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Processo nº 623/2025/A
(Suspensão de Eficácia)

Data: 04 de Setembro de 2025
Requerente: A
Entidade Requerida: Secretário para a Segurança
*
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO
  
  A, com os demais sinais dos autos,
  vem requerer a suspensão de eficácia do despacho do Secretário para a Segurança de 04.06.2025 que declarou a nulidade da autorização de residência concedida ao Requerente.
  Para tanto alega o Requerente que enquanto residente de Macau havia requerido a concessão da nacionalidade Chinesa sendo que no decurso desse processo foi notificado para apresentar a renuncia à nacionalidade paquistanesa que tinha, o que fez, pelo que não lhe sendo concedida a nacionalidade chinesa fica na situação de apátrida não podendo sair da RAEM por não ter documento algum de identificação.
  Mais alega que perdendo a qualidade de residente da RAEM não pode continuar a exercer a sua actividade profissional, não tendo economias e em consequência não podendo prover ao seu sustento nem da sua família o que constitui um custo pessoal, emocional e social que não é passível de contabilização e que se traduz em prejuízo de difícil reparação.
  Pelo que, não determinando a suspensão grave lesão do interesse público e não sendo manifesta a falta de fundamento do recurso contencioso, entende estarem verificados os pressupostos para que seja decretada a suspensão do acto.
  
  Citada a Entidade Requerida para contestar veio esta fazê-lo invocando que o Requerente não demonstra em que é que consistem os prejuízos de difícil reparação que invoca e que estando em causa interesses meramente patrimoniais podem os mesmos ser ressarcidos através de acção indemnizatória, concluindo pela improcedência do pedido.
  
  Pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público foi emitido o seguinte parecer:
  «1.
  A, melhor identificado nos autos, veio instaurar o presente procedimento cautelar de suspensão de eficácia do acto praticado pelo Secretário para a Segurança, datado de 4 de Junho de 2025, através do qual foi declarada a nulidade da sua autorização de residência na Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China (RAEM) e das suas renovações.
  A Entidade Requerida, devidamente citada, apresentou contestação.
  2.
  (i)
  Decorre do disposto no artigo 121, no.1 do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), que a suspensão de eficácia dos actos administrativos que tenham conteúdo positivo ou que, tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva é concedida quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto causar previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso contencioso;
b) A suspensão de eficácia não determinar grave lesão do interesse público concretamente produzido pelo acto;
c) Não resultarem do processo fortes indícios de ilegalidade do recurso contencioso.
  Estes requisitos do decretamento da providência cautelar da suspensão de eficácia são de verificação cumulativa, bastando, por isso, a não verificação de um deles para que, sem prejuízo, no entanto, do disposto nos nos 2, 3 e 4 do citado artigo 121 do CPAC, tal decretamento resulte inviável (assim, entre outros, o Ac. do Tribunal de Última Instância de 4.10.1999, processo no.90/2019).
  (ii)
  No caso, parece-nos que o acto administrativo suspendendo, apesar de meramente declarativo, tem, em virtude de implicar uma efectiva alteração na prévia situação jurídica do Requerente, um conteúdo positivo.
  Além disso, de modo algum se pode ter por ostensivo ou manifesto que a suspensão de eficácia do acto represente, a ser decretada, grave lesão para o interesse público concretamente prosseguido pelo acto, pelo que, face à falta da alegação a que se refere o no.1 do artigo 129 do CPAC, se pode dizer preenchido o requisito da providência a que alude a alínea b) do no.1 do artigo 121 do CPAC.
  Do mesmo modo, do processo não resultam fortes indícios de ilegalidade do recurso contencioso, mostrando-se assim verificado o requisito previsto na alínea c) do no.1 do artigo 121 do citado diploma legal.
  (iii)
  Controvertida é a questão de saber se, no caso, se mostra preenchido o requisito do decretamento da suspensão de eficácia que se refere a alínea a) do no.1 do artigo 121 do CPAC, ou seja, saber se da execução do acto resultará, previsivelmente, prejuízo de difícil reparação para o Requerente.
  Parece-nos que não.
  (iii.1)
  Como referiu o Tribunal de Última Instância de 14.11.2009, tirado no processo no.33/2009, “não se pode paralisar a actividade da Administração se o requerente não alegar e provar sumariamente que a execução do acto lhe causa prejuízo de difícil reparação.”
  Por outro lado, sobre o que deve entender-se por prejuízo de difícil reparação, no mesmo douto acórdão, o TUI teve oportunidade de definir o seguinte: “mesmo que o interessado sofra danos com a execução de um acto administrativo, se lograr obter a anulação do acto no respectivo processo, pode, em execução de sentença, se indemnizado nos prejuízo sofridos. E se esta via não for suficiente pode, ainda, intentar acção de indemnização para ressarcimento dos prejuízos. Por isso, só se os prejuízos forem de difícil reparação, isto é, que não possam ser satisfeitos com a utilização dos falados meios processuais, é que a lei admite a suspensão de eficácia do acto.”
  Além disso, o nosso mais alto Tribunal tem igualmente vindo a decidir no sentido de que cabe ao requerente da suspensão de eficácia o ónus de alegar e provar os factos integradores do conceito de prejuízo de difícil reparação, fazendo-o de forma concreta e especificada (veja-se, por exemplo, os acórdãos do Tribunal de Última Instância de 26.2.2020, processo no.136/2019, de 7.7.2021, processo no.57/2021 e de 22.2.2023, processo no.9/2023).
  (iii.2)
  Tendo isto presente, estamos modestamente em crer que o Requerente não demonstrou, ainda que de forma sumária, que os prejuízos que, segundo diz, para si resultarão da execução do acto são irreparáveis ou de difícil reparação, à luz do critério jurisprudencial acima referido (veja-se, no mesmo sentido, o decidido pelo Tribunal de Última Instância no acórdão de 6.7.2022, processo no.72/2022).
  Na verdade, o Requerente limitou-se a alegar, em síntese, que ele ficará sem a titularidade do Bilhete de Identidade-de Residente Permanente da RAEM se o acto suspendendo for executado, daí resultará para ele a perda do emprego na RAEM, e consequentemente não podia sustentar a sua vida e a da sua família - esposa e filho não biológico, mais ainda, não podia voltar para a sua terra natal, por já tinha renunciado à nacionalidade paquistanesa, apresentando como prova o certificado de renúncia à nacionalidade paquistanesa e o conteúdo do e-mail enviado pelo Consulate General of the Islamic Republic of Pakistan de Hong Kong em Janeiro de 2021.
  Todavia, nada disto se encontra minimamente substanciado de modo a permitir ao Tribunal concluir que ocorre o falado prejuízo irreparável.
  Na verdade, uma coisa é sofrer prejuízos e incómodos em virtude da execução de um acto administrativo. Outra coisa, diferente, é esses prejuízos serem irreparáveis ou de difícil reparação a justificarem, por isso, a neutralização, pelo menos temporária, da eficácia desse acto. Aliás, segundo entendimento jurisprudencial consolidado, “mesmo que o interessado sofra danos com a execução de um acto administrativo, se lograr obter a anulação do acto no respectivo processo, pode, em execução de sentença, ser indemnizado dos prejuízos sofridos. E se esta via não for suficiente pode, ainda, intentar acção de indemnização para ressarcimento dos prejuízos. Por isso, só se os prejuízos forem de difícil reparação, isto é, que não possam ser satisfeitos com a utilização dos falados meios processuais, é que a lei admite a suspensão da eficácia do acto.” (assim, por todos, o acórdão do Tribunal de Última Instância de 14.11.2009).
  Acresce que, no caso, o acto que declaraou a nulidade da autorização da residência se fundou na condenação criminal do Requerente em virtude de ter celebrado “casamento falso” com o objectivo de obter a autorização de residência pelo que não poderá deixar de viver com as consequências dessa actuação.
  Finalmente, também não nos parece que o regresso do Requerente à sua terra natal possa ser impossível, com um e-mail enviado pelo Consulate General of the Islamic Republic of Pakistan de Hong Kong em Janeiro de 2021, que por si só, não represente um prejuízo irreparável.
  Conclui-se, a nossa ver, que o Requerente não se desincumbiu do ónus que sobre recaía de alegar factos concretos susceptíveis de consubstanciar o prejuízo irreparável que a lei exige para que o tribunal possa decretar a suspensão da eficácia de um acto administrativo.
  Neste conspecto, parece-nos, pois, que se não demonstra estar preenchido o pressuposto do decretamento da providência a que se refere a alínea a) do no.1 do artigo 121 do CPAC.
  3.
  Pelo exposto, salvo melhor opinião, parece ao Ministério Público que deve ser indeferido o pedido de suspensão de eficácia.».
  
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
  
  O Tribunal é o competente.
  O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.
  As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas.
  Não existem outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.
III. FUNDAMENTAÇÃO

1) Factos

a) Por despacho do Exmº Secretário para a Segurança de 04.06.2025 com base nos fundamentos no relatório complementar nº 300054/SRDARPREN/2025P foi declarada nula a autorização de residência concedida ao Requerente em 06.09.2013, com os seguintes fundamentos:
Parecer:
Aprovo o parecer do Chefe do Departamento para os Assuntos de Residência e Permanência, substituto.
À apreciação do então Secretário para a Segurança.
B
o comandante do CPSP, substituto
(ass.: vd. original)
Aos 28/05/2025

1. Ao interessado A, de nacionalidade paquistanesa, foi concedida a autorização de residência em Macau em 06/09/2013, para que se reunisse com a cônjuge residente de Macau C. Mais tarde renovou-se-lhe a autorização até 05/09/2020.
2. De acordo com o acórdão do TSI de 20/03/2025 já transitado em julgado, o interessado A e C celebraram um casamento falso em Paquistão de papel passado, para pedir autorização de residência em Macau. Além disso, o interessado declarou-se mentirosamente o pai do D (filho do irmão mais velho dele e da C). O TJB sentenciou em 30/06/2023 e o interessado foi condenado a 2 anos e 6 meses de pena de prisão pelo “crime de falsificação de documentos” p. e p. pelo art.º 18.º, n.º 2 da Lei n.º 6/2004, cometido em coautoria material e de forma consumada; além disso, foi condenado a 1 ano e 6 meses de pena de prisão pelo “crime de falsificação de documento de especial valor” p. e p. pelo art.º 244.º, n.º 1, alínea b) do CP conjugado com o art.º 245.º, cometido em coautoria material e de forma consumada; em cúmulo das duas penas aplicadas, foi condenado a 3 anos de pena de prisão efectiva. Mais tarde, o TSI modificou-lhe a decisão, mandando suspender a execução da pena de prisão na medida de 3 anos.
3. O que o interessado fez causou à decisão de deferimento do seu pedido de autorização de residência o vício de erro nos pressupostos de facto, para além de introduzir actos ilícitos na tomada da decisão. Por isso, é de declarar nulas as decisões de concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao interessado.
4. Na audiência escrita, o mandatário do interessado alegou sinteticamente que apesar dos dois crimes de “falsificação de documentos” (casamento falso e falsas declarações sobre a identidade), o interessado mantinha a relação conjugal com C, com quem vivia e que os dois juntos tomavam conta do filho que não era do interessado.
5. Eis a nossa análise e a proposta fundamentadas em tudo quanto informam os autos:
1) O pressuposto e requisito principal dos actos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao interessado foi o casamento que o interessado A celebrou com C. O TSI provou, no entanto, que era falso o casamento que o interessado celebrara com C. Estando em causa facto ilícitos, trata-se de um acto nulo cujo objecto constitui crimes.
2) Resultou da audiência escrita que era insuficiente a justificação apresentada pelo mandatário do interessado, sobretudo no que diz respeito ao alegado erro de facto de que a decisão administrativa padecia. Na sentença do tribunal está provado que o interessado enganou as Autoridades e obteve a “autorização de residência” através de um casamento falso celebrado na altura (ano 2013). As suas alegações não conseguiram desmentir os factos dados por assentes pelas Autoridades sobre o casamento falso que o interessado A celebrara com C.

Nesta conformidade, propõe-se declarar, nos termos do art.º 122.º, n.º 2, alínea c) do CPA, nulos logo desde o início os actos administrativos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao interessado A; bem como notificar a DSI, para acompanhamento e tratamento do caso.

À apreciação e consideração do Sr. Comandante.
Aos 23/05/2025
O Chefe do Departamento para os Assuntos de Residência e Permanência, substituto
(ass.: vd. o original)
O Subintendente E
Despacho:

Concordo, proceda-se conforme proposto.

O Secretário para a Segurança,
WONG SIO CHAK
(ass.: vd. original)
04/06/2025

Gabinete do Secretário para a Segurança

A presente fotocópia foi extraída do original.

Macau, 07/08/2025
O Chefe do Gabinete
(ass.: vd. original)

Assunto: declaração de nulidade da concessão de autorização de fixação de residência
Relatório complementar n.º 300054/SRDARPREN/2025P
Data: 15/05/2025
1. Conforme o despacho do então Secretário para a Segurança de 06/09/2013, concedeu-se autorização de fixação de residência na RAEM ao interessado A, de nacionalidade paquistanesa, para que se reunisse com o cônjuge residente de Macau C. Mais tarde renovou-se-lhe a autorização até 05/09/2020. (Já se perfizeram sete anos seguidos da autorização de fixação de residência)
【dos autos】
2. No período que vai de 05/2019 a 05/2021, através de correios trocados com a PJ, tomou-se conhecimento de um caso de “crime de falsificação de documento de especial valor” (casamento falso) em que estavam envolvidos cinco indivíduos chamados F, G, A (o interessado), C e H. Concluída a investigação, os indivíduos constituídos como arguidos foram detidos e entregues ao MP para inquérito e tratamento. (P. 230-240)
3. No período que vai de 07/2021 a 04/2022, pediram informações ao MP através de correios sobre o acompanhamento do caso. Segundo a resposta de 31/05/2022, já acusaram o interessado e o caso foi remetido para o TJB para julgamento (processo n.º CR3-21-0248-PCC). Junto se mandou a acusação (OU KIM IENG SOU n.º 2298/2021), segundo a qual no início de 2013, o irmão mais velho do interessado pediu que a C ajudasse o seu irmão mais novo A, de modo que pudesse vir a Macau fixar a residência, através de casamento falso. Por obra do irmão mais velho do interessado, os dois casaram-se em 02/03/2013 em Paquistão e com base nisso, pediu-se a autorização de fixação de residência na RAEM. De resto, D, filho do irmão mais velho do interessado e da C, nasceu em 21/06/2013. Por obra do irmão mais velho do interessado e com conhecimento da C, o interessado A, mentindo ser o pai, tratou do registo de nascimento para D. Sendo o casamento falso, o interessado e a C têm vivido separados em Macau. O interessado foi acusado do “crime de falsificação de documentos” p. e p. pelo art.º 18.º, n.º 2 da Lei n.º 6/2004, cometido em (co-)autoria material e de forma consumada e do “crime de falsificação de documento de especial valor” p. e p. pelo art.º 244.º, n.º 1, alínea b) do CP conjugado com o art.º 245.º do mesmo Código. (P. 241-248)
4. No período que vai de 06/2022 a 07/2023, pediram informações ao TJB através de correios sobre o julgamento do caso do interessado. Segundo a resposta de 13/09/2023, o interessado recorrera da sentença proferida, pelo que a decisão ainda não transitara em julgado. Em seguida a 11/10/2023, receberam a sentença proferida pelo Juízo Criminal do TJB (n.º CR3-21-0248-PCC), segundo a qual em 2011 a C conheceu através de amigos o irmão mais velho do interessado F. Enamoraram-se. Em 10/2012 a C ficou grávida com filho do irmão mais velho do interessado. No início de 2013 o irmão mais velho do interessado solicitou ajuda à C para que o seu irmão mais novo A viesse fixar residência a Macau através de casamento falso, induzindo o governo da RAEM em erro que viria a emitir o BIRM ao interessado. De resto, D, filho do irmão mais velho do interessado e da C, nasceu em 21/06/2013. Por obra do irmão mais velho do interessado e com conhecimento da C, o interessado A, mentindo ser o pai, tratou do registo de nascimento para D. Sendo o casamento falso, o interessado e a C têm vivido separados em Macau. O interessado foi condenado a 2 anos e 6 meses de pena de prisão pelo “crime de falsificação de documentos” p. e p. pelo art.º 18.º, n.º 2 da Lei n.º 6/2004, cometido em coautoria material e de forma consumada; além disso, foi condenado a 1 ano e 6 meses de pena de prisão pelo “crime de falsificação de documento de especial valor” p. e p. pelo art.º 244.º, n.º 1, alínea b) do CP conjugado com o art.º 245.º; em cúmulo das duas penas aplicadas, foi condenado a 3 anos de pena de prisão efectiva. (P. 249-286)
5. No período que vai de 25/01/2024 a 10/02/2025, pediram informações ao TSI através de correios acerca da decisão sobre caso do interessado. Segundo a resposta de 24/03/2025, proferiu-se o acórdão que transitou em julgado em 20/03/2025. Anexou-se o acórdão, segundo o qual em 23/01/2025 o TSI concedeu provimento parcial ao recurso interposto pelo recorrente, anteriormente condenado a 2 anos e 6 meses de pena de prisão pelo “crime de falsificação de documentos” p. e p. pelo art.º 18.º, n.º 2 da Lei n.º 6/2004 e a 1 ano e 6 meses de pena de prisão pelo “crime de falsificação de documento de especial valor” p. e p. pelo art.º 244.º, n.º 1, alínea b) do CP conjugado com o art.º 245.º e em cúmulo das duas penas aplicadas, condenado a 3 anos de pena de prisão efectiva; o TSI modificou-lhe a decisão, mandando suspender a execução da pena de prisão na medida de 3 anos. (P. 287-316)
【audiência escrita】
6. O pressuposto e requisito principal dos actos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida foi o casamento que o interessado A celebrara com C. O tribunal provou, no entanto, que era falso o casamento que o interessado celebrara com C. Durante os actos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao interessado ocorreram os actos ilícitos. É de, portanto, declarar, nos termos do art.º 122.º, n.º 2, alínea c) do CPA, nulos os actos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao interessado A.
7. Em 03/04/2025, o nosso Departamento mandou uma nota interna (413/SRDARP/2025P) ao Departamento de Controlo Fronteiriço, pedindo que interceptassem o interessado nos postos de migração, para notificá-lo da audiência escrita. (P. 345 – 347)
8. Em 09/04/2025, notificaram o interessado por correio da intenção do Departamento nos termos do art.º 13.º da Lei n.º 16/2021 e nos termos dos art.º 93.º e art.º 94.º do Código do Procedimento Administrativo. Resulta da página da Internet dos CTT que o correio foi entregue em 14/04/2025; vd. ofício n.º 103541/CPSP-SRDARP/OFI/2025P, ofício n.º 103543/CPSP-SRDARP/OFI/2025P e notificação n.º 200336/SRDARPREN/2025P; o interessado podia expressar-se por escrito a tal respeito no prazo de 15 dias a contar do dia de notificação. (P. 333 – 344)
【alegações】
9. Em 09/05/2025, este Departamento recebeu os seguintes documentos dirigidos pelo Dr. I, mandatário do interessado ao CPSP, reencaminhados pelo Gabinete do Secretário para a Segurança:
– A declaração (P. 328-332) do mandatário do interessado, que dizia essencialmente: “…
1) Cá o mérito da causa é a autorização de fixação de residência, em vez do casamento que o interessado celebrou com seu cônjuge.
2) Apesar dos dois crimes de “falsificação de documentos” (casamento falso e falsas declarações sobre a identidade), o interessado mantinha a relação conjugal com C, com quem vivia e que os dois juntos tomavam conta do filho que não era do interessado. No entanto, incumbia à Administração indagar os factos dados por provados na acção criminal (a actual manutenção de comunhão de vida entre o interessado e C), para apurar se correspondem à realidade; só que a Administração não o fez.
3) A seu ver, a decisão administrativa sobre a declaração de nulidade da concessão e da renovação de autorização de fixação de residência ao interessado padece do vício de erro nos pressupostos de facto e de direito; desejava, portanto, que não dessem prosseguimento à execução da decisão.”
– Fotocópia do certificado de cidadão paquistanês do interessado (emitido em 31/03/2021) (P. 327)
– Fotocópia do ofício mandado pela DSI para o interessado (sobre a aquisição da nacionalidade chinesa – entrega da prova de renúncia à nacionalidade). (P. 326)
– Fotocópia do BIRM permanente do interessado. (P. 325)
– A procuração e a subdelegação do interessado notarialmente reconhecidas. (P. 317 – 324)
【análise sintética】
10. Efectuada a análise sintética, propõe-se o seguinte para o caso em apreço:
– O pressuposto e requisito principal dos actos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao A foi o casamento que o A celebrara com C. O TSI provou, no entanto, que era falso o casamento que A celebrara com C. Durante os actos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao A ocorreram os actos ilícitos de A. Portanto, pretende-se declarar, nos termos do art.º 122.º, n.º 2, alínea c) do CPA, nulos os actos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao A.
– Resultou da audiência escrita que era insuficiente a justificação apresentada pelo mandatário do interessado. Na sentença do tribunal está provado que o interessado enganou as Autoridades e obteve a “autorização de residência” através de um casamento falso celebrado na altura (ano 2013). As suas alegações não conseguiram rebater os factos dados por assentes pelas Autoridades sobre o casamento falso que o interessado A celebrara com C.

Nesta conformidade, propõe-se declarar, nos termos do art.º 122.º, n.º 2, alínea c) do CPA, nulos logo desde o início os actos administrativos da concessão de autorização de residência e de renovação da autorização que fora concedida ao interessado A; bem como notificar a DSI, para acompanhamento e tratamento do caso.

À decisão superior.

O elaborador,
(ass.: vd. original)
J 0XXX81
O Subcomissário K
(ass.: vd. original)
Subdivisão de Residência
Divisão de Autorização de Residência e Permanência


b) Pelo Governo do Paquistão foi emitido certificado a declarar que o Requerente renunciou à cidadania do Paquistão – cf. fls. 92 -;
c) Em Abril de 2025 o Requerente passou a trabalhar a tempo parcial na companhia indicada a fls. 96 e 97 auferindo no total MOP11.000,00.

  Para além dos factos indicados não se provaram quaisquer outros.
  
2) Do Direito
  
  De acordo com o disposto no artº 120º do CPAC «a eficácia dos actos administrativos pode ser suspensa quando os actos:
  a) Tenham conteúdo positivo;
  b) Tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.».
  No caso dos autos o acto em causa declara a nulidade do acto que concedeu ao Requerente o estatuto de residente da RAEM, o qual, por introduzir uma alteração no estatuto de residente do Requerente modificou a ordem jurídica pre-existente, sendo um acto de conteúdo positivo.
  Por sua vez o CPAC no seu artº 121º consagra os requisitos para que a suspensão seja concedida, a saber:
«Artigo 121.º
(Legitimidade e requisitos)
  1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
  a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
  b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
  c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
  2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
  3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
  4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
  5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.».
  
  Vejamos então.
  Como fundamento do despacho cuja suspensão se pede está a condenação do Requerente por falsamente e com o intuito de obter o estatuto de residente da RAEM ter declarado ser casado com uma residente de Macau e ter declarado ser pai do filho desta, situações que não correspondem à verdade.
  Sendo irrelevante para a apreciação dos pressupostos da suspensão do acto os fundamentos em que este se alicerça, dado que não cabe nesta fase de apreciar da sua legalidade, não deixam, no caso concreto, os mesmos de relevar para efeitos de apreciação da argumentação do Requerente.
  Sendo falso o casamento e falsa a paternidade demonstrado está que o Requerente não tem esposa nem filho para sustentar.
  Alega o Requerente que ficou na situação de apátrida por ter renunciado à sua anterior nacionalidade, pelo que o acto agora praticado o coloca numa situação de indocumentado.
  Porém, tal desiderato, como se diz na contestação resultou de uma opção do Requerente e não da prática do acto cuja suspensão se pede pelo que é alheia a este, reforçando-se, se daí resulta algum prejuízo de difícil reparação para o Requerente apenas a si é imputável e não ao acto em causa.
  Mais alega que com a prática do acto em causa perde o emprego que tem ficando sem rendimentos para prover ao seu sustento.
  Contudo, o que resulta dos autos é que o Requerente apenas arranjou dois empregos em tempo parcial dois meses antes do acto em causa ter sido praticado e quando já era expectável que tal viesse a acontecer, desconhecendo-se como vivia antes, admitindo-se que tivesse outras fontes de rendimentos pois de algo haveria de viver.
  Destarte, em face da factualidade apurada não se pode concluir que o Requerente haja demonstrado que da prática do acto possa resultar prejuízo que não possa ser reparado, nomeadamente através de acção de indemnização.
  Assim sendo, acompanhamos o Douto Parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público no sentido de não estar verificado o pressuposto da alínea a) do nº 1 do artº 121º CPAC.
  
  Acompanhamos o parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público de que estão verificados os requisitos das alíneas b) e c) do nº 1 do artº 121º do CPAC, uma vez que não resultam indícios em sentido contrário.
  
  Contudo, sendo os requisitos consagrados no nº 1 do artº 121º do CPAC de verificação cumulativa, na míngua de demonstração do requisito da alínea a) apenas se pode concluir pela improcedência da providência requerida.
  
IV. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos vai indeferido o pedido de suspensão de eficácia do despacho do Secretário para a Segurança de 04.06.2025 que declarou a nulidade da autorização de residência concedida ao Requerente.
  
  Custas a cargo do Requerente fixando-se a taxa de justiça em 4Uc´s.
  
  Registe e Notifique.
  
  RAEM, 04 de Setembro de 2025
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
(Relator)

Seng Ioi Man
(1o Juiz-Adjunto)

Fong Man Chong
(2o Juiz-Adjunto)

Álvaro António Mangas Abreu Dantas
(Delegado Coordenador)

623/2025/A SUPSENSÃO 1