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Processo n.º 437/2025
(Autos de recurso em matéria cível)

Relator: Fong Man Chong
Data: 20 de Novembro de 2025

ASSUNTOS:

- Função do sinal no contrato-promessa de compra e venda e consequência de impossibilidade de cumprimento definitivo de prestação prometida

SUMÁRIO:

I - A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC), qualificação esta que determina o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CCM).
II - A qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais.
III - A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CCM). Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Numa situação em que, tal como se detecta no caso dos autos, se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis (porque se usam expressões diversas, tais como “contrato-promessa de compra e venda” “prometer comprar e “prometida venda”, “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”), a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 228º do CCM).
IV – O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico, sendo nesta perspectiva, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial. Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das partes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes. Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
V - No caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CCM que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”. Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CCM).
VI - O artigo 801º/-1 do CCM manda que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”, normativo este que rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento.
VII - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas. A equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto.
VIII - Por regra, a indemnização fundada no incumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido. Nesta óptica, o regime de restituição do sinal em dobro em matéria de contrato-promessa pode classificar-se como um regime especial.

O Relator,

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Fong Man Chong



Processo nº 437/2025
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 20 de Novembro de 2025

Recorrentes : - A
- B
- C

Recorridos : - Os Mesmos

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   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    A e B, Recorrentes, devidamente identificados nos autos, discordando da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, datada de 13/12/2024, veio, em 20/01/2025, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 1865 a 1874, 1881 a 1883, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. Os Recorrentes assentam a motivação do presente recurso no facto de, na Sentença, o douto Tribunal a quo ter julgado a acção apenas como parcialmente procedente – de forma errada, salvo melhor e fundamentada opinião -, impondo a redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado pelos Recorrentes à Recorrida, bem como a consequente consideração relativa à mora no cumprimento da obrigação de indemnizar da Recorrida, mormente no que concerne à data de início da contagem de juros legais devidos, sendo estes os concretos pontos que enformam, conformam e limitam o objecto do presente recurso, colocando os Recorrentes apenas em crise o quantum indemnizatório atribuído, a ratio subjacente ao mesmo e as consequências extraídas sobre o mesmo em sede de mora e da indemnização moratória devida.
     2. O contrato celebrado entre os Recorrentes e a Recorrida deve ser efectivamente qualificado como um contrato-promessa de compra e venda de imóvel, cujo incumprimento se deve - em exclusivo – à Recorrida.
     3. Perante o contrato-promessa sub judice, presume-se que tem carácter de sinal todas as quantias entregue à Recorrida no âmbito e por conta do mesmo, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço, conforme dispõe o artigo 435.º do Código Civil
     4. Por força do regime do sinal, os Recorrentes têm o direito a exigir o dobro do que foi prestado à Recorrida, nos termos do disposto na 2.ª parte, do n.º 2 do artigo 436.º do Código Civil, após serem abatidas as quantias pagas por esta ao C, conforme decorre da conjugação da factualidade ínsita nos Factos Assentes M) e II).
     5. Assim não entendeu o Tribunal a quo, mal tendo andado neste concreto ponto - sempre com a devida vénia.
     6. Inexiste qualquer motivo passível de justificar a redução da pena convencional determinada na Sentença, alegadamente assente na disposição contida no artigo 801.º do Código Civil, aplicável ex vi do n.º 5 do artigo 436.º do mesmo diploma legal.
     7. Afigura-se aos Recorrentes que parece resultar da tese expendida pelo douto Tribunal a quo a possibilidade de se estar perante uma situação passível de invocação da figura da compensatio lucri cum damno. Não entendem assim os Recorrentes.
     8. É verdade que os Recorrentes, na qualidade de promitentes-compradores de fracção autónoma no projecto imobiliário "Pearl Horízon", se candidataram à compra de uma habitação para troca junto da Macau Renovação Urbana, SA., ao abrigo do Despacha do Chefe do Executivo n.º 89/2019.
     9. Porém, entende a doutrina que a aplicação da compensatio lucri cum damno depende da verificação de diversos requisitos, designadamente (i) o aparecimento de uma vantagem patrimonial no património do lesado; (ii) um nexo de causalidade adequada; (iii) a unidade do título jurídico; (iv) a homogeneidade dos bens a compensar; e (v) o respeito pela autodeterminação do lesado.
     10. De entre estes requisitos, um sobressai a diferença de título jurídico entre o dano e o lucro: o dano resulta da impossibilidade de cumprimento por parte da Recorrida; a vantagem deriva de um acto legislativo da RAEM e de um despacho do Chefe do Executivo, inscritos na execução da política de habitação da RAEM.
     11. Trata-se, por outro lado, de uma vantagem resultante de prestação de terceiro, a RAEM, que tem como destinatário os Recorrentes, sendo a Recorrida totalmente alheia a tal vantagem.
     12. Acresce que o benefício ora em apreço não passa de uma mera expectativa, não havendo ainda uma data previsível para que os Recorrentes possam, finalmente, receber as chaves dessa fracção autónoma e para o fazer, terão de pagar integralmente o preço fixado, não sabendo os Recorrentes sequer se, nessa altura, terão os meios financeiros suficientes para tal.
     13. Para essa incerteza contribui a conduta da Recorrida, que há quase anos retém nas suas contas o avultado sinal pago pelos Recorrentes, mostrando tudo fazer para não ter de o restituir em tempo útil, correndo os Recorrentes o sério risco de perder o direito à fracção autónoma, algo que não poderá deixar de relevar para a aplicação da norma ínsita no artigo 801.º do Código Civil.
     14. Para além disso, tudo o que é análogo entre as duas fracções (a prometida comprar à Recorrida e a de substituição da Macau Renovação Urbana, S.A.) é a tipologia, preço e área. Tudo o resto é diferente, desde os acabamentos aos serviços proporcionados aos condóminos (clube, etc.) até à orientação da fracção autónoma. Do mesmo modo, o valor de mercado que se esperava para as fracções do Pearl Horizon seria substancialmente superior ao valor de mercado da fracção que os Recorrentes poderão vir a receber.
     15. Por outro lado, caso tudo corra bem, os Recorrentes não deverão ter acesso à fracção autónoma da Macau Renovação Urbana, S.A. antes de 2026, ao passo que a fracção que prometeu adquirir à Recorrida dever-lhes-ia ter sido entregue, o mais tardar, até 25 de Dezembro de 2015. Serão mais de 10 anos de atraso.
     16. Este é um dano indemnizável que deveria ter sido levado em consideração pelo Tribunal a quo aquando da cogitação acerca da redução da Indemnização por manifestamente excessiva, com base no regime do n.º 1 do artigo 801.º do Código Civil, aplicável por força do n.º 5 do artigo 436.º do mesmo diploma legal.
     17. Deverá, pois, esse dano ser dado como indemnizado pelo pagamento do sinal em dobro, indemnização essa que, pelas razões aduzidas, nada tem de excessiva, colhendo tal raciocínio respaldo nas conclusões extraídas nos acórdãos proferidos pelo Venrando Tribunal de Segunda Instância, por exemplo, no âmbito dos Processos n.º 205/2024 e 292/2024.
     18. A Recorrida não alegou, nem logrou provar, factos dos quais se pudesse extrair o suposto e aventado excesso manifesto da pena convencional oferecida ao caso sub judice por aplicação do regime do sinal, pelo que a redução equitativa operada pelo Tribunal a quo não deveria ter tido lugar, tendo o Tribunal a quo violado as disposições legais ínsitas no artigo 404.º, no artigo 435.º, no artigo 436.º, n.º 2, 2.ª parte, no artigo 436.º, n.º 5, assim como no n.º 1 do artigo 801.º, todos do Código Civil.
     19. Sendo a Recorrida condenada ao pagamento do dobro do valor por esta recebido a título de sinal, conforme oportunamente peticionado em sede de Petição Inicial pelos Recorrentes, quebrar-se-á a lógica impressa na Sentença, mais concretamente aquela constante do seu Ponto 6, a fls. 1742v. e 1743, uma vez que a obrigação de indemnizar da Recorrida aparece líquida desde a data de citação da Recorrida para a presente acção judicial, conforme decorre do disposto no artigo 794.º, n.º 1 do Código Civil, assim como do artigo 565.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, disposições essas igualmente violadas pelo douto Tribunal a quo.
     Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso, por provado, revogando-se a decisão ínsita na Sentença proferida pelo Tribunal a quo, na específica parte em que determina a redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado, bem como o início da mora no cumprimento da obrigação de indemnizar da Recorrida, substituindo-se por outra que dê pleno cumprimento ao disposto na 2.ª parte do n.º 2 do artigo 436.º do Código Civil, determinando o quantum indemnizatório a oferecer aos Recorrentes no dobro do valor do sinal prestado, acrescido de juros à taxa legal contados desde a data de citação da Recorrida para a presente causa, fazendo V. Exas. dessa forma a costumada e desejada JUSTIÇA!!
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    C, Recorrente, devidamente identificada nos autos, discordando da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, datada de 13/12/2024, veio, em 21/01/2025, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 1754 a 1779, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. Constitui objecto do presente Recurso a, aliás, douta sentença do Tribunal Judicial de Base, que julgou parcialmente procedente a presente acção e condenou a Recorrente no pagamento de uma indemnização aos Recorridos, no montante global de HKD5.696.023,66.
     2. Ocorreu uma impossibilidade jurídica superveniente e definitiva do cumprimento dos contratos em discussão nos presentes autos mas tal impossibilidade não é imputável à Recorrente.
     3. Com efeito, ficou provado que se não fôsse um consumo de tempo além do expectável por parte da DSSOPT, a Recorrente teria conseguido aproveitar o terreno dentro dos prazos de aproveitamento e de concessão contratados e, assim, dar cumprimento aos contratos em apreço.
     4. Uma tal actuação da DSSOPT e da DSPA era imprevisível.
     5. Desde logo, não era previsível que a DSSOPT permanecesse inerte e sem emitir qualquer decisão relativamente ao plano de consulta e ao projecto parcial de arquitectura, apresentados pela Recorrente em Abril e Maio de 2008.
     6. Não era previsível que após a apresentação do projecto global de arquitectura em Outubro de 2009, a DSSOPT emitisse uma Planta de Alinhamento Oficial em Fevereiro de 2010, donde constava um novo condicionamento urbanístico atinente à observância de uma distância mínima entre cada torre, que inviabilizaria o projecto apresentado e que não estava previsto na lei, nem tinha sido anteriormente exigido em Macau.
     7. Não era previsível que após a aprovação do projecto de arquitectura do empreendimento "Pearl Horizon", comunicada à Recorrente em 07/01/2011, a DSSOPT fizesse depender a emissão da licença de construção, da apresentação e aprovação de um Relatório ambiental pela DSPA.
     8. Essa falta de previsibilidade resulta da circunstância de nunca tal exigência ter ocorrido anteriormente a nenhum promotor imobiliário.
     9. E ainda da circunstância de, ao tempo, não existir norma legal ou regulamentar aprovada e em vigor que exigisse esse Relatório Ambiental ou que sugerisse, sequer, que conteúdo pudesse vir a ter de conter.
     10. Muito menos era de esperar que, como se provou, a DSSOPT e a DSPA demorassem quase 3 anos a aprovar esse Relatório num procedimento moroso e ao sabor dos improvisos desses serviços.
     11. Não se pode pretender que uma Administração Pública que está sujeita ao princípio da legalidade (artigo 3.º do CPA) , ao princípio da protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes (artigo 4.º do CPA), ao princípio da justiça e da imparcialidade (artigo 7.º do CPA) e aos princípios da boa fé e da colaboração (artigos 8.º e 9.º do CPA) deve entender-se genericamente como uma pessoa que actua de forma a violar os seus deveres contratuais com os sujeitos com que se relaciona. E que a Recorrente deveria assim ter presumido vir a suceder.
     12. E mesmo quando confrontada com essa exigência inesperada, a Recorrente previu, tal como qualquer bom pai de família no seu lugar o faria, que tal exigência seria rapidamente ultrapassada.
     13. Com efeito, do Ofício de 07/01/2011 constante de fls. 227 e seguintes dos autos, no seu ponto nº 19, parte final, resulta que o Relatório ambiental exigido pela DSSOPT deveria consistir em 4 pontos muito simples.
     14. No entanto, conforme está provado, os Serviços da Administração foram apresentando sucessivas e novas condições ao longo de quase 3 anos, à medida que as anteriores iam sendo cumpridas pela Recorrente, o que era manifestamente imprevisível, mesmo para um bom pai de família.
     15. D'outro passo, a actuação da RAEM sempre seria inultrapassável.
     16. Efectivamente, os serviços da RAEM não emitiriam a licença de construção sem que fosse apresentado o Estudo Ambiental, rectius, sem que fossem apresentadas todas as versões do Estudo Ambiental que foi exigindo ao longo de cerca de 3 anos.
     17. Bem se vê que a DSSOPT e a DSPA não actuaram como parte do contrato de concessão mas sim como Administração Pública, como puissance publique, sob as mesmas vestes com que actuam relativamente a qualquer privado.
     18. Ou seja, em resumo, ao contrário do que se sugere na douta sentença recorrida, afigura-se que se está, efectivamente, em sede de "facto do príncipe".
     19. Também não foi a Recorrente que trouxe os Recorridos para a esfera de risco do contrato em causa. Foram eles que quiseram nela entrar.
     20. Os Recorridos sabiam perfeitamente que havia adquirido um bem que não existia à data do contrato que celebraram.
     21. E as datas dos termos dos prazos de concessão e de aproveitamento são públicas, constando do Registo Predial.
     22. Sendo que a Recorrente não faltou a deveres de informação que fossem devidos, nem prestou informação falsa ou sonegou informação que, de acordo com ditames de boa fé, estivesse vinculada a transmitir.
     23. Por outro lado, compreende-se, por exemplo, que a crise económica, a retracção do mercado financeiro, taxas de juros, salários, etc., possam ser considerados riscos com que os promotores imobiliários devem contar e assumir, mas não já, a situação dos autos que provocou uma provada paralisação de cerca de 5 anos do prazo de aproveitamento do terreno.
     24. Quanto à qualificação aos contratos, o que se revela mais plausível e consentâneo com a aplicação das regras plasmadas entre os artigos 228º e 230º do CC é que se tratam de contratos de reserva ou de contratos de compra e venda de um bem futuro.
     25. A respeito da letra dos contratos, refira-se que as partes podem usar terminologia jurídica e fazer qualificações, mas esse aspecto não é vinculativo para o intérprete-aplicador.
     26. Relativamente à redacção do contrato em apreço, logo na sua cláusula 5ª, as partes acordaram numa redacção que excluiu propositadamente a utilização da expressão “訂” referente ao conceito de "sinal" (com o sentido de penalização), em prol da expressão "訂金", correspondente ao conceito de "depósito" (que não tem sentido penalizador).
     27. Deste modo, as partes estão a manifestar a sua vontade em afastar a qualificação de sinal aos pagamentos efectuados por conta do contrato em causa.
     28. A cláusula 22ª não indicia que as partes celebraram uma promessa de compra e venda em vez de uma compra e venda de um bem futuro ou um contrato de reserva.
     29. Em contrário do que se considerou na douta sentença recorrida, a previsão da cláusula 9ª de um consentimento para a cessão também não permite reconduzir o contrato base a um contrato-promessa.
     30. É esta a solução preconizada no artigo 418º do CC pela simples razão de que em contratos com prestações recíprocas, como é o caso, onde a Recorrente tem o dever de entregar o imóvel objecto do contrato e o adquirente tem o dever de pagar um preço.
     31. Quanto à circunstância de poder eventualmente inferir-se de alguns dos segmentos do clausulado a necessidade de celebração de um segundo contrato, esta é, nos termos do artigo 866º do Código Civil (CC), uma formalidade absolutamente essencial, quer para o contrato-promessa, quer para o contrato de reserva, quer para o contrato de compra e venda imediata de um bem futuro.
     32. Por seu turno, as suas cláusulas 10ª a 12ª são previsões que raramente ou nunca são reguladas no contrato-promessa, mas sim no contrato de compra e venda.
     33. Também os textos preliminares e circundantes constantes dos autos, conectados com o contrato em questão, designadamente, os recibos de pagamento e o facto de o contrato conter uma planta da respectiva fracção adquirida em anexo, apontam para uma qualificação outra que não a de "contrato-promessa".
     34. Relativamente ao elemento histórico subjacente ao contrato em causa, há a destacar que o contrato foi celebrado antes da publicação da Lei nº 7/2013, que foi elaborada em resposta a um vazio legal que disciplinasse estes casos, o que permite vincar a sua especificidade em relação às figuras existentes a esse tempo na ordem jurídica de Macau, incluindo a figura do contrato-promessa tipificada no Código Civil.
     35. Como afirma João Vicente Monteiro na sua mais recente obra, Código do Registo Predial de Macau Anotado, pág. 299, "Estes 'contratos-promessa' têm sido tradicionalmente utilizados para formalizar verdadeiros contratos de compra e venda sobre as fracções autónomas em construção".
     36. Relativamente ao elemento teleológico, o fim do negócio tido em mente pelas partes é o seguinte: para a parte compradora, um imóvel a ser construído fica reservado contra o pagamento de uma certa quantia, por inteiro ou dividida em prestações; para a parte vendedora é receber do adquirente um determinado preço pela fracção autónoma que vai construír e lhe vai entregar.
     37. Se o beneficiário desistir perde essa quantia a favor da outra parte; quando não, o contrato mantém-se. Em contrapartida, o vendedor deixa de poder dispor da fracção autónoma não podendo celebrar nenhum outro contrato com terceiros que tenha por objecto essa fracção autónoma.
     38. Assim, pela interpretação do clausulado, pelos textos conectados com o contrato, pelo elemento histórico e pelo elemento teleológico, afigura-se que o contrato em discussão não é um típico contrato-promessa mas antes um contrato de reserva ou um contrato de compra e venda imediata de um bem futuro, tal como defende Menezes Cordeiro no douto Parecer Jurídico ora junto.
     39. Subsidiariamente, mesmo que se entenda que o contrato em discussão nos presentes autos se trata de um contrato-promessa típico, a verdade é que a quantia que a Recorrente recebeu enquanto pagamento do preço da fracção a construir que foi vendida, configura um cumprimento antecipado do contrato prometido tendo em vista a satisfação de obrigação futura, previsto no artigo 434º do Código Civil.
     40. Pelo que, ressalvado diverso entendimento, não há lugar a uma indemnização correspondente ao dobro dessa quantia.
     41. Relativamente à indemnização a arbitrar, uma vez que a impossibilidade superveniente não é imputável à Recorrente, tem aplicação o disposto no artigo 779º/1 do CC: "A obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor."
     42. As consequências são as do artigo 784º/1 do CC: o interessado na aquisição fica desobrigado da contraprestação e pode exigir a restituição do valor recebido pelo alienante, em singelo, nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa, conforme o estipulado nos artigos 467º e 473º/1 do CC.
     43. Ficou estabelecido que a Recorrente recebeu por conta do contrato em discussão o montante de HKD5.297.600,00.
     44. E que a Recorrente pagou o montante de HKD3.601.576,34 ao C, liquidando o montante ainda em falta relativamente ao mútuo que os Recorridos haviam contraído com aquele Banco, para a aquisição da fracção objecto desse mesmo contrato.
     45. Daí que, como também vem decidido na douta sentença recorrida, o montante da obrigação de restituição a cargo da Recorrente para com os Recorridos, se cifra em HKD1.696.023,66 (5.297.600,00 - 3.601.576,34), pelo que, salvo melhor opinião, deve ser esse o quantum final da indemnização a arbitrar.
     46. Caso assim se não entender, a Recorrente não está de acordo com o montante do dano equitativo, HKD4.000.000,00.
     47. Ressalvado diverso entendimento, que nada obsta a que o dano equitativo seja calculado nos presentes autos de acordo com o critério aplicado por Venerando TSI no referido Processo nº 22/2024.
     48. Considerando que o contrato dos Recorrentes foi celebrado em 30 de Julho de 2012 e que estamos em Março de 2025 (período de cerca de 12 anos e sete meses), o valor da indemnização a arbitrar a título de dano equitativo seria cerca de HKD2.354.783,20, correspondente a HKD5.297.600,00 (valor recebido pela Recorrente) + HKD2.354.783,20 (5.297.600,00 x 3,5% x 12,7).
     49. No entanto, de acordo com os dados oficiais da Autoridade Monetária de Macau, a taxa de juros praticada pelos Bancos entre 2011 e 2023, foi, em média, a de 1,2655%, pelo que se afigura que deve ser essa a taxa aplicada ao cálculo do dano equitativo e não a de 3,5%.
     50. Consequentemente, caso se tomasse em conta o referido período de 12,7 anos, mas com referência à taxa de 1,2655%, o valor seria então o de HKD851.422,32, correspondente a 5.297.600 x 1,2655% x 12,7.
     51. No entanto, ressalvado diverso entendimento, por força da cláusula 10ª do contrato em apreço, conjugada com o facto de a impossibilidade definitiva para o seu cumprimento apenas se ter cristalizado na ordem jurídica com o trânsito em julgado do douto Acórdão do TUI de 28/05/2018, proferido no âmbito do Processo nº 7/2018, é este o momento a partir do qual tem início o período base para o cálculo da indemnização.
     52. Esse período vai, portanto de 2018 a 2025 e, como tal, compreende sensivelmente 7 anos.
     53. Ora, de acordo com os mesmos dados oficiais da AMCM, a taxa média deste período de 7 anos foi a de 2,141%, pelo que o montante indemizatório mais correcto se cifraria em HKD793.951,00 (5.297.600 x 2,141% x 7).
     54. Assim, um quantum indemniza tório arredondado por excesso para HKD800.000,00 seria o mais adequado.
     54. Assim, caso esse Venerando TSI entenda que, para o cálculo da indemnização, não serão de se seguir as regras do enriquecimento sem causa mas as de uma solução por equidade, afigura-se que o o valor total da indemnização deveria ser alterado para HKD2.496023.66, correspondente a HKD1.696.023,66 (obrigação de restituição) + HKD800.000,00 (dano equitativo) .
     55. Quanto aos respectivos juros de mora, por força do artigo 794º/4 do Código Civil, afigura-se que a sua contagem teria início com a data da sentença até integral pagamento, posto que só com a sua prolação a obrigação da Recorrente se tornaria líquida, à taxa legal de 9,75% ao ano.
     56. Ressalvado diverso entendimento, a douta decisão recorrida incorre na violação dos artigos 228º, 229º, 230º, 435º, 436º, 467º, 473º/1, 556º, 560º/5, 779º/1, 784º/1, 795º e 801º do Código Civil.
     Nestes termos e nos mais de direito aplicável, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente Recurso ser julgado procedente, com as legais consequências, assim se fazendo, serenamente, Justiça.
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    A e B, com os sinais identificativos nos autos, ofereceu a resposta constante de fls. 1886 a 1898, tendo alegado o seguinte:
     I. Ponto Prévio
     1. De modo a evitar repetições desnecessárias, os Recorridos dão por ora reproduzida toda a factualidade assente e dada como provada pelo douto Tribunal a quo, devidamente transcrita em sede da Sentença Recorrida (doravante "Sentença"), constante especificamente de fls. 1725 a 1734v. dos autos.
     2. Nos termos propostos pela-Recorrente nas suas alegações de recurso, verifica-se que a mesma apresenta 3 temas de discórdia face à Sentença, a saber: 1) a qualificação jurídica do contrato em apreço nos presentes autos, 2) a imputação de impossibilidade superveniente de cumprimento a terceiro, bem como 3) a indemnização determinada pelo douto Tribunal a quo.
     3. Salvo melhor e fundamentada opinião, nenhuma razão assiste à Recorrente, conforme os Recorridos passarão a demonstrar.
     II. Da Natureza Jurídica dos Contratos em Apreço
     4. Insurge-se a Recorrente contra a (correcta, adianta-se) qualificação jurídica oferecida pelo douto Tribunal a quo relativamente à natureza do contrato ínsito a fis. 26 a 27 dos autos (doravante, o "Contrato"), bem como à factualidade dada por assente a este título - Factos Assentes J), P) e Q) -, algo que não deixa de causar estupefacção aos Recorridos, ainda para mais considerando as diversas sentenças contra a Recorrente proferidas pelo Tribunal Judicial de Base acerca da mesma temática, às quais se junta a própria posição do Venerando Tribunal ad quem ínsita, por exemplo, nos Acórdãos proferidos no âmbito dos Processos n.º 22/2024, 220/2024, 66/2025, 162/2025, entre tantos outros.
     5. Em todos esses arestos, a posição jurisprudencial foi unívoca: estamos efectivamente perante contratos-promessa de compra e venda de imóveis e não perante qualquer contrato de compra e venda de bem futuro (seja denominado "Mai Lou Fa" ou outro), nem sequer perante um contrato de reserva. Por outras palavras, todas as teses carreadas para os autos por parte da Recorrente a este respeito, seja para os presentes autos, seja para outros análogos, foram rejeitadas pelos Tribunais da R.A.E.M. - como, aliás, se impunha, tendo em conta a concreta factualidade subjacente ao referido Contrato e as mais basilares regras de boa interpretação do mesmo.
     Senão vejamos,
     6. A venda das fracções autónomas do projecto Pearl Horizon não tem qualquer particularidade de relevo, face à comercialização de quaisquer outras fracções autónomas em fase de projecto, no que é uma prática antiga. A promotora do empreendimento - a Recorrente - coloca no mercado as fracções autónomas enquanto bem futuro, prometendo a sua venda (vide Cláusula 1ª do Contrato), financiando-se assim para prosseguir com a construção. Os pagamentos são faseados, à medida que a construção evolui, e a transmissão da propriedade apenas se faz com a escritura pública de compra e venda, uma vez terminada a construção.
     7. A qualificação dos contratos depende, sobretudo, das prestações típicas a que as partes contratantes se obrigam. No caso do contrato-promessa, as partes obrigam-se a celebrar um outro contrato (definitivo), como resulta claro do artigo 404.º do Código Civil. Importa, pois, analisar o teor do contrato celebrado pelas partes para verificar se a prestação típica é, ou não, a celebração de um outro contrato. Uma análise do Contrato não deixa margem para dúvidas. Particularmente claro é o disposto nas cláusulas 9.ª e 15.ª do contrato celebrados entre as partes, onde acordam na celebração da escritura pública de compra e venda do imóvel em questão. Este é o verdadeiro fim do Contrato e as partes arredam, de forma terminante, qualquer discussão a esse propósito.
     8. É certo que a terminologia utilizada pelas partes não vincula o Tribunal, mas não menos certo é o facto de o contrato em apreço nos presentes autos fazer várias referências a contrato-promessa, a promitente comprador, a promitente vendedor e outras que são usuais, mesmo típicos, em contratos-promessa.
     9. Desde logo, o título do Contrato evidencia o que era a intenção das partes, ao darem-lhe o nome de 樓宇買賣預約合約. Depois, na cláusula 1.ª ficou acordado que a Parte A promete vender à Parte B. Sob pena de se aduzirem argumentos ad nauseam, aponte-se ainda o facto de o Contrato ora em apreço determinar, por exemplo, a perda dos valores pagos, caso a Parte B falhasse algum pagamento (cláusula 5.ª. tipicamente cláusula de sinal, decalcada do normativo ínsito no n.º 2 do artigo 436.º do Código Civil), a necessidade de a Parte B obter consentimento da Parte A para o caso de pretender revendera fracção autónoma antes da celebração da escritura pública de compra e venda, pagando ainda uma comissão de 1% (cláusula 9.ª), a sujeição da Parte B a obras de decoração interior e exterior levadas a cabo pela Parte A sem possibilidade de oposição (cláusula 22.ª), entre outras.
     10. Tais cláusulas revelam efectivamente que não estamos perante qualquer contrato definitivo passível de transferir a propriedade dos imóveis em apreço para a esfera jurídica dos Recorridos.
     11. Ao invés, todas estas cláusulas demonstram que o objecto do Contrato é a celebração de uma escritura pública de compra e venda e que, até esse momento, a Parte B (ora Recorridos) apenas detêm direitos de natureza obrigacional. Qualquer outra teorização apenas se poderá reputar como atentatória da realidade material subjacente, realidade essa que clama pelo respaldo absoluto e sem reservas da qualificação da natureza do Contrato operada pelo Tribunal a quo.
     12. A Recorrente parece começar a querer aceitar tal factualidade, conforme se pode retirar de páginas 28-29 das suas alegações de recurso, quando afirma: "Mesmo que se entenda que o contrato em discussão nos presentes autos se trata de um contrato-promessa típico, a verdade é que, por todo o exposto, que aqui se dá por reproduzido, as quantias que a Recorrente recebeu enquanto pagamentos de parte ou totalidade dos preços das fracções em discussão, configuram um cumprimento antecipado dos contratos prometidos tendo em vista a satisfação de obrigação futura, conforme previsto no artigo 434.º do Código Civil". Louve-se a aparente inflexão do discurso - no sentido de não colocar de parte a qualificação do Contrato como contrato-promessa -, mas aponte-se a entorse gritante das regras legais aplicáveis ao caso em apreço ensaiada pela Recorrente.
     13. Como a Recorrente bem sabe, atendendo à real natureza do Contrato, as partes podem identificar os pagamentos feitos pelo promitente-comprador como sendo depósito, sinal ou preço, indiferenciadamente. No final das contas e por força do disposto no artigo 435.º do Código Civil, presume-se que todos esses pagamentos têm o carácter de sinal e, consequentemente, seguem o regime estabelecido para o efeito.
     14. Mais, a Recorrente também não pode ignorar que tentou afastar a aplicação ao caso concreto do regime do sinal, sem sucesso (veja-se a resposta oferecida aos quesitos n.º 50.º-A e 68.º). Uma vez que se está perante uma presunção juris tantum, caberia à Recorrente inverter a citada presunção de modo a conferir respaldo à sua pretensão, tendo falhado redondamente, devendo ser aplicadas in casu as regras ínsitas no n.º 1 e 2 do artigo 343.º do Código Civil.
     15. Fácil se torna a conclusão de que, com a argumentação expendida a este respeito em sede das suas alegações de recurso, a Recorrente - passe a expressão - pretende fazer entrar pela janela aquilo que não conseguiu fazer entrar pela porta ...
     16. O mesmo desfecho ter-se-á de apontar à sugestão de enquadramento típico do contrato objecto dos presentes autos enquanto contrato de reserva, o qual poderá ser conceptualmente descrito como pré-contratos sujeito à liberdade contratual.
     17. Sobre esse tópico, cite-se o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do Processo n.º 25128/20.3T8LSB.L1-7, a título de jurisprudência comparada, no qual se conclui:
     "Em todo o caso, tem-se entendido que o "Contrato de Reserva" já assumiu alguma tipicidade social, na vida económica corrente, pela frequência com que vem sendo convencionado, estando subordinado essencialmente às regras da liberdade contratual (Art. 405.º n.º 1 do C.C.).
     Higina Castelo (in "Reserva de Imóvel: com vista à futura celebração de contrato relativo a bem imóvel", disponível in "blook.pt") reconhece que esta figura possa ser recortada dentro dos chamados "acordos intermédios", que para uns são meros instrumentos jurídicos, destituídos de natureza contratual, servindo de simples auxiliares de negociação de um dado acordo mercantil (cfr. Engrácia Antunes in "Direito dos Contratos Comerciais", pág. 97); para outros são uma forma de "contratação mitigada", o que não significa que seja uma contratação fraca, mas antes uma contratação de tipo diferente, em que os deveres são de simples procedimento, de esforço e negociação, mas existem e devem ser cumpridos (cfr. Menezes Cordeiro in "Manual de Direito Comercial", pág. 497); para outros ainda a sua juridicidade depende de interpretação casuística (cfr. Ana Prata in "O Contrato Promessa e o seu Regime Civil", pág. 125 a 136).
     No fundo não são ainda um contrato-promessa, com esse tipo de vinculação típica, nem estão sujeitos ao seu regime, mas são preliminares doutros contratos, estabelecidos ainda numa fase em que é possível o arrependimento, mas não deixam de ser verdadeiros contratos, nomeadamente quando neles seja estipulado o direito ao arrependimento mediante o pagamento de indemnização (cfr. Higina Castelo, in Ob. Loc. Cit. pág.s 14 a 16).
     Para Higina Castelo o contrato de reserva será um contrato bilateral ou sinalagmático, na medida em que cada uma das partes se obriga a realizar a sua prestação porque a parte contrária se obriga a efetuar a dela e para que esta se concretize, sendo cada prestação contrapartida e justificação da outra. Em concreto, o interessado na aquisição compromete-se a adquirir ou celebrar um contrato promessa de aquisição (sem prejuízo de poder alternativamente pagar pela sua desistência injustificada com quantia que adianta), porque a parte contrária se compromete a alienar ou celebrar contrato promessa de alienação (sem prejuízo de poder pagar pela sua desistência ad nutum, perdendo a quantia adiantada e, geralmente, outro tanto); e para que isso aconteça, o interessado na alienação compromete-se a alienar ou celebrar o contrato-promessa, porque a parte contrária se compromete a adquirir ou celebrar o contrato-promessa. O que implica que as partes se comportem de determinada forma, diligenciando o necessário naquele sentido, obtendo de documentação necessárias, como licenças, financiamentos bancários, procedendo a notificações de preferentes ou abstendo-se de negociar a coisa com terceiros (cfr. Higina Castelo in Ob. Loc. Cit. pág. 19).
     É normal que, quando as partes celebrem um contrato de reserva de imóvel, a vontade relativa ao contrato final ainda não se encontre suficientemente consolidada, pretendendo as partes manter a liberdade de contratar".
     18. Nada russo resulta do Contrato. Ao invés, aquilo que resulta do Contrato é que as Partes prometeram vender e prometeram comprar, respectivamente, o imóvel em apreço, assim como prometeram celebrar o respectivo contrato definitivo, através de escritura pública de compra e venda - ou seja, celebraram um contrato-promessa de compra e venda de-imóvel, tout court.
     19. Em face do exposto, naufraga a argumentação acerca da qualificação do Contrato operada pela Recorrente, sendo de manter a decisão do Tribunal a quo.
     III. Do Incumprimento Contratual Definitivo Imputável à Recorrente
     20. O Contrato não foi cumprido pela Recorrente e a prestação típica a que a Recorrente se obrigou - a celebração da escritura pública de compra e venda sobre a fracção autónoma 7 do 37.º andar do bloco 7, a ser construída no Lote P, s/n da Areia Preta (doravante, "Fracção F37") - tornou-se impossível. Este é um facto que a Recorrente não quis inicialmente aceitar, mas que hoje é indesmentível e pacífico. A concessão do terreno onde a Recorrente planeava construir o empreendimento Pearl Horizon caducou - Factos Assentes GG) a JJ) -, sendo do conhecimento público que aquele lote de terreno foi concedido à Macau Renovação Urbana, S.A., conforme Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 5/2021, de 1 de Março de 2021, para desenvolvimento imobiliário.
     21. Inconformada com a decisão do douto Tribunal a quo, vem a Recorrente colocar em crise a causa dessa mesma impossibilidade, alegando que a impossibilidade de cumprimento dos Contratos se deve à actuação de um terceiro, in casu a R.A.E.M., na figura da (então) Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (doravante, "DSSOPT") e da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (doravante, "DSPA"), mais alegando que a actuação da Administração deverá ser reputada de imprevisível e inevitável.
     22. Diga-se que a Recorrente pretende provar nestes autos aquilo que não conseguiu provar quando demandou a RAEM na acção com o processo n.º 317/18-RA (acção para efectivação da responsabilidade civil extracontratual), que foi julgada improcedente. De igual modo, a Recorrente desistiu do pedido de intervenção acessória provocada da RAEM nestes mesmos autos. Isto é, a Recorrente optou por tentar imputar à RAEM responsabilidade no incumprimento do Contrato, mas não quer que a RAEM sequer se pronuncie sobre essa imputação. É, naturalmente, mais fácil fazê-lo tendo apenas os Recorridos como interlocutores, os quais não participaram ou sequer acompanharam os meandros da negociação do contrato de concessão e sua execução, nomeadamente em sede do processo administrativo relativo ao empreendimento imobiliário Pearl Horizon.
     23. A Recorrente procura argumentar no sentido de que a culpa do incumprimento não lhe pode ser imputada, mas sim à RAEM, numa tentativa de ilidir a presunção de culpa que sobre si impende. Trata-se de uma linha de argumentação que é destituída de qualquer mérito, conforme facilmente se demonstra.
     Em concreto,
     24. Alega a Recorrente que a conduta da Administração foi imprevisível, começando por assentar a razão da sua discórdia com a Sentença proferida pelo Tribunal a quo no (suposto) facto de " ... quando a Recorrente contratou, já o projecto de arquitectura tinha sido incondicionalmente aprovado e com imediata eficacidade".
     25. Tal raciocínio é manifestamente incorrecto e contraditório com a matéria de facto dada como assente, conforme resulta do teor do Facto Assente J), do qual resulta que o Contrato foi celebrado em 30 de Julho de 2012, e da resposta aos quesitos n.º 25.º. 46.º, 47.º e 60.º.
     26. A Recorrente bem sabe que a argumentação expendida a propósito da suposta aprovação incondicional do seu projecto de arquitectura, trazido ao conhecimento da Recorrente por via do ofício notificado em 7 de Janeiro de 2011 é, no mínimo, falaciosa, até porque contraria a factualidade alegada e provada em diversos outros arestos, conforme seja aquela que resultou da sentença proferida no Processo n.º 317/18-RA, do Tribunal Administrativo (acção para efectivação de responsabilidade civil extracontratual intentada pela Recorrente contra a RAEM), do acórdão proferido em sede de recurso contencioso pelo Tribunal de Segunda Instância, no âmbito do Processo n. º 179/2016, ou mesmo no acórdão proferido pelo Tribunal de Última Instância, no âmbito do Processo n.º 55/2016, factualidade essa que foi já sobejamente tratada e trazida ao conhecimento de Venerando Tribunal a quo, e que respalda, por completo, a argumentação supra aduzida.
     27. Ora, como é bom de ver, a aprovação do projecto de arquitectura da Recorrente foi feita de forma condicional (basta atentar no teor do documento constante de fls. 227 e 228), uma vez que, para emissão da licença de obra a Recorrente teria de apresentar e obter aprovação do relatório de estudo de impacto ambiental requerido.
     28. Caso tal aprovação não fosse condicional - como foi -, bastaria à Recorrente requerer a emissão da licença de obra, nos termos do artigo 42.º do Regulamente Geral da Construção Urbana, algo que a Recorrente não fez, à data, nem tão pouco colocou tal acto administrativo em crise, pelo que vício não lhe notou ou assacou.
     29. Em sentido diametralmente oposto, resulta provado que a Recorrente apresentou diversos relatórios de estudo de impacto ambiental - vide, nomeadamente, resposta oferecida aos quesitos n.º 28.º, 30.º a 37.º e 40.º. Ou seja, a própria actuação (comprovada) da Recorrente demonstra à saciedade que a mesma bem sabia que o seu projecto, à data de 7 de Janeiro de 2011, não havia "sido incondicionalmente aprovado e com imediata eficacidade". E tanto sabia que a própria Recorrente apenas após ser notificada da aprovação do último relatório de estudo de impacto ambiental é que requereu à DSSOPT a emissão de licença de obras, mais concretamente em 24/10/2013 - vide resposta oferecida aos quesitos n.º 46.º, 47.º e 60.º.
     30. Da factualidade supra elencada, resulta clarividente a periclitância e total falta de validade dos argumentos tecidos pela Recorrente no que à suposta imprevisibilidade da Administração diz respeito, em face do incumprimento do Contrato sub judice.
     31. Em acréscimo, afirma ainda a Recorrente que "no caso vertente, também não era previsível que a DSSOPT fizesse depender a emissão dessa licença, da apresentação e aprovação de um Relatório ambiental pela DSPA, como infelizmente o fez" (página 9 das Alegações de Recurso).
     Ora,
     32. Estando assente que o Contrato foi celebrado entre Recorrente e Recorridos em 30 de Julho de 2012, e resultando provado que a Recorrente, já em 7 de Janeiro de 2011, havia sido notificada de que, para obter a emissão da licença de obra, a Recorrente teria de apresentar e obter aprovação do relatório de estudo de impacto ambiental requerido pela Administração, como é que a Recorrente pode aspirar ancorar uma qualquer réstia de imprevisibilidade ao facto em apreço?
     33. Cristalino resulta que, quando a Recorrente decidiu contratar com os Recorridos, já sabia das regras impostas pela Administração, tendo-se conformado com as mesmas, não as questionando ou levantado óbice. O que a Recorrente nunca fez foi informar os Recorridos da condição imposta pela Administração para que a licença de obras fosse emitida.
     34. Para além disso, a Lei n.º 2/91/M, de 11 de Março (Lei de Bases do Ambiente) estabelece que os planos, projectos, trabalhos e acções que possam afectar o ambiente, a saúde e a qualidade de vida da população, que sejam da responsabilidade e iniciativa de um organismo da Administração ou de instituições públicas ou privadas, devem ser acompanhados de estudo de impacte ambiental (artigo 28.º, n.º 1) e que a aprovação do estudo de impacte ambiental é condição essencial para o licenciamento final das obras e trabalhos pelos serviços competentes (artigo 28.º, n.º 3). Certamente que a Recorrente, companhia experiente na área da construção civil, estaria familiarizada com tal diploma legislativo - e, ainda que não o estivesse, ignorantia juris non excusat, conforme decorre do artigo 5.º do Código Civil.
     35. O acompanhamento do quadro regulatório existente na R.A.E.M. foi inicialmente feita pelo Conselho do Ambiente, até ter existido um reforço concreto da actuação na área ambiental por parte da Administração da RAEM, o qual culminou na Lei n.º 6/2009, onde se materializou a extinção do citado Conselho do Ambiente e a criação da DSPA. Esta pretendia-se com capacidade de intervenção revigorada, procurando-se reforçar a "protecção dos direitos ambientais e a aplicação da lei", bem como assegurar o gradual desenvolvimento e a plena implementação das políticas ambientais do Governo de Macau. (págs.2 e 3 do Parecer n.º 2/III/2009, da 2.ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa).
     36. Tendo em conta a dimensão (18 torres habitacionais) que o projecto da Recorrente contemplava, ter-se-á de convir que a exigência de estudos de impacto ambiental não tem, pois, nada de ilegal e possui, até, plena justificação, maxime em prol da prossecução do interesse público, conforme decorrência do artigo 4.º do Código do Procedimento Administrativo.
     37. Tudo isto porque a Recorrente não queria respeitar a recomendação feita pela DSSOPT de assegurar um afastamento mínimo entre as torres. Competia, pois, à Recorrente demonstrar que o projectado empreendimento não teria consequências nefastas em matéria de circulação de ar. As exigências feitas pela DSPA nesta matéria foram mais que razoáveis, pois que a finalidade deste exercício não era provar que o distanciamento entre torres que foi sugerido pela DSSOPT era necessário, mas sim que o projecto, sem respeitar essa sugestão, era viável em termos ambientais, nas suas mais variadas vertentes. E isso foi conseguido.
     38. Ora, se a exigência de estudos de impacto ambiental encontra pleno esteio na letra da lei desde, pelo menos, 1991, não se entende a argumentação da Recorrente, muito menos pretendendo emprestar à sua actuação um cariz diligente, algo que falece pela base. A Administração exigiu o cumprimento da lei, nada mais, e a acusação de inexistência de norma legal em respalde da mesma proferida pela Recorrente não é séria. A RAEM não criou qualquer entrave ilegal à actuação da Recorrente, limitou-se a cumprir a lei nos termos que entendeu melhor prosseguirem o interesse público e a Recorrente não consegue avançar qualquer argumento sério que aponte em sentido contrário, caindo por terra a sua (parca) argumentação no sentido de estarmos perante um denominado "facto do príncipe".
     39. Por outro lado, alega a Recorrente que a actuação da R.A.E.M. configurou uma força inultrapassável - em concreto, "os serviços da RAEM não emitiram a licença de construção sem que fosse apresentado o Estudo Ambiental", a página 14 das Alegações de Recurso. No entanto, desconhecem os Recorridos se essa mesma licença de construção foi pedida junto da DSSOPT, após a suposta aprovação do projecto, notificada à Recorrente em 7 de Janeiro de 2011. Se a Recorrente tinha tanta certeza da sua posição jurídica em detrimento daquela defendida pela Administração, cabia-lhe, enquanto contratante diligente, requerer a emissão da licença de obras. Mas a Recorrente não o fez. Assim como nunca a Recorrente impugnou, reclamou ou recorreu de qualquer acto da Administração no âmbito do processo em apreço, onde manifestasse o seu desagrado ou preocupação com a forma como o processo estava a ser conduzido. Só depois de a caducidade da concessão ter sido declarada é que a Recorrente reagiu, o que retira qualquer laivo de credibilidade às suas queixas sobre ilegalidades cometidas pela Administração.
     40. Os atrasos e contratempos nos processos de licenciamento são vulgares e conhecidos de todos, sobretudo dos promotores imobiliários, ainda para mais experientes, como é o caso da Recorrente, sendo de esperar que tudo tivesse feito para precaver tais atrasos e contratempos com a necessária diligência.
     41. Conforme se lê em decisão do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal, processo 628/09.3YFLSB, proferida em 12 de Janeiro de 2010, ora citado a título de jurisprudência comparada:
     "Quem se assume como promitente-vendedor de fracção a construir, recebendo do promitente-comprador um sinal, terá de prever toda uma série de diligências de natureza burocrática e eventuais obstáculos administrativos e, em relação a eles, precaver-se atempadamente.
     Salvo melhor opinião, não lograram as RR., face aos factos provados, afastar a presunção de culpa que sobre elas impendia, não resultando demonstrada, designadamente a ocorrência de acto de terceiro que não fosse previsível ou de caso fortuito ou de força maior".
     42. O mesmo Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 7 de Novembro de 2006, processo 06A2018, ora citado a título de jurisprudência comparada, entende que:
     "Mas para ilidirem a presunção do nº 1 do artigo 799º teriam de demonstrar que agiram com toda a diligencia, que se socorreram de todos os meios legais, que forneceram todos os elementos permissivos de contrariar o projecto da autarquia que, enfim, tudo fizeram para que o objecto do contrato promessa não se tornasse impossível.
     Esta é, aliás, a posição que mais se coaduna com a dogmática da culpa presumida e que, em coerência com os princípios da probidade negocial, permite que, os mais ousados, possam outorgar contratos promessa de bens pendentes e alvará de loteamento sem que nunca fiquem sujeitos à sanção do nº2 do artigo 442º do Código Civil, bastando-lhes alegar o facto de terceiro, leia-se Câmara Municipal".
     43. Em conclusão, para que a conduta da Administração pudesse configurar uma causa de força maior, como a Recorrente pretende, teria de se tratar de um evento revestido da trilogia imprevisibilidade-inevitabilidade-irresistibilidade (v. JOSÉ CARLOS BRANDÃO PROENÇA, Lições de Cumprimento e Não Cumprimento das Obrigações, 2011, pág.167), algo que, conforme demonstrado, não sucede no caso em apreço. Não tendo a Recorrente demonstrado que tudo fez para que o objecto do Contrato não se tornava impossível, não poderá a mesma eximir-se da sua responsabilidade, sendo de aplicar ao caso concreto o disposto no n.º 1 do artigo 790.º, 788.º, 787.º e 557.º do Código Civil, com as inerentes consequências legais.
     IV. Do Risco
     44. No que para estes autos interessa, importa reter que, em 7 de Janeiro de 2011, a DSSOPT notificou a Recorrente da aprovação do seu projecto de arquitectura (resposta oferecida aos quesitos n.º 46.º, 47.º e 60.º), ainda que de forma condicionada, porquanto a emissão de licença de construção dependeria da necessária apresentação e aprovação de relatório de circulação de ar e relatório de impacto ambiental do empreendimento (resposta ao quesito n.º 25.º).
     45. Dever-se-á sublinhar ainda que a Recorrente celebrou o Contrato já bem sabendo do ónus que sobre si impendia e muito antes da notificação da aprovação final do projecto de obra, o que veio apenas a acontecer em 15 de Outubro de 2013 - resposta oferecida ao quesito n.º 46.º, 47.º e 60.º -, sendo que apenas em 2 de Janeiro de 2014 é que a DSSOPT emitiu a licença de obras - idem. Ou seja, a Recorrente contrata a promessa de venda da Fracção F37 sem ter o projecto incondicionalmente aprovado e sem ter, sequer, licença de construção.
     46. Das alegações de recurso resulta que a Recorrente tem um muito sui generis entendimento do que seja a conduta esperada de um operador diligente. Apesar de afirmar que a exigência de estudos de impacto ambiental fora alegadamente inédita, e com isso reconhecer que nenhuma experiência tinha na matéria, nem podia colher de casos semelhantes ocorridos com outros promotores, a Recorrente declara que nunca lhe ocorreu poder daí advir uma situação de impossibilidade de incumprimento. Não se entende a lógica (ou a falta dela).
     47. Caso os estudos de impacto ambiental fossem comuns e a Recorrente tivesse deles experiência prévia, que apontasse para que a situação pudesse estar resolvida a curto prazo, já poderia fazer algum sentido a convicção da Recorrente de que conseguiria ultrapassar essa etapa com facilidade. Mas não era esse o caso, uma vez que, aparentemente, a Recorrente não possuía referências ou termos de comparação que lhe pudessem criar a expectativa de que poderia cumprir com as condições impostas pela DSSOPT e assim obter a almejada licença de construção.
     48. De qualquer forma, recorde-se uma vez mais que o estudo de impacto ambiental não foi uma surpresa que tivesse apanhado a Recorrente desprevenida depois de ter celebrado o Contrato, em 30 de Julho de 2012. Pelo contrário, essa exigência já tinha sido fixada antes de contratar a promessa de venda da Fracção F37 com os Recorridos.
     49. Mais, a essa data, já a Recorrente havia apresentado e a DSPA/DSSOPT já haviam apreciado 2 Relatórios de Estudo de Impacto Ambiental, sem existir aprovação dos mesmos, pelo que a Recorrente não pode arguir que, à data, nada fazia prever a morosidade e/ou complexidade do exercício proposto pela Administração.
     50. Nestas circunstâncias, o que recomenda a prudência? Actuar com extrema cautela, pois que pisamos terreno desconhecido, proceder com a máxima diligência, uma vez que não se sabe qual vai ser o desfecho deste exercício. Exactamente o contrário do que a Recorrente fez, ao começar de imediato a celebrar contratos-promessa de compra e venda e a receber pagamentos dos promitentes compradores, envolvendo-os assim também a eles nessa viagem sem destino seguro. Tudo aquilo que um bom pai de família (ou um operador normalmente diligente) não faria, em especial face aos alegados atrasos dos serviços públicos da RAEM no âmbito do processo de licenciamento administrativo relativo ao projecto imobiliário Pearl Horizon, de que a Recorrente se queixa.
     51. Esses atrasos, ou o que assim fosse entendido por parte da Recorrente, deveriam ter-lhe recomendado acrescidas cautelas na forma como lidava com a situação, pois que tais atrasos poderiam repetir-se e eram aparentemente a norma na sua relação com a Administração.
     52. Qualquer promotor imobiliário minimamente versado no ofício sabe que os processos de aprovação de projectos e de licenciamento não são tramitados nos curtos prazos que a lei indicativamente fixa, sobretudo quando se trata de um empreendimento imobiliário com 18 torres.
     53. Pois bem, o argumento esgrimido pela Recorrente, de que nenhum empreendedor imobiliário de Macau, normalmente diligente, poderia contar com as exigências da DSPA relativamente aos relatórios de impacto ambiental penas faria sentido se a Recorrente tivesse sido confrontada com a exigência desses relatórios depois de celebrado o Contrato. Sendo certo que a DSPA foi acrescentando questões a abordar naqueles relatórios, o procedimento já tinha sido iniciado antes da celebração do Contrato e a Recorrente não estava devidamente preparada para lhe dar resposta, porque nenhuma experiência tinha na matéria.
     54. Ao celebrar o Contrato nestas condições, ciente de que o prazo de aproveitamento iria expirar daí a cerca de 1 ano e meio e que a concessão caducava em 25 de Dezembro de 2015, a Recorrente optou por fazer recair sobre os Recorridos o risco de não conseguir concluir o aproveitamento no prazo respectivo ou, mesmo, no prazo da concessão.
     55. A Recorrente optou voluntariamente por celebrar contratos-promessa de compra e venda sem se assegurar previamente de que estavam reunidas as condições para os poder cumprir, numa conduta que, no mínimo apenas se poderá qualificar de gravemente negligente. Correu o risco de não conseguir cumprir e fez os Recorridos partilharem desse risco.
     56. A Recorrente sabia - ou devia saber, atendendo à sua posição de conhecida construtora profissional com larga experiência em Macau - que tinha de completar o empreendimento Pearl Horizon no máximo até 25 de Dezembro de 2015 - resposta ao quesito n.º 1.º - e que tinha de tomar todas as diligências necessárias para o conseguir. Mas não o fez. Conforme resulta claro da convicção que criou, contava com uma prorrogação do contrato de concessão ou com uma nova concessão e só isso justifica a recusa de acolher a recomendação da DSSOPT sobre o afastamento das torres e a forma morosa e ineficiente como lidou com a necessidade de apresentar relatórios de impacto ambiental.
     57. Quanto às expectativas e convicção da Recorrente de que lhe seria concedida a prorrogação ou nova concessão do Lote "P" para lá do prazo da concessão, não se sabe em que base atendível assentaram. Apenas se sabe que a Recorrente não foi capaz de elencar ou sequer intuir qualquer compromisso da Administração nesse sentido. Qualquer expectativa criada apenas poderia assentar nos elementos que os autos revelam e, na verdade, os autos não revelam comunicação alguma trocada com a Administração que pudesse, por si, criar expectativa alguma. O que existe é a actuação da Administração que vem descrita nos autos, na qual não se consegue desvendar qualquer fonte de expectativa séria.
     58. No que respeita aos casos em que anteriormente havia sido concessionado novamente o mesmo terreno ao mesmo concessionário em casos em que o terreno concessionado não tinha sido aproveitado dentro do respectivo prazo, falta demonstrar que esses outros casos eram idênticos ou semelhantes, nas suas nesses outros casos, a falta de cumprimento do prazo de aproveitamento se devia, ou não, aos concessionários. No caso da Recorrente, recorde-se o que ficou exarado no ponto 2 do Ofício da Exma. Sra. Directora Substituta dos Serviços para os Transportes e Obras Públicas, datado de 29 de Julho de 2014, reproduzido enquanto Facto Assente X), do qual resulta claramente que, aos olhos da Administração, o atraso do aproveitamento do terreno é imputável à Recorrente.
     59. Ou seja, nada nos autos permite inverter a presunção de culpa da Recorrente. Antes pelo contrário, reforça a convicção de que agiu com culpa. E culpa grave, indesculpável.
     60. Dizer que não foi a Recorrente que atraiu os Recorridos para a esfera de risco do contrato seria motivo de chacota, não fosse a seriedade do assunto em apreço.
     61. A Recorrente, promotora imobiliária de renome na RAEM, com experiência e "obra feita", que coloca no mercado milhares de fracções, através da promessa da sua venda, sendo a única interlocutora nas negociações com a Administração, e bem assim no procedimento administrativo atinente à construção do empreendimento imobiliário, pretende assacar aos Recorridos o risco do negócio? Quando estes, antes, aquando e mesmo depois da celebração do Contrato, em boa-fé, nunca foram avisados ou alertados pela Recorrente sobre o risco sério, grave e presente, que pairava sob o negócio sub judice? Não se compreende tal linha argumentativa por parte da Recorrente, ainda para mais quando esta era a única parte do Contrato que tinha, efectivamente, o dominus da informação acerca do risco eminente do mesmo e nada fez no sentido de alertar os Recorridos para o efeito.
     62. Reconhecendo a superior capacidade de síntese do douto Tribunal a quo, cite-se o teor da Sentença (páginas 30 e 31 da mesma), a qual descreve na perfeição a situação criada pela Recorrente, da qual se extraem as devidas consequências legais:
     "Neste contexto, um bom pai de família, no lugar da ré, não se vincularia a construir e entregar como a ré se vinculou ou, então, obtinha a adesão da sua contraparte contratual à possibilidade de sobrevir a impossibilidade de cumprir, incrementando ao contrato alguma álea em vez de se comprometer firmemente como se comprometeu. A ré distanciou-se claramente do comportamento que no seu lugar teria um bom pai de família. Tomou por certo o que eram meras expectativas. A ré é juridicamente censurável em termos de culpa por ter ocorrido a impossibilidade da sua prestação".
     63. Estabelecido que ficou o incumprimento culposo da Recorrente, sendo-lhe imputável a impossibilidade das prestações assumidas com os Recorridos, terá a mesma de os indemnizar pelo danos que surgiram na sua esfera jurídica, nomeadamente nos termos do disposto nos artigos 787.º, 790.º e 557.º do Código Civil.
     V. na Obrigação de Indemnizar, do Dano e Juros
     64. Os Recorridos não poderiam estar mais em desacordo com a análise e soluções preconizadas pela Recorrente no que à indemnização àqueles devida diz respeito. Vejamos,
     65. Pugna a Recorrente pela aplicação ao caso sub judice das regras do enriquecimento sem causa ou, subsidiariamente, a aplicação ao caso concreto de uma decisão com base na equidade.
     Ora,
     66. Sendo verdade que os próprios Recorridos colocaram em crise a solução oferecida a este título por parte do Tribunal a quo (respeitosamente se remetendo V. Exas. para o teor dos pontos 33 a 62 das alegações de recurso oferecidas pelos ora Recorridos, aí Recorrentes, motivação essa que se mantém, na íntegra, e se considera como ora transcrita ), não poderão os Recorridos deixar de tecer alguns comentários às alegações da Recorrente, em face do argumentário utilizado.
     67. Em primeiro lugar, estabelecido que ficou o incumprimento culposo do Contrato por parte da Recorrente, os Recorridos afastam, de uma penada, a argumentação da Recorrente no sentido de aplicar ao presente caso as normas ínsitas no n.º 1 do artigo 779.º e no n.º 1 do artigo 784.º do Código Civil, com a consequente (infundada) pretensão de restituir apenas o valor a si entregue, ao abrigo do instituto do enriquecimento sem causa, ex vi dos artigos 467.º e 473.º do Código Civil, uma vez que tal normativo é inaplicável ao presente caso.
     68. De facto, dada a natureza jurídica do Contrato, bem como a imputabilidade do seu incumprimento culposo à Recorrente, deverá esta ser chamada a indemnizar os Recorridos pelos danos causados na sua esfera jurídica, os quais apresentam um nexo causal inquestionável face ao referido incumprimento contratual, os quais pagaram avultadas quantias à Recorrente, enquanto promitentes-fiéis, sem qualquer sinalagma da contraparte.
     69. Em segundo lugar, a Recorrente não alegou, nem logrou provar, factos dos quais se pudesse extrair o suposto e aventado excesso manifesto da pena convencional oferecida ao caso sub judice por aplicação do regime do sinal, pelo que - salvo melhor e fundamentada opinião - m jamais deverá ter lugar qualquer redução equitativa da indemnização devida, nos termos determinados pela lei - vide, no mesmo sentido, o teor do Acórdãos proferidos pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância no âmbito do Processos n.º 205/2024 e 292/2024.
     70. Denota-se que a Recorrente tenta, a todo o custo, eximir-se à responsabilidade que tem no caso ora em apreço, bem como ao dever de indemnizar os Recorridos decorrente da correcta e boa aplicação da lei.
     71. De facto, perante o contrato-promessa sub judice, presume-se que tem carácter de sinal todas as quantias entregue à Recorrente no âmbito e por conta do mesmo, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço, conforme dispõe o artigo 435.º do Código Civil.
     72. Por força do regime do sinal, os Recorridos têm o direito a exigir o dobro do que foi prestado à Recorrente, nos termos do disposto na 2.ª - parte, do n.º 2 do artigo 436.º do Código Civil, após serem abatidas as quantias pagas por esta ao C, conforme decorre da conjugação da factualidade ínsita nos Factos Assentes M) e II).
     73. No que respeita ao dever de pagamento de juros de mora por parte da Recorrente, os Recorridos enjeitam a solução preconizada pela Recorrente e reiteram o oportunamente exposto nos pontos 61 e 62 das suas alegações de recurso, cujo teor se considera como integralmente reproduzido.
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    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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  III – FACTOS ASSENTES:
    A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
     1. A Ré é uma sociedade constituída em Macau, no dia 8 de Fevereiro de 1977, cujo objecto é a exploração do comércio de importação e exportação, da actividade de agente comercial e de transportes, da indústria de vestuário, fiação, tecelagem e malhas, tinturaria e impressão, do fabrico de bordados e, ainda, da actividade de fomento predial e construção e reparação de edifícios.
     2. A Ré, sendo uma sociedade ao fomento predial, desenvolveu em Macau empreendimentos de grande dimensão, tais como “La Baie du Nobre” e “Villa de Mer”, etc.
     3. Por Despacho n.º 160/SATOP/90, publicado no 2.º Suplemento ao Boletim Oficial n.º 52, de 26 de Dezembro de 1990, rectificado pelo Despacho nº 107/SATOP/91, publicado no Boletim Oficial, n.º 26, de 1 de Julho de 1991, à ré foi concedido um terreno, resgatado ao mar, com a área de 60.782m2, constituído por 3 lotes com a designação de Lote “O”, para fins habitacionais, Lote “S” para fins habitacionais e Lote “Pa” para fins industriais.
     4. Em conformidade com o estipulado no n.º 1 da cláusula 2.ª do aludido despacho de concessão, o prazo de concessão foi fixado em 25 anos, contados a partir da outorga da escritura pública do contrato.
     5. Por Despacho n.º 123/SATOP/93, publicado na II Série do Boletim Oficial n.º 35, de 1 de Setembro de 1993, e nos termos que já tinham sido previstos no Despacho n.º 160/SATOP/90, foi à Ré concedida uma parcela de terreno, designada por “Pb”, destinada a ser anexada à parcela “Pa”, constituindo um lote único, com a área global de 67.536m2, tinha em vista viabilizar o projecto de instalação de um “complexo industrial”.
     6. Através desta revisão, o prazo global do aproveitamento do terreno foi prorrogado até 26 de Dezembro de 2000.
     7. Depois, procedeu-se à anexação das parcelas “Pa” e “Pb”, sendo o respectivo terreno registado sob a descrição n.º 22380, no Livro B68M, com a designação de Lote “P”
     8. Pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, publicado na II Série do Boletim Oficial da RAEM, nº 9, de 1 de Março de 2006, bem assim, o Estudo Prelimiar de 2005 e as PAOs de 2004 e 2005, foram acordados a alteração de finalidade e o reaproveitamento do lote “P”, do qual passou a constar a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com 5 pisos, sobre o qual assentavam 18 torres com 47 pisos cada uma, afectados às seguintes finalidades e áreas brutas de construção (vide o n.º 2.3 da cláusula 3.ª referida no artigo 1.º - termos e condições do contrato de concessão por arrendamento em anexo ao Despacho n.º 19/2006):
     a) - Habitação: 599.730m2;
     b) - Comércio: 100.000m2;
     c) - Estacionamento: 116.400m2;
     d) - Área livre: 50.600m2.
     9. O prazo de aproveitamento foi acordado em 96 meses, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial da RAEM do despacho que titulasse a referida revisão.
     10. Os autores e a ré celebraram, em 30 de Julho de 2012, o Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel (adiante designado por “Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel”), que incidia sobre a fracção habitacional F, do 37.º andar do bloco 7 (adiante designada por “fracção em causa”), a ser constituído no Lote “P” (adiante designada por “terreno”), registado na Conservatória de Registo Predial sob a descrição n.º 22380, situado em Macau, na Zona da Areia Preta, s/n, Lote “P” (vide documento constante de fls. 26 a 27 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido integralmente).
     11. Sendo o preço da fracção acima referida de seis milhões e vinte mil dólares de Hong Kong (HKD6.020.000,00).
     12. A ré efectuou um desconto no preço que consta do contrato no valor de HKD722.400,00 sobre o preço constante do contrato (HKD6.020.000,00).
     13. Os autores pagaram à ré o preço do imóvel, no valor total de HKD5.297.600,00.
     14. Em 2 de Agosto de 2012, os autores, a ré e o C, Limitada, Sucursal de Macau (adiante designado por “Banco”) celebraram um contrato de compra e venda de imóvel, com mútuo garantido por hipoteca (adiante designado por “contrato trilateral”).
     15. Os autores, através do “contrato trilateral”, pediram ao banco um empréstimo no valor de quatro milhões e duzentos e catorze mil dólares de Hong Kong (HKD4.214.000,00).
     16. De acordo com a primeira metade da cláusula 5.ª do Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel celebrado entre os autores e a ré: os autores devem efectuar pagamentos segundo o prazo estipulado, a falta de pagamento pontual importa o incumprimento dos autores e a desistência do sinal pago, neste caso, a ré tem direito a fazer seu o preço do imóvel pago pelos autores.
     17. De acordo com a cláusula 10.ª do Contrato-Promessa de Compra e Venda de Imóvel, a fracção seria entregue no prazo de 1200 dias úteis de sol (ou seja, excluídos domingos, feriados e dias de chuva), contados a partir da conclusão do 1.º piso para habitação das obras da superestrutura, e seria celebrada escritura pública.
     18. Em 24 de Outubro de 2013, a Ré requereu, junto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, a emissão de licença para as obras das fundações, que foi emitida em 2 de Janeiro de 2014, com validade até 28 de Fevereiro de 2014.
     19. Em 15 e 30 de Janeiro de 2014, a Ré apresentou pedidos de prorrogação do prazo de aproveitamento.
     20. Em 4 de Junho de 2014, a Ré voltou a requerer a prorrogação, conforme documento constante de fls. 917 e 917 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido integralmente.
     21. Em 26 de Junho de 2014, a Comissão de Terras emitiu a seguinte pronúncia: “Para além disso, estima-se que mesmo que o prazo de aproveitamento seja prorrogado, a concessionária só possa concluir parte das obras da fundação, podendo no entanto isto criar indirectamente condições favoráveis à concessionária para que esta se aproveite do facto como fundamento para lograr ficar com a concessão do terreno. Nestas circunstâncias, propõe que a situação real do processo, anteriormente descrita, seja tida em consideração na decisão final que recair sobre o pedido, nomeadamente o conteúdo da carta da concessionária.”
     22. Em 10 de Julho de 2014, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu o seguinte parecer:
     “…Analisado o parecer da Comissão de Terras e ponderando os 17.º a 21.º pontos desse parecer e a carta da concessionária, constante do 24.º ponto, nomeadamente, o teor do ponto 24.4, concordo, em princípio, com os pontos 14.2 e 14.3 da informação n.º 090/DSODEP/2014 da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, isto é, prorrogar o prazo de aproveitamento até 25 de Dezembro de 2015 e aplicar a multa no montante de MOP$180.000,00, pressupondo que a Sociedade concessionária aceite previamente por escrito as seguintes condições, para garantir interesses públicos:
     1. Se não for completado o aproveitamento antes da prescrição de arrendamento, mesmo estando preenchidos os requisitos previstos no art.º 5.º da Lei n.º 7/2013 (Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção), a Sociedade concessionária não vai pedir autorização prévia para fazer negócios jurídicos de promessa de transmissão ou oneração de edifícios em construção no lote P, nem vai realizar esses negócios jurídicos, excepto a eventual obtenção legal de nova concessão desse terreno;
     2. Se não mais lhe for concedido o terreno, a Sociedade concessionária não pode pedir à RAEM qualquer indemnização ou compensação.”
     23. Em 15 de Julho de 2014, sobre este parecer, o Chefe do Executivo despachou: “Concordo”.
     24. A Direcção dos Serviços de solos, Obras Públicas e Transportes enviou à Ré um ofício, assinado pelo seu director, substituto, do seguinte teor:
     “…1. Nos termos da cláusula n.º 2 do contrato de concessão de terreno revisto pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, o prazo de aproveitamento do terreno já ficou caduco aos 28 de Fevereiro de 2014; no entanto, nos termos do art.° 2.º do Despacho n.º 160/SATOP/90, o prazo de arrendamento do terreno vai acabar aos 25 de Dezembro de 2015.
     2. Como o atraso do aproveitamento do terreno é imputável à vossa empresa, e tendo em conta que esta não é a primeira vez que a vossa empresa requer prorrogar o aproveitamento de terreno, e visto que já concordou aceitar a forma de punição para o atraso prevista no contrato; para o efeito, nos termos do Despacho proferido pelo Chefe do Executivo aos 15 de Julho de 2014, Autoriza-se prorrogar o prazo de aproveitamento do terreno até 25 de Dezembro de 2015, e aplica-se a multa no valor de MOP$180.000,00 (cento e oitenta mil patacas). Mas para garantir os interesses públicos, a empresa concessionária obriga-se previamente a prometer por escrito aceitar as seguintes condições:
     2.1. Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5.º da Lei n.º 7/2013, Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção, a concessionária não vai pedir Autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no Lote “P” ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;
     2.2. Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.
     3. Nestes termos, avisa-se a vossa empresa para entregar a promessa escrita acima mencionada, para ser transferida à Comissão de Terras para acompanhar, a fim de emitir a guia de pagamento da multa.»”
     25. A Ré aceitou pagar a multa no valor de $180.000,00 e prometeu, por escrito, à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes que não voltava a reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.
     26. Em 27 de Novembro de 2015, a Ré apresentou ao Chefe do Executivo o pedido de prorrogação dos prazos de aproveitamento e de concessão por período não inferior a 60 meses, contados a partir de 26 de Dezembro de 2015.
     27. Em 30 de Novembro de 2015, o Chefe do Executivo concordou com o parecer que lhe foi submetido, o qual considerava não dever ser deferido o aludido pedido de prorrogação com fundamento de a Lei n.º 10/2013 impedir a renovação de concessões provisórias; esta a razão por que não podia ser autorizada a prorrogação do prazo de aproveitamento.
     28. Em 21 de Janeiro de 2016, a Comissão de Terras emitiu o parecer n.º 9/2016, cujo ponto 50 apresenta o seguinte teor:
     “…Findo o seu prazo de vigência, as concessões provisórias não podem ser renovadas, a não ser no caso previsto no n.º 2 do artigo 48.º da Lei de Terras, conforme estabelece o n.º 1 do mesmo preceito legal, operando-se a caducidade por força da verificação daquele facto (decurso do prazo de arrendamento).
     De igual modo, resultava da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho (Lei de Terras anterior), que no caso de a concessão revestir natureza provisória, em virtude do terreno não se encontrar aproveitado (cf. Artigos 49.º, 132.º e 133.º), não era possível operar a sua renovação por períodos sucessivos de dez anos porquanto a figura da renovação prevista no n.º 1 do artigo 55.º era aplicável apenas às concessões definitivas.
     Apesar da caducidade operar de forma automática e directa, para tornar a situação jurídica certa e incontestada e, portanto, eliminar a insegurança jurídica sobre a extinção ou não do direito resultante da concessão, deve a mesma (caducidade) ser declarada, conforme decorre do disposto no corpo do artigo 167.º da Lei n.º 10/2013…”
     29. No dia 22 de Janeiro de 2016, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu parecer com o seguinte teor:
     “…8. Reunida em sessão de 21 de Janeiro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado o processo, considerou que o prazo de arrendamento de 25 anos fixado na cláusula segunda do contrato terminou em 25 de Dezembro de 2015, e que a concessão provisória não pode ser renovada, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 48.º da Lei n.º 10/2013, Lei de terras, aplicável por força dos seus artigos 212.º e 215.º. Deste modo, a concessão do lote "P" encontra-se caducada pelo termo do respectivo prazo de arrendamento (caducidade preclusiva), devendo esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.
     Consultado o processo supramencionado e concordando com o que vem proposto, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno pelo decurso do prazo de arrendamento”.
     30. No dia 26 de Janeiro de 2016, o Chefe do Executivo proferiu o seguinte despacho: “Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, a que se refere o Processo n.º 2/2016 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 22 de Janeiro de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho”.
     31. Por despacho n.º 6/2016, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas tornou público que, por despacho do Chefe do Executivo, de 26 de Janeiro de 2016, foi declarada a caducidade da concessão do terreno, situado na península de Macau, no NATAP, designado por Lote “P”, pelo decurso do seu prazo.
     32. Contra o despacho do Chefe do Executivo, emitido em 26 de Janeiro de 2016, que declarou a caducidade da concessão do terreno em causa, a Ré interpôs recurso contencioso anulatório, junto do Tribunal de Segunda Instância.
     33. No dia 19 de Outubro de 2017, o Tribunal de Segunda Instância proferiu o acórdão que julgou improcedente o recurso contencioso, mantendo-se o acto administrativo recorrido. A Ré, não se conformando, recorreu junto do Tribunal de Última Instância contra o referido acórdão.
     34. De acordo com o acórdão n.º 7/2018, o Tribunal de Última Instância negou provimento ao recurso interposto pela Ré, tendo o acórdão transitado em julgado e irrecorrível, em 12 de Junho de 2018.
     35. Em 28 de Setembro de 2018, a Ré liquidou, junto do banco, o empréstimo ainda em dívida pelos autores ao banco, mediante a celebração do “contrato trilateral”, no valor de três milhões, seiscentos e um mil, quinhentos e setenta e seis dólares de Hong Kong e trinta e quatro cêntimos (HKD3.601.576,34), equivalentes a três milhões, setecentas e nove mil, seiscentas e vinte e três patacas e sessenta e três avos (MOP3.709.623,63).
     36. Em 10/09/2004, a Ré apresentou um Estudo Prévio junto da DSSOPT (T-4803), seguido de um estudo prévio complementar, apresentado em 15/12/2004 (T-6451).
     37. A DSSOPT emitiu três Plantas de Alinhamento Oficiais (PAO’s) para o lote “P”, uma em 23/12/2004 e outra 23/02/2005 e a terceira, em 11/05/2007.
     38. Em 06/05/2008 a R. apresentou o projecto inicial de arquitectura.
     39. Em 23/02/2010, a DSSOPT emitiu nova PAO.
     40. O 2.º Relatório foi apresentado pela R. em 19/04/2012 (6 meses de preparação).
     41. Em 31/08/2012, a R. apresentou o 3.º Relatório de Avaliação do Impacto Ambiental (tendo levado um mês para a sua preparação).
     42. A DSPA emitiu o parecer sobre o terceiro relatório de avaliação do impacte ambiental em 16/10/2012, parecer este foi notificado à R. em 28/12/2012 (Ofício no. 13023/DURDEP/2012).
     43. A Ré apresentou o quarto relatório de avaliação do impacte ambiental em 15/03/2013 (T-3953/2013).
     44. Em 15/10/2013 ocorreu a aprovação final do Estudo de Avaliação do Impacto Ambiental e de Circulação do Ar, atento o parecer da DSPA de 29/08/2013, sujeita apenas a condições de pormenor, designadamente resultantes dos pareceres da CEM (17/06/2011), IACM (17/06/2011), Corpo de Bombeiros (01/06/2011) e DSAT (13/07/2011).
     45. Em 29/11/2018, a R. instaurou uma acção de indemnização contra a RAEM e pede, em alterativa ao pedido de indemnização, a atribuição de uma nova concessão para o mesmo lote de terreno, lote P.
     46. A ré bem sabia que tinha de concluir o aproveitamento do Lote “P” o mais tardar até 25 de Dezembro de 2015, para poder cumprir as obrigações estipuladas no “contrato-promessa de compra e venda de imóvel”. (Q 1.º)
     47. Em 13 de Março de 2019, o grupo interdepartamental do Governo de Macau realizou uma acção conjunta, de desocupação e recuperação do Lote “P”. (Q 3.º)
     48. Referiu a ré que como os autores tinham pago todo o preço do imóvel, atribuiu-lhes o valor acordado para os aparelhos domésticos e materiais de decoração de interiores (adiante designados por coisas a adquirir), de setecentos e vinte e dois mil e quatrocentos dólares de Hong Kong (HKD722.400,00). (Q 4.º)
     49. Contribuíram decisivamente para a aceitação do prazo de aproveitamento de 96 meses pela Ré vários factores, nomeadamente: (Q 6.º)
     a) As Plantas de Alinhamento Oficiais referentes ao Lote “P” já emitidas em 2004 e 2005;
     b) A apresentação pela Ré do Estudo Prévio em 10/09/2004, complementado em 15/12/2004, que serviu de base para o cálculo do prémio devido pela revisão do contrato de concessão;
     c) Ter sido aprovado o Estudo Prévio em 21/01/2005, por Ofício nº 747/DURDEP/2005, e emitidos os pareceres técnicos de todas as entidades que, por lei, são chamadas a pronunciar-se de acordo com as suas áreas funcionais;
     d) Ser expectável para a Ré, de acordo com a sua vasta experiência no desenvolvimento de projectos imobiliários em Macau, poder concluir a empreitada em questão antes do fim do prazo da concessão;
     e) Não haver indícios de funcionamento anormal e impeditivo de uma actuação célere, adequada e proporcional dos serviços da Administração Pública, em conformidade com os parâmetros constantes do Código do Procedimento Administrativo;
     f) A existência de uma cláusula no contrato de concessão de 1990, que se manteve em vigor, consagrando o princípio da colaboração dos serviços da Administração Pública no respeitante ao prazo de pronúncia para os projectos que lhes fossem submetidos para aprovação: ou seja, conforme a cláusula 5.ª, nº 7, a Administração dispunha de um prazo de 60 dias para aceitar ou rejeitar os pedidos da Ré.
     50. O referido estudo prévio foi aprovado pela DSSOPT em 21/01/2005. (Q 7.º)
     51. Os estudos prévios e as Plantas de Alinhamento Oficiais (PAO) emitidas pela DSSOPT não se prevêem a necessidade de um afastamento mínimo de 1/6 da altura do prédio mais alto entre as diversas torres a construir no terreno, tal como não se prevêem a necessidade de um limite máximo de 50 metros para a extensão das fachadas das torres. (Q 8.º)
     52. Em 29/4/2008, a Ré apresentou o Plano de Consulta “Master Layout Plan”, relativo à proposta de localização das torres. (Q 9.º)
     53. Decorridos 60 dias, a DSSOPT nada decidiu sobre o projecto inicial de arquitectura. (Q 11.º)
     54. A Ré solicitou em 14/8/2009, a emissão de uma nova PAO. (Q 12.º)
     55. A DSSOPT, ultrapassado o prazo contratual de 60 dias, não emitiu a Planta solicitada. (Q 13.º)
     56. Preocupada com o escoar do prazo de 96 meses de aproveitamento, a ré apresentou o projecto global de arquitectura. (Q 14.º)
     57. O projecto inicial de arquitectura de 2008 e o projecto global de arquitectura de 2009 mantinham as mesmas soluções arquitectónicas já previstas nos Estudos Prévios de 2004. E o “estudo prévio de 2004” previa a construção de 18 torres com 46 andares cada assentes em pódio de 6 pisos, o contrato de concessão revisto previa a construção de 18 torres com 47 andares assentes num pódio de 5 pisos, o “projecto inicial de arquitectura de 2008” continha 4 torres de um conjunto de 16 com 43 andares assentes em pódio de 2 pisos de cave e mas três pisos acima do nível do solo e o projecto global de 2009 continha 18 torres com 52 pisos mas com localização diferente da indicada no “estudo prévio de 2004”. (Q 15.º)
     58. A nova PAO emitida em 23/02/2010 pela DSSOPT foi notificada à R. por Ofício nº 4427/DURDEP/2010, de 09/04/2010. (Q 16.º)
     59. A nova PAO e o ofício nº 4427/DURDEP/2010, de 09/04/2010 vieram formular sugestões não previstas anteriormente, incluindo a tentativa de modificação unilateral do contrato de concessão revisto, nomeadamente, através dos pontos 5 e 6 do referido Ofício, que pretendiam: (Q 17.º)
* A contemplação de uma extensão máxima contínua das fachadas das torres de 50 metros;
* A contemplação de um afastamento mínimo entre as torres não inferior a 1/6 da altura da torre mais alta.
     60. O cumprimento das inéditas sugestões formulados pela DSSOPT constantes dos n.º 5 e 6 do Doc. n.º 14 juntos com a contestação da Ré, tinha, necessariamente, por consequência, um aproveitamento em termos diversos, com a redução da área destinada a construção, embora, a extensão das fachadas projectadas no projecto global apresentado em 2009 já respeitava o limite máximo sugerido de 50 metros. (Q 18.º)
     61. O cumprimento das inéditas sugestões formuladas pela DSSOPT constantes nos nºs. 5 e 6 do doc. 14 junto com a contestação da Ré implicava, necessariamente, a elaboração de novos estudos prévios e novos projectos de arquitectura, já que a disposição no terreno das torres a construir teria que ser alterada e implicaria uma alteração estrutural do próprio aproveitamento constante do contrato de concessão. (Q 19.º e 20.º)
     62. Em 07/01/2011, a DSSOPT aprovou o projecto de arquitectura que tinha sido apresentado pela R. em 22/10/2009. (Q 21.º)
     63. O projecto aprovado pela DSSOPT em 07/01/2011 não contemplava a sugestão de afastamento entre torres mencionada no nº 6 do referido Ofício nº 4427/DURDEP/2010, de 09/04/2010. (Q 22.º)
     64. A DSSOPT prescindiu da sugestão de afastamento entre torres mencionada no nº 6 do referido Ofício nº 4427/DURDEP/2010, de 09/04/2010. (Q 23.º)
     65. O projecto então aprovado contemplava as soluções anteriormente preconizadas nos Estudos Prévios de 10/09/2004 e 15/12/2004, das PAO’s de 23/12/2004 e de 23/12/2005, do projecto de arquitectura de 2009, e do contrato de concessão revisto. (Q 24.º)
     66. A decisão de aprovação do projecto de arquitectura sujeitou a emissão de licença de obras à condição de (a) a Ré apresentar um relatório de avaliação do impacto ambiental que poderia ser causado pela nova construção a implementar no Lote “P” e (b) de tal relatório vir ser aprovado pelo serviço administrativo competente da Região – a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (“DSPA”) (Q 25.º)
     67. Aquando da celebração do contrato de revisão da concessão do lote de terreno em causa, e nas respectivas negociações, a Administração nunca afirmou ser necessário a apresentação e a aprovação de qualquer relatório de avaliação do impacto ambiental do empreendimento referido objecto do contrato, sem o que a obra de construção não se iniciaria. (Q 27.º)
     68. Em 11/05/2011 a R. apresentou o exigido relatório de impacto ambiental (T-5205/2011). (Q 28.º)
     69. A DSPA elaborou um parecer em 22/06/2011 que apenas foi notificado à R. em 04/10/2011 (ofício com referência n.º 11599/DURDEP/2011), onde formulou exigências adicionais, designadamente no que respeita aos factores “ruído”, “qualidade da água”, “paisagem”, “vista”, “voo de pássaros”, “estacionamento automóvel nas redondezas da ETAR” e “outros”. (Q 29.º)
     70. Na apreciação deste 2.º Relatório, a DSPA voltou a apresentar novas exigências, igualmente não previstas em qualquer norma legal ou regulamentar em vigor (ofício DSPA de 24/05/2012, n.º 1586/054/DAMA/DPAA/2012). (Q 30.º)
     71. Nas negociações entre a ré, DSSOPT e DSPA, na reunião de 25/7/2012, em lugar de servirem para esclarecer o que já havia sido solicitado, acabaram por ter como consequência o aditamento, pela DSPA, de novas exigências. (Q 31.º)
     72. No parecer emitido pela DSPA em 16/10/2012, a DSPA voltou a formular novas exigências. (Q 32.º)
     73. A Ré viu-se obrigada a fornecer: um estudo pormenorizado sobre o “Layout” das torres, com “simulação informática”; e uma avaliação sobre as partículas em suspensão. (Q 33.º)
     74. A DSPA exigiu da R. uma nova avaliação ou, em alternativa, a alteração do “Layout”, em virtude da questão da ETAR. (Q 34.º)
     75. Em 03/05/2013 a DSPA emitiu o parecer sobre o quarto relatório de avaliação do impacte ambiental (Ofício 1545/071/DAMA/DPAA/2013) (Q 35.º)
     76. A DSPA voltou a apresentar novas exigências, desta feita em relação à avaliação do impacto ambiental sobre os novos aterros, a ilha artificial, o fedor, etc.. (Q 36.º)
     77. A Ré apresentou um quinto relatório de avaliação do impacte ambiental em 28/06/2013. (Q 37.º)
     78. Com vista a evitar mais demoras, a ré pediu reunião conjunta com a DSSOPT e a DSPA p/celeridade do 5.º RIA (38), a qual se realizou em 26/7/2013. Q 38.º)
     79. Dessa reunião, em lugar de sair um esclarecimento final acerca do cumprimento das exigências até então efectuadas, o que resultou foram novas exigências, que obrigaram a ré a elaborar um novo relatório com conteúdo adicional. (Q 39.º)
     80. Em 07/08/2013 (isto é, 12 dias depois da reunião), a ré apresentou o 6.º relatório de avaliação do impacte ambiental, contemplando as novas exigências manifestadas pelos serviços públicos na referida reunião de 26/07/2013. (Q 40.º)
     81. O projecto da R. (apresentado em 22/10/2009 e parcialmente alterado em 03/06/2010 para atender a certos requisitos impostos pela DSSOPT), com a aprovação da DSSOPT de 07/01/2011, sujeitando, porém, a emissão da licença de obra à aprovação do Estudo de Impacto Ambiental do empreendimento projectado, não sofreu quaisquer alterações de relevo. (Q 41.º)
     82. O projecto submetido pela R. 4 anos antes (em 22/10/2009) já então satisfazia plenamente as exigências sobre a ventilação e respectiva avaliação do impacto ambiental. (Q 42.º)
     83. O projecto submetido pela R. em 22/10/2019 já então satisfazia plenamente as exigências sobre impacto ambiental. (Q 43.º)
     84. - A ré apresentou à DSSOPT um projecto parcial de arquitectura em 6/5/2008 e a DSSOPT não emitiu qualquer pronúncia sobre ele.
- Em 22/10/2009, a ré apresentou outro projecto de arquitectura que substituiu o apresentado em 6/5/2008 e a ré apreciou-o em 09/04/2010 com exigências e sugestões.
- A ré respondeu em 3/6/2010 acatando as exigências, mas não a sugestão de afastamento entre as torres projectadas correspondente, no mínimo, a 1/6 da altura da torre mais alta.
- A DSSOPT aprovou este projecto e notificou a ré em 7/1/2011 para apresentar o relatório de estudos de impacto ambiental que teria a construção do empreendimento em matéria de fluxo de ar, efeito biombo, ilhas de calor e expansão de poluentes.
- A ré realizou o estudo e apresentou o respectivo relatório em 11/5/2011;
- Depois, a DSSOPT pediu mais estudos da mesma natureza (impacto ambiental) até que aprovou o relatório respectivo em 15/10/2013.
- A ré pediu a emissão de licença de obras em 24/10/2013.
- A licença de obras foi emitida em 02/01/2014. (Q 46.º, 47.º e 60.º)
     85. À R. bastariam 3 a 4 anos para concluir a construção de todo o empreendimento imobiliário “Pearl Horizon” e entregar aos Autores a fracção autónoma aqui em causa. (Q 48.º)
     86. - Se a DSSOPT tivesse dado resposta em 60 dias apreciando o projecto parcial de arquitectura apresentado pela ré em 06/05/2008, a que não respondeu;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando o projecto global de arquitectura apresentado pela ré em 22/10/2009, a que respondeu em 9/4/2010;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando a alteração apresentada ao referido projecto global em 3/6/2010, a que respondeu em 7/1/2011 e
     - Se a DSSOPT, quando em 7/1/2011 exigiu pela primeira vez a realização de estudos de impacto ambiental, tivesse exigido à ré todos os estudos da mesma natureza que lhe exigiu mais tarde,
     A R. tinha concluído o empreendimento “Pearl Horizon” dentro dos prazos de aproveitamento e de concessão e teria podido entregar à parte autora a fracção autónoma de prédio urbano que se comprometeu a entregar e no prazo em que se comprometeu a fazê-lo. (Q 49.º)
     87. Após a emissão de licença de obra a que se refere o facto assente O., com base na convicção de vir a deferir à Ré um pedido de prorrogação dos prazos de aproveitamento do Lote P e da concessão, a Ré celebrou milhares de contratos-promessa de compra e venda das fracções autónomas, investiu avultadas verbas na preparação dos diferentes projectos da obra e na realização e densificação dos estudos de impacte ambiental sucessivamente solicitados pela RAEM e custeou e executou as obras das fundações do edifício durante o último ano dos prazos de aproveitamento e de concessão. (Q 50.º)
     88. Nos termos da cláusula 5.ª, n.º 7 do contrato Concessão, a DSSOPT dispunha de prazo de 60 dias para se pronunciar sobre os requerimentos da Ré. (Q 51.º)
     89. O projecto inicial de arquitectura nunca chegou a ser analisado pela DSSOPT. (Q 52.º)
     90. Em resposta, em 3/6/2010, a Ré incorporou no projecto de 22/10/09, as exigências obrigatórias, mas não acolheu as exigências do afastamento mínimo entre torres e da extensão máxima da fachada. (Q 53.º)
     91. O teor do Parecer sobre o 2.º relatório de impacto ambiental foi objecto de discussão entre a C, a DSSOPT e a DSPA, em 25/07/2012. (Q 54.º)
     92. A Ré viu-se obrigada a recorrer a serviços especializados da Austrália, para a realização da “simulação informática. (Q 55.º)
     93. Em lado nenhum se previa a apresentação e aprovação de Relatórios de Avaliação do Impacto Ambiental e de Circulação do Ar, sendo esta uma exigência inédita em Macau. (Q 56.)
     94. As exigências formuladas pela DSPA eram exigências novas que apenas iam sendo formuladas à medida que o tempo passava e após a análise dos anteriores elementos entregues pela Ré. (Q 57.º)
     95. Após emissão de licença de obra, em 2/1/14, a Ré iniciou de imediato os trabalhos de fundações, tendo concluído as obras de fundações do edifício no último ano dos prazos de aproveitamento e de concessão. (Q 58.º)
     96. Mas só cerca de seis meses e meio depois foi o pedido de prorrogação autorizado, em 29/7/2014, através do ofício nº 572/954.06/DSODEP/2014, mas apenas até 25/12/2015. (Q 59.º)
     97. A RAEM bem sabia, não podendo deixar de conhecer, que o prazo que a ora Ré teve para o aproveitamento do projecto, após a emissão das licenças e suas prorrogações, era manifestamente insuficiente para a construção do empreendimento. (Q 62.º)
     98. A ré aceitou as condições impostas pela RAEM e fez a respectiva promessa escrita. (Q 63.º)
     99. Em casos de inimputabilidade do concessionário, a política da RAEM era de atribuir, por ajuste directo, nova concessão ao anterior concessionário. (Q 65.º)
     100. A Ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou dada uma nova concessão do mesmo terreno para data posterior a 25/12/2015, porque os Serviços da Administração lhe criaram tais expectativas, nomeadamente: (Q 66.º)
1) Ao imporem-lhe o cumprimento da exigência da distância mínima entre torres de 1/6 da torre mais alta, o que foi dispensando em momento ulterior, exigência não prevista em parte alguma e inédita em Macau, o que fez com que despendesse o tempo entre 22/10/2009 a 7/1/2011;
2) Ao imporem-lhe o cumprimento da exigência da aprovação dos relatórios de circulação de ar e de impacto ambiental, exigência não prevista em parte alguma e inédita em Macau, o que obrigou que se despendesse o tempo entre 7/1/2011 e 15/10/2013;
3) Ao emitirem a licença de obra para as fundações, em 2/1/2914, um mês antes do termo do prazo de aproveitamento, sabendo que era impossível concluir o empreendimento até ao termo do contrato de concessão;
4) Ao prorrogarem o prazo de aproveitamento, em 29/07/2014, até 25/12/2015, sabendo que seria impossível concluir o empreendimento até essa data;
5) Ao ser essa a prática seguida anteriormente em casos análogos, de se fazer nova concessão do mesmo terreno ao mesmo concessionário, em caso de não aproveitamento do terreno dentro do prazo.
     101. A Ré ofereceu ao público milhares de fracções autónomas por construir deste seu empreendimento em termos semelhantes àqueles que acordou com o autor no contrato em apreço nos presentes autos, com pagamento do preço na modalidade de pagamento integral ou pagamento faseado (Q 68.º)
     102. Os Autores candidataram-se à aquisição de uma fracção autónoma ao abrigo da Lei n.º 8/2019, de 12 de Abril, por via do Despacho do CE de 30/5. (Q 69.º)
     103. Tal requerimento foi deferido. (Q 70.º)
     104. Tal fracção é de tipologia, área e preço equivalentes à fracção que constitui o objecto do contrato em causa nos presentes autos e está a ser construída no terreno que foi concessionado à Ré. (Q 71.º)
     105. Os autores apenas poderão receber do Governo tal fracção nas condições descritas porque celebraram com a ré o contrato referido na alínea J. relativamente a uma fracção autónoma a construir no mesmo terreno . (Q 72.º)
     106. O valor de mercado dessa fracção é superior ao valor inicialmente pago pelos Autores à Ré por fracção idêntica. (Q 73.º)

* * *
IV – FUNDAMENTAÇÃO
    Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este afirmou na sua douta decisão:
     
     I – RELATÓRIO.
     A e B, com outros elementos de identificação nos autos, intentaram a presente acção declarativa que segue termos sob a forma ordinária de processo comum contra a Ré, C Limitada (C有限公司), registada na CRCBM sob o n.º XXX.
     
     Alegando que, como promitentes-compradores e com entrega de sinal celebraram com a ré, em 30/07/2012, como promitente-vendedora, um contrato-promessa de compra e venda de uma fracção autónoma de um prédio urbano que a ré se propunha construir num terreno concessionado pela RAEM; alegando também que já cessou a concessão sem que a ré tivesse construído, incumprindo e já não podendo cumprir a promessa por razões que lhe são imputáveis, uma vez que, não diligenciou no sentido de concluir a construção dentro do prazo da concessão; e alegando ainda que a ré, em 28/9/2018, pagou ao “C” a quantia de HKD3.601.576,34 que os autores deviam ao referido Banco por terem contraído empréstimo bancário para pagarem o sinal,
     Pedem os autores que:
     1. Seja declarado resolvido o referido contrato-promessa;
     2. Seja a ré condenada a pagar-lhes a quantia de MOP8.691.576,37, correspondente ao dobro do sinal prestado (MOP12.401.200,00) com dedução da quantia que a ré pagou ao Banco por conta dos autores, acrescida de juros de mora à taxa legal das obrigações de natureza comercial, calculados com base no valor de MOP12.401.200,00, a partir da cessação da concessão (26/12/2015) até 27/09/2018; e calculados com base no valor de MOP8.691.576,37, a partir de 28/09/2018 até ao pagamento integral;
     3. Para o caso de se entender que a falta de cumprimento não é imputável à ré, pede a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de MOP2.490.976.37, acrescida de juros de mora à taxa legal das obrigações de natureza comercial, calculados com base no valor de MOP6.200.600,00, a contar de 26/12/2015 a 27/09/2018; e, calculados com base no valor de MOP2.490.976,37, a partir de 28/09/2018 até ao pagamento integral até ao pagamento integral.
     
     Contestou a Ré, aceitando a existência do contrato-promessa invocado pelos autores mas rejeitando que já não possa ser cumprido, alegando que intentou uma acção judicial contra a RAEM na qual pretende conseguir um novo contrato de concessão por arrendamento do mesmo terreno onde pretendia construir o empreendimento imobiliário de que fazia parte a fracção autónoma contratada, a qual, em caso de procedência da referida acção judicial, poderá ser entregue aos autores.
     Ainda em contestação, disse a ré que, caso improceda a referida acção que intentou contra a RAEM e caso não possa efectivamente construir o seu empreendimento imobiliário nem possa cumprir a sua obrigação para com os autores, essa impossibilidade não lhe deve ser imputada a si porquanto deve ser imputada à RAEM, a qual, durante o decurso do respectivo procedimento administrativo para aprovação do projecto de arquitectura e para emissão da licença de obras, fez exigências de alteração do projecto de arquitectura que não podia ter feito, fez indevidamente exigências de realização de estudos do impacto ambiental do mesmo projecto e, além disso, não cumpriu os prazos estabelecidos no contrato de concessão e demorou demasiado a apreciar os pedidos da ré para prorrogação do prazo de aproveitamento da concessão, o que levou a que a ré não pudesse iniciar a construção mais cedo e não tivesse conseguido concluí-la antes de caducar a referida concessão.
     Para o caso de se concluir que ocorre impossibilidade da prestação e que esta é imputável à ré, veio esta, também na contestação, defender que os autores não têm direito a indemnização calculada pelo valor do sinal prestado, porquanto foi acordado que as quantias pagas à ré não constituíam sinal.
     Também na contestação que apresentou, disse a ré que, caso se conclua pela impossibilidade imputável e pela existência de sinal, deve a indemnização determinada pelo valor deste ser reduzida segundo juízos de equidade.
     Ainda na contestação, disse a ré que o preço que os autores pagaram foi inferior ao alegado por lhes ter sido feito um desconto e que, alegando os autores o contrário, litigam de má fé e devem ser condenados em multa e indemnização.
     Ainda na contestação bateu-se a ré contra a pretensão relativa aos juros de mora dizendo que devem contar-se apenas desde a citação e à taxa dos juros civis.
     Por fim, requereu a ré contestante a intervenção acessória da RAEM invocando como fundamento que, caso seja condenada a indemnizar os autores, terá direito de regresso contra a RAEM para esta lhe reembolsar o montante da condenação.
     
     Na réplica que apresentaram, os autores, com excepção do respeitante aos juros moratórios, impugnaram todas as teses da contestação da ré, quer quanto à afirmação da prestação da ré como ainda possível, à imputabilidade a terceiro da causa da impossibilidade da prestação, à inexistência de sinal e à intervenção da equidade na fixação do montante da indemnização.
     Quanto ao desconto que a ré alegou ter feito aos autores no preço acordado e quanto à litigância de má-fé fundada a omissão de alegação do referido desconto, vieram os autores aceitar a existência do desconto alegado pela ré e requereram a correspondente modificação da causa a pedir e a redução do pedido e negaram litigar de má-fé.
     A ré ainda apresentou tréplica, aceitou a redução do pedido sobre o desconto e discordou dos cálculos efectuados pelos autores relativos ao pagamento que a ré fez por conta deles ao Banco que lhes concedeu crédito.
     
     Foi admitida a intervenção acessória da RAEM, a qual contestou e foi objecto de resposta pelas partes principais. Porém, a ré veio comunicar aos autos que desistiu da acção de indemnização que movera contra a RAEM e, por isso, foi proferido despacho a fls. 1047 a declarar extinta a instância relativamente à RAEM por inutilidade superveniente da lide.
     
     Foi proferido despacho saneador a fls. 962 a 973b, no qual foi admitida a modificação da causa de pedir e a redução de pedido requeridas pelos autores na réplica e também selecionou a matéria de facto relevante para a decisão.
     
     Procedeu-se a julgamento, foi decidida a matéria de facto controvertida e não foram apresentadas doutas alegações de Direito.
     *
     II – SANEAMENTO.
     A instância mantém-se válida e regular, como decidido no despacho saneador e nada obsta ao conhecimento do mérito.
     *
     III – QUESTÕES A DECIDIR.
     Tendo em conta o relatório que antecede, designadamente:
     - Que a principal pretensão dos autores é serem indemnizados/restituídos em consequência dos danos que sofreram por a ré não ter cumprido, por impossibilidade superveniente, a prestação a que se vinculou por contrato;
     - O facto de a essência da principal divergência entre as partes ser a imputabilidade à ré ou a terceiro da causa da impossibilidade superveniente da prestação da ré e a existência ou inexistência de sinal;
     As principais questões a decidir gravitam à volta de:
     1- Ocorrência de impossibilidade da prestação contratual a cargo da ré e, em caso afirmativo, imputação à ré ou a terceiro da causa superveniente da impossibilidade da referida prestação.
     1.1 - Caso se conclua que ocorre a referida impossibilidade superveniente da prestação e que a respectiva causa deve ser imputada a terceiro, importa apurar as consequências jurídicas de tal imputação, designadamente:
     1.1.1 - Quanto à extinção da obrigação da ré decorrente do contrato que celebrou com os autores;
     1.1.2 Quanto a eventual criação na esfera jurídica da ré de uma outra obrigação de restituir aos autores o que deles recebeu;
     1.2 - Caso se conclua que a causa da impossibilidade superveniente da prestação a cargo da ré deve ser imputada à própria ré, importa então apurar as consequências da referida impossibilidade superveniente da prestação decorrente de causa imputável à ré, designadamente:
     1.2.1 – Direito dos autores de resolver o contrato;
     1.2.2 – Criação na esfera jurídica da ré de uma obrigação de restituir aos autores o que deles recebeu.
     1.2.3 – Obrigação da ré indemnizar os autores.
     1.2.3.1 - Caso se conclua que a ré tem obrigação de indemnizar os autores, caberá apurar o montante da indemnização e a ocorrência de mora no cumprimento desta obrigação de indemnizar, para isso é necessário averiguar se foi acordado e prestado sinal;
     1.2.3.1.1 - Caso se conclua pela existência de sinal, caberá ainda decidir se a indemnização deve ser calculada com base no “regime-regra” do sinal ou se ser reduzida segundo juízos de equidade para montante inferior ao valor do sinal prestado.
     1.2.3.1.2 Caso se conclua pela inexistência de sinal, caberá determinar qual o valor da indemnização na ausência de sinal.
     1.2.3.1.3 – Caso se conclua pela ocorrência de mora no cumprimento da obrigação de indemnizar é ainda necessário apurar as consequências desta a nível indemnizatório, designadamente quanto ao início da mora e quanto à taxa do juro moratório.
     2 Ocorrência, ou não, de litigância de má fé por parte dos autores.
     *
     IV – FUNDAMENTAÇÃO.
     A) – Motivação de facto.
     Estão provados os seguintes factos:
     (...)
     
     B) – Motivação de Direito.
 1 – Da impossibilidade superveniente da prestação.
     Neste momento da discussão já não são necessárias especiais considerações para concluir que a prestação da ré se tornou impossível. Seja qual for a prestação devida: celebrar o contrato prometido de compra e venda de uma fracção autónoma de prédio urbano ou apenas construir e entregar a referida fracção. Com efeito, não tendo a ré meios jurídicos conhecidos nos autos que lhe permitam construir a mencionada fracção, não se vê como negar as características relevantes da impossibilidade superveniente da prestação: ojectiva, absoluta e definitiva1. Com efeito, sem que ocorram circunstâncias de todo imprevisíveis presentemente, a ré, apesar de ser uma sociedade comercial e poder existir durante muito tempo, não tem possibilidade jurídica de construir ou adquirir a fracção autónoma em causa2. Trata-se de uma impossibilidade jurídica da prestação, não de uma impossibilidade física ou naturalística, pois a construção da mencionada fracção está acessível à ré pelos conhecimentos técnicos existentes, mas não lhe está permitida por causa da sua situação jurídica actual e previsível num futuro ponderável3. Na verdade, resulta dos autos que a ré não tem qualquer direito sobre o terreno onde se iria situar a planeada construção. E sem tal direito não lhe é juridicamente possível construir.
     
     Conclui-se assim que se tornou impossível após a celebração do contrato a prestação que a ré acordou com os autores.
     
     Resta, pois, apurar as consequências da impossibilidade da prestação.
     
     1.1 – Dos efeitos da impossibilidade da prestação.
     1.1.1 – Em geral.
     Se a prestação acordada é originariamente impossível, a obrigação não nasce porque o contrato é nulo e, por isso, não gera a obrigação de prestar nem o dever de cumprir (art. 395º, nº 1 do CC).
     Se a prestação acordada é originariamente possível (aquando da celebração do respectivo negócio jurídico), mas posteriormente deixa de o ser, a obrigação extingue-se, não pode ser cumprida e o devedor deixa de ter o dever de a prestar (arts. 779º e 790º do CC).
     Se a impossibilidade superveniente ocorre por razões não imputáveis ao devedor, mas imputáveis a terceiro, ao credor ou a ninguém (caso fortuito ou de força maior), fica o devedor exonerado perante o credor. Se, porém, o credor cumpriu perante o devedor a sua eventual contraprestação e a causa da impossibilidade não imputável ao devedor também não lhe é imputável a si, credor, então este, credor, tem direito a que lhe seja restituído o que prestou, mas segundo as regras do enriquecimento sem causa. É esta a tese da ré, escorada no art. 784º do CC. Com efeito, entende que a impossibilidade da prestação não lhe é imputável a si nem ao credor, mas a terceiro, a RAEM.
     Se a prestação se tornou impossível por causa imputável ao devedor, a obrigação extingue-se, não pode ser cumprida e o devedor deixa de ter o dever de a prestar, como se disse atrás. Porém, o devedor poderá ver nascer na sua esfera jurídica outra obrigação, a obrigação de indemnizar o credor pelos prejuízos sofridos em consequência da mencionada impossibilidade superveniente, devendo o devedor indemnizar o credor como se faltasse culposamente ao cumprimento devido (art. 790º, nº 1 do CC).
     Para apurar os efeitos da impossibilidade da prestação torna-se, pois, necessário decidir se a causa da impossibilidade da prestação é imputável à ré devedora ou à RAEM, terceiro em relação à prestação.
     Vejamos.
     
     1.1.2 – Da imputação da causa da impossibilidade da prestação.
     Este tribunal já decidiu esta questão em diversos litígios semelhantes ao que se discute nos presentes autos e não encontrou ainda razões para decidir de modo diferente. As partes, designadamente os seus ilustres mandatários conhecem a fundamentação da referida decisão deste tribunal, razão por que não advém redução das garantias processuais das partes se aqui não se reproduzir exaustivamente aquela fundamentação.
     Em síntese:
     A imputação é a atribuição a uma pessoa dos efeitos jurídicos de um facto. No caso presente está em causa a atribuição à ré do dever de indemnizar os autores (efeito jurídico) por ter ocorrido a impossibilidade da prestação (facto jurídico).
     A causa da impossibilidade jurídica da prestação da ré foi o facto de a ré não ter construído a facção acordada com os autores no prazo de que a ré dispunha nos termos do contrato de concessão, o que causou a caducidade da concessão e a impossibilidade jurídica de construir e entregar.
     A imputação à ré da causa da impossibilidade da sua prestação depende da sua culpa em relação a essa causa.
     A culpa é um juízo de censura dirigido a uma pessoa por ter tido um comportamento diverso daquele que deveria ter tido, ou seja, por ter tido um comportamento ilícito ou contrário ao Direito em vez de ter tido um comportamento lícito. In casu está em causa um ilícito contratual, o incumprimento de uma obrigação contraída por via contratual.
     Este juízo de culpa pressupõe capacidade de motivação e liberdade de decisão do agente (que não se questiona em relação à ré) e, em matéria de responsabilidade civil, estrutura-se numa comparação entre o comportamento que o agente teve e aquele que, no seu lugar, teria um bom pai de família, o qual é uma pessoa que, entre o mais, se esforça por não cair em situações que o impeçam de honrar aquilo a que se comprometeu por via contratual e que, para isso, designadamente, pondera bem as possibilidades de cumprir antes de se comprometer e não se compromete quando há um não desprezível grau de probabilidade de não conseguir cumprir.
     A ré, quando se comprometeu com os autores a cumprir (30/07/2012), dispunha de menos de dois anos até ao fim do prazo de aproveitamento da concessão (28/2/2014) e de cerca de três anos e cinco meses até ao fim do prazo da concessão (25/12/2015), sendo notório que se trata de tempo insuficiente o que decorreu entre a celebração do contrato e o termo do prazo de aproveitamento, pois que a ré se comprometeu a construir em “1200 dias úteis de sol, contados a partir da conclusão do primeiro piso para habitação das obras de superestrutura”, necessitava de três a quatro anos para construir (ponto 85. dos factos provados) e quando contratou ainda não tinha licença de obras para iniciar a construção por esta licença depender da aprovação administrativa de estudos de impacto ambiental que a ré apresentara à autoridade competente em 11 de Maio de 2011 e que não estavam ainda aprovados na data em que a ré celebrou o contrato com os autores (30/07/2012 e ponto 10. dos factos provados). Além disso, a ré necessitava da cooperação dos serviços públicos da RAEM, que vinham cooperando com atraso não despresível em relação aos prazos legais e contratuais, não relevando aqui as razões desse atraso, quer sejam ponderosas, quer sejam censuráveis, quer respeitem a acumulação imprevisível de serviço, que respeitem a falhas de organização ou outras falhas. Acresce que quando contratou, não podia a ré tomar por certo que o prazo de aproveitamento lhe fosse prorrogado, como efectivamente veio a ser, até ao termo do prazo da concessão (art. 105º, nº 3 da Lei de Terras então vigente - Lei nº 6/80/M, de 5 de Julho).
     Neste contexto, um bom pai de família, no lugar da ré, não se vincularia a construir e entregar como a ré se vinculou ou, então, obtinha a adesão da sua contraparte contratual à possibilidade de sobrevir a impossibilidade de cumprir, incrementando ao contrato alguma álea em vez de se comprometer firmemente como se comprometeu. A ré distanciou-se claramente do comportamento que no seu lugar teria um bom pai de família. Tomou por certo o que eram meras expectativas. A ré é juridicamente censurável em termos de culpa por ter ocorrido a impossibilidade da sua prestação, uma vez que actuou com a solenidade, a certeza e a firmeza que pertence aos contratos e aos compromissos contratuais quando as circunstâncias em que actuou determinariam a um bom pai de família que não contratasse ou que contratasse com diferente clausulado que esclarecesse a outra parte contratante da escassez de tempo e da cooperação necessária, lenta e exigente que a Administração lhe vinha prestando.
     Este tribunal só pode decidir por razões jurídicas. Se, por mero exemplo, a actuação da ré foi meritória, justificada ou compreensível em termos gestão empresarial não cabe aqui avaliar nem releva em sede de juízo de culpa cível em matéria de responsabilidade civil. O risco empresarial não é o risco jurídico. Este tem a ver com os direitos e os deveres jurídicos, nomeadamente de quem celebra contratos e, designadamente, do âmbito da autonomia privada e do dever de agir de boa fé. Aquele outro risco é aqui alheio.
     Em conclusão, a causa da impossibilidade da prestação é, crê-se que sem sombra de dúvida, juridicamente imputável à ré a título de culpa.
     
 2 – Da resolução contratual.
     No que respeita ao direito à resolução do contrato e às suas consequências de restituição retroactiva do que foi prestado, não se vê como negar. É a lei evidente (arts. 790º, nº 2, 426º a 428º e 282º do CC) e nem as partes questionam.
     Procede, pois, esta pretensão dos autores e deve ser declarado resolvido o contrato, como peticionado.
     
     3 – Da indemnização dos danos decorrentes da impossibilidade superveniente da prestação por causa imputável ao devedor.
     3.1 Da existência de obrigação de indemnizar.
     Estando decidido que houve incumprimento culposo da ré, rectius, impossibilidade da prestação por causa imputável à ré, basta que haja danos na esfera jurídica dos autores com nexo de causalidade com o referido incumprimento para que surja na esfera jurídica da ré a obrigação de indemnizar (arts. 787º, 790º e 557º do CC).
     Tendo-se provado que os autores pagaram à ré para receber deles um imóvel e que nada receberam é forçoso concluir que os autores sofreram danos decorrentes do incumprimento da ré, pois que pagaram para adquirir e nada adquiriram.
     Assim, não são necessárias outras considerações para se concluir que existe na esfera jurídica da ré a obrigação de indemnizar os autores, sendo a controvérsia essencialmente respeitante ao valor da indemnização.
     
     3.2 Do montante da indemnização
     Os autores pretendem ser indemnizados pelo dano legalmente predeterminado correspondente ao valor do sinal prestado.
     Por seu lado, a ré entende que a sua culpa, caso se conclusa que existe, é diminuta e, havendo lugar a indemnização, esta deve ser fixada, por razões de equidade, em montante inferior ao “sinal” prestado.
     
     O princípio geral em matéria de responsabilidade civil é que devem ser indemnizados todos os prejuízos efectivamente sofridos pelo credor em consequência do incumprimento do devedor (arts. 787º - “prejuízo que causa ao credor”, 556º - “reconstituir a situação que existiria” e 557º - “danos que o lesado … não teria se não fosse a lesão” - do CC.).
     
     No entanto, se for constituído sinal é o valor deste que, em princípio, determina o valor da indemnização, o valor que terá a obrigação de indemnizar originada pelo incumprimento culposo. É o que dispõe o art. 436º do CC.
     É, pois, necessário apurar se foi constituído sinal, entendendo os autores que foi e a ré que não foi.
     
     3.2.1 Da existência de sinal
     Da qualificação do contrato.
     Como antes se referiu, os autores e a ré entendem que o contrato em discussão nos presentes autos deve ser qualificado como contrato-promessa. Também é esse o entendimento deste tribunal. Com efeito, a prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CC), como ocorre no caso dos presentes autos e resulta do nº 10. dos factos provados.
     
     Da convenção de sinal.
     O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico4. Numa certa perspectiva, é, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial.
     Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes.
     Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes5.
     Se os autores pretendem ser indemnizados segundo o regime do sinal, cabe-lhes, nos termos do art. 335º, nº 1 do CC, alegar e provar, entre o mais, os factos demonstrativos de ter sido estipulada a existência de sinal.
     Porém, no caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CC que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
     Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CC). No caso dos autos, provou-se que os autores entregaram à ré, promitente-vendedora, determinada quantia em dinheiro no âmbito do contrato promessa que celebraram. Provou-se o facto base da presunção, pelo que está presumido que as partes quiseram atribuir carácter de sinal. Cabe, pois à ré, interessada em ilidir a presunção, a alegação e a prova do facto contrário ao facto presumido, isto é, cabe-lhe provar que as partes acordaram que a quantia entregue não tinha carácter de sinal. A ré não conseguiu fazer a prova dessa vontade negocial contrária à presunção legal (resposta dada ao quesito 50º-A da base instrutória). Tem a ré de ver esta questão decidida em sentido contrário à sua pretensão.
     
     Conclui-se, pois, que foi acordado sinal no caso em apreço.
     
     O montante da indemnização predeterminado pelo valor do sinal e a sua redução por juízos de equidade.
     “Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado” (art. 436º, nº 2 do CC).
     Está demonstrado que a ré não cumpriu definitivamente a sua promessa de venda.
     Está também demonstrado que a ré recebeu sinal.
     Foi já decidido atrás que a causa do incumprimento não é imputável a terceiro e que é imputável à ré a título de culpa. E também já atrás foi decidido que o incumprimento culposo da ré confere os autores o direito de resolver o contrato-promessa.
     Deve, pois a ré restituir o que recebeu para cumprir a promessa de venda que não cumpriu, uma vez que, como efeito da resolução do contrato, sempre terá que devolver o que lhe foi prestado (arts. 282º e 427º do CC) 6. Mas terá ainda de pagar aos autores um montante igual ao do sinal que recebeu?
     Vejamos.
     Dispõe o nº 4 do art. 436º do CC que “na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste”.
     E dispõe o art. 801º, nº 1 do CC, aplicável por força do disposto no nº 5 do art. 436º do mesmo CC, que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”.
     Portanto, o valor da indemnização por incumprimento do contrato, rectius, por impossibilidade culposa da prestação, deve, em princípio, corresponder ao valor do sinal prestado. Porém, o referido valor da indemnização pode ser:
     - Aumentado para o valor do dano efectivamente sofrido pelo credor se este dano for consideravelmente superior ao valor do sinal7;
     - Reduzido para montante equitativo não inferior ao valor do dano efectivo se a penalização resultante do sinal for manifestamente excessiva em relação ao mesmo dano efectivo8.
     
     Da redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado.
     A redução equitativa da indemnização requer a certeza de que a indemnização determinada pelo valor do sinal é manifestamente excessiva em relação ao dano efectivo.
     Em consequência da impossibilidade da prestação da ré, os autores irão receber do Governo de Macau uma fracção idêntica à que pretendiam adquirir da ré e por preço idêntico ao acordado com a ré (pontos 102. a 106. dos factos provados9).
     Os autores tinham o direito de adquirir a fracção prometida sem ter que pagar nada mais do que já pagaram à ré (HKD5.297.600,00 – após desconto) e terão de pagar pela aquisição da “habitação para troca” o preço igual ao que acordaram com a ré (sem desconto – HKD6.020.000,00), pelo que terão um prejuízo de HKD722.400,00.
     Os autores estão privados há vários anos da fracção autónoma prometida pela ré e continião privados dela durante tempo presentemente desconhecido. Essa privação é inegavelmente um dano, embora se desconheça o montante, o qual deve ser ponderado segundo juízos de equidade, nos termos do disposto no art. 560º, nº 6 do CC.
     Os autores tiveram ainda despesas com o empréstimo bancário que contraítram ao C, pois que se provou que pediram HKD4.214.000,00 (ponto 15. dos factos provados) e que a ré só reembolsou HKD3.601.576,34 (ponto 35. dos factos provados). Essas despesas são dano para os autores, embora também se desconheça o montante concreto, designadamente os juros remuneratórios pagos pelos autores, montante que deve também ser ponderado segundo juízos de equidade, nos termos do disposto no art. 560º, nº 6 do CC.
     
     O prejuízo dos autores serão, então, o correspondente à privação do desconto (interesse contratual negativo), à privação da disponibilidade da fracção entre a data em que a ré deveria entregar e a data em que a irá receber da sociedade comercial Macau Renovação Urbana, S.A. (interesse contratual positivo) e às despesas que tiveram com a contração e a amortização parcial do empréstimo bancário (interesse contratual negativo). No que tange ao interesse contratual positivo trata-se de uma situação semelhante à mora e não ao incumprimento definitivo, pois que os autores irão adquirir uma fracção como pretendiam, mas mais tarde do que acordaram.
     Se aos autores for devolvida a quantia que pagaram e se obtivem pelo mesmo preço a fracção que pretendiam, embora com atraso e sem desconto no preço, a indemnização correspondente ao valor que pagaram (HKD5.297.600,00) é manifestamente excessiva, pois que a disponibilidade da fracção durante o tempo em que os autores dela não podem dispôr não proporcionaria aos autores um valor líquido tão elevado que, somado ao “desconto perdido” e às despesas suportadas, se aproximase de HKD5.297.600,00.
     O Venerando Tribunal de Segunda Instância já apreciou caso com algumas semelhanças com o presente, embora a ali autora tivesse feito o seu pagamento no ano de 2015, e considerou que o dano equitativo corresponde à aplicação de uma taxa anual de 3,5% durante 8 anos sobre o valor efectivamente pago pela autora10, embora a ali autora tivesse pago a terceiro pela aquisição da posição contratual de promitente-compreador valor superior ao que o “cedente” havia pago à ré”. Perspectivou, pois o dano como interesse contratual negativo. Não o que a autora deixou de auferir através do que despendeu, mas o que tiver de despender em vão, sem nada auferir.
     As diferenças entre o caso apreciado pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância e o caso presente impedem que aqui se siga a solução ali encontrada.
     
     Este tribunal também já decidiu em diversos casos a questão da redução equitativa do valor da indemnização determinada pelo valor do sinal. Sendo essa decisão e a respectiva fundamentação conhecidas das partes através dos seus ilustres mandatários, é aqui dispensável repetir.
     Assim, tudo ponderado, designadamente que a culpa da ré é diminuta e que o valor da indemnização não deve ser inferior ao dano efectivo e deve ainda permitir que o sinal cumpra a sua função penitencial, afigura-se equitativo fixar em HKD4.000.000,00 o valor da indemnização a cargo da ré em consequência da impossibilidade superveniente da sua prestação devida no âmbito do contrato que celebrou com os autores.
     
     2 Dos pedidos subsidiários.
     Em consequência do que fica dito, está prejudicada a apreciação dos pedidos subsidiários que pressupõem que se considere que não foi acordado sinal e que o incumprimento não é imputável à ré.
     
     3 Da quantia paga pela ré ao C por conta dos autores.
     Como resulta do exposto, a ré tem duas obrigações para com os autores: a obrigação de restituir o que recebeu, que resulta como efeito da resolução do contrato, e a obrigação de indemnizar os danos sofridos pelos autores, que resulta da impossibilidade da prestação por causa imputável ao devedor.
     Ambas as obrigações têm diferentes regimes moratórios, como à frente se verá. Releva, pois, decidir onde “descontar” a quantia que a ré pagou por conta dos autores.
     
     Os autores contraíram empréstimo bancário para pagar à ré o preço acordado pela aquisição da posição contratual de promitentes compradores. A ré, por acordo com o Banco mutuante, pagou a dívida dos autores. Autores e ré estão de acordo que o montante pago pela ré ao Banco seja deduzido na quantia que a ré deve pagar ao s autores. Não havendo discussão nesta parte, também o tribunal não vê razão para discutir, apenas para procurar onde deve ser feita a dedução.
     
     Da sub-rogação.
     Um terceiro interessado pode cumprir a obrigação do devedor (art. 757º do CC) e o credor que recebe de terceiro pode sub-rogá-lo nos direitos que tinha sobre o devedor, adquirindo o terceiro esses direitos (arts. 583º e 587º do CC). O credor também pode ceder a terceiro o seu crédito, mesmo sem consentimento do devedor (art. 571º do CC).
     Os autos não fornecem os factos necessários a qualificar a situação que cria o crédito da ré a compensar com o crédito dos autores, seja como sub-rogação, seja como transmissão de crédito. Com efeito, os referidos factos não esclarecem qual era concretamente a dívida dos autores para com o Banco mutuante. Tudo aponta para se concluir que a ré não cumpriu a obrigação dos autores. Ao que parece, modificou-a e cumpriu a obrigação modificada. Ao que parece, os autores pediram emprestado e estavam a pagar mensalmente conforme acordado, o que demoraria anos. A ré acordou com o Banco liquidar tudo de uma vez só. Sem o consentimento do devedor, o credor e terceiro não podem modificar a obrigação daquele devedor.
     Assim, a ré não adquiriu qualquer crédito do Banco sobre os autores, porque estes deviam prestações mensais e a ré cumpriu prestação única. Sem o consentimento dos autores, o que a ré e o Banco mutuante fizeram não vincula os autores. Assim, sem o consentimento dos autores, a ré e o Banco não podiam liquidar de uma só vez um empréstimo que se vencia em prestações mensais. A ré e o Banco interferiram no conteúdo da obrigação dos autores para com o Banco sem terem direito de interferir. O Banco mutuante não pode sub-rogar a ré num direito que não tem sobre os autores, o direito de liquidar arbitrariamente ou ad nutum a totalidade do empréstimo que acordou liquidar em prestações mensais.
     Conclui-se, pois, que a ré não é titular de qualquer crédito como tendo-lhe sido transmitido pelo Banco mutuante e, por isso, não pode compensá-lo com a dívida que tenha para com os autores.
     Mas afigura-se evidente que a actuação da ré, sem animus donandi, configura um enriquecimento dos autores sem causa justificativa, o que cria na esfera jurídica dos autores a obrigação de devolverem à ré aquilo como que se enriqueceram à custa dela. É certo que a situação de enriquecimento sem causa e da medida da obrigação de restituir que surge de tal enriquecimento, não foram invocadas nem tramitadas com alegação de factos em discussão contraditória, onde tudo que fosse pertinente se poderia invocar, designadamente a prescrição da obrigação de restituir. Mas afigura-se isento de questões e de dúvidas que se verificam todos os pressupostos daquele instituto e que a medida da obrigação de restituir por enriquecimento próprio e empobrecimento alheio é exactamente a quantia que a ré pagou ao Banco mutuante (arts. 467º e 473º). Como se disse, as partes não questionam a medida da dedução a fazer.
     Conclui-se, pois que a ré tem um direito sobre os autores: que lhe restituam o que por conta deles pagou ao C.
     E também não há dúvidas que a ré pode compensar esse crédito com a dívida que tenha para com os autores (art. 838º do CC).
     Os autores têm dois créditos diferentes sobre a ré: um crédito a que lhes sejam restituídos o que prestaram, o qual surge como efeito da resolução do contrato; outro crédito a que lhes sejam ressarcidos os danos que sofreram em consequência do incumprimento.
     A questão é agora saber qual o crédito dos autores que deve entrar na compensação. É o que estiver vencido no momento em que opera a compensação por declaração à outra parte com a notificação da contestação (arts. 838º, nº 1, al. a) e 839º, nº 1 do CC).
     A ré pagou ao C uma dívida dos autores e pretende-se a compensação. A quantia que a ré pagou deve ser compensada com a obrigação vencida na altura em que a compensação foi feita pelos próprios autores e com a citação da ré. Na referida altura, a obrigação de indemnizar ainda não estava vencida, pois só com a liquidação se vence (art. 794º, nº 4 do CC), mas venceu-se nessa mesma altura a obrigação de restituir em consequência da resolução contratual, que se venceu também com a citação (art. 430º do CC). É com esta obrigação que deve fazer-se a compensação.
     Deste modo, a parte que falta restituir da quantia que a ré recebeu dos autores é HKD1.696.023,66 (HKD5.297.600,00 - HKD3.601.576,34).
     
     4 Da mora no cumprimento da obrigação de indemnizar e da obrigação de restituir.
     6.1 Do início da mora (art. 794º do CC e art. 565º, nº 3 do CPC).
     Tendo a indemnização sido fixada segundo juízos de equidade, é ilíquida a respesctiva obrigação de indemnizar, pelo que a mora só se inicia com a liquidação operada pela presente decisão.
     Porém a mora quanto à obrigação de restituição do sinal prestado venceu-se com a interpelação. E esta interpelação ocorreu com a citação.
     
     6.2 A taxa de juro moratório.
     A indemnização moratória relativa às obrigações pecuniárias corresponde aos juros legais a contar do dia da constituição em mora, salvo excepções aqui inaplicáveis (art. 795º do CC).
     Nos termos do art. 569º, nº 2 do Código Comercial só em relação aos créditos de natureza comercial acresce a sobretaxa de 2% sobre os juros legais, não sendo aplicável ao crédito dos autores nem às obrigações de que sejam titulares passivos os comerciantes ou as empresas comerciais se o titular activo não for comerciante.
     A indemnização moratória deve corresponder aos juros legais contados desde a citação sem acréscimo da sobretaxa aplicável aos créditos de natureza comercial.
     
     7 – Da qualidade da litigância dos autores.
     Os autores alegaram que pagaram à ré a quantia de HKD6.020.000,00 e a ré alegou que apenas lhe foi paga a quantia de HKD5.297.600,00 porquanto fez um desconto aos autores de HKD722.400,00.
     Dizendo a ré que o referido desconto era do conhecimento dos autores, conclui aquela que estes litigaram de má fé ao alegar factos contrários à verdade.
     Os autores responderam aceitando que foi feito o referido desconto, mas rejeitando litigarem de má fé e dizendo que a própria ré declarou por escrito que recebeu HKD6.020.000,00 e que devolveu HKD722.400,00.
     Na réplica os autores já reconduzem a sua tese à indemnização de acordo com o montante que efectivamente pagaram, HKD5.297.600,00, e pedem a redução dos pedidos nos pontos 2.º e 3.º da petição inicial.
     
     Tendo os autores reduzido o pedido e modificado a causa de pedir em função da divergência apontada pela ré, não pode a sua forma de litigância ser qualificada de má fé.
     *
     V – DECISÃO.
     Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, declara-se resolvido o contrato celebrado entre as partes e condena-se a ré a pagar aos autores a quantia de:
     - HKD1.696.023,66 (um milhão, seiscentos e noventa e seis mil e vinte e três dólares de Hong Kong e sessenta e seis cêntimos), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da citação da ré até integral pagamento;
     - HKD4.000.000,00 (quatro milhões de dólares de Hong Kong), acrescida de juros contados à taxa legal desde a data da presente sentença até integral pagamento.
     
     Custas a cargo de autores e ré na proporção do respectivo decaimento.
     Registe e notifique.
*
    Quid Juris?
    Uma vez que está em causa essencialmente a aplicação de Direito aos factos assentes vamos apreciar em conjunto os recursos interpostos pelos Autores e pela Ré.
*
    Ora, a particularidade do caso dos autos consiste no seguinte:
    a) – Os Autores (contraentes) pagaram uma parte do preço acordado para adquisição da fracção autónoma em causa;
    b) – Depois, os mesmos chegaram a candidatar-se a uma fracção semelhante por via de “compensação” nos termos permitidos pela Lei nº 8/2019, de 30 de Maio;
    c) - Agora, os Autores vêm a reclamar a restituição em dobro das quantias totais pagas por eles.
    Terão os Autores fundamentos legais para o fazer?
    Tal como temos vindo a sublinhar que cada caso é um caso, não obstante existirem vários processos em que se discutem as questões idênticas ou semelhantes.
    Ora, dada a identidade ou semelhança da matéria discutida neste tipo de processos, as considerações por nós tecidas noutros processos valem, mutatis mudantis, para o caso, obviamente com as devidas adaptações, nomeadamente no processo nº 813/2024, com o acórdão proferido em 13/3/2025, em que ficou consignado o seguinte entendimento:
    
     “(…)
    1) – Nos exercício das funções jurisidicionais, é do conhecimento deste TSI que são basicamente as seguintes situações que dão origem aos litígios em que se discutem as mesmas matérias:
    a) – O promitente-comprador mantém a sua posição contratual até à data em que foi proposta acção contra a Ré, sem que tivesse transmitido a sua posição contratual para terceiro;
    b) – O promitente-comprador chegou a ceder a sua posição de promitente-comprador para um terceiro, por um preço superior ao fixado no primeiro contrato-promessa, e é este terceiro, actual titular da posição do contrato-promessa que veio a propor a acção contra a Ré, pedindo que esta lhe pagasse o sinal dobro à luz do preço mais alto (ou seja, existe diferença ao nível do preço, o preço fixado no primeiro contrato-promessa e o preço mais alto posteriormente fixado no segundo (ou posteriores) contrato-promessa;
    c) – O promitente-comprador chegou a celebrar vários contratos-promessa com a Ré, prometendo adquirir várias fracções autónomas (depois, chegou a transmitir alguns contratos-promessa para terceiros e mantém alguns para si próprio).
    2) – Todas as hipóteses acima apontadas trazem várias questões para discutir, uma delas consiste em saber se é legítimo e justo que o promitente-comprador venha a receber o sinal em dobro independentemente das particularidades do caso em discussão.
    3) – No caso, não é supérfluo realçar que o caso em análise tem a sua particularidade, já que, ao contrário daquilo que se verifica em situações normais, em que a promitente-vendedor não quer cumprir de livre vontade e por iniciativa própria o acordado. No caso não foi isto que sucedeu, a Ré quis cumprir, só que por decisão do Governo da RAEM, a Ré não pude cumprir. Ou seja, a sua “culpa”(se podemos utilizar esta palavra) não é acentuada nem “indesculpável”, o que deve relevar para ponderar e fixar as sanções contratuais!
     (…)”.
    Neste tipo de processo em massa, são discutidas várias questões jurídicas:
    Questão da “culpa” (em sentido lato) da parte que não cumpriu a promessa:
    “Aqui, merece igualmente destacar um outro ponto: o raciocínio do Tribunal a quo aponta, parece-nos, para a ideia de que toda a culpa de incumprimento se concentra na parte da Ré/Recorrente, mas tal como se refere anteriormente por nós, não é líquida esta argumentação, já que a Ré fazia e tentava fazer tudo para que pudesse cumprir os compromissos assumidos perante o Governo da RAEM, apesar que o resultado final não vir a ser “satisfatório” a todos os níveis. Mas os comportamentos assumidos pela Ré demonstram que não existe “dolo” de incumprimento por parte dela, quanto muito, negligência ou utilizando uma linguagem diferente, um “ risco de investimento” que a Ré há-de assumir, daí a sua quota-parte de responsabilidade, circunstâncias estas que devem ser valoradas na fixação das indemnizações que cabem no caso em análise. Aliás, o Tribunal recorrido na fundamentação da decisão dos factos afirmou: “A convicção do tribunal formou-se na análise crítica da globalidade da prova testemunhal e documental produzida, ponderada nos termos antes referidos e que podem ser explicitados sinteticamente como segue.
    É uma evidência que a ré tinha vontade firme de concluir o empreendimento “Pearl Horizon”, o que resulta da consideração dos esforços e dispêndios que fez, incontestáveis e incontestados nos autos, incluindo por via judicial.”
*
    Conforme o quadro factual fixado pelo Tribunal recorrido, existem vários factos que são claros para demonstrar que a Ré não actuou com “dolo” no cumprimento dos acordos quer perante o Governo enquanto concedente quer perante as partes dos contratos-promessa, a saber:
    “(…)
     - A DSSOPT aprovou o projecto sem o sugerido afastamento entre torres e em 7/1/2011 notificou a ré dessa aprovação e notificou-a ainda para apresentar o relatório de estudo de impacto ambiental que teria a construção do edifício em matéria de fluxo de ar, efeito biombo, ilhas de calor e expansão de poluentes e referindo à ré que não lhe seria emitida licença de obras sem que o referido relatório fosse apresentado e aprovado;
     - Em 11/5/2011, a ré apresentou à DSSOPT um relatório do estudo de impacto ambiental requerido;
     - Posteriormente, a DSSOPT em coordenação com a DSPA exigiu à ré a apresentação de outros relatórios de estudos de impacto ambiental incidentes sobre outros aspectos ambientais diferentes daqueles que havia mencionado e a ré apresentou-os até que, em 15/10/2013, foi aprovado o último relatório apresentado;
     Em 24/10/2013, a ré requereu à DSSOPT a emissão de licença de obras que foi emitida em 2/1/2014.
     - Se a DSSOPT tivesse dado resposta em 60 dias apreciando o projecto parcial de arquitectura apresentado pela ré em 06/05/2008, a que não respondeu;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando o projecto global de arquitectura apresentado pela ré em 22/10/2009, a que respondeu em 9/4/2010;
     - Se a DSSOPT tivesse respondido em 60 dias apreciando a alteração apresentada ao referido projecto global em 3/6/2010, a que respondeu em 7/1/2011 e
     - Se a DSSOPT, quando em 7/1/2011 exigiu pela primeira vez a realização de estudos de impacto ambiental, tivesse exigido à ré todos os estudos da mesma natureza que lhe exigiu mais tarde.
    
    “(…)”
     1. A Ré confiou que lhe seria prorrogado o prazo de aproveitamento ou dada uma nova concessão do mesmo terreno para data posterior a 24/12/2015 porque os serviços da RAEM criaram tais expectativas, nomeadamente:
a. Ao emitirem licença de obras para as fundação em 02/1/2014, um mês antes do terreno do prazo de aproveitamento;
b. Ao Prorrogarem o prazo de aproveitamento em 29/7/2014 até 25/12/2015, sabendo que tal não seria possível;
c. Já anteriormente haviam concessionado novamente o mesmo terreno ao mesmo concessionário em casos em que o terreno concessionado não tinha sido aproveitado no dentro do respectivo prazo. (Q 9.º)
    (…)”.
    Tudo isto demonstra claramente que a Ré não actuou com dolo para desrespeitar as obrigações decorrentes dos contratos-promessa, pelo contrário, os factos assentes acima transcritos podem constituir alteração superveniente das circunstâncias nos termos do artigo 431º do CCM (chegou-se também alegar esta matéria na sua PI), já que se tratam de factos imprevisíveis e que ocorreram posteriormente ao momento da celebração dos acordos em análise.
*
    Questão da consideração do benefício obtido pela parte não culposa na resolução dos contratos bilaterais:
    “(…)
    Com as devidas adaptações, o disposto no artigo 784º/2 do CCM pode ser chamado para fundamentar a decisão em análise, já que tal normativo dispõe:
    
(Contratos bilaterais)
    1. Quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa.
    2. Se a prestação se tornar impossível por causa imputável ao credor, não fica este desobrigado da contraprestação; mas, se o devedor tiver algum benefício com a exoneração, o valor do benefício é descontado na contraprestação.
    Em regra, a restituição do sinal não representa uma injustiça flagrante ou ofende o sentido de justiça material, é de aceitar como correcta a solução legalmente consagrada: restituição do sinal em dobro por quem não cumpre o acordo celebrado nos termos do disposto no artigo 801º do CCM.

*
    1) - Agora, relativamente ao dano excedente, quando não se pude ser calculado ao certo, à luz da doutrina dominante, e no caso da sua impossibilidade, recorre-se ao juízo de equidade.
    A propósito deste ponto, escreveu-se:
    “De harmonia com a lei substantiva, sempre que não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (art.º 566.º, n.º 3, do Código Civil). Considerada a possibilidade processual de uma condenação ilíquida, coloca-se o problema da articulação de uma e outra norma (artº 609.º, n.º 2, do CPC). A articulação deve ser feita do modo seguinte: se ainda for possível fixar no incidente de liquidação a quantidade da condenação, aplica-se a norma processual da condenação genérica; no caso inverso, o dano será equitativamente julgado5. Equidade – como justiça do caso concreto – que, porém, sob pena de um julgamento puramente arbitrário ou atrabiliário, não prescinde de um suporte de facto, por mínimo ou reduzido que seja6, nem serve para alijar por inteiro, o não cumprimento, seja pelo credor da obrigação de indemnização quantitativamente indeterminada do ónus da prova do valor do dano a que está indiscutivelmente adstrito, seja pelo devedor de igual ónus que o vulnera no tocante a qualquer facto extintivo daquela mesma obrigação (art.º 342.º, n.ºs 1 e 2, e 346.º, n.º 1, in fine, do Código Civil, e 414.º do CPC).”11

    Questão da aplicação da teoria de interesse contratual negativo ou de confiança:
“(…)
    2) – Pergunta-se, como é que se deve resolver este tipo de questões? A propósito desta matéria, citemos aqui a posição dominante vigente em Portugal, em nome do Direito Comparado (Cfr. ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 9/10/2012) sobre a matéria em discussão (uma situação semelhante):
“Acontece porém que nos situamos no âmbito da resolução do contrato. O autor optou pela resolução do contrato.
A resolução do contrato “consiste na destruição da relação contratual, validamente constituída, operada por um acto posterior de vontade de um dos contraentes, que pretende fazer regressar as partes à situação em que elas se encontrariam se o contrato não tivesse sido celebrado” [14].
Entre as partes e na falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade do negócio jurídico, nos termos do art.º 433º do Código Civil. Por isso tem efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes.
Ao pretender indemnização por lucros cessantes, o A. está a pedir a reparação do interesse contratual positivo, ou seja, o ressarcimento do prejuízo que não sofreria se a cessão de exploração tivesse sido inteiramente cumprida pela R. O que resultaria para o credor do cumprimento curial do contrato, abrangendo, portanto, não só o equivalente da prestação, mas também a cobertura pecuniária (a reparação) dos prejuízos restantes provenientes da inexecução, "de modo a colocar-se o credor na situação em que estaria se a obrigação tivesse sido cumprida".
Como é sabido, “a nulidade impede a produção de efeitos e a anulação faz cessar a produção de efeitos jurídicos” [15].
Em caso de resolução contratual, a posição clássica e largamente dominante, é a de que a tutela se resume ao interesse contratual negativo, ou seja, ao prejuízo que o credor não teria se o contrato não tivesse sido celebrado [16]. Tal entendimento tem sido seguido maioritariamente na jurisprudência. [17]
Com base nesta doutrina, não é aceitável a compatibilidade de cumulação entre a resolução do contrato e a indemnização correspondente ao (interesse contratual positivo, sobretudo com fundamento nos argumentos retirados do efeito retroactivo da resolução e da incoerência da posição do credor, ao pretender, depois de ter optado por extinguir o contrato pela solução, basear-se nele para obter uma indemnização, correspondente ao interesse no seu cumprimento.
Por isso e conclui no citado acórdão de 24.1.2012 que, “por regra, a indemnização fundada no não cumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido”.
Nada no caso justifica que nos afastemos da regra geral em razão dos interesses em discussão, o que se justifica apenas em casos excepcionais, como também tem sido entendido na jurisprudência. [18]
Por conseguinte, improcede o pedido de indemnização do A. relativo a lucros cessantes.”

    O raciocínio vale, mutantis mudantis, para o caso dos autos, sendo certo que o artigo 436º do CCM (que tem uma redacção diferente da do CC de 1966 vigente em Portugal), consagra:
(Sinal)
    1. Quando haja sinal, a coisa entregue deve ser imputada na prestação devida, ou restituída quando a imputação não for possível.
    2. Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele o direito de exigir o dobro do que houver prestado.
    3. A parte que não tenha dado causa ao incumprimento poderá, em alternativa, requerer a execução específica do contrato, quando esse poder lhe seja atribuído nos termos gerais.
    4. Na ausência de estipulação em contrário, e salvo o direito a indemnização pelo dano excedente quando este for consideravelmente superior, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste.
    5. É igualmente aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 801.º
    Depois, o artigo 801º do CCM manda:
(Redução equitativa da pena)
    1. A pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em contrário.
    2. É admitida a redução nas mesmas circunstâncias, se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida.
    Questão de danos excedentes:
    
    A propósito dos nº 4 e 5 do artigo 436º do CCM, anotou-se:
    “15. No estudo global que se faça do problema, chega-se à conclusão que o nº 4 vem reforçar a ideia transversal consagrada no Código a respeito da natureza confirmatória do sinal (o próprio Menezes Leitão acaba por admitir que o nº 4 não tem natureza penitencial, em ob. cit., pág. 246). Ou seja, para lá da perda do sinal pelo tradens ou da devolução em dobro do sinal pelo accipiens, ainda pode haver lugar, salvo estipulação em contrário, a indemnização pelo dano excedente. Foi uma opção do legislador de Macau, que podia ter aproveitado a ocasião para ser mais generosa. Com efeito, não passou da criação dessa possibilidade indemnizatória pelo dano excedente, sem a estender a outra qualquer indemnização (nomeadamente, por danos não patrimoniais), tendo em conta que na parte final do nº 4 afirmou expressamente a impossibilidade de alargamento da extensão indemnizatória (habitualmente, alguns autores defendem que, sem limitação, pode haver a indemnização por perdas e danos no caso de sinal confirmatório).
     Pior é, apesar de tudo, a situação do parente próximo preceito português, pois nele se preceitua que "Na ausência de estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não cumprimento".
     De qualquer maneira, há mesmo aí quem sustente que, para além dessa indemnização pelo não cumprimento, possa haver uma ou mais indemnizações fundadas noutras causas, como, por exemplo, nos casos de terem sido feitas benfeitorias na coisa (Ana Prata, Código ... cit., pág. 568).
     16. O nº 5 manda aplicar, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 801º. Não é bem claro o propósio da disposição legal: se apenas se aplica aos casos em que os contraentes estabelecem no contrato uma indemnização para o caso de incumprimento por arrependimento (arras ou sinal penitencial), ou se também aplicação no caso de sinal confirmatório-penal.
     E se a resposta for no sentido de apenas cobrir a segunda hipótese de sinal confirmatório, ainda fica por saber se a redução por equidade (art. 801º) abrange somente as situações em que há dano excedente (nº 4), calculando-se aí a indemnização segundo critérios equitativos, ou se também atinge o dobro do sinal por incumprimento do accipiens.
     Por um lado, poderia parecer que a melhor solução seria, efectivamente, a que permite a aplicação do regime de redução no caso de incumprimento de contrato em que o sinal tem a função de arra confirmatória. Na verdade, se o sinal tiver o sentido penitencial, isso se deve ao facto de as partes, de livre vontade e por consenso, terem estabelecido os próprios limites indemnizatórios, não fazendo sentido que o tribunal os possa baixar apenas porque o devedor lho tenha pedido.
     Por outro lado, é de crer que a redução também não possa incidir sobre o dobro do sinal, porque isso seria contrariar a solução da lei (nº 2).
     Nesta óptica, pareceria ficar assim a remissão para o art. 801º circunscrita às situações em tiver que haver indemnização pelo dano excedente. Este dano pode ser, realmente, elevado, se tivermos em conta as diferenças de preços em mercados (por exemplo, imobiliários) que frequentemente se pautam por regras pouco saudáveis de especulação. Tendo em conta que o dano pode ser realmente avultado, a intervenção do juiz pode eventualmente justificar-se, se bem que a redução também pode funcionar como um prémio ao devedor.
    Não temos, enfim, a certeza sobre o alcance da norma.
     Mas, se fizermos a conjugação dos artigos 436º, 801º (e o ambiemte da sua sistematização) e 820º, nº 2, (neste caso, para o contrato-promessa) talvez seja possível, afinal de contas, considerar que a remissão apenas faça sentido nos casos em que as partes contratantes tenham estipulado, por penitência, uma indemnização com caracter de pena no contrato para a hipótese de não cumprimento por arrependimento. A jurisprudência dirá o que for de justiça sobre o assunto. (Cfr. Código Civil de Macau, Anotado e Comentado, João Gil de Oliveira e José Cândido de Pinho, CFJJ, 2020, Vol. VI, pág. 506 e 507).
    Efectivamente pode existir alguma dúvida na interpretação e aplicação das normas em causa.
    Mas não é pela primeira vez que este TSI é chamado para se pronunciar sobre o conceito de danos ou prejuízos excedentes, o mesmo conceito encontra-se consagrado no artigo 1027º do CCM em matéria locatária que dispõe:
     
(Indemnização pelo atraso na restituição da coisa)
    1. Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida.
    2. Logo, porém, que o locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro; à mora do locatário não é aplicável a sanção prevista no artigo 333.º
    3. Fica salvo o direito do locador à indemnização dos prejuízos excedentes, se os houver.
    A propósito deste conceito, ficou consagrado o seguinte entendimento no Proc. nº 646/2017, com o acórdão proferido em 26/07/2018:
     
    “I - A Ré deve pagar a quantia equivalente ao dobro da renda que se praticava, como justa indemnização específica pela não restituição do imóvel, embora de natureza contratual, por continuar a usar a coisa, em prejuízo das locadoras, correspondente à renda que estava a ser praticada e que se traduz no valor de uso do imóvel.
    II – Em relação à indemnização pelos prejuízos excedentes, uma vez verificados, a título de lucros cessantes, ela tem por fundamento o efectivo prejuízo causado, que pode já não se medir pelo valor da renda, não obstante ser o mesmo o respectivo facto gerador, mesmo que o montante dos danos causados às locadoras seja inferior ou equivalente ao quantitativo da renda, hipótese em que ao credor basta a indemnização contemplada pelo artigo 1027º/2 do CC.
    III - A solução correcta só poderá ser conseguida mediante interpretação sistemática, lógica e teleológica da norma do artigo 1027º/3 do CCM. Não resta dúvida que, quer a sanção prevista no nº 2, quer no nº 3 do artigo citado, visa “forçar” o inquilino a devolver o locado ao senhorio com o mais cedo possível, sob pena de estar sujeito a sanções pesadas até que o locado seja devolvido a quem de direito.
    IV - Por esta via, a leitura mais consentânea com a ratio legis da norma do artigo 1027º/3 do CCM é a de que a indemnização da mora entra em linha de consideração para efeitos da fixação da indemnização por prejuízo excedente, sob pena de se duplamente “sancionar” o inquilino!”
     
    Não há razões bastantes para não seguirmos o entendimento acima referido, já que está em causa uma matéria de natureza idêntica: para além de pagar o dobro, pode pedir-se indemnização por danos excedentes, mas estes têm de estar devidamente demonstrados e comprovados, não bastam alegações abstractas ou provas indirectas.
    “(…)”.
    Voltando ao caso em análise, sublinhe-se aqui, é de verificar-se que a norma do nº 4 do artigo 436º é mais exigente do que a norma do artigo 1027º (que regula a matéria de locação), pois aquela norma fala de “dano consideravelmente superior’! O que exige provas mais rígidas e persuasivas!
*
    Aqui, é de recordar-se que no processo nº 220/2024 fica também consignado o seguinte entendimento:
    “從上述轉錄的內容可見,原審法院已詳細論證了第一被告的不履行責任,我們認同有關見解,故基於訴訟經濟原則及根據《民事訴訟法典》第631條第5款之規定,引用上述見解和依據,裁定這部分的上訴理由不成立。
    事實上,本院在涉及“海一居”事件的案件中已多次強調(見中級法院在卷宗編號1142/2019、1145/2019、1150/2019及1192/2019內作出的裁判),澳門特別行政區僅和土地承批人,即本案之第一被告,建立了法律關係;一切因應承批土地所作出的行為,均是針對土地承批人/第一被告而作出。因此,即使假設該等行為損害了土地承批人/第一被告的權益,例如無法如期利用土地而導致其需向預約買受人作出賠償,也只能是土地承批人/第一被告在履行其賠償義務後再向澳門特別行政區追討賠償,而非預約買受人可直接向澳門特別行政區追討因土地承批人/第一被告違反與其簽定的預約買賣合同的賠償責任。
    只有在澳門特別行政區濫用權利,行為特別惡劣的情況下其才需負上相關賠償責任,然而本案並不存在該等情況。
    4. 就賠償金額方面:
    第一被告認為基於合同不履行非其責任,故只應按不當得利規則(《民法典》第784條第1款之規定)作出返還。
    此外,亦認為即使假設其在相關的合同不履行存有過錯,雙倍的定金賠償是明顯過高,應根據衡平原則作出縮減。
    我們在前述部分已認定第一被告需對合同的不履行負上責任,故不能適用《民法典》第784條第1款之規定,按不當得利規則作出返還。
    就賠償金額方面,根據《民法典》第3條的規定,法院在下列任一情況下可按衡平原則處理案件:
    a) 法律規定容許者;
    b) 當事人有合意,且有關之法律關係非為不可處分者;
    c) 當事人按適用於仲裁條款之規定,預先約定採用衡平原則者。
    《民法典》第436條第5款明確容許經適當配合後適用第801條之規定,即容許法院當認為賠償金額過高時按衡平原則減少違約賠償金額。
    為此,我們需考慮原告們的實際損失是多少,即其共付出了多少金錢以取得相關的合同地位來決定是否適用衡平原則作出縮減。
    在本個案中,原告們向原預約買受人支付了港幣2,356,000.00元(900,000+1,456,000)以取得相關的預約買受人合同地位。
    倘按平均年利率3.5%計算8年(2012-2019年)的利息,可獲得港幣659,680.00元的利息,即共有港幣3,015,680.00元。
    原告們可獲得雙倍定金的賠償是港幣2,292,000.00元(1,146,000 x 2),並不高於前述的金額。
    由此可見,原審法院不以衡平原則對賠償金額作出縮減是正確的,應予以維持。”
    3) – Voltando ao caso dos autos, uma leitura possível: ao contrário que se pretende defender, temos por certo que as quantias pagas pelos Autores à Ré a título de sinal, se fossem depositadas nas instituições bancárias, certamente eles receberão juros, facto este que temos por certo que os Autores deixaram de poder os receber, razão pela qual a Ré deve indemnizá-los por esta via.
(…)
    4) - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas, que se distingue do puro julgamento jurídico por apresentar menos preocupações sistemáticas e maiores empirismo e intuição. Portanto, a equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto (Cfr. António Menezes Cordeiro, “A decisão segundo a equidade”, in o Direito, Ano 122, 1990, Abril-Junho, pág. 272, e Manuel Carneiro da Frada, “A equidade (ou justiça com coração): a propósito da decisão arbitral segundo a equidade, in Revista da Ordem dos Advogados, 2012, Ano 72, Vol. I, pág. 143, e os Acs. do STJ de 31.01.2012 (875/05) e 07.10.2010 (3515/03). Ou seja, no caso, deve existir factos assentes no sentido de que os Autores tivessem a possibilidade de vender, pelo menos, pelos valores por ele alegados e comprovados (ex. mediante contratos-promessa de compra e venda celebrados) a uma terceira pessoa concreta, o que não se encontra devidamente demonstrado por factualidade assente.
    5) (…)”.
*
    Relativamente ao recurso interposto pelos Autores, estes alegaram o seguinte:
     “(…)
     8. É verdade que os Recorrentes, na qualidade de promitentes-compradores de fracção autónoma no projecto imobiliário "Pearl Horízon", se candidataram à compra de uma habitação para troca junto da Macau Renovação Urbana, SA., ao abrigo do Despacha do Chefe do Executivo n.º 89/2019.
     9. Porém, entende a doutrina que a aplicação da compensatio lucri cum damno depende da verificação de diversos requisitos, designadamente (i) o aparecimento de uma vantagem patrimonial no património do lesado; (ii) um nexo de causalidade adequada; (iii) a unidade do título jurídico; (iv) a homogeneidade dos bens a compensar; e (v) o respeito pela autodeterminação do lesado.
     10. De entre estes requisitos, um sobressai a diferença de título jurídico entre o dano e o lucro: o dano resulta da impossibilidade de cumprimento por parte da Recorrida; a vantagem deriva de um acto legislativo da RAEM e de um despacho do Chefe do Executivo, inscritos na execução da política de habitação da RAEM.
     11. Trata-se, por outro lado, de uma vantagem resultante de prestação de terceiro, a RAEM, que tem como destinatário os Recorrentes, sendo a Recorrida totalmente alheia a tal vantagem.
     12. Acresce que o benefício ora em apreço não passa de uma mera expectativa, não havendo ainda uma data previsível para que os Recorrentes possam, finalmente, receber as chaves dessa fracção autónoma e para o fazer, terão de pagar integralmente o preço fixado, não sabendo os Recorrentes sequer se, nessa altura, terão os meios financeiros suficientes para tal.
     13. Para essa incerteza contribui a conduta da Recorrida, que há quase anos retém nas suas contas o avultado sinal pago pelos Recorrentes, mostrando tudo fazer para não ter de o restituir em tempo útil, correndo os Recorrentes o sério risco de perder o direito à fracção autónoma, algo que não poderá deixar de relevar para a aplicação da norma ínsita no artigo 801.º do Código Civil.
     14. Para além disso, tudo o que é análogo entre as duas fracções (a prometida comprar à Recorrida e a de substituição da Macau Renovação Urbana, S.A.) é a tipologia, preço e área. Tudo o resto é diferente, desde os acabamentos aos serviços proporcionados aos condóminos (clube, etc.) até à orientação da fracção autónoma. Do mesmo modo, o valor de mercado que se esperava para as fracções do Pearl Horizon seria substancialmente superior ao valor de mercado da fracção que os Recorrentes poderão vir a receber.
     15. Por outro lado, caso tudo corra bem, os Recorrentes não deverão ter acesso à fracção autónoma da Macau Renovação Urbana, S.A. antes de 2026, ao passo que a fracção que prometeu adquirir à Recorrida dever-lhes-ia ter sido entregue, o mais tardar, até 25 de Dezembro de 2015. Serão mais de 10 anos de atraso.
     16. Este é um dano indemnizável que deveria ter sido levado em consideração pelo Tribunal a quo aquando da cogitação acerca da redução da Indemnização por manifestamente excessiva, com base no regime do n.º 1 do artigo 801.º do Código Civil, aplicável por força do n.º 5 do artigo 436.º do mesmo diploma legal.
     17. Deverá, pois, esse dano ser dado como indemnizado pelo pagamento do sinal em dobro, indemnização essa que, pelas razões aduzidas, nada tem de excessiva, colhendo tal raciocínio respaldo nas conclusões extraídas nos acórdãos proferidos pelo Venrando Tribunal de Segunda Instância, por exemplo, no âmbito dos Processos n.º 205/2024 e 292/2024.
     18. A Recorrida não alegou, nem logrou provar, factos dos quais se pudesse extrair o suposto e aventado excesso manifesto da pena convencional oferecida ao caso sub judice por aplicação do regime do sinal, pelo que a redução equitativa operada pelo Tribunal a quo não deveria ter tido lugar, tendo o Tribunal a quo violado as disposições legais ínsitas no artigo 404.º, no artigo 435.º, no artigo 436.º, n.º 2, 2.ª parte, no artigo 436.º, n.º 5, assim como no n.º 1 do artigo 801.º, todos do Código Civil.
     19. Sendo a Recorrida condenada ao pagamento do dobro do valor por esta recebido a título de sinal, conforme oportunamente peticionado em sede de Petição Inicial pelos Recorrentes, quebrar-se-á a lógica impressa na Sentença, mais concretamente aquela constante do seu Ponto 6, a fls. 1742v. e 1743, uma vez que a obrigação de indemnizar da Recorrida aparece líquida desde a data de citação da Recorrida para a presente acção judicial, conforme decorre do disposto no artigo 794.º, n.º 1 do Código Civil, assim como do artigo 565.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, disposições essas igualmente violadas pelo douto Tribunal a quo.”

    O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:
     “(…)
     Da redução equitativa da indemnização determinada pelo valor do sinal prestado.
     A redução equitativa da indemnização requer a certeza de que a indemnização determinada pelo valor do sinal é manifestamente excessiva em relação ao dano efectivo.
     Em consequência da impossibilidade da prestação da ré, os autores irão receber do Governo de Macau uma fracção idêntica à que pretendiam adquirir da ré e por preço idêntico ao acordado com a ré (pontos 102. a 106. dos factos provados12).
     Os autores tinham o direito de adquirir a fracção prometida sem ter que pagar nada mais do que já pagaram à ré (HKD5.297.600,00 – após desconto) e terão de pagar pela aquisição da “habitação para troca” o preço igual ao que acordaram com a ré (sem desconto – HKD6.020.000,00), pelo que terão um prejuízo de HKD722.400,00.
     Os autores estão privados há vários anos da fracção autónoma prometida pela ré e continião privados dela durante tempo presentemente desconhecido. Essa privação é inegavelmente um dano, embora se desconheça o montante, o qual deve ser ponderado segundo juízos de equidade, nos termos do disposto no art. 560º, nº 6 do CC.
     Os autores tiveram ainda despesas com o empréstimo bancário que contraítram ao C, pois que se provou que pediram HKD4.214.000,00 (ponto 15. dos factos provados) e que a ré só reembolsou HKD3.601.576,34 (ponto 35. dos factos provados). Essas despesas são dano para os autores, embora também se desconheça o montante concreto, designadamente os juros remuneratórios pagos pelos autores, montante que deve também ser ponderado segundo juízos de equidade, nos termos do disposto no art. 560º, nº 6 do CC.
     
     O prejuízo dos autores serão, então, o correspondente à privação do desconto (interesse contratual negativo), à privação da disponibilidade da fracção entre a data em que a ré deveria entregar e a data em que a irá receber da sociedade comercial Macau Renovação Urbana, S.A. (interesse contratual positivo) e às despesas que tiveram com a contração e a amortização parcial do empréstimo bancário (interesse contratual negativo). No que tange ao interesse contratual positivo trata-se de uma situação semelhante à mora e não ao incumprimento definitivo, pois que os autores irão adquirir uma fracção como pretendiam, mas mais tarde do que acordaram.
     Se aos autores for devolvida a quantia que pagaram e se obtivem pelo mesmo preço a fracção que pretendiam, embora com atraso e sem desconto no preço, a indemnização correspondente ao valor que pagaram (HKD5.297.600,00) é manifestamente excessiva, pois que a disponibilidade da fracção durante o tempo em que os autores dela não podem dispôr não proporcionaria aos autores um valor líquido tão elevado que, somado ao “desconto perdido” e às despesas suportadas, se aproximase de HKD5.297.600,00.
     O Venerando Tribunal de Segunda Instância já apreciou caso com algumas semelhanças com o presente, embora a ali autora tivesse feito o seu pagamento no ano de 2015, e considerou que o dano equitativo corresponde à aplicação de uma taxa anual de 3,5% durante 8 anos sobre o valor efectivamente pago pela autora13, embora a ali autora tivesse pago a terceiro pela aquisição da posição contratual de promitente-compreador valor superior ao que o “cedente” havia pago à ré”. Perspectivou, pois o dano como interesse contratual negativo. Não o que a autora deixou de auferir através do que despendeu, mas o que tiver de despender em vão, sem nada auferir.
     As diferenças entre o caso apreciado pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância e o caso presente impedem que aqui se siga a solução ali encontrada.
     
     Este tribunal também já decidiu em diversos casos a questão da redução equitativa do valor da indemnização determinada pelo valor do sinal. Sendo essa decisão e a respectiva fundamentação conhecidas das partes através dos seus ilustres mandatários, é aqui dispensável repetir.
     Assim, tudo ponderado, designadamente que a culpa da ré é diminuta e que o valor da indemnização não deve ser inferior ao dano efectivo e deve ainda permitir que o sinal cumpra a sua função penitencial, afigura-se equitativo fixar em HKD4.000.000,00 o valor da indemnização a cargo da ré em consequência da impossibilidade superveniente da sua prestação devida no âmbito do contrato que celebrou com os autores.”
     
    Ora, face à argumentação acima transcrita, entendemos que a decisão está bem fundamentada e representa uma aplicação correcta do Direito neste ponto, já que tem sido esta solução que vem sendo defendida por este TSI nesta matéria, motivo pelo qual, na ausência de vícios invalidantes, ao abrigo do artigo 631º/5 do CPC, é de manter a decisão recorrida, julgando-se improcedente o recurso interposto pelos Autores nesta parte.
*
    Relativamente à argumentação tecida pelo Tribunal recorrido neste ponto, importa destacar ainda os seguintes aspectos:
    a) – Em 30/07/2012 o contrato-promessa foi celebrado;
    – A cláusula 10ª estipula: “"1200 dias de sol e trabalho (sem contar os domingos, feriados e dias de chuva) após a construção do primeiro piso, só a partir dessa data entrando a Recorrente em mora".
    b) – Feitas as contas à luz do critério fixado na citada cláusula 10ª (em regra, cada mês tem 22 dias úteis (de trabalho), um ano tem 262 dias úteis, portanto, 1200dias/262 (dias) = 5 (anos). Ou seja, a Ré deveria entregar os imóveis em 2016 se tudo corresse bem.
    c) – Em 29/01/2016 foi publicado no BO o despacho que declarou a caducidade do terreno;
    d) – Em 23/05/2018 pelo TUI foi proferido o acórdão que negou provimento ao recurso contencioso interposto pela Ré.
    Ou seja, o tempo mais cedo possível para calcular as indemnizações devia ser a partir do ano 2016. Nestes termos, existe um período de cerca de 5 anos relativamente ao qual a Autora não pode reclamar juros moratórios. Ou seja, usando o raciocínio seguido este TSI, desde a data da celebração do contrato-promessa até ao momento em que se verifica a impossibilidade de prestação definitiva, há-de descontar tal período de 5 anos, portanto, o período de 2011 a 2018, se se considerasse que a Autora ficava privada de gozo do imóvel, só se contam 2 anos.
    Na sequência de argumentação acima por nós tecida, por força do acordo à luz do qual a Ré gozava de 1200 dias úteis para cumprir as obrigações contratuais, os juros calculados não devem reportar-se a 12 anos, mas sim 7 ou 8 anos ao máximo, pelo que o o valor da indemnização equitativa do interesse contratual positivo não deve ser tão elevado nos termos reclamados pelos Autores, nomeadamente no que se refere à perda de “interesses” pela privação de fundos pela Ré.
    Eis um valor que pode servir de referência.
*
    Depois, o Tribunal a quo afirmou ainda:
     
     “(…)
Da mora na obrigação de indemnizar.
6.1 Do início da mora (art. 794º do CC e art. 565º, nº 3 do CPC).
     Tendo a indemnização sido fixada segundo juízos de equidade, é ilíquida a respesctiva obrigação de indemnizar, pelo que a mora só se inicia com a liquidação operada pela presente decisão.
     Porém a mora quanto à obrigação de restituição do sinal prestado venceu-se com a interpelação. E esta interpelação ocorreu com a citação.
     
6.2 A taxa de juro moratório.
     A indemnização moratória relativa às obrigações pecuniárias corresponde aos juros legais a contar do dia da constituição em mora, salvo excepções aqui inaplicáveis (art. 795º do CC).
     Nos termos do art. 569º, nº 2 do Código Comercial só em relação aos créditos de natureza comercial acresce a sobretaxa de 2% sobre os juros legais, não sendo aplicável ao crédito do autor nem às obrigações de que sejam titulares passivos os comerciantes ou as empresas comerciais se o titular activo não for comerciante.
     A indemnização moratória deve corresponder aos juros legais contados desde a citação sem acréscimo da sobretaxa aplicável aos créditos de natureza comercial.
     
    Pelo que, o valor fixado pelo Tribunal a quo não se mostra desproporcional ou inadequado, e como tal é de manter a decisão em análise.
*
    Relativamente aos argumentos invocados pela Ré/Recorrente, a análise acima citada e desenvolvida, é bastante clara para replicar as questões levantadas pela Recorrente, pois, é de verificar-se que nesta parte, todas as questões levantadas pelas partes já foram objecto de reflexões e decisões por parte do Tribunal recorrido, nesta sede de recurso, concluímos que, em face da argumentação acima transcrita, o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis, tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de manter a sentença recorrida.
*
    Face ao exposto, é de negar provimento aos recursos interpostos respectivamente pelos Autores e pela Ré, mantendo-se as decisões recorridas.
*
    Síntese conclusiva:
    I - A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC), qualificação esta que determina o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CCM).
    II - A qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais.
    III - A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CCM). Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda”. No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Numa situação em que, tal como se detecta no caso dos autos, se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis (porque se usam expressões diversas, tais como “contrato-promessa de compra e venda” “prometer comprar e “prometida venda”, “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”), a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 228º do CCM).
    IV – O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico, sendo nesta perspectiva, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial. Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das partes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes. Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
    V - No caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CCM que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”. Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CCM).
    VI - O artigo 801º/-1 do CCM manda que “a pedido do devedor, a pena convencional pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente…”, normativo este que rege directamente a cláusula penal, a pena convencionada pelas partes para sancionar o incumprimento. É aplicável ao sinal com as necessárias adaptações, sendo que o sinal, mesmo sendo confirmatório, também funciona, ainda que supletivamente, como pena aplicável ao incumprimento.
    VII - É de sublinhar que o julgamento segundo a equidade é sempre o produto de uma decisão humana que visará ordenar o problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas. A equidade não remete, de modo algum, para o simples entendimento pessoal do juiz ou para a sua íntima convicção, afastando-se decisivamente do puro arbítrio judicial, não estando igualmente em causa, na decisão segundo o critério não normativo da equidade, uma apreciação intuitiva puramente individual, mas antes racional e objectivável. A racionalidade e a objectivação dessa apreciação pressupõe a aquisição da indispensável base de facto.
    VIII - Por regra, a indemnização fundada no incumprimento definitivo, que se cumula com a resolução, respeita apenas ao chamado interesse contratual negativo ou de confiança, visando colocar o credor prejudicado na situação em que estaria se não tivesse sido celebrado o contrato, e não naquela em que se acharia se o contrato tivesse sido cumprido. Nesta óptica, o regime de restituição do sinal em dobro em matéria de contrato-promessa pode classificar-se como um regime especial.
*
    Tudo visto e analisado, resta decidir.
* * *
V ‒ DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento aos recursos, mantendo-se a sentença recorrida.
*
    Custas pelos Recorrentes e pela Recorrida em partes iguais para ambas.
*
    Registe e Notifique.
*
RAEM, 20 de Novembro de 2025.

Fong Man Chong
(Relator)

Choi Mou Pan
(1º Adjunto)

Tam Hio Wa
(2º Adjunto)
1 Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume II, 11ª edição, pgs. 117.
2 “… o não cumprimento definitivo, que é o resultado de uma impossibilidade definitiva de cumprir, não tem de derivar de uma impossibilidade absoluta de cumprir, no sentido de não poder em caso algum desaparecer. … A impossibilidade da prestação considera-se definitiva não apenas quando toda a probabilidade da sua remoção está excluída, mas também quando ela só pode ser removida mediante circunstâncias especiais que não são de esperar de antemão. … Isto é o mesmo que dizer que também é definitiva a impossibilidade que só possa cessar por um facto extraordinário com que não seja legítimo contar” - Vaz Serra, RLJ, Ano 100º (1967 – 1968), p. 254.
3 Meneses Cordeiro, Tratado de Direito Civil, volume IX, 2ª edição, p. 324.
4 Um elemento natural ou típico do conteúdo do contrato-promessa para Manuel Trigo, Lições de Direito das Obrigações, p. 144. Um acto jurídico real quoad constitutionem, podendo constituir uma cláusula acessória de um negócio jurídico para Nuno Manuel Pinto Oliveira, Ensaio Sobre o Sinal, págs. 10 e 11.
5 Acórdão do Venerando TSI de 04/04/2019, proferido no processo nº 327/2017, Relator: Dr. Fong Man Chong, acessível em www.court.gov.mo e João Calvão da Silva, Sinal e Contrato Promessa, 11ª edição, p. 94.
6 Os autores terão dois títulos para o mesmo direito (receber a quantia que pagaram): a restituição em consequência da resolução contratual e a devolução indemnizatória do sinal. É, portanto, infrutífero escolher um dos títulos. Porém, sempre se dirá que a resolução de apresenta com precedência lógica sobre o regime do sinal.
7 “…a indemnização pelo dano excedente constituiria a indemnização pelo dano efectivo …” - Professor Manuel Trigo, Uma Uma Mudança de Paradigma: A Indemnização pelo Dano Excedente, em Especial nos Casos de Perda do Sinal ou de Pagamento do Dobro Deste e a Jurisprudência Recente (estudo em homenagem a João Calvão da Silva), Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, Ano XXV, nº 49, 2021, p. 151.
8 Assim, também Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, 1990, p. 730. E, do mesmo autor, “A Cláusula Penal no Ordenamento Jurídico de Macau”, Um Diálogo Consistente, Olhares Recentes Sobre Temas do Direito Português e de Macau, 2016, Vol. I, Edição da Fundação Rui Cunha, pgs. 38 e 39 – “Ora, qual será o critério que deve pautar a actuação do juiz, quer para decidir se pode reduzir a pena, quer para determinar, simultaneamente, em caso afirmativo, a medida dessa redução?
Naturalmente que a diferença entre o valor do prejuízo efectivo e o montante da pena é, desde logo, o primeiro factor, de cariz objectivo, a considerar”.
9 Factos não alegados pela ré, nem em articulado superveniente nos termos do art. 425º do CC, mas aditados à base instrutória após requerimento de fls. 1630.
10 Acórdão do Venerando TSI nº 22/2024, de 9/5/2024, Relator: Dr. Ho Wai Neng, acessível em www.court.gov.mo.
11 Ac do STJ, Proc. 3292/20.5TBLRA/C1.S1., de 11/02/2025.
12 Factos não alegados pela ré, nem em articulado superveniente nos termos do art. 425º do CC, mas aditados à base instrutória após requerimento de fls. 1630.
13 Acórdão do Venerando TSI nº 22/2024, de 9/5/2024, acessível em www.court.gov.mo.
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