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Processo nº 1068/2009
Data do Acórdão: 15JUL2010


Assuntos:
contrato de trabalho
irrenunciabilidade do direito
descansos semanais
descansos anuais
feriados obrigatórios
compensações do trabalho prestado em dias de descansos semanais e anuais e de feriados obrigatórios
gorjetas
salário justo
salário diário
salário mensal



SUMÁRIO

1. São elementos essenciais de uma relação de trabalho a prestação do trabalhador, a retribuição e a subordinação jurídica.

2. mesmo que houvesse acordo entre o trabalhador e a entidade patronal, nos termos do qual aquele renunciou o direito de gozo a aos descansos e feriados obrigatórios, o certo é que, por força da natureza imperativa das normas que confere ao trabalhador direito a compensações e nos termos do disposto no artº 6º da Lei nº 101/84/M e no artº 6º do Decreto-Lei nº 24/89/M, a um tal acordo da natureza convencional nunca poderia ser reconhecida qualquer validade legal, dado que resulta nitidamente um regime menos favorável para o trabalhador.

3. Admitindo embora que variam as opiniões sobre o que se deve entender por salário justo e adequado, mesmo com referência ao parâmetro das exigências do bem comum, o certo é que podemos afirmar, com a razoável segurança, que salário justo e adequado nesse parâmetro deve ser aquele que, além de compensar o trabalhador, é capaz de prover um trabalhador das suas necessidades de vida, garantindo-lhe a subsistência com dignidade e até permitir-lhe assumir compromissos financeiros pelo menos de curto ou até médio prazo.



O relator


Lai Kin Hong

Processo nº 1068/2009


Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I

A, devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Judicial de Base acção de processo comum do trabalho, contra a SOCIEDADE DE TURISMO E DIVERSÕES DE MACAU, devidamente identificada nos autos, doravante abreviadamente designada STDM.

Citada a Ré, contestou pugnando pela improcedência da acção.

A final a acção foi julgada parcialmente procedente e condenada a Ré a pagar ao Autor A a quantia de MOP$836.472,00, acrescida de juros vencidos e vincendos, a contar do trânsito em julgado da sentença até integral pagamento.

Inconformada, recorreu a Ré e concluiu as suas alegações afirmando que:

I. A Sentença de que ora se recorre é nula por erro na subsunção da matéria de facto dada como provada à solução de direito.

II. Recorde-se aqui que estamos em sede de responsabilidade civil, pelo que o(a) Recorrido(a) apenas terá direito de ser indemnizado(a) caso prove que a Recorrente praticou um acto ilícito.

III. E, de acordo com os arts. 20°, 17°, 6. b) e 24° do RJRT, apenas haverá comportamento ilícito por parte do empregador – e consequentemente direito a indemnização – quando o trabalhador seja obrigado a trabalhar em dia de descanso semanal, anual e ou em dia de feriado obrigatório e o empregador não o remunere nos termos da lei.

IV. Ora nada se provou que fosse susceptível de indicar qualquer acção ou omissão (muito menos ilícita) por parte da Recorrente que haja obstado ao gozo de descansos pelo(a) A., não podendo, por isso, afirmar-se o seu direito ao pagamento da indemnização que pede, a esse título – relembre-se que ficou provado que o(a) A. precisava da autorização da R. para ser dispensado dos serviços;

V. Porque assim é, carece de fundamento legal a condenação da ora Recorrente por falta de prova de um dos elementos essenciais ao direito de indemnização do(a) A., ora Recorrido(a), i.e., a ilicitude do comportamento da R., ora Recorrente. Caso assim não se entenda, e salvo mais douto entendimento, sempre deve aplicar-se, para o cálculo de qualquer compensação pelo trabalho alegadamente prestado em dias de descanso, o regime previsto para o salário diário;

Assim não se entendendo, e ainda concluindo:

VI. O(A) A., ora Recorrido(a), não estava dispensado(a) do ónus da prova quanto ao não gozo de dias de descanso e devia, em audiência, por meio de testemunhas ou por meio de prova documental, ter provado que dias alegadamente não gozou.

VII. Assim sendo, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo errou na aplicação do direito, pelo que o douto Tribunal de Segunda Instância deverá anular a decisão e absolver a Recorrente dos pedidos deduzidos pelo(a) A., ora Recorrido(a).

VIII. Nos termos do n°1 do art. 335° do Código Civil (adiante CC) “Àquele que invoca um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado.”.

IX. Por isso, e ainda em conexão com os quesitos 3º a 9º, da base instrutória, cabia ao(à) A., ora Recorrido(a), provar que a Recorrente obstou ou negou o gozo de dias de descanso.

X. Ora nada se provou que fosse susceptível de indicar qualquer acção ou omissão (muito menos ilícita) por parte da Recorrente que haja obstado ao gozo de descansos pelo(a) A., não podendo, por isso, afirmar-se o seu direito à indemnização que pede, a esse título.

Assim não se entendendo, e ainda concluindo:

XI. O nº 1 do art. 5º do RJRT dispõe que o diploma não será aplicável perante condições de trabalho mais favoráveis que sejam observadas e praticadas entre empregador e trabalhador, esclarecendo o art. 6º deste diploma legal que os regimes convencionais prevalecerão sempre sobre o regime legal, se daqui resultarem condições de trabalho mais favoráveis aos trabalhadores.

XII. O facto de o(a) A. ter beneficiado de um generoso esquema de distribuição de gorjetas que lhe permitiu, ao longo de vários anos, auferir rendimentos que numa situação normal nunca auferiria, justifica, de per si, a possibilidade de derrogação do dispositivo que impõe ao empregador o dever de pagar um salário justo, pois caso o(a) Recorrido(a) auferisse apenas um salário justo – da total responsabilidade da Recorrente e pago na íntegra por esta – certamente que esse salário seria inferior ao rendimento total que o(a) Recorrido(a), a final, auferiria durante os vários anos em que foi empregado da Recorrente.

XIII. Não concluindo – e nem sequer se debruçando sobre esta questão – pelo tratamento mais favorável ao trabalhador resultante do acordado entre as partes – consubstanciado, sobretudo, nos altos rendimentos que o(a) A. auferia – incorreu o Tribunal a quo em erro de direito, o que constitui causa de anulabilidade da sentença ora em crise.

Assim não se entendendo e ainda concluindo:

XIV. A aceitação do trabalhador de que aos dias de descanso semanal, anual e em feriados obrigatórios não corresponde qualquer remuneração teria, forçosamente, de ser considerada como válida.

XV. Os artigos 24º e seguintes da Lei Básica consagram um conjunto de direitos fundamentais, assim como os artigos 67º e seguintes do Código Civil consagram um conjunto de direitos de personalidade e, do seu elenco não constam os alegados direitos violados (dias de descanso anual e feriados obrigatórios).

XVI. Não tendo o legislador consagrado a irrenunciabilidade dos direitos em questão, devem os mesmos ser considerados livremente renunciáveis e, bem assim, considerada eficaz qualquer limitação voluntária dos mesmos, seja essa limitação voluntária efectuada ab initio, superveniente ou ocasionalmente.

XVII. Donde, deveria o Tribunal ter considerado eficaz a renúncia ao gozo efectivo de tais direitos, absolvendo a aqui Recorrente do pedido.

Assim não se entendendo, e ainda concluindo:

XVIII. Ao trabalhar voluntariamente – e, realce-se, não ficou em nenhuma sede provado que esse trabalho não foi prestado de forma voluntária, muito pelo contrário - em dias de descanso (sejam eles anual, semanal ou resultantes de feriados), o(a) Recorrido(a) optou por ganhar mais, tendo direito à correspondente retribuição em singelo.

XIX. E, não tendo o(a) Recorrido(a), sido impedido(a) de gozar quaisquer dias de descanso anual, de descanso semanal ou quaisquer feriados obrigatórios, forçoso é concluir pela inexistência do dever de indemnização por parte da STDM, ora Recorrente.

Ainda sem conceder, e ainda concluindo:

XX. Por outro lado, jamais pode a ora Recorrente concordar com a fundamentação do(a) Mmo(a). Juiz a quo quando considera que o(a) A., ora Recorrido(a), era remunerado com base num salário mensal, sendo que toda a factualidade dada como assente indica o sentido inverso, ou seja, do salário diário.

XXI. Em primeiro lugar, porque a proposta contratual oferecida pela ora Recorrente aos trabalhadores dos casinos, como o(a) aqui Recorrido(a) era a mesma há cerca de 40 anos: auferiam um salário diário fixo de MOP$4.10/dia, HKD$ 10.00/dia ou HKD$ 15.00, ou seja, um salário de acordo com o período de trabalho efectivamente prestado.

XXII. Acresce que o “esquema” do salário diário nunca foi contestado pelos trabalhadores na pendência da relação contratual.

XXIII. Trata-se de uma disposição contratual válida e eficaz de acordo com o RJRT, que prevê, expressamente, a possibilidade de as partes acordarem no regime salarial mensal ou diário, no âmbito da liberdade contratual prevista no art. 1° do RJRT.

XXIV. Ora, na ausência de um critério legal ou requisitos definidos para aferir a existência de remuneração em função do trabalho efectivamente prestado, ao estabelecer que o(a) A., ora Recorrido(a), era remunerado com um salário mensal, a sentença recorrida desconsidera toda a factualidade dada como assente e, de igual forma, as condições contratuais acordadas entre as partes.

XXV. Salvo o devido respeito por entendimento diverso, a Recorrente entende que, nessa parte, a decisão em crise não está devidamente fundamentada ao tentar estabelecer como imperativo (i.e., o regime de salário mensal em contratos de trabalho típicos) o que a lei define como dispositivo (i.e., as partes poderem livremente optar pelo regime de salário mensal ou diário em contratos de trabalho típicos).

XXVI. E, é importante salientar, esse entendimento por parte do(a) Mmo(a). Juiz a quo, teve uma enorme influência na decisão final da presente lide e, em última instância, no cálculo do quantum indemnizatório, pelo que deve ser reapreciada por V. Exas. no sentido de fixar o salário auferido pelo A, ora Recorrido(a), como salário diário, o que expressamente se requer.

Por outro lado,

XXVII. O trabalho prestado pelo(a) Recorrido(a) em dias de descanso foi sempre remunerado em singelo.

XXVIII. A remuneração já paga pela ora Recorrente ao ora Recorrido(a) por esses dias deve ser subtraída nas compensações devidas pelos dias de descanso a que o(a) A. tinha direito, nos termos do RJRT.

XXIX. Maxime, o trabalho prestado em dia de descanso semanal, para os trabalhadores que auferem salário diário, deve ser remunerado como um dia normal de trabalho (cfr. al. a) e b) do n.° 6 do art.° 17° do RJRT, tendo o Tribunal a quo descurado em absoluto essa questão.

XXX. Ora, nos termos do art. 26°, n.° 2 do RJRT, o salário diário inclui a remuneração devida pelo gozo de dias de descanso semanal e, nos termos do art. 17°, n.° 6, al. b), os trabalhadores que auferem salário diário verão o trabalho prestado em dia de descanso semanal remunerado nos termos do que for acordado com o empregador.

XXXI. No presente caso, não havendo acordo expresso, deverá considerar-se que a remuneração acordada é a correspondente a um dia de trabalho.

XXXII. A decisão Recorrida enferma assim de ilegalidade, por errada aplicação da alínea b) do n° 6 do art. 17° e do artigo 26° do RJRT, o que importa a revogação da parte da sentença que condenou a Recorrente ao pagamento relativo às compensações pelo não gozo dos dias de descanso, o que, expressamente, se requer.

Ainda concluindo:

XXXIII. As gorjetas dos trabalhadores de casinos não são parte integrante do conceito de salário, do mesmo modo que não o são as gorjetas auferidas pelos trabalhadores da STDM.

XXXIV. Neste sentido, a corrente Jurisprudencial dominante, em que se destacam os acórdãos do Tribunal de Última Instância proferidos no âmbito dos Processos n.º 28/2007, 29/2007 e 58/2007, datados de 21 de Setembro de 2007, 22 de Novembro de 2007 e 27 de Fevereiro de 2008, respectivamente.

XXXV. Também neste sentido se tem pronunciado a doutrina de forma unânime.

XXXVI. O ponto essencial para a qualificação das prestações pecuniárias enquanto prestações retributivas é quem realiza a prestação. A prestação será retribuição quando se trate de uma obrigação a cargo do empregador.

XXXVII. Nas gratificações há um animus donandi, ao passo que a retribuição consubstancia uma obrigatoriedade.

XXXVIII. A propósito da incidência do Imposto Profissional: “O Imposto Profissional incide sobre os rendimentos do trabalho, em dinheiro ou em espécie, de natureza contratual ou não, fixos ou variáveis, seja qual for a sua proveniência ou local, moeda e forma estipulada para o seu cálculo e pagamento”. É a própria norma que distingue, expressamente, gorjetas de salário.

XXXIX. Qualifica Monteiro Fernandes expressamente as gorjetas dos trabalhadores da STDM como “rendimentos do trabalho”, esclarecendo que os mesmos são devidos por causa e por ocasião da prestação de trabalho, mas não em função ou como correspectividade dessa mesma prestação de trabalho.

XL. Na verdade, a reunião e contabilização das gorjetas são realizadas nas instalações dos casinos da STDM, mas com a colaboração e intervenção dos empregados de casino, funcionários da tesouraria e de funcionários do governo que são chamados para supervisionar aquelas operações.

XLI. Salvo o devido respeito pelo(a) Mmo(a). Juiz a quo, a posição de sustentar a integração das gorjetas no conceito jurídico de salário, com base no conceito abstracto e subjectivo de “salário justo”, não tem qualquer fundamento legal, nem pode ter aplicação no caso concreto.

XLII. Em primeiro lugar, porque o que determina se certo montante integra ou não o conceito de salário, são critérios objectivos, que, analisados detalhadamente, indicam o contrário, senão vejamos: as gorjetas são montantes, (i) entregues por terceiros; (ii) variáveis; (iii) não garantidos pela STDM aquando da contratação; (iv) reunidas e contabilizadas pelos respectivos empregados do casino, juntamente com funcionários da tesouraria e do governo de Macau.

XLIII. E, fortalece a nossa tese, a posição do governo de Macau que nunca considerou necessário a definição de um montante mínimo salarial que pudesse servir de bitola para a apreciação – menos discricionária – do que é um salário justo.

XLIV. Dessa forma, o cálculo de uma eventual indemnização, que não se concede, só poderia levar em linha de conta o salário diário, excluindo-se as gorjetas.

Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, que V.Exas doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, revogando-se a decisão recorrida em conformidade, fazendo-se, mais uma vez, a habitual

JUSTIÇA!

II

Ficaram provados na primeira instância os seguintes factos:

根據自認和書證獲證實的事實(既證事實)
A) 自上世紀六十年代初,經當時澳門地區政府批給,第一被告為以專營方式經營幸運博彩或其他娛樂場博彩的經營者。
B) 根據2001年12月18日頒佈的行政長官第259/2001號批示,該專營許可權依法於2002年3月31日結束。
C) 根據第76/2002號行政長官批示,澳門博彩股份有限公司獲得其中一個經營批給。
D) 依據原告與第一被告於1978年4月19日訂立的合同,原告被聘為第一被告的員工,在第一被告經營的幸運博彩範圍內,原告在其命令、領導及監督下工作。
E) 在工作的首年,原告的工作是為第一被告的客人提供協助,之後,原告開始任職“荷官”至2002年7月29日。
F) 原告的工作時間一直由第一被告根據其需要確定,每日輪值。
G) 根據原告與第一被告的協議,作為原告為第一被告提供服務的回報,自1978年至1989年6月,第一被告支付原告日固定金額報酬為港幣4.1 圓;自1989年7月至1995年4月,為每日港幣10圓;從1995年5月至2002年7月,為每日港幣15圓。
H) 除此以外,在為第一被告工作期間,原告還收取第一被告客人付給所有員工全部小費中一份額,金額不定;該小費由第一被告每日收集並點算,之後,每十日,由第一被告按工作人員的相關職位分發給所有工作人員。
I) 2002年7月28日,原告與澳門博彩股份有限公司(第二被告)簽署了一份《工作合同》,內容載於卷宗第25頁至第34頁,其內容在此全文轉錄。
經庭審後獲證明的事實
1. 原告與第一被告的勞動關係存續期間,原告從沒獲得許可享用任何一日的每工作一周一日之休。
2. 在上述期間提供的工作,原告從沒有收到任何額外補償。
3. 原告也從沒有獲得另外一日作為補休。
4. 第一被告從沒有訂定任何年假休息期間。
5. 原告沒有享有任何期間的年假休息。
6. 原告與第一被告合同關係存續期間,第一被告從沒有給予原告享有強制性公眾假日休息。
7. 原告從沒有因在上述期間實質提供工作而收到任何額外薪金。
8. 原告每月工資收入由既證事實第G)及H)項所述之確定金額及浮動金額組成,每年從第一被告收取的日工資如下所列:
* 在1984年:每日金額為澳門幣329圓;
* 在1985年:每日金額為澳門幣334圓;
* 在1986年:每日金額為澳門幣314圓;
* 在1987年:每日金額為澳門幣369圓;
* 在1988年:每日金額為澳門幣394圓;
* 在1989年:每日金額為澳門幣411圓;
* 在1990年:每日金額為澳門幣513圓;
* 在1991年:每日金額為澳門幣479圓;
* 在1992年:每日金額為澳門幣536圓;
* 在1993年:每日金額為澳門幣533圓;
* 在1994年:每日金額為澳門幣578圓;
* 在1995年:每日金額為澳門幣538圓;
* 在1996年:每日金額為澳門幣486圓;
* 在1997年:每日金額為澳門幣502圓;
* 在1998年:每日金額為澳門幣482圓;
* 在1999年:每日金額為澳門幣414圓;
* 在2000年:每日金額為澳門幣415圓;
* 在2001年:每日金額為澳門幣456圓。
* 在2002年:每日金額為澳門幣406圓。
9. 原告與第一被告合同關係存續期間,原告與家人及朋友交往方面受到了限制、沒能擁有喜悅及閑暇時間。
10. 原告獲第一被告通知,由於澳門博彩股份有限公司取得幸運博彩經營批給,故原告應與其簽立“新”工作合同。
11. 原告享有豁免工作期間,不收取任何報酬。
12. 多年來,在豁免上班的日子,第一被告的員工,特別是原告,從沒有要求第一被告支付任何相關日子的補償或報酬。

Perante as volumosas conclusões na motivação do recurso, é de frisar que ao tribunal não cabe debater com as partes, recorrente ou recorrida, todos os argumentos por elas deduzidos para sustentar a sua posição face às questões por elas ou contra elas levantadas, mas sim só as questões que, face à lei processual, devam e possam constituir o objecto do recurso, assim como as questões de conhecimento oficioso.

Assim, de acordo com o globalmente alegado nas conclusões do recurso, são as seguintes questões, elencadas numa relação subsidiária, que delimitam o thema decidendum na presente lide recursória, para além da questão que a recorrente levantou acerca da falta da prova dos factos demonstrativos da ilicitude da acção ou omissão da Ré.

Ora, quanto a esta última questão que se prende com a matéria de facto, a ora recorrente não fez mais do que sindicar a livre apreciação de prova feita pelo Tribunal a quo.

Atendendo às provas produzidas e examinadas no julgamento da matéria de facto e tendo em conta a regra estabelecida no artº 558º/3 do CPC, não se vê que existe erro grosseira na apreciação de prova nem violação de quaisquer regras da prova legal.

Improcede assim essa parte.

Passemos então apreciar as seguintes questões de direito.

1. da existência do contrato de trabalho;
2. do direito de gozo de descansos semanais e anuais, e de feriados obrigatórios;
3. da nartureza das “gorjetas” e do salário justo e adequado;
4. do salário diário ou mensal; e
5. dos factores de multiplicação para efeitos de cálculos de indemnização pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios.

1. da existência de contrato de trabalho

A noção do contrato de trabalho encontra-se legalmente definido como “é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta” – cf. artº 1152º do CC de 1966 e artº 1079º do CC de 1999.

São portanto elementos essenciais de uma relação de trabalho, objecto de um contrato de trabalho, a prestação do trabalhador, a retribuição e a subordinação jurídica.

Globalmente interpretada a matéria de facto assente, verifica-se a demonstração dos factos susceptíveis de integrar no conceito desses três elementos constitutivos de uma relação de trabalho estabelecida entre o trabalhador e a entidade patronal STDM.

De facto, dessa relação resulta por um lado que, o trabalhador se obrigava a prestar uma actividade (exercício das funções de croupier) ou pelo menos se encontrava à disposição da entidade patronal para o exercício dessa actividade, sob as ordens, directivas e instruções da entidade patronal, e por outro lado que a entidade patronal STDM organizava e dirigia essa actividade a prestar pelo trabalhador, mediante a emissão dessas ordens, directivas e instruções, com vista a um resultado que está fora da relação entre eles travada, que é justamente a exploração dos casinos e obtenção de lucros.

Verificam-se assim os elementos da prestação do trabalhador e a subordinação jurídica.

Quanto ao elemento de retribuição, vimos na matéria de facto assente que em troca da actividade por ele prestada ou da disponibilidade da força do seu trabalho, o trabalhador recebia da entidade patronal STDM, como contrapartida dessa actividade ou disponibilidade uma retribuição pecuniária, consubstanciada no pagamento periódico de uma quantia fixa (MOP$4,10, HKD$10,00 e HKD$15,00 diariamente) e de uma outra variável (as gorjetas, qualificadas como parte integrante do salário por razões que se expõem infra)

Verificados os três elementos essenciais de uma relação de trabalho, é evidente que estamos perante um contrato de trabalho celebrado entre a entidade patronal STDM e o trabalhador A.

Cremos assim que as questões a ser apreciadas infra deverão ser enquadradas no âmbito de aplicação dos diplomas reguladores das relações de trabalho então vigentes, que são a Lei nº 101/84/M e o D. L. Nº 24/89/M, consoante a localização temporal dos factos com relevância à solução das questões que delimitam o objecto do presente lide recursória.

2. do direito de gozo de descansos semanais e anuais, e de feriados obrigatórios

Aqui, para excluir a sua responsabilidade pelas compensações do trabalho prestado em dias de descansos semanais e anuais e de feriados obrigatórios remunerados, a entidade patronal invocou a renunciabilidade do direito de gozo desses descansos e feriados para sustentar a ausência da ilicitude do seu comportamento no âmbito da execução do contrato de trabalho celebrado com o trabalhador.

Ficou provado que:

1. 原告與第一被告的勞動關係存續期間,原告從沒獲得許可享用任何一日的每工作一周一日之休。
2. 在上述期間提供的工作,原告從沒有收到任何額外補償。
3. 原告也從沒有獲得另外一日作為補休。
4. 第一被告從沒有訂定任何年假休息期間。
5. 原告沒有享有任何期間的年假休息。
6. 原告與第一被告合同關係存續期間,第一被告從沒有給予原告享有強制性公眾假日休息。
7. 原告從沒有因在上述期間實質提供工作而收到任何額外薪金。

Ora, independentemente da qualificação ou não das “gorjetas” como parte integrante do salário, o trabalho prestado em dias de descanso semanal e anual e de feriados obrigatórios na vigência do Decreto-Lei nº 24/89/M deve ser sempre compensado pelo pagamento de retribuição correspondente nos termos fixados na lei.

E no âmbito da Lei nº 101/84/M, deve ser compensado apenas o trabalho prestado em dias de descanso anual, assim como o trabalho prestado somente nos 3 dias de feriados obrigatórios (o dia 1 de Janeiro, o dia 1 de Maio e o dia 1 de Outubro) nas situações previstas no artº 21º/1-b).

Todavia, atendendo à natureza contínua inerente ao funcionamento dos casinos explorados pela entidade patronal onde prestava serviço o trabalhador, o trabalho por ele prestado não lhe confere o direito a qualquer acréscimo salarial, por força do artº 21º/1-c), a contrario.

Não tendo o trabalhador recebido da entidade patronal STDM as correspondentes retribuições pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal e anual e de feriados obrigatórios, tal como imperativamente consagrados na lei, tem agora o trabalhador direito a reclamar, por via da acção cível, da entidade patronal as compensações devidas.

Pois, mesmo que houvesse acordo entre o trabalhador e a entidade patronal STDM, nos termos do qual aquele renunciou o direito de gozo a esses descansos e feriados obrigatórios, o certo é que, por força da natureza imperativa dessas normas que confere ao trabalhador direito a compensações e nos termos do disposto no artº 6º da Lei nº 101/84/M e no artº 6º do Decreto-Lei nº 24/89/M, a um tal acordo da natureza convencional nunca poderia ser reconhecida qualquer validade legal, dado que resulta nitidamente um regime menos favorável para o trabalhador.

O que é gerador da nulidade do acordo, por violação da lei imperativa – artº 274º do CC de 1999 e artº 281º do CC de 1966.

Eis a ilicitude do comportamento da entidade patronal, que a faz incorrer na responsabilidade de indemnizar o trabalhador.

3. da nartureza das “gorjetas” e do salário justo e adequado

Da materialidade fáctica assente resulta que:

* o trabalhador recebia uma quantia fixa, no valor de MOP$4,10 por dia, desde o início até 30JUN1989; de HKD$10,00 por dia, desde 01JUL1989 até à cessação da relação de trabalho estabelecida com a entidade patronal STDM;

* recebia uma quantia variável proveniente das gorjetas dadas pelos clientes, as quais são contabilizados e distribuídas segundo um critério fixado pela entidade patronal STDM de acordo com a categoria do beneficiário;

* a entidade patronal foi sempre regular na entrega das gorjetas ao trabalhador;

Tanto a lei nº 101/84/M como o D. L. nº 24/89/M, a lei impõe que o salário seja justo.

Diz o artº 27º da Lei nº 101/84/M que “pela prestação dos seus serviços/actividade laboral, os trabalhadores têm direito a um salário justo”.

Ao passo que o D. L. nº 24/89/M de 03ABR estabelece no seu artº 7º, como um dos deveres do empregador, que o empregador deve, a título da retribuição ao trabalho prestado pelo trabalhador, paga-lhe um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho.

A este dever da entidade patronal, o mesmo decreto faz corresponder simetricamente o direito do trabalhador de auferir um salário justo – artº 25º do mesmo decreto.

A retribuição pode ser certa, variável ou mista consoante seja calculada em função do tempo, do resultado ou daquele e deste (artº 26º do Decreto-Lei nº 24/89/M). E pode ser paga em dinheiro e, ou, em espécie (artº 25º, nº 3, do Decreto-Lei nº 24/89/M); mas apenas pode ser constituída em espécie até ao limite de metade do montante total da retribuição, sendo a restante metade paga em dinheiro (idem, artº 25º, nº3) – vide Augusto Teixeira Garcia, in Lições de Direito do Trabalho ao alunos do 3º ano da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, 1991/1992, Capítulo III, ponto 1 e 2.

In casu, o trabalhador era remunerado em dinheiro.

Se levássemos em conta apenas a quantia fixa que o trabalhador recebia da entidade patronal STDM, ou seja, MOP$4,10 por dia, desde o início até JUN1989, HKD$10,00 por dia, desde JUL1989 até ABR1995, e HKD$15,00 por dia, desde MAIO1995 até à cessação da relação de trabalho com a STDM, esta quantia ser-nos-ia obviamente muito aquém do critério imperativamente fixado na lei que impõe o dever ao empregador de pagar ao trabalhador um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho.

Admitindo embora que variam as opiniões sobre o que se deve entender por salário justo e adequado, mesmo com referência ao parâmetro das exigências do bem comum, o certo é que podemos afirmar, com a razoável segurança, que salário justo e adequado nesse parâmetro deve ser aquele que, além de compensar o trabalhador, é capaz de prover um trabalhador das suas necessidades de vida, garantindo-lhe a subsistência com dignidade e até permitir-lhe assumir compromissos financeiros pelo menos de curto ou até médio prazo.

Na esteira desse entendimento, a parte da quantia fixa (MOP$4,10, HKD$10,00 e HKD$15,00) do rendimento que o trabalhadora auferia está muito longe de ser capaz de prover o trabalhador das suas necessidades mínimas, muito menos garantir-lhe a subsistência com dignidade ou permitir-lhe assumir compromissos financeiros.

Só não será assim se o salário do trabalhador estiver composto por essa parte fixa e por uma outra parte variável que consiste na quantia denominada “gorjetas”, que tendo embora a sua origem nas gratificações dadas pelos clientes, eram primeiro colectadas e depois distribuídas periodicamente pela entidade patronal ao trabalhador, segundo os critérios por aquele unilateralmente definidos, nomeadamente de acordo com a categoria e a antiguidade do trabalhador.

Ora, para qualquer homem médio, se o salário não fosse o assim composto, ninguém estaria disposto a aceitar apenas a quantia fixa (MOP$4,10, HKD$10,00 e HKD$15,00) com seu verdadeiro e único salário, para trabalhar por conta da entidade patronal STDM, que como se sabe, pela natureza das suas actividades e pela forma do seu funcionamento exige aos seus trabalhadores, nomeadamente os afectados a seus casinos, a trabalhar por turnos, diurnos e nocturnos.

Pelo que, as denominadas gorjetas não podem deixar de ser consideradas parte integrante do salário, pois de outro modo, a entidade patronal STDM violava o seu dever legal de pagar ao trabalhador um salário justo e adequado.

4. do salário diário ou mensal

A entidade patronal defende que o trabalhador auferiu salário diário e não salário mensal.

Como a determinação da natureza diária ou mensal do salário que auferiu influi nos cálculos das compensações em causa, temos de nos debruçar sobre ela.

Ao contrário do que foi decidido na primeira instância, a recorrente defende que o trabalhador auferiu um salário diário e não mensal.

Como se sabe, é por imposição legal e pelos termos do contrato de concessão para exploração dos jogos de fortuna e azar que os casinos têm de funcionar ininterruptamente durante 24 horas.

Ora, para fazer face à necessidade de assegurar o funcionamento contínuo legalmente imposto dos seus casinos, já custa perceber como é quê é possível os seus trabalhadores afectados aos casinos, em vez de auferirem um salário mensal, que é única forma de pagamento conciliável com a organização dos turnos durante 24 horas para assegurar a continuidade do funcionamento dos casinos, auferirem antes um salário diário determinado em função do número de dias de trabalho em que quis trabalhar e efectivamente prestou serviço.

Sem mais considerações, improcede assim o argumento defendido pela entidade patronal de que o trabalhador auferia um salário diário.

5. dos factores de multiplicação para efeitos de cálculos de indemnização pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios.

Pelo que vimos, ficam decididas a irrenunciabilidade dos descansos semanais e anuais e de feriados obrigatórios, a responsabilidade de indemnização por parte da entidade patronal pelo trabalho prestado nos dias de descansos e de feriados, a inclusão das “gorjetas” no conceito do salário e a natureza mensal do salário que o trabalhador auferia, cremos que é altura para apurar os factores de multiplicação para efeitos de cálculos das quantias devidas pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios.

a) compensação do trabalho em descansos anuais

Antes da entrada em vigor da Lei nº 101/84/M em 01SET1984, vigorava plenamente o princípio da liberdade contratual e da autonomia privada, sem quaisquer condicionalismos garantísticos legais, não havia lugar a quaisquer compensações senão as contratualmente convencionadas.

Já na vigência da Lei nº 101/84/M, ou seja, no período compreendido entre 01SET1984 e 02ABR1989, já foram estabelecidas algumas garantias aos trabalhadores, nomeadamente a compensação obrigatória pelo trabalho prestado em dias do descanso anual – artºs 24º/2 e 23º/1 (que são 6 dias).

Acerca do descanso anual, os artºs 23º e 24º prescrevem:
Artigo 23.º (Aquisição do direito a descanso anual)
1. O trabalhador permanente tem direito a seis dias de descanso anual, sem perda de salário, para além dos períodos de descanso semanal e dos feriados obrigatórios.
2. Nos casos em que a duração da relação de trabalho for inferior a 12 meses, mas superior a 3 meses, o período de descanso anual a que o trabalhador tem direito é o proporcional, na medida de 1/2 dia por cada mês ou fracção de duração da relação de trabalho.
3. Para os efeitos do disposto no número anterior, cada mês considerar-se-á completo às 24 horas do correspondente dia do mês seguinte; mas se no último mês não existir dia correspondente ao inicial, o prazo finda no último dia desse mês.
Artigo 24.º (Marcação do período do descanso anual)
1. O período ou períodos de descanso anual a gozar por cada trabalhador será fixado pelo empregador, de acordo com as exigências de funcionamento da empresa.
2. No momento da cessação da relação de trabalho, se o trabalhador não tiver ainda gozado o respectivo período de descanso anual, ser-lhe-á pago o salário correspondente a esse período.
Assim, no âmbito da Lei nº 101/84/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso anual vencidos mas não gozados, a fórmula é:

1 X o salário diário médio X número de dias de descanso anual vencidos mas não gozados.

Nos termos do disposto no artº 21º/1 do Decreto-Lei nº 24/89/M, os trabalhadores têm direito a seis dias úteis de descanso anual, sem perda de salário, em cada ano civil.

Nos termos do disposto no artº 24º do mesmo diploma, o empregador que impedir o trabalhador de gozar o período de descanso anual pagará ao trabalhador, a título de indemnização, o triplo da retribuição correspondente ao tempo de descanso que deixou de gozar.

In casu, não resulta da matéria de facto provada que o trabalhador foi impedido pela entidade patronal de gozar os seus descansos anuais, não se deve aplicar assim a forma de multiplicação a que se refere o citado artº 24º.

E na falta de norma expressa para compensar o trabalhador pelo não gozo de dias de descanso anual mas sem impedimento por parte da entidade patronal, afigura-se-nos correcto aplicar por analogia o regime previsto para a situação análoga no caso de descanso semanal, prevista no artº 17º/5 e 6.

Isto é, o trabalho prestado pelo trabalhador em dias de descanso anual, sem constrangimento da entidade patronal, deve dar analogicamente ao trabalhador o direito de ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso anual, vencidos mas não gozados, a fórmula é:

2 X o salário diário médio X número de dias de descanso anual vencidos mas não gozados, caso o trabalhador não tenha sido impedido pela entidade patronal de os gozar.

b) compensação do trabalho em descanso semanal

Como vimos supra, na vigência da Lei nº 101/84/M, não há lugar à compensação do trabalho prestado em dias de descansos semanais.

Ao passo que no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, a lei já regula as condições do trabalho prestado em dias de descanso semanal e as diferentes formas de compensações desse trabalho consoante as variadas circunstâncias que o justificam.

Diz o artº 17º deste diploma que:

1. Todos os trabalhadores têm direito a gozar, em cada período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26º.
2. O período de descanso semanal de cada trabalhador será fixado pelo empregador, com devida antecedência, de acordo com as exigências do funcionamento da empresa.
3. Os trabalhadores só poderão ser chamados a prestar trabalho nos respectivos períodos de descanso semanal:
a) Quando os empregadores estejam em eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a acréscimos de trabalho não previsíveis ou não atendíveis pela admissão de outros trabalhadores;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável e insubstituível para garantir a continuidade do funcionamento da empresa.

4. Nos casos de prestação de trabalho em período de descanso semanal, o trabalhador tem direito a um outro dia de descanso compensatório a gozar dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e que será imediatamente fixado.
5. A observância do direito consagrado no nº 1 não prejudica a faculdade de o trabalhador prestar serviço voluntário em dias de descanso semanal, não podendo, no entanto, a isso ser obrigado.
6. O trabalho prestado nos termos do número anterior dá ao trabalhador o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Em face dos factos que ficaram provados nos presentes autos, não se mostrando que o trabalho em dias de descanso semanal foi prestado em qualquer das situações previstas no nº 3 e na falta de outros elementos fácticos, a compensação deve processar-se nos termos consagrados no nº 6, isto é, o trabalhador tem direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso semanal, a fórmula é:

2 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em descanso semanal, fora das situações previstas no artº 17º/3, nem para tal constrangido pela entidade patronal.

c) compensação do trabalho em feriado obrigatório

Tal como vimos supra, na vigência da Lei nº 101/84/M, só é de compensar o trabalho prestado naqueles três dias de feriados obrigatórios remunerados (o dia 1 de Janeiro, o dia 1 de Maio e o dia 1 de Outubro), mas apenas nas situações previstas no artº 21º/1-b), já não também na hipótese prevista no artº 21º/1-c), que é justamente a situação dos presentes autos, ou seja, a prestação do trabalho seja indispensável para garantir a continuidade do funcionamento da entidade patronal.

Portanto, in casu, como a entidade patronal, enquanto concessionária da exploração dos jogos, obrigava-se por lei e pelos termos do contrato de concessão a manter em funcionamento contínuo, não há lugar a compensações do trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios na vigência da Lei nº 101/84/M.

No âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, o trabalho em feriados obrigatórios e a forma das suas compensações encontram-se regulados no artº 20º que prescreve:

1. O trabalho prestado pelos trabalhadores nos dias de feriado obrigatório, referidos no nº 3 do artigo anterior, dá direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal e só pode ser executado:
a) Quando os empregadores estejam na eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a um acréscimo de trabalho não previsível;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável para garantia a continuidade do funcionamento da empresa, nos casos em que, de acordo com os usos e costumes, esse funcionamento deva ocorrer nos dias de feriados.
2. Nos casos de prestação de trabalho em dia feriado obrigatório não remunerado, ao abrigo da alínea b) do nº 1, o trabalhador que tenha concluído o período experimental tem direito a um acréscimo de salário nunca inferior a 50% do salário normal, a fixar por acordo entre as partes.

Nos termos do disposto no artº 19º/3, os trabalhadores têm direito à retribuição nos seis dias de feriado obrigatório (1 de Janeiro, os primeiros 3 dias do Ano Novo Chinês, 1 de Maio e 1 de Outubro).

Perante a materialidade fáctica assente, o trabalho prestado pelo trabalhador em dias de feriados obrigatório integra-se justamente na circunstância prevista no artº 20º/1-c), pois o trabalhador estava afectado aos casinos explorados pela entidade patronal, que como vimos supra, se obrigava legalmente a manter os seus casinos em funcionamento contínuo.

Assim, ao abrigo do disposto no artº20º/1, o trabalhador tem direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal.

A propósito da interpretação da expressão “acréscimo salarial”, ensina o Dr. Augusto Teixeira Garcia que “......A prestação de trabalho nestes dias dá o direito aos trabalhadores de receberem um acréscimo de retribuição nunca inferior ao dobro da retribuição normal (artº 20º, nº1). Assim, se um trabalhador aufere como remuneração diária a quantia de MOP$100, por trabalho prestado num dia feriado obrigatório e remunerado ele terá o direito de auferir MOP$300, ou seja, MOP$100 que corresponde ao dia de trabalho mais MOP$200, correspondente ao acréscimo salarial por trabalho prestado em dia feriado.” – vide, op. cit., Capítulo V, ponto 9.2.

Cremos que essa é única interpretação correcta da expressão “acréscimo salarial”.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado, a fórmula é:

3 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em feriado obrigatório remunerado, nas situações previstas no artº 20º/1-c).

Verificando-se que, à excepção do que sucede com as compensações pelo trabalho prestado nos feriados obrigatórios remunerados, os factores de multiplicação aqui enunciados por nós são exactamente os que foram aplicados na sentença ora recorrida, o presente recurso não pode deixar de improceder em todos os aspectos.

Em relação às compensações referentes ao trabalho prestado nos feriados obrigatórios, apesar de terem sido fixadas pelo Tribunal a quo aquém do que defendemos supra, é de manter pura e simplesmente por não ter o Autor recorrido da sentença de 1ª instância, por força do princípio dispositivo.

III

Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso da Ré, mantendo-se na íntegra a sentença de 1ª instância.

Custas pela Ré.

RAEM, 15JUL2010

Dr. Lai Kin Hong (Relator)

Dr. Choi Mou Pan

Dr. José Maria Dias Azedo
Ac. 1068/2009-1