Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau
Recurso de decisão jurisdicional em matéria administrativa
N.º 51 / 2010
Recorrente: Secretário para a Economia e Finanças
Recorrida: A
1. Relatório
A interpôs recurso contencioso, perante o Tribunal de Segunda Instância, contra o despacho do Secretário para a Economia e Finanças que lhe negou o recurso hierárquico sobre a decisão da Directora dos Serviços de Finanças que lhe aplicou a pena disciplinar de 5 dias de multa.
Por acórdão proferido no processo n.º 703/2009, o Tribunal de Segunda Instância concedeu provimento ao recurso e anulou o acto impugnado.
Deste acórdão vem agora o Secretário para a Economia e Finanças interpor recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância, alegando essencialmente o seguinte:
- A declaração de nulidade do procedimento de avaliação teve por fundamento a preterição de uma formalidade desse processo;
- A conduta da recorrida não se esgotou nesse momento, na medida em que o seu vínculo à Administração Pública se manteve e, no respectivo exercício, violou deveres funcionais;
- O comportamento assumido pela recorrida, traduzido na violação dos deveres funcionais durante o procedimento da avaliação do desempenho do ano de 2007, é autonomamente aferida, mantendo-se válidos todos os actos praticados no processo disciplinar, que lhe foi instaurado com total independência e autonomia relativamente ao da avaliação do desempenho;
- A conduta da recorrida que integra a violação de deveres funcionais ocorreu nos dois procedimentos de avaliação do desempenho, de 2007 e 2008. Apenas o procedimento de 2007 foi declarado nulo;
- Deve o acórdão recorrido ser revogado.
A recorrida contra-alegou, pedindo que seja confirmado o acórdão recorrido.
O Ministério Público emitiu o parecer no sentido de manter o decidido no acórdão recorrido.
Foram apostos vistos pelos juízes-adjuntos.
2. Fundamentos
2.1 Matéria de facto
Por não ter sido impugnada nem haver alteração da matéria de facto fixada pelo Tribunal de Segunda Instância, remetemos para a parte de factos provados do acórdão recorrido.
2.2 Comportamento relevante para processo disciplinar
A recorrida foi punida disciplinarmente na pena de 5 dias de multa pela violação dos deveres de zelo e lealdade por infracções cometidas nos procedimentos de avaliação do desempenho relativo aos anos de 2007 e 2008, traduzidas na recusa de assinar os mapas resumo das 1ª, 2ª e 3ª reuniões de avaliação do primeiro ano e da 1ª do segundo ano.
Por outro lado, o referido procedimento de avaliação do ano 2007 foi declarado nulo por despacho da Directora dos Serviços de Finanças.
O Tribunal de Segunda Instância anulou o acto impugnado por considerar que, uma vez declarado nulo o procedimento de avaliação (embora no acórdão ora recorrido não se distinguiu os dois procedimentos de avaliação dos anos de 2007 e 2008), inadequado ou ilegal é dele extrair factos para efeitos de punição em sede de processo disciplinar.
O ora recorrente considera que o comportamento da recorrida violador dos deveres funcionais durante o procedimento da avaliação do desempenho é autonomamente aferido.
Parece-nos que o recorrente tem razão.
Pois não se deve considerar que o comportamento adoptado pela recorrida, que consistia na recusa de assinar os resumos das reuniões de avaliação, desaparece com a declaração de nulidade do respectivo procedimento de avaliação.
Uma coisa é a anulação do procedimento de avaliação e outra coisa são factos com relevância disciplinar que ocorreram durante tal procedimento ou outro.
Tal comportamento da recorrida existiu realmente, independentemente da declaração da nulidade do procedimento em que ocorreu, podendo sempre constituir objecto de apreciação disciplinar. Mas para indagar se constitui realmente uma infracção disciplinar com a consequente imputação da responsabilidade disciplinar e a sujeição a sanção, já se trata de outra questão, ligada ao fundo da matéria.
Procede assim o recurso jurisdicional.
Não deixamos de referir aqui que o tribunal recorrido deveria ter conhecido de outros vícios suscitados no recurso contencioso, segundo o espírito veiculado pelos art.ºs 74.º, n.º 5 e 151.º, n.º 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso, para evitar a situação de o processo poder ter de voltar ao Tribunal de Última Instância em novo recurso jurisdicional contra a nova decisão a ser tomada pelo tribunal recorrido face à decisão de reenvio para novo julgamento ora proferida.
3. Decisão
Face ao exposto, acordam em julgar procedente o recurso jurisdicional e revogar o acórdão recorrido, determinando a baixa do processo para o Tribunal de Segunda Instância a fim de conhecer do objecto do recurso contencioso, se para tal nada obsta.
Custas nesta instância pela recorrida com a taxa de justiça fixada em 3 UC.
Aos 30 de Março de 2011
Os juízes:Chu Kin
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai
O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Victor Manuel Carvalho Coelho
Processo n.º 51 / 2010 1