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Processo n.º 99/2025
(Autos de recurso em matéria cível)

Relator: Fong Man Chong
Data: 17 de Julho de 2025

ASSUNTOS:

- Função do sinal no contrato-promessa de compra e venda e consequência de impossibilidade de cumprimento definitivo de prestação prometida

SUMÁRIO:

I - A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC), qualificação esta que determina o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CCM).
II - A qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais.
III - A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CCM). Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Numa situação em que, tal como se detecta no caso dos autos, se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis (porque se usam expressões diversas, tais como “contrato-promessa de compra e venda” “prometer comprar e “prometida venda”, “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”), a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 2**º do CCM).
IV – O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico, sendo nesta perspectiva, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial. Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes. Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
V - No caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CCM que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”. Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CCM).
VI - O artigo 801º/-1 do CCM manda que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”, normativo este que rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento.
VII - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas. A equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto.
VIII - Por regra, a indemnização fundada no incumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido. Nesta óptica, o regime de restituição do sinal em dobro em matéria de contrato-promessa pode classificar-se como um regime especial.

O Relator,

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Fong Man Chong



Processo nº 99/2025
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 17 de Julho de 2025

Recorrentes : - Sociedade de Importação e Exportação C, Limitada
- A
- B

Recorridos : - Os Mesmos

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   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    Sociedade de Importação e Exportação C, Limitada, Recorrente, devidamente identificada nos autos, discordando da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, datada de 12/07/2024, veio, em 25/07/2024, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 1662 a 1685, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. Constitui objecto do presente Recurso a, aliás, douta sentença do Tribunal Judicial de Base, que julgou parcialmente procedente apresente acção e condenou a Recorrente no pagamento de uma indemnização aos Recorridos, no montante global de MOP3.939.260.00.
     2. Ocorreu uma impossibilidade jurídica superveniente e definitiva do cumprimento do contrato em discussão nos presentes autos mas tal impossibilidade não é imputável à Recorrente.
     3. Com efeito, ficou provada praticamente toda a matéria alegada pela Recorrente susceptível de estabelecer que não conseguiu aproveitar o terreno dentro do prazo contratado e, assim, dar cumprimento ao contrato em apreço, por razões imputáveis aos Serviços da RAEM.
     4. Uma tal actuação da DSSOPT e da DSPA era imprevisível.
     5. Desde logo, não era previsível que a DSSOPT permanecesse inerte e sem emitir qualquer decisão relativamente ao plano de consulta e ao projecto parcial de arquitectura, apresentados pela Recorrente em Abril e Maio de 2008.
     6. Não era previsível que após a apresentação do projecto global de arquitectura em Outubro de 2009, a DSSOPT emitisse uma Planta de Alinhamento Oficial em Fevereiro de 2010, donde constava um novo condicionamento urbanístico atinente à observância de uma distância mínima entre cada torre que inviabilizaria o projecto apresentado e que não estava previsto na lei, nem tinha sido anteriormente exigido em Macau.
     7. Não era previsível que após a aprovação do projecto de arquitectura do empreendimento "XXXX", comunicada à Recorrente em 07/01/2011, a DSSOPT fizesse depender a emissão da licença de construção, da apresentação e aprovação de um Relatório ambiental pela DSPA.
     8. Essa falta de previsibilidade resulta da circunstância de nunca tal exigência ter ocorrido anteriormente a nenhum promotor imobiliário.
     9. E ainda da circunstância de, ao tempo, não existir norma legal ou regulamentar aprovada e em vigor que exigisse esse Relatório Ambiental ou que sugerisse, sequer, que conteúdo pudesse vir a ter de conter.
     10. Muito menos era de esperar que, como se provou, a DSSOPT e a DSPA demorassem quase 3 anos a aprovar esse Relatório num procedimento moroso e ao sabor dos improvisos desses serviços.
     11. Não se pode pretender que uma Administração Pública que está sujeita ao princípio da legalidade (artigo 3.º do CPA), ao princípio da protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes (artigo 4.º do CPA), ao princípio da justiça e da imparcialidade (artigo 7.º do CPA) e aos princípios da boa fé e da colaboração (artigos 8.º e 9.º do CPA) deve entender-se genericamente como uma pessoa que actua de forma a violar os seus deveres contratuais com os sujeitos com que se relaciona. E que a Recorrente deveria assim ter presumido vir a suceder.
     12. E mesmo quando confrontada com essa exigência inesperada, a Recorrente previu, tal como qualquer bom pai de família no seu lugar o faria, que tal exigência seria rapidamente ultrapassada.
     13. Com efeito, do Ofício de 07/01/2011 constante de fls. 327 a 336, no seu ponto nº 19, parte final, resulta que o Relatório ambiental exigido pela DSSOPT deveria consistir em 4 pontos muito simples.
     14. No entanto, conforme está provado, os Serviços da Administração foram apresentando sucessivas e novas condições ao longo de quase 3 anos, à medida que as anteriores iam sendo cumpridas pela Recorrente, o que era manifestamente imprevisível, mesmo para um bom pai de família.
     15. In casu, está inclusivamente provado que a Recorrente tem vasta experiência no ramo, nunca tendo tido problemas nos diversos empreendimentos que desenvolveu nas áreas adjacentes ao Lote P.
     16. E que tem capacidade para calcular os prazos, detectar perigos de atrasos e que factores poderiam afectar o andamento previsto para a obra (Facto nº 70 da sentença).
     17. Pode, portanto, dizer-se que a Recorrente possui todo o aport do típico bom pai de família, no ramo em que exerce a sua actividade.
     18. D'outro passo, a actuação da RAEM sempre seria inultrapassável.
     19. Efectivamente, os serviços da RAEM não emitiriam a licença de construção sem que fosse apresentado o Estudo Ambiental, rectius, sem que fossem apresentadas todas as versões do Estudo Ambiental que foi exigindo ao longo de cerca de 3 anos.
     20. A única forma de a Recorrente procurar ultrapassar estas exigências era a de avançar para a via contenciosa, através do recurso contencioso de anulação destinado a anular os actos administrativos praticados pelos serviços da RAEM, por vício de violação de lei.
     21. Bem se vê que a DSSOPT e a DSPA não actuaram como parte do contrato de concessão mas sim como Administração Pública, como puissance publique, sob as mesmas vestes com que actuam relativamente a qualquer privado.
     22. Ou seja, em resumo, ao contrário do que se sugere na douta sentença recorrida, afigura-se que se está, efectivamente, em sede de "facto do príncipe".
     23. Quanto ao risco, desde logo, em boa verdade, o risco para os Recorridos nasce com a cessão da posição contratual que celebraram com o contraente inicial, cedente.
     24. Nesta situação, a questão da distribuição do risco em contratar diz respeito somente ao cedente e aos Recorridos, enquanto cessionários, mas não, salvo melhor opinião, à Recorrente, que nunca teve qualquer conhecimento do teor do que foi previamente contratado entre eles, limitando-se a consentir na cessão (vd. Acórdão do TSI de 21/06/2012, Proc. nº 169/2012).
     25. Por outro lado, compreende-se, por exemplo, que a crise económica, a retracção do mercado financeiro, taxas de juros, salários, etc., possam ser considerados riscos com que os promotores imobiliários devem contar e assumir, mas não já, a situação, provada nos autos, que provocou uma paralisação de cerca de 5 anos do prazo de aproveitamento do terreno.
     26. Os Recorridos sabiam necessariamente que o contrato cedido estava umbilicalmente ligado ao cumprimento do contrato de concessão do terreno e que, naturalmente, as vicissitudes deste se repercutiam necessariamente naquele.
     27. As datas dos termos das concessões são públicas, constando do Registo Predial.
     28. Um dos princípios fundamentais do Registo Predial é o Princípio da Publicidade consagrado no artigo 1º do Código do Registo Predial de Macau e dele decorre que a ninguém é lícito invocar o desconhecimento da situação jurídica de qualquer imóvel, quando constante de registo público, que é de livre acesso.
     29. Os Recorridos também sabiam perfeitamente que a fracção transaccionada ia ser construída no futuro, ou seja, que tinham adquirido um bem que não existia à data do contrato que celebraram.
     30. Os Recorridos contrataram em 2014, o termo da concessão era em 2015 e, na altura em que contrataram, era público e notório que ainda nada tinha sido construído.
     31. Com efeito, provado está que as fundações foram contruídas pela Recorrente entre Agosto de 2014 e Dezembro de 2015, sendo que a data, pública, do termo da concessão, era a de 25 de Dezembro de 2015.
     32. E a Recorrente não faltou a deveres de informação que fossem devidos, nem prestou informação falsa ou sonegou informação que, de acordo com ditames de boa fé, estivesse vinculada a transmitir.
     33. Pelo que em boa verdade não foi a Recorrente que trouxe os Recorridos para a esfera de risco do contrato em causa. Foram eles que quiseram nela entrar.
     34. Quanto à qualificação do contrato, o que se revela mais plausível e consentâneo com a aplicação das regras plasmadas entre os artigos 2**º e 230º do CC é que se trata de um contrato de reserva ou de um contrato de compra e venda de um bem futuro.
     35. A respeito da letra do contrato, refira-se que as partes podem usar terminologia jurídica e fazer qualificações, mas esse aspecto não é vinculativo para o intérprete-aplicador.
     36. Relativamente à redacção do contrato em apreço, logo na sua cláusula 5ª, as partes acordaram numa redacção que excluiu propositadamente a utilização da expressão “訂” referente ao conceito de "sinal" (com o sentido de penalização), em prol da expressão "訂金", correspondente ao conceito de "depósito" (que não tem sentido penalizador).
     37. Deste modo, as partes estão a manifestar a sua vontade em afastar a qualificação de sinal aos pagamentos efectuados por conta do contrato em causa.
     38. A cláusula 22ª não indicia que as partes celebraram uma promessa de compra e venda em vez de uma compra e venda de um bem futuro ou um contrato de reserva.
     39. Em contrário do que se considerou na douta sentença recorrida, a previsão da cláusula 9ª de um consentimento para a cessão também não permite reconduzir o contrato base a um contrato-promessa.
     40. É esta a solução preconizada no artigo 418º do CC pela simples razão de que em contratos com prestações recíprocas, como é o caso, a Recorrente tem o dever de entregar o imóvel objecto do contrato, mas o adquirente tem o dever de pagar um preço e, no caso vertente, de pagar o preço em prestações distintas e sucessivas.
     41. Quanto à circunstância de poder eventualmente inferir-se de alguns dos segmentos do clausulado a necessidade de celebração de um segundo contrato, é, nos termos do artigo 866º do Código Civil (CC), uma formalidade absolutamente essencial, quer para o contrato-promessa, quer para o contrato de reserva, quer para o contrato de compra e venda imediata de um bem futuro.
     42. Por seu turno, as suas cláusulas 10ª a 12ª são previsões que raramente ou nunca são reguladas no contrato-promessa, mas sim no contrato de compra e venda.
     43. Também os textos preliminares e circundantes constantes dos autos conectados com o contrato em questão, designadamente, os recibos de pagamento identificarem-se deliberadamente como se tratando da liquidação de um preço e, nunca, de um sinal) e o facto de o contrato conter uma planta da fracção adquirida em anexo.
     44. Relativamente ao elemento histórico subjacente ao contrato em causa, há a destacar que o contrato foi celebrado antes da publicação da Lei nº 7/2013, que foi elaborada em resposta a um vazio legal que disciplinasse estes casos, o que permite vincar a sua especificidade em relação às figuras existentes a esse tempo na ordem jurídica de Macau, incluindo a figura do contrato-promessa tipificada no Código Civil.
     45. Como afirma João vicente Monteiro na sua mais recente obra, Código do Registo Predial de Macau Anotado, pág. 299, "Estes 'contratos-promessa' têm sido tradicionalmente utilizados para formalizar verdadeiros contratos de compra e venda sobre as fracções autónomas em construção".
     46. Relativamente ao elemento teleológico, o fim do negócio tido em mente pelas partes é o seguinte: para a parte compradora, um imóvel a ser construído fica reservado contra o pagamento de uma certa quantia, por inteiro ou dividida em prestações; para a parte vendedora é receber do adquirente um determinado preço pela fracção autónoma que vai construír e lhe vai entregar.
     47. Se o beneficiário desistir perde essa quantia a favor da outra parte; quando não, o contrato mantém-se. Em contrapartida, o vendedor deixa de poder dispor da fracção autónoma não podendo celebrar nenhum outro contrato com terceiros que tenha por objecto essa fracção autónoma.
     48. Assim, pela interpretação do clausulado, pelos textos conectados com o contrato, pelo elemento histórico e pelo elemento teleológico, afigura-se que o contrato em discussão não é um típico contrato-promessa mas um contrato de reserva ou um contrato de compra e venda imediata de um bem futuro, tal como defende Menezes Cordeiro no douto Parecer Jurídico ora junto.
     49. Subsidiariamente, mesmo que se entenda que o contrato em discussão nos presentes autos se trata de um contrato-promessa típico, a verdade é que as quantias que a Recorrente recebeu enquanto pagamentos de uma parte do preço da fracção a construir que foi vendida, configura um cumprimento antecipado do contrato prometido tendo em vista a satisfação de obrigação futura, previsto no artigo 434º do Código Civil, como o comprovam os recibos de pagamento de fls. 46 a 48 dos autos.
     50. Relativamente à indemnização a arbitrar, uma vez que a impossibilidade superveniente não é imputável à Recorrente, tem aplicação o disposto no artigo 779º/1 do CC: "A obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor."
     51. As consequências são as do artigo 784º/1 do CC: o interessado na aquisição fica desobrigado da contraprestação e pode exigir a restituição do valor que entregou ao alienante, em singelo, nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa, conforme o estipulado nos artigos 467º e 473º/1 do CC.
     52. A Recorrente recebeu HKD1.360.000,00, pelo que, salvo melhor opinião, na perspectiva da Recorrente, o quantum final da indemnização a arbitrar cifra-se neste mesmo valor, acrescido dos respectivos juros de mora.
     53. Subsidiariamente a Recorrente pediu que a indemnização fosse arbitrada com base na equidade, tendo a douta sentença recorrida considerado ser essa a solução jurídica adequada para a aferição do alegado dano da privação do uso do imóvel e arbitrado uma indemnização a esse título no valor de HKD1.300.000,00.
     54. No entanto, salvo melhor opinião, uma vez que este dano não corresponde ao dano excedente a que faz menção o nº 4 do artigo 436º do CC, não pode o mesmo ser incluído na obrigação de indemnização a cargo da Recorrente, uma vez que decorre claramente deste preceito legal que a indemnização no montante correspondente ao dobro do sinal esgota a obrigação de indemnização, excluindo da sua esfera, portanto, qualquer outra componente indemnizat6ria.
     55. O mesmo vale, salvo melhor opinião, para a indemnização correspondente às despesas que os Recorridos pagaram à Recorrente, no valor de MOP43.660,00, igualmente arbitrada a favor dos primeiros.
     56. Deste modo, ressalvado diverso entendimento, caso se entenda que a indemnização a arbitrar não deve seguir as regras do enriquecimento sem causa com a consequente fixação do seu montante em HKD1.260.000,00, não deve a mesma ultrapassar o montante deHKD2.520.000,00.
     57. Ressalvado diverso entendimento, a douta decisão recorrida incorre na violação dos artigos 2**º, 229º, 230º, 435º, 436º, 467º, 473º/1, 556º, 560º/5, 779º/1, 784º/1, 795º e 801º do Código Civil.
     Nestes termos e nos mais de direito aplicável, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente Recurso ser julgado procedente, com as legais consequências, assim se fazendo, serenamente, Justiça.
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    A e B, com os sinais identificativos nos autos, ofereceu a resposta constante de fls. 1778 a 1791, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. 上訴人針對法官 閣下於2024年07月12日所作出的判決不服並提起上訴,上訴人的上訴理由主要涉及以下三方面的內容:
     a) 合同履行不能之可歸責性;
     b) 合同之定性及被上訴人/上手買家所支付的金額之定性;及
     d) 損害賠償。
     2. 在尊重上訴人之前提下,被上訴人對於上訴人之上訴理由陳述不予認同並在此提出爭執如下。
     I. 關於合同履行不能之可歸責性
     3. 上訴人認為其與上手買家於2011年03月09日所簽署的預約買賣合同(以下稱:涉案合同)(及後由被上訴人透過合同地位讓與的方式取得上手買家於涉案合同之預約買受人地位)最終出現履行不能並非基於上訴人之過錯,而是基於澳門特區之過錯(尤其包括延誤回覆及各種要求)導致上訴人未能在土地利用期屆滿之前完成對土地之利用而導致土地批給最終被宣告失效,從而導致被上訴人不能獲交付涉案合同之涉案單位(即:第...幢**樓F座)。
     4. 對此,被上訴人不予認同並在此提出爭執如下。
     5. 根據原審法院對第2條待證事實的答覆,作為相關批給合同當事人之上訴人在與澳門特區達成相關批給合同時已知悉上條之期限。
     6. 上訴人是一家有經驗的發展商(見原審法院對第3條待證事實的答覆),上訴人應有能力估算建成“XXXX”項目需要的時間。
     7. 根據原審法院對第4條待證事實的答覆,上訴人與上手買家簽署涉案合同時尚未獲發地基工程准照。
     8. 而根據原審法院對第48條待證事實的答覆,上訴人需要3至4年的時間建成整個“XXXX”項目。
     9. 在明知其未能於土地利用期屆滿之前不能完成建造整個“XXXX”項目並把涉案單位交付予上手買家的情況下,上訴人仍決定於2011年03月09日與上手買家簽署涉案合同。
     10. 更甚者,上訴人與上手買家及被上訴人於2014年08月12日簽署《XXXX合同地位讓與的合同》(以下稱:上述合同地位讓與合同)(見卷宗第36頁),但當時上訴人尚在進行土地基工程,完全未開始任何上蓋工程。
     11. 既然上訴人認為其需要3至4年的時間完成建造整個“XXXX”項目,即上訴人在與上手買家及被上訴人簽署上述合同地位讓與合同時是知悉上訴人根本不可能在土地利用期或土地批給屆滿前完成建造整個“XXXX”項目及把涉案單位交付予被上訴人。
     12. 雖然上訴人在獲發工程准照後立即展開“XXXX”項目的地基工程,但本案中沒有任何證據證明上訴人有增聘人手加快展開建造上蓋的工程,導致P地段之土地批給最終被宣告失效。
     13. 雖然上訴人相信相關之土地批給期限會獲延長或會獲重新批給予上訴人(見原審法院對第53條待證事實的答覆),但顯然,上訴人對於此一信念存在錯誤。
     14.《土地法》第48條第1款明確規定臨時批給是不能續期的。
     15. 上訴人過份自信地認為相關之土地批給期限會獲延長或會獲重新批給予上訴人,錯誤地認為上訴人最終可以建成“XXXX”項目並把涉案單位交付予被上訴人。
     16. 即使上訴人相信相關之土地批給期限會獲延長或會獲重新批給予上訴人,但上訴人應知悉仍存在相關土地批給不獲續期或不獲重新批給的可能性,但卻沒有在與上手買家簽署涉案合同或與上手買家及被上訴人簽署上述合同地位讓與合同時提醒上手買家或被上訴人相關可能性之存在(見卷宗第28-30、36頁)。
     17. 雖然上訴人認為從涉案單位之物業登記可查閱相關土地批給之到期日,但被上訴人作為一般市民並不了解相關到期日之意義;反之,上訴人作為發展商應有義務對被上訴人作出相關提醒及告知相關到期日之意義。
     18. 基此,上訴人應根據《民法典》第219條的規定向被上訴人所遭受的損失負責。
     19. 此外,上訴人所指的澳門特區的延誤回覆及各種要求導致上訴人未能展開對P地段之利用從而導致相關土地被宣告失效及涉案合同之履行不能。
     20. 上訴人所指的澳門特區的延誤回覆及各種要求自2008年起已經開始出現(見原審法院對第8-27條及第39-47條待證事實的答覆),並不是在簽署涉案合同或上述合同地位讓與合同之後才發生,直至上訴人與上手買家簽署亦未獲發工程准照,上訴人亦理應能預計相關情況仍會持續。
     21. 但上訴人仍堅持在2011年03月09日與上手買家簽署涉案合同,及與上手買家及被上訴人於2014年08月12日簽署上述合同地位讓與合同,上訴人過份自信地認為澳門特區必然會把相關之土地批給續期或重新批給予上訴人,及錯誤地認為上訴人最終能把涉案單位交付予被上訴人。
     22. 綜上所述,上訴人明知土地批給合同即將屆滿但卻沒有在涉案合同或上述合同地位讓與合同內作出善意提醒、上訴人過份自信地認為相關土地批給必然會獲得續期或重新批給、上訴人錯誤認為其最終能建成“XXXX”項目並把涉案單位交付予被上訴人;對於涉案合同之履行不能,上訴人明顯存在過錯。
     II. 關於合同之定性及被上訴人/上手買家所支付的金額之定性
     23. 上訴人一直堅持涉案預約買賣合同屬“賣樓花”必須簽署的合同,能讓上訴人以低價出售涉案單位,屬於對將來物之買賣而需要簽署的合同,不屬《民法典》第435條所指的預約買賣合同。
     24. 上訴人進一步指出上手買家(及後由被上訴人透過合同地位讓與的方式取得上手買家於涉案合同之預約買受人地位)所曾支付的金額是購買涉案單位之樓款,且在卷宗內從未記載相關金額為“訂金”,相關金額並不具有《民法典》第436條所指的定金性質。
     25. 對此,被上訴人不予認同並提出爭執如下。
     26. 根據清理批示第I條已證事實,上訴人在涉案合同內承諾以港幣肆佰貳拾萬圓整(HKD4,200,000.00)向上手買家出售涉案單位,而上手買家亦承諾以相同價格購入涉案單位(見卷宗第1097-1112頁)。
     27. 即上訴人與上手買家簽署的涉案合同屬於《民法典》第435條所規定的買賣之預約合同。
     28. 根據原審法院對第35條待證事實的回覆,未能證實上手買家曾支付的金額不具有擔保性質而屬於購買涉案單位的樓款。
     29. 而涉案合同內並沒有任何約定排除上手買家向上訴人曾支付的金額不具有定金性質。
     30. 根據涉案合同第9條的內容,倘上手買家在與上訴人簽署買賣公證書之前把涉案單位轉售予他人必須要取得上訴人的同意(見卷宗28-30頁)。
     31. 倘上手買家曾支付的金額屬於購買涉案單位的樓款,上手買家是可以自由把涉案單位轉售他人而毋需取得上訴人之同意。
     32. 根據涉案合同第5條的內容,倘上手買家未有按涉案合同所載之期限進行支付,則視上手買家為撻訂,上手買家曾支付的金額將會被上訴人沒收(見卷宗28-30頁)。
     33. 顯然,這正正就表示上手買家曾支付的金額具有定金性質,否則,上訴人在上手買家不按時進行支付上訴人是不能沒收上手買家所曾支付的金額。
     34. 由此可見,上手買家所曾支付的金額具有《民法典》第436條所規定的定金之性質。
     III. 關於損害賠償
     35. 上訴人認為涉案合同出現履行不能的情況不能歸責於上訴人,故被上訴人或上手買家應被免除支付義務,而被上訴人或上手買家所曾支付的金額只能根據不當得利的規則返還予被上訴人。
     36. 對此,被上訴人不予認同並提出爭執如下。
     37. 根據本答覆之上述分析,涉案合同之履行不能是上訴人之過錯所導致的。
     38. 而上訴人在本案中亦未能證明涉案合同之履行不能並非由上訴人之過錯所造成的,故根據《民法典》第779條第1款、787、788及790條的規定上訴人應向被上訴人作出相應的損害賠償。
     39. 根據《民法典》第436條第2款的規定,被上訴人有權要求上訴人返還雙倍定金。
     40. 上手買家曾向上訴人支付港幣壹佰貳拾陸萬圓整(HKD1,260,000.00)的金額,故上訴人應向被上訴人返還雙倍定金,金額合共港幣貳佰伍拾貳萬圓整(HKD2,520,000.00),折合為澳門幣貳佰伍拾玖萬伍仟陸佰圓整(MOP2,595,600.00)。
     41. 上訴人認為根據《民法典》第436條第4款的規定,在上訴人向被上訴人雙倍返還定金後毋須作出其他賠償。
     42. 但基於上訴人曾向被告支付澳門幣肆佰圓整(MOP400.00)的合約費及港幣肆萬貳仟圓整[折合為澳門幣肆萬叁仟貳佰陸拾圓整(MOP43,260.00)]的轉名費,故原審法院亦同時裁定被告須向上訴人返還澳門幣肆佰圓整(MOP400.00)的合約費及澳門幣肆萬叁仟貳佰陸拾圓整(MOP43,260.00)的轉名費。
     43. 此外,原審法院認為基於上訴人之過錯而導致涉案合同之不能履行,導致被上訴人本來能使用涉案單位的權利已被剝奪超過10年,故原審法院根據《民法典》第560條第6款所關於衡平原則的規定裁定上訴人尚須向被上訴人之支付澳門幣壹佰叁拾萬圓整(MOP1,300,000.00)的賠償。
     44. 根據清理批示第N條已證事實,為購買涉案單位,被上訴人曾向上手買家支付合共港幣伍佰貳拾陸萬圓整(KD5,260,000.00),折合為澳門幣伍佰肆拾壹萬柒仟捌佰圓整(MOP5,417,800.00)的價金(見卷宗第1097-1112頁)。
     45. 根據原審法院對第6條待證事實的回覆,被上訴人能以澳門幣壹仟零肆拾壹萬玖仟玖佰貳拾伍圓壹角捌分(MOP10,419,925.18)在相同區域取得如涉案單位面積相約的住宅單位。
     46. 同理,假如被上訴人能獲交付涉案單位,被上訴人亦能在獲交付涉案單位後進行出售,被上訴人在提交起訴狀時本應能以澳門幣壹仟零肆拾壹萬玖仟玖佰貳拾伍圓壹角捌分(MOP10,419,925.18)的金額出售涉案單位或進行出租。
     47. 但基於上訴人之過錯,被上訴人已無法獲交付涉案單位,故被上訴人亦不可能把涉案單位進行出售或出租,導致被上訴人損失合共澳門幣壹佰玖拾柒萬叁仟玖佰貳拾伍圓壹角捌分(MOP1,973,925.18)[計算方式:MOP10,419,925.18 - MOP8,446,000.00 = MOP1,973,925.18]。
     48. 被上訴人本來能使用涉案單位的權利已被剝奪超過10年,被上訴人之損失明顯遠高於定金數額,故除裁定上訴人須向被上訴人雙倍返還定金及返還被上訴人曾支付的合約費及轉名費外,原審法院按衡平原則裁定上訴人尚須向被上訴人另外一筆損害賠償金額符合法律規定[雖然被上訴人不認同澳門幣壹佰叁拾萬圓整(MOP1,300,000.00)的金額並就此提出上訴]。
     49. 綜上所述,請求上級法院裁定上訴人上述之理由不能成立。
*
    A e B, Recorrentes, devidamente identificados nos autos, discordando da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, datada de 12/07/2024, veio, em 01/08/2024, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 1764 a 1771, tendo formulado as seguintes conclusões:
     一.上訴標的
     1. 本上訴是分別針對:
     a) 原審法庭於2024年04月24日作出對事實事宜作出認定的批示(以下稱:被上訴事實事宜批示)關於調查基礎內容的第58條作出答覆,相關調查基礎內容及原審法院的答覆分別如下:
     - 第58條:O valor de mercado dessa fracção é superior ao valor inicialmente pago pelos Autores à Ré por fracção idêntica?
     Provado (fundamentação: as regras da experiência quanto à evolução do mercado imobiliário da RAEM desde a data do contrato em apreço – 2011 – e a análise global da prova testemunhal que depôs sobre a matéria quesitada).
     b) 原審法庭於2024年07月12日所作出的判決書內作出的以下相關決定(見卷宗第1617-1651頁,在此請求視為完全轉錄)(以下稱:被上訴判決):
     - 1. declara-se resolvido o contrato celebrado entre as partes; e
     - 2. condena-se a ré a pagar aos autores a quantia de:
     - MOP2.639.260,00 (dois milhões, seiscentas e trinta e nove mil, duzentas e sessenta Patacas), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da citação da ré até integral pagamento;
     - MOP1.300.000,00 (um milhão e trezentas mil Patacas), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da presente sentença até integral pagamento.
     2. 上訴人分別對被上訴事實事宜批示及被上訴對決不服,並認為:
     a) 被上訴事實事宜批示沾有違反一般經驗法則的瑕疵;及
     b) 被上訴判決沾有審判錯誤適用法律的瑕疵。
     3. 因此,現向尊敬的中級法院法官 閣下提起本平常上訴。
     二.上訴理據
     I. 對被上訴事實事宜批示提出爭執
     4. 在尊重原審法院的前提下,上訴人現謹針對原審法庭於2024年04月24日作出的被上訴事實事宜批示關於調查基礎內容第58的答覆提出爭執。
     A. 關於被上訴事實事宜批示第58條
     5. 對於原審法院對被上訴事實事宜批示待證事實第58條的回覆,上訴人不予認同並提出爭執。
     6. 原審法院根據一般經濟法則認為澳門特區的不動產市場自涉案之預約買賣合同之年份(即2011年)的發展,認為置換房現時的市場價值高於原告們(即:上訴人)一開始支付予被告的金額。
     7. 首先,卷宗內沒有任何書面證據能夠證明置換房現時的市場價值。
     8. 根據原審法院對清理批示第57條待證事實的答覆,上訴人能獲配置置換房的原因是基於上訴人曾就涉案單位與被告簽署預約買賣合同。
     9. 置換房現時出售的每平方米呎價與涉案單位的每平方米呎價是一致亦是基於上條之原因。
     10. 但置換房現時的市場價值是多少是不為人所知的。
     11. 澳門不動產市場自2020年起受新冠疫情所影響,不動產市場價值持續下跌,故根本無辦法證明置換房現時的市場價值高於原告們(即:上訴人)一開始支付予被告的金額。
     12. 雖然置換房興建在XXXX涉案單位本來獲批准興建的土地之上(即:P地段),但置換房在品質上並不一定與XXXX涉案單位相約。
     13. XXXX樓盤計劃建造18座塔樓,被告進行銷售時是以豪宅來形容涉案單位的。
     14. 眾所週知,置換房的樓群僅有6座塔樓,同一土地有其他政府房屋,包括:暫住房及長者公寓。
     15. 置換房在占地面積方面遠少於XXXX樓盤。
     16. 由此可見,置換房是無法與涉案單位進行比較的。
     17. 在缺乏書面證據及具體證言的情況下,上訴人認為被上訴事實事宜批示待證事實第58條違反一般經驗法則,且在缺乏具體證據的情況下不應獲得證實。
     II. 關於被上訴判決
     18. 在尊重原審法院的前提下,上訴人認為被上訴判決沾有錯誤適用法律的瑕疵。
     19. 原審法院裁定由上手買家支付予被告的港幣壹佰貳拾陸萬圓整(HKD1,260,000.00)[折合為澳門幣壹佰貳拾玖萬柒仟捌佰圓整(MOP1,297,800.00)]的樓款屬於《民法典》第436條所規定的定金。
     20. 原審法院根據《民法典》第436條第2款的規定裁定被告須向上訴人雙倍返還被告曾收取的定金,金額合共:澳門幣貳佰伍拾玖萬伍仟陸佰圓整(MOP2,595,600.00)(計算方式:MOP1,297,800X2)。
     21. 同時,基於上訴人曾向被告支付澳門幣肆佰圓整(MOP400.00)的合約費及港幣肆萬貳仟圓整[折合為澳門幣肆萬叁仟貳佰陸拾圓整(MOP43,260.00)]的轉名費,故原審法院亦同時裁定被告須向上訴人返還澳門幣肆佰圓整(MOP400.00)的合約費及澳門幣肆萬叁仟貳佰陸拾圓整(MOP43,260.00)的轉名費。
     22. 基於上述兩條的原因,原審法院裁定被告須向上訴人支付合共澳門幣貳佰陸拾叁萬玖仟貳佰陸拾圓整(MOP2,639,260.00)。
     23. 此外,原審法院認為基於被告不能履行涉案的預約合同,故上訴人本來能使用涉案單位的權利已被剝奪超過10年,但基於剝奪使用權的損失無法確定,故原審法院根據《民法典》第560條第6款的規定認為按衡平原則裁定被告向上訴人支付澳門幣壹佰叁拾萬圓整(MOP1,300,000.00)的金額(以下稱:上述金額)是屬於合理。
     24. 但上訴人不予認同。
     25. 首先,為購買涉案單位,上訴人曾向上手買家支付合共港幣伍佰貳拾陸萬圓整(HKD5,260,000.00),折合為澳門幣伍佰肆拾壹萬柒仟捌佰圓整(MOP5,417,800.00)的價金。
     26. 根據原審法院第6條待證事實的回覆,涉案單位在上訴人提交起訴狀時的價值可為澳門幣壹仟零肆拾壹萬玖仟玖佰貳拾伍圓壹角捌分(MOP10,419,925.18)。
     27. 即倘被告履行涉案單位之預約買賣合同,上訴人能在獲交付涉案單位後進行出售,上訴人在提交起訴狀時本應能以澳門幣壹仟零肆拾壹萬玖仟玖佰貳拾伍圓壹角捌分(MOP10,419,925.18)的金額出售涉案單位或進行出租。
     28. 但基於被告之過錯,上訴人已無法獲交付涉案單位,故上訴人亦不可能把涉案單位進行出售或出租,導致上訴人損失合共澳門幣壹佰玖拾柒萬叁仟玖佰貳拾伍圓壹角捌分(MOP1,973,925.18)[計算方式:MOP10,419,925.18-MOP8,446,000.00=MOP1,973,925.18]。
     29. 此外,基於被告之過錯,使上訴人對涉案單位的使用權被剝奪超過10年,且被剝奪的情況仍然繼續,置換房最終不一定能滿足上訴人的住屋需要。
     30. 上訴人認為被上訴判決關於上述金額的決定屬不合理,明顯過低,不符合衡平原則,錯誤適用法律,應被廢止。
     31. 上訴人認為按衡平原則的規定,被告應向上訴人支付澳門幣叁佰伍拾萬圓整(MOP3,500,000.00)作為對上訴人所造成的損失之損害賠償。
     請求
     綜上所述,懇請尊敬的中級法院法官 閣下:
     1. 按照有關法律之規定指正補充,並接納本上訴;
     2. 裁定上訴人的上訴理由成立;
     3. 宣告:
     a) 廢止被上訴事實事宜批示關於調查基礎內容清理批示的第58條作出答覆,並修改為如下:
     - 第58條:O valor de mercado dessa fracção é superior ao valor inicialmente pago pelos Autores à Ré por fracção idêntica?
     Nao Provado.
     b) 廢止被上訴判決,並裁定如下:
     - 1. declara-se resolvido o contrato celebrado entre as partes; e
     - 2. condena-se a ré a pagar aos autores a quantia de:
     - MOP2.639.260,00 (dois milhões, seiscentas e trinta e nove mil, duzentas e sessenta Patacas), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da citação da ré até integral pagamento;
     - MOP3.500.000,00 (três milhões e quinhentos mil Patacas), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da presente sentença até integral pagamento.
     4. 判處被上訴人(即:被告)支付本上訴的司法稅及訴訟費用及職業代理費。
*
    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
* * *
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
  III – FACTOS ASSENTES:
    A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
     1. A Ré é uma sociedade por quotas, constituída em Macau, em 08 de Fevereiro de 1977, cujo objecto é a exploração do comércio de importação e exportação, da actividade de agente comercial e de transportes, da indústria de vestuário, fiação, tecelagem e malhas, tinturaria e impressão, do fabrico de bordados e, ainda, da actividade de fomento predial e construção e reparação de edifícios.
     2. Por Despacho nº 160/SATOP/90, publicado no 2.º Suplemento do Boletim Oficial nº 52, de 26 de Dezembro de 1990, alterado pelo Despacho nº 107/SATOP/91, publicado no Boletim Oficial nº 26, de 01 de Julho de 1991, foi concedido à Ré o terreno, a resgatar ao mar, com a área de 60.782m2, constituído por 3 lotes com a designação de Lote “O”, para fins habitacionais, Lote “S” para fins habitacionais e Lote “Pa” para fins industriais.
     3. De acordo com a cláusula 2ª, nº 1, dos termos da concessão fixados naquele despacho, o prazo de concessão foi fixado em 25 anos, contados a partir da outorga da escritura pública do contrato.
     4. Por Despacho nº 123/SATOP/93, publicado na II Série do Boletim Oficial nº 35, de 1 de Setembro de 1993, e nos termos que já tinham sido previstos no Despacho nº 160/SATOP/90, foi à Ré concedida a parcela de terreno designada por “Pb” destinada a ser anexada à parcela “Pa”, constituindo um lote único com a área global de 67.536m2 e destinava-se a viabilizar o projecto de instalação de um “complexo industrial”.
     5. As parcelas “Pa” e “Pb” foram anexadas e o respectivo terreno passou a estar descrito sob o nº ****0 do Livro B68M, com a designação de Lote “P”.
     6. Pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas nº 19/2006, publicado na II Série do Boletim Oficial da RAEM nº 9, de 01 de Março de 2006, tendo em conta o Estudo Prévio de 2005 e as PAOs de 2004 e 2005, foi acordada a alteração de finalidade e o reaproveitamento do lote “P”, com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com 5 pisos, sobre o qual assentam 18 torres com 47 pisos cada uma, afectado às seguintes finalidades e áreas brutas de construção (cfr. a redacção conferida à cláusula 3ª, nº 2.3, do contrato de concessão de arrendamento pelo artigo 1º dos termos e condições do contrato constantes do Anexo ao Despacho nº 19/2006):
     a) - Habitação: 599.730m2;
     b) - Comércio: 100.000m2;
     c) - Estacionamento: 116.400m2;
     d) - Área livre: 50.600m2.
     7. O prazo de aproveitamento era de 96 meses, contados a partir da data da publicação no «Boletim Oficial da RAEM» do despacho que titulasse a referida revisão.
     8. Em 09 de Março 2011, a Ré e a “D (Macau) Investments Limited” (adiante designada por “ex-compradora”) celebraram o “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel” (adiante designado por “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel”), cujo objecto era, a fracção “F”, do **º andar, do bloco ..., do edifício em construção no “Lote P”, situado em Macau, na Zona da Areia Preta, S/N, que se encontrava descrito na Conservatória de Registo Predial de Macau sob o nº ****0 (adiante designada por “fracção em causa”)
     9. A Ré prometeu vender a fracção em causa, enquanto a ex-compradora prometeu comprá-la, mediante o preço de quatro milhões e duzentos mil dólares de Hong Kong (HKD4.200.000,00), equivalentes a quatro milhões, trezentas e vinte e seis mil patacas (MOP4.326.000,00).
     10. Em conformidade com o estabelecido no ponto 3a da cláusula 3ª, do “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel”, a ex-compradora pagou à Ré, a título de sinal estipulado no contrato, a quantia de um milhão, duzentos e sessenta mil dólares de Hong Kong (HKD1.260.000,00), equivalentes a um milhão, duzentas e noventa e sete mil e oitocentas patacas (MOP1.297.800,00).
     11. Em 26 de Junho de 2014, os Autores e a ex-compradora celebraram o “Contrato de Compra e Venda Provisório”, cujo objecto era a fracção em causa (adiante designado por “Contrato de Compra e Venda Provisório”), através do qual os Autores prometeram comprar a fracção em causa, enquanto a ex-compradora prometeu vendê-la, mediante o preço de oito milhões e duzentos mil dólares de Hong Kong (HKD8.200.000,00), equivalentes a oito milhões, quatrocentas e quarenta e seis mil patacas (MOP8.446.000,00).
     12. Em 09 de Maio e 09 de Junho de 2014, respectivamente, os Autores, cumprindo a cláusula 2ª, alínea a), do “Contrato de Compra e Venda Provisório”, efectuaram à ex-compradora, a título de preço do imóvel, os pagamentos mediante a livrança (n.º H54****), sacada do Banco da China, Sucursal de Macau, no valor de cento e cinquenta mil dólares de Hong Kong (HKD150.000,00), e a livrança (n.º H55****), sacada do Banco da China, Sucursal de Macau, no valor de seiscentos e cinquenta mil dólares de Hong Kong (HKD650.000,00).
     13. Em 11 de Agosto de 2014, os Autores, cumprindo a cláusula 2ª, alínea d), do “Contrato de Compra e Venda Provisório”, efectuaram à ex-compradora, a título de preço do imóvel, o pagamento mediante a livrança (n.º H56****), sacada do Banco da China, Sucursal de Macau, no valor de quatro milhões, quatrocentos e sessenta mil dólares de Hong Kong (HKD4.460.000,00).
     14. Por outras palavras, os Autores já pagaram à ex-compradora, a título de preço do imóvel, o valor total de cinco milhões, duzentos e sessenta mil dólares de Hong Kong (HKD5.260.000,00), equivalentes a cinco milhões, quatrocentas e dezassete mil e oitocentas patacas (MOP5.417.800,00).
     15. Posteriormente, em 12 de Agosto de 2014, relativamente à fracção em causa, os Autores, a Ré e a ex-compradora assinaram uma “Declaração de Alienação da Fracção do Edf. “XXXX””.
     16. Através da supramencionada “Declaração de Alienação da Fracção do Edf. “XXXX””, os Autores adquiriram a posição do promitente-comprador que a ex-compradora tinha no “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel” celebrada em 9 de Março de 2011, tendo a Ré também concordado e consentido com a referida cessão da posição contratual.
     17. De acordo com os termos da referida “Declaração de Alienação da Fracção do Edf. “XXXX”” e do “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel”, o remanescente do preço do imóvel, no valor de dois milhões, novecentos e quarenta mil dólares de Hong Kong (HKD2.940.000,000), equivalentes a três milhões, vinte e oito mil e duzentas patacas (MOP3.028.200,00), devia ser pago pelos Autores à Ré no prazo de sete dias, contados da emissão da licença de utilização (licença de ocupação) pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes de Macau.
     18. De acordo com a cláusula 10ª do “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel”, a entrega da fracção seria realizada no prazo de 1200 dias úteis de sol (ou seja, excluídos domingos, feriados e dias de chuva), contados a partir da conclusão do 1º piso para habitação das obras da superestrutura, e seria celebrada a escritura pública.
     19. Em 24 de Outubro de 2013, a Ré requereu junto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes a emissão de licença para as obras das fundações, que foi emitida em 02 de Janeiro de 2014.
     20. Em 15 e 30 de Janeiro de 2014, a Ré apresentou o pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento.
     21. Em 04 de Junho de 2014, a Ré voltou a requerer a prorrogação.
     22. Em 26 de Junho de 2014, a Comissão de Terras emitiu a seguinte pronúncia: “Para além disso, estima-se que mesmo que o prazo de aproveitamento seja prorrogado, a concessionária só possa concluir parte das obras da fundação, podendo no entanto isto criar indirectamente condições favoráveis à concessionária para que esta se aproveite do facto como fundamento para lograr ficar com a concessão do terreno. Nestas circunstâncias, propõe que a situação real do processo, anteriormente descrita, seja tida em consideração na decisão final que recair sobre o pedido, nomeadamente o conteúdo da carta da concessionária.”
     23. Em 10 de Julho de 2014, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas, emitiu o seguinte parecer: “…Analisado o parecer da Comissão de Terras e ponderando os 17º a 21º pontos desse parecer e a carta da concessionária, constante do 24º ponto, nomeadamente, o teor do ponto 24.4, concordo, em princípio, com os pontos 14.2 e 14.3 da informação n.º 090/DSODEP/2014 da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, isto é, prorrogar o prazo de aproveitamento até 25 de Dezembro de 2015 e aplicar a multa no montante de MOP$180,000.00, pressupondo que a Sociedade concessionária aceite previamente por escrito as seguintes condições, para garantir interesses públicos:
     1. Se não for completado o aproveitamento antes da prescrição de arrendamento, mesmo estando preenchidos os requisitos previstos no art.º 5.º da Lei n.º 7/2013 (Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção), a Sociedade concessionária não vai pedir autorização prévia para fazer negócios jurídicos de promessa de transmissão ou oneração de edifícios em construção no lote P, nem vai realizar esses negócios jurídicos, excepto a eventual obtenção legal de nova concessão desse terreno;
     2. Se não mais lhe for concedido o terreno, a Sociedade concessionária não pode pedir à RAEM qualquer indemnização ou compensação.”
     24. Em 15 de Julho de 2014, sobre este parecer, o Chefe do Executivo despachou: “Concordo”.
     25. Em 29 de Julho de 2014, foi enviado à Ré um ofício assinado pela Directora, Substituta, da DSSOPT, com o seguinte teor; “…1. Nos termos da cláusula n.º 2 do contrato de concessão de terreno revisto pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, o prazo de aproveitamento do terreno já ficou caduco aos 28 de Fevereiro de 2014; no entanto, nos termos do art.º 2.º do Despacho n.º 160/SATOP/90, o prazo de arrendamento do terreno vai acabar aos 25 de Dezembro de 2015.
     2. Como o atraso do aproveitamento do terreno é imputável à vossa empresa, e tendo em conta que esta não é a primeira vez que a vossa empresa requer prorrogar o aproveitamento de terreno, e visto que já concordou aceitar a forma de punição para o atraso prevista no contrato; para o efeito, nos termos do Despacho proferido pelo Chefe do Executivo aos 15 de Julho de 2014, autoriza-se prorrogar o prazo de aproveitamento do terreno até 25 de Dezembro de 2015, e aplica-se a multa no valor de MOP$180.000,00 (cento e oitenta mil patacas). Mas para garantir os interesses públicos, a empresa concessionária obriga-se previamente a prometer por escrito aceitar as seguintes condições:
     2.1. Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5.º da Lei n.º 7/2013, Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção, a concessionária não vai pedir autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no Lote “P” ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;
     2.2. Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.
     3. Nestes termos, avisa-se a vossa empresa para entregar a promessa escrita acima mencionada, para ser transferida à Comissão de Terras para acompanhar, a fim de emitir a guia de pagamento da multa.”
     26. A Ré aceitou pagar a multa no valor de MOP180.000,00 e prometeu, por escrito, à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes que não voltava a reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.
     27. Em 27 de Novembro de 2015, a Ré apresentou ao Chefe do Executivo o pedido de prorrogação dos prazos de aproveitamento e de concessão por período não inferior a 60 meses, contados a partir de 26 de Dezembro de 2015.
     28. Em 30 de Novembro de 2015, o Chefe do Executivo concordou com os pareceres que lhe foram colocados à consideração, cujo sentido era o de indeferir o pedido de prorrogação com fundamento em que, impedindo a Lei nº 10/2013 a renovação de concessões provisórias, não podia ser autorizada a prorrogação do prazo de aproveitamento.
     29. Em 21 de Janeiro de 2016, a Comissão de Terras emitiu o parecer nº 9/2016, cujo ponto 50 apresenta o seguinte teor:
     “Findo o seu prazo de vigência, as concessões provisórias não podem ser renovadas, a não ser no caso previsto no n.º 2 do artigo 48.º da Lei de Terras, conforme estabelece o n.º1 do mesmo preceito legal, operando-se a caducidade por força da verificação daquele facto (decurso do prazo de arrendamento).
     De igual modo, resultava da Lei n.º6/80/M, de 5 de Julho (Lei de Terras anterior), que no caso de a concessão revestir natureza provisória, em virtude do terreno não se encontrar aproveitado (cf. Artigos 49º, 132º e 133º), não era possível operar a sua renovação por períodos sucessivos de dez anos porquanto a figura da renovação prevista no n.º1 do artigo 55º era aplicável apenas às concessões definitivas. Apesar da caducidade operar de forma automática e directa, para tornar a situação jurídica certa e incontestada e, portanto, eliminar a insegurança jurídica sobre a extinção ou não do direito resultante da concessão, deve a mesma (caducidade) ser declarada, conforme decorre do disposto no corpo do artigo 167ºda Lei nº10/2013…”
      No dia 22 de Janeiro de 2016, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu parecer com o seguinte teor:
     “…8. Reunida em sessão de 21 de Janeiro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado o processo, considerou que o prazo de arrendamento de 25 anos fixado na cláusula segunda do contrato terminou em 25 de Dezembro de 2015, e que a concessão provisória não pode ser renovada, de acordo com o previsto no nº 1 do artigo 48º da Lei nº 10/2013, Lei de terras, aplicável por força dos seus artigos 212º e 215º. Deste modo, a concessão do lote "P" encontra-se caducada pelo termo do respectivo prazo de arrendamento (caducidade preclusiva), devendo esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo. Consultado o processo supra mencionado e concordando com o que vem proposto, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno pelo decurso do prazo de arrendamento”.
     30. Em 26 de Janeiro de 2016, o Chefe do Executivo proferiu o seguinte despacho: “Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, a que se refere o Processo n.º 2/2016 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 22 de Janeiro de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho”.
     31. O prazo de concessão por arrendamento do terreno em causa expirou em 25 de Dezembro de 2015.
     32. Segundo o Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas nº 6/2016, tornou-se público que por despacho do Chefe do Executivo, exarado em 26 de Janeiro de 2016, foi declarada a caducidade da concessão do terreno situado na península de Macau, nos NATAP, designado por lote «P», pelo decurso do seu prazo.
     33. A Ré interpôs recurso contencioso junto do Tribunal de Segunda Instância, requerendo a anulação do despacho exarado pelo Chefe do Executivo em 26 de Janeiro de 2016, através do qual foi declarada a caducidade da concessão provisória daquele terreno.
     34. Em 19 de Outubro de 2017, o Tribunal de Segunda Instância proferiu o acórdão que julgou improcedente o recurso contencioso, mantendo-se o acto administrativo recorrido. A Ré, não se conformando, recorreu junto do Tribunal de Última Instância contra o referido acórdão.
     35. De acordo com o Acórdão nº 7/2018, o Tribunal de Última Instância negou provimento ao recurso interposto pela Ré, tendo o acórdão transitado em julgado e tornado irrecorrível em 12 de Junho de 2018.
     36. Os Autores, para celebração do “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel”, respeitante à fracção em causa, despenderam quatrocentas patacas (HKD400,00) (sic) a título de despesa do contrato.
     37. Os Autores, para celebração do “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel”, despenderam quarenta e dois mil dólares de Hong Kong (HKD42.000,00), a título de despesa com transferência de titularidade da fracção em causa, equivalentes a quarenta e três mil, duzentas e sessenta patacas (MOP43.260,00).
     38. Em 25 de Julho de 2014, os Autores, relativamente à fracção em causa, pagaram, junto da Direcção dos Serviços de Finanças, o imposto do selo sobre a transmissão de bens imóveis, no valor de duzentas e três mil e quarenta e nove patacas (MOP203.049,00).
     39. A Ré era concessionária do Lote “P”, situado nos Novos Aterros da Zona da Areia Preta, onde estava prevista a construção de um prédio em regime de propriedade horizontal, designado por “XXXX”, conforme contrato de concessão titulado pelo Despacho nº 160/SATOP/1990, publicado no 2.º Suplemento ao n.º 52 do Boletim Oficial, de 26 de Dezembro de 1990.
     40. O referido contrato de concessão foi revisto em 1/3/2006 e conforme resulta do anexo ao Despacho n.º 19/2006 do STOP, publicado na II Série do Boletim Oficial n.º 9, de Março de 2006, o reaproveitamento do terreno do Lote “P” abrangia a construção do prédio atrás citado, compreendendo 18 torres habitacionais, com 47 pisos cada, assentes num pódio de 5 pisos, havendo ainda áreas significativas para comércio e estacionamento de automóveis e motociclos.
     41. O prazo de aproveitamento foi acordado em 96 meses.
     42. Nos termos da cláusula 5ª, nº 7 do contrato de concessão inicial, titulado pelo Despacho n.º 160/SATOP/90, a DSSOPT dispunha de um prazo de 60 dias para, obrigatoriamente, se pronunciar sobre os requerimentos da R., no âmbito da marcha do respectivo processo.
     43. A R. apresentou em 10/09/2004 um Estudo Prévio junto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) (T- 4803), seguido de um Estudo Prévio complementar apresentado junto da mesma entidade em 15/12/2004 (T - 6451).
     44. Os referidos Estudos Prévios foram aprovados pela DSSOPT em 21/01/2005, por Ofício com o nº 747/DURDEP/2005.
     45. A DSSOPT emitiu três Plantas Oficiais de Alinhamento (PAO’s), uma em 23/12/2004, outra em 23/02/2005 e a terceira em 11/05/2007.
     46. Em 29/04/2008 a R. apresentou o “Master Layout Plan” (Recibo de entrada nº T-3040).
     47. Em 06/05/2008 a R. apresentou o projecto inicial de arquitectura (Talão nº T-3163).
     48. Em 22/10/2009 a Ré apresentou o projecto de arquitectura à DSSOPT (Talão 7191/2009).
     49. Em 23/02/2010, a DSSOPT emitiu nova PAO, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
     50. Em 09/04/2010, A Ré recebeu o Ofício nº 4427/DURDEP/2010 contendo em anexo a referida PAO, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
     51. Em resposta, a Ré, em 03/06/2010, incorporou no projecto algumas sugestões, sem contudo contemplar a exigência de um afastamento mínimo entre as torres equivalente a 1/6 da torre mais alta e a de 50 metros entre as fachadas.
     52. Em 07/01/2011 a DSSOPT aprovou o projecto de arquitectura apresentado pela Re em 22/10/2009 através do Ofício nº 318/DURDEP/2011.
     53. Em 11/05/2011 a R. apresentou um relatório de impacto ambiental (T-5205/2011).
     54. Mas a DSPA elaborou um parecer em 22/06/2011, que apenas foi notificado à R. em 04/10/2011 (ofício com referência n.º 11599/DURDEP/2011, onde formulou numerosas exigências adicionais, designadamente no que respeita aos factores “ruído”, “qualidade da água”, “paisagem”, “vista” e “voo de pássaros”.
     55. A resposta a essas novas exigências exigiu a preparação de um segundo relatório de avaliação do impacte ambiental, o qual foi apresentado pela R. em 19/04/2012 (T-4242/2012).
     56. Em 31/08/2012, foi apresentado o terceiro relatório de avaliação do impacte ambiental.
     57. A DSPA emitiu outro parecer sobre este novo relatório de avaliação do impacte ambiental em 16/10/2012, mas este parecer apenas foi notificado à R. cerca de quatro meses depois do requerimento da Ré, em 28/12/2012 (Ofício nº 13023/DURDEP/2012).
     58. Neste parecer, desta feita a DSPA exigiu um estudo pormenorizado sobre o “Layout” das torres, com “simulação informática”, uma avaliação sobre as “partículas em suspensão” e “uma nova avaliação ou em alternativa a alteração do Layout, em virtude da questão da ETAR”.
     59. A R. apresentou um quarto relatório de avaliação do impacte ambiental em 15/03/2013 (T-3953/2013).
     60. Em 03/05/2013 a DSPA emitiu o seu Parecer sobre este novo relatório de avaliação do impacto ambiental – cfr. Ofício nº 1545/071/DAMA/DPAA/2013.
     61. Nesse Parecer são formuladas exigências adicionais quanto ao conteúdo do relatório, desta vez, entre outras, no que respeitaria ao “impacto ambiental sobre os novos aterros, a ilha artificial, o fedor, etc”.
     62. Em 07/08/2013 foi apresentado o sexto relatório de avaliação do impacte ambiental pela R..
     63. Em 15/10/2013 ocorreu a aprovação final do projecto de obra, incluindo o Estudo de Avaliação do Impacto ambiental e de Circulação do Ar, atento o parecer da DSPA de 29/08/2013, sujeita apenas a condições de pormenor, designadamente resultantes dos pareceres da CEM (17/06/2011), IACM (17/06/2011), Corpo de Bombeiros (01/06/2011) e DSAT (13/07/2011).
     64. A licença para as obras de fundações foi imediatamente requerida pela R. em 24 de Outubro de 2013 (T-11874/2013).
     65. A DSSOPT só a emitiu em 2 de Janeiro de 2014 com um período de validade até 28 de Fevereiro de 2014, i. é, inferior a dois meses.
     66. Em 15 de Janeiro de 2014, a R. também apresentou um pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento.
     67. Só cerca de seis meses e meio depois foi o mesmo autorizado, em 29 de Julho de 2014, através do ofício nº 572/954.06/DSODEP/2014.
     68. A Ré jamais pode construir a fracção em causa e entregá-la aos Autores, nem possível é a transmissão, aos Autores, do direito de propriedade da fracção em causa. (Q 1.º)
     69. A Ré tinha perfeito conhecimento de que não seria renovada a concessão do terreno após a expiração do prazo de concessão provisória, isto é, para conseguir cumprir as suas obrigações derivadas do “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel”, a Ré precisava de finalizar o aproveitamento do lote P até 25 de Dezembro de 2015. (Q 2.º)
     70. A Ré, sendo uma sociedade que tem, por objecto, o desenvolvimento imobiliário, desenvolveu em Macau vários complexos habitacionais, tais como “La Baire Du Nobre” e “Vila de Mer”, entre outros, tinha, assim, capacidade para calcular os prazos em que conseguiria concluir os projectos e detectar, com os seus conhecimentos profissionais, quais os factores que afectavam o andamento das obras. (Q 3.º)
     71. Aquando da celebração do “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel” entre a Ré e a “ex-compradora”, ainda não tinha sido emitida, no que toca ao processo da obra a executar no Lote P, licença válida para obras (vide doc. 9 da p.i.). (Q 4.º)
     72. A ré confiou que acabaria por conseguir celebrar a escritura pública com os Autores e entregar-lhes a fracção em causa. (Q 5.º)
     73. Uma fracção residencial nova, com a mesma área, situada no mesmo bairro e do mesmo nível da que os autores pretendiam adquirir da ré tinha na data da entrada da petição inicial em juízo o valor de mercado de dez milhões, quatrocentas e dezanove mil, novecentas e vinte e cinco patacas e dezoito avos (MOP10.419.925,18 = MOP132.199,00 x 78,82 metros quadrados).(Q 6.º)
     74. A ré solicitou em 14/08/2009 a emissão de uma nova PAO. (Q 8.º)
     75. Na parte final, logo após o ponto 19 do Ofício nº 318/DURDEP/2011, a DSSOPT condicionou a emissão da licença de obra à apresentação de Relatórios de impacto ambiental. (Q 9.º)
     76. Na apreciação do segundo relatório ambiental, a DSPA decidiu apontar novos requisitos a cumprir pela R., não previstos em qualquer norma legal ou regulamentar em vigor (Ofício nº 1586/054/DAMA/DPAA/2012, de 24/05/2012 e depois oralmente, em reunião ocorrida em 25/07/2012), cujo teor foi objecto de discussão entre a XXXX, a DSSOPT e a DSPA, em 25/07/2012. (Q 10.º)
     77. Houve, assim, negociações em 25/07/2012 - três meses após a apresentação do 2.º Relatório. (Q 11.º)
     78. Contudo, essas negociações, em lugar de servirem para esclarecer o que já havia sido solicitado, acabaram por ter como consequência o aditamento, pela DSPA, de novas exigências sobre a matéria a aplicar nas fachadas, padrões de avaliação sobre o ar e os ruídos. (Q 12.º)
     79. Nessa ocasião, a DSPA propôs que a DSSOPT emitisse parecer sobre as novas exigências a incluir no relatório a apresentar. (Q 13.º)
     80. Em 28/06/2013, a R. apresentou o quinto relatório de avaliação do impacte ambiental. (Q 14.º)
     81. Tendo em vista evitar maiores demoras, a R. solicitou uma reunião à DSSOPT e à DSPA que teve lugar em 26/07/2013.(Q 15.º)
     82. Em nenhuma das PAO’s de 2004, 2005 e 2007 se previa a necessidade de um afastamento mínimo de 1/6 da altura da torre mais alta, do limite máximo de 50 metros para as fachadas das torres e da apresentação e aprovação de relatórios de impacto ambiental. (Q 16.º)
     83. A PAO de 23/02/2010 e o Ofício de 09/04/2010, mencionados nas (sugeridas) Alíneas L) e M) dos Factos Assentes, vieram formular exigências não previstas anteriormente e que também não constavam do contrato de concessão revisto, nomeadamente, a obrigatoriedade de uma distância mínima entre as Torres equivalente a 1/6 da altura da torre mais alta, que era uma sugestão e não uma exigência. (Q 17.º)
     84. O acatamento da sugestão de afastamento entre as torres num mínimo de 1/6 da altura da torre mais alta implicava um aproveitamento em termos diversos dos constantes dos estudos prévios apresentados para revisão do contrato de concessão e, caso se pretendessem manter as vistas das torres para o mar, poderia implicar redução da área destinada a construção.(Q 18.º)
     85. O acatamento da sugestão de afastamento entre as torres implicava, necessariamente, a elaboração de novos projectos de arquitectura. (Q 19.º)
     86. A ré não concordou com a sugestão de afastamento mínimo entre as torres feita pelo Ofício de 09/04/2010. (Q 20.º)
     87. O projecto de arquitectura aprovado em 07/01/2011 através do Ofício nº 318/DURDEP/2011 não contemplava a sugestão relativa ao distanciamento entre torres, pelo que no fim a DSSOPT desistiu daquela sugestão. (Q 21.º)
     88. A DSSOPT acabou por aceitar, tardiamente, a aprovação nos moldes em que o projecto estava congeminado desde a apresentação em 22/10/2009, acolhendo, afinal de contas, o modelo construtivo saído da revisão do contrato de concessão de 2006 (que não previa o afastamento entre torres correspondente, no mínimo, a 1/6 da altura da torre mais alta). (Q 22.º)
     89. A DSPA formulou exigências que nunca antes tinham sido efectuadas em Macau e que não se encontravam regulamentadas. (Q 24.º)
     90. Após a emissão da licença para as fundações, em 02/01/2014, a Ré iniciou de imediato os trabalhos. (Q 28.º)
     91. - Se a DSSOPT tivesse dado resposta em 60 dias apreciando o projecto parcial de arquitectura apresentado pela ré em 06/05/2008, a que não respondeu;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando o projecto global de arquitectura apresentado pela ré em 22/10/2009, a que respondeu em 9/4/2010;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando a alteração apresentada ao referido projecto global em 3/6/2010, a que respondeu em 7/1/2011 e
     - Se a DSSOPT, quando em 7/1/2011 exigiu pela primeira vez a realização de estudos de impacto ambiental, tivesse exigido à ré todos os estudos da mesma natureza que lhe exigiu mais tarde,
     A R. tinha concluído o empreendimento “XXXX” dentro dos prazos de aproveitamento e de concessão e teria podido entregar à parte autora a fracção autónoma de prédio urbano que se comprometeu a entregar e no prazo em que se comprometeu a fazê-lo. (Q 29.º)
     92. A Ré investiu avultadas verbas na preparação dos diferentes projectos da obra, na realização e densificação dos estudos de impacte ambiental sucessivamente solicitados pela RAEM e no custeamento e execução das obras das fundações do “XXXX” durante o último ano dos prazos de aproveitamento e de concessão, porque a RAEM deu a entender que iria prorrogar os prazos de aproveitamento e de concessão. (Q 30.º)
     93. A Ré ofereceu ao público milhares de fracções autónomas por construir deste seu empreendimento em termos semelhantes àqueles que acordou com os autores no contrato em apreço nos presentes autos, com pagamento do preço na modalidade de pagamento integral ou pagamento faseado. (Q 34.º)
     94. A R lançou dois planos de restituição das quantias que lhe foram entregues por conta dos contratos celebrados entre esta e todos os “promitentes-compradores”, abrangendo um total de cerca de 3.020 direitos de aquisição de fracções autónomas do empreendimento imobiliário “XXXX” (artigo 198). (Q 36.º)
     95. Ambos os Planos contemplam uma forma de restituição do preço em singelo (artigo 201). (Q 37.º)
     96. As condicionantes urbanísticas eram as mesmas nas PAOs 2004, 2005 e 2007. (Q 39.º)
     97. Os projectos de arquitectura de 29/4/2008 e de 6/5/2008 não chegaram a ser analisados e decididos pela DSSOPT. (Q 40.º)
     98. Aquando do contrato de revisão da concessão do terreno aqui em causa e nas respectivas negociações, nunca foi afirmado ser necessário a apresentação e aprovação de relatórios de impacto ambiental como condição para início das obras. (Q 41.º)
     99. Para a elaboração do 4.º relatório de impacto ambiental, a Ré viu-se obrigada a recorrer a serviços especializados da Austrália, para a realização da “simulação informática” exigida. (Q 42.º)
     100. Da reunião realizada em 26/7/2013, resultaram novas exigências que obrigaram a Ré à elaboração de novo relatório de impacto ambiental. (Q 43.º)
     101. Estavam em causa exigências novas que apenas iam sendo formuladas à medida que o tempo passava e após a análise dos anteriores elementos entregues pela Ré. (Q 44.º)
     102. O projecto submetido pela Ré, 4 anos antes, em 22/10/2009, já então satisfazia as exigências sobre ventilação e avaliação de impacto ambiental. (Q 45.º)
     103. Obtidas as licenças de construção, a Ré construiu e concluiu todo o trabalho de fundações durante o último ano dos prazos de aproveitamento e concessão. (Q 46.º)
     104. Entre a data da aprovação do projecto, comunicada em 7/1/11, até ao termo dos prazos os prazos de aproveitamento ou da concessão, a Ré dispunha de tempo suficiente para concluir todo o empreendimento e entregar a fracção autónoma aqui em causa aos autores. (Q 47.º)
     105. À Ré bastariam 3 a 4 anos para concluir a construção de todo o empreendimento imobiliário “XXXX” e entregar aos AA a fracção autónoma aqui em causa. (Q 48.º)
     106. A Ré foi obrigada a aceitar as condições impostas para a prorrogação do prazo de aproveitamento, por não dispor de alternativa que lhe permitisse imediatamente continuar a executar o aproveitamento. (Q 49.º)
     107. A Administração bem sabia que, após a emissão da licença e suas prorrogações, não seria à Ré possível concluir a construção de todo empreendimento no prazo do aproveitamento. (Q 50.º)
     108. Em casos de inimputabilidade do concessionário, a política da RAEM era de atribuir, por ajuste directo, nova concessão ao anterior concessionário. (Q 51.º)
     109. A RAEM assumiu a restituição do pagamento do imposto do selo aos compradores. (Q 52.º)
     110. A Ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou dada uma nova concessão do mesmo terreno para data posterior a 25/12/2015, porque os Serviços da Administração lhe criaram tais expectativas, nomeadamente: (Q 53.º)
     1) Ao imporem-lhe o cumprimento da exigência da distância mínima entre torres de 1/6 da torre mais alta, uma sugestão e não uma exigência, o que foi dispensando em momento ulterior, exigência não prevista em parte alguma e inédita em Macau, o que fez com que despendesse o tempo entre 22/10/2009 a 7/1/2011;
     2) Ao imporem-lhe o cumprimento da exigência da aprovação dos relatórios de circulação de ar e de impacto ambiental, exigência não prevista em parte alguma e inédita em Macau, o que obrigou que se despendesse o tempo entre 7/1/2011 e 15/10/2013;
     3) Ao emitirem a licença de obra para as fundações, em 2/1/2914, um mês antes do termo do prazo de aproveitamento, sabendo que era impossível concluir o empreendimento até ao termo do contrato de concessão;
     4) Ao prorrogarem o prazo de aproveitamento, em 29/07/2014, até 25/12/2015, sabendo que seria impossível concluir o empreendimento até essa data;
     5) Ao ser essa a prática seguida anteriormente em casos análogos, de se fazer nova concessão do mesmo terreno ao mesmo concessionário, em caso de não aproveitamento do terreno dentro do prazo.(Q 53.º)
     111. Os Autores candidataram-se à aquisição de uma fracção autónoma ao abrigo da Lei n.º 8/2019, de 12 de Abril, por via do Despacho do CE de 30/5.(Q 54.º)
     112. Em caso afirmativo, tal requerimento foi deferido.(Q 55.º)
     113. Tal fracção é de tipologia, área e preço equivalentes à fracção que constitui o objecto do contrato em causa nos presentes autos e está a ser construída no terreno que foi concessionado à Ré.(Q 56.º)
     114. Os Autores apenas poderão receber do Governo tal fracção, nas condições descritas, apenas porque foi compradores, nos termos do contrato dos autos, de uma fracção autónoma à Ré, que seria construída no mesmo terreno.(Q 57.º)
     115. O valor de mercado dessa fracção é superior ao valor inicialmente pago pelos Autores à Ré por fracção idêntica.(Q 58.º)
* * *
IV – FUNDAMENTAÇÃO
    Os Autores vêm a impugnar a resposta do quesito 58º, defendendo que a mesma devia ser NEGATIVA.
    É do seguinte teor a resposta do quesito 58º:
    O valor de mercado dessa fracção é superior ao valor inicialmente pago pelos Autores à Ré por fracção idêntica?
    PROVADO.
    Para impugnar a matéria de facto, é preciso cumprir o regime especial do artigo 599º que dispõe:
     1. Quando impugne a decisão de facto, cabe ao recorrente especificar, sob pena de rejeição do recurso:
     a) Quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados;
     b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo nele realizado, que impunham, sobre esses pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida.
     2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação da prova tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar as passagens da gravação em que se funda.
     3. Na hipótese prevista no número anterior, e sem prejuízo dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe à parte contrária indicar, na contra-alegação que apresente, as passagens da gravação que infirmem as conclusões do recorrente.
     4. O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 590.º

    Ora, a especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem questionar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio delimitam o objecto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto. Por sua vez, a especificação dos concretos meios probatórios convocados, bem como a indicação exacta das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de base para a reapreciação do Tribunal de recurso, ainda que a este incumba o poder inquisitório de tomar em consideração toda a prova produzida relevante para tal reapreciação, como decorre hoje, claramente, do preceituado no artigo 629º do CPC.
    É, pois, em vista dessa função delimitadora que a lei comina a inobservância daqueles requisitos de impugnação da decisão de facto com a sanção máxima da rejeição imediata do recurso, ou seja, sem possibilidade de suprimento, na parte afectada, nos termos do artigo 599º/2 do CPC.
    O que se verifica neste caso é que os impugnantes não cumpriram tal ónus, pois não indicaram quis os elementos concretos dos autos que imponham uma decisão diversa da fixada pelo Colectivo, para além de atacarem apenas a convicção do julgador. Aliás, é de frisar-se que a matéria quesitada é também um pouco irrelevante para a decisão de causa, porque não se chegou a indicar qual o valor concreto do mercado da fracção em causa à data do julgamento.
    Pelo que, julga-se improcedente a impugnação em causa.
*
    Prosseguindo,
    Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este afirmou na sua douta decisão:

     I – RELATÓRIO.
     A e B, ambos casados no regime da comunhão de adquiridos, também de nacionalidade chinesa, com outros elementos de identificação nos autos, intentaram a presente acção declarativa que segue termos sob a forma ordinária de processo comum contra Sociedade de Importação e Exportação C Limitada, registada na CRCBM sob o n.º ***(SO);
     
     Em síntese, alegaram os autores que:
     - Celebraram com a D (Macau) Investments Limited um contrato através do qual esta lhe transmitiu a posição de promitente-compradora que detinha num contrato-promessa de compra e venda que havia celebrado com a ré relativo a uma fracção autónoma designada “F**” de um prédio urbano que a ré se propunha construir num terreno que lhe havia sido concessionado por arrendamento;
     - A ré não cumpriu e já não pode cumprir a prometida venda porquanto, por razões que lhe são imputáveis, não construiu nem pode já construir o imóvel prometido vender, uma vez que foi declarada pelo Chefe do Executivo e “confirmada” no TUI a caducidade da concessão por arrendamento do terreno destinado à construção.
     Pediram os autores que:
     1. Seja declarado resolvido o referido contratos-promessa;
     2. Seja a ré condenada a
a. pagar-lhes o valor do dano que excede o valor do sinal em dobro, ou seja, a indemnização dos danos correspondentes ao preço que pagaram para adquirir a posição contratual de promitente comprador (MOP5.417.800,00), a quantia que pagaram em imposto do selo e despesas para aquisição da referida posição contratual (400,00 + 43.260,00 + 203.049,00 = MOP246.709,00) e a diferença entre o preço que pagaram para adquirir a posição contratual e o valor actual do imóvel (MOP1.973.925,18), totalizando o valor de MOP7.638.434,18;
b. ou, subsidiariamente, pagar-lhes as referidas quantias sem o acréscimo do valor do imóvel, totalizando no valor de MOP5.664.509,00;
c. ou, também subsidiariamente, pagar-lhes o sinal em dobro no valor de MOP2.595.600,00;
d. ou, ainda subsidiariamente, pagar-lhes o sinal em singelo, a quantia paga de MOP1.297.800,00.
     3. Juros à taxa legal das obrigações de natureza comercial, contados sobre a quantia em que a ré foi condenada, desde o 26/12/2015 até integral pagamento.
     
     Contestou a Ré, aceitando a existência do contrato invocado pelos autores mas rejeitando que já não possa ser cumprido, alegando que intentou uma acção judicial contra a RAEM na qual pretende conseguir um novo contrato de concessão por arrendamento do mesmo terreno onde pretendia construir o empreendimento imobiliário de que fazia parte a fracção autónoma contratada, a qual, em caso de procedência da referida acção judicial, poderá ser entregue aos autores.
     Ainda em contestação, disse a ré que, caso improceda a referida acção que intentou contra a RAEM e caso não possa efectivamente construir o seu empreendimento imobiliário nem possa cumprir a sua obrigação para com os autores, essa impossibilidade não lhe deve ser imputada a si porquanto deve ser imputada à RAEM, a qual, durante o decurso do respectivo procedimento administrativo para aprovação do projecto de arquitectura e para emissão da licença de obras, fez exigências de alteração do projecto de arquitectura que não podia ter feito, fez indevidamente exigências de realização de estudos do impacto ambiental do mesmo projecto e, além disso, não cumpriu os prazos estabelecidos no contrato de concessão e demorou demasiado a apreciar os pedidos da ré para prorrogação do prazo de aproveitamento da concessão, o que levou a que a ré não pudesse iniciar a construção mais cedo e não tivesse conseguido concluí-la antes de caducar a referida concessão.
     Para o caso de se concluir que ocorre impossibilidade da prestação e que esta é imputável à ré, veio esta, também na contestação, defender que os autores não têm direito a indemnização calculada pelo valor do sinal prestado, porquanto foi acordada a inexistência de sinal.
     Também na contestação que apresentou, disse a ré que, caso se conclua pela impossibilidade imputável e pela existência de sinal, deve a indemnização determinada pelo valor deste ser reduzida segundo juízos de equidade.
     Disse ainda não ser responsável pelo preço que os autores pagaram para adquirir a posição contratual; que os autores não pedem o ressarcimento do imposto do selo; que desconhece se o pagara, mas que a RAEM aceitou devolvê-lo; que não podem receber cumulativamente indemnização pelo sinal em dobro e pelo dano excedente e que não têm direito a receber “juros de mora comerciais”.
     Também na contestação requereu a ré contestante a intervenção acessória da RAEM invocando como fundamento que, caso seja condenada a indemnizar os autores, terão direito de regresso contra a RAEM para esta lhe reembolsar o montante da condenação.
     
     Na réplica que apresentaram, os autores impugnaram todas as teses da contestação da ré, quer quanto à afirmação da prestação da ré como ainda possível, à imputabilidade a terceiro da causa da impossibilidade da prestação, à inexistência de sinal e à intervenção da equidade na fixação do montante da indemnização. Apenas deixaram por responder à tese da ré da não aplicação da taxa comercial dos juros de mora.
     
     Foi admitida a intervenção acessória da RAEM, a qual contestou e foi objecto de resposta pelas partes principais. Porém, a ré veio depois comunicar aos autos que desistiu da acção de indemnização que movera contra a RAEM e, por isso, foi no despacho saneador, a fls. 1094, declarada extinta a instância relativamente à RAEM por inutilidade superveniente da lide.
     
     Foi proferido despacho saneador a fls. 1093 a 1112, o qual, como referido, declarou extinta a instância relativamente à RAEM e também seleccionou por remissão para os projectos das partes, a matéria de facto relevante para a decisão.
     
     Procedeu-se a julgamento, foi decidida a matéria de facto contravertida e não foram apresentadas doutas alegações de Direito.
     *
     II – SANEAMENTO.
     A instância mantém-se válida e regular, como decidido no despacho saneador e nada obsta ao conhecimento do mérito.
     *
     III – QUESTÕES A DECIDIR.
     Tendo em conta o relatório que antecede, designadamente:
     - Que a principal pretensão dos autores é serem indemnizados/restituídos em consequência dos danos que sofreram por a ré não ter cumprido, por impossibilidade superveniente, a prestação a que se vinculou por contrato;
     - O facto de os autores e a ré estarem de acordo que entre eles existe a relação contratual invocada pelos autores;
     - O facto de neste momento processual autores e ré estarem também de acordo que a prestação contratual a cargo da ré se tornou impossível depois da celebração do respectivo contrato, pois que a ré desistiu da acção onde pretendia recuperar a possibilidade de cumprir;
     - O facto de a essência da principal divergência entre as partes ser a imputabilidade à ré ou a terceiro da causa da impossibilidade superveniente da prestação da ré e a existência ou inexistência de sinal;
     As principais questões a decidir gravitam à volta de:
     1- Ocorrência de impossibilidade superveniente da prestação contratual devida pela ré aos autores e imputação à ré ou a terceiro da causa dessa impossibilidade.
1.1 - Caso se conclua que a causa da impossibilidade superveniente da prestação a cargo da ré deve ser imputada a terceiro, importa apurar as consequências jurídicas de tal imputação, designadamente:
1.1.1 - Quanto à extinção da obrigação da ré decorrente do contrato;
1.1.2 Quanto a eventual criação na esfera jurídica da ré de uma outra obrigação de restituir aos autores o que deles recebeu e o que recebeu da cedente da posição contratual;
1.2 - Caso se conclua que a causa da impossibilidade superveniente da prestação a cargo da ré deve ser imputada à própria ré, importa então apurar as consequências da referida impossibilidade superveniente da prestação decorrente de causa imputável à ré, designadamente:
1.2.1 - Direito dos autores de resolver o contrato;
1.2.2 - Obrigação da ré indemnizar os autores.
1.2.2.1 - Caso se conclua que a ré tem obrigação de indemnizar os autores, caberá apurar o montante da indemnização e a ocorrência de mora no cumprimento desta obrigação de indemnizar, para isso é necessário averiguar se foi acordado e prestado sinal;
1.2.2.1.1 - Caso se conclua pela existência de sinal, caberá ainda decidir se a indemnização deve ser calculada com base no “regime-regra” do sinal ou se deve ser ampliada para englobar o dano que excede o valor do sinal ou se deve ser reduzida segundo juízos de equidade para montante inferior ao valor do sinal prestado.
1.2.2.1.2 Caso se conclua pela inexistência de sinal, caberá determinar qual o valor da indemnização na ausência de sinal.
1.2.2.1.3 – Caso se conclua pela ocorrência mora no cumprimento da obrigação de indemnizar é ainda necessário apurar as consequências desta a nível indemnizatório, designadamente quanto ao início da mora e quanto à taxa de juro moratório.
     *
     IV – FUNDAMENTAÇÃO.
  A) – Motivação de facto.
     Estão provados os seguintes factos:
     (...)
     
  B) – Motivação de Direito.
 1 – Da impossibilidade superveniente da prestação.
     Neste momento da discussão já não são necessárias especiais considerações para concluir que a prestação da ré se tornou impossível. Seja qual for a prestação devida: celebrar o contrato prometido de compra e venda de uma fracção autónoma de prédio urbano ou apenas construir e entregar a referida fracção. Com efeito, a ré veio aos autos informar que já terminou por desistência a acção judicial que movera contra a RAEM na qual pretendia recuperar a possibilidade jurídica de construir a fracção a entregar aos autores. Acresce que, não tendo a ré meios jurídicos conhecidos nos autos que lhe permitam construir a mencionada fracção, não se vê como negar as características relevantes da impossibilidade superveniente da prestação: ojectiva, absoluta e definitiva1. Com efeito, sem que ocorram circunstâncias de todo imprevisíveis presentemente, a ré, apesar de ser uma sociedade comercial e poder existir durante muito tempo, não tem possibilidade jurídica de construir ou adquirir a fracção autónoma em causa2. Trata-se de uma impossibilidade jurídica da prestação, não de uma impossibilidade física ou naturalística, pois a construção da mencionada fracção está acessível à ré pelos conhecimentos técnicos existentes, mas não lhe está permitida por causa da sua situação jurídica actual e previsível num futuro ponderável3. Na verdade, resulta dos autos que a ré não tem qualquer direito sobre o terreno onde se iria situar a planeada construção.
     
     Conclui-se assim que se tornou impossível após a celebração dos contratos a prestação que a ré acordou prestar.
     
     Resta, pois, apurar as consequências da impossibilidade da prestação.
     
     1.1 – Dos efeitos da impossibilidade da prestação.
     1.1.1 – Em geral.
     Se a prestação acordada é originariamente impossível, a obrigação não nasce porque o contrato é nulo e, por isso, não gera a obrigação de prestar nem o dever de cumprir (art. 395º, nº 1 do CC).
     Se a prestação acordada é originariamente possível (aquando da celebração do respectivo negócio jurídico), mas posteriormente deixa de o ser, a obrigação extingue-se, não pode ser cumprida e o devedor deixa de ter o dever de a prestar (arts. 779º e 790º do CC).
     Se a impossibilidade superveniente ocorre por razões não imputáveis ao devedor, mas imputáveis a terceiro, ao credor ou a ninguém (caso fortuito ou de força maior), fica o devedor exonerado perante o credor. Se, porém, o credor cumpriu perante o devedor a sua eventual contraprestação e a causa da impossibilidade não imputável ao devedor também não lhe é imputável a si, credor, então este, credor, tem direito a que lhe seja restituído o que prestou, mas segundo as regras do enriquecimento sem causa. É esta a tese da ré, escorada no art. 784º do CC. Com efeito, entende que a impossibilidade da prestação não lhe é imputável a si nem ao credor, mas a terceiro, a RAEM.
     Se a prestação se tornou impossível por causa imputável ao devedor, a obrigação extingue-se, não pode ser cumprida e o devedor deixa de ter o dever de a prestar, como se disse atrás. Porém, o devedor poderá ver nascer na sua esfera jurídica outra obrigação, a obrigação de indemnizar o credor pelos prejuízos sofridos em consequência da mencionada impossibilidade superveniente, devendo o devedor indemnizar o credor como se faltasse culposamente ao cumprimento devido (art. 790º, nº 1 do CC).
     Para apurar os efeitos da impossibilidade da prestação torna-se, pois, necessário decidir se a causa da impossibilidade da prestação é imputável à ré devedora ou à RAEM, terceiro em relação à prestação.
     Vejamos.
     
     1.1.2 – Da imputação da causa da impossibilidade da prestação.
     Vimos já que a prestação da ré se tornou impossível depois de estabelecida por via contratual.
     As partes divergem agora sobre a imputabilidade da causa da impossibilidade da prestação da ré.
     O art. 790º do CC, sob a epígrafe “imputabilidade culposa” dispõe que “tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação”.
     Em rigor, esta situação de impossibilidade imputável da prestação não é conceitualmente incumprimento4, mas é considerada como incumprimento definitivo5.
     Tendo em conta a forma como a nossa lei sistematiza o regime jurídico da impossibilidade da prestação (por causa imputável ao devedor e por causa que não lhe é imputável, mas com presunção de imputabilidade), o melhor método é aquele que em primeiro lugar procura saber se a causa da impossibilidade é ou não é imputável ao devedor e só depois de concluir que não é imputável ao devedor é que apura se é imputável a outrem, designadamente ao credor, a terceiro ou a ninguém (caso fortuito ou de força maior).
     
     1.1.2.1 A causa da impossibilidade.
     Já vimos que a prestação da ré é impossível, seja esta prestação a celebração de um contrato definitivo de compra e venda de um imóvel, seja essa prestação a construção do referido imóvel e a sua entrega aos autores.
     Já vimos que a causa imediata da impossibilidade da prestação não é uma impossibilidade física de construir e entregar, mas jurídica, pois que a ré, tendo condições materiais para construir e entregar, não tem possibilidade jurídica por não ter direito sobre o terreno onde iria construir que lhe permita edificar o empreendimento que pretendia e que lhe permitiria cumprir a sua obrigação para com os autores.
     Porém, a ré já teve em tempos o direito que lhe permitia construir, o direito do concessionário por arrendamento, direito que caducou. Assim, a causa intermédia da impossibilidade da prestação é a caducidade da concessão que causou a impossibilidade jurídica.
     Ocorre que a concessão caducou porque a ré não concluiu a construção do seu empreendimento imobiliário em determinado prazo, o prazo de aproveitamento do terreno concessionado. Assim, a causa remota da impossibilidade jurídica da prestação é o atraso na execução das obras que levou à caducidade da concessão.
     A causa da impossibilidade jurídica da prestação da ré é, pois, o facto de as obras de aproveitamento do terreno concessionado não terem sido concluídas no prazo de aproveitamento.
     
     Interessa, pois, saber a quem é imputável esse atraso que causou a impossibilidade jurídica da prestação ao causar a caducidade da concessão que permitiria cumprir. A ré entende que o atraso não lhe é imputável porquanto fez todos os esforços para conseguir construir em prazo e evitar a caducidade da concessão, além de ter legítimas expectativas de conseguir construir mesmo depois do termo daquele prazo, por prorrogação ou renovação. E entende que o referido atraso é imputável à RAEM que “não a deixou” construir dentro do prazo de aproveitamento da concessão.
     
     1.1.2.2 A imputação da causa da impossibilidade.
     A imputação é uma operação jurídica destinada a atribuir a uma esfera jurídica os efeitos jurídicos de um facto. Normalmente, os efeitos negativos de um facto, a criação de um dever jurídico ou de uma obrigação ou a extinção de um direito ou de uma faculdade jurídica.
     Os factos jurídicos têm efeitos jurídicos, ou seja, produzem alteração no mundo dos direitos e deveres jurídicos. É necessário saber em que esfera jurídica se vão produzir esses efeitos. Este é, em modo simplista, o problema da imputação.
     
     No caso em apreço está em causa a atribuição à esfera jurídica da ré da obrigação de indemnizar os autores enquanto efeito de um facto que tornou impossível uma prestação contratual de que os autores eram credores. O facto é, como se disse, a não construção das fracções contratualmente destinadas aos autores no prazo também contratualmente estabelecido para aproveitamento do terreno onde aquelas fracções estavam projectadas. Um facto negativo: não construção em prazo de caducidade do direito de construir. O efeito daquele facto que cabe atribuir a uma esfera jurídica é, o nascimento nessa esfera jurídica da obrigação de indemnizar.
     A imputação é um juízo jurídico, um juízo normativo ou um juízo feito por referência a um critério normativo de imputação, um juízo feito por referência a uma razão normativa para justificar a atribuição a alguém dos efeitos jurídicos de um facto.
     Segundo o nosso Direito é a culpa do titular de uma esfera jurídica devedora o critério normativo de imputação a essa esfera jurídica dos efeitos que tem um facto causador da impossibilidade da prestação, designadamente os efeitos geradores do dever de indemnizar6. Com efeito, a epígrafe do referido art. 790º é “impossibilidade culposa” e o seu primeiro número determina que aquele a quem for imputada a causa da impossibilidade da prestação seja tratado (imputado) como se faltasse culposamente ao cumprimento da sua obrigação.
     
     Se a imputação é um juízo formado por referência à culpa, a culpa é também ela própria um juízo. É um juízo de censura dirigido a uma pessoa por ter praticado (por acção ou omissão) um acto ilícito em vez de ter praticado um acto lícito alternativo7. É a censura em termos de culpa que deve ser dirigida à conduta do agente que justifica que a sua esfera jurídica recolha os frutos da sua acção.
     Em matéria de responsabilidade civil, como é a que está aqui em ponderação, tal juízo de censura, dirigido a um agente por ter praticado o acto ilícito danoso em vez do acto lícito devido e possível, pressupõe que o agente tenha capacidade de culpa, isto é, tenha capacidade de entender e querer no momento em que actuou (que não seja inimputável – art. 481º do CPC). Mas pressupõe também que o agente não inimputável não respeite um dever objectivo de diligência que sobre ele impende quando actua em sociedade com possibilidade de causar danos a outrém. Esse dever de cuidado corresponde exactamente à diligência que um bom pai de família teria nas circunstâncias que o agente actuou (Art. 480º, nº 2 do CC). O agente, na tentativa de evitar o acto ilícito, não pode intencionlmente ou de forma imprudente deixar de observar o referido dever de cuidado medido pelo padrão de diligência de um bom pai de família e não pelo padrão de diligência habitual do próprio agente8. Se observar o cuidado devido e, mesmo assim, o acto ilícito ocorrer, este ilícito não lhe é imputável a título de culpa9.
     O acto ilícito em causa no caso sub judice é um ilícito contratual equiparado ao incumprimento contratual. É a impossibilidade da prestação. É a não construção em prazo. Nenhuma dúvida se colocando quanto à capacidade de culpa da ré (capacidade de entender e querer), há, pois, que averiguar se a prestação se tornou impossível porque a ré não actuou com o grau de diligência devido, aquele com que actuaria um bom pai de família nas circunstâncias em que a ré actuou.
     
     O momento a que se reporta o juízo de culpa é aquele em que o agente praticou o acto ilícito10. Cabendo aferir se no momento em que o agente actuou de modo ilícito poderia ter querido e podia ter actuado de modo lícito se, estando capaz de entender e querer, actuasse como actuaria um bom pai de família.
     No caso dos autos a actuação da ré a submeter ao crivo da actuação do bom pai de família é duradoura e não de execução imediata. Com efeito, a prestação contratual devida pela ré requeria entre três a quatro anos para que pudesse ser executada/prestada. Esse período de actuação da ré a considerar em termos de juízo de culpa começa com a celebração do contrato com a sociedade que cedeu a posição contratual aos autores (09/03/2011) e acaba no termo efectivo do prazo de aproveitamento determinante da caducidade da concessão (25 de Dezembro de 2015, depois de prorrogado de 28/02/2014). Com efeito, a impossibilidade da prestação ocorreu porque a ré não construiu após ter contraído perante a sociedade cedente da posição contratual o dever de prestar (construir e entregar) e até ao momento em que deixou definitivamente de poder construir e de poder cumprir a sua prestação por ter terminado a concessão do terreno da construção.
     Cabe, pois, aferir se no referido período temporal a ré actuou com a diligência com que actuaria um bom pai de família, uma vez que não está questionada a capacidade da ré para formar uma vontade livre e esclarecida.
     
     A culpa da ré determinada pelo grau de diligência de um bom pai de família perspectivada nos termos de “actio libera in causa” negligente.
     Dispõe o art. 481º, nº 1 do CC que “não responde pelas consequências do facto danoso quem, no momento em que o facto ocorreu, estava, por qualquer causa, incapacitado de entender ou querer, salvo se o agente se colocou culposamente nesse estado, sendo este transitório”.
     Esta disposição legal revela que o juízo de culpa em matérias de responsabilidade civil pode ser fundado em comportamento do agente praticado em momento anterior à prática do acto ilícito causador dos danos a indemnizar, desde que o agente não seja suscetível de censura no momento da prática desse acto mas seja susceptível dessa mesma censura no momento anterior em que foi originada a causa que impede o juízo de censura no momento da prática do acto danoso. Ou seja, pelo critério do “bonus pater famílias” o agente não está “livre” e censurável no momento da prática do acto ilícito, mas colocou-se nessa situação intencionalmente ou por imprudência, estando “livre” e censurável no momento em que ocorre a “causa” da circunstância que lhe exclui a culpa.
     O caso que deu origem a este avanço da ciência do Direito provém do Direito criminal e terá sido o caso de um funcionário dos caminhos de ferro que se embriagou e estava inconsciente no momento em que tinha de “mudar as linhas” para que dois comboios seguissem orientações diferentes e, nada tendo feito, ocorreu uma colisão entre dois comboios num momento em que o funcionário estava incapaz de culpa por estar incapaz de entender e querer o comportamento lícito alternativo ao comportamento ilícito que praticara em estado de inconsciência.
     A acção de não mudar as linhas dos comboios não era censurável ao funcionário por não ser em si própria uma acção livre por falta de capacidade para entender e querer no estado de embriaguez completa. Porém a sua causa foi livre, pois que o funcionário se embriagou de forma intencional para não ser censurado ou de forma apenas imprudente ou negligente. A acção não livre era, afinal, livre na sua causa e, por isso, ainda susceptível de ser dirigido ao seu autor um juízo de censura em termos de culpa por não ter optado pela acção lícita alternativa. O funcionário não era “livre” no momento da colisão dos comboios, mas era “livre” de não se embebedar quando, com possibilidade de prever que a colisão iria ocorrer, se embebedou - a “actio libera in causa”.
     O funcionário devia ser censurado “in causa” ou na origem da causa da desculpação da sua acção de não “mudar as linhas” como era seu dever11.
     
     Vejamos em que medida a “ideia” da actio libera in causa pode auxiliar na decisão do presente caso, ou seja, na decisão de dirigir ou não dirigir à ré um juízo de censura em termos de culpa por a sua prestação se ter tornado impossível em vez de ter sido prestada antes de, por esgotamento do prazo de aproveitamento da concessão, ocorrer a impossibilidade de construir.
     Trata-se da culpa pela causa da impossibilidade, presumindo-se em relação ao devedor e cabendo a este provar que a impossibilidade sobreveio apesar de ter feito o esforço exigível para que não sobreviesse, um esforço cuja medida de exigibilidade é determinada pelo esforço que faria um bom pai de família colocado na situação do devedor no momento da causa da acção livre (actio libera in causa), o momento da celebração do contrato com o credor, e não no momento em que a prestação se tornou impossível (causa da impossibilidade – caducidade da concessão e três a quatro anos imediatamente anteriores).
     
     A ré diz que não conseguiu construir em tempo a fracção autónomaa que devia entregar aos autores porque a RAEM não lhe permitiu ao colocar-lhe entraves ilegais que impediram a construção atempada.
     Por outro lado, a ré diz ainda que a RAEM lhe criou expectativas que lhe permitiria construir mesmo para lá do fim do prazo de aproveitamento da concessão, quer não fazendo terminar a concessão, quer atribuindo-lhe uma nova concessão.
     A actuação de terceiro que a ré invoca para não lhe ser imputada a título de culpa (censura) a superveniência da impossibilidade da prestação tem de ser avaliada a dois níveis. A criação de entraves ilegais respeita à possibilidade de actuação da ré e a criação de expectativas que se vieram a frustrar respeita à liberdade de decisão, designadamente à vontade não esclarecida porque formada em erro relativo às expectativas.
     
     Digam-se desde já três coisas sobre a relevância exculpante da alegada actuação da RAEM materializada em factos objectivamente impossibilitantes (entraves) e em factos subjectivamente desculpantes (expectativas):
     Relativamente à criação de entraves:
     - Não estamos em sede do chamado “facto do príncipe”12 em que um terceiro estranho à relação contratual impede a prestação por força do seu poder de autoridade pública que o devedor não pode ultrapassar. De acordo com a alegação da ré, no caso em apreço a RAEM actuou apenas como parte num contrato de concessão por arrendamento e, por vezes, não o cumpriu e criou entraves. É certo que a ré não teria ao seu dispor meio fácil, ágil e atempado de compelir a RAEM a cumprir a cooperação contratual que alegadamente não cumpriu. Porém, para efeitos de análise, mesmo apesar das reconhecidas dificuldades da ré, ainda não se justifica qualificar a actuação da RAEM como “facto do príncipe”, o qual, por ser inultrapassável ou só ultrapassável por meios inexigíveis, torna a impossibilidade superveniente da prestação não imputável ao devedor;
     - Relevam apenas para exclusão da culpa da ré os entraves criados pela actuação da RAEM (alegadamente causadora da impossibilidade da prestação) que ocorreram depois de a ré ter celebrado o contrato com o cedente da posição contratual que os autores adquiriram (9/3/2011), pois que antes disso não havia qualquer prestação devida pela ré que a RAEM pudesse impossibilitar de cumprir. Não releva, pois, a sugestão/exigência da RAEM para a ré fazer alterações ao projecto de arquitectura, designadamente aumentando o afastamento entre torres, uma vez que tudo ocorreu antes da celebração dos contratos e era do conhecimento da ré. De facto, não existindo ainda dever de prestar, não poderia o mesmo dever ficar impossibilitado de ser cumprido.
     
     Relativamente às expectativas:
     - Também em termos de actio libera in causa relevam apenas para exclusão da culpa da ré as expectativas alegadamente criadas pela RAEM antes de a ré ter celebrado o contrato com os autores, pois que depois disso não foi assumida qualquer prestação pela ré que pudesse ser fundada em expectativas de poder cumprir. Não releva, pois, a prorrogação do prazo de aproveitamento e a emissão de licença de obras, uma vez que não contribuíram com expectativas para a decisão da ré de contrair o dever de prestar (construir e entregar) que já havia contraído. De facto, já existindo dever de prestar, não poderia o mesmo ter sido contraído com base em expectativas criadas posteriormente, pelo que a frustração de tais expectativas por acto de terceiro não pode desculpar “in causa”.
     
     Vejamos então se deve ser dirigido à ré um juízo de culpa semelhante ao que é dirigido ao agente nos casos de “actio libera in causa”.
     
     Se a imputação da impossibilidade se faz pelo juízo de culpa e se esta pode ser aferida “in causa” ou na origem da impossibilidade e não no tempo em que ocorre a impossibilidade, tratar-se-á de impossibilidade da prestação por causa imputável “in causa” ao devedor. Trata-se afinal de imputação da “causa que causou a causa” da impossibilidade.
     
     A prestação a cargo da ré tornou-se impossível contra a vontade e os esforços da mesma ré. Mas no momento em que a prestação foi acordada seria já previsível (a um bom pai de família, que é medianamente previdente e prudente) que era consistente a probabilidade de não ser possível a construção no prazo de aproveitamento? E se fosse previsível, como procederia um bom pai de família? Contrataria, arriscando que a impossibilidade não ocorreria? Contrataria apenas depois de esclarecer a outra parte contratual da probabilidade de não ser possível a construção no prazo de aproveitamento? Ou não contrataria? Se contratasse pura e simplesmente, a ré não deve ser censurada em termos de culpa. Se o bom pai de família não contratasse ou só contratasse depois de esclarecer a contraparte e de obter a adesão desta, então a ré deve ser censurada “in causa” por a prestação se ter tornado impossível mais tarde como já era ponderável e devia ser ponderado no momento em que o dever de prestar foi criado13.
     
     A ré invoca um acto de terceiro como causador da impossibilidade da prestação. Porém, para a ré ficar imune ao juízo de culpa “in causa” é necessário que o acto de terceiro, além de inevitável como o “facto do príncipe” e o caso de força maior, se apresentasse como imprevisível (como o caso fortuito) ou improvável a uma pessoa que, no momento da criação do dever de prestar, actuasse com a diligência média com que actuaria o “bonus pater familias”. Não releva, pois, para a questão da culpa da ré aqui em apreço, saber se a actuação da RAEM é ela própria ilícita e culposa ou contrária à lei e censurável, relevando apenas saber se é inevitável e imprevisível.
     
     Há que valorar a conduta da ré em termos de censura por observância ou inobservância voluntária e livre dos deveres de cuidado que se impunham a um bom pai de família medianamente previdente e diligente na situação em que a ré contratou e no momento em que contratou.
     Tal operação tem de ser feita sem nunca perder de vista que se presume a culpa da ré por ter ocorrido impossibilidade superveniente da prestação a seu cargo e que tal presunção impõe à ré o ónus de prova (e de alegação) de factos com eficácia desculpante (arts. 790º, nº 1 e 788º, nº 1 do CC).
     
     O “bom pai de família” comerciante/empresário.
     O grau de diligência devido que determinará se o grau de diligência observado pela ré é ou não susceptível de censura é aquele que observaria um bom pai de família nas circunstâncias em que a ré actuou. Cabe aferir se a ré se desviou, in causa, da actuação que teria no seu lugar o bom pai de família.
     A ré é uma sociedade comercial, um agente económico que, num ambiente jurídico-comercial de incentivo à livre iniciativa com vista ao progresso económico e social se propõe desenvolver uma actividade económica lucrativa que pressupõe correr riscos comerciais os quais serão, afinal, a justificação jusfilosófica do lucro (ou uma das justificações possíveis).
     Se correr riscos é inerente à actividade comercial exercida em concorrência, o exercício da concorrência, que se quer livre, quere-se também leal ou seja, conforme aos usos honestos da actividade económica, designadamente sem enganos por acção ou omissão (arts. 158º e 160º do Código Comercial). O bom pai de família empresário é aquele que pauta a sua actuação comercial de acordo com os usos honestos da sua actividade comercial, os quais não lhe impõem que revele os seus segredos comerciais nem o impedem de ser hábil na luta pela clientela, mas que o impedem de omitir outras indicações relevantes do seu comércio e de ser astucioso.
     No caso dos autos, a ré quando contratou desenvolveu a sua actividade comercial propondo-se construir e vender. Na ordem jurídica da RAEM não é, em abstracto, censurável pelo padrão do bom pai de família comerciante que a ré tenha arriscado construir e que, mediante um preço, se tenha obrigado a construir e a entregar.
     Porém, a ré trouxe os autores para a sua esfera de risco ou para a sua esfera de organização comercial onde se inseria a RAEM na qualidade de concedente e de entidade administrativa competente em matéria urbanística e ambiental.
     Não parece haver dúvidas que o dever de cuidado que observaria um bom pai de família aumenta quando não arrisca sozinho mas insere na sua esfera de risco e de organização o credor sem que este tenha qualquer poder de controlar ou interferir nesse risco e nessa organização exclusivas do círculo de actividade comercial do devedor. Retenha-se que a ré se “queixa” que já antes de ter celebrado o contrato com o “cedente” a RAEM lhe vinha dificultando indevidamente a conclusão do empreendimento ao exigir alterações ao projecto de arquitectura e estudos de impacto ambiental, não se sabendo por que razão seria de esperar que a atitude adversa da RAEM mudasse depois da celebração do contrato entre a ré e os autores14.
     A censura do devedor pela impossibilidade da prestação fundada na aceitação imprudente do risco de obtenção/construção de coisa futura aumenta se o devedor “leva” o credor para esse risco em condições que o bonus pater familias não levaria.
     E aumenta ainda mais se o devedor não adverte o credor dos riscos organizacionais ou outros em que o insere, cabendo ao devedor demonstrar que advertiu se quiser ilidir a presunção de culpa que sobre si impende. Na verdade, “quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé…” – art. 219º, nº 1 do CC15.
     O contraente que se compromete a prestar no futuro compromete-se ao mesmo tempo a remover os obstáculos ao cumprimento que previsivelmente se lhe deparem e a disponibilizar o esforço previsivelmente necessário à remoção. Assim, em caso de impossibilidade de remoção do obstáculo ao cumprimento, o insucesso do devedor é-lhe, em princípio, censurável se quando contratou calculou mal as suas forças para remover os obstáculos previsíveis, se previu mal esses obstáculos que eram previsíveis ou se calculou bem forças e obstáculos previsíveis e se conformou com a insuficiência de forças para remover os obstáculos. São a imprudência, a imprevidência, a intenção e a consciência os locais onde se pode ancorar a censura.
     
     Mas vejamos mais de perto nos factos provados quais as circunstâncias em que a ré arriscou.
     O contrato que criou à ré o dever de prestar foi celebrado em (9/3/2011), e a ré necessitava de um período de três a quatro anos para construir e entregar as fracções autónomas acordadas (pontos 8. e 105. dos factos provados). Na referida data era expectável que o prazo de aproveitamento terminaria em 28/02/2014 se não viesse mais tarde, como veio, a ser prorrogado. Não disporia, pois, a ré de “três a quatro anos” para construir desde a celebração dos contratos até ao termo do prazo de aproveitamento não prorrogado ainda. Na data dos contratos a ré não tinha ainda licença administrativa para iniciar as obras e estava advertida que só lhe seria emitida depois de apresentar relatórios de circulação de ar e de estudo de impacto ambiental que fossem aprovados. Na mesma data da celebração do contrato a ré não tinha ainda obtido aprovação do referido relatório de impacto ambiental, o qual apresentou pela primeira vez em 11 de Maio de 2011.
     Por outro lado, não se provaram factos onde se possa concluir que a ré tinha razões para estar segura que, contrariamente ao que aconteceu, o prazo de aproveitamento e o prazo de concessão seriam prorrogados nem que lhe seria atribuída nova concessão do mesmo terreno com um grau de segurança que permitiria a um bom pai de família (determinado a cumprir os seus compromissos) vincular-se contratualmente perante terceiros sem os esclarecer que para cumprir o seu vínculo precisava que as suas expectativas se concretizassem. Provou-se apenas que a ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou a renovação de concessão para a data posterior de 24/12/2015. Ora, a ré até poderia confiar e ter expectativas, mas não suficientemente seguras ao ponto de levarem o “bom pai de família” (empresário que segue os usos honestos da sua actividade económica) a contratar como a ré contratou contraindo com firmeza e solenidade contratual escrita a obrigação de construir que apenas tinha expectativas de conseguir. Com efeito, as expectativas são isso mesmo: confiança que aconteça o que pode não acontecer. A ré vinculou-se com base em expectativas sem as repercutir nos termos do acordo sob a forma de cláusulas condicionais. Tinha apenas expectativas e vinculou-se sob a forma de certezas, comprometendo-se sem condições. Transformou as expectativas em certezas. Não espelhou as expectativas no contrato porquanto neste se vinculou sem mais. O contrato não revela com transparência a situação de mera expectativa em que a ré se encontrava. Por certo, a actuação com transparência neste caso corresponde ao conceito de bom pai de família. Na situação do caso em apreço, a divergência entre a forma como a ré se vinculou e a situação de exectativas em que se encontrava, ainda que possa ser cuidadosa e competente em termos de marketing e de influência no comportamento do mercado, excede o dolus bonus e o padrão de actuação do bom pai de família comerciante de usos honestos da sua actividade económica.
     Perante esta factualidade, um bom pai de família comerciante e empresário comercial empreendedor que estivesse determinado a prosseguir a sua actividade comercial contrataria sem a avisar das vicissitudes referidas? Relembre-se antes de responder que é à ré que cabe alegar e provar que esclareceu os “compradores” (ou que isso era desnecessário por já estarem esclarecidos) antes de os inserir na sua esfera de organização e de risco empresarial e que cabe alegar e provar que tinha razões para confiar na extensão do prazo de aproveitamento ou da concessão.
     Afigura-se que, em face do elevado risco advindo da escassez de prazo para construir e da “lenta e exigente” relação com os serviços competentes da RAEM, um bom pai de família empresário, empreendedor, prudente e atento aos interesses legítimos dos demais agentes económicos não celebraria o contrato que a ré celebrou sem o conhecimento efectivo e a aceitação por parte do outro contraente do risco de impossibilidade da prestação que veio a concretizar-se.
     A contratação que a ré fez nestas circunstâncias de escassez de tempo e num contexto de anterior “relacionamento lento e exigente” com a RAEM configura em si mesmo uma violação por parte da ré do dever objectivo de cuidado quanto aos usos honestos e transparentes da actividade económica, violação que se projectou “in causa” naquilo que mais tarde viria a ser a causa efectiva da impossibilidade da prestação16. Portanto, mesmo que a ré tenha sido diligente com vista a conseguir construir, não foi cuidadosa como seria no seu lugar um bom pai de família, mas foi temerária, ao contratar inserindo sem advertência o “cedente” na sua esfera de risco, do risco de não conseguir construir atempadamente, risco que era claramente visível a um bom pai de família.
     A censura a dirigir à ré não deriva do facto de ter empreendido e corrido risco empresarial, mas deriva, pois, do facto de ter colocado os seus contrapartes no risco da própria ré quando esse risco já era antecipável a um bom pai de família, que é medianamente previdente, e quando este pai de família, caso pretendesse arriscar, arriscaria sozinho sem ampliar a sua esfera de risco a terceiros sem os esclarecer ou então esclareceria esse mesmo risco, o que se presume que a ré não fez.
     A censura que a ordem jurídica dirige à actuação da ré por ter ocorrido a impossibilidade da prestação é uma censura “in causa”.
     A ré contratou sem observar os cuidados que, no seu lugar, observaria o bom pai de família para evitar que ocorresse de surpresa para a outra parte contratante a impossibilidade da prestação que a própria ré criava por via contratual, pelo que não actuou com o cuidado objectivamente devido, sendo negligente a sua actuação, uma das formas de culpa cível em matéria de responsabilidade civil.
     À ré pode ser dirigido um juízo de censura em termos de culpa pela expansão temerária e unilateral da sua esfera de risco. Não é de risco que se trata, mas de culpa pela expansão do risco.
     Em termos puramente de risco que a ré não comunicou ao “cedente”, se a ré tivesse conseguido construir receberia os lucros que houvesse sem ter de os repartir com com o cedente e, como não conseguiu construir, recebe os prejuízos que haja, também sem ter de os repartir.
     A ré diz que tudo fez para conseguir construir e que, por isso, não merece censura por não ter conseguido construir atempadamente e assim evitar a caducidade da concessão que provocou, afinal, a sua impossibilidade jurídica de construir. Porém, não é na falta de esforço para construir que deve fundar-se o juízo de culpa quanto à impossibilidade da prestação. O juízo de culpa deve antecipar-se “in causa” e aí, conclui-se que a ré, sem esclarecer claramente o “cedente”, nem deveria ter criado o dever de prestar e, assim, teria evitado a impossibilidade de o cumprir que veio a verificar-se, como era antecipável a quem actuasse com mediana prudência e cuidado para não causar danos a terceiros decorrentes da impossibilidade de cumprir a obrigação de construir e entregar fracções autónomas de prédio urbano.
     
     Em conclusão, a impossibilidade da prestação devida pela ré é imputável à devedora (ré) a título de culpa (negligência ou inobservância do cuidado devido) porquanto essa impossibilidade era previsível a um comerciante medianamente prudente no momento em que o dever de prestar foi assumido pela ré e essa previsibilidade levaria aquele comerciante a não contratar da forma empresarial arrojada como a ré contratou ou a fazê-lo apenas depois de obter a adesão ao seu risco empresarial.
     
 2 – Da resolução contratual.
     No que respeita ao direito à resolução do contrato e às suas consequências de restituição retroactiva do que foi prestado, não se vê como negar. É a lei evidente (arts. 790º, nº 2, 426º a 4**º e 282º do CC) e nem as partes questionam.
     Procede, pois, esta pretensão dos autores e deve ser declarado resolvido o contrato, como peticionado.
     
     3 – Da indemnização dos danos decorrentes da impossibilidade superveniente da prestação por causa imputável ao devedor.
     3.1 Da existência de obrigação de indemnizar.
     Estando decidido que houve incumprimento culposo da ré, rectius, impossibilidade da prestação por causa imputável à ré, basta que haja danos na esfera jurídica dos autores com nexo de causalidade com o referido incumprimento para que surja na esfera jurídica da ré a obrigação de indemnizar (arts. 787º, 790º e 557º do CC).
     Tendo-se provado que os autores pagaram ao cedente para receber da ré um imóvel e que nada receberam, é forçoso concluir que sofreram danos decorrentes do incumprimento da ré, pois que pagaram para adquirir e nada adquiriram.
     Assim, não são necessárias outras considerações para se concluir que existe na esfera jurídica da ré a obrigação de indemnizar os autores, sendo a controvérsia essencialmente respeitante ao valor da indemnização. E esta conclusão é afirmada sem necessidade de discussão sobre a existência de sinal penitencial, aquele sinal acordado pelas partes como “preço do arrependimento”, o qual torna lícita a desvinculação unilateral do normal dever de cumprimento do contrato.
     
     3.2 Do montante da indemnização
     Os autores pretendem ser indemnizados pelo seu alegado dano efectivo, que alegadamente é superior ao dobro do sinal prestado, totalizando o valor de MOP7.638.434,18.
     Por seu lado, a ré entende que a sua culpa, caso se conclua que existe, é diminuta e, havendo lugar a indemnização, esta deve ser fixada, por razões de equidade, em montante inferior ao “sinal” prestado.
     
     O princípio geral em matéria de responsabilidade civil é que devem ser indemnizados todos os prejuízos efectivamente sofridos pelo credor em consequência do incumprimento do devedor (arts. 787º - “prejuízo que causa ao credor”, 556º - “reconstituir a situação que existiria” e 557º - “danos que o lesado … não teria se não fosse a lesão” - do CC.).
     
     No entanto, se for constituído sinal é o valor deste que, em princípio, determina o valor da indemnização, o valor que terá a obrigação de indemnizar originada pelo incumprimento culposo. É o que dispõe o art. 436º do CC.
     É, pois, necessário apurar se foi constituído sinal, entendendo os autores que foi e a ré que não foi.
     
     3.2.1 Da existência de sinal
     Da qualificação do contrato.
     Como antes se referiu, os autores entendem que o contrato em discussão nos presentes autos deve ser qualificado como contrato-promessa, ao passo que a ré entende que deve ser qualificado como contrato atípico.
     A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC).
     A qualificação dos contratos pertence à lei e não às partes17. É uma operação muito relevante, pois vai determinar o regime jurídico aplicável à relação contratual18. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CC).
     Pois bem, a qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular19. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais, podendo concluir-se que o contrato concreto se reconduz a um tipo, a nenhum ou a mais que um, sendo neste caso um contrato misto ou uma união de contratos.
     A nosso ver, deve atender-se de forma mais relevante às prestações características acordadas pelos contraentes, quer para qualificar o contrato, quer para se lhe determinar o regime quando se conclua que o contrato celebrado se trata de um contrato misto por agregar elementos de mais do que um tipo contratual20.
     Faltando no contrato celebrado um elemento essencial de um contrato tipificado na lei, o acordo das parte não pode qualificar-se segundo tal tipo contratual.
     Pois bem, então afinal a operação de qualificação do contrato redunda em duas operações: saber que prestação característica quiseram as partes e, depois, subsumi-la à prestação característica de um tipo contratual, de mais que um ou de nenhum.
     
     Vejamos então nos factos provados se, nas prestações concretamente acordadas pelas partes que ali constam, o seu acordo pode ou não ser qualificado como contrato-promessa.
     A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CC).
     Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Porém, os factos provados remetem para o texto do acordo em análise. Desse texto constam expressões cujo significado aponta quer no sentido de as partes acordarem celebrar no futuro novo contrato (de compra e venda), quer no sentido de acordarem apenas formalizar no futuro um acordo já concluído. Com efeito, ora denominam o contrato de “contrato-promessa de compra e venda” e falam em prometer vender, “prometer comprar e “prometida venda” e denominam-se “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”; ora falam em recuperação e revenda da fracção pela ré e alienação da fração pelo promitente-comprador antes da celebração da escritura pública de compra e venda (cláusulas 5ª e 9º).
     Pois bem, nesta situação em que se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis, como referido, a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 2**º do CC).
     Ora, parece-nos decisivo o teor das cláusulas 9º a 22ª para saber o sentido que o normal declaratário atribuiria ao teor da declaração que as partes plasmaram no documento a que se reporta a alínea c) dos factos provados: - se lhe atribuiria o sentido de estar já concluído o acordo definitivo ou se lhe atribuiria o sentido de ainda haver algo para acordar no futuro.
     Na referida cláusula 22ª refere-se que a ré pode fazer alterações de construção sem que a outra parte contratual possa recusar a “transacção”, o que aponta no sentido de haver ainda acordo a fazer no futuro que as partes denominaram “transacção” e que não podia ser recusado com determinado fundamento.
     A cláusula 9ª aponta também para que as partes quisessem ainda novo contrato. Com efeito, estabeleceram condições onerosas para a cessão da posição contratual. Ora, se as partes já considerassem a propriedade da fracção na esfera jurídica do “comprador”, porque considerariam que este não era dono integral e não podia transferir para terceiro sem o consentimento da ré e sem a remunerar?
     Este “mecanismo” de cessão da posição contratual aponta no sentido de que, no entendimento das partes contratantes, a ré não se desligou da prestação característica do contrato-promessa que é celebrar outro contrato e que, por isso, receberá comissão para celebrar esse novo e futuro contrato com terceiro, não se tratando apenas de uma modificação subjectiva do mesmo contrato. Se na vontade real dos contraentes a ré já nada tivesse a ver com a fracção autónoma em causa nem com a prestação característica do contrato promessa, a comissão que tem direito a receber por consentir na cessão da posição contratual seria incompreensível na economia do contrato. De facto, as partes não estabeleceram a necessidade de consentimento e de pagamento de comissão para as vendas posteriores à celebração da escritura pública de compra e venda, o que aponta para que, no espírito dos contraentes, a situação negocial é diferente antes e depois da escritura, porque a fracção está em esferas jurídicas diferentes nesses dois momentos.
     Se as partes considerassem que celebraram um contrato de compra e venda de bem futuro não era necessário regular a cessão da posição contratual que regularam. O comprador de bem futuro pode vender a coisa como pode o comprador de bem já existente. O proprietário que adquiriu por contrato não transmite a sua posição contratual quando vende. Não transmite um crédito, mas transmite um direito real, ainda que futuro, ainda que suspenso. Se as partes sentissem que a fracção autónoma já pertencia aos “promitentes- compradores” em termos de direito real futuro, não colocariam qualquer entrave a que estes vendessem, também como bem futuro. A justificação que a ré dá (conhecer a quem deveria entregar a fracção e evitar actividades fraudulentas em relação a terceiros) não basta na perspectiva do normal declaratário para o pesado e caro/lucrativo mecanismo contratual estabelecido no caso de o “promitente-comprador” já se sentir proprietário, apesar de ter suspensa a aquisição do direito de propriedade. Até porque a ré estava totalmente garantida face à falta de pagamento, pois faria suas as quantias que já lhe haviam sido pagas (cláusula 5ª do contrato em análise).
     Se a ré vendeu bem futuro, como defende, a sua contraparte contratual também poderia fazer o mesmo e vender o seu bem futuro sem necessidade de “autorização” da ré. A ré também não pediu autorização a ninguém para vender um bem futuro de que seria proprietária quando o construísse. Porque necessitavam os “promitentes-compradores” de “autorização” se eram tão proprietários futuros como a ré? É esta falta de explicação para a desconsideração da qualidade jurídica real dos “promitentes-compradores” face a bens futuros que tem de levar o declaratário normal a concluir que, afinal, os contraentes consideraram que os “promitentes-compradores” apenas tinham direito de crédito e poderiam ceder a posição contratual do contrato gerador desse direito de crédito, mas não podiam vender bens futuros porque estes bens eram alheios, porque eram da ré. Ao regularem a cessão da posição contratual, deixam entender que consideraram que a posição do cedente e dos autores que podia ser cedida era uma posição creditícia e não uma posição real, ainda que correspondente ao que pode designar-se na linguagem comum por “pequeno proprietário”. Isto é, as partes contratantes deixaram entender que os “promitentes-compradores” tinham um direito de crédito, um direito ao cumprimento de uma promessa de contratar, e não um direito real, ainda que futuro e em suspensão. Ao regularem a cessão de um crédito (posição contratual) as partes deixam entender ao declaratário normal que consideravam que os autores não tinham ainda um direito real sobre coisa futura. Deixam entender que os autores não podem transmitir a coisa futura (o seu direito real sobre ela), mas apenas podem transmitir a promessa da ré (um direito sobre a ré e não um direito sobre a coisa futura).
     
     É esta engrenagem negocial aliada à denominação que as partes deram ao contrato que celebraram que deve levar o “normal declaratário” a considerar que a prestação característica que a ré assumiu foi celebrar um contrato no futuro com o promitente originário ou com aquele a quem fosse cedida a posição contratual de promitente-comprador.
     Em conclusão, dir-se-á que o sentido com que deve valer juridicamente a declaração negocial quanto às prestações acordadas só é reconduzível ao tipo contratual de contrato-promessa.
     
     Da convenção de sinal.
     O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico21. Numa certa perspectiva, é, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial.
     Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes.
     Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes22.
     Se os autores pretendem ser indemnizados segundo o regime do sinal, cabe-lhes, nos termos do art. 335º, nº 1 do CC, alegar e provar, entre o mais, os factos demonstrativos de ter sido estipulada a existência de sinal.
     Porém, no caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CC que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
     Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CC). No caso dos autos, provou-se que o “cedente” entregou à ré, promitente-vendedora, determinada quantia em dinheiro no âmbito do contrato promessa que celebraram. Provou-se o facto base da presunção, pelo que está presumido que as partes quiseram atribuir carácter de sinal. Cabe, pois à ré, interessada em ilidir a presunção, a alegação e a prova do facto contrário ao facto presumido, isto é, cabe-lhe provar que as partes acordaram que a quantia entregue não tinha carácter de sinal. A ré não conseguiu fazer a prova dessa vontade negocial contrária à presunção legal. Tem a ré de ver esta questão decidida em sentido contrário à sua pretensão. Com efeito, a ré logrou apenas provar que o contrato que celebrou refere a palavra preço, não constituindo tal facto “prova do contrário” do facto presumido. Isto é, não é prova de que as partes não quiseram atribuir carácter de sinal.
     Mas dir-se-á ainda que do contrato-promessa sub judice resulta que as partes quiseram que as quantias pagas pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor sejam consideradas sinal. Com efeito, na cláusula 5ª do contrato referido diz-se que a falta de pagamento das prestações do preço acordado implica a perda da quantia já paga. Trata-se do regime supletivo do sinal, pelo que parece clara a vontade das partes no sentido de terem pretendido constituir sinal.
     Mas, em caso de dúvida sobre o sentido que atribuiria o “declaratário normal”, deve, para se apurar o sentido com que a vontade declarada das partes deve valer, ponderar-se a medida em que o princípio do equilíbrio das prestações intervém na fixação do valor da vontade negocial declarada quando se desconhece a vontade real.
     Se é certo que não é determinante para qualificar o acordo das partes o facto de as partes terem denominado como contrato-promessa aquele acordo que celebraram, é igualmente certo que não é determinante para fixar o sentido com que deve valer a declaração negocial o facto de terem denominado de depósito a quantia monetária entregue pelos autores à ré em cumprimento do acordo que celebraram.
     Se a vontade real dos contraentes é conhecida pelo declaratário, é ela que deve vincular os declarantes (nº 2 do art. 2**º do CC). Se essa vontade real não é conhecida, é a vontade declarada que vai determinar quais os vínculos contratuais que as partes devem cumprir. Para saber em que sentido a vontade declarada vincula é necessário interpretá-la, ou seja, avaliá-la intelectivamente para lhe apreender o sentido vinculador.
     Há, pois, que atender ao princípio do equilíbrio das prestações, o qual diz que, em caso de dúvida, o sentido da declaração é o mais equilibrado nos negócios onerosos, como é o dos autos.
     Ora, se em caso de incumprimento do cedente a ré é indemnizada em “1.260.000,00”, qual será a vontade negocial que deve valer em caso de incumprimento da ré? Deve pagar apenas se se enriqueceu e só na medida do seu enriquecimento? Ou deve também ter uma pena e pagar o mesmo que o cedente ou outra quantia, mas uma pena? Parece que o princípio do equilíbrio das prestações impõe que, em caso de dúvida, se conclua que as partes estabeleceram penas para ambas e que quiseram que a quantia entregue pelos autores fosse a medida da pena de ambas em caso de incumprimento definitivo.
     As partes não estipularam que em caso de incumprimento do cedente a ré podia recorrer à acção de execução específica, nem à acção de condenação, nem à resolução do contrato com restituição do que foi prestado e indemnização dos danos efectivos. Estipularam o regime do sinal segundo o qual, em caso de incumprimento daquele que o prestou, aquele que o recebeu fica com ele para si sem direito a outra indemnização excepto se sofrer danos manifestamente superiores.
     Na dúvida, o princípio do equilíbrio das prestações “manda” que se atribua valor à declaração negocial das partes no sentido de ter sido estipulado sinal.
     
     Assim, mesmo que não se qualifique o contrato como contrato-promessa, há-de a quantia entregue ser qualificada de sinal de acordo com o sentido com que deve valer juridicamente a declaração negocial das partes.
     
     Portanto, mesmo sem a presunção legal referida, sempre a vontade das partes deve ser interpretada no sentido de terem convencionado sinal.
     
     Conclui-se, pois, que foi acordado sinal no caso em apreço.
     
     O montante da indemnização predeterminado pelo valor do sinal, a sua ampliação para o valor do dano efectivo que excede o valor do sinal ou a sua redução por juízos de equidade.
      “Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado” (art. 436º, nº 2 do CC).
     Está demonstrado que a ré não cumpriu definitivamente a sua promessa de venda.
     Está também demonstrado que a ré recebeu sinal.
     Foi já decidido atrás que a causa do incumprimento não é imputável a terceiro e que é imputável à ré a título de culpa. E também já atrás foi decidido que o incumprimento culposo da ré confere aos autores o direito de resolver o contrato-promessa.
     Deve, pois a ré restituir o que recebeu para cumprir a promessa de venda que não cumpriu (HKD1.260.000,00, equivalentes MOP1.297.800,00), uma vez que, como efeito da resolução do contrato, sempre terá que devolver o que lhe foi prestado (arts. 282º e 427º do CC). Mas terá ainda de pagar aos autores um montante igual ao do sinal que recebeu, um montante superior ou um montante inferior?
     Vejamos.
     Dispõe o nº 4 do art. 436º do CC que “na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
     E dispõe o art. 801º, nº 1 do CC, aplicável por força do disposto no nº 5 do art. 436º do mesmo CC, que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”.
     
     Portanto, o valor da indemnização por incumprimento do contrato, rectius, por impossibilidade culposa da prestação, deve, em princípio, corresponder ao valor do sinal prestado. Porém, o referido valor da indemnização pode ser:
     - Aumentado para o valor do dano efectivamente sofrido pelo credor se este dano for consideravelmente superior ao valor do sinal23;
     - Reduzido para montante equitativo não inferior ao valor do dano efectivo se a penalização resultante do sinal for manifestamente excessiva em relação ao mesmo dano efectivo24.
     
     O ónus da prova.
     O legislador ao permitir às partes fixarem por convenção as consequências do incumprimento acabou por criar uma distribuição do ónus da prova em que só tem que provar o dano relevante o contraente que pretende que a indemnização por incumprimento se fixe em valor diferente do predeterminado. Assim, o credor que pretende que o valor da indemnização seja superior ao predeterminado tem de provar que sofreu um dano consideravelmente superior ao sinal. Por sua vez, o devedor que pretende que a indemnização seja de valor inferior ao predeterminado tem que demonstrar que a pena é manifestamente excessiva em relação ao dano.
     No presente caso, cabe à ré alegar e provar os factos de onde se possa concluir que o valor do sinal é manifestamente excessivo para ressarcir o dano efectivo dos autores e para sancionar a culpa pelo incumprimento.
     A ré alegou e provou que se esforçou por cumprir e que os autores vão receber uma fracção autónoma de um imóvel idêntica à que a ré lhe entregaria e por preço também idêntico.
     
     Da redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado.
     “A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…” (art. 801º, nº 1 do CC).
     Os autores estão há cerca de 10 anos privados do imóvel que pretendiam adquirir e continuarão privados por mais algum tempo, que se desconhece. Tal privação de uso impediu que nele morassem, que o arrendassem, que o cedessem gratuitamente, etc. A indemnização correspondente ao sinal (HKD1.260.000,00, equivalentes MOP1.297.800,00) não pode, a qualquer luz, considerar-se manifestamente superior ao dano da privação do uso e da disponibilidade.
     Não procede, pois, a pretensão da ré de ver reduzido por juízos de equidade o valor da indemnização determinado pelo valor do sinal.
     
     Da indemnização do dano efectivo, denominado dano excedente.
     Por regra, o montante da obrigação de indemnizar em consequência de incumprimento contratual deve corresponder ao valor do dano efectivo, ou seja, o dano ocorrido que tem nexo de causalidade com o incumprimento (arts. 556º a 558º do CC). Se, porém, as partes estipularem sinal, a indemnização só deve corresponder ao dano efectivo se assim for convencionado, situação que aqui não releva, ou se esse dano efectivo for consideravelmente superior ao valor do sinal (art. 436º, nº 4 do CC).
     Os autores alegaram ter tido um dano de MOP7.638.434,18 decorrente do incumprimento e adveniente do preço que pagaram e das despesas que suportaram para adquirir a sua posição contratual no contrato incumprido, e da privação do aumento do valor de mercado do imóvel que pretendiam adquirir.
     Mais detalhadamente, os autores pretendem ser indemnizados pelos seguintes danos:
     1- Preço que pagaram para adquirir a posição contratual (MOP5.417.800,00).
     2- Despesas com formalização do contrato de cessão da posição contratual e com pagamento do imposto do selo (400,00 + 43.260,00 + 203.049,00 = MOP246.709,00).
     3- Privação da valorização do imóvel ou diferença do valor de mercado do imóvel entre o preço que os autores adquiriram a posição contratual de promitentes compradores e o valor actual do imóvel (10.419.925,18 – 8.446.000,00 = MOP1.973.925,18).
     
     A ré, embora por outras palavras, entende que o dano relativo ao preço não tem nexo de causalidade com o incumprimento contratual. Entende, também por outras palavras, que, estando a RAEM disposta a devolver o imposto do selo aos autores, se estes não o foram receber, quebraram o nexo causal entre o facto lesivo e o respectivo dano e não ocorre obrigação de indemnizar relativamente a esta despesa de imposto.
     
     Vejamos.
     Quanto ao preço pago pelos autores pela cedência da posição contratual de promitentes-compradores.
     Os autores adquiriram a posição de promitentes-compradores pagando o equivalente a MOP5.417.800,00. Dizem que este pagamento é um dano. Porém, adquiriram o direito de obter um imóvel na condição de pagarem ainda a parte do preço acordado que o cedente ainda não havia pago, correspondente a MOP3.028.200,00. Neste momento, os autores têm o direito de adquirir imóvel semelhante à sociedade “Macau ......” pagando o preço equivalente a MOP4.326.000,00.
     O cálculo da indemnização obtém-se por comparação entre a situação que o lesado tem e a que teria se não fosse a lesão (arts. 556º a 558º do CC).
      Já atrás se falou na privação do uso do imóvel, enquanto dano. O dano dos autores é ainda a diferença entre o que vão ter de pagar à sociedade Macau ...... e o que iriam pagar à ré (MOP4.326.000,00 – MOP3.028.200,00 = MOP1.297.800,00). Mas não é o que pagaram ao cedente, pois este valor seria sempre pago, quer a ré cumprisse, quer a ré não cumprisse. Na situação em apreço, em que os autores apenas têm de pagar mais do que teriam de pagar se a ré cumprisse a sua obrigação e apenas poderão usufruir do imóvel prometido alguns anos mais tarde do que usufruiriam se a ré tivesse cumprido, o dano dos autores é apenas a privação temporária do uso e a diferença do que terão de pagar.
     Afigura-se óbvio que não é um dano o preço que pagaram para adquirir a situação contratual em que se encontram.
     Improcede, pois esta parte da pretensão dos autores.
     
     Quanto à privação do aumento do valor de mercado.
     Este dano não se provou. Com efeito, provou-se que os autores irão receber um imóvel semelhante ao prometido, pelo que, quando o receberem, terão o valor de mercado que teriam se a ré tivesse cumprido.
     
     Quanto ao imposto do selo.
     Afigura-se evidente que pagar imposto do selo em consequência de um acto tributário, que foi a celebração de um contrato oneroso, e nada receber em cumprimento desse contrato que ficou incumprido é claramente um dano para os autores.
     Porém, provou-se que a RAEM assumiu a restituição do pagamento do imposto do selo aos autores (ponto 109. dos factos provados). Isto significa que se o dano ainda persiste, os autores tiveram e, eventualmente ainda têm, o domínio do processo causal desse dano, só eles o podendo evitar reclamando da RAEM a devolução que esta está disposta a fazer. Esta quebra do nexo causal torna este dano não indemnizável. A celebração do contrato de cessão da posição contratual, enquanto acto tributário, deu lugar ao pagamento do imposto do selo e o “incumprimento do acto tributário” fez do pagamento do imposto um dano que hoje ocorre na esfera jurídica dos autores. Há um processo causal entre o incumprimento e o “dano do selo”. Porém, os autores têm ou tiveram o poder de evitar o dano, só eles o podendo evitar. Este monopólio posterior do domínio do processo causal impede que se conclua que o dano hoje verificado ainda mantenha nexo de causalidade com o incumprimento. O incumprimento contratual ia a caminho de causar o dano que hoje se verifica, mas intrometeu-se no processo causal um acto ou uma omissão dos autores que faz com que juridicamente assumam para si o processo causal do dano de hoje, que é o que releva nos termos do disposto no nº 5 do art. 560º do CC. Os autores tiveram o domínio exclusivo do processo causal do dano, pelo que, se não o impediram, sibi imputet.
     O dano decorrente do pagamento do imposto do selo não é indemnizável por já não manter qualquer nexo causal com o incumprimento da ré.
     
     Quanto às despesas pagas à ré para esta consentir na cedência da posição contratual de promitente-comprador (400,00 + 43.260,00).
     Não se vêm quaisquer dúvidas quanto a deverem qualificar-se as referidas despesas como dano indemnizável.
     
     Síntese.
     Assim vistas as coisas, o dano efectivo alegado pelos autores é a privação do uso do imóvel prometido, a diferença do preço que terão de pagar (MOP1.297.800,00) e as despesas que, em vão, pagaram à ré (MOP43.660,00).
     Pois bem, o dano da privação do uso não é possível de determinar, até por se desconhecer o tempo de privação, que ainda não terminou. Neste caso, o montante do dano em dinheiro deve ser fixado por juízos de equidade (art. 560º, nº 6 do CC). Ora, considerando as “comodidades” e os frutos civis que o imóvel poderia proporcionar aos autores duranto o previsível período em que deles estiveram e estartão privados, julga-se equitativo fixar o valor da indemnização em MOP1.300.000,00.
     
     Nos termos expostos o dano efectivo dos autores deve ser calculado em MOP2.641.460,00, o que é inegavelmente “consideravelmente superior” ao valor do sinal prestado (MOP1.297.800,00). Assim, nos termos do disposto no nº 4 do art. 436º do CC, a indemnização dos danos dos autores em consequência do incumprimento da ré deve fixar-se em MOP2.641.460,00.
     
     Dos pedidos subsidiários.
     Em consequência do que fica dito, está prejudicada a apreciação dos pedidos subsidiários que pressupõem que se considere que não foi acordado sinal e que o incumprimento não é imputável à ré.
     
     4 Da mora na obrigação de indemnizar.
     4.1 - Do início da mora (art. 794º do CC e art. 565º, nº 3 do CPC).
     Tendo uma parte da indemnização sido fixada segundo juízos de equidade, é ilíquida a respesctiva obrigação de indemnizar, pelo que a mora só se inicia com a liquidação operada pela presente decisão.
     Porém a mora quanto à obrigação de restituição do sinal prestado, quanto ao dano correspondente à quantia que os autores ainda terão de pagar à sociedade Macau ...... e às despesas efectuadas venceu-se com a interpelação. E esta interpelação ocorreu com a citação e não com a caducidade da concessãpo por arrendamento, como defendem os autores.
     
     4.2 - A taxa de juro moratório.
     A indemnização moratória relativa às obrigações pecuniárias corresponde aos juros legais a contar do dia da constituição em mora, salvo excepções aqui inaplicáveis (art. 795º do CC).
     Nos termos do art. 569º, nº 2 do Código Comercial só em relação aos créditos de natureza comercial acresce a sobretaxa de 2% sobre os juros legais, não sendo aplicável ao crédito dos autores nem às obrigações de que sejam titulares passivos os comerciantes ou as empresas comerciais se o titular activo não for comerciante.
     A indemnização moratória deve corresponder aos juros legais contados desde a citação sem acréscimo da sobretaxa aplicável aos créditos de natureza comercial.
     
     5 Em conclusão.
     Têm os autores direito:
     - a resolver o contrato;
     - a que lhes seja restituída a quantia que a ré recebeu em cumprimento do contrato resolvido (MOP1.297.800,00);
     - a indemnização do dano efectivo consideravelmente superior ao valor do sinal prestado (MOP2.641.460,00);
     - a receber juros de mora à taxa dos juros legais civis a contar desde a presente sentença quanto ao dano fixado por juízos de equidade e desde a citação quanto aos demais danos e quanto à restituição do sinal prestado.
     *
     V – DECISÃO.
     Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, declara-se resolvido o contrato celebrado entre as partes e condena-se a ré a pagar aos autores a quantia de:
     - MOP2.639.260,00 (dois milhões, seiscentas e trinta e nove mil, duzentas e sessenta Patacas), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da citação da ré até integral pagamento;
     - MOP1.300.000,00 (um milhão e trezentas mil Patacas), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da presente sentença até integral pagamento.
     
     Custas a cargo dos autores e ré na proporção do respectivo decaimento.
     Registe e notifique.
*
    Quid Juris?
    Uma vez que está em causa essencialmente a aplicação de Direito, vamos apreciar os recursos interpostos pelos Autores e pela Ré em conjunto.
*
    Ora, a particularidade do caso dos autos consiste no seguinte:
    a) – A ex-promitente-adquirente (cfr. uma sociedade comercial de HK, fls. 28 dos autos) pagou, no 1º momento, uma parte do preço acordado para adquisição da fracção autónoma (“**º - F”) em causa;
    b) – Depois, ela cedeu a posição contratual para os Autores dos autos;
    c) – Agora, os Autores vêm a reclamar a restituição em dobro das quantias totais pagas por ele e indemnizações por danos excedentes.
    Terão os Autores fundamentos legais para o fazer?
    Tal como temos vindo a sublinhar que cada caso é um caso, não obstante existirem vários processos em que se discutem as questões idênticas ou semelhantes.
    Ora, dada a identidade ou a semelhança da matéria discutida neste tipo de processos, as considerações por nós tecidas noutros processos valem, mutatis mudantis, para o caso, obviamente com as devidas adaptações, nomeadamente no processo nº 813/2024, com o acórdão proferido em 13/3/2025, em que ficou consignado o seguinte entendimento:
    
     “(…)
    1) – Nos exercício das funções jurisidicionais, é do conhecimento deste TSI que são basicamente as seguintes situações que dão origem aos litígios em que se discutem as mesmas matérias:
    a) – O promitente-comprador mantém a sua posição contratual até à data em que foi proposta acção contra a Ré, sem que tivesse transmitido a sua posição contratual para terceiro;
    b) – O promitente-comprador chegou a ceder a sua posição de promitente-comprador para um terceiro, por um preço superior ao fixado no primeiro contrato-promessa, e é este terceiro, actual titular da posição do contrato-promessa que veio a propor a acção contra a Ré, pedindo que esta lhe pagasse o sinal dobro à luz do preço mais alto (ou seja, existe diferença ao nível do preço, o preço fixado no primeiro contrato-promessa e o preço mais alto posteriormente fixado no segundo (ou posteriores) contrato-promessa;
    c) – O promitente-comprador chegou a celebrar vários contratos-promessa com a Ré, prometendo adquirir várias fracções autónomas (depois, chegou a transmitir alguns contratos-promessa para terceiros e mantém alguns para si próprio).
    2) – Todas as hipóteses acima apontadas trazem várias questões para discutir, uma delas consiste em saber se é legítimo e justo que o promitente-comprador venha a receber o sinal em dobro independentemente das particularidades do caso em discussão.
    3) – No caso, não é supérfluo realçar que o caso em análise tem a sua particularidade, já que, ao contrário daquilo que se verifica em situações normais, em que a promitente-vendedor não quer cumprir de livre vontade e por iniciativa própria o acordado. No caso não foi isto que sucedeu, a Ré quis cumprir, só que por decisão do Governo da RAEM, a Ré não pude cumprir. Ou seja, a sua “culpa”(se podemos utilizar esta palavra) não é acentuada nem “indesculpável”, o que deve relevar para ponderar e fixar as sanções contratuais!
     (…)”.

    Aqui, merece igualmente destacar um outro ponto: o raciocínio do Tribunal a quo aponta, parece-nos, para a ideia de que toda a culpa de incumprimento se concentra na parte da Ré/Recorrente, mas tal como se refere anteriormente por nós, não é líquida esta argumentação, já que a Ré fazia e tentava fazer tudo para que pudesse cumprir os compromissos assumidos perante o Governo da RAEM, apesar que o resultado final não vir a ser “satisfatório” a todos os níveis. Mas os comportamentos assumidos pela Ré demonstram que não existe “dolo” de incumprimento por parte dela, quanto muito, negligência ou utilizando uma linguagem diferente, um “ risco de investimento” que a Ré há-de assumir, daí a sua quota-parte de responsabilidade, circunstâncias estas que devem ser valoradas na fixação das indemnizações que cabem no caso em análise. Aliás, o Tribunal recorrido na fundamentação da decisão dos factos afirmou: “A convicção do tribunal formou-se na análise crítica da globalidade da prova testemunhal e documental produzida, ponderada nos termos antes referidos e que podem ser explicitados sinteticamente como segue.
    É uma evidência que a ré tinha vontade firme de concluir o empreendimento “XXXX”, o que resulta da consideração dos esforços e dispêndios que fez, incontestáveis e incontestados nos autos, incluindo por via judicial.”
*
    Questão do incumprimento do acordo firmado:
    Conforme o quadro factual fixado pelo Tribunal recorrido, existem vários factos que são claros para demonstrar que a Ré não actuou com “dolo” no cumprimento dos acordos quer perante o Governo enquanto concedente quer perante as partes dos contratos-promessa, a saber:
    “(…)
     - A DSSOPT aprovou o projecto sem o sugerido afastamento entre torres e em 7/1/2011 notificou a ré dessa aprovação e notificou-a ainda para apresentar o relatório de estudo de impacto ambiental que teria a construção do edifício em matéria de fluxo de ar, efeito biombo, ilhas de calor e expansão de poluentes e referindo à ré que não lhe seria emitida licença de obras sem que o referido relatório fosse apresentado e aprovado;
     - Em 11/5/2011, a ré apresentou à DSSOPT um relatório do estudo de impacto ambiental requerido;
     - Posteriormente, a DSSOPT em coordenação com a DSPA exigiu à ré a apresentação de outros relatórios de estudos de impacto ambiental incidentes sobre outros aspectos ambientais diferentes daqueles que havia mencionado e a ré apresentou-os até que, em 15/10/2013, foi aprovado o último relatório apresentado;
     Em 24/10/2013, a ré requereu à DSSOPT a emissão de licença de obras que foi emitida em 2/1/2014.
     - Se a DSSOPT tivesse dado resposta em 60 dias apreciando o projecto parcial de arquitectura apresentado pela ré em 06/05/2008, a que não respondeu;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando o projecto global de arquitectura apresentado pela ré em 22/10/2009, a que respondeu em 9/4/2010;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando a alteração apresentada ao referido projecto global em 3/6/2010, a que respondeu em 7/1/2011 e
     - Se a DSSOPT, quando em 7/1/2011 exigiu pela primeira vez a realização de estudos de impacto ambiental, tivesse exigido à ré todos os estudos da mesma natureza que lhe exigiu mais tarde.
    
    “(…)”
     1. A Ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou dada uma nova concessão do mesmo terreno para data posterior a 24/12/2015 porque os serviços da RAEM criaram tais expectativas, nomeadamente:
a. Ao emitirem licença de obras para as fundação em 02/1/2014, um mês antes do terreno do prazo de aproveitamento;
b. Ao Prorrogarem o prazo de aproveitamento em 29/7/2014 até 25/12/2015, sabendo que tal não seria possível;
c. Já anteriormente haviam concessionado novamente o mesmo terreno ao mesmo concessionário em casos em que o terreno concessionado não tinha sido aproveitado no dentro do respectivo prazo. (Q 9.º)
    (…)”.
    Tudo isto demonstra claramente que a Ré não actuou com dolo para desrespeitar as obrigações decorrentes dos contratos-promessa, pelo contrário, os factos assentes acima transcritos podem constituir alteração superveniente das circunstâncias nos termos do artigo 431º do CCM (O Autor chegou também alegar esta matéria conforme o teor do artigo 138º a 139º da PI), já que se tratam de factos imprevisíveis e que ocorreram posteriormente ao momento da celebração dos acordos em análise.
*
    Resoluções possíveis do incumprimento dos contratos bilaterais:
    
    Com as devidas adaptações, o disposto no artigo 784º/2 do CCM pode ser chamado para fundamentar a decisão em análise, já que tal normativo dispõe:
    
(Contratos bilaterais)
    1. Quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa.
    2. Se a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor, não fica este desobrigado da contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com a exoneração, o valor do benefício é descontado na contraprestação.
    Em regra, a restituição do sinal não representa uma injustiça flagrante ou ofende o sentido de justiça material, é de aceitar como correcta a solução legalmente consagrada: restituição do sinal em dobro por quem não cumpre o acordo celebrado nos termos do disposto no artigo 801º do CCM.

*
    1) - Agora, relativamente ao dano excedente, quando não pode ser calculado ao certo, à luz da doutrina dominante, e no caso da sua impossibilidade, recorre-se ao juízo de equidade.
    A propósito deste ponto, escreveu-se:
    “De harmonia com a lei substantiva, sempre que não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (art.º 566.º, n.º 3, do Código Civil). Considerada a possibilidade processual de uma condenação ilíquida, coloca-se o problema da articulação de uma e outra norma (artº 609.º, n.º 2, do CPC). A articulação deve ser feita do modo seguinte: se ainda for possível fixar no incidente de liquidação a quantidade da condenação, aplica-se a norma processual da condenação genérica; no caso inverso, o dano será equitativamente julgado5. Equidade – como justiça do caso concreto – que, porém, sob pena de um julgamento puramente arbitrário ou atrabiliário, não prescinde de um suporte de facto, por mínimo ou reduzido que seja6, nem serve para alijar por inteiro, o não cumprimento, seja pelo credor da obrigação de indemnização quantitativamente indeterminada do ónus da prova do valor do dano a que está indiscutivelmente adstrito, seja pelo devedor de igual ónus que o vulnera no tocante a qualquer facto extintivo daquela mesma obrigação (art.º 342.º, n.ºs 1 e 2, e 346.º, n.º 1, in fine, do Código Civil, e 414.º do CPC).”25

    2) – Pergunta-se, como é que se deve resolver este tipo de questões? A propósito desta matéria, citemos aqui a posição dominante vigente em Portugal, em nome do Direito Comparado (Cfr. ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 9/10/2012) sobre a matéria em discussão (uma situação semelhante):
“Acontece porém que nos situamos no âmbito da resolução do contrato. O autor optou pela resolução do contrato.
A resolução do contrato “consiste na destruição da relação contratual, validamente constituída, operada por um acto posterior de vontade de um dos contraentes, que pretende fazer regressar as partes à situação em que elas se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado” [14].
Entre as partes e na falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade do negócio jurídico, nos termos do art.º 433º do Código Civil. Por isso tem efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes.
Ao pretender indemnização por lucros cessantes, o A. está a pedir a reparação do interesse contratual positivo, ou seja, o ressarcimento do prejuízo que não sofreria se a cessão de exploração tivesse sido inteiramente cumprida pela R. O que resultaria para o credor do cumprimento curial do contrato, abrangendo, portanto, não só o equivalente da prestação, mas também a cobertura pecuniária (a reparação) dos prejuízos restantes provenientes da inexecução, "de modo a colocar-se o credor na situação em que estaria se a obrigação tivesse sido cumprida".
Como é sabido, “a nulidade impede a produção de efeitos e a anulação faz cessar a produção de efeitos jurídicos” [15].
Em caso de resolução contratual, a posição clássica e largamente dominante, é a de que a tutela se resume ao interesse contratual negativo, ou seja, ao prejuízo que o credor não teria se o contrato não tivesse sido celebrado [16]. Tal entendimento tem sido seguido maioritariamente na jurisprudência. [17]
Com base nesta doutrina, não é aceitável a compatibilidade de cumulação entre a resolução do contrato e a indemnização correspondente ao (interesse contratual positivo, sobretudo com fundamento nos argumentos retirados do efeito retroactivo da resolução e da incoerência da posição do credor, ao pretender, depois de ter optado por extinguir o contrato pela solução, basear-se nele para obter uma indemnização, correspondente ao interesse no seu cumprimento.
Por isso e conclui no citado acórdão de 24.1.2012 que, “por regra, a indemnização fundada no não cumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido”.
Nada no caso justifica que nos afastemos da regra geral em razão dos interesses em discussão, o que se justifica apenas em casos excepcionais, como também tem sido entendido na jurisprudência. [18]
Por conseguinte, improcede o pedido de indemnização do A. relativo a lucros cessantes.”

    Questão da indemnização pelos danos excedentes:
    
    O raciocínio vale, mutantis mudantis, para o caso dos autos, sendo certo que o artigo 436º do CCM (que tem uma redacção diferente da do CC de 1966 vigente em Portugal), consagra:
(Sinal)
    1. Quando haja sinal, a coisa entregue deve ser imputada na prestação devida, ou restituída quando a imputação não for possível.
    2. Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado.
    3. A parte que não tenha dado causa ao incumprimento poderá, em alternativa, requerer a execução específica do contrato, quando esse poder lhe seja atribuído nos termos gerais.
    4. Na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
    5. É igualmente aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 801.º
    Depois, o artigo 801º do CCM manda:
(Redução equitativa da pena)
    1. A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em contrário.
    2. É admitida a redução nas mesmas circunstâncias, se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida.
    A propósito dos nº 4 e 5 do artigo 436º do CCM, anotou-se:
    “15. No estudo global que se faça do problema, chega-se à conclusão que o nº 4 vem reforçar a ideia transversal consagrada no Código a respeito da natureza confirmatória do sinal (o próprio Menezes Leitão acaba por admitir que o nº 4 não tem natureza penitencial, em ob. cit., pág. 246). Ou seja, para lá da perda do sinal pelo tradens ou da devolução em dobro do sinal pelo accipiens, ainda pode haver lugar, salvo estipulação em contrário, a indemnização pelo dano excedente. Foi uma opção do legislador de Macau, que podia ter aproveitado a ocasião para ser mais generosa. Com efeito, não passou da criação dessa possibilidade indemnizatória pelo dano excedente, sem a estender a outra qualquer indemnização (nomeadamente, por danos não patrimoniais), tendo em conta que na parte final do nº 4 afirmou expressamente a impossibilidade de alargamento da extensão indemnizatória (habitualmente, alguns autores defendem que, sem limitação, pode haver a indemnização por perdas e danos no caso de sinal confirmatório).
     Pior é, apesar de tudo, a situação do parente próximo preceito português, pois nele se preceitua que "Na ausência de estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não cumprimento".
     De qualquer maneira, há mesmo aí quem sustente que, para além dessa indemnização pelo não cumprimento, possa haver uma ou mais indemnizações fundadas noutras causas, como, por exemplo, nos casos de terem sido feitas benfeitorias na coisa (Ana Prata, Código ... cit., pág. 568).
     16. O nº 5 manda aplicar, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 801º. Não é bem claro o propósio da disposição legal: se apenas se aplica aos casos em que os contraentes estabelecem no contrato uma indemnização para o caso de incumprimento por arrependimento (arras ou sinal penitencial), ou se também aplicação no caso de sinal confirmatório-penal.
     E se a resposta for no sentido de apenas cobrir a segunda hipótese de sinal confirmatório, ainda fica por saber se a redução por equidade (art. 801º) abrange somente as situações em que há dano excedente (nº 4), calculando-se aí a indemnização segundo critérios equitativos, ou se também atinge o dobro do sinal por incumprimento do accipiens.
     Por um lado, poderia parecer que a melhor solução seria, efectivamente, a que permite a aplicação do regime de redução no caso de incumprimento de contrato em que o sinal tem a função de arra confirmatória. Na verdade, se o sinal tiver o sentido penitencial, isso se deve ao facto de as partes, de livre vontade e por consenso, terem estabelecido os próprios limites indemnizatórios, não fazendo sentido que o tribunal os possa baixar apenas porque o devedor lho tenha pedido.
     Por outro lado, é de crer que a redução também não possa incidir sobre o dobro do sinal, porque isso seria contrariar a solução da lei (nº 2).
     Nesta óptica, pareceria ficar assim a remissão para o art. 801º circunscrita às situações em tiver que haver indemnização pelo dano excedente. Este dano pode ser, realmente, elevado, se tivermos em conta as diferenças de preços em mercados (por exemplo, imobiliários) que frequentemente se pautam por regras pouco saudáveis de especulação. Tendo em conta que o dano pode ser realmente avultado, a intervenção do juiz pode eventualmente justificar-se, se bem que a redução também pode funcionar como um prémio ao devedor.
    Não temos, enfim, a certeza sobre o alcance da norma.
     Mas, se fizermos a conjugação dos artigos 436º, 801º (e o ambiemte da sua sistematização) e 820º, nº 2, (neste caso, para o contrato-promessa) talvez seja possível, afinal de contas, considerar que a remissão apenas faça sentido nos casos em que as partes contratantes tenham estipulado, por penitência, uma indemnização com caracter de pena no contrato para a hipótese de não cumprimento por arrependimento. A jurisprudência dirá o que for de justiça sobre o assunto. (Cfr. Código Civil de Macau, Anotado e Comentado, João Gil de Oliveira e José Cândido de Pinho, CFJJ, 2020, Vol. VI, pág. 506 e 507).
    Efectivamente pode existir alguma dúvida na interpretação e aplicação das normas em causa.
    Mas não é pela primeira vez que este TSI é chamado para se pronunciar sobre o conceito de danos ou prejuízos excedentes, o mesmo conceito encontra-se consagrado no artigo 1027º do CCM em matéria locatária que dispõe:
     
(Indemnização pelo atraso na restituição da coisa)
    1. Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida.
    2. Logo, porém, que o locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro; à mora do locatário não é aplicável a sanção prevista no artigo 333.º
    3. Fica salvo o direito do locador à indemnização dos prejuízos excedentes, se os houver.
    A propósito deste conceito, ficou consagrado o seguinte entendimento no Proc. nº 646/2017, com o acórdão proferido em 26/07/2018:
     
    “I - A Ré deve pagar a quantia equivalente ao dobro da renda que se praticava, como justa indemnização específica pela não restituição do imóvel, embora de natureza contratual, por continuar a usar a coisa, em prejuízo das locadoras, correspondente à renda que estava a ser praticada e que se traduz no valor de uso do imóvel.
    II – Em relação à indemnização pelos prejuízos excedentes, uma vez verificados, a título de lucros cessantes, ela tem por fundamento o efectivo prejuízo causado, que pode já não se medir pelo valor da renda, não obstante ser o mesmo o respectivo facto gerador, mesmo que o montante dos danos causados às locadoras seja inferior ou equivalente ao quantitativo da renda, hipótese em que ao credor basta a indemnização contemplada pelo artigo 1027º/2 do CC.
    III - A solução correcta só poderá ser conseguida mediante interpretação sistemática, lógica e teleológica da norma do artigo 1027º/3 do CCM. Não resta dúvida que, quer a sanção prevista no nº 2, quer no nº 3 do artigo citado, visa “forçar” o inquilino a devolver o locado ao senhorio com o mais cedo possível, sob pena de estar sujeito a sanções pesadas até que o locado seja devolvido a quem de direito.
    IV - Por esta via, a leitura mais consentânea com a ratio legis da norma do artigo 1027º/3 do CCM é a de que a indemnização da mora entra em linha de consideração para efeitos da fixação da indemnização por prejuízo excedente, sob pena de se duplamente “sancionar” o inquilino!”
     
    Não há razões bastantes para não seguirmos o entendimento acima referido, já que está em causa uma matéria de natureza idêntica: para além de pagar o dobro, pode pedir-se indemnização por danos excedentes, mas estes têm de estar devidamente demonstrados e comprovados, não bastam alegações abstractas ou provas indirectas.
    No que respeita aos critérios da valoração probatória, nunca é demais sublinhar que se trata de um raciocínio problemático, argumentativamente fundado no húmus da razão prática, a desenvolver mediante análise crítica dos dados de facto veiculados pela actividade instrutória, em regra, por via de inferências indutivas ou analógicas pautadas pelas regras da experiência colhidas da normalidade social, que não pelo mero convencimento íntimo do julgador, não podendo a intuição deixar de passar pelo crivo de uma razoabilidade persuasiva e susceptível de objectivação, o que não exclui, de todo, a interferência de factores de índole intuitiva, compreensíveis ainda que porventura inexprimíveis. Ponto é que a motivação se norteie pelo princípio da completude racional, de forma a esconjurar o arbítrio26.
    É, pois, nessa linha que se deve aferir a razoabilidade dos juízos de prova especificamente impugnados, mediante a análise crítica do material probatório constante dos autos, incluindo as gravações ou transcrições dos depoimentos, tendo em conta o respectivo teor, o seu nicho contextual histórico-narrativo, bem como as razões de ciência e a credibilidade dos testemunhos. Só assim se poderá satisfazer o critério da prudente convicção do julgador na apreciação da prova livre, em conformidade com o disposto, designadamente no artigo 390º do CCM, em conjugação com o artigo 558º do CPC, com vista a obter uma decisão que se possa ter por justa e legítima.
    Voltando ao caso em análise, sublinhe-se aqui, é de verificar que a norma do nº 4 do artigo 436º é mais exigente do que a norma do artigo 1027º (que regula a matéria de locação), pois aquela norma fala de “dano consideravelmente superior’! O que exige provas mais rígidas e persuasivas!
*
    Aqui, é de recordar-se que no processo nº 220/2024 fica consignado o seguinte entendimento:
    “從上述轉錄的內容可見,原審法院已詳細論證了第一被告的不履行責任,我們認同有關見解,故基於訴訟經濟原則及根據《民事訴訟法典》第631條第5款之規定,引用上述見解和依據,裁定這部分的上訴理由不成立。
    事實上,本院在涉及“XXXX”事件的案件中已多次強調(見中級法院在卷宗編號1142/2019、1145/2019、1150/2019及1192/2019內作出的裁判),澳門特別行政區僅和土地承批人,即本案之第一被告,建立了法律關係;一切因應承批土地所作出的行為,均是針對土地承批人/第一被告而作出。因此,即使假設該等行為損害了土地承批人/第一被告的權益,例如無法如期利用土地而導致其需向預約買受人作出賠償,也只能是土地承批人/第一被告在履行其賠償義務後再向澳門特別行政區追討賠償,而非預約買受人可直接向澳門特別行政區追討因土地承批人/第一被告違反與其簽定的預約買賣合同的賠償責任。
    只有在澳門特別行政區濫用權利,行為特別惡劣的情況下其才需負上相關賠償責任,然而本案並不存在該等情況。
    4. 就賠償金額方面:
    第一被告認為基於合同不履行非其責任,故只應按不當得利規則(《民法典》第784條第1款之規定)作出返還。
    此外,亦認為即使假設其在相關的合同不履行存有過錯,雙倍的定金賠償是明顯過高,應根據衡平原則作出縮減。
    我們在前述部分已認定第一被告需對合同的不履行負上責任,故不能適用《民法典》第784條第1款之規定,按不當得利規則作出返還。
    就賠償金額方面,根據《民法典》第3條的規定,法院在下列任一情況下可按衡平原則處理案件:
    a) 法律規定容許者;
    b) 當事人有合意,且有關之法律關係非為不可處分者;
    c) 當事人按適用於仲裁條款之規定,預先約定採用衡平原則者。
    《民法典》第436條第5款明確容許經適當配合後適用第801條之規定,即容許法院當認為賠償金額過高時按衡平原則減少違約賠償金額。
    為此,我們需考慮原告們的實際損失是多少,即其共付出了多少金錢以取得相關的合同地位來決定是否適用衡平原則作出縮減。
    在本個案中,原告們向原預約買受人支付了港幣2,356,000.00元(900,000+1,456,000)以取得相關的預約買受人合同地位。
    倘按平均年利率3.5%計算8年(2012-2019年)的利息,可獲得港幣659,680.00元的利息,即共有港幣3,015,680.00元。
    原告們可獲得雙倍定金的賠償是港幣2,292,000.00元(1,146,000 x 2),並不高於前述的金額。
    由此可見,原審法院不以衡平原則對賠償金額作出縮減是正確的,應予以維持。”
    3) – Voltando ao caso dos autos, uma leitura possível: ao contrário que se pretende defender, temos por certo que as quantias pagas pelos Autores à Ré a título de sinal, se fossem depositadas nas instituições bancárias, certamente eles receberão juros, facto este que temos por certo que os Autores deixaram de poder os receber, razão pela qual a Ré deve indemnizá-los por esta via.
(…)
    4) - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas, que se distingue do puro julgamento jurídico por apresentar menos preocupações sistemáticas e maiores empirismo e intuição. Portanto, a equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto (Cfr. António Menezes Cordeiro, “A decisão segundo a equidade”, in o Direito, Ano 122, 1990, Abril-Junho, pág. 272, e Manuel Carneiro da Frada, “A equidade (ou justiça com coração): a propósito da decisão arbitral segundo a equidade, in Revista da Ordem dos Advogados, 2012, Ano 72, Vol. I, pág. 143, e os Acs. do STJ de 31.01.2012 (875/05) e 07.10.2010 (3515/03). Ou seja, no caso, deve existir factos assentes no sentido de que os Autores tivessem a possibilidade de vender, pelo menos, pelos valores por ele alegados e comprovados (ex. mediante contratos-promessa de compra e venda celebrados) a uma terceira pessoa concreta, o que não se encontra devidamente demonstrado por factualidade assente.
    5) (…)”.
*
    Relativamente à solução ditada pelo Tribunal a quo, globalmente analisados os argumentos invocados pelo Tribunal a quo, é de entender que a solução é correcta, quando se afirmou:
     “Da convenção de sinal.
     O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico27. Numa certa perspectiva, é, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial.
     Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes.
     Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes28.
     Se os autores pretendem ser indemnizados segundo o regime do sinal, cabe-lhes, nos termos do art. 335º, nº 1 do CC, alegar e provar, entre o mais, os factos demonstrativos de ter sido estipulada a existência de sinal.
     Porém, no caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CC que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
     Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CC). No caso dos autos, provou-se que o “cedente” entregou à ré, promitente-vendedora, determinada quantia em dinheiro no âmbito do contrato promessa que celebraram. Provou-se o facto base da presunção, pelo que está presumido que as partes quiseram atribuir carácter de sinal. Cabe, pois à ré, interessada em ilidir a presunção, a alegação e a prova do facto contrário ao facto presumido, isto é, cabe-lhe provar que as partes acordaram que a quantia entregue não tinha carácter de sinal. A ré não conseguiu fazer a prova dessa vontade negocial contrária à presunção legal. Tem a ré de ver esta questão decidida em sentido contrário à sua pretensão. Com efeito, a ré logrou apenas provar que o contrato que celebrou refere a palavra preço, não constituindo tal facto “prova do contrário” do facto presumido. Isto é, não é prova de que as partes não quiseram atribuir carácter de sinal.
     Mas dir-se-á ainda que do contrato-promessa sub judice resulta que as partes quiseram que as quantias pagas pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor sejam consideradas sinal. Com efeito, na cláusula 5ª do contrato referido diz-se que a falta de pagamento das prestações do preço acordado implica a perda da quantia já paga. Trata-se do regime supletivo do sinal, pelo que parece clara a vontade das partes no sentido de terem pretendido constituir sinal.
     Mas, em caso de dúvida sobre o sentido que atribuiria o “declaratário normal”, deve, para se apurar o sentido com que a vontade declarada das partes deve valer, ponderar-se a medida em que o princípio do equilíbrio das prestações intervém na fixação do valor da vontade negocial declarada quando se desconhece a vontade real.
     Se é certo que não é determinante para qualificar o acordo das partes o facto de as partes terem denominado como contrato-promessa aquele acordo que celebraram, é igualmente certo que não é determinante para fixar o sentido com que deve valer a declaração negocial o facto de terem denominado de depósito a quantia monetária entregue pelos autores à ré em cumprimento do acordo que celebraram.
     Se a vontade real dos contraentes é conhecida pelo declaratário, é ela que deve vincular os declarantes (nº 2 do art. 2**º do CC). Se essa vontade real não é conhecida, é a vontade declarada que vai determinar quais os vínculos contratuais que as partes devem cumprir. Para saber em que sentido a vontade declarada vincula é necessário interpretá-la, ou seja, avaliá-la intelectivamente para lhe apreender o sentido vinculador.
     Há, pois, que atender ao princípio do equilíbrio das prestações, o qual diz que, em caso de dúvida, o sentido da declaração é o mais equilibrado nos negócios onerosos, como é o dos autos.
     Ora, se em caso de incumprimento do cedente a ré é indemnizada em “1.260.000,00”, qual será a vontade negocial que deve valer em caso de incumprimento da ré? Deve pagar apenas se se enriqueceu e só na medida do seu enriquecimento? Ou deve também ter uma pena e pagar o mesmo que o cedente ou outra quantia, mas uma pena? Parece que o princípio do equilíbrio das prestações impõe que, em caso de dúvida, se conclua que as partes estabeleceram penas para ambas e que quiseram que a quantia entregue pelos autores fosse a medida da pena de ambas em caso de incumprimento definitivo.
     As partes não estipularam que em caso de incumprimento do cedente a ré podia recorrer à acção de execução específica, nem à acção de condenação, nem à resolução do contrato com restituição do que foi prestado e indemnização dos danos efectivos. Estipularam o regime do sinal segundo o qual, em caso de incumprimento daquele que o prestou, aquele que o recebeu fica com ele para si sem direito a outra indemnização excepto se sofrer danos manifestamente superiores.
     Na dúvida, o princípio do equilíbrio das prestações “manda” que se atribua valor à declaração negocial das partes no sentido de ter sido estipulado sinal.
     
     Assim, mesmo que não se qualifique o contrato como contrato-promessa, há-de a quantia entregue ser qualificada de sinal de acordo com o sentido com que deve valer juridicamente a declaração negocial das partes.
     
     Portanto, mesmo sem a presunção legal referida, sempre a vontade das partes deve ser interpretada no sentido de terem convencionado sinal.
     
     Conclui-se, pois, que foi acordado sinal no caso em apreço.
     
     O montante da indemnização predeterminado pelo valor do sinal, a sua ampliação para o valor do dano efectivo que excede o valor do sinal ou a sua redução por juízos de equidade.
      “Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado” (art. 436º, nº 2 do CC).
     Está demonstrado que a ré não cumpriu definitivamente a sua promessa de venda.
     Está também demonstrado que a ré recebeu sinal.
     Foi já decidido atrás que a causa do incumprimento não é imputável a terceiro e que é imputável à ré a título de culpa. E também já atrás foi decidido que o incumprimento culposo da ré confere aos autores o direito de resolver o contrato-promessa.
     Deve, pois a ré restituir o que recebeu para cumprir a promessa de venda que não cumpriu (HKD1.260.000,00, equivalentes MOP1.297.800,00), uma vez que, como efeito da resolução do contrato, sempre terá que devolver o que lhe foi prestado (arts. 282º e 427º do CC). Mas terá ainda de pagar aos autores um montante igual ao do sinal que recebeu, um montante superior ou um montante inferior?
     Vejamos.
     Dispõe o nº 4 do art. 436º do CC que “na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
     E dispõe o art. 801º, nº 1 do CC, aplicável por força do disposto no nº 5 do art. 436º do mesmo CC, que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”.
     
     Portanto, o valor da indemnização por incumprimento do contrato, rectius, por impossibilidade culposa da prestação, deve, em princípio, corresponder ao valor do sinal prestado. Porém, o referido valor da indemnização pode ser:
     - Aumentado para o valor do dano efectivamente sofrido pelo credor se este dano for consideravelmente superior ao valor do sinal29;
     - Reduzido para montante equitativo não inferior ao valor do dano efectivo se a penalização resultante do sinal for manifestamente excessiva em relação ao mesmo dano efectivo30.
     
     O ónus da prova.
     O legislador ao permitir às partes fixarem por convenção as consequências do incumprimento acabou por criar uma distribuição do ónus da prova em que só tem que provar o dano relevante o contraente que pretende que a indemnização por incumprimento se fixe em valor diferente do predeterminado. Assim, o credor que pretende que o valor da indemnização seja superior ao predeterminado tem de provar que sofreu um dano consideravelmente superior ao sinal. Por sua vez, o devedor que pretende que a indemnização seja de valor inferior ao predeterminado tem que demonstrar que a pena é manifestamente excessiva em relação ao dano.
     No presente caso, cabe à ré alegar e provar os factos de onde se possa concluir que o valor do sinal é manifestamente excessivo para ressarcir o dano efectivo dos autores e para sancionar a culpa pelo incumprimento.
     A ré alegou e provou que se esforçou por cumprir e que os autores vão receber uma fracção autónoma de um imóvel idêntica à que a ré lhe entregaria e por preço também idêntico.
     
     Da redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado.
     “A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…” (art. 801º, nº 1 do CC).
     Os autores estão há cerca de 10 anos privados do imóvel que pretendiam adquirir e continuarão privados por mais algum tempo, que se desconhece. Tal privação de uso impediu que nele morassem, que o arrendassem, que o cedessem gratuitamente, etc. A indemnização correspondente ao sinal (HKD1.260.000,00, equivalentes MOP1.297.800,00) não pode, a qualquer luz, considerar-se manifestamente superior ao dano da privação do uso e da disponibilidade.
     Não procede, pois, a pretensão da ré de ver reduzido por juízos de equidade o valor da indemnização determinado pelo valor do sinal.
     
     Da indemnização do dano efectivo, denominado dano excedente.
     Por regra, o montante da obrigação de indemnizar em consequência de incumprimento contratual deve corresponder ao valor do dano efectivo, ou seja, o dano ocorrido que tem nexo de causalidade com o incumprimento (arts. 556º a 558º do CC). Se, porém, as partes estipularem sinal, a indemnização só deve corresponder ao dano efectivo se assim for convencionado, situação que aqui não releva, ou se esse dano efectivo for consideravelmente superior ao valor do sinal (art. 436º, nº 4 do CC).
     Os autores alegaram ter tido um dano de MOP7.638.434,18 decorrente do incumprimento e adveniente do preço que pagaram e das despesas que suportaram para adquirir a sua posição contratual no contrato incumprido, e da privação do aumento do valor de mercado do imóvel que pretendiam adquirir.
     Mais detalhadamente, os autores pretendem ser indemnizados pelos seguintes danos:
     4- Preço que pagaram para adquirir a posição contratual (MOP5.417.800,00).
     5- Despesas com formalização do contrato de cessão da posição contratual e com pagamento do imposto do selo (400,00 + 43.260,00 + 203.049,00 = MOP246.709,00).
     6- Privação da valorização do imóvel ou diferença do valor de mercado do imóvel entre o preço que os autores adquiriram a posição contratual de promitentes compradores e o valor actual do imóvel (10.419.925,18 – 8.446.000,00 = MOP1.973.925,18).
     
     A ré, embora por outras palavras, entende que o dano relativo ao preço não tem nexo de causalidade com o incumprimento contratual. Entende, também por outras palavras, que, estando a RAEM disposta a devolver o imposto do selo aos autores, se estes não o foram receber, quebraram o nexo causal entre o facto lesivo e o respectivo dano e não ocorre obrigação de indemnizar relativamente a esta despesa de imposto.
     
     Vejamos.
     Quanto ao preço pago pelos autores pela cedência da posição contratual de promitentes-compradores.
     Os autores adquiriram a posição de promitentes-compradores pagando o equivalente a MOP5.417.800,00. Dizem que este pagamento é um dano. Porém, adquiriram o direito de obter um imóvel na condição de pagarem ainda a parte do preço acordado que o cedente ainda não havia pago, correspondente a MOP3.028.200,00. Neste momento, os autores têm o direito de adquirir imóvel semelhante à sociedade “Macau ......” pagando o preço equivalente a MOP4.326.000,00.
     O cálculo da indemnização obtém-se por comparação entre a situação que o lesado tem e a que teria se não fosse a lesão (arts. 556º a 558º do CC).
      Já atrás se falou na privação do uso do imóvel, enquanto dano. O dano dos autores é ainda a diferença entre o que vão ter de pagar à sociedade Macau ...... e o que iriam pagar à ré (MOP4.326.000,00 – MOP3.028.200,00 = MOP1.297.800,00). Mas não é o que pagaram ao cedente, pois este valor seria sempre pago, quer a ré cumprisse, quer a ré não cumprisse. Na situação em apreço, em que os autores apenas têm de pagar mais do que teriam de pagar se a ré cumprisse a sua obrigação e apenas poderão usufruir do imóvel prometido alguns anos mais tarde do que usufruiriam se a ré tivesse cumprido, o dano dos autores é apenas a privação temporária do uso e a diferença do que terão de pagar.
     Afigura-se óbvio que não é um dano o preço que pagaram para adquirir a situação contratual em que se encontram.
     Improcede, pois esta parte da pretensão dos autores.
     
     Quanto à privação do aumento do valor de mercado.
     Este dano não se provou. Com efeito, provou-se que os autores irão receber um imóvel semelhante ao prometido, pelo que, quando o receberem, terão o valor de mercado que teriam se a ré tivesse cumprido.”
    
*
    Um argumento lateral, neste recurso a Ré veio a defender:
    “(…)
     51. As consequências são as do artigo 784º/1 do CC: o interessado na aquisição fica desobrigado da contraprestação e pode exigir a restituição do valor que entregou ao alienante, em singelo, nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa, conforme o estipulado nos artigos 467º e 473º/1 do CC.
     52. A Recorrente recebeu HKD1.360.000,00, pelo que, salvo melhor opinião, na perspectiva da Recorrente, o quantum final da indemnização a arbitrar cifra-se neste mesmo valor, acrescido dos respectivos juros de mora.
     53. Subsidiariamente a Recorrente pediu que a indemnização fosse arbitrada com base na equidade, tendo a douta sentença recorrida considerado ser essa a solução jurídica adequada para a aferição do alegado dano da privação do uso do imóvel e arbitrado uma indemnização a esse título no valor de HKD1.300.000,00.
     54. No entanto, salvo melhor opinião, uma vez que este dano não corresponde ao dano excedente a que faz menção o nº 4 do artigo 436º do CC, não pode o mesmo ser incluído na obrigação de indemnização a cargo da Recorrente, uma vez que decorre claramente deste preceito legal que a indemnização no montante correspondente ao dobro do sinal esgota a obrigação de indemnização, excluindo da sua esfera, portanto, qualquer outra componente indemnizat6ria.
     55. O mesmo vale, salvo melhor opinião, para a indemnização correspondente às despesas que os Recorridos pagaram à Recorrente, no valor de MOP43.660,00, igualmente arbitrada a favor dos primeiros.
    56. Deste modo, ressalvado diverso entendimento, caso se entenda que a indemnização a arbitrar não deve seguir as regras do enriquecimento sem causa com a consequente fixação do seu montante em HKD1.260.000,00, não deve a mesma ultrapassar o montante deHKD2.520.000,00.
    É de verificar-se que o valor diferencial não é muito significativo, comparando-se o valor indemnizatório total fixado na sentença recorrida e o que a Ré aceite e defende na conclusão do recurso, e porque foi feito apelo ao critério de equidade, na ausência de elementos que demonstrem a manifesta injustiça do valor arbitrado no caso em apreciação, tal valor não se deve alterado.
    
    Quanto ao demais, é de verificar-se que nesta parte, todas as questões levantadas pelas partes já foram objecto de reflexões e decisões por parte do Tribunal recorrido e, nesta sede de recurso concluímos, em face da argumentação acima transcrita, o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis (apesar de, em alguns aspectos, os pontos de vistas não serem totalmente coincidentes, tal não afecta o mérito da decisão), tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de manter a decisão recorrida.
    
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    Face ao exposto, é de negar provimento aos recursos, respectivamente interposto peles Autores e pela Ré, mantendo-se a decisão recorrida.
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    Síntese conclusiva:
    I - A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC), qualificação esta que determina o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CCM).
    II - A qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais.
    III - A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CCM). Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Numa situação em que, tal como se detecta no caso dos autos, se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis (porque se usam expressões diversas, tais como “contrato-promessa de compra e venda” “prometer comprar e “prometida venda”, “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”), a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 2**º do CCM).
    IV – O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico, sendo nesta perspectiva, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial. Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes. Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
    V - No caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CCM que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”. Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CCM).
    VI - O artigo 801º/-1 do CCM manda que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”, normativo este que rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento.
    VII - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas. A equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto.
    VIII - Por regra, a indemnização fundada no incumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido. Nesta óptica, o regime de restituição do sinal em dobro em matéria de contrato-promessa pode classificar-se como um regime especial.
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    Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento aos recursos, mantendo-se a sentença recorrida nos seus preciso termos.
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    Custas pelas Partes em partes iguais.
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    Registe e Notifique.
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RAEM,17 de Julho de 2025.

(Relator)
Fong Man Chong

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
1 Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume II, 11ª edição, pgs. 117.
2 “… o não cumprimento definitivo, que é o resultado de uma impossibilidade definitiva de cumprir, não tem de derivar de uma impossibilidade absoluta de cumprir, no sentido de não poder em caso algum desaparecer. … A impossibilidade da prestação considera-se definitiva não apenas quando toda a probabilidade da sua remoção está excluída, mas também quando ela só pode ser removida mediante circunstâncias especiais que não são de esperar de antemão. … Isto é o mesmo que dizer que também é definitiva a impossibilidade que só possa cessar por um facto extraordinário com que não seja legítimo contar” - Vaz Serra, RLJ, Ano 100º (1967 – 1968), p. 254.
3 Meneses Cordeiro, Tratado de Direito Civil, volume IX, 2ª edição, p. 324.
4 Neste sentido, Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 2º Volume, 1988, p. 170.
5 Prof. Manuel Trigo, Lições de Direito das Obrigações, p. 580.
6 Desde há muito que tem havido tentativas doutrinais de restringir o princípio da culpa em matéria de imputação ao devedor da impossibilidade da prestação. Baptista Machado (Risco Contratual e Mora do Credor, Obra Dispersa, Vol. I) apela a uma distribuição do risco contratual em caso de malogro do plano negocial por superveniência da impossibilidade da prestação. Menezes Cordeiro, sensível à evolução alemã em matéria de impossibilidade da prestação, invoca em termos esquemáticos uma graduação especial e reforçada do dever de diligência do devedor com vista à obtenção do objecto da prestação (Tratado de Direito Civil, volume IX, 2ª edição, p. 329 a 333). Sob a epígrafe “Novas tensões em torno do princípio da culpa?”, Catarina Monteiro Pires (Impossibilidade da prestação, pgs. 622 a 638), embora não o afirmando, chega a equacionar para o Direito alemão actual e para o Direito português o que designa por “despedida do princípio da culpa” e o que designa também por coexistência com outros critérios de imputação ao devedor da impossibilidade da sua prestação.
7 Só faz sentido falar de culpa perante actos ilícitos – Pessoa Jorge, Ensaio Sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, 1995, p. 317.
8 Lapidarmente, escreve Pessoa Jorge (Ensaio Sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, p. 337: “O que o legislador quis foi excluir, como critério de definição do comportamento devido, a diligência psicológica habitual do agente”.
9 “Como definir então se uma conduta é culposa? Pela diferença entre o comportamento exigível… e o comportamento adoptado no caso concreto” - Alberto de Sá e Mello, “Critérios de apreciação da culpa na responsabilidade civil: breve anotação ao Regime do Código” in Revista da Ordem dos Advogados, sem n.º, ano 49, setembro 1989, Lisboa, p. 535, também acessível em https://www.oa.pt/upl/%7Ba2b9529f-1b59-4cec-94ff-b02dab234224%7D.pdf.
10 O disposto no art. 481º do CC aponta para que esse momento seja aquele em que o acto ilícito (danoso) ocorreu. No mesmo sentido, Alberto de Sá e Mello, op. cit. p. 527.
11 “A imputabilidade não se verifica, então, no momento da prática do facto, mas no momento da colocação das suas causas” – Prof. Cavaleiro de Ferreira, Direito Penal, Vol. II, pgs. 34 a 37 (Edição AAFDL 1962).
12 Pessoa Jorge, Ensaio Sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, 1995, p. 135.
13 A propósito da impossibilidade superveniente da prestação por facto de terceiro estranho ao cumprimento, escreve Pessoa Jorge (op. cit., pg. 136): “... só há impossibilidade exoneratória se o comportamento do terceiro reunir as caracterísicas do caso fortuito ou de força maior: assim, se o devedor podia e devia ter previsto e evitado a sua actuação, não lhe é lícito invocar o impedimento por ele criado”.
O mesmo autor escreve também que não releva o facto de o comportamento de terceiro que impossibilita a prestação ser ele próprio ilícito e culposo ou ser lícito e não censurável.
14 Não está em causa considerar a ré responsável perante o autor pelos actos da RAEM, quer nos termos do art. 789º, nº 1, quer por qualquer culpa in eligendo, pois que a RAEM não tem a qualidade pressuposta no referido normativo, nem foi escolhida pela ré.
15 Também o credor está obrigado a proceder de boa fé no exercício do seu direito de crédito (art. 752º, nº 2 do CC), designadamente não lhe sendo lícito em certas circunstâncias recusar sem razão prestação semelhante à prestação devida que o devedor ofereça. No caso dos autos a ré alegou que propôs ao autor entregar-lhe outra fracção autónoma de entre as que tinha e que o autor escolhesse. Na dificuldade/impossibilidade de cumprir que a ré experimentou, ao autor poderia não ser lícito recusar se a fracção oferecida satisfizesse o interesse contratual, o que se desconhece, designadamente quanto a área, localização e preço da fracção devida e da oferecida.
16 “A auto-condução a um estado de” impossibilidade previsível de cumprir “corresponderia já a uma violação do dever … de cuidado, temporalmente dissociada da verificação do resultado” (impossibilidade efectiva de cumprir) – adaptação do texto de Teresa Quintela de Brito, Crime Praticado em Estado de Inimputabilidade Auto-provocada…, 1991, p. 155.
17 “Este é o processo de qualificação próprio da doutrina dos elementos do contrato: a verificação da existência no contrato de todos os elementos essenciais do tipo determina a qualificação… Na doutrina tipológica, a qualificação não constitui um processo de subsunção a um conceito, mas de correspondência do contrato ao um tipo” – Pedro Pais de Vasconcelos, Contratos Atrípicos, 2ª edição, p. 166.
18 “A qualificação de um certo contrato como deste ou daquele tipo tem consequências determinantes no que respeita à vigência da disciplina que constitui o modelo regulativo do tipo. Como direito injuntivo e como direito dispositivo, o modelo regulativo do tipo dá sempre um contributo importantíssimo para a disciplina do contrato julgado típico” - Pedro Pais de Vasconcelos, op. cit., loc. cit.
19 “Tratar-se-á … de questão de interpretação das declarações de vontade das partes, a resolver segundo a … doutrina da impressão do destinatário…” Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 11ª edição, p. 24.
20 “…haveria, nos contratos mistos, que descobrir qual o elemento típico relevante. A regulamentação global seria a própria desse elemento” – Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 1º Volume, 1987, p. 427.
21 Um elemento natural ou típico do conteúdo do contrato-promessa para Manuel Trigo, Lições de Direito das Obrigações, p. 144. Um acto jurídico real quoad constitutionem, podendo constituir uma cláusula acessória de um negócio jurídico para Nuno Manuel Pinto Oliveira, Ensaio Sobre o Sinal, págs. 10 e 11.
22 Acórdão do Venerando TSI de 04/04/2019, proferido no processo nº 327/2017, Relator: Dr. Fong Man Chong, acessível em www.court.gov.mo e João Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 11ª edição, p. 94.
23 “…a indemnização pelo dano excedente constituiria a indemnização pelo dano efectivo …” - Professor Manuel Trigo, Uma Mudança de Paradigma: A Indemnização pelo Dano Excedente, em Especial nos Casos de Perda do Sinal ou de Pagamento do Dobro Deste e a Jurisprudência Recente (estudo em homenagem a João Calvão da Silva), Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, Ano XXV, nº 49, 2021, p. 151.
24 Assim, também Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, 1990, p. 730. E, do mesmo autor, “A Cláusula Penal no Ordenamento Jurídico de Macau”, Um Diálogo Consistente, Olhares Recentes Sobre Temas do Direito Português e de Macau, 2016, Vol. I, Edição da Fundação Rui Cunha, pgs. 38 e 39 – “Ora, qual será o critério que deve pautar a actuação do juiz, quer para decidir se pode reduzir a pena, quer para determinar, simultaneamente, em caso afirmativo, a medida dessa redução?
Naturalmente que a diferença entre o valor do prejuízo efectivo e o montante da pena é, desde logo, o primeiro factor, de cariz objectivo, a considerar”.
25 Ac do STJ, Proc. 3292/20.5TBLRA/C1.S1., de 11/02/2025.
26 Sobre o princípio da completude da motivação da decisão judicial ditado, pela necessidade da justificação cabal das razões em que se funda, com função legitimadora do poder judicial, vide acórdão do STJ, de 17-01-2012, relatado pelo Exm.º Juiz Cons. Gabriel Catarino, no processo n.º 1876/06.3TBGDM.P1 .S1, disponível na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj
27 Um elemento natural ou típico do conteúdo do contrato-promessa para Manuel Trigo, Lições de Direito das Obrigações, p. 144. Um acto jurídico real quoad constitutionem, podendo constituir uma cláusula acessória de um negócio jurídico para Nuno Manuel Pinto Oliveira, Ensaio Sobre o Sinal, págs. 10 e 11.
28 Acórdão do Venerando TSI de 04/04/2019, proferido no processo nº 327/2017, Relator: Dr. Fong Man Chong, acessível em www.court.gov.mo e João Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 11ª edição, p. 94.
29 “…a indemnização pelo dano excedente constituiria a indemnização pelo dano efectivo …” - Professor Manuel Trigo, Uma Mudança de Paradigma: A Indemnização pelo Dano Excedente, em Especial nos Casos de Perda do Sinal ou de Pagamento do Dobro Deste e a Jurisprudência Recente (estudo em homenagem a João Calvão da Silva), Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, Ano XXV, nº 49, 2021, p. 151.
30 Assim, também Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, 1990, p. 730. E, do mesmo autor, “A Cláusula Penal no Ordenamento Jurídico de Macau”, Um Diálogo Consistente, Olhares Recentes Sobre Temas do Direito Português e de Macau, 2016, Vol. I, Edição da Fundação Rui Cunha, pgs. 38 e 39 – “Ora, qual será o critério que deve pautar a actuação do juiz, quer para decidir se pode reduzir a pena, quer para determinar, simultaneamente, em caso afirmativo, a medida dessa redução?
Naturalmente que a diferença entre o valor do prejuízo efectivo e o montante da pena é, desde logo, o primeiro factor, de cariz objectivo, a considerar”.
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