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Processo n.º 896/2024
(Autos de recurso em matéria cível)

Relator: Fong Man Chong
Data: 17 de Julho de 2025

ASSUNTOS:

- Função do sinal no contrato-promessa de compra e venda e consequência de impossibilidade de cumprimento definitivo de prestação prometida

SUMÁRIO:

I - A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC), qualificação esta que determina o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CCM).
II - A qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais.
III - A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CCM). Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Numa situação em que, tal como se detecta no caso dos autos, se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis (porque se usam expressões diversas, tais como “contrato-promessa de compra e venda” “prometer comprar e “prometida venda”, “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”), a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 228º do CCM).
IV – O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico, sendo nesta perspectiva, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial. Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes. Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
V - No caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CCM que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”. Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CCM).
VI - O artigo 801º/-1 do CCM manda que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”, normativo este que rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento.
VII - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas. A equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto.
VIII - Por regra, a indemnização fundada no incumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido. Nesta óptica, o regime de restituição do sinal em dobro em matéria de contrato-promessa pode classificar-se como um regime especial.

O Relator,

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Fong Man Chong

Processo nº 896/2024
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 17 de Julho de 2025

Recorrentes : - A
- B
- C, Limitada (C有限公司)

Recorridos : - Os Mesmos

*
   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    A e B, Recorrentes, devidamente identificados nos autos, discordando da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, datada de 17/06/2024, veio, em 01/07/2024, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 1619 a 1634, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. 上訴人針對初級法院於2024年6月17日作出的判決不服而提出本上訴。
     2. 上訴人認為被上訴判決有關賠償金額部份及法律理由闡述部份沾有錯誤解釋和適用《民法典》第400條、第434條至第436條之規定,錯誤解釋和適用《民法典》第801條之規定及錯誤解釋和適用《商法典》第569條第2款之規定等瑕疵,應予廢止或撤銷。
     3. 有關錯誤解釋和適用《民法典》第400條、第434條至第436條之規定方面,根據被上訴判決第7頁及8頁之獲證事實之部份內容,原審法院認為本案所涉及之定金金額應以實際交付予被告之金額為准,即港幣3,928,000元,相當於《樓宇買賣預約合約》所訂定之涉案單位價金港幣4,910,000元之八折。
     4. 上訴人除對原審法院之見解給予應有的尊重外,不認同原審法院認定實際交付之定金金額之理據。
     5. 根據被上訴判決第7頁及8頁之已獲證事實第2)點及8)點和附隨答辯狀提交之文件34之內容,上訴人與被告約定買賣涉案之第7幢9樓F(F9)單位之價金為港幣4,910,000元,且上訴人已按照《樓宇買賣預約合約》之規定,合共向被告支付港幣4,910,000元,被告亦已向上訴人發出已收取全數港幣4,910,000元之收據。
     6. 根據附隨答辯狀提供之文件34之內容,上訴人因在樓花期一次過付清樓款全數,並選擇自行選購涉案單位的所有協定之家居電器及室內裝修材料(“購置物"),故被告發放總額港幣982,000元予上訴人,作為被告給予上訴人提早清付樓款之特惠配套。
     7. 即被告在全數收取上訴人支付之港幣4,910,000元後,再以回贈“購置物"之方式向上訴人支付港幣982,000元,該金額相當於涉案《樓宇買賣預約合約》價金之20%。因此,被告是在已全收取港幣4,910,000元之款項後,才向上訴人支付“購置物"回贈。
     8. 根據附隨起訴狀提交之附件2之內容,有關《樓宇買賣預約合約》所訂定之樓價價金為港幣4,910,000元,當中並沒有提及折扣/回贈方案及折扣/回贈金額。
     9. 倘被告欲以此折扣/回贈優惠作為日後訴訟之防禦方法對抗上訴人,應當在有關《樓宇買賣預約合約》中訂明相關之折扣/回贈方案、折扣/回贈之性質及折扣/回贈之確實金額。
     10. 此外,根據附隨答辯狀提交之附件35的涉案單位之《樓宇買賣按揭抵押借款合約》是由上訴人、被告及D有限公司的代表共同簽署,按照有關合同第1點之內容,被告確認有關單位之樓價為港幣4,910,000元,而非被告所述經扣除折扣/回贈後其實際收取之港幣3,928,000元。
     11. 根據《民法典》第399條第1款及第400條第1款之規定,合同應予切實履行,無論是被告附隨答辯狀提供之收據或聲明書,當中均顯示上訴人已按照《樓宇買賣預約合約》之規定全數向被告支付港幣4,910,000元,有關回贈之慷慨行為僅在上訴人全數支付款項後作出,並非直接在上訴人應支付之港幣4,910,000元中扣除。
     12. 上訴人已根據《樓宇買賣預約合約》之規定履行支付義務,且其已全數向被告支付港幣4,910,000元,因此,即使如被上訴判決所述以真實支付之定金金額作為計算上訴人應得之賠償依據,由於上訴人實際已向被告支付之定金總數為港幣4,910,000元,而被告亦真實收取了有關款項;
     13. 即使被告向上訴人支付回贈,且上訴人亦簽發了相關聲明書,但該贈與行為僅在全數支付定金後作出,故該贈與行為不應影響作為計算上訴人應得賠償之已支付之定金金額。
     14. 故上訴人認為被上訴判決第7及8頁之已獲證事實第2)點及8)點就《民法典》400條之適用存在錯誤。
     15. 因此,被上訴判決就《民法典》第434條至436條“交付之定金"方面存在錯誤之理解,不應以被告最終實際取得之金額作為上訴人之定金金額,被告向上訴人作出之贈與慷慨行為,不應損害上訴人通過合同所得之權利。
     16. 故被上訴判決應以港幣4,910,000元作為上訴人通過定金制度計算出應得賠償之依據。
     17. 由於可歸責於被告的過錯不履行,上訴人有權獲得賠償,無論根據所訂定的預約合同,還是根據《民法典》第436條第2款最後部分,即上訴人有權要求被告返還雙倍定金,金額為港幣9,820,000元正,折合澳門幣10,114,600元正;
     18. 即使扣除被告替上訴人償還D銀行貸款港幣2,623,023.16元,被告仍須向上訴人支付港幣7,196,976.84元(9,820,000-2,623,023.16),折合澳門幣7,412,886元。
     19. 綜上所述,上訴人認為被上訴判決沾有錯誤解釋和適用《民法典》第400條、第434條至第436條規定之瑕疵。
     20. 有關錯誤解釋和適用《民法典》第801條規定方面,根據被上訴判決第12頁至33頁之部份內容,原審法院認為本案應根據《民法典》第801條之規定,就上訴人依定金制度獲得之賠償作出相應縮減。
     21. 上訴人除對原審法院之見解給予應有的尊重外,不認同有關觀點並認為即使適用《民法典》第801條之規定作出縮減,所縮減之幅度亦屬明顯過高。
     22. 根據葡萄牙學者Pires De Lima及Antunes Varela就適用葡萄牙《民法典》第812條(對應澳門《民法典》第801條)之見解,對定金制度所生之賠償不應被縮減至低於因不履行而所遭受之實際損失。
     23. 因此,在判定被上訴判決賠償縮減之幅度是否明顯過高,應分析上訴人所遭受之實際損失。
     24. 根據被上訴判決第7及8頁之已獲證事實第2)點及8)點和附隨答辯狀提交之文件35之內容,上訴人是以港幣4,910,000元向被告購買涉案單位;上訴人已向被告支付港幣4,910,000元之定金款項(但根據被上訴判決之理解,上訴人支付之定金款項為港幣3,928,000元)。
     25. 於2011年3月18日,上訴人以年利率2.25%向D銀行貸款港幣3,430,000元,以取得涉案單位預約買受人地位,而被告於2018年10月31日替上訴人向D銀行償還貸款,
     26. 期間,上訴人已向D銀行支付之利息為港幣588,644.38元(HKD3,430,000x2.25%/365x2,784),然而,上訴人因被告未有履行《樓宇買賣預約合約》而遭受了上述已支付之利息金額之損失。
     27. 另外,根據已獲證事實第2點之內容,上訴人於2011年3月16日取得涉案單位之預約買受人地位,至今已逾13年半,且被告仍未有向上訴人支付任何款項,故
     28. 以銀行定期存款利率(3.5%年利率)及簡單數學方式計算,上訴人除未能取得涉案單位外,亦因被告未有返還任何款項而遭受了相當於應返還之款項通過定期存款可得之利息,自2011年3月16日至2024年9月15日期間,存款於銀行可得之定期存款利息為港幣2,322,564.52元(HKD4,910,000x3.5%/365x4,933);
     29. 即使以被上訴裁判認定之應返還金額3,928,000元計算,上訴人在上述期間內存款於銀行可得之定期存款利息為港幣1,858,051.62(HKD3,928,000x3.5%/365x4,933)。
     30. 上訴人自取得預約買受人地位至今已長達13年半,但仍未能取得及享益涉案單位,因此,上訴人因被告過錯無法履行《樓宇買賣預約合約》之事實所遭受之財產損害相當巨大。
     31. 另外就被上訴判決以被告非自願不履行及無高度過錯("A ré incumpriu contra a sua vontade e sem elevado grau de culpa")作為衡量適用《民法典》第801條縮減上訴人賠償之依據,上訴人不予認同。
     32. 首先,被告接受和放棄上訴其與澳門特區政府就有關土地利用之爭端作出的判決。上訴人無正當性參與被告與澳門特區政府之間的訴訟,被告亦從沒自發向上訴人披露其工程進度等有關問題;因此,上訴人與被告之間的關係,只是純粹按照上述《樓宇買賣預約合約》之規定履行相關義務。
     33. 涉案《樓宇買賣預約合約》為格式合同,是由被告以其認為最合適的條款單方制作提供予不特定的預約買受人(包括上訴人),合約約束上訴人及被告,其條款已清晰載明,當中沒有非自願不履行,又或無高度過錯減責的條款,因此,就合同責任而言,被告應就其確定無法履行上述《樓宇買賣預約合約》而向原告依法作出賠償。且
     34. 被告於2014年8月4日書面回覆運輸工務局時,已明確承認涉案土地利用之延誤事實可歸責於被告,被告未能推翻上述其通過書面自認之可歸責事實。
     35. 就合同責任而言,在被告明確承認其可被歸責,而導致其確定無法履行上述《樓宇買賣預約合約》的事實下,不論被告是否非自願不履行或是否存在高度過錯,皆不應損害上訴人依法獲得之賠償之權利。
     36. 除此之外,被上訴判決亦以倘被告在上訴人支付「置換房」的樓款前返還定金,將不再遭受相應的損失(Se a ré devolver o sinal antes de os autores pagarem o preço da " fracção para troca", estes já não terão o prejuízo correspondente.),作為衡量適用《民法典》第801條縮減上訴人賠償之依據,上訴人亦不予認同。
     37. 因「置換房」至今仍未能交付上訴人,其與原《樓宇買賣預約合約》所定單位交付日期差距多年,這些年間上訴人持續遭受損失(包括但不限於住房成本、時間成本及精神壓力),縱然被告在上訴人支付「置換房」的樓款前返還定金,但相應的損失仍然是存在的。
     38. 根據第8/2019號法律《都市更新暫住房及置換房法律制度》所列明,置換房並非補償性質,特區政府清楚表明置換房只是一項基於善意原則,為協助本澳居民解決住房需要及改善居住環境,而制定的一項恩恤惠民措施;亦不是為發展商(現在/將來)提供一項減責的理據。
     39. 本案被告因其過錯導致不履行與上訴人所訂立的《樓宇買賣預約合約》,而上訴人要求被告返還雙倍定金,與上述第8/2019號法律《都市更新暫住房及置換房法律制度》沒有任何關係。
     40. 儘管上訴人成功向«E有限公司»申購置換房,但購買置換房與原單位的座向層數皆不同,不應作為縮減賠償之依據,更不應因接受特區政府的善意恩恤,而損害上訴人依法所得之賠償或權利。
     41. 因此,上訴人認為被上訴判決錯誤適用《民法典》第801條之規定及縮減上訴人應獲得之賠償幅度屬明顯過高。
     42. 有關錯誤解釋和適用《商法典》第569條第2款規定方面,根據附隨起訴狀提交之文件一,被告是一間經營商業企業之法人商業企業主,房地產發展及樓宇之建築是其重要的所營事業,依賴出售單位賺取商業利益,因此被告在本案中與上訴人簽訂《樓宇買賣預約合約》之行為是其因經營商業企業所作出之行為,故有關行為應被視為商行為。
     43. 基於被告因本案所生之債務是源於其從事所營事業之商行為,故根據《商法典》第3條第1款b項及第569條之規定,因有關行為所生之遲延利息應加上2%。
     44. 因此,上訴人認為被上訴判決沾有錯誤解釋和適用《商法典》第569條第2款規定之瑕疵。
     45. 綜上所述,上訴人認為被上訴判決有關賠償金額部份及法律理由闡述部份沾有錯誤解釋和適用《民法典》第400條、第434條至第436條之規定,錯誤解釋和適用《民法典》第801條之規定及錯誤解釋和適用《商法典》第569條第2款之規定等瑕疵。
     請求
     綜合上述的法律依據及事實依據,請求尊敬的法官 閣下裁定本上訴理由成立,並裁定:
     1. 廢止或撤銷原審法院判決中有關判處賠償金額的部分,並作出改判;
     2. 判處被告向原告支付港幣7,196,976.84元,折合澳門幣7,412,886元;及加上自2018年12月10日至完全支付所欠金額澳門幣7,412,886元期間的到期和將到期利息,在計算利息時應按《商法典》第569條2款規定在法定利率上附加(2%)的額外利率。
     3. 判處被告支付全部訴訟費用、律師費用以及其他法定負擔費用。
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    A Recorrida, C, Limitada (C有限公司), veio, 25/10/2024, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 1752 a 1754, tendo alegado o seguinte:
     1. Os Recorrentes alegam que a douta sentença recorrida interpretou e aplicou incorrectamente os artigos 400º, 434º e 436º do Código Civil.
     2. Alegam que pagaram à ora Recorrida HKD4.910.000,00.
     3. Tal facto não ficou provado.
     4. E alegam que só depois de lhe pagarem esta quantia, a recorrida lhes fez um desconto no valor de HKD982.000,00.
     5. Tal facto também não ficou provado.
     6. Trata-se de um Facto que não ficou provado nos termos em que os Recorrentes o alegam.
     7. O que ficou provado foi que, "O preço inicialmente acordado no acordo referido em B) foi de HKD4.910.000,00 e o preço erectivamente pago pelos autores à Ré foi de HKD3.928.000,00" (Facto nº 8 da douta sentença recorrida).
     8. Com efeito, neste e em todos os processos idênticos a este que têm sido julgados, o que sempre resulta provado é que em caso de pagamento integral do preço, a C faz um desconto imediato no preço, ainda antes da realização do respectivo pagamento, e que os compradores nessas circunstâncias como é o caso dos Recorrentes, nunca pagam, portanto, em nehum momento, o preço total.
     9. Apenas pagam, sempre, o preço constante do contrato, imediatamente deduzido do respectivo desconto.
     10. Por exemplo, se o preço contratado é de HKD5.000.000.00 e o desconto é de 20%, ou seja, HKD1.000.000,00, o comprador apenas entrega à C HKD$4.000.000,00.
     11. Quanto à emissão do recibo no valor do desconto, no exemplo citado, HKD1.000.000,00 e, no caso vertente, HKD982.000,00, a explicação vem dada na douta fundamentação da Decisão em Matéria de Facto, nos termos da qual: os documentos de fls. 26, 31 a 37, 881, e 882 e o depoimento das testemunhas F e G, mostram que depois de celebrado o acordo com a ré, os autores conseguiram empréstimo bancário, tendo a ré declarado que recebeu dos autores a quantia de HKD982.000,00 (fls. 33) e tendo os autores declarado que receberam igual quantia da ré (fls. 881), afigurando-se ao tribunal, de acordo com as regras da experiência relativa à concessão de crédito hipotecário e de acordo com o depoimento das duas referidas testemunhas, que as duas declarações têm como justificação o facto de os autores terem pedido empréstimo bancário em base no preço acordado para conseguirem uma determinada percentagem deste e tendo a ré feito a sua declaração para se harmonizar com o empréstimo e para, por razões de marketing e de mercado, prevenir ou evitar que se criasse a imagem de descida de preços.
     12. Os Recorrentes não impugnaram a decisão de facto.
     13. Deste modo, a sua alegação a este respeito é uma mera discordância da apreciação da prova levada a efeito pelo tribunal no uso da sua livre convicção o que, como se sabe, não é sindicável e violaria o princípio da imediação da prova.
     14. Pelo que, deve improceder a douta alegação de recurso quanto a esta parte.
     15. Seguidamente, os Recorrentes imputam à douta sentença recorrida a violação do artigo 801º do Código Civil, nomeadamente, a decisão por equidade protagonizada pelo distinto Tribunal de 1ª Instância, bem como a violação do artigo 569º do Código Comercial.
     16. A este respeito, a ora Recorrida remete a sua contra-resposta para todo o exposto nas suas Alegações de Recurso, no seu ponto C) "Da Indemnização", páginas 30 a 38 e respectivas Conclusões, aqui as dando por integralmente reproduzidas.
     17. Pelo que, salvo melhor opinião, também quanto a esta parte devem as doutas alegações de recurso a que ora se responde, improceder.
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    C, Limitada (C有限公司), Recorrente, devidamente identificada nos autos, discordando da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, datada de 17/06/2024, veio, em 04/07/2024, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 1637 a 1663, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. Constitui objecto do presente Recurso a, aliás, douta sentença do Tribunal Judicial de Base, que julgou parcialmente procedente a presente acção e condenou a Recorrente no pagamento de uma indemnização aos Recorridos, no montante global de HKD4.304.976,84.
     2. Ocorreu uma impossibilidade jurídica superveniente e definitiva do cumprimento do contrato em discussão nos presentes autos mas tal impossibilidade não é imputável à Recorrente.
     3. Com efeito, ficou provada praticamente toda a matéria alegada pela Recorrente susceptível de estabelecer que não conseguiu aproveitar o terreno dentro do prazo contratado e, assim, dar cumprimento ao contrato em apreço, por razões imputáveis aos Serviços da RAEM.
     4. Todavia, com todo o respeito, a douta sentença recorrida acaba por não aprofundar as consequências jurídicas da referida factualidade provada, limitando a sua análise, à conduta da Recorrente no momento em que contratou, procurando apurar se ela actuou como um bom pai de família, fazendo depender um juízo de culpa exclusivamente desta circunstância.
     5. E entendeu que a actuação da Administração era previsível e evitável, bem como, que o risco do incumprimento corre exclusivamente por conta da Recorrente, pelo que lhe deve ser imputada a culpa pela impossibilidade do cumprimento.
     6. Ressalvado diverso entendimento, só se a impossibilidade do cumprimento não for imputável a terceiro, se poderá, deverá, partir então para a análise daquela outra questão, pelo que a douta sentença recorrida adoptou o prisma errado sob o qual deveria ter lugar a análise de direito no presente caso, com importantes reflexos na respectiva decisão.
     7. Não obstante, salvo melhor opinião, a verdade é que contrariamente ao que reza a douta sentença recorrida, uma tal actuação da DSSOPT e da DSPA era imprevisível.
     8. Após a aprovação do projecto de arquitectura do empreendimento "H", comunicada à Recorrente em 07/01/2011 qualquer promotor imobiliário em Macau colocaria as fracções autónomas em projecto (aprovado), a construír, no mercado.
     9. Não era previsível que a DSSOPT fizesse depender a emissão dessa licença da apresentação e aprovação de um Relatório ambiental pela DSPA, como infelizmente o fez, pela primeira vez na história de Macau.
     10. Essa falta de previsibilidade é evidente e resulta ainda da circunstância de, ao tempo, não existir norma legal ou regulamentar aprovada e em vigor que exigisse esse Relatório Ambiental ou que sugerisse, sequer, que conteúdo pudesse vir a ter de conter.
     11. Muito menos era de esperar que a DSSOPT e a DSPA demorassem quase 3 anos a aprovar esse Relatório num procedimento moroso e ao sabor dos improvisos desses serviços.
     12. Não se pode pretender que uma Administração Pública que está sujeita ao princípio da legalidade (artigo 3.º do CPA), ao princípio da protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes (artigo 4.º do CPA), ao princípio da justiça e da imparcialidade (artigo 7.º do CPA) e aos princípios da boa fé e da colaboração (artigos 8.º e 9.º do CPA) deve entender-se genericamente como uma pessoa que actua de forma a violar os seus deveres contratuais com os sujeitos com que se relaciona. E que a Recorrente deveria assim ter presumido vir a suceder[Sérvulo1].
     13. E mesmo quando confrontada com essa exigência inesperada, a Recorrente previu, tal como qualquer bom pai de família no seu lugar o faria, que tal exigência seria rapidamente ultrapassada.
     14. Com efeito, do Ofício de 07/01/2011 constante de fls. 360 a 369, no seu ponto nº 19, parte final, resulta que o Relatório ambiental exigido pela DSSOPT deveria consistir em 4 pontos muito simples.
     15. No entanto, conforme está provado, os Serviços da Administração foram apresentando sucessivas e novas condições ao longo de quase 3 anos, à medida que as anteriores iam sendo cumpridas pela Recorrente, o que era manifestamente imprevisível, mesmo para um bom pai de família.
     16. D'outro passo, a DSSOPT e a DSPA não actuaram como parte do contrato de concessão mas sim como Administração Pública, como puissance publique, sob as mesmas vestes com que actuam relativamente a qualquer privado.
     17. A actuação da RAEM sempre seria inultrapassável. Os serviços da RAEM não emitiriam a licença de construção sem que fosse apresentado o Estudo Ambiental, rectius, sem que fossem apresentadas todas as versões do Estudo Ambiental que foi exigindo ao longo de cerca de 3 anos.
     18. A única forma de a Recorrente procurar ultrapassar estas exigências era a de avançar para a via contenciosa, através do recurso contencioso de anulação destinado a anular os actos administrativos praticados pelos serviços da RAEM, por vício de violação de lei.
     19. Ou seja, ao contrário do que se sugere na douta sentença recorrida, afigura-se que se está, efectivamente, em sede de "facto do príncipe".
     20. Quanto ao risco, compreende-se, por exemplo, que a crise económica, a retracção do mercado financeiro, taxas de juros, salários, etc., possam ser considerados riscos com que os promotores imobiliários devem contar e assumir, mas não já, a situação dos autos que provocou uma provada paralisação de cerca de 5 anos do prazo de aproveitamento do terreno.
     21. Os Recorridos sabiam necessariamente que o contrato que celebraram com a Recorrente estava umbilicalmente ligado ao cumprimento do contrato de concessão do terreno e que, naturalmente, as vicissitudes deste se repercutiam necessariamente naquele.
     22. As datas dos termos das concessões são públicas, constando do Registo Predial.
     23. Foram assistidos por agentes imobiliários e advogados que também tinham necessariamente conhecimento destes factos e que de a cordo com as regras da experiência comum os confirmaram perante os Recorridos.
     24. De qualquer modo, um dos princípios fundamentais do Registo Predial é o Princípio da Publicidade consagrado no artigo 1º do Código do Registo Predial de Macau e dele decorre que a ninguém é lícito invocar o desconhecimento da situação jurídica de qualquer imóvel, quando constante de registo público, que é de livre acesso.
     25. Os Recorridos sabiam perfeitamente que haviam adquirido um bem que não existia à data do contrato que celebraram.
     26. E a Recorrente não faltou a deveres de informação que fossem devidos, nem prestou informação falsa ou sonegou informação que, de acordo com ditames de boa fé, estivesse vinculada a transmitir.
     27. Pelo que em boa verdade não foi a Recorrente que trouxe os Recorridos para a esfera de risco do contrato em causa. Foram eles que quiseram nela entrar.
     28. Quanto à qualificação do contrato, o que se revela mais plausível e consentâneo com a aplicação das regras plasmadas entre os artigos 228º e 230º do CC é que se trata de um contrato de reserva ou de um contrato de compra e venda de um bem futuro.
     29. A respeito da letra do contrato, refira-se que as partes podem usar terminologia jurídica e fazer qualificações, mas esse aspecto não é vinculativo para o intérprete-aplicador, sendo que do artigo 228º do Código Civil (CC) resulta a consagração da Teoria da Impressão do Declaratário, preconizada por Manuel de Andrade (Teoria Geral da Relação Jurídica, pág. 303), segundo a qual relevam todas as circunstâncias que acompanhem a conclusão do contrato e possam, objectivamente, inculcar num declaratário hipotético, razoável e cuidadoso, colocado na posição do declaratário real, um determinado sentido para a declaração.
     30. Relativamente à redacção do contrato em apreço, logo na sua cláusula 5ª, as partes acordaram numa redacção que excluiu propositadamente a utilização da expressão “訂” referente ao conceito de "sinal" (com o sentido de penalização), em prol da expressão "訂金", correspondente ao conceito de "depósito" (que não tem sentido penalizador).
     31. Deste modo, as partes estão a manifestar a sua vontade em afastar a qualificação de sinal aos pagamentos efectuados por conta do contrato em causa.
     32. A cláusula 22ª não indicia que as partes celebraram uma promessa de compra e venda em vez de uma compra e venda de um bem futuro ou um contrato de reserva.
     33. Em contrário do que se considerou na douta sentença recorrida, a previsão da cláusula 9ª de um consentimento para a cessão também não permite reconduzir o contrato base a um contrato-promessa.
     34. É esta a solução preconizada no artigo 418º do CC pela simples razão de que em contratos com prestações recíprocas, como é o caso, a Recorrente tem o dever de entregar o imóvel objecto do contrato, mas o adquirente tem o dever de pagar um preço e, no caso vertente, de pagar o preço em prestações distintas e sucessivas.
     35. Quanto à circunstância de poder eventualmente inferir-se de alguns dos segmentos do clausulado a necessidade de celebração de um segundo contrato, é, nos termos do artigo 866º do Código Civil (CC), uma formalidade absolutamente essencial, quer para o contrato-promessa, quer para o contrato de reserva, quer para o contrato de compra e venda imediata de um bem futuro.
     36. Por seu turno, as suas cláusulas 10ª a 12ª são previsões que raramente ou nunca são reguladas no contrato-promessa, mas sim no contrato de compra e venda.
     37. Também os textos preliminares e circundantes constantes dos autos conectados com o contrato em questão, designadamente, a certidão predial da fracção em causa, os recibos de pagamento e o facto de o contrato conter uma planta da fracção adquirida em anexo, apontam para uma perspectivação dos contraentes outra que não a de estarem a celebrar uma mera promessa.
     38. Relativamente ao elemento histórico subjacente ao contrato em causa, há a destacar que o contrato foi celebrado antes da publicação da Lei nº 7/2013, que foi elaborada em resposta a um vazio legal que disciplinasse estes casos, o que permite vincar a sua especificidade em relação às figuras existentes a esse tempo na ordem jurídica de Macau, incluindo a figura do contrato-promessa tipificada no Código Civil.
     39. Como afirma João Vicente Monteiro na sua mais recente obra, Código do Registo Predial de Macau Anotado, pág. 299, "Estes 'contratos-promessa' têm sido tradicionalmente utilizados para formalizar verdadeiros contratos de compra e venda sobre as fracções autónomas em construção".
     40. In casu, o fim do negócio tido em mente pelas partes é o seguinte: para a parte compradora, um imóvel a ser construído fica reservado contra o pagamento de uma certa quantia, por inteiro ou dividida em prestações; para a parte vendedora é receber do adquirente um determinado preço pela fracção autónoma que vai construír e lhe vai entregar.
     41. Se o beneficiário desistir perde essa quantia a favor da outra parte; quando não, o contrato mantém-se. Em contrapartida, o vendedor deixa de poder dispor da fracção autónoma não podendo celebrar nenhum outro contrato com terceiros que tenha por objecto essa fracção autónoma.
     42. Assim, pela interpretação do clausulado, pelos textos conectados com o contrato, pelo elemento histórico e pelo elemento teleológico, afigrura-se que o contrato em discussão não é um típico contrato-promessa mas um contrato de reserve ou um contrato de compra e venda imediata de um bem futuro, tal como defende Menezes Cordeiro no douto Parecer Jurídico ora junto.
     43. Subsidiariamente, mesmo que se entenda que o contrato em discussão nos presentes autos se trata de um contrato-promessa típico, a verdade é que as quantias que a Recorrente recebeu enquanto pagamentos de uma parte do preço da fracção a construir que foi vendida, configura um cumprimento antecipado do contrato prometido tendo em vista a satisfação de obrigação futura, previsto no artigo 434º do Código Civil, como o comprovam os recibos de pagamento de fls. 30 a 39 dos autos.
     44. Relativamente à indemnização a arbitrar, uma vez que a impossibilidade superveniente não é imputável à Recorrente, tem aplicação o disposto no artigo 779º/1 do CC: "A obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor."
     45. As consequências são as do artigo 784º/1 do CC: o interessado na aquisição fica desobrigado da contraprestação e pode exigir a restituição do valor que entregou ao alienante, em singelo, nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa, conforme o estipulado nos artigos 467º e 473º/1 do CC.
     46. Deste modo, salvo melhor opinião, na perspectiva da Recorrente, o quantum final da indemnização a arbitrar cifra-se em HKD1.304.976,84 (3.928.000 - 2.623.023,16 = 1.304.976,84), equivalentes a MOP1.344.126,15, acrescido dos respectivos juros de mora, a contar desde a citação da Recorrente para contestar, à taxa legal de 9,75% ao ano.
     47. Subsidiariamente a Recorrente pediu que a indemnização fosse arbitrada com base na equidade, tendo a douta sentença recorrida considerado ser essa a solução jurídica adequada e arbitrado uma indemnização a esse título no valor de HKD$3.000.000,00.
     48. Este valor pode ser decomposto em 3 parcelas: O valor de HKD982.000,00, que corresponde ao que os Recorridos despenderam além do que pagaram à Ré para poderem adquirir a habitação por troca; o valor de HKD1.649.760,00 obtido com base num eventual rendimento de juros para os depósitos a prazo incidentes sobre o capital pago pelos Recorridos à Recorrente; e, um valor adicional de cerca de HKD$370.000,00, em função dos demais factores de ponderação.
     49. Aceitando-se o itinerário percorrido pela douta decisão em causa, sucede, porém, que a Recorrente recolheu informação até ao momento não disponível nos autos, a qual pode ser preponderante para o resultado final de tal íter.
     50. De acordo com os dados oficiais da Autoridade Monetária de Macau, a taxa de juros praticada pelos Bancos, em média, entre 2011 e 2023, foi a de 1,2655% (cfr. docs. 1 e 2 ora juntos ao abrigo do art. 616º/1/2ª parte do CPC)
     51. Consequentemente, o valor mais correcto a tomar em conta quanto a este ponto seria o de HKD596.506,08 (3.928.000,00 x 1,2655% x 12 = 596.506,08) e não o de HKD1.649.760.00 (3.928.000,00 x 3,5% x 12), constante da douta sentença recorrida.
     52. Se somarmos a este valor, aqueles outros valores de HKD$982.000,00 e HKD370.000,00, o juízo equitativo a formular mais justo seria então o de HKD1.950.000,00, arredondado por excesso.
     53. Mas há que tomar ainda em conta que na cláusula 10ª do contrato donde emerge este pagamento consta que a fracção deveria ser entregue no prazo de "1200 dias de sol e trabalho após a construção do primeiro piso, só a partir dessa data entrando a Recorrente em mora".
     54. Por outras palavras, os Recorridos fizeram os pagamentos totalizando HKD$3.928.000,00 em 2011, mas contrataram voluntariamente com a Recorrente em como tal quantia ficaria imobilizada sem vencer juros por este período e, portanto, até um momento indeterminado no tempo.
     55. Entretanto, como resulta dos autos, tal momento nunca chegou a ocorrer uma vez que não foi possível construir e entregar a fracção pelas razões supervenientes acima descritas.
     56. Consequentemente, salvo melhor opinião, é o momento em que a impossibilidade do cumprimento se tornou definitiva e não o momento em que foi feito o pagamento do "preço", do "depósito" ou do "sinal" que deve ser tomado em conta para o cálculo deste segmento da indemnização a arbitrar.
     57. Assim, esse momento foi o momento em que a declaração de caducidade do contrato de concessão foi proferida e se tornou irreversível, o que apenas ocorreu com o trânsito em julgado do douto acórdão do TUI proferido em 23 de Maio de 2018, no âmbito do Processo nº 7/2018.
     58. Pelo que, ressalvado diverso entendimento, o momento a ser tomado em consideração para o cálculo do dano equitativo é o ano de 2018 e, como tal, compreende um período de 5 anos, isto é entre 2018 e 2023.
     59. Ora, de acordo com os mesmos dados oficiais da AMCM (cfr. docs. 1 e 2), a taxa média deste período de 5 anos foi a de 2,141%, pelo que o montante respeitante a este vector de ponderação se cifra, a final, em HKD$420.492,40 (3.928.000,00 x 2,141% x 5 = 420.492,40).
     60. Assim, o valor mais justo para a indemnização equitativa a arbitrar cifra-se, parece-nos, neste valor, HKD420.492,40, acrescido dos outros dois valores que foram tomados em consideração para esta decisão, isto é, HKD982.000,00 e HKD370.000,00, o que perfaz um total arredondado por excesso de de HKD1.402.492,40, que arredondado por excesso seria o de HKD$1.775.000,00.
     61. Em conclusão, seguindo-se o próprio itinerário da douta sentença recorrida com base nos factos só agora carreados aos autos, o valor total da indemnização, comprendendo a obrigação de restituir e o dano equitativo, cifra-se em HKD3.079.976,84 (1.304.976,84 + 1.775.000,00), ou, no máximo, em HKD3.254.976,84 (1.304.976,84 + 1.950.000,00).
     62. Finalmente, quanto à contagem dos juros de mora relativamente à parcela da indemnização no valor de HKD$1.304.976,84, a douta sentença recorrida entendeu que deveria ter início com a data da interpelação por considerar que a respectiva obrigação de restituição se venceu nesse momento, in casu, com a citação.
     63. No entanto, salvo melhor opinião, a obrigação de restituir só se tornou líquida com a prolação da douta sentença recorrida e respectiva data.
     64. Com efeito, sucede que a douta sentença recorrida teve necessariamente que proceder a operações aritméticas e que teve que basear tais cálculos com base em factos controvertidos ao tempo da citação que interferiram com a liquidação da obrigação de indemnização arbitrada, nomeadamente quanto ao pedido de compensação de créditos com contra-créditos formulado pela Recorrente.
     65. Desse modo, afigura-se que, também relativamente a esta parcela da indemnização, os juros de mora começam a contar apenas com a finalização de todas as operações descritas e consequente valor líquido apurado, o que coincide com a data da prolação da sentença.
     66. Ressalvado diverso entendimento, a douta decisão recorrida incorre na violação dos artigos 228º, 229º, 230º, 435º, 436º, 467º, 473º/1, 556º, 560º/5, 779º/1, 784º/1, 795º e 801 º do Código Civil.
     Nestes termos e nos mais de direito aplicável, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente Recurso ser julgado procedente, com as legais consequências, assim se fazendo, serenamente, Justiça.
*
    A e B, com os sinais identificativos nos autos, ofereceu a resposta constante de fls. 1756 a 1770, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. 於2024年6月17日,原審法庭作出被上訴判決,該判決為「Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, declara-se resolvido o contrato celebrado entre as partes e condena-se a ré a pagar aos autores a quantia de:
     - HKD1.304.976,84 (um milhão, trezentos e quatro mil, novecentos e setenta e seis dólares de Hong Kong e oitenta e quatro cêntimos), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da citação da ré até integral pagamento;
     - HKD3.000.000,00 (três milhões de dólares de Hong Kong), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da presente sentença até integral pagamento....」(詳見卷宗第1609背頁)。
     2. 上訴人不服並提出上訴,在上訴狀結論第2條至第19條中,力陳土地運輸工務局及環境保護局的行為是不可預見的,指無法預見土地運輸工務局要求其提交的環評報告獲環境保護局批准才發出准照,指當時沒有任何法律、法規要求提交環評報告,這是澳門史上首次,而相關報告經3年左右才獲批,為此,上訴人曾通過行政訴訟手段撤銷特區政府相關部門的行政違法行為;同時
     3. 在上訴狀結論第20條至第28條中主張,被上訴人與上訴人簽立涉案合同時必然知道該合同與土地批給合同有關,批給期限是公開載於物業登記,房地產中介人及律師也必然知道這些事實,根據一般經驗法則他們會向被上訴人確認這些事實,又指其沒有不履行提供資訊義務亦沒有提供虛假或隱瞞資訊,因此,認為被上訴人在涉案合同的風險並非由上訴人所引致的。及
     4. 最終認為涉案合同的履行不能不應歸責於上訴人「2. Ocorreu uma impossibilidade jurídica superveniente e definitiva do cumprimento do contrato em discussão nos presentes autos mas tal impossibilidade não é imputável à Recorrente.」。
     5. 被上訴人除對上訴陳述之內容給予應有之尊重外,完全不能認同涉案合同的履行不能不應歸責於上訴人之主張及見解。相反,被上訴人完全認同原審法院在判決中作出決定「...Por isso, o esgotamento do tempo em que a ré poderia ter construído e não construiu, a causa da impossibilidade da prestação, é imputável à ré a título de culpa....」。
     6. 上訴人在上訴狀中,使用大篇幅陳述其與澳門特別行政區之間有關批給土地關係的事實,然而,上訴人卻忽略了本案所爭議之訴訟標的法律關係為簽訂涉案《樓宇買賣預約合約》的當事人,亦即是上訴人和被上訴人;
     7. 因上訴人過錯履行不能其與被上訴人所訂立的《樓宇買賣預約合約》,被上訴人在本案請求上訴人返還雙倍定金,當中之合同關係只發生在被上訴人和上訴人之間。澳門特別行政區並沒有參與上訴人和被上訴人之間的《樓宇買賣預約合約》,因此,澳門特別行政區不是涉案的當事人(參見《民事訴訟法典》第58條之規定)。
     8. 事實上,上訴人和被上訴人所簽訂的《樓宇買賣預約合約》屬於一個法律關係;而上訴人和澳門特別行政區所簽訂的土地批給合同,又是另一個法律關係,上訴人不能及不應將兩者混為一談(參見《民法典》第400條第2款規定)
     9. 上訴人在上訴狀第2條至第19條所主張的事實,僅涉及上訴人和澳門特別行政區之間所建立的法律關係,因被上訴人並沒有參與上訴人和澳門特別行政區之間的土地批給合同,因此所主張的事實與被上訴人沒有任何關係;
     10. 倘若證明澳門特別行政區未有遵守土地批給合同的附隨義務,但這並不代表上訴人可以不履行其與被上訴人所簽署的合同義務,以及履行不能歸責於上訴人的事實;
     11. 縱使澳門特別行政區在執行土地批給合同的過程中對上訴人存有過錯,亦不代表澳門特別行政區的行為對被上訴人存有過錯,也不能因此推斷或證明上訴人在涉案合同的法律關係中就不存在過錯,上訴人不應將兩個不同法律關係中的過錯問題混為一談。
     12. 涉案《樓宇買賣預約合約》不具物權效力,被上訴人亦未取得相關單位的所有權,因此不能主張擁有任何形式的物權,被上訴人所擁有的只是因涉案合同而產生的債權;基於債權的相對性,它只會在合同的雙方當事人之間,即上訴人和被上訴人之間產生效力,不會延伸到合同以外的第三人(包括澳門特別行政區)。
     13. 綜上所述,基於土地批給合同中的過錯和涉案《樓宇買賣預約合約》中的過錯屬於二個不同問題,因此,被上訴人認為上訴人在上訴狀結論第2至第19條所主張的事實是不能成立的,應予駁回。
     14. 針對上訴人在上訴狀結論第20條至第28條中,主張被上訴人要承擔樓宇不能在土地法定批給期限內建成的風險。被上訴人除對相關陳述之內容給予應有之尊重外,完全不能認同,並認為所主張事實是不成立的,應予駁回。
     15. 被上訴人只是普通市民,上訴人作為澳門有經驗的大型發展商,是操控整個建造工程的支配者,有條件和有能力知道樓宇建造所需的時間、情況,及有條件和能力知道樓宇能否在土地的法定批給期限完成建造。
     16. 此外,上訴人在原審法院之答辯中承認「106. Na verdade, aprovado o projecto de obra em 15/10/2013...」。也就是說,位於澳門XX區無門牌P地段(LOTEP)之「H」建築計劃於2013年10月15日才獲批准,然而,上訴人卻早於2011年3月16日與被上訴人簽署了涉案《樓宇買賣預約合約》。
     17. 於2014年6月4日,上訴人向澳門特別行政區申請延長承批土地之利用期,並承諾於2015年12月25日前完成利用。上述的所有事實都在上訴人有意識的情況下作出,但上訴人卻向被上訴人隱瞞相關事實;
     18. 除此之外,上訴人主張被上訴人與上訴人簽立涉案合同時,必然知道該合同與土地批給合同有關,房地產中介人及律師也會向被上訴人確認相關事實;但上述事實並未獲得證實,上訴人亦沒有履行其舉證責任。
     19. 針對上訴人在上訴狀結論第28條至第43條中主張,原審法院錯誤界定案中的合同為預約買賣合同(contrato-promessa de compra e venda)及當中所涉及支付的款項為定金(sinal);上訴人認為涉案合同的正確法律定性是“保留合同或買賣將來物合同"(contrato de reserve ou contrato de compra e venda imediata de um bem futuro),而當中所涉及支付的款項為“訂金"(depósito)
     20. 除對上述陳述內容給予應有之尊重外,被上訴人完全不能認同有關主張及見解。相反,被上訴人完全認同原審法院就本案合同界定為預約買賣合同及當中所涉及支付的款項為定金。
     21. 涉案的《樓宇買賣預約合約》是由上訴人一方製作、編寫的格式合同,合同標題清楚標示為《樓宇買賣預約合約》;同時,在《樓宇買賣預約合約》條款中,清楚列明如乙方(被上訴人)不按合同條款履行付款時,甲方(上訴人)有權沒收由乙方(被上訴人)所有已交付之款項,因此,從合同條款規定可見,被上訴人向上訴人所交付之款項適用《民法典》第436條第2款的規定,相關款項為定金。
     22. 根據上訴人在原審法院附隨答辯狀提交之35文件“樓宇買賣按揭抵押借款合約",是由上訴人(甲方)、被上訴人(乙方)和D有限公司(丙方)所簽署的三方合同,而當中明確表明「茲因甲方將座落於本澳XX區無門牌P地段(LOTEP),登記於澳門物業登記局標示編號2XXX0號,第七幢9樓F座賣與乙方承受而乙方又將該單位向丙方抵押借款,現經三方面同意,即日訂立本約,條件如下:(一)上述單位訂明售價港幣肆佰玖拾壹萬元正(HKD4,910,000.00),乙方已於本日將全數樓款交足與甲方收。現乙方徵得甲方同意,將上述單位抵押予丙方辦理借款港幣叁佰肆拾叁萬元正(HKD3,430,000.00)。...」
     23. 根據上訴人在原審法院附隨答辯狀提交之36文件“債權讓與合同",是由D有限公司(甲方)和上訴人(乙方)所簽署的合同,而當中明確表明「茲因:1. 甲方向在建樓宇H之獨立單位的預約買受人(被上訴人)提供資金,該資金僅用作供預約買受人購買前述獨立單位之用。乙方已從上述預約買受人收到由甲方提供的相應款項,故甲方對前述預約買受人(以下又稱“借款人/預約買受人”)持有債權。該等獨立單位由乙方根據其與澳門特別行政區政府簽訂之土地批給合同負責興建,該等獨立單位所在的土地位於XX填海區,名為地段P,上述土地批給於2015年12月25日失效。
     2. 甲方與借款人/預約買受人彼等根據所訂立的借貸合同存在真實、合法、有效的借款債權。......」
     24. 從上述文件可見,上訴人、被上訴人在相關合同中的意思表示是十分清晰明確的,不存在任何的爭議,根據第15/2001號法律的規定,明確規定適用於不動產預約買賣合同。
     25. 根據《民法典》第435條之規定「在買賣之預約合同中,預約買受人向預約出賣人交付之全部金額,即使以提前履行或首期價金之名義交付者,亦推定具有定金性質」。
     26. 因此,被上訴人完全認同原審法院界定案中的合同為預約買賣合同及當中所涉及支付的款項為定金,同時認為判決中並不存在上訴人在上訴結論第28條至第43條中所主張的瑕疵。
     27. 綜上所述,被上訴人認為上訴人在上訴狀結論第28條至第43條中所主張的事實不能成立的,應予駁回。
     28. 針對上訴人在上訴狀結論第44條至第66條中主張涉案金額應按照被上訴人向上訴人實際交付金額為准,而相關賠償金額應按不當得利的規定作計算。被上訴人除對相關陳述之內容給予應有之尊重外,完全不能認同有關主張及見解。
     29. 根據被上訴判決已獲證事實第2)點及8)點和上訴人在原審法院附隨答辯狀提交之文件35之內容,上訴人與被上訴人約定買賣涉案之第7幢9樓F(F9)單位之價金為港幣4,910,000元,且被上訴人已按照《樓宇買賣預約合約》之規定,合共向上訴人支付港幣4,910,000元,上訴人亦已向被上訴人發出已合共收取全數港幣4,910,000元之收據。
     30. 根據上訴人在原審法院附隨答辯狀提供之文件34之內容,被上訴人因在樓花期一次過付清樓款全數,並選擇自行選購涉案單位的所有協定之家居電器及室內裝修材料(“購置物"),故上訴人發放總額港幣982,000元予被上訴人,作為上訴人給予被上訴人提早清付樓款之特惠配套。
     31. 即上訴人在全數收取被上訴人支付之港幣4,910,000元後,再以回贈“購置物"之方式向被上訴人支付港幣982,000元,該金額相當於涉案《樓宇買賣預約合約》價金之20%。因此,上訴人是在已全收取港幣4,910,000元之款項後,才向被上訴人支付“購置物"回贈。
     32. 根據被上訴人在原審法院附隨起訴狀提交之附件2之內容,有關《樓宇買賣預約合約》所訂定之樓價價金為港幣4,910,000元,當中並沒有提及折扣/回贈方案及折扣/回贈金額。
     33. 倘上訴人欲以此折扣/回贈優惠作為日後訴訟之防禦方法對抗被上訴人,應當在有關《樓宇買賣預約合約》中訂明相關之折扣/回贈方案、折扣/回贈之性質及折扣/回贈之確實金額。
     34. 此外,根據上訴人在原審法院附隨答辯狀提交之附件35的涉案單位之“樓宇買賣按揭抵押借款合約"是由被上訴人、上訴人及D有限公司的代表共同簽署,按照有關合同第1點之內容,上訴人確認有關單位之樓價為港幣4,910,000元,而非上訴人所述經扣除折扣/回贈後其實際收取之港幣3,928,000元。
     35. 根據《民法典》第399條第1款及第400條第1款之規定,合同應予切實履行,無論是上訴人附隨答辯狀提供之文件、收據或聲明書,當中均顯示被上訴人已按照《樓宇買賣預約合約》之規定全數向上訴人支付港幣4,910,000元,有關回贈之慷慨行為僅在被上訴人全數支付款項後作出,並非直接在被上訴人應支付之港幣4,910,000元中扣除。
     36. 被上訴人是根據《樓宇買賣預約合約》之規定履行支付義務,且其已全數向上訴人支付港幣4,910,000元;因此被上訴人實際已向上訴人支付之定金總數為港幣4,910,000元,而上訴人亦真實收取了有關款項;
     37. 即使上訴人向被上訴人支付回贈,且被上訴人亦簽發了相關聲明書,但該贈與行為僅在全數支付定金後作出,故該贈與行為不應影響作為計算被上訴人應得賠償之已支付之定金金額;相關贈與慷慨行為,亦不應損害被上訴人通過合同所得之權利。
     38. 因此,不應以上訴人最終實際取得之金額作為被上訴人之定金金額,應以《樓宇買賣預約合約》所約定的港幣4,910,000元作為被上訴人通過定金制度計算出應得賠償之依據。
     39. 由於可歸責於上訴人的過錯履行不能,被上訴人有權獲得賠償,無論根據所訂定的預約合同,還是根據《民法典》第436條第2款最後部分,即被上訴人有權要求上訴人返還雙倍定金,金額為港幣9,820,000元正,折合澳門幣10,114,600元正;
     40. 即使扣除上訴人替被上訴人償還D銀行貸款港幣2,623,023.16元,上訴人仍須向被上訴人支付港幣7,196,976.84元(9,820,000-2,623,023.16),折合澳門幣7,412,886元。
     41. 因此,被上訴人認為應以港幣4,910,000元作為被上訴人通過定金制度計算出應得賠償之依據,而相關賠償金額應按《民法典》第436條第2款最後部分的規定作計算。
     42. 綜上所述,被上訴人認為上訴人在上訴狀結論第44條至第66條中所主張的事實不能成立的,應予駁回。
*
    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
* * *
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
  III – FACTOS ASSENTES:
    A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
     1. A Ré foi concessionária de um terreno onde, para fins comerciais, pretendia construir um imóvel constituído por várias fracções autónomas.
     2. Por acordo escrito em 16 de Março de 2011 que se mostra junto a fls. 26 a 29 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido, a ré prometeu vender aos autores por preço não inferior a HKD3.928.000,00 uma das fracções autónomas do imóvel que pretendia construir.
     3. Com a celebração do acordo referido em B), os autores pagaram à ré MOP400,00 a título de despesas derivadas do contrato.
     4. Por carta que a ré recebeu a 04 de Outubro de 2018, cujo teor consta de fls. 43 e aqui se dá por reproduzido, os autores solicitaram à ré o pagamento de indemnização pelos factos que se discutem nos presentes autos no prazo de 15 dias.
     5. Presentemente a ré já não é concessionária do referido terreno.
     6. A concessão terminou porque foi declarada a sua caducidade com fundamento no facto de a ré não ter procedido ao aproveitamento do terreno concessionado no respectivo prazo de aproveitamento de 25 anos que terminou em 25 de Dezembro de 2015.
     7. Em 28/09/2019 a ré pagou ao Banco D a quantia de HKD2.623.023,16 que os autores haviam pedido emprestada ao referido Banco para aquisição da fracção autónoma prometida vender pela ré e a qual ainda não haviam restituído, tendo os autores sido informados do pagamento feito pela ré e tendo o D declarado subrogar a ré no direito de crédito que tinha sobre os autores.
     8. O preço inicialmente acordado no acordo referido em B) foi de HKD4.910.000,00 e que o preço efectivamente pago pelos autores à ré foi de HKD3.928.000,00. (Q 1.º)
     9. - Entre o então Território de Macau e a ré foi acordada no ano de 1990 a concessão por arrendamento de um terreno denominado “Lote P” para ser desenvolvido pela ré para fins industriais;
     - Acordaram também que o então Território de Macau apreciaria no prazo de 60 dias os projectos que lhe fossem apresentados pela ré;
     - Não acordaram qualquer limite para a extensão de fachadas dos edifícios a construir nem qualquer limite mínimo de afastamento entre eles;
     - Acordaram que a ré respeitaria os padrões internacionais em matéria ambiental e não acordaram que a ré deveria fazer estudos de impacto ambiental dos edifícios que iria construir nem que devia apresentar relatórios desses estudos;
     - Posteriormente, em 2006, a RAEM e a ré acordaram alterar o referido acordo de concessão para a ré desenvolver no terreno um empreendimento para fins de habitação e comércio construindo um edifício com determinadas áreas brutas de construção, o qual se configuraria num pódio de cinco pisos no qual assentariam em 18 torres de 47 pisos cada uma;
     - Acordaram que o prazo para desenvolver o terreno com a referida construção era de 96 meses, iniciava em 1 de Março de 2006 e terminava em 28 de Fevereiro de 2014;
     - Acordaram que a concessão terminava em 25/12/2015;
     - Mas, assim como em 1990, também não acordaram qualquer limite para a extensão das fachadas das torres a construir nem qualquer limite mínimo de afastamento entre elas;
     - Com vista a acordarem alterar o acordo de 1990, em 2004 e 2005, a ré requereu à DSSOPT a emissão de duas Plantas de Alinhamento Oficial, que foram emitidas sem referência a qualquer condicionamento urbanístico relativo a extensão de fachadas e a afastamento entre torres;
     - Também com vista a acordarem alterar o acordo de 1990, em 2004 e 2005, a ré apresentou à DSSOPT um estudo prévio que num dos seus elementos componentes junto a fls. 162 constava o desenho, em planta, das torres a construir, algumas das quais distavam das mais próximas não mais de três metros;
     - Em 06/05/2008 a ré apresentou à DSSOPT para apreciação um projecto de arquitectura com vista ao desenvolvimento do terreno concessionado;
     - A DSSOPT não se pronunciou sobre este projecto;
     - Em 22/10/2009 a ré apresentou à DSSOPT outro projecto de arquitectura com vista ao desenvolvimento do terreno concessionado, o qual projectava as respectivas 18 torres com fachadas de extensão não superior a 50 metros e nem todas com distanciamento entre si igual ou superior a 1/6 da altura da torre mais alta;
     - A DSSOPT apreciou este projecto e enviou à ré em 9/4/2010 um ofício e uma PAO exigindo alterações técnicas e sugerindo que a extensão das fachadas das torres não excedesse 50 metros e que as torres tivessem um afastamento entre elas não inferior a 1/6 da altura da mais alta;
     - A ré respondeu em 3/6/2010, alterando o projecto de arquitectura acolhendo as referidas exigências técnicas feitas pela DSSOP, mas não acolhendo nem aceitando acolher a sugestão de afastamento mínimo entre as torres;
     - A DSSOPT aprovou o projecto sem o sugerido afastamento entre torres e em 7/1/2011 notificou a ré dessa aprovação e notificou-a ainda para apresentar o relatório de estudo de impacto ambiental que teria a construção do edifício em matéria de fluxo de ar, efeito biombo, ilhas de calor e expansão de poluentes e referindo à ré que não lhe seria emitida licença de obras sem que o referido relatório fosse apresentado e aprovado;
     - Em 11/5/2011, a ré apresentou à DSSOPT um relatório do estudo de impacto ambiental requerido;
     - Posteriormente, a DSSOPT em coordenação com a DSPA exigiu à ré a apresentação de outros relatórios de estudos de impacto ambiental incidentes sobre outros aspectos ambientais diferentes daqueles que havia mencionado e a ré apresentou-os até que, em 15/10/2013, foi aprovado o último relatório apresentado;
     Em 24/10/2013, a ré requereu à DSSOPT a emissão de licença de obras que foi emitida em 2/1/2014.
     - Se a DSSOPT tivesse dado resposta em 60 dias apreciando o projecto parcial de arquitectura apresentado pela ré em 06/05/2008, a que não respondeu;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando o projecto global de arquitectura apresentado pela ré em 22/10/2009, a que respondeu em 9/4/2010;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando a alteração apresentada ao referido projecto global em 3/6/2010, a que respondeu em 7/1/2011 e
     - Se a DSSOPT, quando em 7/1/2011 exigiu pela primeira vez a realização de estudos de impacto ambiental, tivesse exigido à ré todos os estudos da mesma natureza que lhe exigiu mais tarde,
     A R. tinha concluído o empreendimento “H” dentro dos prazos de aproveitamento e de concessão. (Q 2.º a 5º)
     10. A Ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou dada uma nova concessão do mesmo terreno para data posterior a 24/12/2015, porque os Serviços da Administração lhe criaram tais expectativas, nomeadamente: (Q 7.º)
i. Ao imporem-lhe o cumprimento da exigência da distância mínima entre torres de 1/6 da torre mais alta, o que foi dispensando em momento ulterior, exigência não prevista em parte alguma e inédita em Macau, o que fez com que despendesse o tempo entre 22/10/2009 a 7/1/2011;
ii. Ao imporem-lhe o cumprimento da exigência da aprovação dos relatórios de circulação de ar e de impacto ambiental, exigência não prevista em parte alguma e inédita em Macau, o que obrigou que se despendesse o tempo entre 7/1/2011 e 15/10/2013;
iii. Ao emitirem a licença de obra para as fundações, em 2/1/2014, um mês antes do termo do prazo de aproveitamento, sabendo que era impossível concluir o empreendimento até ao termo do contrato de concessão;
iv. Ao prorrogarem o prazo de aproveitamento, em 29/7/2014, até 25/12/2015, sabendo que seria impossível concluir o empreendimento até essa data;
v. Ao ser essa a prática seguida anteriormente em caso análogos, de ser fazer nova concessão do mesmo térreo ao mesmo concessionário em casos em que o terreno concessionário, em caso de não aproveitamento do terreno dentro d prazo.
     11. Os Autores candidataram-se à aquisição de uma fracção autónoma ao abrigo da Lei n° 8/2019, de 12 de Abril, por via do Despacho do Chefe do Executivo 89/2019, de 30 de Maio. (Q 8.º)
     12. Tal requerimento foi deferido. (Q 9.º)
     13. Tal fracção é de tipologia, área e preço equivalentes à fracção que constitue o objecto do contrato em causa nos presentes autos e irá ser construída no terreno concessionado à Ré que vem mencionado na Alínea B) dos Factos Assentes. (Q 10.º)
     14. Os Autores apenas poderão receber do Governo tal fracção nas condições descritas porque são compradores de, pelo menos, uma fracção autónoma à Ré, a construir no mesmo terreno. (Q 11.º)
     15. O valor de mercado dessa fracção é superior ao valor inicialmente pago pelos Autores à ré por fracção idêntica. (Q 12.º)
* * *
IV – FUNDAMENTAÇÃO
    Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este afirmou na sua douta decisão:
     
     I – RELATÓRIO.
     A e a sua mulher B, casados no regime da comunhão geral de bens, ambos de nacionalidade chinesa, com outros elementos de identificação nos autos, intentaram a presente acção declarativa que segue termos sob a forma ordinária de processo comum contra a Ré, C Limitada (C有限公司), registada na CRCBM sob o n.º XX8(SO).
     
     Alegando que, como promitentes-compradores e com entrega de sinal, os autores celebraram com a ré, como promitente-vendedora, um contrato-promessa de compra e venda de uma fracção autónoma de um prédio urbano que a ré se propunha construir num terreno concessionado pela RAEM; e alegando ainda que já cessou a concessão sem que a ré tivesse construído, incumprindo e já não podendo cumprir a promessa por razões que lhe são imputáveis, uma vez que, não diligenciou no sentido de concluir a construção dentro do prazo da concessão,
     Pedem os autores que:
     1) Seja declarado resolvido o referido contrato-promessa;
     2) Seja a ré condenada a pagar-lhes a quantia de HKD9.820.000,00, correspondente ao dobro da quantia que recebeu a título de sinal e a quantia de MOP400,00 de despesas tidas com a formalização do contrato, tudo acrescido de juros à taxa legal dos créditos de natureza comercial, contados desde 20/10/2018 até integral pagamento.
     
     Contestou a Ré, aceitando a existência do contrato-promessa1 invocados pelos autores e rejeitando que já não possa ser cumprido, alegando que intentou uma acção judicial contra a RAEM na qual pretende conseguir um novo contrato de concessão por arrendamento do mesmo terreno onde pretendia construir o empreendimento imobiliário de que fazia parte a fracção autónoma contratada, a qual, em caso de procedência da referida acção judicial, poderá ser entregue aos autores2.
     Ainda em contestação, disse a ré que, caso improceda a referida acção que intentou contra a RAEM e caso não possa efectivamente construir o seu empreendimento imobiliário nem possa cumprir a sua obrigação para com os autores, essa impossibilidade não lhe deve ser imputada a si porquanto deve ser imputada à RAEM, a qual, durante o decurso do respectivo procedimento administrativo para aprovação do projecto de arquitectura e para emissão da licença de obras, fez exigências de alteração do projecto de arquitectura que não podia ter feito, fez indevidamente exigências de realização de estudos do impacto ambiental do mesmo projecto e, além disso, não cumpriu os prazos estabelecidos no contrato de concessão e demorou demasiado a apreciar os pedidos da ré para prorrogação do prazo de aproveitamento da concessão, o que levou a que a ré não pudesse iniciar a construção mais cedo e não tivesse conseguido concluí-la antes de caducar a referida concessão.
     Para o caso de se concluir que ocorre impossibilidade da prestação e que esta é imputável à ré, veio esta, também na contestação, defender que os autores não têm direito a indemnização calculada pelo valor do sinal prestado, porquanto não foi acordado o referido sinal, mas apenas o pagamento do preço.
     Também na contestação que apresentou, disse a ré que, caso se conclua pela impossibilidade imputável e pela existência de sinal, deve a indemnização determinada pelo valor deste ser reduzida segundo juízos de equidade.
     Ainda na contestação, disse a ré que o preço que os autores pagaram foi inferior ao alegado por lhe ter sido feito um desconto e que, alegando os autores o contrário, litigam de má fé e deverão ser condenados em multa e indemnização.
     Invocou ainda, relativamente à sua eventual obrigação de indemnizar/restituir aos autores, o direito de compensar a quantia que pagou ao Banco D que lhe era devida pelos autores em consequência do empréstimo que contraíram para pagarem à ré o preço acordado.
     
     Na réplica que apresentaram, os autores opuseram-se à requerida intervenção acessória da RAEM e impugnaram todas as teses da contestação, quer quanto à afirmação da prestação da ré como ainda possível, quer quanto à imputabilidade a terceiro da causa da impossibilidade da prestação, quer quanto à inexistência de sinal e à intervenção da equidade na fixação do montante da indemnização.
     Também quanto ao valor efectivamente pago mantiveram os autores o que disseram na petição inicial e bateram-se à excepção de compensação.
     
     A ré ainda apresentou tréplica, mas sem trazer novidade aos autos, apenas esclarecimentos.
     
     Foi admitida a intervenção acessória da RAEM, a qual contestou. Porém, a ré veio comunicar aos autos que desistiu da acção de indemnização que movera contra a RAEM e, por isso, foi proferido despacho a fls. 1091 a declarar extinta a instância relativamente à RAEM por inutilidade superveniente da lide.
     
     Foi proferido despacho saneador e de selecção da matéria de facto relevante para a decisão a fls. 1048 a 1050.
     
     Procedeu-se a julgamento, foi decidida a matéria de facto contravertida e foram apresentadas doutas alegações de Direito pelos autores e pela ré. De tais alegações sobressai que os autores consideram que a relação contratual em litígio consubstancia um contrato-promessa e retiram do respectivo regime jurídico a solução de Direito do presente pleito, entendendo agora em face dos factos provados que o valor do sinal prestado é inferior ao que alegaram na petição inicial e sobressai ainda que a ré já não rejeita que a sua prestação se tornou impossível mas considera que a referida relação contratual se trata de um contrato atípico com elementos de proximidade com contratos típicos como o contrato-promessa e o contrato de compra e venda de bens futuros e só para efeitos de análise admite que possa ser qualificada de contrato-promessa.
     *
     II – SANEAMENTO.
     A instância mantém-se válida e regular, como decidido no despacho saneador e nada obsta ao conhecimento do mérito.
     *
     III – QUESTÕES A DECIDIR.
     Tendo em conta o relatório que antecede, designadamente:
     - Que a principal pretensão dos autores é serem indemnizados/restituídos em consequência dos danos que sofreram por a ré não ter cumprido, por impossibilidade superveniente, a prestação a que se vinculou por contrato;
     - O facto de os autores e ré estarem de acordo que existe a relação contratual invocada pelos autores e que a prestação a cargo da ré se tornou impossível por causa superveniente;
     - O facto de a essência da principal divergência entre as partes ser a imputabilidade à ré ou a terceiro da causa da impossibilidade superveniente da prestação da ré e a existência ou inexistência de sinal;
     As principais questões a decidir gravitam à volta de:
     1- Imputação à ré ou a terceiro da causa superveniente da impossibilidade da prestação a cargo da ré.
1.1 - Caso se conclua que a causa da impossibilidade superveniente da prestação a cargo da ré deve ser imputada a terceiro, importa apurar as consequências jurídicas de tal imputação, designadamente:
1.1.1 - Quanto à extinção da obrigação da ré decorrente do contrato que celebrou com os autores;
1.1.2 Quanto a eventual criação na esfera jurídica da ré de uma outra obrigação de restituir aos autores o que deles recebeu;
     1.2 - Caso se conclua que a causa da impossibilidade superveniente da prestação a cargo da ré deve ser imputada à própria ré, importa então apurar as consequências da referida impossibilidade superveniente da prestação decorrente de causa imputável à ré, designadamente:
1.2.1 – Criação na esfera jurídica da ré de uma obrigação de restituir aos autores o que deles recebeu.
1.2.2 – Direito dos autores de resolverem o contrato;
1.2.3 - Obrigação da ré indemnizar os autores.
1.2.3.1 - Caso se conclua que a ré tem obrigação de indemnizar os autores, caberá apurar o montante da indemnização e a ocorrência de mora no cumprimento desta obrigação de indemnizar, para isso é necessário averiguar se foi acordado e prestado sinal;
1.2.3.1.1 - Caso se conclua pela existência de sinal, caberá ainda decidir qual o valor desse sinal e se a indemnização deve ser calculada com base no “regime-regra” do sinal ou se deve ser reduzida segundo juízos de equidade para montante inferior ao valor do sinal prestado.
1.2.3.1.2 Caso se conclua pela inexistência de sinal, caberá determinar qual o valor da indemnização na ausência de sinal.
1.2.3.1.3 – Caso se conclua pela ocorrência de mora no cumprimento da obrigação de indemnizar é ainda necessário apurar as consequências desta a nível indemnizatório, designadamente quanto ao início da mora e quanto à taxa dos juros moratórios.
     2- –Compensação da quantia paga pela ré ao Banco D e que lhe era devida pelos autores.
     3- - Ocorrência, ou não, de litigância de má fé por parte dos autores.
     *
     IV – FUNDAMENTAÇÃO.
     A) – Motivação de facto.
     Estão provados os seguintes factos:
     (...)
     
     B) – Motivação de Direito.
 1. – Da impossibilidade superveniente da prestação.
     Neste momento da discussão já não são necessárias especiais considerações para concluir que a prestação da ré se tornou impossível. Seja qual for a prestação devida: celebrar o contrato prometido de compra e venda de uma fracção autónoma de prédio urbano ou apenas construir e entregar a referida fracção. Com efeito, por um lado, a ré já não questiona nas suas alegações de Direito a referida impossibilidade como questionou na contestação dizendo que uma acção judicial lhe poderia proporcionar a faculdade de construir aquela fracção. Por outro lado, a ré veio aos autos informar que já terminou por desistência a referida acção judicial que movera contra a RAEM na qual pretendia recuperar a possibilidade jurídica de construir a fracção a entregar aos autores. Acresce que, não tendo a ré meios jurídicos conhecidos nos autos que lhe permitam construir a mencionada fracção, não se vê como negar as características relevantes da impossibilidade superveniente da prestação: ojectiva, absoluta e definitiva3. Com efeito, sem que ocorram circunstâncias de todo imprevisíveis presentemente, a ré, apesar de ser uma sociedade comercial e poder existir durante muito tempo, não tem possibilidade jurídica de construir ou adquirir a fracção autónoma em causa4. Trata-se de uma impossibilidade jurídica da prestação, não de uma impossibilidade física ou naturalística, pois a construção da mencionada fracção está acessível à ré pelos conhecimentos técnicos existentes, mas não lhe está permitida por causa da sua situação jurídica actual e previsível num futuro ponderável5. Na verdade, resulta dos autos que a ré não tem qualquer direito sobre o terreno onde se iria situar a planeada construção.
     
     Conclui-se assim que se tornou impossível após a celebração do contrato a prestação que a ré acordou com os autores.
     
     Resta, pois, apurar as consequências da impossibilidade da prestação.
     
     1.1 – Dos efeitos da impossibilidade da prestação.
     1.1.1 – Em geral.
     Se a prestação acordada é originariamente impossível, a obrigação não nasce porque o contrato é nulo e, por isso, não gera a obrigação de prestar nem o dever de cumprir (art. 395º, nº 1 do CC).
     Se a prestação acordada é originariamente possível (aquando da celebração do respectivo negócio jurídico), mas posteriormente deixa de o ser, a obrigação extingue-se, não pode ser cumprida e o devedor deixa de ter o dever de a prestar (arts. 779º e 790º do CC).
     Se a impossibilidade superveniente ocorre por razões não imputáveis ao devedor, mas imputáveis a terceiro, ao credor ou a ninguém (caso fortuito ou de força maior), fica o devedor exonerado perante o credor. Se, porém, o credor cumpriu perante o devedor a sua eventual contraprestação e a causa da impossibilidade não imputável ao devedor também não lhe é imputável a si, credor, então este, credor, tem direito a que lhe seja restituído o que prestou, mas segundo as regras do enriquecimento sem causa. É esta a tese da ré, escorada no art. 784º do CC. Com efeito, entende que a impossibilidade da prestação não lhe é imputável a si nem ao credor, mas a terceiro, a RAEM.
     Se a prestação se tornou impossível por causa imputável ao devedor, a obrigação extingue-se, não pode ser cumprida e o devedor deixa de ter o dever de a prestar, como se disse atrás. Porém, o devedor poderá ver nascer na sua esfera jurídica outra obrigação, a obrigação de indemnizar o credor pelos prejuízos sofridos em consequência da mencionada impossibilidade superveniente, devendo o devedor indemnizar o credor como se faltasse culposamente ao cumprimento devido (art. 790º, nº 1 do CC).
     Para apurar os efeitos da impossibilidade da prestação torna-se, pois, necessário decidir se a causa da impossibilidade da prestação é imputável à ré devedora ou à RAEM, terceiro em relação à prestação.
     Vejamos.
     
     1
     1.1.1
     1.1.2 – Da imputação da causa da impossibilidade da prestação.
     A prestação da ré tornou-se impossível porque a ré não construiu no prazo em que poderia fazê-lo (entre a data em que acordou com os autores construir e entregar – 16/3/2011 e a data limite do prazo que tinha para construir, o prazo de aproveitamento da concessão – 28/2/2014 – que foi prorrogado até 25/12/2015).
     A imputação da causa da impossibilidade tem de fazer-se a título de culpa6 e esta é, em sede de responsabilidade civil, um juízo de censura que assenta no facto hipotético de a impossibilidade não ter ocorrido se o agente, em vez de ter actuado como actuou, tivesse actuado como, no seu lugar, actuaria um bom pai de família (arts. 480º, nº 2, 788º, nº 2 e 790º, nº 1 do CC), o qual, entre o mais, é medianamente prudente e medianamente previdente7.
     A ré necessitava de um período mínimo de três anos para conseguir construir como se comprometeu com os autores (art. 135º da contestação) e comprometeu-se a construir quando faltavam menos de três anos para terminar o prazo em que, em condições de normalidade, poderia construir. Além disso, para construir necessitava da “cooperação” da Administração Pública, cooperação que não vinha decorrendo de forma célere. Mesmo que os serviços da Administração Pública não despendessem um único dia durante o qual a ré não pudesse construir, o tempo que a ré dispunha era insuficiente numa perspectiva prudente. Em tal situação, um bom pai de família, não se teria comprometido como a ré se comprometeu com os autores, designadamente sem esclarecer a outra parte contratante, o que se presume que a ré não fez (arts. 788º, nº 1 e 790º, nº 1 do CC), do CC). Na verdade, “quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé…” – art. 219º, nº 1 do CC8. Por isso, o esgotamento do tempo em que a ré poderia ter construído e não construiu, a causa da impossibilidade da prestação, é imputável à ré a título de culpa9.
     O contraente que se compromete a prestar no futuro compromete-se ao mesmo tempo a remover os obstáculos ao cumprimento que previsivelmente se lhe deparem e a disponibilizar o esforço previsivelmente necessário à remoção. Assim, em caso de impossibilidade de remoção do obstáculo ao cumprimento, o insucesso do devedor é-lhe, em princípio, censurável se quando contratou calculou mal as suas forças para remover os obstáculos previsíveis, se previu mal esses obstáculos que eram previsíveis ou se calculou bem forças e obstáculos previsíveis e se conformou com a insuficiência de forças para remover os obstáculos. São a imprudência, a imprevidência, a intenção e a consciência os locais onde se pode ancorar a censura.
     Por outro lado, não se provaram factos onde se possa concluir que a ré tinha razões para estar segura que, contrariamente ao que aconteceu, o prazo de aproveitamento e o prazo de concessão seriam prorrogados nem que lhe seria atribuída nova concessão do mesmo terreno com um grau de segurança que permitiria a um bom pai de família (determinado a cumprir os seus compromissos) vincular-se contratualmente perante terceiros. A ré até poderia confiar e ter expectativas, mas não suficientemente seguras ao ponto de levarem o “bom pai de família” a contratar como a ré contratou contraindo a obrigação de construir com a firmeza que é predicado dos contratos. Com efeito, as expectativas são isso mesmo: confiança que aconteça o que pode não acontecer.
     Perante a factualidade provada, um bom pai de família comerciante e empresário comercial empreendedor que estivesse determinado a prosseguir a sua actividade comercial e que tivesse expectativas de conseguir, não contrataria com os autores sem os avisar da escassez de tempo que se verificava.
     
     Em conclusão, a impossibilidade da prestação devida pela ré é imputável à devedora (ré) a título de culpa (negligência ou inobservância do cuidado objectivamente devido) porquanto essa impossibilidade era previsível a um comerciante medianamente prudente no momento em que o dever de prestar foi assumido pela ré e essa previsibilidade levaria aquele comerciante a não contratar como a ré contratou ou a fazê-lo apenas depois de obter a adesão dos autores ao seu risco empresarial.
     
     1.1.3 - Da resolução contratual.
     No que respeita ao direito à resolução do contrato e às suas consequências de restituição retroactiva do que foi prestado, não se vê como negar. É a lei evidente (arts. 790º, nº 2, 426º a 428º e 282º do CC) e nem as partes questionam.
     Procede, pois, esta pretensão dos autores e deve ser declarado resolvido o contrato, como peticionado.
     
     1.1.4 - Da indemnização dos danos decorrentes da impossibilidade superveniente da prestação por causa imputável ao devedor.
     
     Da existência de obrigação de indemnizar.
     Estando decidido que houve incumprimento culposo da ré, rectius, impossibilidade da prestação por causa imputável à ré, basta que haja danos na esfera jurídica dos autores com nexo de causalidade com o referido incumprimento para que surja na esfera jurídica da ré a obrigação de indemnizar (arts. 787º, 790º e 557º do CC).
     Tendo-se provado que os autores pagaram à ré para receber dela um imóvel e que nada receberam é forçoso concluir que os autores sofreram danos decorrentes do incumprimento da ré, pois que pagaram para adquirir e nada adquiriram.
     Assim, não são necessárias outras considerações para se concluir que existe na esfera jurídica da ré a obrigação de indemnizar os autores, sendo a controvérsia essencialmente respeitante ao valor da indemnização.
     
     Do montante da indemnização.
     Os autores pretendem ser indemnizados pelo dobro do sinal prestado.
     Por seu lado, a ré entende que a sua culpa, caso se conclua que existe, como se concluiu, é diminuta e, havendo lugar a indemnização, esta deve ser fixada, por razões de equidade, em montante inferior ao “sinal” prestado.
     O princípio geral em matéria de responsabilidade civil é que devem ser indemnizados todos os prejuízos efectivamente sofridos pelo credor em consequência do incumprimento do devedor (arts. 787º - “prejuízo que causa ao credor”, 556º - “reconstituir a situação que existiria” e 557º - “danos que o lesado … não teria se não fosse a lesão” - do CC.).
     
     No entanto, se for constituído sinal é o valor deste que, em princípio, determina o valor da indemnização, o valor que terá a obrigação de indemnizar originada pelo incumprimento culposo. É o que dispõe o art. 436º do CC.
     É, pois, necessário apurar se foi constituído sinal, entendendo os autores que foi e a ré que não foi.
     
     Da existência de sinal.
     Da qualificação do contrato.
     Esta questão já foi diversas vezes apreciada por este tribunal com conhecimento das partes, designadamente dos respectivos mandatários, razão por que se dispensa aqui a análise antes feita e se opta pela síntese, por ser mais conveniente para as partes, não lhes reduzindo qualquer garantia processual.
     É a prestação característica acordada pelas partes que determina a qualificação do acordo que celebraram e é a qualificação desse contrato que determina o respectivo regime jurídico que há-de determinar a solução dos diferendos contratuais.
     A prestação acordada que vincula as partes apura-se através da interpretação do contrato.
     A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CC).
     No contrato celebrado entre os autores e a ré, reproduzido no nº 2. dos factos provados, as partes comprometeram-se a celebrar no futuro um contrato de compra e venda, o que se conclui da interpretação do contrato, quer pelo título que as partes lhe deram, quer pelas cláusulas de que o dotaram, designadamente estipulando que os autores não podiam recusar a celebração do contrato definitivo em determinadas circunstâncias (cláusula 22ª) e fazendo depender de pagamento e de autorização da ré a transmissão da posição contratual dos autores (cláusula 9ª), o que é incompatível com a convicção das partes no sentido de os autores terem adquirido da ré um direito real.
      Conclui-se, pois, que deve ser qualificado como contrato-promessa o acordo celebrado entre os autores e a ré.
     
     Da convenção de sinal.
     O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico10. Numa certa perspectiva, é, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial.
     Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes.
     Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes11.
     Se os autores pretendem ser indemnizados segundo o regime do sinal, cabe-lhes, nos termos do art. 335º, nº 1 do CC, alegar e provar, entre o mais, os factos demonstrativos de ter sido estipulada a existência de sinal.
     Porém, no caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CC que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
     Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CC). No caso dos autos, provou-se que os autores entregaram à ré, promitente-vendedora, determinada quantia em dinheiro no âmbito do contrato-promessa que celebraram. Provou-se o facto base da presunção, pelo que está presumido que as partes quiseram atribuir carácter de sinal. Cabe, pois à ré, interessada em ilidir a presunção, a alegação e a prova do facto contrário ao facto presumido, isto é, cabe-lhe provar que as partes acordaram que a quantia entregue não tinha carácter de sinal. A ré não conseguiu fazer a prova dessa vontade negocial contrária à presunção legal.
     
     Conclui-se, pois, por presunção legal, que foi acordado sinal no caso em apreço.
     
     O montante da indemnização predeterminado pelo valor do sinal e a sua redução por juízos de equidade.
     “Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado” (art. 436º, nº 2 do CC).
     Está demonstrado que a ré não cumpriu definitivamente a sua promessa de venda.
     Está também demonstrado que a ré recebeu sinal.
     Foi já decidido atrás que a causa do incumprimento não é imputável a terceiro e que é imputável à ré a título de culpa. E também já atrás foi decidido que o incumprimento culposo da ré confere os autores o direito de resolver o contrato-promessa.
     Deve, pois a ré restituir o que recebeu para cumprir a promessa de venda que não cumpriu, uma vez que, como efeito da resolução do contrato, sempre terá que devolver o que lhe foi prestado (arts. 282º e 427º do CC). Mas terá ainda de pagar aos autores um montante igual ao do sinal que recebeu?
     Vejamos.
     Dispõe o nº 4 do art. 436º do CC que “na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste”.
     E dispõe o art. 801º, nº 1 do CC, aplicável por força do disposto no nº 5 do art. 436º do mesmo CC, que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”.
     
     Portanto, o valor da indemnização por incumprimento do contrato, rectius, por impossibilidade culposa da prestação, deve, em princípio, corresponder ao valor do sinal prestado. Porém, o referido valor da indemnização pode ser:
     - Aumentado para o valor do dano efectivamente sofrido pelo credor se este dano for consideravelmente superior ao valor do sinal12;
     - Reduzido para montante equitativo não inferior ao valor do dano efectivo se a penalização resultante do sinal for manifestamente excessiva em relação ao mesmo dano efectivo13.
     
     O valor do sinal.
     Quanto a esta questão divergem as partes14 quanto ao valor do sinal prestado que deve relevar para a decisão da indemnização a fixar. Os autores entendem que prevalece o valor estipulado como preço da compra e venda prometida. Por sua vez, a ré entende que prevalece o valor efectivamente entregue pelo promitente comprador.
     Releva para a solução desta questão a consideração da vertente real do sinal. Se para decidir se a quantia entregue tem carácter de sinal relevou a vertente negocial ou obrigacional do sinal (a vontade negocial das partes ainda que presumida), agora releva a vertente real. Com efeito, nesta vertente, o sinal assume-se como uma coisa entregue e não já como o acordo ou a convenção de entrega de uma coisa15. É essa dimensão que deriva do texto da lei e da função do sinal, quer seja confirmatório de uma vontade negocial séria, quer seja penitencial e convencionado para o caso de arrependimento previsto na vontade negocial das partes, mas sempre garantístico e destinado a ter efeitos em sede de incumprimento, seja incumprimento lícito porque previsto e regulado pelas partes, seja ilícito. Com efeito, sempre a lei se refere ao sinal como a coisa entregue ou a quantia entregue (arts. 434º a 436º do CC).
     O sinal é, pois, um elemento contratual real quoad constitutionem, sendo que só fica eficazmente constituído com o acto material de entrega da coisa por parte daquele que constitui o sinal (tradens) àquele que dele beneficia (accipiens). Para a existência de sinal não basta o acordo de vontades negociais reais ou presumidas no sentido da respectiva constituição. É necessária a entrega da coisa em que o sinal se materializa16. Daqui deriva que só pode ser considerado sinal aquilo que foi efectivamente entregue, ainda que fosse acordado que deveria ser entregue a título de sinal coisa ou quantia superior. Com efeito, o sinal só desempenha eficazmente a sua função de garantia na medida em que é efectivamente entregue àquele que recebe a coisa que consubstancia o sinal. No fundo, um dos aspectos essenciais que distingue o sinal da cláusula penal é esta diferença estrutural, pois que esta última se restringe a uma convenção obrigando a uma prestação futura em caso de incumprimento, ao passo que o sinal, além de convenção, tem natureza real quoad constitutionem consubstanciada no acto de entrega.
     O sinal tem também uma função de garantia, pelo que a quantia entregue e devolvida perde a referida função e só a quantia retida pela parte que recebe o sinal se mantem como garantia, pois o acordo de redução do preço (desconto) equivale a uma alteração consensual da convenção de sinal, alteração que as partes podem fazer livremente (art. 400º do CC).
     O sinal que se encontra presentemente prestado no caso dos presentes autos e que garantia a ré quanto ao cumprimento dos autores é, pois, constituído pela quantia efectivamente entregue pelos promitentes compradores à ré promitente-vendedora e que esta retem em seu poder - HKD3.928.000,00 (pontos 8. dos factos provados). Com efeito, o que acordou receber, que efectivmente recebeu e devolveu ou o que não chegou sequer a receber, efectivamente não cumpre neste momento qualquer função de sinal17.
     
     O ónus da prova.
     O legislador ao permitir às partes fixarem por convenção as consequências do incumprimento acabou por criar uma distribuição do ónus da prova em que só tem que provar o dano relevante o contraente que pretende que a indemnização por incumprimento se fixe em valor diferente do predeterminado. Assim, o credor que pretende que o valor da indemnização seja superior ao predeterminado tem de provar que sofreu um dano consideravelmente superior ao sinal. Por sua vez, o devedor que pretende que a indemnização seja de valor inferior ao predeterminado tem que demonstrar que a pena é manifestamente excessiva em relação ao dano.
     No presente caso, cabe à ré alegar e provar os factos de onde se possa concluir que o valor do sinal é manifestamente excessivo para ressarcir o dano efectivo dos autores e para sancionar a culpa pelo incumprimento.
     A ré alegou e provou que se esforçou por cumprir e que os autores vão receber uma fracção autónoma de um imóvel idêntica à que a ré lhe entregaria e por preço também idêntico.
     
     Da redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado.
     A redução equitativa da indemnização requer a certeza de que a indemnização determinada pelo valor do sinal é manifestamente excessiva em relação ao dano efectivo.
     Os autores tinham o direito de adquirir a fracção prometida sem ter que pagar nada mais do que já pagaram à ré e terão de pagar pela aquisição da habitação para troca o preço igual ao que acordaram com a ré (sem desconto), pelo que terão um prejuízo de HKD982.000,00.
     Se a ré devolver o sinal antes de os autores pagarem o preço da “fracção para troca”, estes já não terão o prejuízo correspondente.
     O prejuízo dos autores será, então, o correspondente à privação do desconto (interesse contratual negativo) e à privação da disponibilidade da fracção entre a data em que a ré deveria entregar e a data em que a irão receber da sociedade comercial E, S.A. (interesse contratual positivo). No que tange ao interesse contratual positivo trata-se de uma situação semelhante à mora e não ao incumprimento definitivo, pois que os autores irão adquirir uma fracção como pretendiam, mas mais tarde do que acordaram.
     Se aos autores for devolvida a quantia que pagaram e se obtiverem pelo mesmo preço a fracção que pretendiam, embora com atraso e sem desconto no preço, a indemnização correspondente ao valor que pagaram (HKD3.928.000,00) é manifestamente excessiva, pois que a disponibilidade da fracção durante o tempo em que os autores dela não podem dispôr não proporcionaria aos autores um valor líquido tão elevado que, somado ao “desconto perdido”, se aproximase de HKD3.928.000,00.
     O Venerando Tribunal de Segunda Instância já apreciou caso semelhante ao presente, embora os ali autores tivessem feito o seu pagamento no ano de 2015, e considerou que o dano equitativo corresponde à aplicação de uma taxa anual de 3,5% durante 8 anos sobre o valor efectivamente pago pela autora18. Perspectivou, pois o dano como interesse contratual negativo. Não o que a autora deixou de auferir através do que despendeu, mas o que tever de despender em vão, sem nada auferir.
     Seguindo o entendimento do Venerando TSI, no caso presente seria de considerar o período de 12 anos, pois que os autores pagaram à ré no ano de 2011.
     Aplicando a doutrina do referido douto acórdão, temos que a quantia paga pelos autores à ré foi de HKD3.928.000,00, pelo que o valor da indemnização equitativa do interesse contratual positivo não deve ser inferior a HKD1.649.760,00 (3.928.000,00 x 3,5% x 12).
     No caso presente há ainda a considerar:
     - O dano dos autores correspondente à diferença entre o preço que terão de pagar pela “habitação para troca” e o preço que pagaram à ré (HKD982.000,00);
     - Que os autores contraíram empréstimo bancário no montante de HKD3.430.000,00, o qual entregaram à ré, que esta lhes irá restituir e sobre o qual também já se considerou a taxa anual de 3.5% considerada equitativa pelo Venerando TSI;
     - Que a ré pagou por conta dos autores a quantia de HKD2.623.023,16 ao respectivo Banco mutuante para restituição da quantia mutuada e respectivos juros.
     Este tribunal também já decidiu em diversos casos a questão da redução equitativa do valor da indemnização determinada pelo valor do sinal, sendo que esta redução equitativa não levar à fixação de indemnização em montante inferior ao dano efectivo e deve ainda respeitar a função punitiva do sinal. Sendo essa decisão e a respectiva fundamentação conhecidas das partes através dos seus ilustres mandatários, é aqui dispensável repetir.
     Assim, aderindo à referida doutrina do TSI, e considerando ainda o dano dos autores correspondente à diferença entre o preço que pagaram, respeitando a função punitiva do sinal, embora de forma equitativamente menos severa, considerando o preço que os autores terão que pagar pela “habitação para troca” e considerando também a parte do empréstimo bancário dos autores que a ré saldou ao Banco mutuante, afigura-se equitativo fixar em HKD.3.000.000,00 o valor da indemnização a cargo da ré em consequência da impossibilidade superveniente da sua prestação devida no âmbito do contrato que celebrou com os autores.
     
     Das de despesas com a formalização do contrato (MOP400,00).
     Os autores pretendem ainda a devolução das despesas que tiveram com a formalização do contrato. Trata-se de um dano respeitante ao interesse contratual negativo. Havendo sinal, só serão ressarcidos os danos efectivos se no seu conjunto forem consideravelmente superiores ao valor do sinal prestado (art. 436º, nº 4 do CC). Não é o caso das despesas de formalização do contrato.
     Improcede esta parte da pretensão dos autores.
     
     Da compensação.
     Os autores contrairam empréstimo bancário para pagar à ré o preço acordado. A ré, por acordo com o Banco mutuante, pagou a dívida dos autores no valor de HKD2.623.023,16. Diz agora a ré que ficou sub-rogada no crédito do Banco mutuante e pretende compensar esse crédito com a dívida que tenha para com os autores.
     Um terceiro interessado pode cumprir a obrigação do devedor (art. 757º do CC) e o credor que recebe de terceiro pode sub-rogá-lo nos direitos que tinha sobre o devedor, adquirindo o terceiro esses direitos (arts. 583º e 587º do CC). O credor também pode ceder a terceiro o seu crédito, mesmo sem consentimento do devedor (art. 571º do CC).
     Os autos não fornecem os factos necessários a qualificar a situação que cria o crédito da ré a compensar com o crédito dos autores, seja como sub-rogação, seja como transmissão de crédito. Com efeito, os referidos factos não esclarecem qual era concretamente a dívida dos autores para com o Banco mutuante. Tudo aponta para se concluir que a ré não cumpriu a obrigação dos autores. Ao que parece, modificou-a e cumpriu a obrigação modificada. Ao que parece, os autores pediram emprestado e estavam a pagar mensalmente conforme acordado, o que demoraria anos. A ré acordou com o Banco liquidar tudo de uma vez só. Sem o consentimento do devedor, o credor e terceiro não podem modificar a obrigação daquele devedor.
     Assim, a ré não adquiriu qualquer crédito do Banco sobre os autores, porque estes deviam prestações mensais e a ré cumpriu prestação única. Sem o consentimento dos autores, o que a ré e o Banco mutuante fizeram não vincula os autores. Assim, sem o consentimento dos autores, a ré e o Banco não podiam liquidar de uma só vez um empréstimo que se vencia em prestações mensais. A ré e o Banco interferiram no conteúdo da obrigação dos autores para com o banco sem terem direito de interferir. O Banco mutuante não pode sub-rogar a ré num direito que não tem sobre os autores, o direito de liquidar arbitrariamente ou ad nutum a totalidade do empréstimo que acordou liquidar em prestações mensais.
     Conclui-se, pois, que a ré não é titular do crédito que invoca como tendo-lhe sido transmitido pelo Banco mutuante e, por isso, não pode compensá-lo com a dívida que tenha para com os autores.
     Mas afigura-se evidente que a actuação da ré, sem animus donandi, configura um enriquecimento dos autores sem causa justificativa, o que cria na esfera jurídica dos autores a obrigação de devolverem à ré aquilo como que se enriqueceram à custa dela. É certo que a situação de enriquecimento sem causa e da medida da obrigação de restituir que surge de tal enriquecimento, não foram invocadas nem tramitadas com alegação de factos em discussão contraditória, onde tudo que fosse pertinente se poderia invocar, designadamente a prescrição da obrigação de restituir. Mas afigura-se isento de questões e de dúvidas que se verificam todos os pressupostos daquele instituto e que a medida da obrigação de restituir por enriquecimento próprio e empobrecimento alheio é exctamente a quantia que a ré pagou ao Banco mutuante (arts. 467º e 473º).
     Conclui-se, pois que a ré tem um direito sobre os autores: que lhe restituam o que por conta deles pagou ao Banco D.
     E também não há dúvidas que a ré pode compensar esse crédito com a dívida que tenha para com os autores (art. 838º do CC).
     Os autores têm dois créditos diferentes sobre a ré: um crédito a que lhes seja restituído o que prestaram, o qual surge como efeito da resolução do contrato; outro crédito a que lhes sejam ressarcidos os danos que sofreram em consequência do incumprimento.
     A questão é agora saber qual o crédito dos autores que seve entrar na compensação. É o que estiver vencido no momento em que opera a compensação por declaração à outra parte com a notificação da contestação (arts. 838º, nº 1, al. a) e 839º, nº 1 do CC).
     A ré pagou ao Banco D uma dívida dos autores e pretende-se a compensação. A quantia que a ré pagou deve ser compensada com a obrigação vencida na altura em que a compensação foi feita. Na referida altura, a obrigação de indemnizar ainda não estava vencida, pois só com a liquidação se vence (art. 794º, nº 4 do CC), mas já se vencera a obrigação de restituir em consequência da resolução contratual, que se venceu com a citação (art. 430º do CC). É com esta obrigação que deve fazer-se a compensação.
     Deste modo, a parte que falta restituir da quantia que a ré recebeu dos autores é HKD1.304.976,84.
     
     2 - Da mora na obrigação de indemnizar.
     2.1 - Do início da mora (art. 794º do CC e art. 565º, nº 3 do CPC).
     Tendo a indemnização sido fixada segundo juízos de equidade, é ilíquida a respesctiva obrigação de indemnizar, pelo que a mora só se inicia com a liquidação operada pela presente decisão.
     Porém a mora quanto à obrigação de restituição do sinal prestado venceu-se com a interpelação. E esta interpelação ocorreu com a citação.
     
     2.2 - A taxa de juro moratório.
     A indemnização moratória relativa às obrigações pecuniárias corresponde aos juros legais a contar do dia da constituição em mora, salvo excepções aqui inaplicáveis (art. 795º do CC).
     Nos termos do art. 569º, nº 2 do Código Comercial só em relação aos créditos de natureza comercial acresce a sobretaxa de 2% sobre os juros legais, não sendo aplicável ao crédito dos autores nem às obrigações de que sejam titulares passivos os comerciantes ou as empresas comerciais se o titular activo não for comerciante.
     A indemnização moratória deve corresponder aos juros legais contados desde a citação sem acréscimo da sobretaxa aplicável aos créditos de natureza comercial.
     
     3 - Da qualidade da litigância dos autores.
     Os autores alegaram que pagaram à ré a quantia de HKD.4.910.000,00 e a ré alegou que apenas lhe foi paga a quantia de HKD3.928.000,00 porquanto fez um desconto aos autores de HKD982.000,00.
     Dizendo a ré que o referido desconto era do conhecimento dos autores, conclui aquela que estes litigam de má fé ao alegarem factos contrários à verdade.
     Os autores responderam aceitando que foi feito o referido desconto, mas rejeitando litigar de má fé e dizendo que a própria ré declarou por escrito que recebeu HKD.4.910.000,00 e que devolveu HKD982.000,00.
     Nas suas alegações de Direito os autores já reconduzem a sua tese à indemnização de acordo com o montante que efectivamente pagaram, HKD3.928.000,00.
     Provou-se (ponto 8. dos factos provados) que “o preço inicialmente acordado no acordo referido em B) foi de HKD4.910.000,00 e que o preço efectivamente pago pelos autores à ré foi de HKD3.928.000,00”.
     Temos então que tudo se resume ao enquadramento jurídico dos mesmos factos praticados e declarados pelas partes e não à alegação de factos não verdadeiros. Os autores entendem que os factos correspondem juridicamente a pagamento, a constituição de sinal e a restituição convencional de uma quantia que têm em seu poder, uma restituição ao jeito de “traditio brevi manu”. Por seu lado, a ré entende que os factos não correspondem àquelas qualificações jurídicas, embora tenha declarado em documento que restituiu quantia recebida.
     Não se encontra, pois, litigância de má fé, porquanto são defensáveis as duas posições jurídicas divergentes acerca dos mesmos factos, os quais não foram escondidos nem escamoteados.
     *
     V – DECISÃO.
     Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, declara-se resolvido o contrato celebrado entre as partes e condena-se a ré a pagar aos autores a quantia de:
     - HKD1.304.976,84 (um milhão, trezentos e quatro mil, novecentos e setenta e seis dólares de Hong Kong e oitenta e quatro cêntimos), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da citação da ré até integral pagamento;
     - HKD3.000.000,00 (três milhões de dólares de Hong Kong), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da presente sentença até integral pagamento.
     
     Custas a cargo de autores e ré na proporção do respectivo decaimento.
     Registe e notifique.
*
    Quid Juris?
    Uma vez que está em causa essencialmente a aplicação de Direito, vamos apreciar os recursos interpostos pelos Autores e pela Ré em conjunto.
*
    Ora, a particularidade do caso dos autos consiste no seguinte:
    a) – Celebrado o respectivo contrato-promessa, os Autores pagaram, no 1º momento, uma parte do preço acordado para adquisição da fracção autónoma (“9º - F”) em causa;
    b) – Depois, eles contraíram empréstimos bancários para pagar o remanescente do preço acordado;
    c) – Agora, os Autores vêm a reclamar a restituição em dobro das quantias totais pagas por ele e indemnizações por danos excedentes.
    Terão os Autores fundamentos legais para o fazer?
    Tal como temos vindo a sublinhar que cada caso é um caso, não obstante existirem vários processos em que se discutem as questões idênticas ou semelhantes.
    Ora, dada a identidade ou a semelhança da matéria discutida neste tipo de processos, as considerações por nós tecidas noutros processos valem, mutatis mudantis, para o caso, obviamente com as devidas adaptações, nomeadamente no processo nº 813/2024, com o acórdão proferido em 13/3/2025, em que ficou consignado o seguinte entendimento:
    
     “(…)
    1) – Nos exercício das funções jurisidicionais, é do conhecimento deste TSI que são basicamente as seguintes situações que dão origem aos litígios em que se discutem as mesmas matérias:
    a) – O promitente-comprador mantém a sua posição contratual até à data em que foi proposta acção contra a Ré, sem que tivesse transmitido a sua posição contratual para terceiro;
    b) – O promitente-comprador chegou a ceder a sua posição de promitente-comprador para um terceiro, por um preço superior ao fixado no primeiro contrato-promessa, e é este terceiro, actual titular da posição do contrato-promessa que veio a propor a acção contra a Ré, pedindo que esta lhe pagasse o sinal dobro à luz do preço mais alto (ou seja, existe diferença ao nível do preço, o preço fixado no primeiro contrato-promessa e o preço mais alto posteriormente fixado no segundo (ou posteriores) contrato-promessa;
    c) – O promitente-comprador chegou a celebrar vários contratos-promessa com a Ré, prometendo adquirir várias fracções autónomas (depois, chegou a transmitir alguns contratos-promessa para terceiros e mantém alguns para si próprio).
    2) – Todas as hipóteses acima apontadas trazem várias questões para discutir, uma delas consiste em saber se é legítimo e justo que o promitente-comprador venha a receber o sinal em dobro independentemente das particularidades do caso em discussão.
    3) – No caso, não é supérfluo realçar que o caso em análise tem a sua particularidade, já que, ao contrário daquilo que se verifica em situações normais, em que a promitente-vendedor não quer cumprir de livre vontade e por iniciativa própria o acordado. No caso não foi isto que sucedeu, a Ré quis cumprir, só que por decisão do Governo da RAEM, a Ré não pude cumprir. Ou seja, a sua “culpa”(se podemos utilizar esta palavra) não é acentuada nem “indesculpável”, o que deve relevar para ponderar e fixar as sanções contratuais!
     (…)”.

    Aqui, merece igualmente destacar um outro ponto: o raciocínio do Tribunal a quo aponta, parece-nos, para a ideia de que toda a culpa de incumprimento se concentra na parte da Ré/Recorrente, mas tal como se refere anteriormente por nós, não é líquida esta argumentação, já que a Ré fazia e tentava fazer tudo para que pudesse cumprir os compromissos assumidos perante o Governo da RAEM, apesar que o resultado final não vir a ser “satisfatório” a todos os níveis. Mas os comportamentos assumidos pela Ré demonstram que não existe “dolo” de incumprimento por parte dela, quanto muito, negligência ou utilizando uma linguagem diferente, um “risco de investimento” que a Ré há-de assumir, daí a sua quota-parte de responsabilidade, circunstâncias estas que devem ser valoradas na fixação das indemnizações que cabem no caso em análise. Aliás, o Tribunal recorrido na fundamentação da decisão dos factos afirmou: “A convicção do tribunal formou-se na análise crítica da globalidade da prova testemunhal e documental produzida, ponderada nos termos antes referidos e que podem ser explicitados sinteticamente como segue.
    É uma evidência que a ré tinha vontade firme de concluir o empreendimento “H”, o que resulta da consideração dos esforços e dispêndios que fez, incontestáveis e incontestados nos autos, incluindo por via judicial.”
*
    Questão do incumprimento do acordo firmado:
    Conforme o quadro factual fixado pelo Tribunal recorrido, existem vários factos que são claros para demonstrar que a Ré não actuou com “dolo” no incumprimento dos acordos quer perante o Governo enquanto concedente quer perante as partes dos contratos-promessa, a saber:
    “(…)
     - A DSSOPT aprovou o projecto sem o sugerido afastamento entre torres e em 7/1/2011 notificou a ré dessa aprovação e notificou-a ainda para apresentar o relatório de estudo de impacto ambiental que teria a construção do edifício em matéria de fluxo de ar, efeito biombo, ilhas de calor e expansão de poluentes e referindo à ré que não lhe seria emitida licença de obras sem que o referido relatório fosse apresentado e aprovado;
     - Em 11/5/2011, a ré apresentou à DSSOPT um relatório do estudo de impacto ambiental requerido;
     - Posteriormente, a DSSOPT em coordenação com a DSPA exigiu à ré a apresentação de outros relatórios de estudos de impacto ambiental incidentes sobre outros aspectos ambientais diferentes daqueles que havia mencionado e a ré apresentou-os até que, em 15/10/2013, foi aprovado o último relatório apresentado;
     Em 24/10/2013, a ré requereu à DSSOPT a emissão de licença de obras que foi emitida em 2/1/2014.
     - Se a DSSOPT tivesse dado resposta em 60 dias apreciando o projecto parcial de arquitectura apresentado pela ré em 06/05/2008, a que não respondeu;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando o projecto global de arquitectura apresentado pela ré em 22/10/2009, a que respondeu em 9/4/2010;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando a alteração apresentada ao referido projecto global em 3/6/2010, a que respondeu em 7/1/2011 e
     - Se a DSSOPT, quando em 7/1/2011 exigiu pela primeira vez a realização de estudos de impacto ambiental, tivesse exigido à ré todos os estudos da mesma natureza que lhe exigiu mais tarde.
    
    “(…)”
     1. A Ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou dada uma nova concessão do mesmo terreno para data posterior a 24/12/2015 porque os serviços da RAEM criaram tais expectativas, nomeadamente:
a. Ao emitirem licença de obras para as fundação em 02/1/2014, um mês antes do terreno do prazo de aproveitamento;
b. Ao Prorrogarem o prazo de aproveitamento em 29/7/2014 até 25/12/2015, sabendo que tal não seria possível;
c. Já anteriormente haviam concessionado novamente o mesmo terreno ao mesmo concessionário em casos em que o terreno concessionado não tinha sido aproveitado no dentro do respectivo prazo. (Q 9.º)
    (…)”.
    Tudo isto demonstra claramente que a Ré não actuou com dolo para desrespeitar as obrigações decorrentes dos contratos-promessa, pelo contrário, os factos assentes acima transcritos podem constituir alteração superveniente das circunstâncias nos termos do artigo 431º do CCM (O Autor chegou também alegar esta matéria conforme o teor do artigo 138º a 139º da PI), já que se tratam de factos imprevisíveis e que ocorreram posteriormente ao momento da celebração dos acordos em análise.
*
    Resoluções possíveis do incumprimento dos contratos bilaterais:
    
    Com as devidas adaptações, o disposto no artigo 784º/2 do CCM pode ser chamado para fundamentar a decisão em análise, já que tal normativo dispõe:
    
(Contratos bilaterais)
    1. Quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa.
    2. Se a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor, não fica este desobrigado da contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com a exoneração, o valor do benefício é descontado na contraprestação.
    Em regra, a restituição do sinal não representa uma injustiça flagrante ou ofende o sentido de justiça material, é de aceitar como correcta a solução legalmente consagrada: restituição do sinal em dobro por quem não cumpre o acordo celebrado nos termos do disposto no artigo 801º do CCM.

*
    1) - Agora, relativamente ao dano excedente, quando não pode ser calculado ao certo, à luz da doutrina dominante, e no caso da sua impossibilidade, recorre-se ao juízo de equidade.
    A propósito deste ponto, escreveu-se:
    “De harmonia com a lei substantiva, sempre que não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (art.º 566.º, n.º 3, do Código Civil). Considerada a possibilidade processual de uma condenação ilíquida, coloca-se o problema da articulação de uma e outra norma (artº 609.º, n.º 2, do CPC). A articulação deve ser feita do modo seguinte: se ainda for possível fixar no incidente de liquidação a quantidade da condenação, aplica-se a norma processual da condenação genérica; no caso inverso, o dano será equitativamente julgado5. Equidade – como justiça do caso concreto – que, porém, sob pena de um julgamento puramente arbitrário ou atrabiliário, não prescinde de um suporte de facto, por mínimo ou reduzido que seja6, nem serve para alijar por inteiro, o não cumprimento, seja pelo credor da obrigação de indemnização quantitativamente indeterminada do ónus da prova do valor do dano a que está indiscutivelmente adstrito, seja pelo devedor de igual ónus que o vulnera no tocante a qualquer facto extintivo daquela mesma obrigação (art.º 342.º, n.ºs 1 e 2, e 346.º, n.º 1, in fine, do Código Civil, e 414.º do CPC).”19

    2) – Pergunta-se, como é que se deve resolver este tipo de questões? A propósito desta matéria, citemos aqui a posição dominante vigente em Portugal, em nome do Direito Comparado (Cfr. ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 9/10/2012) sobre a matéria em discussão (uma situação semelhante):
“Acontece porém que nos situamos no âmbito da resolução do contrato. O autor optou pela resolução do contrato.
A resolução do contrato “consiste na destruição da relação contratual, validamente constituída, operada por um acto posterior de vontade de um dos contraentes, que pretende fazer regressar as partes à situação em que elas se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado” [14].
Entre as partes e na falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade do negócio jurídico, nos termos do art.º 433º do Código Civil. Por isso tem efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes.
Ao pretender indemnização por lucros cessantes, o A. está a pedir a reparação do interesse contratual positivo, ou seja, o ressarcimento do prejuízo que não sofreria se a cessão de exploração tivesse sido inteiramente cumprida pela R. O que resultaria para o credor do cumprimento curial do contrato, abrangendo, portanto, não só o equivalente da prestação, mas também a cobertura pecuniária (a reparação) dos prejuízos restantes provenientes da inexecução, "de modo a colocar-se o credor na situação em que estaria se a obrigação tivesse sido cumprida".
Como é sabido, “a nulidade impede a produção de efeitos e a anulação faz cessar a produção de efeitos jurídicos” [15].
Em caso de resolução contratual, a posição clássica e largamente dominante, é a de que a tutela se resume ao interesse contratual negativo, ou seja, ao prejuízo que o credor não teria se o contrato não tivesse sido celebrado [16]. Tal entendimento tem sido seguido maioritariamente na jurisprudência. [17]
Com base nesta doutrina, não é aceitável a compatibilidade de cumulação entre a resolução do contrato e a indemnização correspondente ao (interesse contratual positivo, sobretudo com fundamento nos argumentos retirados do efeito retroactivo da resolução e da incoerência da posição do credor, ao pretender, depois de ter optado por extinguir o contrato pela solução, basear-se nele para obter uma indemnização, correspondente ao interesse no seu cumprimento.
Por isso e conclui no citado acórdão de 24.1.2012 que, “por regra, a indemnização fundada no não cumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido”.
Nada no caso justifica que nos afastemos da regra geral em razão dos interesses em discussão, o que se justifica apenas em casos excepcionais, como também tem sido entendido na jurisprudência. [18]
Por conseguinte, improcede o pedido de indemnização do A. relativo a lucros cessantes.”

    Questão da indemnização pelos danos excedentes:
    
    O raciocínio vale, mutantis mudantis, para o caso dos autos, sendo certo que o artigo 436º do CCM (que tem uma redacção diferente da do CC de 1966 vigente em Portugal), consagra:
(Sinal)
    1. Quando haja sinal, a coisa entregue deve ser imputada na prestação devida, ou restituída quando a imputação não for possível.
    2. Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado.
    3. A parte que não tenha dado causa ao incumprimento poderá, em alternativa, requerer a execução específica do contrato, quando esse poder lhe seja atribuído nos termos gerais.
    4. Na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
    5. É igualmente aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 801.º
    Depois, o artigo 801º do CCM manda:
(Redução equitativa da pena)
    1. A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em contrário.
    2. É admitida a redução nas mesmas circunstâncias, se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida.
    A propósito dos nº 4 e 5 do artigo 436º do CCM, anotou-se:
    “15. No estudo global que se faça do problema, chega-se à conclusão que o nº 4 vem reforçar a ideia transversal consagrada no Código a respeito da natureza confirmatória do sinal (o próprio Menezes Leitão acaba por admitir que o nº 4 não tem natureza penitencial, em ob. cit., pág. 246). Ou seja, para lá da perda do sinal pelo tradens ou da devolução em dobro do sinal pelo accipiens, ainda pode haver lugar, salvo estipulação em contrário, a indemnização pelo dano excedente. Foi uma opção do legislador de Macau, que podia ter aproveitado a ocasião para ser mais generosa. Com efeito, não passou da criação dessa possibilidade indemnizatória pelo dano excedente, sem a estender a outra qualquer indemnização (nomeadamente, por danos não patrimoniais), tendo em conta que na parte final do nº 4 afirmou expressamente a impossibilidade de alargamento da extensão indemnizatória (habitualmente, alguns autores defendem que, sem limitação, pode haver a indemnização por perdas e danos no caso de sinal confirmatório).
     Pior é, apesar de tudo, a situação do parente próximo preceito português, pois nele se preceitua que "Na ausência de estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não cumprimento".
     De qualquer maneira, há mesmo aí quem sustente que, para além dessa indemnização pelo não cumprimento, possa haver uma ou mais indemnizações fundadas noutras causas, como, por exemplo, nos casos de terem sido feitas benfeitorias na coisa (Ana Prata, Código ... cit., pág. 568).
     16. O nº 5 manda aplicar, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 801º. Não é bem claro o propósio da disposição legal: se apenas se aplica aos casos em que os contraentes estabelecem no contrato uma indemnização para o caso de incumprimento por arrependimento (arras ou sinal penitencial), ou se também aplicação no caso de sinal confirmatório-penal.
     E se a resposta for no sentido de apenas cobrir a segunda hipótese de sinal confirmatório, ainda fica por saber se a redução por equidade (art. 801º) abrange somente as situações em que há dano excedente (nº 4), calculando-se aí a indemnização segundo critérios equitativos, ou se também atinge o dobro do sinal por incumprimento do accipiens.
     Por um lado, poderia parecer que a melhor solução seria, efectivamente, a que permite a aplicação do regime de redução no caso de incumprimento de contrato em que o sinal tem a função de arra confirmatória. Na verdade, se o sinal tiver o sentido penitencial, isso se deve ao facto de as partes, de livre vontade e por consenso, terem estabelecido os próprios limites indemnizatórios, não fazendo sentido que o tribunal os possa baixar apenas porque o devedor lho tenha pedido.
     Por outro lado, é de crer que a redução também não possa incidir sobre o dobro do sinal, porque isso seria contrariar a solução da lei (nº 2).
     Nesta óptica, pareceria ficar assim a remissão para o art. 801º circunscrita às situações em tiver que haver indemnização pelo dano excedente. Este dano pode ser, realmente, elevado, se tivermos em conta as diferenças de preços em mercados (por exemplo, imobiliários) que frequentemente se pautam por regras pouco saudáveis de especulação. Tendo em conta que o dano pode ser realmente avultado, a intervenção do juiz pode eventualmente justificar-se, se bem que a redução também pode funcionar como um prémio ao devedor.
    Não temos, enfim, a certeza sobre o alcance da norma.
     Mas, se fizermos a conjugação dos artigos 436º, 801º (e o ambiemte da sua sistematização) e 820º, nº 2, (neste caso, para o contrato-promessa) talvez seja possível, afinal de contas, considerar que a remissão apenas faça sentido nos casos em que as partes contratantes tenham estipulado, por penitência, uma indemnização com caracter de pena no contrato para a hipótese de não cumprimento por arrependimento. A jurisprudência dirá o que for de justiça sobre o assunto. (Cfr. Código Civil de Macau, Anotado e Comentado, João Gil de Oliveira e José Cândido de Pinho, CFJJ, 2020, Vol. VI, pág. 506 e 507).
    Efectivamente pode existir alguma dúvida na interpretação e aplicação das normas em causa.
    Mas não é pela primeira vez que este TSI é chamado para se pronunciar sobre o conceito de danos ou prejuízos excedentes, o mesmo conceito encontra-se consagrado no artigo 1027º do CCM em matéria locatária que dispõe:
     
(Indemnização pelo atraso na restituição da coisa)
    1. Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida.
    2. Logo, porém, que o locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro; à mora do locatário não é aplicável a sanção prevista no artigo 333.º
    3. Fica salvo o direito do locador à indemnização dos prejuízos excedentes, se os houver.
    A propósito deste conceito, ficou consagrado o seguinte entendimento no Proc. nº 646/2017, com o acórdão proferido em 26/07/2018:
     
    “I - A Ré deve pagar a quantia equivalente ao dobro da renda que se praticava, como justa indemnização específica pela não restituição do imóvel, embora de natureza contratual, por continuar a usar a coisa, em prejuízo das locadoras, correspondente à renda que estava a ser praticada e que se traduz no valor de uso do imóvel.
    II – Em relação à indemnização pelos prejuízos excedentes, uma vez verificados, a título de lucros cessantes, ela tem por fundamento o efectivo prejuízo causado, que pode já não se medir pelo valor da renda, não obstante ser o mesmo o respectivo facto gerador, mesmo que o montante dos danos causados às locadoras seja inferior ou equivalente ao quantitativo da renda, hipótese em que ao credor basta a indemnização contemplada pelo artigo 1027º/2 do CC.
    III - A solução correcta só poderá ser conseguida mediante interpretação sistemática, lógica e teleológica da norma do artigo 1027º/3 do CCM. Não resta dúvida que, quer a sanção prevista no nº 2, quer no nº 3 do artigo citado, visa “forçar” o inquilino a devolver o locado ao senhorio com o mais cedo possível, sob pena de estar sujeito a sanções pesadas até que o locado seja devolvido a quem de direito.
    IV - Por esta via, a leitura mais consentânea com a ratio legis da norma do artigo 1027º/3 do CCM é a de que a indemnização da mora entra em linha de consideração para efeitos da fixação da indemnização por prejuízo excedente, sob pena de se duplamente “sancionar” o inquilino!”
     
    Não há razões bastantes para não seguirmos o entendimento acima referido, já que está em causa uma matéria de natureza idêntica: para além de pagar o dobro, pode pedir-se indemnização por danos excedentes, mas estes têm de estar devidamente demonstrados e comprovados, não bastam alegações abstractas ou provas indirectas.
    No que respeita aos critérios da valoração probatória, nunca é demais sublinhar que se trata de um raciocínio problemático, argumentativamente fundado no húmus da razão prática, a desenvolver mediante análise crítica dos dados de facto veiculados pela actividade instrutória, em regra, por via de inferências indutivas ou analógicas pautadas pelas regras da experiência colhidas da normalidade social, que não pelo mero convencimento íntimo do julgador, não podendo a intuição deixar de passar pelo crivo de uma razoabilidade persuasiva e susceptível de objectivação, o que não exclui, de todo, a interferência de factores de índole intuitiva, compreensíveis ainda que porventura inexprimíveis. Ponto é que a motivação se norteie pelo princípio da completude racional, de forma a esconjurar o arbítrio20.
    É, pois, nessa linha que se deve aferir a razoabilidade dos juízos de prova especificamente impugnados, mediante a análise crítica do material probatório constante dos autos, incluindo as gravações ou transcrições dos depoimentos, tendo em conta o respectivo teor, o seu nicho contextual histórico-narrativo, bem como as razões de ciência e a credibilidade dos testemunhos. Só assim se poderá satisfazer o critério da prudente convicção do julgador na apreciação da prova livre, em conformidade com o disposto, designadamente no artigo 390º do CCM, em conjugação com o artigo 558º do CPC, com vista a obter uma decisão que se possa ter por justa e legítima.
    Voltando ao caso em análise, sublinhe-se aqui, é de verificar que a norma do nº 4 do artigo 436º é mais exigente do que a norma do artigo 1027º (que regula a matéria de locação), pois aquela norma fala de “dano consideravelmente superior’! O que exige provas mais rígidas e persuasivas!
*
    Aqui, é de recordar-se que no processo nº 220/2024 fica consignado o seguinte entendimento:
    “從上述轉錄的內容可見,原審法院已詳細論證了第一被告的不履行責任,我們認同有關見解,故基於訴訟經濟原則及根據《民事訴訟法典》第631條第5款之規定,引用上述見解和依據,裁定這部分的上訴理由不成立。
    事實上,本院在涉及“H”事件的案件中已多次強調(見中級法院在卷宗編號1142/2019、1145/2019、1150/2019及1192/2019內作出的裁判),澳門特別行政區僅和土地承批人,即本案之第一被告,建立了法律關係;一切因應承批土地所作出的行為,均是針對土地承批人/第一被告而作出。因此,即使假設該等行為損害了土地承批人/第一被告的權益,例如無法如期利用土地而導致其需向預約買受人作出賠償,也只能是土地承批人/第一被告在履行其賠償義務後再向澳門特別行政區追討賠償,而非預約買受人可直接向澳門特別行政區追討因土地承批人/第一被告違反與其簽定的預約買賣合同的賠償責任。
    只有在澳門特別行政區濫用權利,行為特別惡劣的情況下其才需負上相關賠償責任,然而本案並不存在該等情況。
    4. 就賠償金額方面:
    第一被告認為基於合同不履行非其責任,故只應按不當得利規則(《民法典》第784條第1款之規定)作出返還。
    此外,亦認為即使假設其在相關的合同不履行存有過錯,雙倍的定金賠償是明顯過高,應根據衡平原則作出縮減。
    我們在前述部分已認定第一被告需對合同的不履行負上責任,故不能適用《民法典》第784條第1款之規定,按不當得利規則作出返還。
    就賠償金額方面,根據《民法典》第3條的規定,法院在下列任一情況下可按衡平原則處理案件:
    a) 法律規定容許者;
    b) 當事人有合意,且有關之法律關係非為不可處分者;
    c) 當事人按適用於仲裁條款之規定,預先約定採用衡平原則者。
    《民法典》第436條第5款明確容許經適當配合後適用第801條之規定,即容許法院當認為賠償金額過高時按衡平原則減少違約賠償金額。
    為此,我們需考慮原告們的實際損失是多少,即其共付出了多少金錢以取得相關的合同地位來決定是否適用衡平原則作出縮減。
    在本個案中,原告們向原預約買受人支付了港幣2,356,000.00元(900,000+1,456,000)以取得相關的預約買受人合同地位。
    倘按平均年利率3.5%計算8年(2012-2019年)的利息,可獲得港幣659,680.00元的利息,即共有港幣3,015,680.00元。
    原告們可獲得雙倍定金的賠償是港幣2,292,000.00元(1,146,000 x 2),並不高於前述的金額。
    由此可見,原審法院不以衡平原則對賠償金額作出縮減是正確的,應予以維持。”
    3) – Voltando ao caso dos autos, uma leitura possível: ao contrário que se pretende defender, temos por certo que as quantias pagas pelos Autores à Ré a título de sinal, se fossem depositadas nas instituições bancárias, certamente eles receberão juros, facto este que temos por certo que os Autores deixaram de poder os receber, razão pela qual a Ré deve indemnizá-los por esta via.
(…)
    4) - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas, que se distingue do puro julgamento jurídico por apresentar menos preocupações sistemáticas e maiores empirismo e intuição. Portanto, a equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto (Cfr. António Menezes Cordeiro, “A decisão segundo a equidade”, in o Direito, Ano 122, 1990, Abril-Junho, pág. 272, e Manuel Carneiro da Frada, “A equidade (ou justiça com coração): a propósito da decisão arbitral segundo a equidade, in Revista da Ordem dos Advogados, 2012, Ano 72, Vol. I, pág. 143, e os Acs. do STJ de 31.01.2012 (875/05) e 07.10.2010 (3515/03). Ou seja, no caso, deve existir factos assentes no sentido de que os Autores tivessem a possibilidade de vender, pelo menos, pelos valores por ele alegados e comprovados (ex. mediante contratos-promessa de compra e venda celebrados) a uma terceira pessoa concreta, o que não se encontra devidamente demonstrado por factualidade assente.
    5) (…)”.
*
    Relativamente à solução ditada pelo Tribunal a quo, globalmente analisados os argumentos invocados pelo Tribunal a quo, é de entender que a solução é correcta, quando se afirmou:
     “O ónus da prova.
     O legislador ao permitir às partes fixarem por convenção as consequências do incumprimento acabou por criar uma distribuição do ónus da prova em que só tem que provar o dano relevante o contraente que pretende que a indemnização por incumprimento se fixe em valor diferente do predeterminado. Assim, o credor que pretende que o valor da indemnização seja superior ao predeterminado tem de provar que sofreu um dano consideravelmente superior ao sinal. Por sua vez, o devedor que pretende que a indemnização seja de valor inferior ao predeterminado tem que demonstrar que a pena é manifestamente excessiva em relação ao dano.
     No presente caso, cabe à ré alegar e provar os factos de onde se possa concluir que o valor do sinal é manifestamente excessivo para ressarcir o dano efectivo dos autores e para sancionar a culpa pelo incumprimento.
     A ré alegou e provou que se esforçou por cumprir e que os autores vão receber uma fracção autónoma de um imóvel idêntica à que a ré lhe entregaria e por preço também idêntico.
     
     Da redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado.
     A redução equitativa da indemnização requer a certeza de que a indemnização determinada pelo valor do sinal é manifestamente excessiva em relação ao dano efectivo.
     Os autores tinham o direito de adquirir a fracção prometida sem ter que pagar nada mais do que já pagaram à ré e terão de pagar pela aquisição da habitação para troca o preço igual ao que acordaram com a ré (sem desconto), pelo que terão um prejuízo de HKD982.000,00.
     Se a ré devolver o sinal antes de os autores pagarem o preço da “fracção para troca”, estes já não terão o prejuízo correspondente.
     O prejuízo dos autores será, então, o correspondente à privação do desconto (interesse contratual negativo) e à privação da disponibilidade da fracção entre a data em que a ré deveria entregar e a data em que a irão receber da sociedade comercial E, S.A. (interesse contratual positivo). No que tange ao interesse contratual positivo trata-se de uma situação semelhante à mora e não ao incumprimento definitivo, pois que os autores irão adquirir uma fracção como pretendiam, mas mais tarde do que acordaram.
     Se aos autores for devolvida a quantia que pagaram e se obtiverem pelo mesmo preço a fracção que pretendiam, embora com atraso e sem desconto no preço, a indemnização correspondente ao valor que pagaram (HKD3.928.000,00) é manifestamente excessiva, pois que a disponibilidade da fracção durante o tempo em que os autores dela não podem dispôr não proporcionaria aos autores um valor líquido tão elevado que, somado ao “desconto perdido”, se aproximase de HKD3.928.000,00.
     O Venerando Tribunal de Segunda Instância já apreciou caso semelhante ao presente, embora os ali autores tivessem feito o seu pagamento no ano de 2015, e considerou que o dano equitativo corresponde à aplicação de uma taxa anual de 3,5% durante 8 anos sobre o valor efectivamente pago pela autora21. Perspectivou, pois o dano como interesse contratual negativo. Não o que a autora deixou de auferir através do que despendeu, mas o que tever de despender em vão, sem nada auferir.
     Seguindo o entendimento do Venerando TSI, no caso presente seria de considerar o período de 12 anos, pois que os autores pagaram à ré no ano de 2011.
     Aplicando a doutrina do referido douto acórdão, temos que a quantia paga pelos autores à ré foi de HKD3.928.000,00, pelo que o valor da indemnização equitativa do interesse contratual positivo não deve ser inferior a HKD1.649.760,00 (3.928.000,00 x 3,5% x 12).
     No caso presente há ainda a considerar:
     - O dano dos autores correspondente à diferença entre o preço que terão de pagar pela “habitação para troca” e o preço que pagaram à ré (HKD982.000,00);
     - Que os autores contraíram empréstimo bancário no montante de HKD3.430.000,00, o qual entregaram à ré, que esta lhes irá restituir e sobre o qual também já se considerou a taxa anual de 3.5% considerada equitativa pelo Venerando TSI;
     - Que a ré pagou por conta dos autores a quantia de HKD2.623.023,16 ao respectivo Banco mutuante para restituição da quantia mutuada e respectivos juros.
     Este tribunal também já decidiu em diversos casos a questão da redução equitativa do valor da indemnização determinada pelo valor do sinal, sendo que esta redução equitativa não levar à fixação de indemnização em montante inferior ao dano efectivo e deve ainda respeitar a função punitiva do sinal. Sendo essa decisão e a respectiva fundamentação conhecidas das partes através dos seus ilustres mandatários, é aqui dispensável repetir.
     Assim, aderindo à referida doutrina do TSI, e considerando ainda o dano dos autores correspondente à diferença entre o preço que pagaram, respeitando a função punitiva do sinal, embora de forma equitativamente menos severa, considerando o preço que os autores terão que pagar pela “habitação para troca” e considerando também a parte do empréstimo bancário dos autores que a ré saldou ao Banco mutuante, afigura-se equitativo fixar em HKD.3.000.000,00 o valor da indemnização a cargo da ré em consequência da impossibilidade superveniente da sua prestação devida no âmbito do contrato que celebrou com os autores.
     
     Das de despesas com a formalização do contrato (MOP400,00).
     Os autores pretendem ainda a devolução das despesas que tiveram com a formalização do contrato. Trata-se de um dano respeitante ao interesse contratual negativo. Havendo sinal, só serão ressarcidos os danos efectivos se no seu conjunto forem consideravelmente superiores ao valor do sinal prestado (art. 436º, nº 4 do CC). Não é o caso das despesas de formalização do contrato.
     Improcede esta parte da pretensão dos autores.
     
     Da compensação.
     Os autores contrairam empréstimo bancário para pagar à ré o preço acordado. A ré, por acordo com o Banco mutuante, pagou a dívida dos autores no valor de HKD2.623.023,16. Diz agora a ré que ficou sub-rogada no crédito do Banco mutuante e pretende compensar esse crédito com a dívida que tenha para com os autores.
     Um terceiro interessado pode cumprir a obrigação do devedor (art. 757º do CC) e o credor que recebe de terceiro pode sub-rogá-lo nos direitos que tinha sobre o devedor, adquirindo o terceiro esses direitos (arts. 583º e 587º do CC). O credor também pode ceder a terceiro o seu crédito, mesmo sem consentimento do devedor (art. 571º do CC).
     Os autos não fornecem os factos necessários a qualificar a situação que cria o crédito da ré a compensar com o crédito dos autores, seja como sub-rogação, seja como transmissão de crédito. Com efeito, os referidos factos não esclarecem qual era concretamente a dívida dos autores para com o Banco mutuante. Tudo aponta para se concluir que a ré não cumpriu a obrigação dos autores. Ao que parece, modificou-a e cumpriu a obrigação modificada. Ao que parece, os autores pediram emprestado e estavam a pagar mensalmente conforme acordado, o que demoraria anos. A ré acordou com o Banco liquidar tudo de uma vez só. Sem o consentimento do devedor, o credor e terceiro não podem modificar a obrigação daquele devedor.
     Assim, a ré não adquiriu qualquer crédito do Banco sobre os autores, porque estes deviam prestações mensais e a ré cumpriu prestação única. Sem o consentimento dos autores, o que a ré e o Banco mutuante fizeram não vincula os autores. Assim, sem o consentimento dos autores, a ré e o Banco não podiam liquidar de uma só vez um empréstimo que se vencia em prestações mensais. A ré e o Banco interferiram no conteúdo da obrigação dos autores para com o banco sem terem direito de interferir. O Banco mutuante não pode sub-rogar a ré num direito que não tem sobre os autores, o direito de liquidar arbitrariamente ou ad nutum a totalidade do empréstimo que acordou liquidar em prestações mensais.
     Conclui-se, pois, que a ré não é titular do crédito que invoca como tendo-lhe sido transmitido pelo Banco mutuante e, por isso, não pode compensá-lo com a dívida que tenha para com os autores.
     Mas afigura-se evidente que a actuação da ré, sem animus donandi, configura um enriquecimento dos autores sem causa justificativa, o que cria na esfera jurídica dos autores a obrigação de devolverem à ré aquilo como que se enriqueceram à custa dela. É certo que a situação de enriquecimento sem causa e da medida da obrigação de restituir que surge de tal enriquecimento, não foram invocadas nem tramitadas com alegação de factos em discussão contraditória, onde tudo que fosse pertinente se poderia invocar, designadamente a prescrição da obrigação de restituir. Mas afigura-se isento de questões e de dúvidas que se verificam todos os pressupostos daquele instituto e que a medida da obrigação de restituir por enriquecimento próprio e empobrecimento alheio é exctamente a quantia que a ré pagou ao Banco mutuante (arts. 467º e 473º).
     Conclui-se, pois que a ré tem um direito sobre os autores: que lhe restituam o que por conta deles pagou ao Banco D.
     E também não há dúvidas que a ré pode compensar esse crédito com a dívida que tenha para com os autores (art. 838º do CC).
     Os autores têm dois créditos diferentes sobre a ré: um crédito a que lhes seja restituído o que prestaram, o qual surge como efeito da resolução do contrato; outro crédito a que lhes sejam ressarcidos os danos que sofreram em consequência do incumprimento.
     A questão é agora saber qual o crédito dos autores que seve entrar na compensação. É o que estiver vencido no momento em que opera a compensação por declaração à outra parte com a notificação da contestação (arts. 838º, nº 1, al. a) e 839º, nº 1 do CC).
     A ré pagou ao Banco D uma dívida dos autores e pretende-se a compensação. A quantia que a ré pagou deve ser compensada com a obrigação vencida na altura em que a compensação foi feita. Na referida altura, a obrigação de indemnizar ainda não estava vencida, pois só com a liquidação se vence (art. 794º, nº 4 do CC), mas já se vencera a obrigação de restituir em consequência da resolução contratual, que se venceu com a citação (art. 430º do CC). É com esta obrigação que deve fazer-se a compensação.
     Deste modo, a parte que falta restituir da quantia que a ré recebeu dos autores é HKD1.304.976,84.”
    
*
    Um argumento lateral, neste recurso a Ré veio a defender:
    “(…)
     59. Ora, de acordo com os mesmos dados oficiais da AMCM (cfr. docs. 1 e 2), a taxa média deste período de 5 anos foi a de 2,141%, pelo que o montante respeitante a este vector de ponderação se cifra, a final, em HKD$420.492,40 (3.928.000,00 x 2,141% x 5 = 420.492,40).
     60. Assim, o valor mais justo para a indemnização equitativa a arbitrar cifra-se, parece-nos, neste valor, HKD420.492,40, acrescido dos outros dois valores que foram tomados em consideração para esta decisão, isto é, HKD982.000,00 e HKD370.000,00, o que perfaz um total arredondado por excesso de de HKD1.402.492,40, que arredondado por excesso seria o de HKD$1.775.000,00.
     61. Em conclusão, seguindo-se o próprio itinerário da douta sentença recorrida com base nos factos só agora carreados aos autos, o valor total da indemnização, comprendendo a obrigação de restituir e o dano equitativo, cifra-se em HKD3.079.976,84 (1.304.976,84 + 1.775.000,00), ou, no máximo, em HKD3.254.976,84 (1.304.976,84 + 1.950.000,00).”
    É de verificar-se que o valor diferencial não é muito significativo, comparando-se o valor indemnizatório total fixado na sentença recorrida e o que a Ré aceite e defende na conclusão do recurso, e porque foi feito apelo ao critério de equidade, na ausência de elementos que demonstrem a manifesta injustiça do valor arbitrado no caso em apreciação, tal valor não deve ser alterado.
    
    Quanto ao demais, é de verificar-se que nesta parte, todas as questões levantadas pelas partes já foram objecto de reflexões e decisões por parte do Tribunal recorrido e, nesta sede de recurso concluímos, em face da argumentação acima transcrita, o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis (apesar de, em alguns aspectos, os pontos de vistas não serem totalmente coincidentes, tal não afecta o mérito da decisão), tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de manter a decisão recorrida.
*
    Face ao exposto, é de negar provimento aos recursos, respectivamente interpostos pelos Autores e pela Ré, mantendo-se a decisão recorrida.
*
    Síntese conclusiva:
    I - A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC), qualificação esta que determina o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CCM).
    II - A qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais.
    III - A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CCM). Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Numa situação em que, tal como se detecta no caso dos autos, se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis (porque se usam expressões diversas, tais como “contrato-promessa de compra e venda” “prometer comprar e “prometida venda”, “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”), a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 228º do CCM).
    IV – O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico, sendo nesta perspectiva, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial. Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes. Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
    V - No caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CCM que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”. Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CCM).
    VI - O artigo 801º/-1 do CCM manda que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”, normativo este que rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento.
    VII - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas. A equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto.
    VIII - Por regra, a indemnização fundada no incumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido. Nesta óptica, o regime de restituição do sinal em dobro em matéria de contrato-promessa pode classificar-se como um regime especial.
*
    Tudo visto e analisado, resta decidir.
* * *
V ‒ DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento aos recursos, mantendo-se a sentença recorrida nos seus preciso termos.
*
    Custas pelas Partes em partes iguais.
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    Registe e Notifique.
*
RAEM,17 de Julho de 2025.

Fong Man Chong
(Relator)

Tong Hio Fong
(1o Juiz-Adjunto)

Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(2o Juiz-Adjunto)

    
    
    
    
     
1 Nas suas doutas alegações de Direito a ré defende tratar-se de contrato de reserva ou de compra e venda de coisa futura e não de contrato-promessa de compra e venda.
2 Nas suas alegações sobre solução jurídica da causa já a ré não questiona a impossibilidade do cumprimento da sua prestação contratual. Talvez por já ter desistido do pedido na acção que intentara contra a RAEM.
3 Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume II, 11ª edição, pgs. 117.
4 “… o não cumprimento definitivo, que é o resultado de uma impossibilidade definitiva de cumprir, não tem de derivar de uma impossibilidade absoluta de cumprir, no sentido de não poder em caso algum desaparecer. … A impossibilidade da prestação considera-se definitiva não apenas quando toda a probabilidade da sua remoção está excluída, mas também quando ela só pode ser removida mediante circunstâncias especiais que não são de esperar de antemão. … Isto é o mesmo que dizer que também é definitiva a impossibilidade que só possa cessar por um facto extraordinário com que não seja legítimo contar” - Vaz Serra, RLJ, Ano 100º (1967 – 1968), p. 254.
5 Meneses Cordeiro, Tratado de Direito Civil, volume IX, 2ª edição, p. 324.
6 O art. 790º do CC, sob a epígrafe “imputabilidade culposa” dispõe que “tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação”.
7 “Como definir então se uma conduta é culposa? Pela diferença entre o comportamento exigível… e o comportamento adoptado no caso concreto” - Alberto de Sá e Mello, “Critérios de apreciação da culpa na responsabilidade civil: breve anotação ao Regime do Código” in Revista da Ordem dos Advogados, sem n.º, ano 49, setembro 1989, Lisboa, p. 535, também acessível em https://www.oa.pt/upl/%7Ba2b9529f-1b59-4cec-94ff-b02dab234224%7D.pdf.
8 Também o credor está obrigado a proceder de boa fé no exercício do seu direito de crédito (art. 752º, nº 2 do CC), designadamente não lhe sendo lícito em certas circunstâncias recusar sem razão prestação semelhante à prestação devida que o devedor ofereça. No caso dos autos a ré alegou que propôs aos autores entregar-lhes outra fracção autónoma de entre as que tinham e que os autores escolhessem. Na dificuldade/impossibilidade de cumprir que a ré experimentou, aos autores poderiam não ser lícito recusar se a fracção oferecida satisfizessem o interesse contratual, o que se desconhece, designadamente quanto a área, localização e preço da fracção devida e da oferecida.
9 A propósito da impossibilidade superveniente da prestação por facto de terceiro estranho ao cumprimento, escreve Pessoa Jorge (op. cit., pg. 136): “... só há impossibilidade exoneratória se o comportamento do terceiro reunir as características do caso fortuito ou de força maior: assim, se o devedor podia e devia ter previsto e evitado a sua actuação, não lhe é lícito invocar o impedimento por ele criado”.
O mesmo autor escreve também que não releva o facto de o comportamento de terceiro que impossibilita a prestação ser ele próprio ilícito e culposo ou ser lícito e não censurável.
10 Um elemento natural ou típico do conteúdo do contrato-promessa para Manuel Trigo, Lições de Direito das Obrigações, p. 144. Um acto jurídico real quoad constitutionem, podendo constituir uma cláusula acessória de um negócio jurídico para Nuno Manuel Pinto Oliveira, Ensaio Sobre o Sinal, págs. 10 e 11.
11 Acórdão do Venerando TSI de 04/04/2019, proferido no processo nº 327/2017, Relator: Dr. Fong Man Chong, acessível em www.court.gov.mo e João Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 11ª edição, p. 94.
12 “…a indemnização pelo dano excedente constituiria a indemnização pelo dano efectivo …” - Professor Manuel Trigo, Uma Uma Mudança de Paradigma: A Indemnização pelo Dano Excedente, em Especial nos Casos de Perda do Sinal ou de Pagamento do Dobro Deste e a Jurisprudência Recente (estudo em homenagem a João Calvão da Silva), Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, Ano XXV, nº 49, 2021, p. 151.
13 Assim, também Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, 1990, p. 730. E, do mesmo autor, “A Cláusula Penal no Ordenamento Jurídico de Macau”, Um Diálogo Consistente, Olhares Recentes Sobre Temas do Direito Português e de Macau, 2016, Vol. I, Edição da Fundação Rui Cunha, pgs. 38 e 39 – “Ora, qual será o critério que deve pautar a actuação do juiz, quer para decidir se pode reduzir a pena, quer para determinar, simultaneamente, em caso afirmativo, a medida dessa redução?
Naturalmente que a diferença entre o valor do prejuízo efectivo e o montante da pena é, desde logo, o primeiro factor, de cariz objectivo, a considerar”.
14 Os autores nas respectivas alegações de Direito aceitam que o valor do sinal é o afirmado pela ré por referência a um “desconto” no preço acordado.
15 “É entendimento comum que o sinal consiste na coisa ou direito fungíveis .. entregue … como garantia de cumprimento” – Professor Manuel Trigo, Lições de Direito das Obrigações, p. 144.
16 Nuno Manuel Pinto Oliveira, Ensaio Sobre o Sinal, págs. 10 e 11.
17 Em sentido algo diverso decidiu o acórdão do TSI nº 22/2024, de 9/5/2024, Relator: Dr. Ho Wai Neng, acessível em www.court.gov.mo.
18 Acórdão do Venerando TSI nº 22/2024, de 9/5/2024, Relator: Dr. Ho Wai Neng, acessível em www.court.gov.mo.
19 Ac do STJ, Proc. 3292/20.5TBLRA/C1.S1., de 11/02/2025.
20 Sobre o princípio da completude da motivação da decisão judicial ditado, pela necessidade da justificação cabal das razões em que se funda, com função legitimadora do poder judicial, vide acórdão do STJ, de 17-01-2012, relatado pelo Exm.º Juiz Cons. Gabriel Catarino, no processo n.º 1876/06.3TBGDM.P1 .S1, disponível na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj
21 Acórdão do Venerando TSI nº 22/2024, de 9/5/2024, Relator: Dr. Ho Wai Neng, acessível em www.court.gov.mo.
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