Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau
Recurso penal
N.º 42 / 2010
Recorrente: A
1. Relatório
A foi julgada no Tribunal Judicial de Base no âmbito do processo comum colectivo n.º CR2-09-0296-PCC e foi condenada pela prática de um crime de tráfico ilícito de drogas previsto e punido pelo art.º 8.º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009 na pena de 8 anos de prisão.
Desta decisão a arguida recorreu para o Tribunal de Segunda Instância. No seu acórdão de 8 de Julho de 2010 proferido no processo n.º 458/2010, julgou-se rejeitar o recurso por manifesta improcedência.
Vem agora a arguida recorrer deste acórdão para o Tribunal de Última Instância, formulando as seguintes conclusões úteis na motivação do recurso:
- A recorrente considerou que a pena determinada pelos Juizes do T.S.I. era excessivamente pesada.
- A recorrente considerou que o Tribunal Colectivo, ao proferir a decisão, violou os dispostos no art.º 40.º, n.º 2 e art.º 65.º do Código Penal, a pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
- Tendo em conta a quantidade de drogas e o modo de execução dos factos ilícitos, bem como a arguida manifestou arrependimento no tribunal e é primária, a recorrente A concluiu que era mais adequado condená-la, por crime previsto e punido pelo art.º 8.º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009, numa pena inferior a 8 anos.
Pedindo que seja fixada uma pena de prisão inferior a 8 anos.
Na resposta, o Ministério Público entende que o recurso deve ser julgado manifestamente improcedente com a consequente rejeição, destacando nomeadamente a quantidade de droga apreendida, a grande intensidade de dolo que presidiu à actuação da recorrente, as elevadas exigências de prevenção geral, e a justeza e equilíbrio da pena impugnada.
Nesta instância, o Ministério Público emitiu o parecer no mesmo sentido.
Foram apostos vistos pelos juízes-adjuntos.
2. Fundamentos
2.1 Matéria de facto
O Tribunal Judicial de Base e o Tribunal de Segunda Instância consideraram fixada a seguinte matéria de facto:
“Factos provados:
No dia 30 de Março de 2009, pelas 12 horas e tal, de acordo com informações fornecidas pelas entidades alfandegárias da China continental, agentes da Polícia Judiciária deslocaram-se ao [Endereço], local onde residia a arguida A, a fim de efectuarem investigações. Na altura, a arguida A estava no interior do referido quarto.
Os agentes da Polícia Judiciária encontraram no referido quarto uma mala de mão de cor castanha e uma mala de mão de cor preta.
Após exame, foram encontradas duas embalagens com substâncias em pó de cor de iogurte por trás do forro da parte lateral da mala de mão de cor castanha e outras duas embalagens com substâncias em pó de cor de iogurte por trás do forro da parte lateral da mala de mão de cor preta. Além disso, na mala de mão de cor preta, foram encontrados um recibo emitido pelo estabelecimento de câmbios “Kong Si” referente à troca cambial de $200,00 dólares americanos por $1540,00 patacas; um cartão da Pensão; cinco papéis onde estavam anotados números de telefone e um conjunto de bilhetes de avião electrónicos onde constava que a titular era A.
Além disso, os agentes da Polícia Judiciária encontraram na posse da arguida A um telemóvel e númerário, nomeadamente $400,00 dólares americanos e $1000,00 patacas.
Após exame laboratorial, apurou-se que as substâncias em pó de cor de iogurte, contidas nas duas embalagens que se encontravam no interior da referida mala de mão de cor castanha, tinham componentes de heroína, com peso total líquido de 435,97 gramas, produto abrangido pela tabela I-A da lista anexa ao Decreto-Lei no. 5/91/M (depois da análise quantitativa, apurou-se que continha uma percentagem de 72,47% de heroína, com peso de 315,95 gramas); as substâncias em pó de cor de iogurte, contidas nas duas embalagens que se encontravam no interior da referida mala de mão de cor preta, também tinham componentes de heroína, com peso total líquido de 502,79 gramas, produto abrangido pela tabela I-A da lista anexa ao mencionado decreto-lei (depois da análise quantitativa, apurou-se que continha uma percentagem de 40,96% de heroína, com peso de 205,94 gramas).
No dia 29 de Março de 2009, pelas 14h10m, a arguida A, levando consigo os referidos produtos estupefacientes, chegou a Macau, vindo de Vietnam, no voo XXXXX da companhia aérea.
A arguida A obteve de indivíduo(s) de identidade desconhecida os referidos produtos estupefacientes e trouxe-os a Macau para entregar a pessoa(s) de identidade desconhecida, a fim de ganhar remuneração pecuniária.
O telemóvel, os papéis onde estavam anotados números de telefone e o(s) bilhete(s) de avião electrónico(s) eram respectivamente instrumento de contacto, elementos e bilhete(s) utilizados pela arguida A aquando do tráfico de estupefacientes, e as referidas quantias pecuniárias tinham sido entregues por indivíduo(s) de identidade desconhecida à arguida para pagamento das despesas relacionadas com o tráfico de estupefacientes.
A arguida A agiu livre, voluntária, consciente e deliberadamente, quando teve a referida conduta.
A arguida conhecia perfeitamente as qualidades e as características dos referidos produtos estupefacientes e estava ciente de que as duas malas de mão continham os referidos produtos estupefacientes.
A arguida, quando teve a referida conduta, não estava legalmente autorizada para assim proceder.
A arguida tinha perfeito conhecimento que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Mais se provou:
É empregada doméstica.
Tem como habilitações académicas a 6ª classe primária e não tem ninguém a seu cargo.
Conforme o CRC, a arguida é primária.
Factos não provados:
Os restantes factos relevantes da acusação, nomeadamente:
No dia 28 de Março de 2009, em Vietname, um indivíduo de identidade desconhecida entregara os referidos produtos estupefacientes à arguida A, a fim de esta trazê-los a Macau e entregá-los à pessoa que iria levantá-los.”
2.2 Medida de pena
A recorrente vem impugnar a pena que lhe foi fixada nas instâncias por demais severidade, pedindo que seja fixada uma pena inferior a 8 anos de prisão em consideração da quantidade da droga, da forma da realização do crime, do arrependimento mostrado e do facto de ser primária.
À recorrente foi aplicado o novo regime sobre o tráfico ilícito de drogas previsto na Lei n.° 17/2009 por ser concretamente mais favorável e condenada pela prática de um crime de tráfico ilícito de drogas previsto no seu art.º 8.º, n.º 1 na pena de 8 anos de prisão, numa moldura penal de 3 a 15 anos de prisão.
Na fixação da pena concreta, é sempre atendido o prescrito no art.° 65.° do Código Penal, tal como foi cumprido pelos tribunais de instâncias.
No presente caso, destaca-se especialmente o peso líquido de 521,89g de heroína apreendida, a grande intensidade de dolo e alto grau de ilicitude, revelados pela forma dissimulada da realização do crime com todos os passos bem planeados.
Atendendo a todas circunstâncias da prática do crime pela recorrente, mostra-se equilibrada a pena de 8 anos de prisão fixada pelas instâncias.
Assim, o presente recurso deve ser rejeitado por manifesta improcedência.
3. Decisão
Face ao exposto, acordam em rejeitar o recurso.
Nos termos do art.º 410.º, n.º 4 do Código de Processo Penal, é a recorrente condenada a pagar 4 UC.
Custas pela recorrente com a taxa de justiça fixada em 4 UC e os honorários de 1000 patacas ao seu defensor nomeado.
Aos 15 de Setembro de 2010
Os juízes:Chu Kin
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai
Processo n.º 42 / 2010 1