Processo nº 22/2023
(Autos de recurso jurisdicional)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. “A”, (“甲”), recorreu contenciosamente para o Tribunal de Segunda Instância do despacho do SECRETÁRIO PARA A ADMINISTRAÇÃO E JUSTIÇA de 16.12.2021 com o qual se determinou a cessação do “Contrato de Prestação de Serviços de Manutenção e Reparação dos Parques e Jardins das Ilhas” com a mesma celebrado, bem como a aplicação de uma multa no valor de MOP$356.000,00 e o confisco da caução prestada; (cfr., fls. 2 a 8-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Oportunamente, por Acórdão de 03.11.2022, (Proc. n.° 113/2022), julgou-se procedente o recurso, anulando-se a decisão recorrida; (cfr., fls. 63 a 67).
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Do assim decidido, traz agora a entidade administrativa então recorrida o presente recurso jurisdicional, alegando para, a final, afirmar que:
“A. Salvo o devido respeito pelo acórdão recorrido, o recorrente discorda de tal acórdão, vem agora interpor recurso ordinário para o Venerando Tribunal de Última Instância com os motivos e fundamentos a seguir enunciados:
B. Salvo o devido respeito por opinião diversa, o recorrente não está de acordo com a seguinte opinião do Exm.º Magistrado do Ministério Público: “Se estas duas relações jurídicas forem fundidas numa única relação jurídica, o efeito substantivo desta "fusão" será equivalente à alteração das regras obrigatórias e vinculativas estipuladas no ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”, o que faz com que o “contrato de prestação de serviços” viole o princípio da “estabilidade das regras”.”
C. O Ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso” permite que os concorrentes apresentem proposta para um ou mais grupos. Porém, há que salientar que a adjudicação já tinha sido feita nesta fase, tendo ambas as partes celebrado somente um contrato. Nesta situação, as duas partes são obrigadas a cumprir as obrigações contratuais fixadas no “contrato de prestação de serviços”.
D. O Ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso” aplica-se apenas na fase de apresentação de propostas mas não na fase de contrato. Nos autos, já estamos na fase de contrato, o que interessa é o acordo de vontade das partes. Da vontade das duas partes nasceu uma relação jurídica administrativa. E a cláusula 9.ª do “contrato de prestação de serviços” estipula as regras sobre a rescisão de contrato.
E. Efectivamente, o “contrato de prestação de serviços” aplica directa e plenamente as regras quanto à rescisão de contrato estipuladas no ponto 13 do “Caderno de Encargos”, não foi feita qualquer alteração ou limitação a este ponto, daí verifica-se que o “contrato de prestação de serviços” não alterou as regras do “Caderno de Encargos”.
F. O ponto 13.1.1 do “Caderno de Encargos” estipula claramente que a “rescisão do contrato” deve ser tratada por todo o contrato e não por “Grupo”, tal como está fixado no Ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”. Assim sendo, a ocorrência da situação indicada em tal cláusula num ou mais grupos pode levar à rescisão de todo o contrato. Podemos ver que, de facto, o “contrato de prestação de serviços” não alterou as regras do “Caderno de Encargos”, nem do ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”.
G. A “acumulação” indicada pelo Exm.º Magistrado do Ministério Púbico é, de facto, a escolha feita conforme o acordo de vontade das duas partes, a qual não causa injustiça aos demais concorrentes que pode implicar a violação do “princípio da concorrência”.
H. Tal como diz o artigo 52.º da contestação, a rescisão do “contrato de prestação de serviços” foi feita de acordo com o disposto no ponto 13 do “Caderno de Encargos”. As duas partes estão a abordar o assunto do contrato que é um negócio jurídico bilateral e o efeito da rescisão é terminar a eficácia desse negócio, pelo que não é possível rescindir apenas uma determinada parte do contrato.
I. O ponto 13 do “Caderno de Encargos” diz respeito à “rescisão do contrato (aplicável a todos os grupos)”. Segundo as regras de “interpretação literal”, quando existe apenas um contrato, a autoridade administrativa pode cessar o contrato inteiro se ocorrer a situação indicada no ponto 13.1, independentemente de tal situação acontecer num ou mais grupos.
J. Além disso, esta interpretação é também aplicável ao ponto 12 do “Caderno de Encargos”. A “acumulação” dos dois grupos neste ponto é, obviamente, favorável à recorrente contenciosa, especialmente quando ambos os grupos não cumprem ou não conseguem cumprir as obrigações contratuais no mesmo dia, estão sujeitos apenas a uma multa, tal como a situação invocada nos artigos 36.º e 37.º da contestação.
K. Portanto, todos são benéficos para a recorrida em graus diferentes, independentemente de qual o entendimento. Por conseguinte, não se pode entender simplesmente com base no “consequencialismo” que é mais fácil cair na situação do ponto 13 do “Caderno de Encargos” e ter o contrato rescindido, e acreditar que a “acumulação” é inevitavelmente desfavorável para a recorrida.
L. Importa frisar que o recorrente e a recorrida têm sempre consenso quanto ao cumprimento do contrato, quer em relação à multa anterior, quer em relação à audição da recorrida realizada aquando da rescisão do contrato, não tendo a recorrida apresentado qualquer contestação. Daí verifica-se que, de facto, o acto recorrido está em conformidade com os termos do princípio da consensualidade.
M. Na rescisão do contrato, não podemos adoptar um determinado método só porque este é mais benéfico para a recorrida e abandonamos o entendimento que foi reconhecido por ambas as partes e é eficaz. Senão, será sempre tendencioso em favor da recorrida, o que dificulta a manutenção dos interesses gerais da Região Administrativa Especial de Macau.
N. Em conjugação com a “interpretação lógica”, as regras sobre a rescisão contratual estipuladas no “Caderno de Encargos” são, sem dúvida, a última linha de defesa para o cumprimento do contrato. O ponto 13 do “Caderno de Encargos” visa incentivar o adjudicatário, que ganhou mais de um grupo, a cumprir o contrato com uma atitude mais rigorosa e séria.
O. Caso contrário, a Administração não pode aplicar as disposições do ponto 13 do “Caderno de Encargos” para rescindir o contrato com a adjudicatária mesmo que se encontrem, ao mesmo tempo, vários incumprimentos ou cumprimentos defeituosos do contrato nos diversos grupos. E tais cumprimentos defeituosos afectarão inevitavelmente a utilização diária por parte dos residentes das instalações sob a gestão do IAM e, consequentemente, prejudicarão o interesse público da Região Administrativa Especial de Macau. Nos termos dos pontos 13.1.3 e 5.14, a Administração tem o direito de cessar o contrato em caso da violação da legislação sobre a “proibição do trabalho ilegal”, independentemente de a violação ocorrer num ou em vários grupos.
P. Não se pode entender que a cessação do contrato possa ser efectuada através da divisão da relação jurídica por grupo, só pela razão de que os grupos podem ser concorridos e ser adjudicados de forma independente, porquanto tal entendimento não favorece a execução efectiva do contrato.
Q. Em suma, as cláusulas do “Contrato de Prestação de Serviços” não alteram o disposto no ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”, nem as regras fixadas no “Caderno de Encargos”. Acresce que, independentemente do entendimento a partir da "interpretação literal" ou da "interpretação lógica", quando ocorra a situação indicada no ponto 13.1 do “Caderno de Encargos”, o recorrente tem o direito de rescindir o contrato celebrado com a recorrida. Assim sendo, o acto impugnado não viola o ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”, nem o ponto 13 do “Caderno de Encargos”.
R. Por fim, tanto o Exm.º Magistrado do Ministério Público como o MM.º Juiz a quo entendem que a aplicação da lei no acto recorrido levará à violação do princípio da “estabilidade das regras” por parte do “contrato de prestação de serviços”.
S. Conforme o indicado nos artigos 25.º e 26.º da contestação, durante o processo de concurso público, espera-se que as empresas de diferentes dimensões possam candidatar-se ao concurso, de modo a evitar que a dimensão do concurso público seja demasiado grande, que faria com que os serviços não possam ser adjudicados às empresas de menor dimensão com capacidade para empreitar alguns projetos, fortalecendo assim a concorrência entre empresas de diferentes dimensões. É necessário garantir que os serviços a adquirir são de qualidade e os preços são justos.
T. No caso vertente, as regras tanto do “Programa do Concurso” como do “Caderno de Encargos” já foram estabelecidas no procedimento da abertura do concurso público. O ponto 13.1.1 do “Caderno de Encargos” não adopta a forma fixada no ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”, que diferencia entre grupos (sic), e o “Caderno de Encargos” aborda o assunto por um contrato ou uma relação jurídica. Portanto, como ambas as partes só assinaram um contrato, o ponto 13 do “Caderno de Encargos” trata-o como a “rescisão de todo o contrato”. Em boa verdade, tal como dizem os artigos 30.º e 31.º da contestação, as duas partes apenas assinaram um contrato neste caso (e o conteúdo do contrato não distingue os serviços do Grupo A ou do Grupo B); a recorrida pode beneficiar mais disso.
U. Pelo exposto, o acto impugnado não viola as regras do ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”, nem do ponto 13 do “Caderno de Encargos”, sendo ainda mais impossível que o “Contrato de Prestação de Serviços” viole o princípio da “estabilidade das regras”. Por conseguinte, deve o acórdão recorrido ser revogado por padecer do vício de erro na interpretação do ponto 13.1 do “Caderno de Encargos” e erro na interpretação do princípio da “estabilidade das regras””; (cfr., fls. 77 a 87 e 9 a 10-v do Apenso).
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A dita “A” respondeu, pugnando pela improcedência do dito recurso; (cfr., fls. 89 a 92-v).
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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer, considerando que o recurso interposto não merecia provimento e que se devia confirmar o Acórdão recorrido na sua íntegra; (cfr., fls. 103 a 103-v).
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Por deliberação do Conselho dos Magistrados Judiciais de 26.03.2025 foram estes autos redistribuídos ao ora relator.
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Nada obstando, cumpre apreciar e decidir.
A tanto se passa.
Fundamentação
Dos factos
2. Pelo Tribunal de Segunda Instância foi dada como “provada” a seguinte matéria de facto:
“1. O Instituto para os Assuntos Municipais (o então Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais) abriu o concurso público n.º 21/SZVJ/2018 em 19 de Dezembro de 2018, para a prestação de serviços de manutenção e reparação dos parques e jardins das Ilhas.
2. Segundo o teor do ponto 1 do “Programa do Concurso”, o objecto do concurso público supra indicado é divido em três grupos:
- Grupo A: As zonas de manutenção abrangem Jardim da Cidade das Flores, Plataforma Ajardinada do Edf. do Lago, Parque de Hac Sá, Jardim do Cais e Jardim do Monumento.
- Grupo B: A zona de manutenção - Parque Central da Taipa
- Grupo C: As zonas de manutenção abrangem Espaço de exposições de flores nas Casas-Museu da Taipa, Jardim Municipal da Taipa e Jardim da Cruz
3. A recorrente candidatou-se ao dito concurso público, tendo apresentado os documentos necessários.
4. Após a avaliação das propostas, o IAM adjudicou à recorrente dois dos três projectos do concurso público: Projecto 1 (Grupo A) e Projecto 2 (Grupo B). E o Projecto 3 (Grupo C) foi adjudicado a outra entidade concorrente.
5. No dia 28 de Março de 2019, a recorrente celebrou um contrato de prestação de serviços com o IAM para os dois projectos do objecto referido pelo um período de 3 anos.
6. Durante a vigência do contrato de prestação de serviços, o IAM acusou que o pessoal da recorrente que prestou serviços no Grupo A tinha dado 22 faltas ao trabalho, enquanto o pessoal do Grupo B deu 2 faltas, pelo que o IAM entendeu que a recorrente violou gravemente e incumpriu repetidamente o dever previsto no ponto 6 do “Caderno de Encargos”, tendo, por isso, instaurado o procedimento administrativo que se prende com o acto recorrido.
7. Tendo em conta que os trabalhadores da recorrente no Grupo A tinham dado mais de 15 faltas ao trabalho, o IAM propôs à entidade recorrida a cessação do contrato de adjudicação do Grupo A do Concurso Público n.º 21/SZVJ/2018.
8. A entidade recorrida autorizou o proposto e exigiu explicitamente a abertura do procedimento de rescisão do contrato do Projecto 1 (Grupo A) do concurso público.
9. O Departamento (sic) Jurídico e de Notariado do IAM fez uma proposta na Proposta n.º 197/DJN/2021 em que entendeu que, uma vez que o IAM tinha celebrado com a recorrente só um contrato de prestação de serviços para os dois grupos de projectos, existe aqui apenas um acto de adjudicação, não sendo possível cessar somente o contrato na parte relativa ao Projecto 1 (Grupo A) e manter ao mesmo tempo a parte sobre o Projecto 2 (Grupo B). Além disso, entendeu também que, após a rescisão do contrato de prestação de serviços, não é possível celebrar um novo contrato com a recorrente para a adjudicação do Projecto 2 (Grupo B) e, por fim, foi proposta a cessação do inteiro contrato de prestação de serviços.
10. De acordo com o proposto na Proposta n.º 197/DJN/2021, o IAM alterou o procedimento de cessação do contrato do Projecto 1 (Grupo A), que havia sido aprovado pela entidade recorrida, para o procedimento de cessação do inteiro contrato de prestação de serviços e apresentou à entidade recorrida a proposta com o número 062/DP/DZVJ/2021, na qual propôs a cessação do contrato de prestação de serviços celebrado com a recorrente, bem como a aplicação de uma multa de MOP 356.000,00 e o confisco da caução definitiva inteira.
11. Por despacho de 16 de Dezembro de 2021 da entidade recorrida, foi aprovada a referida proposta do IAM”; (cfr., fls. 64 a 64-v e 5 a 5-v do Apenso).
Do direito
3. Vem a entidade administrativa recorrer do Acórdão pelo Tribunal de Segunda Instância prolatado que concedeu provimento ao recurso contencioso que a então recorrente, agora recorrida, “A”, aí interpôs do seu despacho datado de 16.12.2021, com o qual se determinou a cessação do “Contrato de Prestação de Serviços de Manutenção e Reparação dos Parques e Jardins das Ilhas”, bem como a aplicação de uma multa de MOP$356.000,00 e o confisco da caução prestada.
Pois bem, para boa – cabal – compreensão das razões do pelo Tribunal de Segunda Instância decidido, vale a pena atentar no que no referido Acórdão agora recorrido se consignou, (acolhendo-se o pelo Ministério Público considerado no seu Parecer), e que, na parte que agora releva, tem o teor seguinte:
“O Ministério Público pronunciou-se no seguinte sentido:
“…
Da petição inicial resultou que a recorrente pede a anulação do despacho, de 16 de Dezembro de 2021, do Sr. Secretário de Administração e Justiça na parte referente ao Grupo B (Para o texto integral do despacho, vide fls. 19 dos autos, nomeadamente fls. 642 do volume II do P.A.), imputando ao despacho erro nos pressupostos legais e aplicação errada das disposições da cláusula 9.ª do “contrato de prestação de serviços de manutenção e reparação dos parques e jardins da Ilhas” e do artigo 57.º do Decreto-Lei n.º 63/85/M. Em concreto, entende a recorrente que o contrato de prestação de serviços na parte relativa ao Grupo B não reúne os pressupostos para a sua cessação, nem os pressupostos para a aplicação de uma multa ou confisco da caução definitiva.
O Sr. Secretário de Administração e Justiça aprovou no despacho recorrido a Deliberação n.º 26 feita na sessão nº 58/2021 do “Conselho de Administração para os Assuntos Municipais” que se realizou em 26 de Novembro de 2021. Nos termos do artigo 115º, nº 1, do CPA, tal Deliberação nº 26 e a Proposta nº 062/DP/DZVJ/2021 por ela adoptada constituem parte integrante do despacho recorrido.
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Tendo lido atentamente a contestação, arriscamo-nos a entender que há divergências entre as partes sobre o entendimento dos termos do “contrato de prestação de serviços de manutenção e reparação dos parques e jardins da Ilhas”, mas a autoridade impugnada não questiona o facto descrito no artigo 3.º da petição inicial, a saber: a decisão da entidade recorrida de cessar o contrato de prestação de serviços tem como fundamento o facto de que os trabalhadores da recorrente tinham dado 24 faltas ao trabalho desde o início do contrato de prestação de serviços até 6 de Julho de 2021, das quais 22 faltas ocorreram no Grupo A e 2 no Grupo B.
Na óptica da recorrente, os locais onde presta os serviços que lhe foram adjudicados são divididos em Grupo A e Grupo B, que são independentes entre si, por isso, o “contrato de prestação de serviços de manutenção e reparação dos parques e jardins da Ilhas” em questão contém duas relações jurídicas independentes e paralelas. Ao contrário disso, a entidade recorrida considera da seguinte forma: apenas foi feita uma adjudicação à recorrente e apenas um contrato celebrado, por isso, existe só uma relação jurídica entre a recorrente e a IAM. É aqui que reside a divergência e é também a questão a resolver neste caso.
1.Na nossa modesta opinião, importa salientar que o “objecto” definido no ponto 1 do programa do Concurso Público n.º 21/SZVJ/2018 foi dividido em três grupos - os nove “locais de trabalho” foram divididos em três grupos (vd. fls. 91 a 102 do Volume 1 do P.A.); o valor da caução provisória foi também calculado por “grupo” (ibid., fls. 91). Além disso, o Ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso” exige clara e explicitamente que a proposta de preços deve, obrigatoriamente, seguir as áreas que foram demarcadas como unidade de cotação, (isto é, a companhia concorrente pode escolher apresentar proposta de preços para todos os grupos ou para apenas um grupo particular. Não pode, no entanto, ser apresentada proposta de preços apenas para um determinado item do grupo).
Ao fixar o “conteúdo dos serviços de manutenção e manutenção”, o ponto 6 do “Programa do Concurso” e do “Caderno de Encargos” acima referidos utiliza também “grupo” como macroestrutura (vd. fls. 71 a 90 do Volume 1 do P.A., nomeadamente fls. 82 a 89), embora tenha listado detalhadamente o conteúdo funcional de cada local, incluindo: horário de funcionamento e âmbito da manutenção, horário de trabalho e número de trabalhadores colocados no local, conteúdo funcional e requisitos.
De facto, a proposta nº 066/DPJ-SZVJ/2018 aprovada pelo antigo “Conselho de Administração para os Assuntos Municipais” indicou expressamente o seguinte (vd. fls. 128 a 131 do Volume 1 do P.A.): Este Instituto tem agora o plano de abrir um concurso público para adjudicar os 9 parques nas ilhas em três grupos ... Aparentemente, ainda que apenas fosse realizado um concurso público, os nove parques foram divididos em três grupos e a adjudicação foi feita por “grupo”.
O despacho de adjudicação consta da Informação n.º 005/ADMI/2019 (vd. fls. 168 do Volume 1 do P.A.). É evidente que o teor substancial deste despacho é "autorizar" todas as propostas feitas na dita proposta que foi submetida pelo IAM à "entidade fiscalizadora". É de frisar que tal proposta referiu o seguinte (ibid., fls. 167, sublinhado nosso): Por deliberação do Conselho de Administração para os Assuntos Municipais, foi autorizada a adjudicação dos serviços de manutenção e reparação dos parques e jardins das Ilhas pertencentes ao IAM da seguinte foram: Grupos A e B à “A” e Grupo C à “B”. Para as duas interessadas – “A” e “B”, o despacho de adjudicação é um “acto plural” (Freitas do Amaral: Direito Administrativo, Volume III, Lisboa 1989, p. 91). Daqui se verifica que não existe só uma adjudicação neste caso.
A Proposta n.º 066/DPJ-SZVJ/2018 e a Proposta n.º 005/ADMI/2019 demonstram, sem dúvida, que, do início ao fim, o IAM utiliza os "três grupos" como um dos objectos e critérios. O ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso” acima mencionado exige claramente que a proposta de preços deve, obrigatoriamente, seguir as áreas que foram demarcadas como unidade de cotação, a companhia concorrente pode escolher apresentar proposta de preços para todos os grupos ou para apenas um grupo particular.
O ponto 3.1.1.3 revela, de forma clara e inequívoca, que os três grupos divididos pelo IAM são independentes entre si; cada grupo deve ser o objecto independente da “proposta”, qualquer concorrente interessado em todos os três grupos deve apresentar três propostas e três cotações. Isto significa necessariamente que estes três grupos devem ser também objectos independentes de contratos administrativos. Pelo exposto, tendemos acreditar que é natural que cada grupo dê origem e produza uma relação jurídica independente.
2.Como acima referido, a Proposta n.º 066/DPJ-SZVJ/2018 especificou a intenção de “dividir os nove parques das ilhas em três grupos para adjudicação” (vd. fls. 128 a 131 do Volume 1 do P.A.). Quanto à razão de “abrir um concurso público para adjudicar”, esclareceu a Proposta n.º 085/DPJ-SZVJ/2018 (vd. fls. 133 a135 do Volume 1 do P.A.) da seguinte forma: A fim de poupar procedimentos administrativos, o IAM planeia abrir um único concurso público para todas as instalações acima referidas. As ditas propostas, ou seja, “dividir os nove parques das ilhas em três grupos para adjudicação” e “abrir um único concurso público” foram aceites e aprovadas pela entidade fiscalizadora competente (vd. fls. 135 do Volume 1 do P.A.).
Porque é que os nove parques das ilhas foram divididos em três grupos? Qual é a sua finalidade e objetivo? Não é conhecido o motivo, pois não se encontrou qualquer explicação (do IAM) nos autos do P.A. sobre isso. No entanto, a explicação feita na Proposta n.º 085/DPJ-SZVJ/2018 (para poupar procedimentos administrativos) confirma, sem sombra de dúvida, que a poupança de recursos e a melhoria da eficácia e eficiência são a base de valor para a realização de um único concurso público para os três grupos.
Na nossa opinião, há razões para acreditar que a poupança de recursos e a melhoria da eficácia e eficiência das actividades administrativas são também os motivos para a existência e base de valor das duas atividades administrativas a seguir indicadas: primeiro, embora a prestação de serviços tenha sido adjudicada às duas concorrentes (A / B), há apenas um despacho de adjudicação (vd. fls. 165 a168 do Volume 1 do P.A.); segundo, o IAM só celebrou um contrato com a recorrente, ainda que esta tenha ganhado os grupos A e B (ibid., nomeadamente fls.166 e fls. 255 a 258).
Podemos afirmar que seria necessário e obrigatório assinar dois contratos caso o IAM tivesse adjudicado o Grupo A e o Grupo B a dois concorrentes diferentes, em vez de só à recorrente. É de salientar mais uma vez que o Ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso” elaborado pelo IAM exige que a proposta de preços deve, obrigatoriamente, seguir as áreas que foram demarcadas como unidade de cotação, de modo a que cada grupo crie uma relação jurídica independente.
Com efeito, apenas foi celebrado um contrato entre o IAM e a recorrente, esta não negou o facto de não ter qualquer objecção ou reserva quanto à minuta do contrato. Ambas as partes celebraram o contrato de acordo com o princípio consagrado no artigo 12.º do CPA. A aceitação por parte da recorrente de celebrar só um contrato demonstrou o espírito de cooperação, o que merece elogios. Contudo, há que ter em mente que a recorrente obteve duas adjudicações, pelo que existem duas relações jurídicas entre ela e a IAM. Segundo as regras de experiência e senso comum, na realidade, é normal que um contrato contenha duas ou mais relações jurídicas, esta situação não é rara.
Concretamente neste caso, salvo o devido respeito por opinião diversa, em nossa modesta opinião, quer a celebração de só um contrato, quer a aceitação da minuta do contrato pela recorrente, ou até que a cláusula 2.ª do "Contrato de Prestação de Serviços" não tivesse dividido os serviços em Grupo A e Grupo B (enumerandos directamente 6 locais de prestação de serviços, vd. fls. 256 a 258 do Volume 1 do P.A.), tudo isto não levou à confusão ou fusão das duas relações jurídicas.
Em síntese, as duas relações jurídicas não se fundem numa só; são meramente “integradas” num mesmo contrato, com apenas unicidade formal, sendo ainda independentes um do outro na sua essência. Isto porque a interpretação do contrato de prestação de serviços deve obedecer às regras estabelecidas no “Programa do Concurso” e no “Caderno de Encargos”. Se estas duas relações jurídicas forem fundidas numa única relação jurídica, o efeito substantivo desta "fusão" será equivalente à alteração das regras obrigatórias e vinculativas estipuladas no ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”, o que faz com que o contrato de prestação de serviços viole o princípio da “estabilidade das regras”.
E ainda, o que é mais importante para este caso é que, ao calcular o número de incumprimentos por parte da recorrente das obrigações da adjudicação, o Grupo A e o Grupo B devem ser calculados separadamente. Se o número de incumprimentos do Grupo A e o do Grupo B forem acumulados indistintamente, tal não só violará o princípio da “estabilidade das regras”, como também, como este caso indubitavelmente prova que, tal “acumulação” será inevitavelmente desfavorável para a recorrente. A razão é óbvia - a “acumulação” facilita que a recorrente caia na situação indicada no ponto 13 do “Caderno de Encargos”, nomeadamente a situação de “ser punida com multa de 15 dias” estipulada no ponto 13.1.4.
Relativamente aos artigos 36.º e 37.º da contestação, salvo o devido respeito, não podemos concordar. Arriscamo-nos a dizer que, na ocasião descrita no artigo 7.º IV da contestação (o número de trabalhadores disponibilizados pela recorrente no Grupo A e no Grupo B em 14 de fevereiro de 2021 era inferior ao número fixado no “contrato de prestação de serviços”), é errado aplicar-lhe apenas uma multa – a forma correcta é aplicar duas multas; nem este erro nem a aceitação do erro pela recorrente têm o efeito e a capacidade de alterar as regras estabelecidas no ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”, nem podem servir de motivo razoável para continuar a aplicar da forma errada as cláusulas contratuais.
Nesse sentido, dado que o IAM admitiu que só há multa de 2 dias no Grupo B (vd. Artigo 7 da contestação), mas o despacho recorrido não distinguiu - embora devesse - entre as duas adjudicações do Grupo A e do Grupo B, tendemos entender que tal despacho viola o ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso” e o ponto 13 do “Caderno de Encargos”, nomeadamente o ponto 13.1.4, padecendo do vício de violação da lei e, em consequência, devendo ser anulado.
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Pelo exposto, propõe-se aos MM.ºs Juízes que deem provimento ao recurso da recorrente e anulem o despacho recorrido neste caso. …”
Concordamos plenamente com os fundamentos e opiniões apresentados pelo Ministério Público sobre as questões em apreço. Assim, ao abrigo do princípio da economia processual e da celeridade, as opiniões acima referidas são citadas como fundamento deste acórdão e julga-se procedente o recurso.
De facto, como num mesmo procedimento de concurso e documento os serviços podem ser divididos em três grupos de serviços A, B e C e adjudicados separadamente à recorrente (Grupo A e Grupo B) e a outra pessoa (Grupo C), porque é que os serviços do Grupo A e do Grupo B devem ser considerados como uma única adjudicação e consequentemente só existe uma relação contratual?
Tal como resultou da opinião do Ministério Público, “as duas relações jurídicas não se fundem numa só; são meramente “integradas” num mesmo contrato, com apenas unicidade formal, sendo ainda independentes um do outro na sua essência. Isto porque a interpretação do contrato de prestação de serviços deve obedecer às regras estabelecidas no “Programa do Concurso” e no “Caderno de Encargos”. Se estas duas relações jurídicas forem fundidas numa única relação jurídica, o efeito substantivo desta "fusão" será equivalente à alteração das regras obrigatórias e vinculativas estipuladas no ponto 3.1.1.3 do “Programa do Concurso”, o que faz com que o contrato de prestação de serviços viole o princípio da “estabilidade das regras”””; (cfr., fls. 64-v a 67 e 6 a 8-v do Apenso).
Ponderando no que pela entidade administrativa (agora) recorrente vem alegado, e tendo em consideração o que no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância recorrido se decidiu e consignou, que dizer?
Pois bem, da reflexão que sobre a “questão” a apreciar nos foi possível efectuar, e sem prejuízo do muito respeito por melhor opinião, cremos que a razão está do lado da entidade administrativa ora recorrente.
Passa-se a tentar explicitar o porque deste nosso ponto de vista.
Ora, como – acertadamente – se sintetizou no douto Parecer pelo Ministério Público junto em sede do anterior recurso contencioso, a sociedade então recorrente, (ora recorrida), pretendia a “anulação do despacho, de 16 de Dezembro de 2021, do Sr. Secretário de Administração e Justiça na parte referente ao Grupo B (…), imputando ao despacho erro nos pressupostos legais e aplicação errada das disposições da cláusula 9.ª do “contrato de prestação de serviços de manutenção e reparação dos parques e jardins da Ilhas” e do artigo 57.º do Decreto-Lei n.º 63/85/M”, entendendo também que “o contrato de prestação de serviços na parte relativa ao Grupo B não reúne os pressupostos para a sua cessação, nem os pressupostos para a aplicação de uma multa ou confisco da caução definitiva”.
Porém, e em nossa opinião, não se lhe pode reconhecer razão, pois que a mesma sociedade ora recorrida interpreta de forma inadequada, e erroneamente, a “situação” em apreciação, olvidando os seus aspectos essenciais e determinantes, dando excessiva – e indevida – ênfase e importância ao facto de lhe ter sido adjudicado e contratada para a prestação de serviços de manutenção e reparação de parques e jardins relativamente a “2 áreas” distintas – os na matéria de facto aludidos “Grupo A” e “Grupo B” – e, considerando-as independentes entre si, entende que não se devia assim decidir pela cessação do contrato na sua totalidade, ou seja, em relação a ambas às áreas, por incumprimento tão só numa, (na parte “A”), ocorrido.
Com efeito, e ainda que dúvidas não existam que as ditas áreas “A” e “B” sejam efectivamente “zonas distintas”, e (até), “postas a concurso de forma separada e autónoma”, importa atentar que o – único – contrato entre o (na altura) “I.A.C.M.” e a dita “sociedade” para o efeito celebrado deu apenas origem a “uma só relação contratual jurídico-administrativa”, e foi em face do “incumprimento do contratado” no mesmo (e único) contrato por parte desta última, que se veio a proferir a decisão administrativa que determinou a cessação da dita “relação contratual”.
Vejamos.
Em sede do “Objecto” do programa do concurso previa-se que:
“1. Objecto
1.1. O presente concurso tem, por objecto, a Prestação de Serviços de Manutenção e Reparação dos Parques e Jardins das Ilhas.
1.2. Local e prazo de serviços:
Grupo
Local de prestação de serviços
Período da prestação de serviços
Grupo A
Jardim da Cidade das Flores
01/05/2019-30/04/2022
Plataforma ajardinada do Edifício do Lago
Parque de Hac Sá
Jardim do Cais e Jardim do Monumento
Grupo B
Parque Central da Taipa
01/05/2019-30/04/2022
Grupo C
Local de exposição de flores da Avenida da Praia
01/05/2019-30/04/2022
Jardim Municipal da Taipa
Jardim da Dra. Laurinda M. Esparteiro
(…)”; (cfr., fls. 37-v do P.A.).
Por sua vez, em matéria de “Proposta de preços” previa-se também que:
“3.1.1.3. A proposta de preços deve ser apresentada, de acordo com os grupos divididos. (i.e. a empresa que pretenda concorrer, pode indicar na proposta os preços para todos os grupos ou para um deles, não sendo permitido apresentar um preço apenas para um item dos grupos)”; (cfr., fls. 36 do P.A.).
Porém, e o que nos parece correcto é que ainda que a aludida sociedade tenha obtido êxito no dito concurso relativamente a “2 locais” de prestação de serviço, que integravam o “Grupo A” e o “Grupo B”, tal não representa, nem permite considerar que tal “circunstância” tenha dado origem a “duas relações jurídicas, distintas e autónomas”, cada uma tendo apenas como objecto um (só) dos ditos “Grupos”.
Admite-se, e respeita-se – obviamente – outra perspectiva, contudo, cremos que a mesma, (como se referiu), assenta em equívoco na apreciação da verdadeira “situação (material)” em questão, e atribui excessiva – e uma vez mais, indevida – relevância ao facto de em causa estarem “2 zonas” distintas, descurando o que se nos apresenta como o seu acertado e adequado “enquadramento jurídico”.
Na verdade, e como se crê (facilmente) alcançável, a finalidade de no mesmo concurso se ter incluído “3 áreas distintas” no seu “objecto”, os referidos “Grupos A, B e C”, (cfr., pág. 17 deste aresto), permitindo-se que os concorrentes apresentassem propostas para todos os grupos, ou para (tão só) um deles, era (apenas) a de assegurar uma maior (possibilidade de) participação, evitando-se – de forma, aliás, louvável – o (imediato) afastamento de eventuais concorrentes com estrutura empresarial de menor dimensão e com menos recursos humanos, (permitindo que participassem ainda que tão só relativamente a uma única área, se assim entendessem), proporcionando-se, igualmente, uma maior possibilidade de escolha e selecção das propostas apresentadas para, a final, se poder encontrar a(s) melhor(es), e, desta forma, melhor se defender o “interesse público”.
Porém – e seja-nos permitido repetir – não obstante tal “circunstância”, (de o concurso incluir “3 grupos” distintos), e tendo a sociedade agora recorrida obtido êxito relativamente a 2 deles, nenhum sentido faz considerar que a autonomia das respectivas áreas e dos locais de prestação de serviço impliquem a necessária existência de “duas relações jurídicas (igualmente) autónomas”, pois que, em nossa opinião, aquela “separação”, foi apenas “instrumental” e tão só para efeitos de programa do concurso, propostas a apresentar e sua posterior selecção, (como atrás se referiu).
Importa pois atentar e salientar que foi apenas praticado um “único acto administrativo”, e, em plena conformidade com tal unicidade, foi igualmente proferida “uma só decisão administrativa de adjudicação”, com a elaboração de “um só termo de adjudicação” e idêntica (redacção e) celebração de “um só contrato de prestação de serviços”, (cuja “minuta” foi previamente exibida à aludida sociedade, sem que esta tivesse suscitado qualquer objecção), sendo de frisar também que, em sede do “objecto” deste mesmo contrato, (e na sua cláusula 2a), se fez tão só referência aos “jardins” e “parques” que integravam e compunham o “Grupo A” e “B”, (sem qualquer especificação ou distinção, ou mesmo, referência a tais “Grupos”), com “o mesmo prazo de duração”, (cfr., cláusula 3a), e onde se acordou, igualmente, o “pagamento de uma só quantia de MOP$6.408.000,00” como retribuição, (cfr., cláusula 4a), tendo-se ainda feito constar (expressamente) que, o “objecto” do presente contrato incluía as “zonas e arredores indicados no programa de concurso como «Grupo A» e «Grupo B»”; (cfr., cláusula 5a).
E, perante o que assim se deixou exposto, motivos não vemos para se considerar que com o dito “contrato” se tenha dado origem a “duas relações contatuais jurídico-administrativas autónomas e independentes”, apenas, e tão só, pelo facto de nele se ter acordado a prestação de serviços que, inicialmente, em sede do programa do concurso, incluía a área de 2 zonas distintas.
Com efeito, e a inda que no aludido programa de concurso se tenha distinguido as “áreas” em questão, (pelos motivos que atrás já fizemos referência), e sendo, como efectivamente sucedeu, as “mesmas”, as “partes contratantes” que negociaram, acordaram e acabaram por celebrar “um só contrato”, (e nos aludidos termos), cremos pois que mais razoável e adequado é o entendimento da entidade administrativa ora recorrente, nesse sentido se mostrando de deliberar.
Aliás, vale ainda a pena considerar e enquadrar a presente situação na hipótese de o concurso apenas se referir às “duas áreas” agora em questão.
Seria mesmo assim de se defender que deveria também dar lugar a “duas relações jurídicas distintas e autónomas”?
Ora, como se nos mostra (bastante) evidente, cremos que tão só de sentido negativo pode ser a resposta.
E, então, vista cremos que está a solução.
*
Mostra-se, porém, de aqui adicionar uma nota.
É a seguinte.
Na pela então recorrente, ora recorrida, invocada “cláusula 9ª” do contrato consta o que segue:
“ (Rescisão do contrato)
1. Se o segundo outorgante infringir o artigo 13 do Caderno de Encargos, o primeiro outorgante terá o direito de rescindir o contrato e executá-lo conforme o seu conteúdo.
2. Caso o direito referido no número anterior seja exercido, a caução definitiva prestada pelo segundo outorgante reverterá a favor do primeiro outorgante”; (cfr., fls. 22-v, com tradução por nós efectuada).
Por sua vez, o pela mesma recorrida também citado art. 57° do Decreto-Lei n.° 63/85/M, (que estabelece o “regime das despesas com obras e aquisição de bens e serviços”) estatui que:
“A rescisão do contrato, além das condições previstas neste diploma e no caderno de encargos ou documento equivalente, poderá também ter lugar se o adjudicatário não cumprir as instruções por escrito do adjudicante sobre matéria que decorra da execução do contrato, e não houver sido absolutamente impedido de o fazer por caso de força maior”.
E, cabendo notar, (e salientar), que em matéria de “sanções por incumprimento do contrato” e de “rescisão do contrato”, o que previsto vem nos “pontos 12° e 13°” do “Caderno de Encargos” do concurso no âmbito do qual se celebrou o contrato em questão nos presentes autos está expressamente consignado que o aí preceituado “é aplicável a todos os grupos”, não vislumbramos pois, (também aqui), qualquer desvio, ou erro, na interpretação de qualquer disposição legal ao caso aplicável, (como parece entender a dita recorrida).
Finalmente, mostra-se de dizer que, a situação dos autos, poderia, eventualmente, ser encarada de uma outra forma, com uma aplicação analógica do instituto da “redução do negócio”, previsto no art. 285° do C.C.M..
Porém, não tendo sido o caso, mais não se afigura de dizer sobre tal aspecto.
Dest’arte, e considerando o que exposto ficou, imperativa se nos apresenta a deliberação que segue.
Decisão
4. Nos termos do que se deixou expendido, em conferência, acordam conceder provimento ao recurso, revogando-se o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância.
Custas em ambas as Instâncias pela ora recorrida “A”, com taxa de justiça que se fixa em 15 UCs.
Registe e notifique.
Macau, aos 14 de Novembro de 2025
Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Song Man Lei
Choi Mou Pan
O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Mai Man Ieng
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Proc. 22/2023 Pág. 11