reagir, não vislumbrando este Tribunal qualquer impedimento legal.
Por não se vislumbrar qualquer violação das normas processuais, inexiste a alegada nulidade de sentença.
Improcede, assim, o recurso nesta parte.
*
Do alegado erro na aplicação do artigo 429.º, n.º 1, alínea b) do CPC
Os recorrentes sustentam que, havendo matéria de facto alegada que esteja provada em documentos ou que seja controvertida, o tribunal recorrido não poderia ter avançado para o saneador-sentença, assumindo apenas uma solução plausível de direito e negando a outra, devendo antes ter seleccionado a matéria de facto relevante.
Conforme refere Abrantes Geraldes, o juiz deve proferir sentença quando toda a matéria de facto estiver provada por confissão expressa ou tácita, ou por documento, ou quando a prova dos factos controvertidos seja indiferente para qualquer das soluções plausíveis.2
Viriato Lima também destaca que “deve ser elaborado despacho saneador-sentença quando todos os factos estão assentes ou os factos não assentes são irrelevantes para a decisão.”3
José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto entendem que, mesmo que haja mais de uma causa de pedir, o conhecimento de uma delas, que prejudique as restantes, no despacho saneador, só deve ter lugar quando haja uma muito razoável margem de segurança quanto à solução a proferir.4
Os recorrentes alegam que existem duas versões contraditórias sobre o comportamento do concedente. Sustentam que a Administração falhou na revisão do contrato e se recusou a devolver o prémio pago, incorrendo em incumprimento contratual, o que impediu o concessionário de executar o objecto do contrato e obter qualquer benefício económico, além de não ter devolvido o terreno após a cessão temporária a terceiros. Assim, defendem que a Administração deve ser responsabilizada por todos os danos sofridos.
Por sua vez, a recorrida apresenta uma versão diferente.
Ficaram provados, entre outros, os seguintes factos:
- Em 10/12/1998, foi proferido pelo Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica, um despacho com o seguinte teor:
“Despacho
Informe-se o Gabinete do Sr. SATOP de que, devido à evolução da malha urbana, e sob o ponto de vista ambiental, parece justificavel reponderar a construção de um edifício naquela zona com a finalidade inicialmente autorizada. Assim, os pareceres da DSE, com os quais concordei, basearam-se fundamentalmente no interesse do projecto na perspectiva de possível relocalização de uma multiplicidade de oficinas automóveis espalhadas pela cidade de Macau.
Actualmente essa relocalização para a área urbana em causa já não assume a melhoria visada e desejável, por colidir com a zona envolvente entretanto objecto de recentes desenvolvimentos. Assim, melhor seria retomar o projecto noutra do Território (por exemplo, Pac On).
Concluindo, e não obstante dever ser imputável ao promotor do projecto os atrasos que conduziram à situação presente, afigura-se hoje defensível a eventual alteração de finalidade, com pagamento adicional do correspondente prémio, já que também daí advirão proveitos financeiros para o Território, que deverão ser tidos em conta face à recente queda de receitas do OGT.”;
- Em 18/1/2002, foi acordado entre o concessionário e a Administração que o terreno concedido seria entregue a esta, a título provisório, para a instalação do Terminal Provisório de Autocarros e Depósito de Materiais e Construção, por um período de 2 anos;
- No entanto, no termo do referido prazo de 2 anos, não foi o terreno devolvido ao concessionário, tendo a Administração o propósito de continuar a utilizar o mesmo até 31/12/2004;
- Por carta dirigida ao Director dos Serviços de Obras Públicas e Transportes de Macau, datada de 27/7/2004, o concessionário insistiu que o terreno lhe fosse devolvido, de forma livre de quaisquer ocupações.
À luz da matéria descrita, não se descortina que o juiz a quo tenha ignorado os factos alegados pelos recorrentes.
Na verdade, a versão factual apresentada pelos recorrentes foi impugnada pela recorrida, alegando que aqueles não descreveram toda a verdade. Mas independentemente de qual versão, se a dos recorrentes ou a da recorrida, seja verdadeira, o juiz a quo considerou que não havia necessidade de mais prova, uma vez que, com base nos factos pertinentes alegados pelos recorrentes, já tinha condições para apreciar os pedidos por eles formulados. Em outras palavras, se, face à matéria pertinente e alegada pelos recorrentes, e independentemente da veracidade da sua versão, o juiz entender que os pedidos dos recorrentes não podem deixar de improceder, nada impede que o juiz conheça do mérito da causa já na fase de saneamento, evitando actos processuais inúteis.
Deste modo, em termos processuais, entendemos que a sentença recorrida não padece do vício apontado.
*
Da alegada insuficiência da matéria de facto
Os recorrentes sustentam que os factos indicados nos artigos 21.º, 24.º a 26.º, 28.º, 29.º, 31.º a 35.º, 37.º, 39.º a 43.º, 47.º, 50.º a 57.º, 59.º a 61.º, 63.º a 72.º, 74.º, 84.º a 86.º, 94.º, 96.º a 123.º, 133.º a 151.º, da petição inicial são pertinentes e fundamentam a responsabilidade contratual e extracontratual da recorrida, defendendo que devem ser seleccionados para a base instrutória.
De acordo com o disposto no artigo 430.º do CPC, o juiz deve selecionar factos controvertidos que sejam relevantes para a decisão da causa.
Os factos cuja inclusão foi requerida pelos recorrentes referem-se a requerimentos e subsequentes respostas, bem como informações emitidas pela Administração e juízos subjectivos por parte dos recorrentes. Na nossa perspectiva, não se vislumbra que sejam factos pertinentes para a causa.
Relativamente aos factos relacionados com prejuízos ou danos, considerando que o juiz decidiu pela improcedência do pedido de responsabilidade, tanto contratual como extracontratual, da Administração, a inclusão desses factos revela-se inócua.
Improcede, assim, o recurso nesta parte.
*
Do alegado erro de julgamento
Ao contrário do que foi sustentado na sentença recorrida, os recorrentes alegam que o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento. Insistem que houve violação contratual por parte da concedente (Administração), a qual consubstancia uma responsabilidade contratual, devendo, assim, os recorrentes ser indemnizados.
Está em causa a seguinte decisão do juiz a quo:
“2. De direito
1) Conforme resulta do que se expôs na petição inicial, a pretensão indemnizatória dos Autores assenta-se na responsabilização da Ré que decorreria, supostamente, da sua violação dos deveres contratuais emergentes do contrato de concessão (conforme se alega nos artigos 152.º a 257.º da petição inicial), subsidiariamente, do “facto do príncipe” ou seja do exercício do poder exorbitante da modificação superveniente do referido contrato celebrado (conforme os artigos 258.º a 310.º), e mais ainda, no plano extracontratual, dos comportamentos que consubstanciam a culpa do serviço (conforme os artigos 311.º a 469.º), ou por acto lícito (conforme os artigos 470.º a 479.º).
Mais alegaram os Autores, em outro lugar da sua petição inicial, que sofreram o prejuízo tanto na vertente de dano emergente como na de lucro cessante que resultou, em última linha, da perda do terreno em causa com a declaração da caducidade da concessão de 24/6/2016, provocada pela prática das condutas descritas como ilícitas (ou lícitas) da Ré que tornaram impossível a execução do contrato por parte do concessionário, com a consequente inviabilização da conclusão do aproveitamento nos termos projectados (conforme se refere nos artigos 130.º a 151.º da petição inicial). Foi esta base que circunscreve o pedido indemnizatório formulado, apesar dos diversos institutos jurídicos invocados.
A nosso ver, uma questão prévia que urge definir antes de se debruçar sobre as concretas pretensões indemnizatórias, é aquela invocada pela contestante (conforme se alega nos artigos 84.º a 118.º, e 289.º a 355.º da contestação), no sentido de apurar a titularidade do direito de indemnização que se arrogam nesta petição inicial, tendo sobretudo em consideração o facto de que o concessionário faleceu em 11/5/2006 e os herdeiros do de cujus nunca chegaram a ser admitidos para suceder, mortis causa, na posição contratual ocupada por aquele.
Nos termos previstos nos artigos 151.º e 156.º da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras), que vigorava ao tempo do falecimento do concessionário, a transmissão por morte de situações decorrentes de concessão provisória não podia ocorrer automaticamente, antes ficava dependente da prática do acto de autorização pelo Chefe do Executivo do requerimento formulado por qualquer herdeiro, no prazo de 90 dias a contar da data do falecimento, sob pena de extinção da concessão.
Mais de acordo com o disposto no artigo 157.º da referida Lei, ainda que esteja instaurado o processo judicial destinado à partilha mortis causa do direito decorrente de concessão provisória, “a sentença não será proferida antes do despacho de autorização ter sido obtido oficiosamente”. Neste aspecto, a lei antiga não se distingue substancialmente da regulamentação introduzida pela nova Lei de Terras – Lei n.º 10/2013, especialmente nos termos previstos nos artigos 152.º, 157.º, n.º 1 e 158.º.
No caso que aqui nos ocupa, pese embora ter sido proferida no processo de inventário facultativo, uma sentença homologatória da partilha, transitada em 25/5/2009, sobre o direito resultante da concessão provisória, com a adjudicação aos herdeiros em comum e nos respectivos quinhões, certo é que tal sentença não podia servir como título válido de transmissão, uma vez que o acto de autorização de que depende a transmissão nunca chegou a ter lugar. E além do mais, para que a transmissão seja titulada por sentença judicial, é ainda precedida de autorização da concedente, por força do artigo 162.º da Lei n.º 6/80/M (correspondente ao artigo 163.º da Lei n.º 10/2013), a qual, naturalmente, também não podia existir no caso concreto. Nesta medida, entendemos nós, a sentença homologatória da partilha só devia produzir os seus efeitos na situação em que é possível a efectivação, nunca podendo incidir sobre o objecto em causa sem a prática do acto de autorização prévia.
Nesta conformidade, deve-se entender que os Autores como herdeiros do concessionário, não adquiram por via da sucessão a posição contratual que este ocupava ao tempo do falecimento. E como tal, é-lhes vedado, pela natureza das coisas, fazer valer o direito que não é deles, que resultaria da posição contratual do concessionário, isto é, o direito de aproveitar o terreno concedido com o alcance dado pelo artigo 1.º do DL n.º 51/83/M, de 26 de Dezembro, não lhes assistindo, por consequência, o direito de indemnização a título do lucro cessante com base na responsabilidade contratual (conforme se alega nos artigos 143.º a 147.º da petição inicial), o qual corresponde ao montante que o concessionário teria obtido se lhe tivesse sido permitido concluir o aproveitamento dentro do prazo contratual, quer à luz do clausulado original da concessão de 1989 para a finalidade inicialmente projectada, quer à do hipotético acordo de revisão contratual de 1999/2005 sobre alteração da finalidade. Numa palavra, se o concessionário faleceu em 2006, sem que tivesse sido autorizada a transmissão mortis causa da posição em favor dos herdeiros, a hipótese de conclusão do aproveitamento até ao fim do contrato em 15/11/2014 nunca se colocaria.
A questão diversa é a de que os herdeiros do concessionário falecido sucederam ao direito de indemnização que competia ao concessionário ao tempo do seu falecimento, por força da regra da transmissibilidade quanto aos direitos patrimoniais (cfr. Inocêncio Galvão Telles, Direito das Sucessões, Noções Fundamentais, p. 93). Contudo é evidente que o direito que lhes seja transmitido deve ser exactamente o mesmo que existia na primitiva titularidade do de cujus. Importava saber, a este respeito, se aquele, antes do seu falecimento em 11/5/2006, já tinha ou não na sua esfera jurídica o direito de indemnização a exercer contra a RAEM, devido à impossibilidade de aproveitamento até então verificada.
Porém, não deve ser a matéria que aqui está em discussão - não foi nesse pressuposto que os Autores tencionavam estruturar a causa de pedir e o pedido que definem o presente litígio, não obstante da referência, na sua petição inicial, a todo o acontecimento que antecedeu a morte do concessionário - para eles, não basta que os comportamentos activos ou omissivos da contraparte que se verificavam anteriormente ao falecimento do concessionário, o que mais interessa, na tese deles, seria a permanência de uma situação de impossibilidade inalterada de modo a tornar-se definitiva face à data do termo do prazo contratual ou ainda mais tarde à da prática do acto da declaração da caducidade da concessão, e só assim justificaria o arbitramento da indemnização com inclusão do montante de lucros cessantes que só se esperaria com a conclusão hipotética do aproveitamento.
Daí, o que vem peticionado nesta parte não se pode integrar no direito de indemnização que existia na titularidade patrimonial do de cujus e que os Autores adquiriram por via da sucessão hereditária, não sendo por isso o mesmo arbitrável em acção da responsabilidade.
2) Nem se deveria dizer que a pretensão indemnizatória, numa outra perspectiva, merecia apoio, se consideramos que o direito de indemnização que se arroga o titular não é apenas o que os Autores adquiriram por via da sucessão, como ainda abrange o direito próprio deles, o qual emergiu como consequência necessária da inércia permanente por parte da Administração na decisão sobre os requerimentos de transmissão mortis causa da posição contratual formulados desde 9/8/2006 (De resto, a suposta falta da revisão contratual, ao contrário do que entenderam os Autores, não lhes confere qualquer direito de indemnização, tanto mais que se eles não foram admitidos para suceder na posição contratual do falecido, nunca teriam o direito à revisão do contrato celebrado).
Em nosso entender, a omissão ilícita resultante da violação do dever de agir da Administração não fundamenta a obrigação de indemnizar nos termos pretendidos pelos Autores.
Não parece controverso que impende sobre a Administração o dever de decidir sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados pelos particulares, por força do disposto no artigo 11.º do CPA, e tal decisão, na falta da determinação do prazo para o efeito, deve ser tomada dentro do prazo razoável por modo a assegurar a respectiva celeridade, a economia e eficiência, segundo o previsto no artigo 12.º do Código. Além do mais, é também pacífico que a demora na prolação do acto acarreta os prejuízos indemnizáveis ao interessado, sendo por isso susceptível de gerar a responsabilidade civil.
Porém, a especificidade da situação aqui em apreço deve afastar a hipótese de ressarcimento do qualquer prejuízo que decorra da demora na prática do acto solicitado. Concretizando, entendemos que a falta da decisão administrativa até ao momento da declaração da caducidade da concessão sobre o requerimento que foi pela primeira vez apresentado em 9/8/2006 não é de todo imputável à Administração, porquanto não tendo tal decisão sido tomada dentro do prazo previsto no artigo 102.º do CPA, se forma um indeferimento tácito, abrindo-se desse modo aos particulares a via contenciosa contra omissões verificadas, sendo o recurso ao meio contencioso um instrumento idóneo a evitar a produção de danos que adviessem em consequência da permanente inércia administrativa. Sucedeu a este respeito que nada fizeram os Autores do caso concreto, nunca chegaram estes, em vez de sempre renovarem o pedido com o mesmo teor perante a Administração, a optarem por via contenciosa para que a Administração tomasse posição inequívoca sobre o assunto.
Em segundo lugar, não foi alegado nenhum tipo de prejuízo pertinente como resultante da situação da inércia que se prolonga no tempo. É de reiterar que não é indemnizável aqui qualquer prejuízo que o lesado venha alegar, mas sim o prejuízo provocado, de modo autónomo, com a dilação ocorrida na tomada da decisão sobre a matéria submetida pelo particular. O que implica a averiguação da existência do nexo causal segundo a teoria de causalidade adequada.
À luz da directriz plasmada nos artigos 556.º e 557.º do Código Civil de Macau, a questão quanto à indemnizabilidade dos danos invocados no caso concreto, em especial, os lucros cessantes, deve-se colocar pela seguinte forma - os Autores teriam ou não auferido os proveitos esperados com a conclusão do aproveitamento nos termos previstos no contrato de concessão, se não houvesse qualquer demora na decisão sobre o requerimento de transmissão hereditária?
Quanto a nós, a resposta é óbvia no sentido de que tal lucro pretendido pelos Autores não é sequer espectável, na medida em que eles não têm direito à prática do acto favorável, não sendo a Administração vinculada a autorizar o requerimento apresentado para estes sucederem na posição do concessionário, vinculações cuja existência que os próprios Autores aliás não especificaram, muito menos lograram demonstrar, porque não existem.
Conforme resulta do artigo 156.º da Lei n.º 6/80/M, “O Governador (leia-se Chefe do Executivo) pode denegar a autorização com fundamento de que os herdeiros não oferecem garantias para o cumprimento das condições da concessão.”, ao passo que segundo o previsto no artigo 157.º, n.º 2 da lei nova, “o Chefe do Executivo pode indeferir a transmissão com o fundamento de que os herdeiros manifestamente não conseguem assegurar o cumprimento das obrigações previstas na concessão…”. (sublinhado nosso). Numa norma e noutra, a presença da margem de discricionariedade administrativa sobre a matéria em causa afasta o dever de decidir do órgão decisor de acordo com a pretensão do particular, e este último, em contrapartida, pode apenas legitimamente contar com uma mera decisão sobre o objecto da pretensão, seja em que sentido for (veja-se, a propósito dos diferentes graus do dever de decidir, O incumprimento do dever de decidir, Justiça Administrativa n.º 54, Novembro/Dezembro 2005, pp. 8 a 10).
Nesta linha de consideração, se a Administração nunca é vinculada a deferir o requerimento na altura apresentado pelos herdeiros do concessionário falecido sobre a transmissão mortis causa da posição contratual, a coerência lógica exige que no plano hipotético, mesmo uma actuação administrativa lícita, ou seja, uma decisão pronta e rapidamente tomada sobre o requerimento não permitisse aos Autores evitar os danos causados com a aquisição hereditária da posição do concessionário e a consequente conclusão do processo do aproveitamento nos termos previstos no contrato.
Isto dito, não é possível, pela falta do nexo causal adequado exigido pelo artigo 557.º do CCM, fazer ressarcir o prejuízo a título dos lucros cessantes, partindo-se da indecisão da Administração sobre os requerimentos de transmissão mortis causa da posição contratual, que lhe foram dirigidos desde 9/8/2006, por via do instituto de responsabilidade extra-contratual ilícita ou lícita.
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3) Relativamente à pretensão indemnizatória formulada sobre os restantes danos patrimoniais invocados nos artigos 132.º a 151.º da petição inicial, deve-se ainda dizer, à luz do que vem de expor-se, que a respectiva ressarcibilidade não deixa de ser duvidosa, pelo simples facto de que os Autores apenas sucederam no direito de indemnização que existia na titularidade do concessionário falecido, e não tendo sido admitido a adquirir a posição do concessionário, são insusceptíveis de serem lesados por toda a actuação administrativa no âmbito do contrato de concessão, posterior ao falecimento daquele.
Desde logo, não foi a acção proposta, conforme atrás referido, com o propósito de discutir a responsabilidade da Administração perante o concessionário em vida – tal como se referiu nos artigos 132 º a 136.º na petição inicial – os valores – prémios e os custos do projecto – “foram pagos pelo concessionário não só por causa da aprovação do concedente dos termos do projecto que o concessionário pretendia executar, como ainda da sua possibilidade efectiva de execução dentro do prazo do contrato”. Ou seja, a obrigação de restituição dos valores anteriormente pagos pela Ré fundar-se-ia no facto de a efectiva execução do projecto ser inviabilizada até à extinção do contrato no termo previsto. Dito por outras palavras, não interessava, do ponto de vista da pretensão indemnizatória, a inviabilidade de prosseguir a execução do projecto que se verificava naquele momento, mas sim a situação como esta que se prolongava até ao termo do contrato de concessão.
Além disso, o concessionário, ao momento do falecimento, nem tinha o direito de indemnização sobre o valor pago acima referido, a suposta situação de “impossibilidade” até então verificada (atentas as circunstâncias descritas sobre a entrada em vigor do DL n.º 24/95/M, de 9 de Junho (Regulamento de Segurança contra Incêndios) que impunha novos condicionantes à construção, assim como a indisponibilidade do terreno que se encontrava no poder da Administração para uso temporário, a falta da revisão do contrato celebrado) não consubstanciava a impossibilidade definitiva de aproveitamento, face ao prazo remanescente até ao termo previsto do contrato de concessão. Inexistia aliás outro fundamento legal para pôr termo à relação contratual existente na altura e exigir a devolução de todo o valor pago. Por conseguinte, os herdeiros do concessionário não podiam reclamar o direito de indemnização que o de cujus não tinha.
Na realidade, eles, não sendo autorizada a transmissão, tinham apenas direito “a levantar todas as benfeitorias introduzidas no terreno se o puderem fazer sem detrimento económico do mesmo, ou a serem por elas indemnizados”, nos termos previstos no artigo 156.º, n.º 3 da Lei n.º 6/80/M. Fala-se, na Lei de Terras nova, da rescisão da concessão provisória com a solução prevista que não seja muito diferente, conforme se dispõe no artigo 157.º, n.º 3, “Na falta de apresentação do pedido nos termos do n.º 1 ou em caso de indeferimento do pedido de transmissão, e se verificando as situações previstas em qualquer alínea do artigo 166.º, a concessão provisória pode ser rescindida pelo Chefe do Executivo, tendo os herdeiros do concessionário direito a serem indemnizados pelo valor real das benfeitorias incorporadas no terreno concedido na data de publicação no Boletim Oficial do despacho de declaração de rescisão da concessão referido no artigo 170.º”.
A situação vertente em que nunca chegou a ser decidida a transmissão até à resposta dada pela DSSOPT em 4/7/2017 mediante o ofício n.º 488/795.03/DSO/2017, não é inteiramente coincidente com a prevista nos referidos preceitos legais. Porém, as posições jurídicas dos herdeiros face ao terreno concedido num caso e noutro acabaram por assimilar. Não se vê, nesta medida, que os herdeiros pudessem reclamar o direito de indemnização em termos distintos do que se encontra previsto no quadro normativo em vigor.
Nestes termos ditos, deve-se concluir que o prejuízo invocado na vertente de danos emergentes, como o prémio pago, os custos de aproveitamento, etc., não é indemnizável com o instituto de responsabilidade civil, delitual ou contratual.
4) Ainda os Autores peticionaram que sejam ressarcidos dos eventuais prejuízos decorrentes dos custos do despejo do lote concedido.
Pela leitura dos factos dados como provados, é manifesto que os danos futuros aqui reclamados não decorreriam do facto alegado como evento lesivo que obriga à reparação, nos termos previstos no artigo 556.º do CCM, mas antes prendem-se com o acto de despejo praticado na sequência da declaração da caducidade da concessão.
Tal despejo processa-se “nos termos e com as necessárias adaptações do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto”, segundo o previsto no artigo 179.º, n.º 2 da Lei n.º 10/2013. E a responsabilidade pelas despesas efectuadas com o despejo fixa-se nos termos do artigo 56.º, n.º 2 do referido DL.
De todo o modo, não é arbitrável o dano futuro peticionado nesta parte.
Assim como a pretensão formulada sobre as despesas associadas com patrocínio judiciário e custas judiciais, cujo reembolso é decidido de acordo com as regras previstas nos artigos 376.º a 384.º do CPC, na dependência da sentença que julgue procedente ou não a acção proposta.
Também, não se trata do prejuízo ressarcível na acção de responsabilidade.
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5) Além do instituto de responsabilidade, os Autores ainda invocaram o direito à reposição do equilíbrio financeiro conforme se alude no artigo 167.º, alínea a) do CPA, que deva decorrer, segundo eles, da alteração de circunstâncias correspondente a “facto do príncipe”, designadamente, com a ocorrência da aprovação do Regulamento de Segurança contra Incêndios através do DL n.º 24/95/M que tinha tornado inviável a execução do projecto de arquitectura para a construção de 13 pisos em propriedade horizontal. Nesta conformidade, entendem os Autores que “há lugar a uma reparação integral dos prejuízos sofridos por concessionário ao abrigo do princípio do equilíbrio financeiro do contrato, cobrindo este, os danos emergentes e os lucros cessantes” (conforme se referiu no artigo 148.º da petição inicial).
Na mesma linha da consideração exposta acima, o que tem que apurar-se é se o direito à indemnização que o concessionário tinha com base neste fundamento, e que transmitiu, por via hereditária, aos seus herdeiros.
O dever de reposição do equilíbrio financeiro surge como consequência do exercício do poder de modificação unilateral do contrato por parte do contraente público, nos termos previstos no artigo 167.º, alínea a) do CPA, e também nas situações do “facto do príncipe” , que correspondem às alterações de circunstâncias imputáveis ao contraente público na actuação fora dos poderes de conformação e com impacto produzido por via indirecta sobre o contrato (Miguel Assis Raimundo, Direito dos Contratos Públicos, volume 2, pp. 156 a 157 e 172 a 173).
Pois, destina-se a reposição de equilíbrio financeiro a recompor o equilíbrio do contrato nos termos inicialmente convencionados. O sentido do mecanismo consiste na reconstituição, nas palavras do legislador português, da “proporção financeira em que assentou inicialmente o contrato”, para o que se deve considerar o “valor das prestações a que as partes se obrigaram e dos efeitos resultantes do facto gerador do direito à reposição no valor dessas mesmas prestações” (artigo 282.º, n.º 5 do Código dos Contratos Públicos).
A referência à proporção significa que “se trata de um cálculo que atende à relação inicial entre prestações, e não, portanto, a um certo valor considerado de modo absoluto, o que compreende, tendo em conta que, por exemplo, a substituição de uma prestação por outra envolve não apenas acréscimo de despesas, ou prejuízos, mas também poupança da despesa inerente à prestação substituída, poupança essa que terá de ser considerada, sob pena de termos óbvia sobrecompensação” (obra cit. pp. 161 a 162).
No caso vertente, para efeito de indemnização inexiste nenhum elemento trazido para autos necessário à recomposição da equação financeira inicialmente convencionado, tendo em conta a perda antecipada dos ganhos e a poupança das despesas em virtude da alteração legislativa que permita construir o edifício de 7 pisos, em vez do de 13 pisos conforme inicialmente previsto no contrato, com a respectiva finalidade.
Além do mais, apesar de os Autores suscitarem a necessidade da reposição de equilíbrio financeiro na sequência da ocorrência do “facto do príncipe”, tal causa de pedir não podia sustentar o pedido indemnizatório formulado, ou seja, os efeitos jurídicos pretendidos com a propositura da acção – como assinalámos, por um lado, o direito ao lucro cessante de valor não especificado só existe com a conclusão hipotética do aproveitamento, e por outro, nem o prémio pago nem o custo de aproveitamento é indemnizável face às previsões contidas na Lei de Terras.
Pelo que se deve denegar o direito de indemnização peticionado pelos Autores com o fundamento supra invocado.
6) Por fim, os Autores socorrem-se do instituto de enriquecimento sem causa, pedindo que a Ré seja condenada a pagar a indemnização no montante de MOP 8,128,000.00, correspondente ao valor do prémio pago pelo concessionário, acrescido dos juros legais.
Em termos mais precisos, não é de uma pretensão indemnizatória que se trata nesta parte, mas sim a restitutiva, fundada na obrigação daquele que sem causa justificativa, enriqueça à custa de outrem, de restituir aquilo com que injustamente se locupletou, conforme se prevê no artigo 467.º do CCM.
No entanto, no caso aqui em apreço, existe a causa justificativa para o apontado “enriquecimento” – o prémio no montante de MOP 8,128,000.00 foi recebido pela Ré, conforme titulado por cláusula décima do contrato de concessão, título este nunca chegou a ser invalidado com efeito retroactivo.
Se assim é, o reembolso do montante do prémio pago não é possível, com fundamento no enriquecimento sem causa.
7) Nestes termos expostos, não obstante das várias soluções jurídicas propostas pelos Autores na sua petição inicial, certo é que os factos essenciais descritos como causa de pedir não permitem extrair os efeitos jurídicos pretendidos nesta acção, ou seja, para sustentar todos os pedidos indemnizatórios formulados, tendo em conta que os Autores próprios não têm o direito de indemnização invocado nem o adquiriram por sucessão hereditária.
Além disso, apesar de ainda consideramos que o direito de indemnização invocado neste caso concreto também prescreveu, conforme o entendido nas jurisprudências recentes do Tribunal de Segunda Instância, e.g. Acórdãos n.º 576/2023, de 29/2/2024, n.º 551/2023, de 16/11/2023, n.º 519/2023, de 26/10/2023, não se mostra por enquanto necessário conhecer desta excepção peremptória invocada, já que os Autores nem sequer são titulares do direito de indemnização que se arrogam.
Resta então decidir.
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III. Decisão
Face ao exposto, o Tribunal decide:
- Julgar improcedente a acção interposta pelos Autores (A), (B), (C), (D), (E), (F), (G) e (H), com a absolvição da Ré Região Administrativa Especial de Macau dos pedidos formulados.
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Custas pela Autora.
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Registe e notifique.”

Louvamos a acertada, perspicaz e justiciosa decisão que antecede, na qual foram abordadas de forma minuciosa e fundamentada as questões relacionadas com o direito de indemnização dos autores, ora recorrentes, incluindo as questões do facto príncipe e do enriquecimento sem causa. Concordamos plenamente com a decisão recorrida, considerando que esta fornece a melhor solução para o caso em apreço.
Assim, à luz da fundamentação jurídica acima exposta, a qual subscrevemos inteiramente e remetemos aos seus precisos termos, conforme disposto no artigo 631.º, n.º 5 do CPC, aplicável por força do artigo 1.º do CPAC, negamos provimento ao recurso.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, o Colectivo de Juízes deste TSI decide negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelos recorrentes (A), (B), (C), (D), (E), (F), (G) e (H), confirmando a sentença recorrida.
Custas pelos recorrentes, com taxa de justiça em 8 U.C.
Registe e notifique.
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RAEM, 17 de Julho de 2025
   Tong Hio Fong (Relator)
Rui Pereira Ribeiro (Primeiro Juiz-Adjunto)
Seng Ioi Man (Segundo Juiz-Adjunto)
1 Manual de Direito Processual Civil, 3.ª edição, CFJJ, 2018, pág. 404
2 Temas da Reforma do Processo Civil, II Volume, 4.ª edição, pág. 131 e 132
3 Manual de Direito Processual Civil, 3.ª edição, pág. 405
4 Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, pág. 374
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Recurso Jurisdicional 781/2024 Pág. 34