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Processo n.º 2/2011. Recurso relativo ao direito de reunião e manifestação.
Recorrentes: A, B e C.
Recorrido: Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública.
Assunto: Direito de manifestação. Recurso. Plena jurisdição. Aviso de manifestação. Dias de realização de manifestação. Ruído. Colocação de oferendas. Queima de papéis votivos. Regulamento Geral dos Espaços Públicos. Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública. Poderes discricionários. Segurança pública. Justificação.
Data da Sessão: 12 de Janeiro de 2011.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Sam Hou Fai e Chu Kin.
SUMÁRIO:
I – O recurso previsto no artigo 12.º da Lei n.º 2/93/M, de 17 de Maio, é um meio processual de plena jurisdição.
II – O aviso prévio de reunião ou manifestação, previsto no artigo 5.º da Lei n.º 2/93/M, pode incluir eventos a realizar em vários dias, desde que o último dia não ultrapasse o prazo de 15 dias úteis contados da data da apresentação daquele aviso.
III – É legal a interdição de produção de ruído com utilização de aparelhos de som, a uma manifestação que pretenda realizar-se num mesmo local do centro da cidade, densamente povoado, durante cerca de um mês, das 11 às 23 horas.
IV – A colocação de oferendas e a queima de papéis votivos em manifestação deve obedecer ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º do Regulamento Geral dos Espaços Públicos.
V – O acto de restrição ou proibição de reunião ou manifestação do comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública, previsto no artigo 8.º da Lei n.º 2/93/M, é proferido no uso de poderes discricionários, mas tem de justificar devidamente as razões de segurança pública ou ordem pública em que se fundamenta.
  O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório e factos provados
A, B e C interpuseram recurso do despacho do Comandante Substituto do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), de 28 de Dezembro de 2010, que determinou que a manifestação, de que aqueles são os promotores, que pretendiam realizar entre os dias 3 e 30 de Janeiro de 2011, das 11 às 23 horas, simultaneamente no Jardim Triangular da Areia Preta e junto à Sede do Governo, tivesse antes lugar junto do Edifício Lake View Mansions, que se situa adjacentemente aos Lagos Nam Wan.
O aviso dos promotores da manifestação, dirigido ao presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), foi efectuado em 27 de Dezembro de 2010 e foi o seguinte:
  “Pelo presente, informamos a V. Exa. previamente como organizadores das respectivas actividades, que serão realizadas, entre 3 (das 11 horas de manhã às 23 horas da noite) e 30 de Janeiro de 2010, em redor da Sede do Governo da RAEM e do Jardim de Arco (actividades e serem realizadas simultaneamente nos dois locais) (mobilizar a solidariedade de outros cidadãos), manifestação de demanda e maratona de greve “sentada” sob a designação “Governo despreza a vida humana, Veredicto Injusto Secular de Hou Kong”;
  Na altura, serão instaladas tendas e velório em redor da Sede do Governo e vai incendiar objectos sagrados e proceder a actos em homenagem, com montagem de um gerador de electricidade, aparelhos de som (conjunto), foto da vítima, faixas horizontal e vertical de protesto; ainda durante tais actividades, terá a participação de cidadãos e entidades apoiantes e solidarizantes com número não restringido. Assim, pedimos que seja comunicado e comunique às autoridades de Segurança Pública”.
O mencionado despacho do Comandante Substituto do CPSP, de 28 de Dezembro de 2010, é do seguinte teor:
  “De acordo com a Lei Básica e com o regime geral que visa concretizar o direito de reunião e de manifestação em lugares públicos (Lei n.º2/93/M, de 17 de Maio), todos os cidadãos de Macau gozam do direito de reunião e de manifestação.
  Contudo, para que tal direito seja exercitado com a segurança e sem causar perturbações à ordem pública, comunicamos com o presente a V. Sria. que para os respectivos efeitos, durante tais actos, os organizadores devem:
1. Manter a ordem de tais actividades e assegurar que estas sejam realizadas num ambiente pacífico e com juízo;
2. Manter as vias de locais de reuniões acessíveis e eficientes, para não afectar a utilização destas por parte de outros;
3. Garantir que não se pratiquem actos que produzem barulhos ou possam afectar o ambiente higiénico e perturbar outros;
4. Observar ainda todas as obrigações previstas no art.7.º do Regulamento Geral dos Espaços Públicos;
5. Para o exercício de tal direito não causar influências negativas ao funcionamento normal da Sede Geral do Governo da RAEM e ainda por motivos de manutenção da ordem pública, para isso nos termos dos n.º3 e n.º4 do art. 8.º da Lei N.º 2/93/M;
  Deve-se realizar as actividades supra referidas em áreas indicadas nos termos da lei pelo Corpo de Polícia de Segurança Polícia”
Alegam os recorrentes o seguinte:
“As quatro exigências1 supra citadas carecem de fundamento legal, está fora do previsto da Lei n.º 3/93/M, pois tal lei não previu o ambiente de reunião e manifestação, nem restringiu o uso de aparelhos de som que podem causar barulhos, no entanto como o local em causa com vias largas e distante da vida quotidiana da população, observamos o estipulado para diminuir incómodos a outros cidadãos.
3. A respeito do ponto 5º, pelo qual as autoridades policiais nos demandaram para mudar o local para redor do Edifício Lake View Mansion, o que é inaceitável. Pois, notamos que o n.º 3 do art. 8 da Lei n.º 2/93/M dispõe: 『No prazo e pela forma previstos no número anterior, a mesma entidade, fundada em razões de segurança pública devidamente justificadas, pode exigir que as reuniões ou manifestações respeitem uma determinada distância mínima (30 metros) das sede do Governo e da Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau, dos edifícios afectos directamente ao funcionamento destes, da sede do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, das instalações dos tribunais e das autoridades policiais, dos estabelecimentos prisionais e das sedes de missões com estatuto diplomático ou de representações consulares, sem prejuízo do disposto no artigo 16.º』, mas, o local por nós escolhido está distante da Sede do Governo mais do que 30 metros. A exigência formulada pelo Comandante a respeito do local em questão no aviso mandado carece de fundamento legal”.
A entidade recorrida respondeu ao recurso.

II – O Direito
1. As questões a apreciar
Está em causa saber se o despacho recorrido violou a lei ao impor as restrições mencionadas nos n. os 1 a 4 do mesmo despacho não permissão de manifestação junto à Sede do Governo, mencionada no n.º 5 do mesmo despacho recorrido.
Preliminarmente serão conhecidas três questões suscitadas pela entidade recorrida, que obstam ao conhecimento do objecto do recurso.

  2. Recurso de plena jurisdição
  Tem este Tribunal entendido que o presente recurso não é de mera anulação, antes tem a natureza de meio processual de plena jurisdição, pelo que, em caso de provimento, o Tribunal não se limita a anular (ou a declarar nulo o acto administrativo recorrido), mas antes conhece da pretensão deduzida pelos recorrentes, que é a de autorização do exercício do direito de manifestação nos moldes por eles pretendidos ou noutros, que forem considerados como conformes com a lei.

3. Questões prévias.
A entidade recorrida suscitou várias questões que obstam ao conhecimento do recurso.
Afirma a entidade recorrida que o Aviso dos promotores apenas se deve considerar válido para o primeiro dia de manifestação (3 de Janeiro de 2011) e não para os posteriores, pois se deve entender que não é possível fazer pedidos genéricos.
Começando por esta questão, parece claro que os promotores não fizeram qualquer pedido genérico. Simplesmente, num só aviso deram conta da sua intenção de realizar manifestação em vários dias, todos entre os dias 3 e 30 de Janeiro de 2011.
Nada na lei obriga a que, por cada dia de manifestação, tenha de ser efectuado um pedido, desde que, como foi o caso, seja a mesma a entidade promotora e o(s) mesmo(s) o(s) local (ais) da manifestação.
Por outro lado, nem o despacho impugnado nem a entidade a quem é legalmente dirigido o aviso de manifestação (o presidente do conselho de administração do IACM), nada referem ou opõem a este respeito, e só na resposta a este recurso foi a questão suscitada pela entidade recorrida.
Contudo, merece ponderação a alegação da entidade recorrida de que as circunstâncias de ordem pública se podem alterar em função do tempo e do local, pelo que as autoridades policiais não podem ser colocadas perante situações no tempo que não podem prever e, portanto, controlar, sendo que os juízos de previsibilidade são tão mais frágeis quanto mais distantes esteja o alvo de análise.
Alega, ainda, a entidade recorrida que, por isso, seria absurdo um aviso de manifestação para todos os dias do ano de 2011, o que parece exacto.
Simplesmente, é a própria lei, nos n. os 1 e 2 do artigo 5.º da Lei n.º 2/93/M, de 17 de Maio, que impõe que o aviso de manifestação seja feito com a antecedência mínima de 2 ou 3 dias úteis (consoante os casos) e a máxima de 15 dias úteis.
Portanto, é a lei que permite que o aviso tenha lugar para manifestação a decorrer 15 até dias úteis depois.
Deste modo, a lei tem implícito o pensamento de que a autoridade competente tem obrigação de prever os condicionalismos de ordem pública e segurança pública nos 15 dias úteis imediatos, para o efeito de poder impor restrições aos cortejos e manifestações.
Assim, pelo menos até 15 dias úteis depois, julgamos que nada obsta a que o aviso se refira a manifestação a realizar em vários dias.
E o aviso pode respeitar a manifestações a terem lugar muito depois, se o aviso respeitar a vários dias?
Pode o aviso revelar a intenção de a manifestação ter lugar todos os dias (ou em alguns dias) durante três meses, seis meses, um ano ou mais?
Embora a letra da lei nada refira em contrário, o intérprete não pode olvidar que nesta matéria se defrontam interesses que podem ser contraditórios.
Por um lado, o interesse de pessoas em exercer o direito de manifestação, consagrado no artigo 27.º da Lei Básica, com o mínimo de constrangimentos possíveis.
Por outro lado, o interesse da sociedade e dos cidadãos na preservação da ordem e tranquilidade públicas, que podem ser afectados pelos manifestantes.
É sabido que são atribuições do CPSP garantir o exercício dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e garantir a manutenção da ordem, segurança e tranquilidade públicas (artigo 3.º do Regulamento Administrativo n.º 22/2001).
Ora, se a lei impõe como prazo máximo entre o aviso de manifestação, dirigido ao presidente do conselho de administração do IACM, e o dia da realização da mesma, o de 15 dias úteis, é porque entende que este é o prazo máximo que pode ser exigido às entidades competentes (IACM e CPSP) para recolha e tratamento de informação relativamente aos riscos de uma actividade a ter lugar nas vias públicas, em lugares públicos ou abertos ao público.
Afigura-se-nos, assim, que nada obsta a que o aviso se refira a manifestação a realizar em vários dias, desde que o último dia da manifestação não exceda em 15 dias úteis a data do pedido.
Ora, tendo o aviso dos promotores da manifestação, dirigido ao presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, sido efectuado em 27 de Dezembro de 2010, o último dia da manifestação não poderia ir para além do dia 17 de Janeiro de 2011.
Assim, considera-se que o aviso dos promotores só era e é valido até ao mencionado dia 17 de Janeiro de 2011.

4. Questões prévias. Continuação.
A tese a entidade recorrida, de que os manifestantes só utilizaram o seu direito no dia 3 de Janeiro de 2011, pelo que este teria caducado é, manifestamente, deslocada.
A manifestação é um direito e não um dever. Se os promotores previam realizar esta actividade em vários dias e só o fizeram num dia, nada obsta a que exerçam o seu direito nos dias seguintes.
Aliás, é a própria entidade recorrida que alega que a manifestação foi dispersada pelas autoridades no dia 3 de Janeiro, por a considerarem feita em local não permitido, pelo que, tendo os promotores interposto recurso da não permissão, é razoável presumir que aguardam que o Tribunal se pronuncie.
Não há, portanto, quaisquer indícios que tenham desistido de efectuar a manifestação.
Improcede a questão suscitada.

5. Questões prévias. Continuação.
Também não tem melhor sorte o entendimento da entidade recorrida de que a parte do despacho que se refere ao afastamento de 30 metros da Sede do Governo não é uma denegação de localização, mas uma evocação desse condicionalismo, pelo que o recurso não teria objecto.
Não foi assim. O n.º 5 do despacho invoca as normas que confere poder de não permitir manifestações a menos de 30 metros de determinados edifícios e impôs uma localização situada a centenas de metros do local. Foi, pois, uma não permissão de manifestação num local e não qualquer recomendação, acompanhado de uma ordem de realização da manifestação noutro local.
Aliás, se não tivesse havido não permissão da manifestação junto da Sede do Governo, mal se perceberia a acção policial que terá dispersado a manifestação no dia 3 de Janeiro.
Improcede a questão suscitada.

6. O mérito do recurso. N. os 1 a 4 do acto recorrido
É o artigo 8.º da Lei n.º 2/93/M, que regula a imposição de restrições às manifestações, pelo comandante do CPSP, com fundamento em razões do bom ordenamento do trânsito de pessoas e veículos e de segurança pública.
Dispõe o seguinte:
“Artigo 8.º
(Imposição de restrições pelo comandante da PSP)
1. O presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais dará imediato conhecimento ao comandante da Polícia de Segurança Pública dos avisos recebidos nos termos do artigo 5.º
2. Se tal se revelar indispensável ao bom ordenamento do trânsito de pessoas de veículos nas vias públicas, o comandante da Polícia de Segurança Pública pode, até 24 horas antes do seu início e através da forma prevista no artigo 6.º, alterar os trajectos programados de desfiles ou cortejos ou determinar que os mesmos façam só por uma das faixas de rodagem.
3. No prazo e pela forma previstos no número anterior, a mesma entidade, fundada em razões de segurança pública devidamente justificadas, pode exigir que as reuniões ou manifestações respeitem uma determinada distância mínima das sedes do Governo e da Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau, dos edifícios afectos directamente ao funcionamento destes, da sede do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, das instalações dos tribunais e das autoridades policiais, dos estabelecimentos prisionais e das sedes de missões com estatuto diplomático ou de representações consulares, sem prejuízo do disposto no artigo 16.º
4. A distância referida no número anterior não pode ser superior a 30 metros”.
O despacho impôs restrições nos n. os 1 a 4. Não se tratou de mera recomendação.
Os recorrentes entendem que não podia fazê-lo.
Sem razão.
O n.º 1 é uma determinação genérica, para as actividades se manterem pacificamente, o que além de legal, releva do simples bom senso.
O n.º 2, ao determinar que a via pública se acessível e eficiente, tem fundamento no n.º 2 do artigo 8.º da Lei n.º 2/93/M, embora não citado pelo acto recorrido, pois é facto do conhecimento geral e portanto, facto notório (artigo 434.º, n.º 1 do Código de Processo Civil) que a faixa de rodagem da via pública no local (em frente do Edifício onde se situa a Sede do Governo), é manifestamente estreita, como também o é o passeio – que integra a via pública, nos termos do artigo 2.º, alínea 18) da Lei do Trânsito Rodoviário - pelo que bem se percebe que a autoridade pública não tenha permitido a interdição de circulação na faixa de rodagem durante trinta dias, durante a maior parte do dia e parte da noite, como aconteceria se a mesma fosse utilizada pelos manifestantes. E é também legal a ordem para que a manifestação se faça sem prejuízo da utilização do passeio pelos peões.
O n.º 3 ao determinar que os organizadores da manifestação devem “Garantir que não se pratiquem actos que produzem barulhos ou possam afectar o ambiente higiénico e perturbar outros” tem, também, fundamento legal.
Como se sabe, quem percorra, visite, frequente ou por qualquer maneira utilize espaços públicos deve abster-se de produzir ruídos susceptíveis de desnecessariamente perturbar a tranquilidade e repouso das outras pessoas [artigo 2.º, n.º 2, alínea 2) Regulamento Geral dos Espaços Públicos, aprovado pelo Regulamento Administrativo n.º 28/2004].
Uma coisa é a produção normal de ruído de uma manifestação em cortejo, com invocação de palavras de ordem de repúdio, apoio, júbilo ou reprovação, que afecta a qualidade de vida da população, designadamente a tranquilidade pública, mas que se tem de tolerar porque está em causa um direito fundamental (de manifestação), sendo que a compressão dos direitos de terceiros é relativamente limitada (já assim não seria, por exemplo, nas proximidades de um hospital).
Mas outra coisa, manifestamente diversa, é a produção de ruído permanente, num mesmo local do centro da cidade, densamente povoado, com aparelhos de som, desde as 11 horas até às 23horas, e com montagem de um gerador de electricidade, como pretendiam os manifestantes.
Isso seria manifestamente desproporcionado face aos direitos de terceiros à tranquilidade, ao repouso e ao sossego, embora o despacho recorrido tenha passado ao lado destas questões, no seu laconismo.
Bem se compreende, pois, a restrição à não produção de ruído.
Quanto à preservação da higiene do local e ao cumprimento do artigo 7.º do Regulamento Geral dos Espaços Públicos2, não vemos que tanto um como outro sejam incompatíveis com o exercício do direito de manifestação, já que o que estaria em causa era o cumprimento das regras normativas sobre a colocação de oferendas e a queima de papéis votivos, a que se referem os n. os 2 e 3 do artigo 7.º do Regulamento. Afigura-se-nos que estas regras de higiene e tendentes a prevenir o risco de incêndio não são incompatíveis com o exercício do direito de manifestação.
Também não merece censura o despacho nesta parte.

7. O mérito do recurso. N. º 5 do acto recorrido
O despacho não permitiu a manifestação junto ao edifício da sede do Governo, invocando expressamente os n. os 3 e 4 do artigo 8.º da Lei n.º 2/93/M.
Simplesmente a lei (n.º 3) impõe que tal restrição ou proibição seja “... fundada em razões de segurança pública devidamente justificadas ...” (o sublinhado é nosso).
Ou seja, a autoridade policial tem um poder discricionário de não permitir manifestações a distância inferior a 30 metros de determinados locais, com fundamento em razões de segurança pública ou ordem pública e não em quaisquer outras razões. E tem que justificar devidamente a não permissão, em vez de se limitar a mencionar vagamente as expressões “segurança pública” ou “ordem pública”.
Ora, o despacho impugnado não dá qualquer justificação em termos de segurança pública ou ordem pública, limitando-se a afirmar que se pretende que o exercício do direito de manifestação não cause “influências negativas ao funcionamento normal do Governo ...” e “... ainda por motivos de manutenção de ordem pública ...”.
A deficiência do despacho, também nesta parte, mas não só, como dissemos, é evidente. Para além de não concretizar com factos em que é que o exercício do direito põe em causa a manutenção da ordem pública, é ainda mais enigmático quando menciona influências negativas ao funcionamento normal do Governo ...
Violou, assim, o disposto no n.º 3 do artigo 8.º da Lei n.º 2/93/M, visto que não apresentou razões de segurança pública ou ordem pública para não permitir a manifestação no local.
Para além disso, nenhuma norma legal confere ao comandante do CPSP que indique um local alternativo onde a manifestação possa ter lugar. Apenas pode impor o afastamento até ao máximo de 30 metros de certos locais. Quando a manifestação pretendida tenha lugar apenas dentro do perímetro não permitido, a determinação do comandante do CPSP deve limitar-se a não permitir a manifestação no local e mais nada.
O recurso é, pois, parcialmente procedente.

III – Decisão
Face ao expendido, concedem parcial provimento ao recurso, autorizando a manifestação junto à Sede do Governo até ao dia 17 de Janeiro de 2011, dentro do condicionalismo previsto nos n.os 1 a 4 do despacho recorrido.
Sem custas.
Macau, 12 de Janeiro de 2011.
   Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) - Sam Hou Fai - Chu Kin
1 Refere-se aos n. os 1 a 4 do Despacho.
2 Que dispõe:
                   “Artigo 7.º
Actividades
1. Fora dos locais e zonas concretamente assinalados para o efeito, nos espaços públicos é proibido, salvo autorização prévia da entidade competente, organizar ou participar em actividades culturais, recreativas ou desportivas que dificultem o tráfego de peões e veículos, ponham em risco a segurança das pessoas ou sejam susceptíveis de originar estragos em bens públicos ou particulares.
2. Sem prejuízo do disposto no número seguinte, nos actos realizados nos espaços públicos que associem a colocação de oferendas e a queima de papéis votivos, o praticante deve:
1) Escolher um local apropriado, de boa ventilação e onde não exista perigo de incêndio ou de explosão;
2) Preparar a combustão em recipientes adequados, que dificultem a libertação de faúlhas ou de cinzas;
3) Colocar os alimentos e aquele recipiente de forma a não impedir o tráfego de peões e veículos;
4) Lavar e limpar o local, após o termo da cerimónia.
3. Carece de autorização prévia do IACM, para prevenir o risco de incêndio, a prática de actos que impliquem acender lume ou fazer arder qualquer material em jardins, parques e zonas verdes, fora dos locais expressamente assinalados para o efeito.
4. É proibido:
1) Acampar ou pernoitar nos espaços ou instalações públicas, excepto nos locais autorizados e nas condições estabelecidas pela entidade competente;
2) Pescar ou praticar qualquer actividade aquática na barragem, no reservatório, nas lagoas ou nos lagos, excepto nos locais autorizados e nas condições estabelecidas pela entidade competente;
3) O exercício da caça”.
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